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Prof. Dilso Domingos Pereira D I R E I T O C I V I L V -‐ C O N T R A T O S I I 2 Tópicos: Doação ....................................................................................................................................3 Prestação de serviço................................................................................................................32 Contrato de empreitada..........................................................................................................39 Empréstimo.............................................................................................................................46 Depósito..................................................................................................................................53 Mandato..................................................................................................................................65 Locação....................................................................................................................................79 Comissåo.................................................................................................................................150 Representação Comercial........................................................................................................160 Gestão.....................................................................................................................................166 Fiança......................................................................................................................................167 Agência e Distribuiçåo.............................................................................................................177 Transporte...............................................................................................................................182 Cartão de Crédito....................................................................................................................197 Factoring .................................................................................................................................199 Franquia.................................................................................................................................. 202 Bancário...................................................................................................................................207 Know How................................................................................................................................211 Seguro......................................................................................................................................213 Leasin.......................................................................................................................................230 Incorporação imobiliária..........................................................................................................237 Compromisso e Arbitragem ....................................................................................................259 Transação.................................................................................................................................275 Constituição de Renda.............................................................................................................278 3 Doação. 1. Conceito. Está no próprio código civil. Art. 538. Considera-‐se doação o contrato em que uma pessoa, por liberalidade, transfere do seu patrimônio bens ou vantagens para o de outra. É uma liberalidade praticada pelo doador em benefício do donatário, transferindo-‐ lhe, em vida, bens ou vantagens do seu patrimônio, entendido aqui como o conjunto de bens pertencentes a uma pessoa, próximo, portanto, do sentido econômico. (Sanseverino) 2. Elementos da doação: -‐ enriquecimento do donatário; -‐ intenção de doar 2.1. Enriquecimento do donatário A doação requer a transferência da propriedade de um bem, que pertence ao doador, para o donatário. Há, assim, um enriquecimento do donatário em troca de um empobrecimento do doador. Liberalidades que não se constituem em doação Há liberalidades que, embora pareçam, não se constituem em doação. Na renúncia abdicativa, por exemplo, quando alguém simplesmente abre mão da herança sem indicar para quem gostaria que ficassem os bens renunciados, não há doação, porque a herança não chega entrar no patrimônio do renunciante. Por outro lado, na renúncia translativa, a doação se caracteriza, porque o renunciante recebe a herança e indica a pessoa para quem deseja que fique o bem. Incide, neste caso, inclusive imposto de transmissão. É o elemento objetivo (Sanseverino). 4 2.2. Intenção de doar O ânimo de doar (animus donandi) “consiste na intenção do doador praticar a liberalidade em favor do donatário”, diz Sanseverino. É a prática de uma liberalidade desinteressada em benefício do donatário, quer dizer, sem exigir qualquer contraprestação. E isso está presente mesmo nas doações modais ou com encargo, afirma Sanseverino, porque este ônus não chega a constituir uma contrapartida à liberalidade. 3. Natureza jurídica É um contrato como, expressamente, estabelece o artigo 538 do Código Civil. O Código Civil alemão (BGB) também atribui à doação natureza contratual, como se depreende do seu artigo 1900 (Sanseverino). Mas, no direito francês, a doação é considerada modo especial de aquisição da propriedade, como dispõe o artigo 892 do Code Civil de 1804. O Código Civil italiano, em seu artigo 769, define a doaçãocomo contrato, mas a insere no Título V, do Livro II, que trata do direito sucessório, ao invés de inseri-‐la no Livro IV que trata do direito das obrigações. (Sanseverino). 4. Características (Gagliano e Pamplona) 4.1. Unilateralidade É um contrato unilateral, porque estabelece obrigação apenas para o doador. E assim o é mesmo que se trate de doação onerosa, ou seja, gravada com um encargo, “vez que o ônus que se impõe ao donatário não tem o peso da contraprestação, a ponto de desvirtuar a natureza do contrato”(Pamplona e Gagliano). Carlos Roberto Gonçalves tem um posicionamento diferente, entendendo que a doação será bilateral se houver imposição de encargo ao donatário. 5 4.2. Formalidade Em regra, o contrato de doação é formal, porque requer forma escrita (por instrumento público ou particular). A exceção reside nas doações de bens móveis de pequeno valor, que se contenta apenas com a entrega imediata. É o que preceitua Código Civil: Art. 541. A doação far-‐se-‐á por escritura pública ou instrumento particular. Parágrafo único. A doação verbal será válida, se, versando sobre bens móveis e de pequeno valor, se lhe seguir incontinenti a tradição. Quanto aos bens imóveis, a regra até seria dispensável, pois o artigo 108 do Código Civil já exige, para os contratos envolvendo imóveis com valor acima de trinta vezes o maior salário mínimo vigente no País, a escritura pública. Mas, para os bens móveis, observa Sanseverino, o legislador estabeleceu um requisito de validade não exigido em outros contratos. Normalmente, tratando-‐se de contrato translativo de bens móveis, não se exige forma escrita, bastando o consenso e a entrega do bem ao adquirente, como ocorre na troca e na compra e venda. O rigor da forma especial, salienta Sanseverino, objetiva a proteção do próprio doador, evitando doações precipitadas e arrependimentos posteriores. O legislador, todavia, abriu exceção para os casos de doações de bens móveis de pequeno valor, admitindo sejam verbais (consensuais), mas exigindo que a entrega seja imediata. São as chamadas doações manuais. “É o caso, por exemplo, do amigo que doa uma caneta ao outro, entregando-‐a de imediato” (Gagliano e Pamplona). 4.3. Ânimo de doar (animus donandi) O doador deve querer praticar o ato de liberalidade, enriquecendo o donatário às suas próprias expensas (Rizzardo). 6 4.4. Gratuidade A doação é um contrato gratuito ou benéfico, porque atribui vantagens apenas ao donatário e encargos ao doador. “Nem mesmo a doação com encargo constitui, a rigor, um contrato oneroso” (Sanseverino), embora o Código Civil (art. 562) denomine esta doação como onerosa. Todavia, Carlos Roberto Gonçalves afirma que havendo imposição de encargo ao beneficiário, o contrato será oneroso. 4.5. Adesão O donatário não pode discutir os termos da doação, restando-‐lhe apenas anuir ou não à liberalidade do doador (Gagliano e Pamplona). 5. Objeto Pode ser objeto da doação bens ou vantagens (CC,art. 538), ou seja, qualquer coisa que “tenha expressão econômica e possa ser alienada”, bens móveis e imóveis, corpóreos e incorpóreos, consumíveis e inconsumíveis (Gonçalves). 5.1. Coisa alheia Coisa alheia, a princípio, não pode ser objeto de doação, mas, se o for, e o doador, posteriormente, adquirir a propriedade da coisa, o contrato se convalida, na forma do parágrafo primeiro do artigo 1268 do Código Civil. 5.2. Bens futuros A maioria dos ordenamentos jurídicos proíbe a doação de bens futuros, tais como o Código Civil francês (art. 943), o Código Civil italiano (art. 771), e o Código Civil português (art. 942). 7 O nosso Código Civil não proíbe, mas na doutrina há divergências. São contrários, por exemplo, Paulo Lôbo, Orlando Gomes; são favoráveis: Agostinho Alvim Carlos Roberto Gonçalves, Paulo de Tarso Vieira Sanseverino. Caio Mário, salientando que a doação de bens futuros não é vedada, alerta que o contrato será condicional e não terá validade se a coisa doada não se tornar disponível para o doador. E, ainda, não terá validade se tiver natureza sucessória, direta ou indireta (Gonçalves). Exemplos: Os frutos que serão colhidos este ano; o primeiro bezerro que nascer da vaca (Agostinho Alvim). 5.3. Promessa de doação Há divergência na doutrina. Para uns, a promessa de doação, sendo pura, se admitida, poderia o donatário exigir o cumprimento da obrigação de fazer e/ou perdas e danos, caso não fosse cumprida, e isso é incompatível com a gratuidade. Para outros, a liberalidade é manifestada no momentoda celebração da promessa, e a sentença proferida na ação intentada pelo promissário-‐donatário, apenas, busca o cumprimento daquilo que foi convencionado. Essas questões aparecem com mais freqüência nas separações judiciais consensuais, onde há promessa de doação de bens aos filhos. Discute-‐se se pode haver arrependimento. Yussef Said Cahali alerta de que se deve distinguir a doação definitiva da promessa de doação. Quando, nestes feitos da área de família, houver homologação judicial, a promessa de doação se torna consumada, não podendo mais haver retratação. Por outro lado, até a homologação, pode o doador arrepender-‐se (Gonçalves). O STJ firmou posição no sentido de que, na ação de dissolução da sociedade conjugal, o acordo homologado que contém promessa de doação de bens aos filhos é exigível por ação cominatória (REsp 125859/RS, 2ª Seção., rel. Min. Ruy Rosado, j. 26/06/2002, DJ 24/03/2002; REsp 742.048/RS, 3ª T., rel. Min. Sidnei Beneti, j. 14.04.2009, DJ 24.04.2009). 8 6. Capacidade 6.1. Capacidade ativa O doador, em regra, deve ter capacidade civil, exigida nos contratos em geral. Se o donatário for um descendente ou o outro cônjuge (CC, art. 544), o consentimento dos outros descendentes ou do cônjuge, diferentemente da venda ou permuta, não é exigido, porque a doação, neste caso, é considerada adiantamento de legítima (Rizzardo). 6.1.1. Cônjuge casado No casamento, exceto se o regime for de separação absoluta, um cônjuge não pode doar sem o consentimento do outro, mas esta proibição não subsiste se a doação for de um para o outro (Rizzardo). No regime de separação obrigatória (CC, art. 1641), diz Rizzardo, apoiado em Serpa Lopes, as doações recíprocas são proibidas. Na separação parcial, são permitidas as doações dos bens particulares de cada um, desde que alienáveis. 6.1.2. Aquestos No regime de participação final nos aquestos (todos os bens do casal adquiridos na vigência do casamento), as doações podem recair sobre os bens que cada um possuía ao casar e sobre os bens adquiridos pelo cônjuge doador, a qualquer custo, na constância do casamento. 6.1.3. Menor O menor não pode doar, exceto se já está autorizado a se casar (Rizzardo). 9 “O menor, absoluta ou relativamente incapaz, não pode realizar doação sem a representação ou assistência de seu representante legal” (Sanseverino). 6.1.4. Mandatário É possível a doação por intermédio de mandatário, podendo, no caso, o mandante (doador), no próprio instrumento, designar o beneficiário ou deixar a escolha a cargo do mandatário (Rizzardo). 6.1.5. Cônjuge adúltero A doação de cônjuge adúltero ao seu cúmplice sofre objeção legal, podendo ser anulada pelo outro cônjuge ou os herdeiros no prazo de até dois anos depois de dissolvida a sociedade conjugal Art. 550. A doação do cônjuge adúltero ao seu cúmplice pode ser anulada pelo outro cônjuge, ou por seus herdeiros necessários, até dois anos depois de dissolvida a sociedade conjugal. Art. 1.642. Qualquer que seja o regime de bens, tanto o marido quanto a mulher podem livremente: [...] IV -‐ demandar a rescisão dos contratos de fiança e doação, ou a invalidação do aval, realizados pelo outro cônjuge com infração do disposto nos incisos III e IV do art. 1.647; [...] Não se deve confundir a condição de união estável envolvendo pessoas casadas, mas separadas de fato, com a de amantes. O que a lei proíbe é a doção de uma pessoa (homem ou mulher), casada ao amásio, mas não é aplicada ao cônjuge separado de fato que mantém uma convivência pública e duradoura com outra, incidindo, neste caso, o artigo 226, § 3º, da Constituição Federal, e artigo 1.723 do Código Civil (Rizzardo). 10 6.2 Capacidade passiva Por óbvio, todas as pessoas capazes para os atos da vida civil podem receber doações. Mas o Código Civil faculta esse direito também a pessoas sem capacidade civil, tais como: ao nascituro; aos incapazes; a pessoas indeterminadas ou não identificadas. 6.2.1. Nascituro O nascituro, embora despido de personalidade, tem seus direitos assegurados por lei, bastando nascer com vida. Assim, são representados pelos pais, que aceitam ou não a doação (Rizzardo). Se aceita, basta haver o nascimento com vida para que a doação se torne definitiva. Porém, se não houver nascimento com vida, a doação torna-‐se ineficaz. Art. 542. A doação feita ao nascituro valerá, sendo aceita pelo seu representante legal. Além do nascituro, pode haver doação em benefício da prole eventual (CC, art.546). 6.2.2. Incapazes Os incapazes podem receber doação, sendo que os absolutamente incapazes estão dispensados da aceitação, mas a doação terá de ser pura. Art. 543. Se o donatário for absolutamente incapaz, dispensa-‐se a aceitação, desde que se trate de doação pura. Também podem os incapazes receber doações com encargo, desde que representados e com autorização judicial (CC,art.1748,II). Art. 1.748. Compete também ao tutor, com autorização do juiz: [...]; II -‐ aceitar por ele heranças, legados ou doações, ainda que com encargos; 11 7. Aceitação A doação é contrato, assim, em regra, é necessária a manifestação das duas partes. Logo, não basta a vontade do doador (animus donandi), para a doação se efetivar, exige-‐se que haja aceitação por parte do donatário, que é o animus donum acciendi, ou seja o ânimo de receber a doação (Sanseverino;Fábio Ulhoa Coelho). Com efeito, o doador, ao manifestar sua intenção de doar, pode, por cautela, fixar prazo para que o donatário expresse a sua manifestação. No silêncio, tratando-‐se de doação pura, presume-‐se que houve aceitação. (Fábio Ulhoa Coelho) Art. 539. O doador pode fixar prazo ao donatário, para declarar se aceita ou não a liberalidade. Desde que o donatário, ciente do prazo, não faça, dentro dele, a declaração, entender-‐se-‐á que aceitou, se a doação não for sujeita a encargo. 7.1. Modalidades de aceitação A aceitação pode ser: expressa, tácita, presumida ou dispensada. a) Aceitação expressa O donatário age dando uma manifestação expressa de que aceitou a doação. Pode ser por escrito, verbal ou por gesto. Ocorre, por exemplo, quando ele comparece ao Tabelionato e assina a escritura pública de doação de um imóvel que lhe está sendo doado; quando recebe um presente e emocionado agradece ao doador com um abraço. (Sanseverino). b) Aceitação tácita O donatário se comporta de forma incompatível com quem não aceita a doação. Pratica atos que denotam o seu consentimento (Sanseverino).Por exemplo, usar a coisa que lhe foi deixada. 12 c) Aceitação presumida Dá-‐se quando, por exemplo, o doador fixa prazo para o beneficiário se manifestar, não sendo doação com encargo, e ele o deixa fluir in albis. (Sanseverino) d) Aceitação dispensada Embora a aceitação seja a regra, no caso de doação pura e se feita em benefício do absolutamente incapaz, a lei a dispensa. Por conseguinte, diz Sanseverino, “os menores de 16 anos de idade e os doentes mentais, por exemplo, embora sejam absolutamente incapazes, podem receber diretamente, sem a presença de seu representante legal, doações puras”. Art. 543. Se o donatário for absolutamente incapaz, dispensa-‐se a aceitação, desde que se trate de doação pura. Anota-‐se que a doação ao nascituro requer aceitação de seu representante legal, consoante determinação expressa do artigo 542 do Código Civil. 8. Espécies de doação (Sanseverino). 8.1. Doação pura ou simples “É a doação por essência, posto que inspirada no ânimo de contemplar o favorecido sem nada lhe exigir ou impor, mas por mera liberalidade” (Rizzardo). São exemplos: doação de um apartamento para a filha que vai se casar; de um automóvel ao filho que completou 18 anos; doação de dinheiro a um hospital de caridade (Sanseverino). 13 8.2. Doação modal ou com encargo Esta modalidade de doação impõe ao donatário um dever, uma incumbência, a realização de uma atividade em favor do doador, de terceiro ou de interesse geral (Rizzardo). Exemplos: Doação de um imóvel incumbindo o donatário de construir nele uma Faculdade. O encargo não suspende a aquisição nem o exercício do direito (Gonçalves). 8.3. Doação em contemplação de merecimento do donatário Art. 540. A doação feita em contemplação do merecimento do donatário não perde o caráter de liberalidade, como não o perde a doação remuneratória, ou a gravada, no excedente ao valor dos serviços remunerados ou ao encargo imposto. O doador demonstra sua admiração pelo donatário, em razão de seu destaque, por meio da liberalidade. Exemplo: a doação feita a um artista, um cientista, um esportista (Sanseverino). A doação pecuniária ao vencedor do Prêmio Nobel (Gonçalves). Não se confunde com a promessa de recompensa. Na doação em contemplação, premia-‐se o donatário em razão de seu destaque; na promessa de recompensa, premia-‐se quem realizou uma atividade significativa (Sanseverino). O prêmio dado ao cientista que descobriu a cura de uma doença rara é doação em contemplação de merecimento; masa oferta de um determinado valor ao cientista que descobrir a vacina para essa mesma doença é promessa de recompensa (Agostinho Alvim). 8.4. Doação remuneratória Nesta espécie, o doador presta uma retribuição ao donatário pelos serviços prestados, motivado por um sentimento de gratidão. Exemplo: a doação feita ao médico ou ao advogado que, pela relação de amizade, prestou serviço gratuito (Sanseverino). 14 8.5. Doação condicional Há doações em que o doador condiciona a eficácia da doação a um evento futuro e incerto, podendo a condição ser suspensiva ou resolutiva. São exemplos: A doação feita em contemplação de casamento (art. 546) existe é válida, mas ineficaz, porque condicionada à realização do casamento. Não se realizando o casamento, a doação não se efetiva. A doação feita com cláusula de reversão (art. 547) estabelece que o bem doado volte ao patrimônio do doador se ele sobreviver ao donatário. Com efeito, a doação subordina-‐se a uma condição resolutiva, pois resta resolvida no caso de o donatário morrer antes do doador. 9. Restrições à liberdade de doar (Sanseverino) No nosso sistema jurídico, vigora o princípio da autonomia privada, que assegura a qualquer pessoa ampla liberdade para celebrar negócio jurídico (Sanseverino). Todavia, essa liberdade não é absoluta, sofre restrições. No contrato de doação é vedada: a doação universal, a doação inoficiosa, a doação em prejuízos dos credores; a doação do cônjuge adúltero a seu cúmplice. 9.1. Doação universal A doação universal é a que abrange todos os bens que integram o patrimônio do doador. A lei proíbe que o doador não reserve bens para a sua subsistência, por questão de interesse público, vez que, em tese, se a pessoa não tem condições de se manter, cabe ao Estado lhe dar assistência. A finalidade da vedação, também, é para proteger não só a própria pessoa do doador, mas outras pessoas a ele relacionadas, tais como o cônjuge, seus herdeiros e credores (Sanseverino). 15 Art. 548. É nula a doação de todos os bens sem reserva de parte, ou renda suficiente para a subsistência do doador. Observa-‐se que a sanção é a nulidade de todo o ato jurídico que pode ser decretada de ofício pelo Juiz. 9.2. Doação inoficiosa “A doação inoficiosa é a que excede a parte disponível do doador” (Sanseverino), ou seja, invade a legítima, que corresponde à parte dos bens da herança garantidos aos herdeiros necessários. A pena é a nulidade do excesso doado, decretada por decisão proferida em ação de redução da doação inoficiosa, que deve, consoante a jurisprudência, ser ajuizada após a morte do doador, embora Rizzardo afirme que possa ser antes. Art. 549. Nula é também a doação quanto à parte que exceder à de que o doador, no momento da liberalidade, poderia dispor em testamento. Art. 1.845. São herdeiros necessários os descendentes, os ascendentes e o cônjuge Art. 1.789. Havendo herdeiros necessários, o testador só poderá dispor da metade da herança. Art. 1.846. Pertence aos herdeiros necessários, de pleno direito, a metade dos bens da herança, constituindo a legítima. 9.3. Doação em prejuízo dos credores É vedada a doação em prejuízo de credores do doador. Assim, se o devedor, ao fazer a doação, já está insolvente ou é reduzido ao estado de insolvência, caracteriza-‐se a fraude a credores, anulável por ação pauliana, que deve ser ajuizado no prazo decadencial de quatro (4) anos (art. 178, II). 16 Art. 158. Os negócios de transmissão gratuita de bens ou remissão de dívida, se os praticar o devedor já insolvente, ou por eles reduzido à insolvência, ainda quando o ignore, poderão ser anulados pelos credores quirografários, como lesivos dos seus direitos. 9.4. Doação do cônjuge adúltero ao cúmplice A lei veda a doação do cônjuge adúltero ao seu cúmplice. Não precisa haver relação de concubinato. Basta que a pessoa beneficiária seja cúmplice no adultério, “podendo ser um único encontro”, diz Sanseverino (p.144). O STJ vem distinguindo concubina de companheira (REsp 3560/RS, Rel. Min. Fontes de Alencar, j. 13.12.1993, DJ 23.05.1994, 4.ªT.); REsp 408.296/RJ, 3.ª T., rel. Min. Ari Parendler, j. 18.06.2009, DJ 24.06.2009). Concubina é a relação paralela havida na constância do casamento do cônjuge adúltero. Companheira é a nova companhia do cônjuge separado de fato, que vai caracterizar uma união estável. Assim, conclui Sanseverino, “as doações feitas por homem casado à sua companheira, após a separação de fato de sua esposa, são válidas, porque, nesse momento, o concubinato anterior dá lugarà união estável; a ‘contrario sensu’, as doações feitas antes disso são nulas”. A ação a ser proposta é a anulatória de doação, porque se trata de nulidade relativa e não absoluta. Logo o ato não é nulo, mas anulável. A legitimidade para propor a ação é do cônjuge, mas se ele já faleceu, é dos herdeiros necessários. O prazo para a propositura da ação anulatória de doação é de dois anos, contados da dissolução da sociedade conjugal, que pode se dar pela morte de um dos cônjuges, pela anulação do casamento, pela separação ou divórcio. 17 Este prazo é decadencial, isto porque, esclarece Sanseverino, o Código Civil de 2002, com boa técnica legislativa, estabeleceu critérios claros e pragmáticos para a distinção dos prazos de prescrição e decadência. Na parte geral (art. 189 e SS.), listou os prazos prescricionais, deixando para a parte especial a indicação, casão a caso, das hipóteses de decadência. Para caracterizar o adultério não se exige que a relação mantida pelo cônjuge seja com pessoa de sexo diverso, podendo ser com pessoa do mesmo sexo. “Assim, as doações feitas por doador casado ao seu parceiro homossexual, na constância da sociedade conjugal, também afronta o disposto no art. 550 do CC/2002”, assevera Sanseverino. Art. 550. A doação do cônjuge adúltero ao seu cúmplice pode ser anulada pelo outro cônjuge, ou por seus herdeiros necessários, até dois anos depois de dissolvida a sociedade conjugal. 9.5. Doação de ascendente a descendente A doação feita por ascendente a descendente importa em adiantamento de legítima, ou seja, adiantamento do que cabe ao donatário na herança. Com efeito, falecendo o doador, o donatário deve levar o bem recebido à colação para que sejam igualados os quinhões dos herdeiros necessários (CC, art. 2004, § 1º). Todavia, como diz Carlos Roberto Gonçalves, o herdeiro donatário fica liberado da colação se o bem doado não excede à parte disponível do doador, o qual expressamente o dispensou (CC, art. 2005). Para o pai beneficiar um filho em detrimento dos outros, na lição de Silvio Rodrigues, “é mister que o doador a inclua em sua quota disponível, com expressa menção de que o donatário fica dispensado da colação. Caso isso não ocorra, entende-‐se que a doação do pai ao filho nada mais é do que adiantamento daquilo que por morte do doador o donatário recebera”. Salienta-‐se, como ensina Carlos Roberto Gonçalves, “ os efeitos de adiantamento de legítima são exclusivamente decorrentes de doação de ascendentes para descendentes. Entre estes não se distinguem os havidos dentro ou fora do casamento de seus pais por origem biológica ou adotiva.” 18 Ainda, a doação feita pelo avô ao neto não configura adiantamento de legítima. Mas pode ocorrer de o neto donatário suceder representando o pai, por estirpe ou representação. Nessa hipótese, o neto não vai levar o bem recebido à colação, porque, por força do artigo 2.005, § único, do Código Civil, que presume estaria a doação contida na parte disponível do doador (Sanseverino). Anota-‐se, este não é o entendimento de Carlos Roberto Gonçalves. Citando Paulo Lôbo, ele afirma que “o neto somente estará obrigado à colação se suceder no lugar do pai, por estirpe ou representação”. Art. 544. A doação de ascendentes a descendentes, ou de um cônjuge a outro, importa adiantamento do que lhes cabe por herança. Art. 2.002. Os descendentes que concorrerem à sucessão do ascendente comum são obrigados, para igualar as legítimas, a conferir o valor das doações que dele em vida receberam, sob pena de sonegação. Parágrafo único. Para cálculo da legítima, o valor dos bens conferidos será computado na parte indisponível, sem aumentar a disponível. Art. 2.003. A colação tem por fim igualar, na proporção estabelecida neste Código, as legítimas dos descendentes e do cônjuge sobrevivente, obrigando também os donatários que, ao tempo do falecimento do doador, já não possuírem os bens doados. Parágrafo único. Se, computados os valores das doações feitas em adiantamento de legítima, não houver no acervo bens suficientes para igualar as legítimas dos descendentes e do cônjuge, os bens assim doados serão conferidos em espécie, ou, quando deles já não disponha o donatário, pelo seu valor ao tempo da liberalidade. Art. 2.004. O valor de colação dos bens doados será aquele, certo ou estimativo, que lhes atribuir o ato de liberalidade. § 1o Se do ato de doação não constar valor certo, nem houver estimação feita naquela época, os bens serão conferidos na partilha pelo que entãose calcular valessem ao tempo da liberalidade. 19 § 2o Só o valor dos bens doados entrará em colação; não assim o das benfeitorias acrescidas, as quais pertencerão ao herdeiro donatário, correndo também à conta deste os rendimentos ou lucros, assim como os danos e perdas que eles sofrerem. Art. 2.005. São dispensadas da colação as doações que o doador determinar saiam da parte disponível, contanto que não a excedam, computado o seu valor ao tempo da doação. Parágrafo único. Presume-‐se imputada na parte disponível a liberalidade feita a descendente que, ao tempo do ato, não seria chamado à sucessão na qualidade de herdeiro necessário. Art. 2.006. A dispensa da colação pode ser outorgada pelo doador em testamento, ou no próprio título de liberalidade. Art. 2.007. São sujeitas à redução as doações em que se apurar excesso quanto ao que o doador poderia dispor, no momento da liberalidade. § 1o O excesso será apurado com base no valor que os bens doados tinham, no momento da liberalidade. § 2o A redução da liberalidade far-‐se-‐á pela restituição ao monte do excesso assim apurado; a restituição será em espécie, ou, se não mais existir o bem em poder do donatário, em dinheiro, segundo o seu valor ao tempo da abertura da sucessão, observadas, no que forem aplicáveis, as regras deste Código sobre a redução das disposições testamentárias. § 3o Sujeita-‐se a redução, nos termos do parágrafo antecedente, a parte da doação feita a herdeiros necessários que exceder a legítima e mais a quota disponível. § 4o Sendo várias as doações a herdeiros necessários, feitas em diferentes datas, serão elas reduzidas a partir da última, até a eliminação do excesso. 20 Art. 2.008. Aquele que renunciou a herança ou dela foi excluído, deve, não obstante, conferir as doações recebidas, para o fim de repor o que exceder o disponível. Art. 2.009. Quando os netos, representando os seus pais, sucederem aos avós, serão obrigados a trazer à colação, ainda que não o hajam herdado, o que os pais teriam de conferir. Art. 2.010. Não virão à colação os gastos ordinários do ascendente com o descendente, enquanto menor, na sua educação, estudos, sustento, vestuário, tratamento nas enfermidades, enxoval, assim como as despesas de casamento, ou as feitas no interesse de sua defesa em processo-‐crime. Art. 2.011. As doações remuneratórias de serviços feitos ao ascendente também não estão sujeitas a colação. Art. 2.012. Sendo feita a doação por ambos os cônjuges, no inventário de cada um se conferirá por metade. 10. Outras situações 10.1. Doação ao nascituro Embora a personalidade civil da pessoa comece com o nascimento com vida, o ordenamento jurídico brasileiro, seguindo outras legislações, como a francesa e a italiana, permite a doação a quem ainda não nasceu. Exige-‐se, apenas, como pressuposto, a concepção e a aceitação. Anota-‐se a aceitação é feita pelo representante legal do nascituro, que não necessariamente devem ser os pais. Em sendo a gestante solteira e menor absolutamente incapaz, o representante legal do nascituro será o mesmo da sua mãe, provavelmente o pai dela, avô do nascituro (Sanseverino). 21 A doação ao nascituro caracteriza uma hipótese legal de obrigação condicional suspensiva, porquanto o nascimento com vida – evento futuro e incerto – é pressuposto para que a doação se torne eficaz. Art. 2.º A personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro. Art. 542. A doação feita ao nascituro valerá, sendo aceita pelo seu representante legal. 10.2. Doação ao incapaz (Sanseverino) O incapaz pode receber doação. Tratando-‐se de absolutamente incapaz, como já referido, fica dispensada a aceitação, mas a doação deve ser pura. Se for com encargo, exige-‐ se a aceitação de seu representante, diz Sanseverino. Art. 3.º São absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil: I – os menores de dezesseis anos; II – os que, por enfermidade ou deficiência mental, não tiverem o necessário discernimento para a prática desses atos; III – os que, mesmo por causa transitória, não puderem exprimir sua vontade. Art. 543. Se o donatário for absolutamente incapaz, dispensa-‐se a aceitação, desde que se trate de doação pura. 10.3. Doação entre cônjuges. É possível a doação feita por um cônjuge ao outro, mas depende do regime de casamento. No caso de comunhão universal, a doação não se realiza, porque, dada a comunicação automática, inexiste transferênciapatrimonial. No regime de separação convencional de bens, a doação entre cônjuges é possível, porque um cônjuge transfere bem de seu patrimônio para o patrimônio do outro. Na separação obrigatória (art. 1.641), a doação não é válida se feita com o intuito de burlar o regime, diz Sanseverino. 22 Art. 544. A doação de ascendentes a descendentes, ou de um cônjuge a outro, importa adiantamento do que lhes cabe por herança. 10.4. Doação em forma de subvenção periódica. Trata-‐se de uma pensão, diz Carlos Roberto Gonçalves. Pode ser em dinheiro, o que mais acontece, ou em outros bens, como rancho, bolsa de estudos, etc. Não se trata de várias doações, mas de uma única com execução continuada (Sanseverino). O contrato deve ser celebrado por instrumento público ou particular. O prazo de duração pode ficar estipulado no próprio instrumento, mas se nada constar, o termo final será a morte do doador. Contudo, ainda, pode a liberalidade ir além da morte do doador, limitada às forças da herança. Neste caso, a obrigação extingue-‐se com a morte do donatário. Esta modalidade submete-‐se às limitações à liberdade de doar, lembra Sanseverino. Havendo empobrecimento do doador, de modo a configurar doação universal, será suspensa. Se beneficiar um descendente, será considerada adiantamento de legítima. Se caracterizar doação inoficiosa, o excesso será nulo. Se houver ingratidão do donatário, poderá ser revogada. Art. 545. A doação em forma de subvenção periódica ao beneficiado extingue-‐se morrendo o doador, salvo se este outra coisa dispuser, mas não poderá ultrapassar a vida do donatário. 10.5. Doação feita em contemplação de casamento (propter nuptias). Art. 546. A doação feita em contemplação de casamento futuro com certa e determinada pessoa, quer pelos nubentes entre si, quer por terceiro a um deles, a ambos, ou aos filhos que, de futuro, houverem um do outro, não pode ser impugnada por falta de aceitação, e só ficará sem efeito se o casamento não se realizar. Esta modalidade possibilita a doação, antes do casamento, por um nubente ao outro, por terceiro a um dos nubentes, a ambos, ou aos filhos que, futuramente, vierem do casamento (prole futura). 23 O pressuposto é que se faça a doação antes do casamento. Nesta modalidade, similar à doação feita ao absolutamente incapaz (art. 543), dispensa-‐se a aceitação. Quanto à forma, em determinados casos, requer-‐se a escritura pública. Assim, feita pelos nubentes entre si, a doação deve ser objeto de pacto antenupcial, que exige a escritura pública (art. 1.653 ss.). Logo, observa Sanseverino a doação de um nubente ao outro, mesmo que não se trate de bem imóvel de valor superior a trinta salários mínimos, um automóvel, por exemplo, deve ser feita por escritura pública. Contudo as doações feitas por terceiros (pais, avós, tios, padrinhos) aos nubentes ou a sua prole futura, dependendo da natureza do bem doado, podem ser por contrato particular ou até verbal (art. 541). Com efeito, nesta espécie de doação, há que se ter atenção com as pessoas envolvidas no negócio jurídico. Esta espécie de doação configura modalidade de condição suspensiva, porque, beneficiando os nubentes, sua eficácia fica condicionada à realização do casamento. Se feita em favor de prole futura, a propriedade será transmitida quando nascer o primeiro filho, sendo que, sobrevindo mais de um, haverá um condomínio, não nascendo nenhum, a doação não terá eficácia. Mas se não houver filhos naturais, e o casal adotar um filho, a doação feita à prole terá eficácia? A resposta, segundo Sanseverino é positiva, posto que, conforme a Constituição Federal (art. 227, § 6º) não há diferença alguma entre a situação jurídica do filho natural e a do adotivo. É bom lembrar que na doação feita entre cônjuges ou aos cônjuges não se aplica essa regra, mas as dos artigos 544 e 551, § único, do Código Civil. Art. 544. A doação de ascendentes a descendentes, ou de um cônjuge a outro, importa adiantamento do que lhes cabe por herança. Art. 551. Salvo declaração em contrário, a doação em comum a mais de uma pessoa entende-‐se distribuída entre elas por igual. Parágrafo único. Se os donatários, em tal caso, forem marido e mulher, subsistirá na totalidade a doação para o cônjuge sobrevivo. 24 Por fim, a doação em contemplação de casamento futuro é irrevogável por ingratidão, consoante disposição expressa do artigo 564, IV, do CC/2002; 10.6. Doação com cláusula de reversão. Art. 547. O doador pode estipular que os bens doados voltemao seu patrimônio, se sobreviver ao donatário. Parágrafo único. Não prevalece cláusula de reversão em favor de terceiro. Nesta modalidade, o doador insere no contrato cláusula estipulando que o bem doado retorne ao seu patrimônio se ele sobreviver ao donatário. Cria-‐se uma obrigação condicional resolutiva (CC/arts.127-‐128), pois, falecendo o donatário antes do doador, a doação se resolve. Consequentemente é caso de propriedade resolúvel (Sanseverino. Pode ocorrer de o donatário alienar o bem recebido a terceiro, depois falecer, permanecendo vivo o doador. Neste caso, a alienação é desfeita, porque o terceiro adquiriu uma propriedade resolúvel (Rizzardo). Por fim, como expressamente prevê o parágrafo único do artigo 547, a reversão prevalece somente em favor do doador, não podendo ser estipulada em benefício de terceira pessoa. 10.7. Doação conjuntiva (Sanseverino). A doação conjuntiva está prevista no caput do artigo 551 do Código Civil. Art. 551. Salvo declaração em contrário, a doação em comum a mais de uma pessoa entende-‐se distribuída entre elas por igual. Configura-‐se quando feita em benefício de mais de uma pessoa conjuntamente. Se nada constar, a distribuição do bem doado aos donatários será em partes iguais, mas pode ser desigual, desde que se faça menção expressa no contrato de doação. 25 Porém, tratando-‐se de doação manual de pequeno valor (CC/02,art.541,§ ún), que dispensa a forma escrita, admite-‐se prova documental e até testemunhal, diz Sanseverino. 10.8. Doação feita a casal. Esta doação está prevista no parágrafo único do artigo 551. Art. 551. Salvo declaração em contrário, a doação em comum a mais de uma pessoa entende-‐se distribuída entre elas por igual. Parágrafo único. Se os donatários, em tal caso, forem marido e mulher, subsistirá na totalidade a doação para o cônjuge sobrevivo. Contempla marido e mulher não importando o regime de casamento e estendendo-‐ se à união estável (Sanseverino). Falecendo um dos cônjuges, a doação subsiste, integralmente, em favor do outro, não sendo assim a parte do falecido objeto de inventário (Rizzardo). É o direito de acréscimo que deve ser aceito não só no direito sucessório, mas também nas doações em benefício de cônjuges. Todavia, observa Sanseverino que a norma não é de ordem pública, admitindo-‐se que o doador, expressamente, estabeleça que, falecendo um dos cônjuges, a parte que lhe toca seja transmitida aos herdeiros, impedindo o direito de acréscimo do cônjuge sobrevivente. 10.9. Doação à entidade futura Art. 554. A doação a entidade futura caducará se, em dois anos, esta não estiver constituída regularmente. Permite a lei a doação à entidade ainda não constituída, podendo se estender a entes coletivos, tais como, associações, fundações, sociedades. Por exemplo, a doação de uma fazenda para uma entidade ecológica de proteção a determinado animal silvestre, que ainda está em formação ou sequer existe; a doação em dinheiro para a formação de uma associação 26 de combate a uma doença infantil (Sanseverino). Se a futura entidade não se regularizar no prazo de dois anos, caduca a doação. Trata-‐se de uma obrigação condicional suspensiva. 10.10. Doação e os juros moratórios, a evicção e os vícios redibitórios. Art. 552. O doador não é obrigado a pagar juros moratórios, nem é sujeito às conseqüências da evicção ou do vício redibitório. Nas doações para casamento com certa e determinada pessoa, o doador ficará sujeito à evicção, salvo convenção em contrário. Inadimplindo o doador, o donatário pode-‐lhe exigir o cumprimento da doação, mas, por ser uma mera liberalidade, não lhe é possível cobrar juros moratórios (Sanseverino). Por trata-‐ser de contrato gratuito, não se aplica a evicção, tratando-‐se de doação. Porém haverá responsabilidade do doador se ele agir com dolo ou má-‐fé (CC/02,art.392). E, ainda, mantém-‐se a evicção, a não ser que se disponha em contrário, se doação foi em contemplação de casamento ou modal. Esta exceção é muito criticada na doutrina (Vide: Sanseverino; Rizzardo). Não responde o doador, também, pelos vícios redibitórios. Com efeito, se um bem, doado, vier a apresentar defeitos ocultos, o doador por eles não responde. Nas doações com encargo, excepcionalmente, os vícios redibitórios incidem, consoante regra do parágrafo único do art. 441. 11. Extinção da doação. O contrato de doação se extingue, normalmente, pelo seu cumprimento, por parte do doador, com a entrega do bem doado ao donatário. Na doação modal, deve o donatário realizar o encargo que lhe foi incumbido (Sanseverino). Todavia,por vezes, a extinção da doação decorre de causas anormais, diversas do adimplemento, tais como, por ingratidão do donatário e por inexecução do encargo, tratadas como causas de revogação (CC, art. 555), e por causas comuns a todos os contratos. 27 11.1. Extinção por causas comuns a todos os contratos. São as causas de nulidade ou anulabilidades, decorrentes dos vícios dos negócios jurídicos, tais como, erro, dolo, coação, estado de perigo, fraude a credores, agente incapaz, objeto ilícito, impossível ou indeterminado, não observância da forma prescrita, (Gonçalves). Ainda, há extinção por causas não comuns a todos os contratos, mas por vícios exclusivos do contrato de doação, como nas hipóteses de inoficiosidade (art. 549), doação feita pelo cônjuge adúltero ao seu cúmplice, etc. 11.2. Extinção (revogação) da doação pelo não cumprimento do encargo. Art. 562. A doação onerosa pode ser revogada por inexecução do encargo, se o donatário incorrer em mora. Não havendo prazo para o cumprimento, o doador poderá notificar judicialmente o donatário, assinando-‐lhe prazo razoável para que cumpra a obrigação assumida. Exige-‐se a mora do donatário. Não havendo prazo para o cumprimento do encargo, há que se notificar o donatário, fixando-‐lhe prazo razoável (CC, art. 397, § ún.). A força maior afasta a mora. O encargo pode ser em benefício do doador, de terceiro, ou do interesse geral (CC, art. 553). A legitimidade para exigir o cumprimento do encargo é do doador, do terceiro (beneficiado) e do Ministério Público. A legitimidade do Ministério Público é apenas para doações com encargos que beneficiem o interesse geral. 28 Estando vivo o doador, somente ele tem legitimidade para exigir o cumprimento do encargos; não a tem o Ministério Público, nem o beneficiário, mesmo que o encargo seja no interesse geral (Gonçalves) No caso de serem vários os donatários, e o encargo ser indivisível, basta o descumprimento de um deles para que haja a revogação, mas se o ônus for divisível, a revogação da doação deve atingir apenas aqueles donatários que não cumpriram com a sua parte no encargo (Gonçalves). Se houver pluralidade de doadores e um só donatário, sendo o direito divisível, havendo descumprimento do encargo, se uns quiserem revogar o benefício e outros não, aqueles que pretenderem poderão fazê-‐lo em relação às suas quotas, mas não sobre a coisa toda doada. 11.3. Revogação por ingratidão do donatário. Art. 557. Podem ser revogadas por ingratidão as doações: I – se o donatário atentou contra a vida do doador ou cometeu crime de homicídio doloso contra ele; II – se cometeu contra ele ofensa física; III – se o injuriou gravemente ou o caluniou; IV – se, podendo ministrá-‐los, recusou ao doador os alimentos de que este necessitava. O rol é exemplificativo (Sanseverino). O homicídio deve ser doloso. A ação revocatória pode ser intentada, independentemente de ter havido condenação no juízo criminal, mas há que se observar os casos em que a sentença penal faz coisa julgada no cível (CC, art. 935). A legitimidade para propor a ação é dos herdeiros (CC, art. 561). 29 A ofensa física deve ser concreta. Não se amolda ao dispositivo a ameaça, porém, diz Sanseverino, a ameaça séria e grave de mal injusto ao doador ou seus familiares pode caracterizar hipótese ingratidão. As condutas culposas – não dolosas – não configuram ingratidão. Com relação há honra, a ingratidão não se funda apenas na injúria e calúnia, mas abrangem também a difamação, embora o dispositivo seja omisso (Sanseverino; Rizzardo). Relembrando: Calúnia é a imputação falsa de fato definido como crime (CP, art. 138); a injúria é a ofensa à honra subjetiva da vítima, como a dignidade, o decoro (CP, art. 140); a difamação é a imputação de fato ofensivo à reputação da vítima, não tipificado como crime, que atinge a sua honra objetiva, por ex., afirmar que a vítima é mau pagador de contas (CP, art. 139). Quanto à ingratidão por recusa do donatário na prestação de alimentos ao doador necessitado, a hipótese não se confunde com a doação com encargo de prestar. Nesta circunstância, a recusa constitui descumprimento do encargo. Aqui, conforme Rizzardo, exige-‐se que o doador se encontre em situação de necessidade; não haja parentes próximos; e o donatário esteja em condições de prestar os alimentos. Também, constitui ingratidão a ofensa ao cônjuge, ao ascendente, ao descendente ou irmão do doador (CC, art. 558). O
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