Buscar

Situações de morbidades que acometem a população indigina

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 3, do total de 16 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 6, do total de 16 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 9, do total de 16 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Prévia do material em texto

MODELO ASSISTENCIAL PARA A SAÚDE INDÍGENA: DSEI-MG/ES. 
 
 
Túlio Batista Franco 
Prof. Dr. do Instituto de Saúde da Comunidade 
Universidade Federal Fluminense - UFF 
Consultor Unesco/Dsei-MG/ES 
 
 
Introdução. 
 
O que se pretende neste texto é, à luz do conhecimento de modelos 
tecnoassistenciais e de um diagnóstico preliminar das condições de assistência 
à saúde aos povos indígenas, apresentar uma proposta de organização da 
produção do cuidado a esta população, na área de abrangência do DSEI-
MG/ES. 
A discussão teórica que sustenta a proposta, é feita aqui na medida da 
necessidade do argumento, isto é, o suficiente para sustentar as diretrizes 
sugeridas para a organização da assistência à saúde dos índios. Assim a 
proposta segue com objetividade, expondo os diversos aspectos que devem 
compor um modelo de assistência, considerando a sua complexidade. 
Sugerimos uma estrutura que tem como seu foco uma dada equipe 
básica de saúde, multiprofissional, que deve atuar na assistência às aldeias e 
domicílios indígenas, e junto a estas equipes, propomos uma outra, matricial, 
isto é, que deverá ofertar ações de suporte técnico e assistenciais para diversas 
equipes que estejam atuando em várias comunidades. Esta deve ser composta 
necessariamente por antropólogo, assistente social, psicólogo e de acordo com 
a especificidade de cada local, outros profissionais de áreas em que a equipe 
básica, juntamente com a equipe técnica e o coordenador do DSEI 
considerarem necessários e pertinente para a integralidade da atenção à saúde 
indígena. 
O aspecto da intersetorialidade é ressaltado, partindo da constatação que 
para a resolução dos graves problemas que afetam a saúde dos índios, devem 
haver uma ampla colaboração e implicação de diversos órgão relacionados a 
esta questão, além naturalmente das ações específicas da saúde coletiva. 
Um breve estudo dos dados disponibilizados pelo Sistema de Informação 
da Atenção à Saúde Indígena, SIASI/DSEI-MG/ES, nos revela o quadro mórbido 
que predomina entre as nações indígenas destes estados, e vem nos indicar 
que áreas devem ser priorizadas para implantação de programas para controle 
de agravos. Podemos assim destacar a alta prevalência da desnutrição, 
doenças infecciosas e parasitárias, alcoolismo e doenças do aparelho 
respiratório. Há nesses grupos mais de 50% das causas de adoecimento e 
morte entre os índios. 
Um outro olhar sobre os perfis sanitário e epidemiológico das diversas 
etnias, dão a impressão que os índios não viveram a transição epidemiológica 
que resultou na prevalência das chamadas “doenças da modernidade”, comuns 
entre a população urbana após a revolução industrial. Seu quadro sanitário é o 
mesmo do Brasil rural do século XVII, com predominância de doenças 
infecciosas e parasitárias, dentre outras como já destacadas acima. Isto coloca 
no centro da formulação de uma proposta de modelo assistencial, toda questão 
pertinente à vigilância à saúde que será detalhada no texto. 
O modelo de assistência deve ter como objetivo central atender às 
necessidades de saúde dos povos indígenas, que vão de encontro aos grupos 
de necessidades definidos por Cecílio (1999) como: “Em se ter ‘boas condições 
de vida’ [...] ter acesso e se poder consumir toda tecnologia de saúde capaz de 
melhorar e prolongar a vida [...] criação de vínculos (a)efetivos entre cada 
usuário e uma equipe e/ou um profissional [...] necessidade de cada pessoa ter 
graus crescentes de autonomia no seu modo de levar a vida”. Além disto, o 
modelo que se pensa para a saúde indígena, deve empoderar os índios para 
que eles próprios possam com o tempo, vir a ser protagonistas na produção da 
sua própria saúde. Torná-los sujeitos plenos, individuais e coletivos, rompendo 
com um centenário ciclo de relações que os tornam sujeitados. Este é o outro 
objetivo que deve ser perseguido. Isto só será possível se forem incorporadas às 
ações da saúde, os outros saberes que possibilitem o acesso ao mundo 
simbólico destes povos, que contribuem para a compreensão da sua cultura e 
comportamento e naturalmente a subjetividade dos índios. Nos referimos 
sobretudo, à questão do processo de trabalho, que deve considerar, para a 
implantação e operação dos programas e ações de saúde, o modo dialógico e 
interativo na relação com os índios, respeitando-os e fazendo-se respeitar, 
procurando assim constituir um ambiente solidário de trabalho e produção da 
saúde. 
 
Pensando o modelo assistencial. 
 
O modelo assistencial genericamente é entendido como a forma ideal de 
organização dos serviços de saúde, ou, o modo como se produz o cuidado a 
partir de determinadas tecnologias assistenciais, dentro de um contexto social, 
político, ambiental e subjetivo (Merhy, 1992; Silva Jr., 1998; Franco, 1999). 
Partimos de um princípio norteador para pensar o modelo de assistência, qual 
seja: ele deve se estruturar, centrado no usuário-índio e suas necessidades. Isso 
pressupõe um modelo dinâmico, que pode assumir diferentes matizes, 
dependendo das necessidades que se interpõem para o cuidado à saúde dos 
povos indígenas. Deve se adaptar às condições de vida, sociais, sanitárias e 
epidemiológicas, culturais e simbólicas, subjetivas e de comportamento de cada 
etnia. Porém, nesse universo complexo, nos guiamos por algumas diretrizes 
operacionais para pensar esse modelo assistencial, que serão discutidas ao 
longo do texto, mas que definimos a seguir como: 
Acolhimento1: significa em primeiro lugar, garantir o ACESSO aos 
usuários-índios à assistência, ou seja, todos que procuram ou não o serviço de 
saúde (o acesso se dá também pela visita domiciliar). A sua recepção no serviço 
de saúde deve ser dar através de ações acolhedoras, realizadas pelo 
profissional de saúde encarregado de atendê-lo em qualquer situação ou lugar, 
em uma escuta qualificada, onde o trabalhador deverá se comprometer em 
resolver o seu problema de saúde. Resolver, significa dar-lhe uma resposta 
positiva, utilizando dos recursos disponíveis ou garantindo-lhe um 
encaminhamento seguro. O Acolhimento humaniza a assistência, deve 
resignificar a relação entre trabalhador e o usuário-índio, pautada pela 
solidariedade, respeito à sua cultura e hábitos, presidida pelo direito de 
cidadania no acesso aos serviços. Por outro lado, o Acolhimento deve reordenar 
o processo de trabalho de forma a torná-lo multiprofissional, reunindo todos os 
saberes implicados na produção do cuidado, o que significa valorizar, além da 
clínica, epidemiologia e planejamento, o conhecimento da antropologia, 
assistência social, psicanálise e esquizo-análise, da cultura, entre outros. 
O Acolhimento como diretriz geral para os serviços, deve ocorrer em 
todos os lugares onde houver o encontro de um trabalhador de saúde com o 
usuário-índio, seja no domicílio, aldeia, no posto de saúde, pólo base, CASAI ou 
outro equipamento de saúde qualquer. Nesses contatos que são de trabalho e 
produção de saúde, a escuta qualificada, centrada na relação e compromissada 
com em resolver o problema de saúde do índio, deve buscar avaliar o risco que 
este apresenta, tomando uma decisão com base nos recursos disponíveis no 
serviço e/ou rede de assistência à saúde indígena, inclusive a retaguarda do 
Sistema Único de Saúde. Após o estabelecimento de um certo diagnóstico 
 
1 Sobre o Acolhimento ver: a) FRANCO, T. B.; BUENO, W. S.; MERHY, E. E. O acolhimento e os 
processos de trabalho em saúde: o caso de Betim (MG). Cadernos de Saúde Pública. Rio de Janeiro: 
FIOCRUZ, jun. 2000. b) MALTA, D. C. et al. Acolhimento: uma reconfiguração do processo de trabalho 
em saúde usuário-centrada.In: CAMPOS, C. R.; MALTA, D. C.; REIS, A. T. et al. Sistema Único de 
Saúde em Belo Horizonte. São Paulo: Xamã, 1998. 
 
 
clínico-sócio-cultural-subjetivo, a equipe deve definir seu projeto terapêutico, 
atendendo ao conjunto de necessidades apresentadas pelo usuário-índio. Para 
o projeto terapêutico devem ser dimensionados recursos e ações compatíveis 
com a complexidade que envolve a assistência à saúde indígena. Isto requer 
pensar o acompanhamento do usuário-índio, o cuidado com seus “parentes-
acompanhantes”, espaço de escuta e de fala nas relações com os mesmos, 
possibilidades de realização de seus ritos no ambiente em que estiver, 
especialmente nas Casas de Atendimento à Saúde Indígena (CASAI) enfim, o 
projeto terapêutico deve reunir as tecnologias de cuidado que os serviços de 
saúde usuais dispõem, adicionadas das questões específicas que são da cultura 
indígena. Tendo o projeto terapêutico definido, é importante definir 
responsabilidades para a sua condução. Isto pode ser feito, indicando entre os 
membros da equipe de saúde, aquele que vai fazer a “gestão do cuidado” , ou 
seja, administrar a condução do seu projeto terapêutico, tendo claro que ele 
utilizará o trabalho de toda equipe para isso, mas fica sendo a partir de então, o 
responsável por garantir os cuidados àquele usuário. 
Vínculo2: se realiza e a partir da adscrição de um certo número de 
usuários-índios a uma equipe multiprofissional, que deve ser a referência segura 
para o cuidado àquela população. Para comunidades de até 2.000 índios em 
média, pode ser utilizada uma equipe multiprofissional e acima deste número as 
equipes podem ou ganhar uma estrutura ampliada (com maior número de 
profissionais) ou devem ser organizadas maior número de equipes para uma 
mesma comunidade indígena. O vínculo pressupõe responsabilização, isto é, 
que a equipe cuide de todos os aspectos que cercam a saúde dos índios, 
incluindo as visitas nas aldeias e domicílios, a busca ativa de casos, assistência 
aos egressos de internações hospitalares e/ou da CASAI, organização de 
programas de controle de agravos, vigilância à saúde em geral e todo arsenal 
técnico da clínica que está disponível para o cuidado aos índios. 
 
2 Sobre o vínculo a equipes de referência ver: CAMPOS, G. W. S. Reforma da reforma, repensando a 
saúde. São Paulo: Hucitec, 1992. 
 
Ao vincular um número de usuários-índios a uma ESFI (Equipe de Saúde 
da Família Indígena), estamos nos referenciando a uma estrutura na 
organização dos serviços, com foco na sua micro-organização social, assim 
como de um novo processo de trabalho. 
O vínculo pode ser organizado no Território Indígena (TI) e/ou em 
qualquer equipamento de saúde. Partimos da idéia geral de que o nível de 
assistência na aldeia deve ser o mais resolutivo possível, evitando assim o 
trânsito de indígenas para as cidades, deslocamento este que muitas vezes 
coloca em risco o usuário-índio e seus familiares. Encaminhamentos para a 
CASAI e a rede de maior complexidade do SUS, devem ser feito, somente em 
casos de necessidade, que foge à competência técnica e missão do posto da 
aldeia e suas estruturas mais próximas. Assim, no nível das aldeias, sugerimos 
duas estruturas de vínculo para assistirem aos índios, a saber: 
i) A ESFI básica, formada por médico, enfermeira, dentista, 
auxiliares de enfermagem, Auxiliar de Consultório Dentário 
(ACD) e agentes comunitários indígenas. 
ii) A Equipe Matricial, formada necessariamente por Antropólogo3, 
Assistente Social4, Psicólogo5, e outros profissionais para 
questões específicas, caso a necessidade dos mesmos seja 
percebida. Esta equipe matricial deve ser referência para um 
certo número de equipes básicas, a ser definido posteriormente 
para cada caso-etnia estudado. 
 
3 Sua função poderá ser a de orientar a equipe técnica quanto aos aspectos culturais, hábitos, 
comportamentos, ritos e todo o mundo simbólico que cerca as comunidades indígenas. Poderá ofertar 
capacitação básica em antropologia para os profissionais de saúde, entre outras ações. 
4 Com atribuição de cuidar dos aspectos que envolvem a assistência social aos usuários-índios e suas 
família, atuar em conflitos, articular com outros órgão e entidades, sendo um elemento chave na busca da 
intersetorialidade. 
5 Deverá assistir os usuários-índios nos aspectos relacionados à saúde mental, notadamente atendendo à 
maior urgência atual, articulando um programa de redução de danos relacionado ao alcoolismo. Poderá 
ofertar capacitação às equipes básicas, nas questões relacionadas à saúde mental, bem como articular as 
entidades da área. 
Nota: Para pequenas comunidades, como é o caso de Minas Gerais, onde de 8 
nações indígenas, 6 deles têm menos de 350 índios cada, uma equipe matricial 
pode ser capaz de assistir a estas 6 etnias juntas. Para grandes comunidades a 
relação equipe/matricial deve ser pensada coletivamente entre os técnicos 
envolvidos com a assistência direta aos índios. 
 O vínculo pode ser uma diretriz que organiza a assistência em outros 
tipos de serviços, como por exemplo: 
iii) CASAI: Pressupõe a vinculação de leitos a uma dada equipe de 
referência, que assumiria os cuidados ao usuário-índio enquanto 
ali estivesse internado, inclusive o agendamento a outros 
serviços, acompanhamento, condução do caso sob todos 
aspectos, até que o tratamento tenha sido completado. Neste 
caso, a equipe de referência da CASAI faz a contra-referência 
para a equipe básica de referência do usuário. Isto para CASAI’s 
maiores. Para as de pequeno porte, a equipe da CASAI é a de 
referência, ou seja, ela faz o vínculo a toda a clientela ali 
internada. 
A CASAI deve ser caracterizado como um equipamento de 
saúde, de tipo específico, com atribuição de acolher as 
demandas que vêm dos postos da aldeia, ou de outros 
equipamentos e até mesmo a demanda espontânea, e tem a 
também a responsabilidade de articular toda a retaguarda de 
assistência à saúde dos índios, incluindo o SUS. Além disto, ela 
deve receber e cuidar dos usuários que retornam da internação 
hospitalar e ainda necessitam de cuidados especiais, antes de 
retornarem para a aldeia. É por excelência, o equipamento que 
faz a articulação da linha do cuidado6 na assistência à saúde 
indígena. 
Ao mesmo tempo, a CASAI serve como um importante 
observatório da eficácia da assistência realizada pelas 
equipes em nível das aldeias. Um grande número de casos 
vindos à CASAI, que poderiam ser resolvidos com os recursos 
disponibilizados às equipes que atendem nas aldeias, é indicador 
de baixa eficácia destas equipes. É possível, a partir da CASAI, 
ter alguns indicadores sentinela da atenção à saúde, por 
exemplo: Alta presença de desnutrição infantil na CASAI é 
sentinela para baixa resolutividade dos cuidados à saúde da 
criança em nível da aldeia. 
iv) HOSPITAL: O mesmo vínculo que há na CASAI, pode ser feito 
também no hospital. Sabemos que não é o modelo adotado 
usualmente na rede de assistência hospitalar do SUS, mas na 
pactuação entre o subsistema de saúde indígena com os 
equipamentos hospitalares, pode-se sugerir a vinculação de 
leitos a equipes de saúde, supondo toda a necessidade de 
cuidados especiais que devem ser dispensados aos índios. 
Resolutividade: significa o compromisso do trabalhador de saúde em 
efetivamente resolver o problema do usuário-índio, ou com os recursos de que 
ele dispõe, ou dando-lhe um encaminhamento seguro para o lugar onde ele 
possa ter seu problema resolvido. 
Integralidade: A integralidade da assistência à saúde, depende da 
pactuação da rede básica organizada e operada pelo subsistemade saúde 
indígena, incluindo a CASAI, e toda rede de atenção à média e alta 
 
6 Ver: Franco, T.B. & Magalhães, H.M.; Integralidade na Assistência à Saúde: A organização das 
Linhas do Cuidado in O Trabalho em Saúde: olhando e experienciando o SUS no cotidiano; 
Merhy, Franco, et al; São Paulo, Hucitec, 2003. 
complexidade e hospitalar, sob gestão do Sistema Único de Saúde. Ela deve 
atingir um nível de funcionamento em que os fluxos assistenciais ocorram de 
forma segura e tranqüila, possibilitando o acesso do usuário-índio a toda 
tecnologia de cuidado, necessária ao atendimento à sua saúde. 
Intersetorialidade: Diz respeito às ações conjuntas entre a saúde 
indígena e todos os outros órgãos governamentais e não governamentais que 
estão implicados com o atendimento às nações indígenas, sobre todo aspecto, 
incluindo os de ordem sócio-econômica, ambiental, cultural. Ela deve compor 
assim uma cartografia orgânica, com funções de cada entidade, relações e 
fluxos comunicantes entre si, que garantam a produção conjunta das condições 
favoráveis para o desenvolvimento das comunidades indígenas, potencializando 
sua capacidade de gerir sua vida individual e coletiva, produzir os bens para 
sua sobrevivência (autosustentabilidade) e se manterem saudáveis. 
Autonomização: O sentido da autonomização é o resultado que se 
pretende obter através de um cuidado à saúde centrado no sujeito índio, seja 
individual ou coletivo. Este resultado diz respeito justamente ao fato dos próprios 
índios ganharem autonomia frente aos serviços de saúde, e com o tempo e as 
ações assistenciais (clínicas, epidemiológicas e sanitárias, de prevenção e 
promoção, culturais e comportamentais, religiosas e subjetivas, etc...) eles 
deverão ir adquirindo capacidade protagônica, se tornando sujeitos na produção 
da sua própria saúde. 
A Vigilância à Saúde: 
A Vigilância à Saúde, e os seus sub-componentes, principalmente os da 
Vigilância Sanitária, Epidemiológica, Ambiental são campos de saberes e 
práticas da saúde coletiva, que devem estar associados às outras diretrizes na 
composição do modelo assistencial. Na observação realizada junto aos Maxakali 
(MG), verifica-se que condições de moradia e ambiental são absolutamente 
precárias. Mesmo com um esforço importante em ofertar água de qualidade, os 
hábitos dos Maxakali para o manejo e guarda dos alimentos não garantem que 
estes se mantenham nas condições ideais para o consumo. Por outro lado, 
dados do Sistema de Informações da Atenção à Saúde Indígena (SIASI), 
disponibilizados no DSEI-MG/ES, informam que a morbidade entre os índios da 
sua área de abrangência está concentrada nas doenças infecciosas e 
parasitárias, que somadas às do aparelho digestivo, muitas vezes associadas a 
estas causas, totalizam 30% dos agravos anotados no SIASI (Figura I). 
Ainda conforme o SIASI, as doenças do aparelho respiratório figuram com 
alta prevalência, perfazendo 22% dos registros mórbidos no ano de 2003. Entre 
os 41 registros de óbito entre os índios para este ano, 11, ou seja, 17% têm 
como causa, por hipótese, problemas relacionados às doenças respiratórias. 
Entre as crianças menores de 1 ano, predomina como quadro mórbido a 
desnutrição, atingindo segundo os dados disponíveis, 34% dos registros de 
morbidade nesta faixa etária, para o ano de 2003. Para as crianças na faixa de 1 
a 4 anos, a desnutrição continua apresentando-se como um problema 
extremamente grave, sendo responsável por 49,2% dos registros de morbidade 
nesta faixa etária, reduzindo para 7,8% para as crianças entre 5 a 9 anos. Em 
outubro de 2004, havia segundo diagnóstico nutricional realizado por técnicos da 
CASAI de Governador Valadares (MG), 21 crianças Maxakali internadas na 
CASAI com desnutrição severa, demonstrando que a alta prevalência deste 
agravo continua atormentando os indígenas. Nas crianças as doenças 
infecciosas intestinais, associadas às diarréias e gatrointerites de presumível 
causa infecciosa, são outros problemas significativos, correspondendo a 12,1% 
da morbidade na faixa etária até 1 ano; 12,4% de 1 a 4 anos e em 26,6% para 
os que estão entre 5 a 9 anos de idade. Isto vem nos demonstrar que um 
programa de controle nutricional entre os índios em Minas Gerais, deverá ser 
amplo nas ações de educação em saúde, de forma a contemplar aspectos do 
acondicionamento de alimentos e higienização dos utensílios e do ambiente, 
com vistas a prevenir os agravos desta natureza. Pressupõe portanto ações 
prioritárias em nível dos domicílios indígenas e suas respectivas famílias, 
sobretudo a mulher, que é por natureza, a cuidadora da criança. 
Os dados sugerem adoção, em caráter emergencial, de programa de 
recuperação nutricional e controle de agravos relacionados ao aparelho 
digestivo, de causa infecciosa e parasitária. Da mesma forma, o controle de 
doenças do aparelho respiratório e programa de redução de danos são também 
de caráter emergencial. Para construir um modelo de produção do cuidado 
aos Maxakali em especial, é necessário primeiro, desmontar as “máquinas 
de morte” presentes nas suas populações, que são principalmente a 
desnutrição e o alcoolismo. 
FIGURA I: Morbidade entre os índios da área de abrangência do DSEI-MG/ES, 
para o ano de 2003, distribuída por grupo de doenças conforme a Classificação 
Internacional de Doenças (CID10). 
24%
22%
13%
7%
7%
6%
6%
5%
4% 2%
4%
Alg. D. infecciosas e parasitárias
D. do ap. Respiratório
D. endócrinas, nutr. e metabólicas 
D. do ap. Circulatório
D. sist. osteomuscular e tec. conjuntivo
D. da pele e tecido subcutâneo
D. do ap. Digestivo
D. aparelho geniturinário
D. do sangue e órg. hemat.e transt.
Imunitários
Transtornos Mentais e Comport.*
Outros
 
Fonte: Sistema de Informação da Saúde Indígena, DSEI-MG/ES. 
A análise dos dados, deixa dúvida no entanto, quanto aos registros 
relacionados aos transtornos mentais e comportamentais, incluindo o 
alcoolismo. É sabido a alta prevalência desta doença entre os índios e no 
entanto, presume-se que os registros não revelam este fato com a extensão que 
têm e o dano que causa entre os mesmos. Um melhor cuidado sobre este item 
deve ser verificado, pois a observação do comportamento dos índios e dos 
danos causados pelo alcoolismo tem nos levado à conclusão de que esta tem 
sido responsável por inúmeros problemas, inclusive o aumento exacerbado da 
agressão entre os próprios índios. 
 
Conclusão. 
 
Este texto assume que a construção de um modelo assistencial para a 
saúde indígena deve ser obra coletiva e portanto, não considera que aqui se 
encerra este debate, mas simplesmente, abre a discussão para os diversos 
sujeitos implicados com o subsistema de saúde indígena. 
Propõe a composição de um amplo arsenal teórico para construir e operar 
o novo modelo, que considera, além das tradicionais áreas da saúde coletiva 
(clínica, epidemiologia, planejamento e ciências sociais), outras se colocam 
como fundamentais, notadamente a antropologia, assistência social, psicanálise 
e esquizo-análise, e ainda, naturalmente, os campos de conhecimento que a 
intersetorialidade pode agregar, como a ecologia, e todos saberes e práticas que 
operam na linha da autosustentabilidade das aldeias. 
A diretriz do Acolhimento, faz uma aposta fundamental na relação entre 
trabalhador e o usuário-índio. Quando implantado nas equipes que atuam em 
comunidades onde uma minoria de indivíduos se comunicam em português, 
alguns dos trabalhadores devem aprender o idioma indígena para melhor 
interagirem com estas etnias. Um exemplo disto é o caso dos Maxakali em 
Minas Gerais. Isto é um diferencial importantepara a eficácia desta diretriz em 
um modelo de cuidado, que opera junto aos povos indígenas. 
Outro aspecto fundamental, é o referencial simbólico sob o qual os índios 
atuam e constroem a realidade social, e que deve ser considerado quando se 
trata de assistir a sua saúde. A produção do cuidado nessas comunidades 
pressupõe a compreensão e respeito à sua cultura e religiosidade, sendo os 
ritos xamânicos muitas vezes considerados dispositivos terapêuticos. Eis o que 
nos diz Guattari (1966) quando sugere a esquizo-análise para a compreensão 
destes fenômenos: 
 
Definimos a esquizo-análise por dois aspectos: a 
destruição das pseudo-formas expressivas do 
inconsciente, a descoberta dos investimentos 
inconscientes do campo social pelo desejo. É dentro deste 
ponto de vista que é preciso considerar muitas curas 
primitivas: elas são esquizo-análise em acto. (Guattari, 
1966). 
O autor vem nos dizendo que o desejo dos sujeitos individuais e coletivos, 
é um grande propulsor para a construção do campo social. O desejo se encontra 
em nível inconsciente, mas atua fortemente sobre a realidade. Por exemplo: 
implementar um novo modelo assistencial à saúde, que seja produtor do 
cuidado, depende da ação desejante dos diversos atores implicados com a 
questão indígena, gestores, técnicos, os próprios índios, isto é, muito além do 
conhecimento técnico necessário, a mudança está vinculada à subjetividade, 
que se expressa no ato de desejar e efetivamente atuar na transformação da 
realidade. 
Os ritos xamânicos são a expressão do inconsciente coletivo, que acessa 
e opera um nível simbólico de significação da realidade e servem como 
dispositivo para a cura de muitos males que afetam a saúde dos índios. O que 
nos diz o autor é que os rituais são uma forma de operar diversos canais de 
representação simbólica, que significam ação esquizoanalítica, e têm o objetivo 
de liberar sua energia criativa, criadora e produtiva, recuperando para os índios 
bens simbólicos como auto-estima, afirmação como sujeito, domínio sobre a 
realidade que o cerca, construção de novas subjetividades, poder de atuar sobre 
o mundo. Isto é altamente terapêutico. Sobre estes aspectos, há um importante 
debate a se realizar, pois trata-se de algo novo no campo de reflexões da saúde 
coletiva, mas que vem ganhando terreno e sendo objetivo de atenção de alguns 
autores. Fica a idéia em geral de que os rituais devem ser estimulados e não 
desqualificados pelo novo modelo de assistência à saúde indígena. 
Enfim, atingir níveis ótimos de assistência à saúde indígena é uma missão 
a ser cumprida e tem como premissa a mudança do atual modelo, ainda 
centrado no saber biológico, com práticas excessivamente prescritivas, como é o 
modelo hegemônico. Verifica-se um terrível paradoxo na saúde indígena, 
enquanto a maioria destas comunidades não viveram o período higienista do 
sanitarismo brasileiro, e neste quesito assumem o perfil da comunidades rurais 
do Brasil século XVII, como dito aqui, têm para si um modelo que opera centrado 
nos recursos ofertados pela maquinaria e instrumental duro normativo e 
estruturado, pouco relacional e dialógico. Assim, o desafio é o de encontrar um 
equilíbrio em um modelo que atue sobre as condições sanitárias propriamente 
ditas, e ao mesmo tempo opera a clínica ampliada, com ênfase nas tecnologias 
leves e no campo relacional para a produção do cuidado (Merhy, 1997, 1998; 
Franco, 1999). 
 
BIBLIOGRAFIA: 
 
BAREMBLITT, G. Compêndio de análise institucional e outras correntes. 
Rio de Janeiro: Ed. Rosa dos Tempos, 1992. 
CAMPOS, G. W. S. Reforma da reforma, repensando a saúde. São Paulo: 
Hucitec, 1992. 
CAMPOS, G. W. S. A saúde pública e a defesa da vida. São Paulo: Hucitec, 
1994b. 
CECÍLIO, L. C. O. (Org.). Inventando a mudança na saúde. São Paulo: 
Hucitec, 1994. 
CECÍLIO, L.C.O.; As Necessidades de Saúde como Conceito Estruturante 
na Luta pela Integralidade e Equidade na Atenção em Saúde; Rio de Janeiro; 
UERJ, IMS: ABRASCO; 2001. 
DELEUZE, G. e GUATTARI, F. O Anti-Édipo: capitalismo e esquizofrenia. 
Lisboa: Assírio & Alvim, 1966. 
DONNANGELO, M. C. Saúde e sociedade. São Paulo: Duas Cidades, 1976. 
Ferreira Vilarinho, E.; Relatório sobre a Intervenção Nutricional na Casa do 
Índio; Governador Valadares (MG), mimeo, outubro/2004. 
FRANCO, T. B. Os processos de trabalho e a mudança do modelo 
tecnoassistencial em saúde. Campinas, 1999. (Tese - Mestrado – 
Universidade Estadual de Campinas). 
FRANCO, T.B. & MAGALHÃES, H.M.; Integralidade na Assistência à Saúde: 
A organização das Linhas do Cuidado in O Trabalho em Saúde: olhando e 
experienciando o SUS no cotidiano; Merhy, Franco, et al; São Paulo, Hucitec, 
2003. 
FRANCO, T. B.; MERHY, E. E. PSF: contradições de um programa destinado à 
mudança do modelo assistencial in O Trabalho em Saúde: olhando e 
experienciando o SUS no cotidiano; São Paulo, Hucitec, 2003. 
FRANCO, T. B.; BUENO, W. S.; MERHY, E. E. O acolhimento e os processos 
de trabalho em saúde: o caso de Betim (MG). Cadernos de Saúde Pública. Rio 
de Janeiro: FIOCRUZ, jun. 2000. 
GUATTARI, F.; ROLNIK, S. Cartografias do desejo. Petrópolis: Vozes, 1999. 
MALTA, D. C. et al. Acolhimento: uma reconfiguração do processo de trabalho 
em saúde usuário-centrada. In: CAMPOS, C. R.; MALTA, D. C.; REIS, A. T. et 
al. Sistema Único de Saúde em Belo Horizonte. São Paulo: Xamã, 1998. 
MERHY, E. E. Em busca do tempo perdido: a micropolítica do Trabalho Vivo em 
saúde. In: MERHY, E. E.; ONOCKO, R. (Org.), Agir em saúde: um desafio para 
o público. São Paulo: Hucitec, 1997. 
MERHY, E.E. A Saúde Pública como Política: um estudo de formuladores 
de políticas; São Paulo, Hucitec, 1992. 
MERHY, E. E.; ONOCKO, R. (Org.), Agir em saúde: um desafio para o público. 
São Paulo: Hucitec, 1997. 
MERHY, E. E. A perda da dimensão cuidadora na produção da saúde − Uma 
discussão do modelo assistencial e da intervenção no seu modo de trabalhar a 
assistência. In: 
MERHY, E. E. Saúde: a cartografia do Trabalho Vivo. São Paulo: Hucitec, 2002. 
SILVA JR. A. G. Modelos tecnoassistenciais em Saúde − o debate no campo 
da saúde coletiva. São Paulo: Hucitec, 1998. 
 
 
Belo Horizonte, 30 de novembro de 2004. 
Fim.

Outros materiais