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A Clínica Analítico-Comportamental: Um estudo de Caso Sobre Auto- Regras e Déficit de Habilidades Sociais Luciana Brandão Sacramento/Junho de 2014 Resumo: O presente artigo aborda a terapia na abordagem analítico-comportamental de uma senhora de 60 anos, que chamaremos de S. A cliente foi atendida inicialmente por uma terapeuta e posteriormente foi realizada co-terapia. S chegou com a queixa inicial de angústia e sofrimento por ter descoberto que o neto seria homossexual. Também se refere a queixas ligadas a falta de habilidades sociais e a auto-regras, como: conflitos familiares, solidão, preocupação excessiva com o que os outros pensam a seu respeito e conflitos religiosos. Neste artigo serão descritas as hipóteses surgidas, as intervenções realizadas e os resultados obtidos. As intervenções basearam-se na FAP (Psicoterapia Analítico Funcional), onde fazíamos pontuações de acordo com os CRB1 (Comportamentos Clinicamente Relevantes) que surgiam em sessão. Alguns resultados observados (CRB2) foram a melhora na escuta e enfrentamento de algumas auto regras. Palavras chave: Terapia Analítico-Comportamental, Déficit em Habilidades Sociais, Controle por Regras e Auto-Regras, Intervenções Verbais. 1. Introdução A clínica analítica comportamental teve início com o Behaviorismo metodológico de Watson, sua concepção baseava-se nos fatos que podiam ser observados, ou seja, desconsiderava os acontecimentos mentais por serem inobserváveis. Como isso ocorreu na época do positivismo, onde era necessária a comprovação dos fatos através da experimentação, a teoria de Watson foi importante para tornar a Psicologia uma ciência. Em 1945 Skinner usou o termo Behaviorismo Radical para diferenciar-se do Behaviorismo metodológico, uma vez que seus estudos levavam em consideração os “comportamentos encobertos”, ou seja, os sentimentos e pensamentos que também são considerados comportamento para Skinner. Na clínica analítica comportamental os comportamentos são classificados como operantes os respondentes. O comportamento é respondente é (reflexo ou involuntário) na presença de um estímulo, como a dilatação e contração da pupila dos olhos em contato com a iluminação. Já o Condicionamento Operante é "voluntário" e a emissão de certas ações está relacionada a produção de determinada classe de estímulos. 1.1 FAP (Psicoterapia Analítico Funcional) A FAP (Functional Analytic Psychotherapy) - Psicoterapia Analítico Funcional foi desenvolvida por Mavis Tsai e Robert J. Kohlenberg e é um tipo de psicoterapia comportamental pautada nas oportunidades de mudanças profundas obtidas dentro das limitações de um relacionamento íntimo e intenso entre terapeuta e cliente. A vivência interpessoal profunda neste relacionamento oferece ao cliente oportunidades de aprendizagem ao vivo, que o ajudam a crescer e superar seus problemas no cotidiano. Oportunidades de aprendizagem ao vivo emergem no seio do relacionamento terapêutico quando o cliente emite comportamentos clinicamente relevantes em relação à pessoa do terapeuta. Estes são momentos em que o comportamento pode ser modelado diretamente a partir dos efeitos que têm sobre o relacionamento. Os comportamentos clinicamente relevantes do cliente que ocorrem durante a sessão são indicados pela sigla inglesa CRB (Clinically Relevant Behavior) e divididos em três categorias. CRB1: Problemas do cliente que ocorrem na sessão. A terapia deve levar à diminuição destes comportamentos por meio de evocação e modelagem de modos alternativos de agir. CRB2: Progressos do cliente que ocorrem na sessão. São comportamentos com baixa ocorrência no início da terapia e que serão alvos de reforçamento por caracterizar melhoras ao vivo no relacionamento com o terapeuta. CRB3: refere-se às falas do cliente sobre suas dificuldades, seus progressos e as suas causas. Inclui as interpretações que o próprio cliente faz dos seus comportamentos durante a interação com o terapeuta (KOHLENBERG e TSAI, 2001). Em primeiro lugar, o que o terapeuta faz pode funcionar como estímulo discriminativo, isto é, pode propiciar uma situação na qual é mais provável que ocorram certos comportamentos do cliente. Em segundo lugar, pode ter uma função eliciadora (evocando respostas emocionais, sensações, imagens ou pensamentos). Finalmente, as ações do terapeuta podem funcionar como reforçadores, isto é, consequências que aumentam a ocorrência de certo comportamento do cliente. Na FAP, o modo de ajudar o cliente é por meio destas diferentes funções das ações do terapeuta durante a sessão. Logo, o primeiro objetivo terapêutico é construir um relacionamento genuíno e intenso para que os problemas-alvo do cliente realmente ocorram dentro da sessão, para serem trabalhados ao vivo (KOHLENBERG e TSAI, 2001). Os procedimentos de avaliação na FAP para gerar hipóteses clínicas e monitorar os progressos do cliente são os mesmos usados por terapeutas cognitivo-comportamentais: entrevistas, autorrelatos, questionários e registros. Durante todo o tratamento, a FAP utiliza técnicas vivenciais e exercícios de contato emocional, como também destaca a expressão honesta pelo terapeuta dos seus sentimentos em relação ao cliente, com o intuito de intensificar o relacionamento terapêutico e torná-lo um lugar de aprendizagem genuíno. Suas estratégias de intervenção são colocadas na forma de regras para o terapeuta: observar atentamente o comportamento do cliente para intervir no momento certo; criar condições para evocar os comportamentos "disfuncionais" e as oportunidades de aprendizagem; reforçar os progressos do cliente quando ocorrem ao vivo em situação de consultório; observar quais os aspectos da pessoa do terapeuta ou quais ingredientes da sua maneira de estar junto ao cliente que são reforçadores para os comportamentos do cliente; compartilhar com o cliente suas interpretações de variáveis que afetam o seu comportamento (TSAI, KOHLENBERG, KANTER e WALZ, 2008). 1.2 Comportamento Verbal O estudo skinneriano do comportamento verbal é apresentado em Verbal Behavior. Segundo Skinner (1957/1992), o comportamento verbal é comportamento operante, agindo sobre o ambiente e sofrendo as conseqüências da alteração que provoca nele. Estas conseqüências – como o reforço e a punição – determinarão a probabilidade de emissão futura da classe de respostas que integram o operante. A comunidade verbal instala os repertórios verbais a partir dos processos de reforçamento, discriminação, generalização, diferenciação, etc. (PASSOS, Maria de Lourdes, 2003) A análise funcional do comportamento verbal procura as variáveis independentes que controlam o comportamento verbal no ambiente do organismo que se comporta verbalmente. Estas variáveis devem ser, ainda, passíveis de observação e manipulação, permitindo assim não apenas que se verifique sua relação de controle do comportamento verbal, mas também a instalação de repertório desse comportamento. A análise funcional do comportamento verbal é sempre estudo do comportamento verbal do falante e ouvinte concretos, individuais, num ambiente específico e conhecido, já que a utilização de textos separados das situações concretas em que foram produzidos obscurece as relações funcionais relevantes para a explicação do comportamento verbal. (PASSOS, Maria de Lourdes, 2003). Segundo PASSOS, Maria de Lourdes apud Skinner, os comportamentos operantes podem ser divididos em dois tipos: não verbais e verbais. Skinner classifica os operantes verbais em: ecoico, textual, transcrição, intraverbal, mando, tato, autoclítico, tato distorcido e mando disfarçado. Iremos explicar melhor apenas o tato e mando por serem os mais relevantes, uma vezque aparecem no caso clínico deste artigo. O mando é o operante verbal pelo qual a comunidade verbal é capaz de dar ordens (- Fale baixo!), fazer pedidos (- Você me emprestaria um livro?), identificar reforços necessitados pelas pessoas (- Quer que ligue o ar refrigerado?), fazer perguntas, dar conselhos e avisos, pedir a atenção de alguém, etc (PASSOS, Maria de Lourdes, 2003). A comunidade verbal considera mandos disfarçados como maneiras mais educadas, polidas ou delicadas de fazer pedidos, e acaba reforçando-os. No entanto, o mando disfarçado nem sempre é efetivo na produção de reforçadores, a alta emissão de mandos disfarçados pode resultar em punições ou escassez de reforçadores. Pode evidenciar dificuldade por parte do cliente de se comportar assertivamente. (SANTOS, Ghoeber Morales dos; SANTOS, Maxleila Reis Martins Santos e MARCHEZINI-CUNHA, Vivian) É por meio do tato que nomeamos os estímulos ou algumas de suas propriedades, descrevendo vários dos aspectos dos ambientes externo e interno à nossa pele. Na presença de sua mãe, a criança recebe um sorriso, um afago ou é retirada do berço, ao emitir o tato mãe. Dessa forma nossos tatos vão sendo estabelecidos e aprendemos a emitir carro, na presença de objetos com rodas, assentos e certas outras propriedades, ou colégio, frente a um prédio relativamente grande, com várias salas, crianças (PASSOS, Maria de Lourdes, 2003). Os tatos distorcidos são relatos do que o ouvinte gostaria de ouvir, e não do que ocorreu na realidade. O falante relata eventos de maneira a produzir reforçadores positivos ou se esquivar de punições. (SANTOS, Ghoeber Morales dos; SANTOS, Maxleila Reis Martins Santos e MARCHEZINI-CUNHA, Vivian) 1.3 Controle por regras e auto-regras De acordo com JONAS, André: “Segundo Skinner, todo comportamento é modelado pelas contingências ambientais (Skinner, 1966, 1969)”. Segundo SOUZA, Deisy p. 85 apud (Catania, 1993; Skinner, 1953; Todorov, 1985): “Em sentido geral, contingência pode significar qualquer relação de dependência entre eventos ambientais ou entre eventos comportamentais e ambientais”. Ainda segundo SOUZA, Deisy p. 85 apud (Catarina, 1993, p. 368): “... a probabilidade de um evento pode ser afetada por causa de outros eventos”. O enunciado de uma contingência é feito em forma de afirmações do tipo se..., então... Assim, os enunciados apresentam-se como “regras” que especificam essas relações entre eventos. Os seres humanos são suscetíveis a uma importante parte do ambiente denominada “regras”. Apresentam um subconjunto da classe mais geral de comportamento modelado pelas contingências, que é controlado por contingências especiais denominadas regras. O comportamento verbal através do qual a regra é expressa e a consciência (discriminação de contingências) necessários à formulação e ao surgimento de regras são, ambos, modelados através de contingências medidas pela comunidade verbal (SKINNER, 1957, 1969). Segundo Skinner (1991), a comunidade verbal gera “consciência” quando ensina um indivíduo a descrever seu comportamento (passado, presente e/ou futuro), e a identificar as variáveis das quais este comportamento é função (ou foi, ou será). Exemplos de comportamento controlado por regras envolvem o seguir conselhos, instruções, ordens, ou qualquer outra forma de comportamento verbal que descreva contingências, isto é, que prescreva a relação entre condições, ação e consequências. Contudo, é preciso lembrar que os tipos de contingências responsáveis pelo estabelecimento e manutenção de seguir regras já foram colocados pelo ambiente não verbal. Um relato verbal ou descrição do comportamento só se torna regra quando ordena o próprio comportamento de tomar decisões, formular planos, estabelecer propósitos e metas, e fazendo assim, estão construindo regras. É relevante salientar a relevância que as regras podem ter em controlar o comportamento, e as instâncias nas quais os seres humanos aparentemente formularam e seguem suas próprias regras. Quando elas são formuladas ou reformuladas pelos indivíduos cujo comportamento passam a controlar, dizemos que são auto-regras. Elas podem ser explícitas (públicas) ou encobertas (pensamentos). Os reforçadores naturais e arbitrários podem ainda fortalecer as auto- regras, dessa forma, não é só o comportamento de seguir regras que é reforçado, mas também o próprio comportamento de seguir regras. A formulação de auto-regras pode ser um problema quando as regras são inadequadas ou quando elas causam sofrimento ao indivíduo, podendo ainda impossibilitar que o sujeito esteja sensível a novas contingências favoráveis. Neste caso será necessária a ajuda profissional de um terapeuta. Conforme BATISTA, Marcia e RIBEIRO, Michela apud (Martinez e Ribes, 1996): o comportamento controlado por regras pode ser insensível às contingências quando há uma história de reforços sociais para o seu surgimento. O surgimento de regras indiscriminadamente pode assumir um caráter negativo, impedindo as pessoas de entrarem em contato com os reforçadores disponíveis no ambiente natural, por apresentarem resistência às mudanças nas contingências. 2. Déficit de Habilidades Sociais Segundo o Behaviorismo Radical todo comportamento é selecionado por contingências, no entanto alguns comportamentos causam sofrimento às pessoas que o emitem ou àquelas que estão a sua volta, desta forma, o papel do analista é descobrir junto com seu cliente, as contingências que mantêm sua queixa, mudar essas contingências nas relações do comportamento do cliente com o ambiente, de forma a minimizar seu sofrimento. Segundo ALVES, Jéssica Cirqueira e BUENO, Gina Nolêlo apud (Del Prette e Del Prette, 1999/2005): “...o indivíduo também necessita aprender novas habilidades, a fim de adaptar-se socialmente. Para ALVES, Jéssica Cirqueira e BUENO, Gina Nolêlo apud (Del Prette e Del Prette, 1999/2005): “Habilidades Sociais são as potencialidades de todo ser humano, que podem ser plenamente desenvolvidas a fim de proporcionar a adaptação social do individuo. Baixos níveis de habilidades sociais podem ser proporcionados por vários fatores que contribuem para sua aquisição, como a falta de oportunidades geradas pela baixa condição sócio-econômica, inteligência rebaixada, dificuldade para resolver problemas, inadequação nas relações familiares, tanto pelo excesso (agressão) quanto pela falta (apatia) nas práticas parentais, favorecendo o aprender, o submeter ou o punir e o obedecer”. De acordo com BATISTA, Marcia e RIBEIRO, Michela apud (Del Prett e Del Prett, 2005): as falhas na aprendizagem de comportamentos sociais adequados estão diretamente relacionados a um ambiente punitivo: os pais quando agressivos se tornam modelos inadequados de comportamentos sociais. A falta e\ou a deficiência de habilidades sociais podem ocasionar padrões de comportamento socialmente inadequados, tais como a esquiva (ficar calado, sair da situação para evitar um confronto interpessoal, entre outros) ou agressividade (adotar comportamentos que não consideram os sentimentos e necessidades do outro, reagir de maneira hostil, depreciar etc.). Esses padrões acabam prejudicando a qualidade da interação, favorecendo os conflitos sociais. De acordo com Matos (1997), as carências de habilidades sociais provocam dificuldades em situações interpessoais, tais como estabelecer novas amizades, aceitar críticas, lidar com provocações, pedir ajuda, resistir à pressão dos pares, entre outras. A capacidade de interagir socialmente é fundamental para o idoso, a fim de que ele possa conquistar e manter as redes de apoio social e garantir maior qualidade de vida. Gray, Ventis e Hayslip (1992) verificaram que asatisfação de vida é influenciada pelo modo como as pessoas se sentem sobre os seus relacionamentos interpessoais e que o apoio social desempenha um papel importante nesse processo. Para BATISTA, Marcia e RIBEIRO, Michela apud (Beckert, 2002): “O terapeuta também pode treinar o cliente para desenvolver o repertório de formular auto-regras adequadas através da modelagem de descrições feitas pelo próprio cliente que correspondem às contingências que ele está exposto... Dessa maneira, para que o cliente formule auto-regras de maneira apropriada o terapeuta deve indicar a correspondência entre o que o cliente diz e o que ele faz, para que o dizer do cliente exerça a função de auto-regra”. Para RIBEIRO, Angeluci e BUENO, Gina apud (Del Prett, Del Prett e Barreto, 2006): estudos como os de Del Prett (1999/2001), Caballo (2002/2003), Bandeira e Quaglia (2006) demonstram que os déficits das habilidades sociais podem ser substituídas por repertórios assertivos, através de programas dirigidos de Treinamento de Habilidades Sociais – THS. 2.2 Assertividade A postura assertiva é uma virtude, pois se mantém no justo meio-termo entre dois extremos inadequados, um por excesso (agressão), outro por falta (submissão). Ser assertivo é dizer "sim" e "não" quando for preciso, e da forma mais adequada. As pessoas aprendem a ser assertivas e não assertivas através das experiências ao longo de sua vida. Logo, serem assertivas torna-se essencial para a melhor qualidade de vida. De acordo com BATISTA, Marcia e RIBEIRO, Michela apud (GUILHARDI, 2002); aponta, entretanto para a possibilidade de o cliente apresentar resistência às mudanças. Nesse sentido, o autor resalta que o terapeuta deve estar atento às diferenças históricas de contato com contingências de reforçamento que produzem diferentes padrões de comportamento do cliente. Essa análise permitirá entender a resistência às mudanças (insensibilidade às contingências) buscando as variáveis ambientais das quais ela é função: (a) a punição, que produz reações emocionais e diminuição da variabilidade comportamental; (b) o reforçamento negativo, que gera comportamento de fuga/esquiva; (c) o reforçamento positivo muito frequente, que interfere na tolerância à frustração e pode possibilitar a ocorrência de extinção de comportamentos muito facilmente; (d) o reforçamento positivo muito infrequente, que aumenta a tolerância a frustração e impede o engajamento do cliente em um processo de mudança comportamental que altere as condições aversivas sob as quais vive; (e) o reforçamento positivo não contingente, que dificulta ao cliente estabelecer relações entre o seu próprio comportamento e as relações do ambiente que o cerca. Se o comportamento governado por regras e auto-regras pode ser insensível às contingências em vários aspectos, então as mudanças a serem trabalhadas com os clientes, devem ser preferencialmente modeladas pelas contingências. 3. Descrição do Caso: A cliente é uma senhora de 60 anos, que chamaremos de S. Ela procurou ajuda terapêutica por indicação do psiquiatra com quem faz acompanhamento e lhe receitou remédio para dormir e reduzir sua ansiedade que se iniciou depois que ela começou a desconfiar que o neto fosse homossexual. No decorrer da terapia foram observados os seguintes repertórios comportamentais: controle por regras e auto-regras (onde entram os conflitos religiosos e falta de controle sobre sua vida) e déficit de habilidades sociais ora apresentando padrões passivos de comportamento, ora apresentando padrões agressivos (onde entram os conflitos familiares, solidão e dificuldade em exercer papel de ouvinte nas suas relações sociais, não estabelecendo um episódio verbal total). Apesar de S ter procurado a terapia por conta do neto, observou-se que ao longo das sessões, sua queixa transformou-se em desabafo por diversos motivos, principalmente por suas relações conflitivas com seus familiares, especialmente os filhos. No momento, esta tem sido as demandas trazidas para as sessões que mais a angustiam. Atualmente ela mora de aluguel com este neto e uma neta em um prédio familiar, onde uma irmã mora no apartamento de baixo e uma sobrinha mora no apartamento de cima. Ao longo da terapia foram identificados alguns comportamentos clinicamente relevantes (CRB1) nos quais foram realizadas intervenções aproveitando algumas reservas comportamentais ou repertórios comportamentais adequados, como por exemplo: apesar da resistência durante a sessão, procurava refletir em casa sobre nossas intervenções, além de ser comprometida com a terapia e procurar cumprir com os combinados. Também foram observados alguns CRB2, como a melhora na escuta, sua iniciativa em procurar a dança e a ginástica, redução da queixa inicial (sobre o neto), percepção sobre seus conflitos familiares e desejo de mudança. 3.1. Análises 3.1.1 Queixa Inicial A cliente procurou o serviço de psicologia dizendo que estava sofrendo a mais ou menos um ano com a desconfiança de que seu neto, hoje com 15 anos seria homossexual. A desconfiança começou no dia das mães do ano passado, depois que sua ex-nora, mãe do neto que ela cria lhe contou que seu filho havia se queixado que S o vivia chamando de viado. S conta que seu filho engravidou a mãe de seu neto quando eles ainda eram adolescentes, mas que nunca chegaram a morar juntos. Como ela já tinha outro filho e tinha dificuldades de criar seu neto, seu atual marido na época sugeriu que S pedisse a mãe de seu neto para criá-lo. A mãe do menino concordou e S cuida no neto desde que ele tinha 1 ano e meio. Desde então, a mãe do menino pouco o procura, mas S sempre pede que o menino vá visitar a mãe e que passe os finais de semana com ela. S se contradiz ao contar que apenas uma vez disse ao rapaz, que ele não precisava usar luvas para arrumar o guarda-roupa, que isso era coisa de maricas, no entanto ela afirma que não o teria chamando de viado. Desde então S sofre com a “calúnia” e passou a juntar os fatos e a observar o comportamento do neto que confirmariam essa suspeita, como por exemplo: No dia em que ela estava com o neto numa festa na casa de sua irmã e ele ficou agoniado querendo ir embora mais cedo. Ela desconfiou que seria para encontrar com um homem em sua casa. Ele foi na frente e quando terminou a festa ela foi embora. Ao chegar no prédio, como o apto. fica no 1ºandar, ela viu a cabeça dele na janela, e ao interfonar ela o viu sair da janela, mas achou que o portão abriu muito rápido, que não havia dado tempo dele chegar até o interfone que ficava na cozinha, e por esse motivo ela acredita que tinha alguém em sua casa, provavelmente o homem com que ele estaria tendo um caso, e este homem abriu a porta. Em outra situação, ao limpar a cabeceira da cama notou uma mancha na parede já seca, que ela acredita que seja esperma de outro homem. Perguntei se não seria mancha de creme de cabelo ou outra coisa, mas ela afirma que era esperma. Ao ser questionada se não seria do seu neto, ela me responde que “o pinto dele é muito pequeno” (Sic) e que “ele não conseguiria de masturbar, só se fosse com dois dedos” (diz ela com ar de deboche); Ela também relata que encontrou cuecas dele “enroladas como charutinho e manchadas com água sanitária” (Sic). Neste momento ela levanta e o imita tirando a cueca com as pernas juntas, mas ao ser questionada se ela o viu tirando a roupa, ela diz que não, que apenas encontrou a cueca embolada e imaginou que ele a teria tirado daquele jeito, porque até então ela encontrava as cuecas mas elas não ficavam emboladas. Sobre as manchas de água sanitária ela acredita que eram por ele ter tentado esconder as manchas e odor de fezes.Ao ser questionada do porque fezes e não esperma ela me responde que o esperma seria mais fácil de lavar e não precisaria ele usar água sanitária para esconder o odor. Em alguns momentos diz ter medo que o neto esteja sendo abusado ou influenciado por alguém, em outros diz que já observou ele olhando o chamando outro rapaz para conservar e que uma vizinha gosta dele, mas ele não se interessa por ela. Ao mesmo tempo em que ela sofre com isso, parece que usa este assunto para justificar sua procura pela terapia, para não admitir que o problema estivesse nela e não no neto. Além disso, não há nada que confirme efetivamente esta suspeita. O que chama a atenção é o fato dela investigar o neto e tentar a todo custo achar provas para a sua suspeita. O que precisamos investigar é o que a leva a fazer isso? Ela chora e sofre muito ao falar neste assunto. Diz ter medo que o neto sofra, mas na verdade tem medo do que os outros, principalmente os pais do menino, vão dizer dela se suas suspeitas se confirmarem. Também temia que o neto estivesse sendo abusado. Quando conversou sobre sua suspeita com os pais do menino, eles disseram que ela estava jogando palavras de maldição contra o filho, o que a deixou muito magoada. O repertório comportamental de investigar o neto seria para descobrir se suas suspeitas se confirmavam. 3.2 Controle por regras e auto-regras A cliente apresenta diversas auto-regras: acredita que não pode ter um neto homossexual porque os outros irão falar; fala que criou seu neto para que ele fosse seu companheiro e agora cobra isso dele, diz que queria que o neto lhe fizesse companhia, diz que quando ele era pequeno era diferente e ela o criou achando que ele seria seu companheiro e agora ele não é. Quando vai para a aula de dança e o professor a tira para dançar tem medo do que os outros vão falar por estar com um homem. Também não pode ser vista com um amigo casado no mercado, pois se alguém os vir podem falar. Tem por medo de errar na dança, que os outros a critiquem e isso lhe incomoda. Diz que não pode ser vista nas aulas de dança ou ginástica por serem “coisas do mundo” e sua religião não permite. Ela cria auto-regras para sua vida e se baseia nela para conduzir o seu comportamento. Presa as auto regras ela fica insensível às contingências. Sente-se presa, gostaria de se libertar. Sente-se mais segura ao seguir as regras. Provavelmente as regras foram desenvolvidas na sua educação religiosa imposta pela família e mantém este repertório por estar insensível a outras contingências ambientais, ficando resistente às mudanças. A sua religião é evangélica – batista. Ela fala sobre as regras morais que sua família lhe ensinou, e como ela internalizou isso, seguindo estas regras para não fazer nada de errado, diz que a religião ajudou neste sentido, mas não concorda com algumas coisas e ainda assim sente-se culpada por não fazer o que a religião determina. A religião diz que ela não pode cantar “músicas do mundo”, só pode se for da igreja, ou que não pode falar com os “impuros”, pessoas de outra religião, mas ela não concorda e faz isso escondido, assim como ir para as aulas de dança e ginástica, mas vive com medo que alguém da religião a veja. Também diz que se sente culpada por estar tirando o dinheiro de transporte que deveria ir à igreja para ir para a dança, apresentando tato distorcido, uma vez que sai para a terapia de carro e esconde isso. O que é preciso descobrir é qual a função desta mentira na sua vida? Existe uma hipótese de que ela poderia estar querendo se vitimizar para sensibilizar o terapeuta e talvez o mesmo ocorra com as outras pessoas do seu convívio. S criou muitas auto-regras devido sua educação religiosa, o que hoje a impede de estar sensível a outras contingências, isso faz com que ela se limite às regras já internalizadas e sinta-se culpada por não acreditar mais nelas. Sente-se culpada e acha sua religião limitadora, isso faz com que ela faça as coisas escondido de seus familiares, que poderiam repreendê-la. Provavelmente este repertório foi desenvolvido pela educação rígida a que foi submetida por sua mãe “ não pode, não pode,...” (sic). O repertório é mantido devido a sua crença de que precisa de uma pessoa mais esclarecida, como um pastor, para orientá-la, mas devido a sua necessidade de liberdade tem conseguido fazer coisas que desejava como a dança, a ginástica e a terapia, que também foram reforçadores para ela na medida em que melhoraram sua qualidade de vida. 4. Déficit de Habilidades Sociais Relata várias situações de conflito com seus filhos, irmãs, netos, sobrinhos, genros e noras. Conta que seu filho, o pai de seu neto vai se casar, mas a mulher está grávida de outro homem e ainda assim ele assumiu o filho, porém ela não aceita isso e por este motivo vive brigando com o filho e com a nora. Diz que ele está fazendo o curso de teologia para ser pastor evangélico e ela acha que a mulher não tem perfil para ser esposa de um pastor, que a mesma se verte de forma indecente, com decotes, e que o próprio filho havia comentado isso. Ele também lhe contou que a mulher havia falsificado sua assinatura para comprar R$ 2.000,00 de móveis no consorcio. Ela acha que o casamento não vai dar certo, que o filho vai sofrer. Diz que a filha havia lhe dito que ela tinha sido uma mãe ausente. Ela ficou muito ofendida com esta afirmação e diz que a filha não tem razão de fazer esse comentário, pois apesar de gostar de festas ela pouco saía e quando fazia isso deixava seus filhos com pessoas responsáveis e não se demorava. Relata que antes de morar na quitinete em que mora hoje, uma irmã (filha de seu padrasto) ofereceu sua casa em Aracaju para lhe ajudar. Esta chegou a ir morar com esta irmã, mas voltou depois que uma amiga desta irmã comentou que ela não gostava de receber visitas. S então decidiu voltar para Salvador sem contar o ocorrido para sua irmã. Ainda lá ela perguntou a esta irmã se ela ia colocar internet porque seu neto havia levado o computador. A irmã respondeu que se fosse colocar seria um modem. S achou que era ruindade da irmã (Sic) já que esta tem melhores condições financeiras e poderia pagar a internet para o neto também. Conta do ocorrido da casa de outro filho em que ela sempre ia visitar e acabava ajudando a nora na arrumação da casa. Certo dia sua filha a chamou para ir à praia e S foi deixando de ajudar a nora. Achou que a nora ficou chateada. Em outro momento em que estava na casa deste mesmo filho este lhe disse que tinha que sair e ela achou que ele a estava mandando embora para fechar a casa e achou que talvez fosse por ela não ter ido ajudar sua esposa no outro dia. Em outro momento foi ao AABB com a irmã de Aracaju. Quando chegou na casa de outra irmã, esta perguntou se S havia trazido doces da festa porque não havia conseguido trazer homens. S ficou muito aborrecida com o comentário da irmã, e do fato da irmã pensar isso dela. Atualmente S mora com o neto de aluguel em um prédio familiar. Em cima mora sua sobrinha (filha de uma irmã dela). Na casa da sobrinha funciona um distribuidor de quentinhas, onde S começou indo ajudá-los na cozinha para ter uma ocupação e agora recebia por seu trabalho. S se aborreceu com o marido desta sobrinha, pois segundo ela, ele esquecia de ligar o freezer e depois a culparia se perdessem os alimentos, então ela pediu para sair de lá. Também conta que se aborreceu com sua irmã que mora na casa de baixo. O motivo do aborrecimento foi porque o marido desta irmã acusou seu neto de ter derramado café na sua cama. S conta que perguntou ao neto e ele negou. Ela também não acredita que o neto faria isso. Também ficou chateada pela forma comoa irmã falou com ela a gritando nas escadarias do prédio. Alem deste ocorrido houve outro, quando o celular de S sumiu e depois sua irmã o encontrou numa cadeira na porta de casa. Depois esta irmã acusou S de ter deixado e celular lá e ter desconfiado de seu filho. S acredita que não deixou o celular na porta de casa porque do contrário alguém que passasse já o teria levado e que provavelmente quem o pegou foi o filho de sua irmã a quem S chama de ladrão. Por estes dois ocorridos S diz estar tão aborrecida, e que deseja se mudar de lá. Relata que o filho (pai do neto que ela cria) a chamou para o aniversário da neta e que ela não queria ir, o filho achou que era por causa de sua esposa, mas ela diz que era por outro motivo, me conta que está sem dinheiro para comprar um presente bom para a neta que é cheia de besteiras (Sic). Mas ficou chateada pelo fato do filho achar que era por causa de sua esposa, sendo assim ela que não queria ir acabou fazendo questão de ir para o aniversário e no final falou para o filho: “Está vendo que não é por causa dela, é muito fácil, é só vim e ignorá-la!”. Em outra situação conta que foi à casa do filho de Aracaju, pois iria dormir aquela semana com a neta, chegando lá descobriu que a neta estava sem almoço e iria comer cachorro-quente. Reclama que a nora não faz nada, não cuidava da casa, da filha, nem do marido. Reclama que o filho é um abestalhado por fazer tudo em casa. Contou que seu filho está dando todo o seu salário para a esposa sustentar a loja que não vende nada e por isso sua neta está almoçando cachorro quente. Diz sentir nojo do tratamento que as filhas dão aos maridos, fazendo tudo por eles. Diz que a filha que se operou e ficou chateada por ela não ter ligado. A filha cobrou a atenção dela e lhe disse que se fosse seu neto ela não teria feito isso. S não pareceu se importar com a filha, apenas não gostou da cobrança. Disse que não ligou porque havia viajado no dia dos pais com um amigo. Conta que não gosta do neto, filho desta filha que se operou, que ele é influenciado pelo pai e que no dia do aniversário dele que foi comemorado na escola S foi levá-lo, e depois ele contou para a mãe que S não havia ficado na escola, que ela tinha ido embora. S disse que depois dos parabéns ela ficou na escola esperando ele para ir embora e que ele sabia disso, mas mentiu para a mãe por não gostar dela. O que mais a magoou foi que sua filha acreditou no filho e não nela que é sua mãe, ainda dizendo que ia ao colégio para perguntar a professora se ela tinha ficado lá ou não. Também contou que este neto quando era menor lhe disse que ele não queria que ela usasse o banheiro dele e que recentemente ele lhe disse que o banheiro dele estava sujo para que ela não o usasse. Ela acha que ele tem nojo dela, mas que não tem motivo, pois ela sempre deixa o banheiro limpo quando sai, mas segundo ela isso é por influência do pai. Conta que casou-se com 15 anos porque estava grávida de um rapaz de 21 anos com quem só dormiu por influência de algumas colegas. Logo depois ela acabou perdendo o bebê e acabou se separando deste homem porque o pegou mostrando o pênis para as meninas que passavam pela rua e desconfia que ele se masturbava para as moças. Contou aos seus sogros e voltou para casa de sua mãe em Salvador. Ao chegar, decidiu estudar o curso técnico de Enfermagem por influência de uma colega. Aos 19 anos casou com outro homem de 34 anos com quem teve 5 filhos e descobriu o que era o prazer sexual, coisa que nunca havia sentido com o outro. Seu ex-marido também era mulherengo, ela observava ele paquerando as mulheres na rua, que certa vez ele não deixou a empregada folgar para ir à paia no domingo, e depois que eles e os filhos voltaram da praia a empregada finalmente foi à paia e ele foi atrás dela. Em outra situação quando ela estava parida dos gêmeos me filho mais velho que ainda era pequeno pediu água, quando ela disse que ia pegar água para ele e levantou, viu seu marido saindo de um quarto em que estava sua sobrinha com pressa com as mãos no pênis e deixando a sandália lá de tão apressado para que ela não visse o que ele fazia, depois sentou-se no sofá. Ela diz que nunca falou nada, fingiu que não tinha percebido. Depois que ele faleceu se relacionou 5 anos com outro homem de quem se separou por ser muito mulherengo e depois teve o ultimo relacionamento por 3 anos com um homem com que ela terminou por achar que ele queria se aproveitar financeiramente dela. Ele pedia cheques para comprar material para vender churrasco, mas depois que ele começou a ganhar algum dinheiro ela achou que ele não deveria mais pedir seus cheques. Além disso, ela não gostava do linguajar vulgar com que ele tentava educar seu neto. Conta que ele dizia: “Vá lavar o cú”, dentre outros que ela não gostava. Ele também não a acompanhava quando ela queria ir a alguma festa e ela passou a ir sozinha de propósito para que ele terminasse com ela, o que acabou acontecendo. Hoje este homem tem outra mulher e mora próximo dela, mas ele ainda mantém contato. Sempre que ela precisa de algum dinheiro liga para ele, mas percebe que ele quer algo a mais. Diz que ele coloca crédito no seu celular todo dia 19, que a chama para ir ao médio ou banco com ele e ela vai, pois também tem interesses de que ele a ajude quando ela precisar. Hoje diz que não consegue acreditar que tem 60 anos, que não se sente com esta idade, nem consegue se vestir como uma senhora com roupas muito fechadas, mas que apesar disso os homens só querem mulheres mais jovens, mesmo que elas só queiram o dinheiro deles, e ela já está com a pele resecada e flácida. Não vê a possibilidade de tem mais um companheiro. Também comenta que um ex-namorado e atual amigo casado parece estar interessado nela, mas ele não vai lhe agregar em nada, não tem nada a lhe oferecer, nem dinheiro nem sexo. S não pensa nele como um possível companheiro quando o neto for adulto. Teme que além dele não agregar nada a ela (Sic), que ele fique doente e ela tenha que cuidar dele. Apesar de ter trabalhado 35 anos no Hospital Couto Maia nunca fez amizades. Hoje faz a faculdade da terceira idade, mas também não tem amizades, e nem serviria, pois a companhia que quer é a de alguém para dançar, para ir às festas com ela (Sic). Foi observada que ela apresenta dificuldades em fazer amizades, apesar de não trazer isso como queixa, mas queixa-se de solidão e teme o período de férias em que terá recesso da terapia, da dança, da faculdade e da ginástica. Vê a terapia como um local onde pode conversar e ser escutada, pois ninguém a escuta, nem os filhos ou netos. S apresenta “dificuldade em exercer papel de ouvinte” nas suas relações sociais, não estabelecendo um episódio verbal total. Sempre começa a sessão como um desabafo. É uma pessoa carente e solitária e tem a terapia como um lugar onde ela tem alguém com quem conversar e desabafar. Tem falado atropelando nossa fala, e parece estar só esperando nós terminarmos para falar, como se o que estivéssemos falando não fosse importante. Além disso, quando é feita alguma intervenção ela justifica-se exageradamente, ficando sempre na defensiva, como se tivesse medo do que pensaríamos a seu respeito, resistindo as nossas intervenções. Os filhos acham que ela entende tudo errado, mas ela não concorda. Os conflitos devem-se a auto-regra de que ela está sempre certa, e isso acaba fazendo com que ela seja menos assertiva e tenha uma capacidade de habilidades sociais reduzida. Ela acredita que o problema com os filhos começou depois que eles se casaram, mesmo que acabe demonstrando em alguns relatos que seus filhos se queixam de algumas atitudes dela quando eles ainda eramcrianças, como a saída com alguns namorados, deixando-os em casa. Apesar de demonstrar claramente que sofre com isso, ela não admite, fazendo com que tenha uma maior resistência com as intervenções na terapia e que sua relação com os filhos continue sendo prejudicada. S está apresentando o CRB1 (Comportamento Clinicamente Relevante), onde provavelmente ela está apresentando em sessão como se comporta lá fora. Provavelmente essa sua falta de escuta faz com que os outras sintam-se enfadados em conversar com ela, e já não se importem mais com sua vitimização, levando-a a solidão. 4.1 Relação disfuncional entre dinheiro e afeto. S é enfermeira aposentada e havia comprado um apartamento, mas seu salário foi reduzido e seu filho assumiu a dívida para que ela não perdesse o apartamento. Hoje ela destina boa parte de sua renda mensal a pagar a este filho e alugou o apartamento para morar em uma quitinete alugado nos fundos da casa de sua irmã. Conta que só foi morar lá depois que seu salário reduziu e ela teve que alugar seu apartamento. Apresenta problemas com o inquilino que vive devendo o condomínio ou atrasando o aluguel. Fala da filha que se operou que antes ela era diferente, que cuidava mais dela, lhe dava presentes, e hoje só quer saber do marido e do filho. S diz sentir nojo do tratamento que a filha dá ao marido. Relata que o amigo casado (ex-namorado) a chamou para viajar no dia dos pais e na volta comentou que estava com R$ 700,00. Ela lembra que ele ao levá-la ao mercado não se demorou para que ela não quisesse comprar nada, depois fala que ele foi interesseiro, que só a chama para acompanhá-lo para ir ao médico ou ao banco, mas que nem comprou um presente para ela na viagem. Durante a terapia S cita uma situação em que falou para os filhos que gostaria de ser adotada, quando na verdade queria uma ajuda financeira deles. (mando disfarçado). Acha que as pessoas só gostam dela se agradá-la com presentes ou dinheiro. Sente-se abandonada pelos filhos e acha que se não pode ter o afeto deles, que ao menos eles poderiam lhe dar alguma ajuda financeira. Isso acaba fazendo com que ela acabe se afastando ainda mais dos filhos e das outras pessoas. 5. Intervenções Feitas 5.1 Queixa Inicial Seu discurso é confuso e apesar de falar muito de si, sempre traz a questão do neto como fuga/esquiva, devido a isso, inicialmente sentimos dificuldade em fazer pontuações, visto que ela parecia não entender o objetivo da terapia, usando-a apenas como desabafo, não se permitindo escutar. Para que ela saísse do foco da queixa do neto e percebesse o objetivo da terapia, foram necessárias algumas intervenções. Digo como me sinto e que gostaria de ajudá-la, mas ela não permite. Que percebo que além da questão do neto acredito que ela tenha procurado terapia por outros motivos que também a fazem sofrer, e que talvez ela tenha continuado a vir para a terapia por isso, mas ela nega e volta a falar do neto. Foram precisas várias intervenções para que ela admitisse que não foi só o problema do neto que a trouxe a terapia, e que ela entendesse que não podia mudar o outros, mas poderia se modificar, mudar sua forma de ver o mundo para assim reduzir seu sofrimento. Ela fala que se sente bem quando vem para a terapia, pois pode desabafar com alguém que não vai julgá-la nem contar para outras pessoas. Explico que a terapia tem outros objetivos além deste. Que as pessoas geralmente nos procuram dente outros motivos por conflitos nas suas relações sociais, mas que apesar de não percebermos, muitas vezes temos participação nestes conflitos, nem sempre é só o outro o único responsável e a terapia ajuda a ver as coisas com outros olhos, reduzindo assim o sofrimento e os conflitos. Para ajudá-la a pensar, foi passada uma atividade para casa onde ela deveria pensar no que ela gostaria de mudar nela. Na sessão seguinte ela responde que gostaria de não ter medo do que os outros vão pensar e conta que quando vai para a aula de dança e o professor a tira para dançar ou quando ela sai com um amigo, tem medo do que os outros vão falar por estar com homens. Também tem medo de errar na dança, teme que os outros a critiquem e isso a incomoda. Lembro que na aula as pessoas estão ali para aprender e sendo assim ninguém sabe dançar, assim como ela e provavelmente irão errar os passos, o que é de se esperar já que estão aprendendo. Finalmente ela consegue dizer 3 situações nas quais ela gostaria de mudar: que a religião não fosse mais limitadora; gostaria de não ter medo do que os outros vão pensar; de deixar de assumir algumas responsabilidades que não são suas. Digo que havia ficado preocupada quando ela me disse na semana passada que a terapia servia apenas como desabafo, mas que estava feliz por ver que ela entendeu que não é só isso, que a terapia pode ajudá-la a mudar se algo lhe incomoda, porém para isso precisava da ajuda dela e só agora que ela conseguiu dizer o que queria mudar, nós poderíamos ajudá-la. 6. Controle por regras e auto-regras Foram usados questionamentos reflexivos para que a cliente reavaliasse as auto regras: “Diante do que a gente conversou você fica muito presa ao que os outros pensam criando regras para a sua vida, é assim que você se sente? Como é isso pra você?” Também foi dado um feedback onde o terapeuta explicou a cliente o que seriam auto- regras e foram relatadas as regras que ela havia criado: Percebo que a Sra. cria algumas regas para a sua vida como por exemplo, não pode ter um neto homossexual porque os outros irão falar; criou seu neto para que ele fosse seu companheiro e agora cobra isso dele; não pode ir à aula de dança da faculdade da 3ª idade para não deixar meu neto livre para fazer o que ele quer, mesmo sabendo que se ele quiser ele arranjará um meio; não pode ser vista com um amigo no mercado, pois os outros podem falar; não pode sair pra dançar, pois sua religião não permite; procura falhas do inquilino para pedir a casa de volta e mesmo sabendo que no momento não tem como arcar com as despesas, pensa em morar lá. Quando a Sra. fica presa a estas regras fica impossibilitada de vivenciar novas experiências e experimentá-las para ver se gosta ou não (presa as contingências). O que a sra. acha disso? A Sra. fica muito presa ao que os outros pensam, como é isso pra você? Como a sra. se sente por pensar desse jeito? A terapeuta pergunta o que a religião significa pra ela. Ela diz que sente-se presa, mas que consegue fazer o que quer, mesmo que escondida. Também diz que não concorda com algumas coisas da religião. A terapeuta faz uma metáfora contando para ela sobre o Mito da Caverna de Platão e pergunta o que ela acha, ela pergunta se mataram o homem porque acharam que ele estava louco? A terapeuta diz que não, eles o mataram, pois não quereriam aceitar outras verdades, e para que ele não influenciasse os outros. Acredito que ela entendeu a metáfora, mas não conseguiu fazer comentários a respeito. A terapeuta pergunta se ela gostaria de se libertar deste sentimento de culpa, e que a religião não fosse mais limitadora, e ela responde que sim. A terapeuta reforça positivamente sua atitude de ser questionadora e de ter atitude, dizendo que percebe que apesar da culpa ela consegue fazer um filtro do que é certo ou errado de acordo com a sua própria consciência e faz o que quer como a dança e a ginástica, mas ela conta sobre seus medos, sem me ouvi-lo e sem perceber o que consegue fazer. A terapeuta repete 3 vezes se ela já reparou que consegue e finalmente ela fica calada e reflexiva. Depois ela fala de como se sente devido às suas crenças religiosas, que ela não concorda com algumas coisas, como não falar comos impuros (pessoas de outras religiões), não dançar, não cantar as música do mundo, etc. Diz que faz as coisas que quer, como semana passada que foi ao Pelourinho e tinham pessoas bebendo com quem ela não podia se misturar. Ela não concorda porque ninguém estava fazendo nada de errado, estavam quietos no seu canto (Sic), mas ainda assim fica com medo que a vejam e se sente culpada, como se estivesse fazendo algo errado. Fala que não concorda com isso porque Deus é amor, é paz e observa que na reportagem que foi transmitida no Globo Repórter, falando sobre as curas do espiritismo ela percebeu que a senhora não era uma pessoa do mal, pelo contrário, só fazia o bem curando as pessoas e que isso não podia ser errado. Diz que queria comentar isso com a pastora e sua irmã, apesar de saber qual seria a opinião delas, e que o filho vive dizendo que ela não pode adorar a dois Deuses. Ela fala que às vezes se pega fazendo coisas da igreja católica, religião de sua mãe, como falar “Ave Maria!”, ou cantar músicas da igreja católica. O terapeuta diz que na igreja católica ela também encontrará coisas que ela discorda. A terapeuta pergunta qual o Deus certo já que seu filho disse que ela adora mais de um Deus? Ela não sabe responder. A terapeuta diz que existem várias religiões e que Deus não vai descer para nos dizer qual é a certa, em todas as religiões ela irá encontrar coisas que ela concorda e coisas que ela discorda, mas ela pode agir de acordo com a sua consciência filtrando o que é certo e errado, e pergunta por que é tão importante para ela a opinião da pastora e da irmã? Se isso mudaria alguma coisa para ela? Ela diz que não mudaria sua opinião, mas gostaria de ouvi-las, apesar de saber o que elas irão dizer. A terapeuta cobra o exercício sobre a religião e ela disse não ter feito. Pede que ela fiça naquele momento e ela fala sobre o que ela não acredita, mas ainda assim se sente culpada, tem medo do julgamento dos irmãos da igreja caso a vejam fazendo algo que a igreja não permita, e fala sobre o que tem feito para se libertar, que tem ido à ginástica, dança, etc. A terapeuta pergunta o motivo de tanta preocupação com o que eles vão pensar se ela só faz o que acha certo, como cuidar de sua saúde física e mental e sendo assim não está indo de encontro com as suas crenças, mas ela diz que precisa de uma orientação de quem sabe mais que ela como um pastor para orientá-la. 7. Déficit em Habilidades Sociais A terapeuta faz a seguinte intervenção: Fiquei pensando que ao mesmo tempo em que a sra. diz que se preocupa com o que os outros pensam ao seu respeito, em outros momentos não me pareceu preocupada com isso, como em algumas situações relatadas: quando não aceita o relacionamento de seu filho, não queria ir ao casamento dele e não faz questão de esconder isso; não quis ir ao aniversário de sua neta; acabou indo ao aniversário, mas ficou chateada pelo fato de seu filho achar que era por causa de sua esposa dele que a sra. não queria ir, então falou para ele: “Está vendo que não é por causa dela, é muito fácil, é só vim e ignorá-la!”. Ao falar isso não se preocupou com o que ele pensaria a seu respeito; nem quando briga com seus filhos; quando brigou com sua irmã de Aracaju; quando briga com sua outra irmã e com o marido dela; quando briga com o marido de sua sobrinha. Como é isso pra você? Em uma das sessões a senhora, me disse que parece ser a Sra. a problemática. Por quê? Lembro também que a Sra. certa vez me disse que se considerava muito invocada. Acredito que talvez a Sra. esteja fazendo uma leitura errada dos fatos, se precipitando e provocando estes transtornos, o que a Sra. acha? Ela é questionada sobre os motivos dos conflitos com sua família. Observo que às vezes você se preocupa demais, percebo que você se sente na responsabilidade de resolver tudo, mas não é muita coisa pra você? Você caba exercendo um papel que não é o seu. A terapeuta diz que percebe que ela é muito preocupada e que toma toda a responsabilidade para si exercendo papéis que não são o dela. O que ela achava disso? Ela fica pensativa e confirma. A terapeuta tenta dizer que ela sofreria menos se exercesse apenas o seu papel, se ela não gostaria disso? Mas ela diz que sempre foi assim e não tem como mudar. A terapeuta diz que estamos em permanente mudança e isso é possível sim, e passa um exercício para casa: Ela deveria pensar na sua responsabilidade e na dos outros nos conflitos. Na sessão seguinte é conversado sobre a atividade, se ela observou que muitas vezes ela exerce um papel que não é o dela, quando ela se preocupa com a neta e quer assumir o papel dos pais em vez de ser a avó? A responsabilidade do pai e da mãe é diferente da avó você não acha? Sei que você se sente na responsabilidade de resolver a situação, mas é muita coisa pra você não é? Inicialmente a intervenção seria fazer com que ela pergunte as pessoas sobre suas interpretações a respeito do que diziam, pois ela poderia estar fazendo interpretações erradas e isto poderia estar gerando os conflitos, mas depois recuamos desta intervenção, pois com ela especificamente isso pode não funcionar, já que suas suspeitas de que seus filhos a agrediam podem se confirmar, confirmando assim suas auto-regras de que ela era a vítima, assim as intervenções mudaram no sentido de sensibilizá-la de que ela estava sofrendo, para que ela percebesse que precisava mudar. A terapeuta pede que ela reflita sobre os conflitos familiares, mas percebe a sua dificuldade em admitir que ela possa ter alguma responsabilidade. Ela sempre fala que a culpa é dos outros. É pedido então para que ela reflita em casa e traga a resposta na próxima semana, mas ela tem muita dificuldade em encerrar a sessão, fingindo não ter entendido a atividade. A terapeuta explica novamente e ainda assim ela demonstra muita dificuldade, não no entendimento, mas resistência para a realização da atividade. Sobre sua dificuldade em assumir sua responsabilidade nos conflitos, é dito que percebemos que ela tem muita resistência para assumir sua responsabilidade. Nunca teve responsabilidade em nenhum conflito? Conte uma situação. Ela começa a falar de situações em que se aborreceu, mas não cumpre o que foi solicitado. Conta que no domingo foi para a casa do filho e tanto ele como sua nora saíram e a deixaram sozinha, disseram que ela podia sair e bater a porta, ela ficou muito chateada, mas não falou nada. Também conta que o ex-marido não ia pegá-la no trabalho, quando ela chegava o paquerando, ela se aborrecia, mas não falava nada devido à religião. Tentamos esclarecer dizendo que em algumas situações em que ela se aborreceu o outro pode ter tido alguma responsabilidade e ela também, mas gostaríamos de ouvir a dela. Mais uma vez ela conta uma situação sem dizer a responsabilidade dela. Conta que sempre foi de “engolir” as coisas devido à religião, mas agora resolveu falar, porque tem coisas que não consegue aguentar calada, mas nunca briga, só se aborrece. Na última história ela conta que foi com o neto no AABB, e chegando lá em um momento em que eles tinham se levantado da mesa um senhor se sentou e o neto lhe disse que a mesa era deles. Ela conta que ficou muito aborrecida e que reclamou com o neto, dizendo que o senhor poderia sentar-se a mesa junto a eles e que o neto estava errado, e que ele era antissocial. Conta isso como quem quer nos mostrar que o neto estava errado e que ela agiu como uma avó querendo educá-lo, mas ainda não reconhece a sua responsabilidade. Ela já ia contar outra história quando eu a terapeuta a interrompe e pede que ela reflita sobre esta história. Pergunta se o neto ficou chateado com ela, ela diz que sim. Pergunta seela reclamou com ele na frente do senhor e inicialmente ela diz que sim, mas depois ela muda e diz que não, que falou quando eles já estavam no carro, mas admite que ainda estava irritada. Pergunta se poderia ter sido diferente a situação se ela falasse em outro momento e de outra forma com o neto, se ela refletisse antes de falar e falasse sem raiva, apenas para orientá-lo e faz uma demonstração: “Meu filho, não precisava você falar assim como o senhor, eu fiquei envergonhada, a mesa é coletiva e não há mal nenhum que ele sente conosco.” Depois pergunta: se ela tivesse falado deste jeito, ele teria ficado chateado? Ela demora para responder, fica pensativa e depois responde que ele não teria ficado chateado se ela falasse desta forma, mas ainda se recusa a admitir dizendo que só falou assim porque estava aborrecida com o que ele fez, jogando a responsabilidade para o neto. Ela pergunta se nós estamos dizendo que ela é culpada. A terapeuta diz que ele teve a sua parcela de responsabilidade, mas ela também teve uma vez que poderia ter evitado o conflito com o neto. Diz ainda que não é só ela que vive conflitos, todos nós vivemos. Algumas vezes alguém nos aborrece, outras vezes aborrecemos alguém e depois fazendo reflexões percebemos que o outro poderia ter feito diferente, ou percebemos que nós poderíamos ter feito diferente, mas não podemos mudar as atitudes dos outros, só as nossas e é isso que queríamos que ela entendesse. A terapeuta conta um caso que aconteceu com ela em que um vizinho colocava o carro em frente a sua garagem e que ela se aborrecia, mas resolveu sempre atrapalhar o descanso dele para que o mesmo tirasse o carro de lá, até que para não ser incomodado ele deixou de colocar o carro ali. Complementa dizendo que poderia ter agido diferente e ter gerado um conflito, como ter brigado com o vizinho ou ter furado os pneus dele, mas devido à forma como ela reagiu não houve conflito. Diz ainda que não queremos que ela “engula” as coisas, apenas tente controlar a sua raiva e só fale depois de ter refletido sobre como ela pode desabafar sem que isso gere uma briga. Por fim, para fixar as reflexões feitas nesta sessão, pedimos para ela pensar em casa na responsabilidade dela e na dos outros nos demais conflitos que ela já me relatou até hoje e o que ela poderia ter feito de diferente para evitá-los. Ela também demonstra sentir falta de reforçadores (lazer) e diz isso claramente. A intervenção girou em torno de investigar se são as auto regras que prejudicam o desenvolvimento das relações sociais saudáveis ou se é a falta de repertório (ela não sabe como fazer). Em uma das sessões dissemos perceber que ela sentia falta de ter mais lazer. O que a Sra. pensa a esse respeito? O que gosta de fazer? A religião é um impeditivo para dançar? Para o que mais de lazer? Por quê? Ela foi incentivada a procurar cursos do seu interesse. Também foi sugerido que ela se expusesse mais para desenvolver repertório social. Com relação a amizades, o que a Sra. pensa sobre isso? Gostaria de fazer amigos? Porque não fez no trabalho e na faculdade? O que a impede? Peço que ela me fale de opções de lazer que lhe agradem e ela fala de viajar. S também diz que depois da terapia começou a fazer dança de salão na UNEB e ginástica, mas esconde isso da família que iria recriminá-la pela religião. Ela demonstra sentir-se perdida no que vai fazer durante as férias de fim de ano da faculdade, da dança, da ginástica e da terapia. Foram dadas sugestões diretas para que ela convidasse colegas dos cursos para sair, ir à praia, ao cinema ou a sua casa para “jogar conversa fora”. S está apresentando o CRB1 (Comportamento Clinicamente Relevante), onde ela apresenta em sessão como se comporta lá fora. As terapeutas precisam estar atentas a isso para pontuar no momento em que o comportamento ocorre. As terapeutas sentem- se cansada por ela falar muito, sempre a cortando ou desviando o assunto, ou ainda quando ela se justificava demais. Foi necessário, como intervenção, que as terapeutas dissessem os seus sentimentos para ela, pois talvez outras pessoas de seu convívio sintam- se do mesmo jeito. Foi lhe dado um feedback : Percebemos nesta sessão assim como em outras que a Sra. tem falado atropelando nossa fala, que parece estar só esperando nós terminarmos para falar, como se o que estivéssemos falando não fosse importante. Não estamos nos sentindo ouvidas. Isso acontece com outras pessoas lá fora? Ela diz que não, fica sem graça, segura a boca com a mão enquanto escuta e depois se justifica. Ao final ela é questionada sobre seu sentimento ao receber este feedback. Como foi pra você ouvir tudo aquilo? É solicitado que ela pense sobre isso e conversaremos mais na próxima sessão. As terapeutas perguntam se ela pensou no que conversaram, e ela fala que sim, que percebeu que atropela a fala dos outros. Pergunto se isso acontece lá fora e ela diz que sim. Pergunto se já fizeram isso com ela, ela conta que recentemente o filho não deu importância ao que ela falava e a cortou dando a sua opinião. Pergunta como ela se sentiu, ela diz que sentiu que ele não estava se importando com ela, que não estava prestando a atenção ao que ela dizia. A terapeuta diz que se sentia da mesma forma e ficava preocupada, pois precisava que ela a escutasse e refletisse sobre o que ela lhe dizia para que a terapia surtisse efeito. Depois desta pontuação a sessão transcorre normalmente, ao final a terapeuta pergunta se ela percebeu alguma mudança naquela sessão sobre a sua escuta, ela diz que ainda é muito cedo pra falar, mas que procurou se controlar. A terapeuta diz que percebeu isso e que esta evolução deve ser estendida para a vida dela lá fora, pois a falta de escuta pode atrapalhá-la nas suas relações sociais. Fala ainda que algumas coisas nós percebemos em nós mesmos, mas outras coisas é preciso do outro como espelho para nos mostrar o que precisamos melhorar. Na terapia analítica-comportamental o terapeuta também pode dizer como me sentiu: Foi difícil para mim falar o que observei pela forma como você reagiu, sempre se justificando. Você costuma fazer isso? Parecia estar neste momento repetindo a sua preocupação com o que os outros vão pensar a seu respeito, foi por isso que você se justificava? Percebo que você se justifica demais, como se estivesse repetindo comigo a preocupação do que vão pensar a seu respeito, é isso mesmo? Nas sessões seguintes, quando o comportamento retornava ou ela mudava de assunto, era perguntado: Está sendo difícil pra você ouvir isso de mim? Sei que é difícil, mas eu preciso falar. 7. Relação disfuncional entre dinheiro e afeto Diz que se sente culpada por estar tirando o dinheiro de transporte que deveria ir à igreja para ir para a dança. As terapeutas observam que ela sempre vem para a consulta de carro, apesar de sempre dizer que passa por dificuldades financeiras e que tem que escolher se vai à dança ou à igreja por não ter dinheiro de transporte, além disso, S olha para os lados antes de sair do carro. Quando ela diz que o ex-namorado é interesseiro, a terapeuta pergunta se quando ela o procura porque precisa de dinheiro, se isso também não seria interesse? Ela admite que sim, mas diz que se sente no direito por tudo o que já fez por ele, mas que não é um interesse sexual da parte dela, se referindo a ultima viagem em que ele a procurou para sexo, mas não teve ereção. Pergunto se ela agisse de outra forma, será que ele também não agiria? Ela responde que ele lhe diz isso. 7.1 Resultados 7.1.1 Queixa Inicial Quase não fala mais sobre o neto, diz que antes sentia-se tão magoada que nem o beijava mais, e que isso tem mudado. Ela chegou à conclusãosegundo seus próprios relatos de que se ele demonstrava interesse por rapazes, não estaria sendo abusado, e por não ser mais criança, ele decide quais são as suas escolhas e cabe a ela respeitá-las, mesmo que não as aceite. 7.2 Controle por regras e auto-regras Ainda se justifica, se recusando a admitir e resistindo a reformular suas regras, mas tem procurado se libertar, e já frequenta a dança e a ginástica, coisas que não fazia antes de começar a terapia. Conta que além da dança de salão está fazendo ginástica que ela descobriu que é gratuita na UNEB, e que ela tem gostado muito. Tem se sentido tão bem com a dança e a ginástica que nem tem precisado tomar os remédios para dormir. Antes S achava que a religião não era limitadora, e sim a falta de dinheiro, com a terapia ela percebe que mesmo com dinheiro ele se sente culpada em fazer algumas coisas, e agora vê a religião como limitadora. Essa percepção é uma evolução da terapia. Ela também fala sobre as regras morais que sua família lhe ensinou, e como ela internalizou isso, seguindo estas regras para não fazer nada de errado, fala que a religião ajudou neste sentido, mas não concorda com algumas coisas, mas ainda assim sente-se culpada por não fazer o que a religião determina. 7.3 Déficit de Habilidades Sociais Tem se esforçado para evitar os conflitos, mas ainda tem muita dificuldade com relação a isso. Ainda não consegue admitir que estes conflitos a fazer sofrer, e de que ela precisa mudar sua forma de agir. Apesar de ter tomado a iniciativa de começar a dança e a ginástica, ainda tem dificuldades de fazer novos amigos, tanto que temia o recesso do final de ano. Também percebeu que o neto é adolescente e que não pode depender da companhia dele para sair. Houve uma melhora significativa na habilidade de escuta, ela não atropela mais a fala das terapeutas e tem procurado escutá-las, mesmo não admitindo alguma observação feita durante a sessão, ela procura refletir em casa e traz o retorno na sessão seguinte. 7.4 Relação disfuncional entre dinheiro e afeto As terapeutas decidem não perguntar a ela sobre este tato distorcido, mas entender qual a função dele para a vida dela através de outros relatos. Seria para que os outros tivessem pena dela? (uma hipótese). Quando ela falar sobre isso posso lhe perguntar: “Você faz muitos sacrifícios não é? Isso é constante? Você fala isso para outras pessoas? O que você acha que elas pensam e sentem quando você fala sobre isso?”. Observar como ela reage ao descrever isso. Neste momento ainda não devemos falar sobre os nossos sentimentos (de descaso), quando escutamos estes relatos o que indica que provavelmente os outros devem sentir o mesmo, é preciso primeiro sensibilizá-la de que isso a afasta das outras pessoas. 8. Considerações Finais Estes atendimentos foram realizados com co-terapia, onde 2 terapeutas atendem o mesmo cliente simultaneamente, podendo fazer intervenções segundo seus planejamentos que devem ocorrer em conjunto. Por se tratar de uma clínica-escola onde o terapeuta e o co-terapeuta encontram-se no último semestre, após o recesso de fim de ano, a paciente dará continuidade a terapia com a turma do próximo semestre. É importante ressaltar a dificuldade que as duas terapeutas encontraram em ser empáticas com esta cliente, devido ao seu repertório de falta de escuta e vitimização. Também é importante lembrar a liberdade que a clínica comportamental oferece ao terapeuta de retornar a algum ponto que não ficou claro para ser melhor trabalhado em outra sessão, mas também deve-se ficar atento aos CRB”s apresentados em sessão para fazer a intervenção na medida do possível no momento em que eles ocorrem. Apesar das terapeutas terem tentado fazer com que S fosse mais assertiva, foi encontrada muita resistência, na qual ela nãoadmitia que sofria com os conflitos familiares, nem admitia a possibilidade de que o problema poderia estar na forma como ela agia. Durante as intervenções, sempre se justificava, tentando se vitimizar. A outra alternativa foi fazer com que ela se sensibilizasse de que estava sofrendo e que admitisse que precisava mudar. Fonte: https://psicologado.com/abordagens/comportamental/a-clinica-analitico- comportamental-um-estudo-de-caso-sobre-auto-regras-e-deficit-de-habilidades-sociais © Psicologado.com
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