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Página 1 de 8 DA AÇÃO DE CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO Art. 539. Nos casos previstos em lei, poderá o devedor ou terceiro requerer, com efeito de pagamento, a consignação da quantia ou da coisa devida. § 1º Tratando-se de obrigação em dinheiro, poderá o valor ser depositado em estabelecimento bancário, oficial onde houver, situado no lugar do pagamento, cientificando-se o credor por carta com aviso de recebimento, assinado o prazo de 10 (dez) dias para a manifestação de recusa. § 2º Decorrido o prazo do § 1º, contado do retorno do aviso de recebimento, sem a manifestação de recusa, considerar-se-á o devedor liberado da obrigação, ficando à disposição do credor a quantia depositada. § 3º Ocorrendo a recusa, manifestada por escrito ao estabelecimento bancário, poderá ser proposta, dentro de 1 (um) mês, a ação de consignação, instruindo- se a inicial com a prova do depósito e da recusa. § 4º Não proposta a ação no prazo do § 3º, ficará sem efeito o depósito, podendo levantá-lo o depositante. O pagamento constitui modalidade de extinção das obrigações. Há casos, contudo, em que o devedor não consegue pagar ou obter a respectiva quitação do credor. Para tais casos, “previstos em lei”, concebeu-se a ação de consignação em pagamento, que possibilita ao devedor ou ao terceiro o depósito de determinada quantia ou coisa devida, com efeito de pagamento. Vale lembrar que nosso sistema permite que não só o devedor pague a dívida, mas também terceiros (interessados ou não, conforme se depreende do art. 304 e do seu parágrafo único do CC). Por meio da ação de consignação, o autor (devedor ou terceiro) pretende ver extinta uma determinada obrigação de pagar ou de entrega de coisa. O cumprimento da obrigação dá-se por meio do depósito (a consignação) do valor ou da coisa devida, que equivale ao adimplemento. O autor requer que seu depósito tenha o mesmo efeito liberatório que teria o pagamento. O que extingue (ou não) a dívida é o depósito, a própria consignação. A sentença, nesse contexto, limita-se a declarar se o depósito realizado preenche (ou não) os requisitos legais para considerar extinta a obrigação, daí sua indisfarçável natureza preponderantemente declaratória. As obrigações de fazer (ou de não fazer) ficam, pois, excluídas a priori do âmbito da ação consignatória, pois não se pode depositar tal tipo de obrigação, que, aliás, nem cabe no conceito de “quantia ou de coisa devida”. ■ Hipóteses de cabimento O NCPC preocupa-se com o processo da consignação em pagamento e não propriamente com as situações em que ele é cabível. Tanto assim que o caput refere-se aos “casos previstos em lei” para abrir a via da consignatória. Página 2 de 8 Nesse passo, é imperioso fazer uma rápida incursão no direito material para trazer as hipóteses contidas no art. 335 do Código Civil, que prevê justamente as situações em que “a consignação tem lugar”: “Art. 335 (…) I – se o credor não puder, ou, sem justa causa, recusar receber o pagamento, ou dar quitação na devida forma; II – se o credor não for, nem mandar receber a coisa no lugar, tempo e condição devidos; III – se o credor for incapaz de receber, for desconhecido, declarado ausente, ou residir em lugar incerto ou de acesso perigoso ou difícil; IV – se ocorrer dúvida sobre quem deva legitimamente receber o objeto do pagamento; V – se pender litígio sobre o objeto do pagamento.” Analisando-se o conteúdo do mencionado artigo do Código Civil pode- se dizer que as hipóteses de consignação em pagamento variam entre situações em que há recusa do credor (mora accipiens), previstas nos incisos I e II, e outras em que há incerteza sobre quem deva receber (incognitio), previstas nos incisos III e IV. Feito o esclarecimento a respeito das “hipóteses previstas na lei”, voltam-se os olhos para o processo de consignação. ■ Consignação extrajudicial O § 1º esclarece que, se tratando de obrigação em dinheiro, poderá o devedor ou terceiro optar pelo depósito da quantia devida em estabelecimento bancário oficial no lugar do pagamento, cientificando-se o credor por carta com aviso de recebimento, na qual lhe será conferido o prazo de dez dias para, querendo, manifestar sua recusa. Decorrido tal prazo – que será contado do retorno do aviso de recebimento – sem que haja a manifestação de recusa do credor, o devedor ficará liberado da obrigação e a quantia ficará à disposição do credor (§ 2º). Todo o procedimento a ser observado pela instituição financeira na consignação extrajudicial está disciplinado na Resolução n. 2.814, de 24.01.2001 do BACEN. Essa modalidade extrajudicial de consignação em pagamento somente tem cabimento quando se tratar de obrigação em dinheiro, porquanto processada perante estabelecimento bancário oficial no lugar do pagamento. Ademais, não é obrigatória, tanto assim que o artigo menciona que o devedor ou terceiro pode optar por essa modalidade. Dessa forma, não havendo interesse do devedor (ou do terceiro) pela via extrajudicial, poderá valer-se da ação judicial de consignação em pagamento, diretamente. Uma vez feita a opção pela via extrajudicial, se não houver a recusa expressa, ou seja, diante da anuência ou mesmo do silêncio do credor, a obrigação estará quitada, sem necessidade de uma ação judicial ulterior. Ocorrendo, porém, a Página 3 de 8 recusa – a qual terá que ser manifestada por escrito ao estabelecimento bancário – o devedor (ou o terceiro) poderá propor, dentro de um mês, a ação de consignação, instruindo a inicial com a prova do depósito feito extrajudicialmente e, bem assim, da recusa (§ 3º). Se, porventura, a ação não for proposta nesse prazo de até 30 dias, o depósito ficará sem efeito, podendo ser levantado pelo depositante. Assim, mediante a recusa escrita do credor, para que se possa aproveitar o depósito realizado extrajudicialmente, o devedor (ou o terceiro) deverá necessariamente ajuizar a ação judicial em até trinta dias. Por óbvio, é possível, posteriormente, a propositura de ação de consignação, mas, para tanto, o devedor deverá realizar um novo depósito. Por fim, um último esclarecimento. A Lei de Locações (Lei n. 8.245/91) nada diz a respeito da consignação extrajudicial e, diante do silêncio da lei específica, algumas dúvidas surgiram a respeito da possibilidade, ou não, do depósito extrajudicial de alugueres e encargos locatícios. A jurisprudência firmou entendimento quanto à possibilidade, com o que concordamos, até porque, nos termos da lei processual, é faculdade do devedor efetuar o depósito extrajudicial de qualquer prestação pecuniária, abrangendo-se também aquelas relativas a aluguel e encargos da locação. Art. 540. Requerer-se-á a consignação no lugar do pagamento, cessando para o devedor, à data do depósito, os juros e os riscos, salvo se a demanda for julgada improcedente. Esse dispositivo, repetindo norma contida no art. 337 do Código Civil, prevê que a consignação deverá ser requerida no lugar do pagamento. A norma deve ser lida em conjunto com o art. 327, também do Código Civil, que trata do lugar do pagamento, verbis: “Efetuar-se-á o pagamento no domicílio do devedor, salvo se as partes convencionarem diversamente, ou se o contrário resultar da lei, da natureza da obrigação ou das circunstâncias. Parágrafo único. Designados dois ou mais lugares, cabe ao credor escolher entre eles.” Dessa forma, a competência para o processamento da ação de consignação em pagamento é do foro onde deve ser efetuado o pagamento, pouco importando onde as partes possuem domicílio. A exceção a esta regra encontra-se na consignação relativa a alugueres de imóveis, regida pela Lei de Locação, na qual se observa que a competência é a do foro do lugar do imóvel. Com a consignação em pagamento, cessar-se-ão para o devedor, na data do depósito, osjuros, tratando-se de quantia, e os riscos, se o depósito recaiu sobre a “coisa devida”. Evidentemente, se o pedido da ação for julgado improcedente, o depósito não terá tido o condão de satisfazer a obrigação, não podendo ser reconhecido como pagamento e, portanto, o devedor continuará suportando os ônus decorrentes da mora. Art. 541. Tratando-se de prestações sucessivas, consignada uma delas, pode o devedor continuar a depositar, no mesmo processo e sem mais formalidades, as que se forem vencendo, desde que o faça em até 5 (cinco) dias contados da data do respectivo vencimento. ---------- Página 4 de 8 Quando a consignação versar sobre prestações periódicas, incidirá o dispositivo no art. 541. Não há necessidade de pedido expresso das parcelas vincendas na petição inicial da consignação em pagamento para depósito. Consignada uma das parcelas, as demais deverão ser depositadas, independentemente de autorização judicial, desde que em até cinco dias contados da data do respectivo vencimento, enquanto o processo estiver pendente. Questão interessante diz respeito à mora intercorrente. Imagine-se que o autor, no curso do processo, não deposita uma ou alguma das prestações periódicas ou o faz extemporaneamente, embora o depósito inicial tenha sido efetuado corretamente e dentro do prazo. O caso não implica a improcedência do pedido. A jurisprudência dominante compreende que “a falta de depósito oportuno das prestações subsequentes não afeta os depósitos feitos em tempo”, opinião que, a nosso ver, está em consonância com o texto legal, pois o autor “pode” (e não “deve”) continuar a consignar. Assim, no caso de procedência do pedido, a prestação ou as prestações consignadas, dentro do prazo, liberarão o devedor do pagamento. Contudo, as prestações depositadas fora do prazo (ou não realizadas), serão rejeitadas, não liberando o devedor da obrigação de pagá-las. De qualquer forma, uma vez ultrapassado o prazo de cinco dias do vencimento previsto nesse artigo, nada impede que o devedor lance mão de outro processo para consignar as prestações. Art. 542. Na petição inicial, o autor requererá: I - o depósito da quantia ou da coisa devida, a ser efetivado no prazo de 5 (cinco) dias contados do deferimento, ressalvada a hipótese do art. 539, § 3º; II - a citação do réu para levantar o depósito ou oferecer contestação. Parágrafo único. Não realizado o depósito no prazo do inciso I, o processo será extinto sem resolução do mérito. A petição inicial da ação de consignação em pagamento deverá observar todos os requisitos gerais previstos nos arts. 319 e 320. Além disso, exige o art. 542, dois requerimentos específicos e obrigatórios, quais sejam, o de depósito da quantia ou da coisa devida (inciso I) e a citação do réu para levantar o depósito ou oferecer contestação (inciso II). O primeiro dos requerimentos específicos (o de depósito da quantia ou da coisa) demanda uma análise imediata do juiz. A partir do seu deferimento, contar- se-á o prazo de cinco dias para o autor fazê-lo, sob pena de extinção do processo sem resolução de mérito (parágrafo único). Quando a ação de consignação em pagamento decorrer da hipótese prevista no § 3º do art. 539 – ou seja, quando tentada a via extrajudicial, com recusa do credor – a petição inicial deverá ser instruída com a prova do depósito e da recusa. Trata- se de requisito indispensável. Observe-se ainda que a ressalva contida no inciso I, in fine, corresponde à dispensa desse requerimento quando a ação tiver sido precedida da consignação extrajudicial. Isso porque o depósito já foi realizado anteriormente, daí a necessidade da petição inicial trazer a prova do depósito. Página 5 de 8 Art. 543. Se o objeto da prestação for coisa indeterminada e a escolha couber ao credor, será este citado para exercer o direito dentro de 5 (cinco) dias, se outro prazo não constar de lei ou do contrato, ou para aceitar que o devedor a faça, devendo o juiz, ao despachar a petição inicial, fixar lugar, dia e hora em que se fará a entrega, sob pena de depósito. Esse dispositivo traz a previsão de um incidente para escolha da coisa, quando a consignação tiver por objeto coisa indeterminada, e está diretamente relacionado com a previsão contida no art. 342 do Código Civil. Sobre o aspecto procedimental, é de se registrar que o credor deverá ser citado para, em cindo dias (caso não haja outro prazo previsto na lei ou no contrato), exercer seu direito de escolha ou para aceitar que o devedor (autor da consignatória) o faça. Diante da indeterminação do bem, cuja escolha recai sobre o credor, não há como se exigir que o autor da ação (devedor da obrigação) requeira o depósito da coisa sem que esta tenha sido definida. Se, no prazo previsto, o credor não fizer sua escolha, esta será devolvida ao devedor. No despacho inicial, o juiz deverá marcar lugar, dia e hora em que se fará a entrega, sob pena de depósito. Assim, citado o credor e feita a escolha, o devedor (autor da ação) saberá o que entregar no local, data e horário marcados. Não realizada a escolha pelo credor, devolve-se ao devedor a possibilidade de fazer a escolha para que no local, data e horário marcados, realize o depósito da coisa por ele escolhida. Art. 544. Na contestação, o réu poderá alegar que: I - não houve recusa ou mora em receber a quantia ou a coisa devida; II - foi justa a recusa; III - o depósito não se efetuou no prazo ou no lugar do pagamento; IV - o depósito não é integral. Parágrafo único. No caso do inciso IV, a alegação somente será admissível se o réu indicar o montante que entende devido. Como primeira observação, impõe-se dizer que, na ausência de outro prazo específico trazido pela lei, aplica-se a regra geral, de forma que o réu poderá contestar no prazo de 15 (quinze) dias. Uma vez contestada, a ação assume caráter ordinário não havendo diferenciação quanto ao seu procedimento. Esse dispositivo traz a previsão casuística das matérias de defesa alegáveis pelo réu, na tentativa de delimitar horizontalmente a cognição. A ideia é a de que os temas previstos nos incisos englobem toda a matéria de defesa possível. No entanto, não se pode entender tal rol como taxativo. Não se afasta, por exemplo, a possibilidade de oposição das objeções processuais. Eis as matérias elencadas no dispositivo: a) não houve recusa ou mora em receber a quantia ou a coisa devida (inciso I); b) foi justa a recusa (inciso II); c) o depósito não se efetuou no prazo ou no lugar do pagamento (inciso III); d) o depósito não é integral (inciso IV). Página 6 de 8 A última das hipóteses mencionadas – a de que o depósito não é integral – diferentemente das demais, dá lugar a um procedimento diferenciado, permitindo ao devedor (autor da ação), quando possível, completar o depósito (art. 545). Além disso, por força do parágrafo único, essa mesma alegação somente será admissível se o réu indicar o montante que entende devido, justamente para impedir esse tipo de afirmação de forma leviana. Como se vê, o próprio texto legal admitiu a possibilidade de pôr-se, na consignatória, a controvérsia sobre o quantum debeatur. A discussão que se coloca é saber se, mesmo quando for preciso discutir ou rever cláusulas contratuais ou mesmo realizar perícia, seria possível discutível o “quantum debeatur” em sede de ação consignatória. Em princípio, a ação de consignação não se presta a fornecer tutela tão ampla, devendo-se limitar aos casos em que a causa de pedir corresponde a uma recusa do credor em receber a quantia ou a coisa devida ou a incerteza sobre quem deva receber. Contudo, para que o juiz possa decidir a respeito da liberação da dívida, por vezes, haverá de examinar inúmeras questões, algumas inclusive de alta indagação, pertinentes à matéria de fato, à interpretaçãode cláusulas contratuais ou mesmo às normas legais. Por isso mesmo, a jurisprudência vem alargando o âmbito da ação de consignação, admitindo seu aforamento em qualquer caso em que se discuta a dívida e seu quantum, mesmo que para isso seja necessário até a realização de perícia técnica. O STJ, referendando essa tese, já se referiu expressamente à possibilidade de cumulação com o pedido de revisão de cláusulas contratuais, indicando que, nesses casos, deve ser adotado o procedimento ordinário. Como se observa, a cognição não pode ser limitada, sob pena de não se possibilitar a correta fixação do valor da dívida e seu quantum, obrigando o autor a ajuizar duas ações para se liberar da obrigação. Nesse contexto, pode o juiz examinar quantas questões sejam colocadas, admitindo-se a discussão a respeito do an e do quantum debeatur. De qualquer forma, o provimento judicial, na ação de consignação em pagamento, dada sua natureza declaratória, estará adstrito à declaração de liberação da dívida. As demais questões serão decididas incidenter tantum. Diferente será a situação se uma destas questões for prejudicial de mérito, abrangida pelo art. 503, 1º do NCPC. Art. 545. Alegada a insuficiência do depósito, é lícito ao autor completá-lo, em 10 (dez) dias, salvo se corresponder à prestação cujo inadimplemento acarrete a rescisão do contrato. § 1º No caso do caput, poderá o réu levantar, desde logo, a quantia ou a coisa depositada, com a consequente liberação parcial do autor, prosseguindo o processo quanto à parcela controvertida. § 2º A sentença que concluir pela insuficiência do depósito determinará, sempre que possível, o montante devido e valerá como título executivo, facultado ao credor promover-lhe o cumprimento nos mesmos autos, após liquidação, se necessária. Página 7 de 8 Esse dispositivo cuida, de forma mais detalhada, da hipótese de o réu alegar como defesa a insuficiência do depósito feito pelo autor. Quando isso ocorrer, faculta-se ao autor completá-lo, sempre que possível, ou seja, salvo se corresponder à prestação cujo inadimplemento acarrete a rescisão do contrato. Por força do § 1º, o valor (ou a coisa) depositado é considerado incontroverso e poderá ser levantado pelo réu, com a liberação parcial do autor, prosseguindo o processo somente quanto à diferença tida como controvertida. A norma visa ao aproveitamento da ação, possibilitando ao credor dispor do valor ou bem depositado imediatamente, sem necessidade de aguardar o seu final. O § 2º cuida da hipótese em que, proposta a consignação, o réu alegou a insuficiência do depósito e, nos dez dias que lhe foi conferido após a contestação, não o complementou, insistindo na expressão quantitativa declarada na inicial. Instaura-se, a partir daí, controvérsia sobre o montante devido, que será decidida por uma sentença, na qual, além de reconhecer a insuficiência do depósito, deverá, sempre que possível, determinar o montante devido. Não sendo possível a determinação da liquidez, o juiz deverá proferir uma sentença ilíquida. Essa decisão valerá como título executivo judicial em favor do réu, facultando-lhe, se líquida, instaurar o cumprimento da sentença nos próprios autos e, se ilíquida, a sua liquidação para posterior execução. Trata-se, como se vê, de uma ação de natureza dúplice. Art. 546. Julgado procedente o pedido, o juiz declarará extinta a obrigação e condenará o réu ao pagamento de custas e honorários advocatícios. Parágrafo único. Proceder-se-á do mesmo modo se o credor receber e der quitação. Esse dispositivo só evidencia a natureza declaratória da sentença proferida na ação de consignação em pagamento. Julgado procedente o pedido formulado pelo autor, a sentença declarará a extinção da obrigação, condenando-se o réu ao pagamento de custas e honorários advocatícios. É importante esclarecer que a extinção se dá mediante o depósito judicial realizado pelo autor. A sentença somente declara que houve a extinção da obrigação, como consequência do depósito. Por sua vez, o parágrafo único esclarece que quando o credor (réu da ação consignatória), ao invés de contestar, optar pelo levantamento do valor ou da coisa depositada, o efeito será o mesmo da procedência do pedido: o juiz proferirá sentença declarando a extinção da obrigação, condenando-o ao pagamento de custas e honorários advocatícios. Art. 547. Se ocorrer dúvida sobre quem deva legitimamente receber o pagamento, o autor requererá o depósito e a citação dos possíveis titulares do crédito para provarem o seu direito. Esse dispositivo e o seguinte (art. 548) tratam da peculiar situação de dúvida subjetiva, ou seja, sobre quem deva legitimamente receber. É o caso previsto nos arts. 335, incisos IV e V, do Código Civil. Nessa hipótese, o autor deve requerer autorização para proceder imediatamente ao depósito e à citação dos possíveis titulares do crédito. Frise-se: esses Página 8 de 8 possíveis titulares não serão citados para levantar o depósito, mas sim para provar o seu direito, ou seja, a titularidade do seu crédito. É claro que aqueles que se julgam titulares do crédito, podem, querendo, também contestar, apresentando as situações previstas no art. 544 e outras porventura pertinentes ao seu crédito. A partir da citação desses possíveis titulares do crédito, o procedimento deverá obedecer o art. 548 seguinte. Art. 548. No caso do art. 547: I - não comparecendo pretendente algum, converter-se-á o depósito em arrecadação de coisas vagas; II - comparecendo apenas um, o juiz decidirá de plano; III - comparecendo mais de um, o juiz declarará efetuado o depósito e extinta a obrigação, continuando o processo a correr unicamente entre os presuntivos credores, observado o procedimento comum. Citados os possíveis titulares, abrem-se três possibilidades: (i) não comparece ninguém para reclamar o crédito; (ii) comparece apenas um pretendente ao crédito; e (iii) comparece mais de um pretendente. Se ninguém comparecer, o juiz deverá converter o depósito em arrecadação de coisas vagas (art. 746), declarando a extinção da obrigação. Comparecendo um único pretendente, segundo o dispositivo legal em comento, o juiz “decidirá de plano”. Essa decisão, é bom que se diga, diz respeito tão somente à titularidade da obrigação. Mas, mesmo assim, o juiz somente decidirá “de plano” se tiver elementos para tanto. Nada obsta que haja necessidade de aprofundar a cognição, inclusive com a designação de audiência, se for o caso. Comparecendo mais de um pretendente à consignação, o processo seguirá sem o autor, mas somente entre os interessados. Por decisão interlocutória, o autor é excluído do processo, com a extinção da obrigação, prosseguindo a demanda somente em relação aos credores, pelo rito ordinário. O réu sucumbente deve realizar o pagamento dos honorários advocatícios e custas processuais, além do reembolso dos honorários do autor. Art. 549. Aplica-se o procedimento estabelecido neste Capítulo, no que couber, ao resgate do aforamento. Segundo o art. 2.038 do CC, fica proibida a constituição de enfiteuses e subenfiteuses, subordinando-se as existentes até sua extinção, às disposições do Código Civil anterior (1916). Nos termos do art. 693 do CC/16, todos os aforamentos, salvo acordo entre as partes, são resgatáveis 10 (dez) anos depois de constituídos, mediante pagamento de um laudêmio. Pode ocorrer que o enfiteuta queira resgatar o aforamento pagando o laudêmio e o senhorio direto recuse-se a receber ou mesmo esteja em local incerto ou inacessível. Tais hipóteses abrem a via da consignação em pagamento que será aplicada, no que couber, para resolvê-las. Página 1 de 8 AULA 03 (Ação de exigir contas) Considerações iniciais: o instrumento processual para exigir contas é uma ferramentaprevista desde o CPC/39 que, naquele diploma legal, estava inserida no grupo das chamadas ações cominatórias. Com a mesma estrutura, essa ferramenta processual também era prevista no CPC/73, com o nome de ação de prestação de contas, alocada entre os procedimentos especiais, pois, além de ser um procedimento com estrutura peculiar, tinha uma aplicação bastante específica. No CPC/15, esse instrumento foi alocado também no grupo dos procedimentos especiais e, por conta de restrições no âmbito de sua aplicação, o legislador entendeu por bem alterar a denominação para ação de exigir contas. Conceito e finalidade: destina-se essencialmente àquele que deseja buscar a prestação de contas forçada de terceiro que, por força de lei ou previsão contratual, está obrigado a fazê-la. No contexto do CPC/73, a ação de prestação de contas permitia não só que a parte obrigasse o terceiro a prestar as contas, mas, também, que esse terceiro pudesse utilizar o mesmo procedimento para prestar as contas devidas. Com esse cenário, a doutrina apontava que, no procedimento de prestação de contas, havia a possibilidade de viabilizar duas pretensões, quais sejam: uma de prestar as contas por parte daquele que era obrigado a fazê-la; e outra, de exigir a apresentação das contas por aquele que era obrigado (CPC/73, art. 914). CPC/73, art. 914. A ação de prestação de contas competirá a quem tiver: I - o direito de exigi-las; II - a obrigação de prestá-las. Na previsão do instituto no CPC/15, o âmbito de aplicação deste instrumento foi significativamente restringido, uma vez que só se prestará para exigir a prestação de contas pelo obrigado. Foi por essa restrição que, como dito acima, essa ferramenta processual teve seu nome alterado de ação de prestação de contas para ação de exigir contas. Na opinião do Professor Evaristo Aragão Santos, o motivo dessa alteração de denominação do instituto não se justifica, na medida em que, tanto no regime antigo, como no Novo Código, o titular do direito busca efetivamente a prestação de contas, e não apenas a sua exigência, razão pela qual não haveria sentido Página 2 de 8 a nova denominação. De qualquer modo, essa alteração serve para fixar a restrição de aplicação do instituto. Legitimação: comporá o polo passivo da ação de exigir contas aquele que, por força de previsão legal ou contratual, tem a obrigação de prestá-las. Nesse ponto, é importante observar que não será qualquer relação jurídica de direito material que dará ensejo ao ajuizamento dessa ação, mas apenas aquelas relações jurídicas que versarem sobre administração de bens ou de interesses de terceiros. Ou seja, numa relação jurídica de empréstimo ou de financiamento imobiliário, que não cuidam de administração de bens ou de interesse de terceiros, não haverá a possibilidade de postular a prestação de contas (v. STJ, REsp 1.293.558/PR). PROCESSO CIVIL. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ART. 543-C DO CPC. AÇÃO DE PRESTAÇÃO DE CONTAS. CONTRATOS DE MÚTUO E FINANCIAMENTO. INTERESSE DE AGIR. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. 1. Para efeitos do art. 543-C do CPC, firma-se a seguinte tese: "Nos contratos de mútuo e financiamento, o devedor não possui interesse de agir para a ação de prestação de contas." 2. No caso concreto, recurso especial não provido. (STJ, REsp 1293558/PR, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 11/03/2015, DJe 25/03/2015). Feita essa delimitação do âmbito de aplicação do procedimento, por consequência, é possível identificar o polo ativo da relação processual, pois, apenas nas relações jurídicas de administração de bens ou interesses de outrem, é que a parte terá a legitimidade para postular a prestação de contas. STJ, Súmula 259: “A ação de prestação de contas pode ser proposta pelo titular de conta-corrente bancária.”. Requisito específico da petição inicial: uma inovação importante prevista pelo CPC/15, inspirada no entendimento jurisprudencial contemporâneo do Superior Tribunal de Justiça (v. STJ, EDcl no AgRg no REsp 1275095/PR), diz respeito à necessidade de o autor especificar detalhadamente na petição inicial as razões pelas quais está exigindo as contas, prevista no art. 550, §1º, CPC/15. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. OMISSÃO. SUPRIMENTO. CARÁTER INFRINGENTE.POSSIBILIDADE. EXCEPCIONALIDADE. CONTRATO BANCÁRIO. AÇÃO DE PRESTAÇÃO DE CONTAS. PEDIDO GENÉRICO. OCORRÊNCIA. 1. Cabíveis embargos de declaração para suprir omissão do acórdão. 2.Admite-se, excepcionalmente, que os embargos, ordinariamente Página 3 de 8 integrativos, tenham efeitos infringentes, desde que constatada a presença de um dos vícios do artigo 535 do Código de Processo Civil, cuja correção importe alterar a conclusão do julgado. 3. Nos termos da jurisprudência desta Corte, o ajuizamento de ação de prestação de contas pelo titular da conta-corrente, independentemente do fornecimento pela instituição financeira de extratos detalhados, não pode conter pedido genérico, porquanto, ao menos, deve especificar o período e quais movimentações financeiras busca esclarecimentos, o que não ocorreu no presente caso. 4. Embargos de declaração acolhidos com efeitos infringentes. (STJ, EDcl no AgRg no REsp 1275095/PR, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 12/04/2016, DJe 19/04/2016). Apesar de o referido dispositivo adotar conceito aberto com a palavra “detalhadamente”, cuja delimitação conceitual deverá ser devidamente preenchida pela jurisprudência, desde já é possível afirmar que a petição inicial estará efetivamente detalhada para ser admitida e processada quando o autor indicar o motivo e as razões pelas quais pretende a prestação de contas. Art. 550. Aquele que afirmar ser titular do direito de exigir contas requererá a citação do réu para que as preste ou ofereça contestação no prazo de 15 (quinze) dias. §1o Na petição inicial, o autor especificará, detalhadamente, as razões pelas quais exige as contas, instruindo-a com documentos comprobatórios dessa necessidade, se existirem. §2o Prestadas as contas, o autor terá 15 (quinze) dias para se manifestar, prosseguindo-se o processo na forma do Capítulo X do Título I deste Livro. §3o A impugnação das contas apresentadas pelo réu deverá ser fundamentada e específica, com referência expressa ao lançamento questionado. §4o Se o réu não contestar o pedido, observar-se-á o disposto no art. 355. §5o A decisão que julgar procedente o pedido condenará o réu a prestar as contas no prazo de 15 (quinze) dias, sob pena de não lhe ser lícito impugnar as que o autor apresentar. §6o Se o réu apresentar as contas no prazo previsto no § 5o, seguir-se-á o procedimento do § 2o, caso contrário, o autor apresentá-las-á no prazo de 15 (quinze) dias, podendo o juiz determinar a realização de exame pericial, se necessário. Página 4 de 8 Procedimento: o procedimento da ação de exigir contas é divido em duas grandes etapas, quais sejam: i) inicialmente, a cognição do órgão jurisdicional se concentrará no dever ou não de o réu prestar as contas; e ii) uma vez definida a existência do dever de prestação de contas, a cognição jurisdicional se voltará para as contas apresentadas pelo réu e apurará o saldo. Iniciado o procedimento, o réu será citado para apresentar sua contestação no prazo de 15 (quinze) dias ou, se, desde já reconhecer o dever de prestar as contas, nesse mesmo prazo poderá prestá-las. Poderá o réu, ainda, ficar silente, não contestando ou apresentando as contas, caso em que será facultado ao autorapresentá-las (art. 550, §5º). Nessa primeira fase, qualquer que seja a postura do réu, o juiz deverá encerrá-la por meio de um pronunciamento judicial de mérito que reconheça a necessidade ou não de prestação de contas. Art. 550. Aquele que afirmar ser titular do direito de exigir contas requererá a citação do réu para que as preste ou ofereça contestação no prazo de 15 (quinze) dias. (…) §5o A decisão que julgar procedente o pedido condenará o réu a prestar as contas no prazo de 15 (quinze) dias, sob pena de não lhe ser lícito impugnar as que o autor apresentar. (...) Uma questão extremamente importante é a definição da natureza da decisão que põe fim à primeira fase da ação de exibir contas, principalmente para a definição de qual recurso será cabível. No regime anterior, o CPC/73 dispunha que as fases da ação de prestação de contas seriam encerradas por meio de sentença e, por conta disso, convencionou-se que o recurso cabível seria a apelação. No entanto, ainda no contexto do código anterior, a doutrina dizia que a sentença que colocava fim à primeira fase não poderia ser chamada de sentença propriamente dita, prevista no art. 162, §1º, do CPC/73, mas, por uma questão de adequação do sistema, o recurso seria a apelação. CPC/73, art. 162. Os atos do juiz consistirão em sentenças, decisões interlocutórias e despachos. §1º Sentença é o ato do juiz que implica alguma das situações previstas nos arts. 267 e 269 desta Lei. (...) No âmbito do CPC/15, essa discussão foi bastante elucidada, na medida em que é possível afirmar que a primeira fase do procedimento especial de Página 5 de 8 exigir contas será encerrada por meio de uma decisão interlocutória de mérito. Essa conclusão deriva, principalmente, da nova conceituação de sentença prevista no art. 203, §1º. Art. 203. Os pronunciamentos do juiz consistirão em sentenças, decisões interlocutórias e despachos. §1o Ressalvadas as disposições expressas dos procedimentos especiais, sentença é o pronunciamento por meio do qual o juiz, com fundamento nos arts. 485 e 487, põe fim à fase cognitiva do procedimento comum, bem como extingue a execução. (...) Ou seja, o pronunciamento judicial que encerra a primeira fase da ação de exigir contas não põe fim ao procedimento, mas inicia efetivamente o procedimento de apresentação e julgamento das contas, razão pela qual não poderá ser classificado como sentença, mas, sim, como decisão interlocutória de mérito, impugnável por meio de agravo de instrumento. Todavia, esse pronunciamento que resolve a primeira fase poderá ser considerado sentença quando extinguir o procedimento por entender que o réu não tem o dever de apresentar as contas, restando, nessa situação, preenchidos os pressupostos de identificação do ato jurisdicional como sentença (encerrar o procedimento + conteúdo de mérito) que, portanto, seria recorrível por meio de apelação. Uma vez reconhecido o dever de o réu prestar as contas, iniciará, então, a segunda fase do procedimento, surgindo ao réu a possibilidade de adotar duas condutas: i) apresentar as contas pretendidas pelo autor; ou ii) ficar silente e não cumprir a determinação judicial de apresentar as contas. No regime anterior, o réu era instado a apresentar as contas no prazo de 48 (quarenta e oito) horas; ao passo que, no regime do CPC/15, o réu deverá apresentá-las no prazo de 15 (quinze) dias, conforme o §5º, do art. 550. Art. 550. Aquele que afirmar ser titular do direito de exigir contas requererá a citação do réu para que as preste ou ofereça contestação no prazo de 15 (quinze) dias. (…) §5o A decisão que julgar procedente o pedido condenará o réu a prestar as contas no prazo de 15 (quinze) dias, sob pena de não lhe ser lícito impugnar as que o autor apresentar. Página 6 de 8 (...) O regime anterior, também, determinava que o réu apresentasse as contas de forma mercantil, previsão que não está contemplada no CPC/15 que, por sua vez, determina que as contas devam ser apresentadas de forma adequada, instruídas com os documentos justificados e com especificação de receitas, despesas, investimentos e saldo (art. 551, §2º). Art. 551. As contas do réu serão apresentadas na forma adequada, especificando-se as receitas, a aplicação das despesas e os investimentos, se houver. (…) §2º As contas do autor, para os fins do art. 550, §5º, serão apresentadas na forma adequada, já instruídas com os documentos justificativos, especificando- se as receitas, a aplicação das despesas e os investimentos, se houver, bem como o respectivo saldo. Na visão do Professor Evaristo Aragão Santos, essa mudança traz uma possibilidade de flexibilizar essa apresentação, de modo a permitir a devida adequação ao caso concreto. A doutrina já dizia que a expressão “forma mercantil” estaria tecnicamente equivocada, pois não existiria uma forma mercantil de apresentar as contas, sendo mais adequado, portanto, o uso da expressão “contábil”. A expressão “adequada” é melhor, na visão do Professor Evaristo Aragão Santos, uma vez que evita interpretações equivocadas sobre os termos “mercantil” ou “contábil”. Realizada a prestação de contas de forma adequada pelo réu, ao autor é permitido, no prazo de 15 (quinze) dias, apresentar manifestação sobre as contas apresentadas, conforme o art. 550, §2º, do CPC/15. Art. 550. Aquele que afirmar ser titular do direito de exigir contas requererá a citação do réu para que as preste ou ofereça contestação no prazo de 15 (quinze) dias. (…) §2o Prestadas as contas, o autor terá 15 (quinze) dias para se manifestar, prosseguindo-se o processo na forma do Capítulo X do Título I deste Livro. (...) Página 7 de 8 Importante inovação está no §3º, do art. 550, que prevê que também essa impugnação apresentada pelo autor deverá ser fundamentada e específica, com referência expressa ao lançamento questionado; essa regra se justifica na medida em que, no regime antigo, o autor comumente apresentava impugnação com argumentos genéricos, deixando de indicar especificamente os motivos pelos quais entendia que as contas apresentadas deveriam ser rejeitadas, causando distorções no procedimento. Art. 550. Aquele que afirmar ser titular do direito de exigir contas requererá a citação do réu para que as preste ou ofereça contestação no prazo de 15 (quinze) dias. (…) § 3o A impugnação das contas apresentadas pelo réu deverá ser fundamentada e específica, com referência expressa ao lançamento questionado. (...) Portanto, ao impugnar as contas, o autor deverá indicar especificamente quais os valores que não concorda e os motivos de sua discordância, permitindo, dessa forma, que o réu possa se manifestar de maneira específica e qualificada sobre os pontos controvertidos das contas apresentadas, inclusive com apresentação de documentos para elucidar a questão. É importante mencionar, ainda, que o §1º do art. 551 do CPC/15 permite que o juiz, de acordo com as peculiaridades do caso concreto, estabeleça prazo razoável para que o réu apresente documentos para elucidar os pontos impugnados e controvertidos pelo autor. Art. 551. As contas do réu serão apresentadas na forma adequada, especificando- se as receitas, a aplicação das despesas e os investimentos, se houver. § 1o Havendo impugnação específica e fundamentada pelo autor, o juiz estabelecerá prazo razoável para que o réu apresente os documentos justificativos dos lançamentos individualmente impugnados. (...) Exauridos os debates sobre as contas apresentadas, iniciará, então, a fase de julgamento das contas.Registre-se que o juiz, ao se debruçar sobre as contas apresentadas, não irá apenas analisar as contas propriamente ditas, mas, também, confrontá-las com a própria relação jurídica de direito material estabelecida entre as partes. Por outro lado, não será permitido ao juiz revisar ou alterar a relação jurídica estabelecida entre Página 8 de 8 as partes, devendo a cognição se restringir às contas apresentadas e ao confronto com os termos da relação jurídica firmada entre as partes. É importante que se diga que a cognição do juiz sobre as contas apresentadas e o confronto com a relação jurídica firmada entre as partes não se limitará ao instrumento contratual pactuado entre as partes, de modo que o juiz poderá, também, analisar outras situações e argumentos que gravitam em torno da relação jurídica que derivou o pedido de prestação de contas, como, por exemplo, a prática reiterada de alguma conduta pelas partes e que poderá ser incorporada na análise do juiz. Feita essa análise pelo julgador, presume-se que será verificado um valor como saldo das contas apresentadas, devendo, então, a sentença que resolver a segunda fase desse procedimento fazer a declaração e reconhecer a existência desse valor (art. 552). Art. 552. A sentença apurará o saldo e constituirá título executivo judicial. Isso quer dizer, portanto, que o julgador poderá concluir que o saldo será em favor tanto do autor como do réu, revelando-se o caráter dúplice desse procedimento. Daí é possível concluir que o réu não precisará necessariamente apresentar reconvenção para que seja reconhecido um saldo em seu favor. Contra esse pronunciamento judicial, por ter natureza de sentença, caberá recurso de apelação. Página 1 de 15 AULA 04 - DAS AÇÕES POSSESSÓRIAS Art. 554. A propositura de uma ação possessória em vez de outra não obstará a que o juiz conheça do pedido e outorgue a proteção legal correspondente àquela cujos pressupostos estejam provados. § 1º No caso de ação possessória em que figure no polo passivo grande número de pessoas, serão feitas a citação pessoal dos ocupantes que forem encontrados no local e a citação por edital dos demais, determinando-se, ainda, a intimação do Ministério Público e, se envolver pessoas em situação de hipossuficiência econômica, da Defensoria Pública. § 2º Para fim da citação pessoal prevista no § 1º, o oficial de justiça procurará os ocupantes no local por uma vez, citando-se por edital os que não forem encontrados. § 3º O juiz deverá determinar que se dê ampla publicidade da existência da ação prevista no § 1º e dos respectivos prazos processuais, podendo, para tanto, valer- se de anúncios em jornal ou rádio locais, da publicação de cartazes na região do conflito e de outros meios. As disposições processuais aplicáveis às ações possessórias no NCPC não contêm, no geral, muitas mudanças relativamente ao tratamento dado ao tema pelo CPC/73. Como veremos nos comentários desenvolvidos a seguir, as alterações mais significativas dizem respeito ao tratamento expresso que o NCPC dá às situações envolventes de invasões coletivas, nas quais a multiplicidade de integrantes do polo passivo e o fato de serem estes, no mais das vezes, desconhecidos, produzem importantes impactos procedimentais nas ações possessórias. ■ Fungibilidade aplicável às ações possessórias O art. 554 do NCPC estabelece a aplicação, às ações possessórias, do princípio da fungibilidade, vale dizer, caso a parte proponha uma ação de reintegração de posse, sendo o caso exigente de ação de manutenção de posse, deverá o órgão jurisdicional receber a demanda como de manutenção de posse fosse. Trata-se de disposição legal fortemente influenciada pelo princípio da instrumentalidade das formas, e quer nos parecer que tal se dá em virtude da aguda relevância que as questões atinentes à posse ostentam no cenário jurídico nacional. Em virtude da maior relevância que o ordenamento jurídico atribui a direitos como o direito à posse, não obsta à proteção possessória eventual equívoco incorrido pela parte ao propor uma ação possessória em lugar de outra. De se observar que, além do equívoco da parte na propositura da ação possessória, o dispositivo legal em apreço também se justifica em face de casos em que a situação se altera, normalmente evoluindo de ofensa de menos para mais grave: tal se dá, por exemplo, quando o cenário inicial invocado pela parte é de turbação (não se deu, ainda, a perda total da posse, ou a total interrupção de seu exercício, mas há atos Página 2 de 15 que impedem o pleno exercício da posse), porém evolui para cenário de esbulho (no decorrer da demanda, radicalizam-se atos agressivos à posse e esta é integralmente extraída do autor da ação). O que releva, portanto, é que se concede ao magistrado liberdade para atribuir ao caso a proteção possessória que se mostre adequada à defesa dos interesses do possuidor vítima de ilícito possessório, reintegrando-o ou mantendo-o na posse, independentemente de ter sido ajuizada a ação correta para o caso concreto (se de reintegração ou de manutenção de posse). Ainda acerca das ações possessórias, cumpre observar que, em demandas de tal natureza, apenas é passível de proteção a posse, vale dizer, não se admite discussão de direito real, o que apenas seria discutível em ação de caráter dominial (ações petitórias, como o é a ação reivindicatória de bem imóvel). Entende-se poder discutir domínio quando ambas as partes discutem a posse como decorrência de domínio. As ações possessórias subdividem-se em: (i) reintegração de posse (quando houver esbulho, isto é, perda total da posse), (ii) manutenção de posse (quando ocorrer turbação da posse, ou seja, atos de agressão à posse, porém se existir privação integral desta em detrimento do possuidor), e (iii) interdito possessório (quando não houver ocorrido, ainda, ato de agressão à posse, mas tal for iminente). ■ Ações possessórias ajuizadas em caso de invasão coletiva Os §§ 1º a 3º do art. 554 contêm importantes inovações relativamente ao CPC/73: cuidam de uma realidade não contemplada na codificação atual (1973), qual seja, a das invasões coletivas e a dificuldade de citação dos réus em ações possessórias em que o polo passivo será formado por grande número de pessoas. O CPC atual (1973), não foi concebido como codificação destinada ao regramento de litígios coletivos, com grande número de integrantes dos polos ativo e passivo das ações. O CPC/73 destina-se precipuamente ao regramento de litígios individuais, nada mais. No campo das ações possessórias, tornaram-se relativamente frequentes as situações em que o número de invasores é elevado, exigindo-se no processamento de tais demandas algumas soluções que, ao longo dos tempos, foram sedimentando-se jurisprudencialmente. É o caso, por exemplo, da formação do polo passivo e da citação dos réus nas ações possessórias com múltiplos e desconhecidos réus (invasões coletivas). Coube, como dito, à jurisprudência a atividade de dissecação do problema, até que se chegou, notadamente por conta das invasões coletivas protagonizadas por movimentos sociais, à admissão, em hipóteses de invasões coletivas, da não individualização imediata (rectius, ao tempo da propositura da ação) de todos os réus, em se tratando de possessórias destinadas a evitar ocupações irregulares de caráter multitudinário. Ou seja: sendo a ação possessória ajuizada em face de invasão coletiva, em que é no mais das vezes impossível individualizar os réus que comporão o Página 3 de 15 polo passivo da demanda, poderá a ação ser ajuizada em face de réus indeterminados, os quais serão identificados quando da diligência citatória.10. E como se dará a citação destes réus de qualificação ignorada, comohabitualmente acontece nas situações de invasões coletivas? A citação deverá dar-se necessariamente por oficial de justiça, de acordo com o que dispõe o § 1º do art. 554 do NCPC, que deverá comparecer ao local da invasão uma única vez e citar os ocupantes ali encontrados, identificando-os na certidão de citação para que posteriormente componham, já individualizados e qualificados, o polo passivo da ação. Os ocupantes que não estiverem no local quando desta diligência citatória única, e os que estiverem, porém se recusarem a identificar-se, serão citados por edital, a teor do que dispõe o § 2º do art. 554 do NCPC. Nota-se a essência do dispositivo legal sob análise: será réu da ação possessória ajuizada em situação de invasão coletiva quem for identificado e citado no dia da única diligência de citação que se realizará, e os demais ocupantes da área considerar-se-ão citados por edital, ainda que não localizados pessoalmente ou não identificados (porque se recusaram, por exemplo) Em virtude de invasões coletivas cuidarem de direitos transindividuais (nos parece que a hipótese é de interesses individuais homogêneos por parte dos réus, em virtude de terem origem comum e pertencerem a um número determinável de pessoas), faz-se de rigor a intimação do Ministério Público, a atuação da Defensoria Pública em defesa dos economicamente hipossuficientes (§ 1º do art. 554 em análise). Em face de multiplicidade de réus e da possibilidade de grande parte deles ser citada de maneira ficta, por edital, deverá ser dada a mais ampla publicidade possível acerca da existência da ação e dos prazos processuais, podendo o juiz valer-se, a teor do art. 554, § 3.º, do NCPC, “de anúncios em jornal ou rádio locais, da publicação de cartazes na região do conflito, e de outros meios”. Art. 555. É lícito ao autor cumular ao pedido possessório o de: I - condenação em perdas e danos; II - indenização dos frutos. Parágrafo único. Pode o autor requerer, ainda, imposição de medida necessária e adequada para: I - evitar nova turbação ou esbulho; II - cumprir-se a tutela provisória ou final. Além da proteção possessória em si, a ação poderá conter pedidos cumulados de condenação em perdas e danos, de indenização relativamente aos frutos do imóvel esbulhado ou turbado que o autor poderia haver percebido caso não houvesse ocorrido a violação à posse, e de todas as medidas necessárias à prevenção de novas turbações ou esbulhos e à concretização da tutela possessória provisória ou final. São passíveis de cumulação com o pleito de proteção à posse, por exemplo, a reparação dos provocados diretamente decorrentes dos atos de esbulho ou Página 4 de 15 de turbação (derrubada de cercas, muros), além dos lucros cessantes (o que o autor deixou de auferir em virtude da violação à posse praticada pelo réu, como rendas locatícias ou atinentes a outros negócios que poderiam ser realizados caso não houvesse ocorrido a violação da posse). Dentre as medidas destinadas à coibição de novos atos de violação à posse e à concretização da tutela provisória ou final concedidas na ação possessória, inclui-se a cominação de multa periódica, em caso de reiteração dos atos lesivos à posse, o desfazimento de modificações lesivas à posse para fins de asseguração do resultado prático da tutela possessória provisória ou final, de modo a se restituir o bem objeto do esbulho ou da turbação ao seu estado anterior à violação da posse, além de quaisquer outras providências que o órgão jurisdicional reputar necessárias, dado que o rol do art. 555 do NCPC não é taxativo. A multa pecuniária destina-se à coibição da repetição de atos de violação da posse: poderá o órgão jurisdicional, verbi gratia, impor ao réu multa diária enquanto perdurar a violação à posse, ou multa por ato configurador de esbulho ou turbação. O pleito condenatório à reparação das perdas e danos decorrentes da violação à posse destina-se a indenizar o autor relativamente a todas as atividades prejudiciais que lhe houverem sido provocadas pelo violador da posse, tais quais danificações a prédios existentes no imóvel, destruição de bens e pertences, destruição de lavoura etc. Art. 556. É lícito ao réu, na contestação, alegando que foi o ofendido em sua posse, demandar a proteção possessória e a indenização pelos prejuízos resultantes da turbação ou do esbulho cometido pelo autor. Diz o art. 556 do NCPC que o réu, citado para se defender em ação possessória, poderá deduzir, além da defesa, pedido de proteção possessória em face do autor, bem como a reparação dos prejuízos resultantes da turbação ou do esbulho. O procedimento das ações possessórias permite, ex lege, que o réu, além de resistir (contestar), formule pedido de proteção à sua posse, em desfavor do autor, fazendo-o no corpo da própria contestação. Ressalte-se que o pedido dedutível pelo réu tem de ser de exclusivo caráter possessório. O pedido de proteção possessória formulado pelo réu, e eventualmente cumulado com perdas e danos, será resolvido conjuntamente com o pedido do autor, na mesma sentença, e serão também objeto de uma só instrução probatória. Ponderamos que a natureza dúplice das ações possessórias tornaria até mesmo dispensável a expressa previsão legal de que o réu poderá, em contestação, formular pretensão de proteção possessória. Com efeito, talvez o artigo sob análise faça sentido relativamente aos pedidos cumuláveis ao de proteção possessória (indenização por danos emergentes e lucros cessantes, por exemplo), porém nos parece uma redundância afirmar que o réu poderá pleitear proteção possessória em sede de contestação à ação possessória, dado que tal proteção pode derivar automaticamente da sentença caso a ação seja julgada improcedente. Página 5 de 15 De fato, as ações possessórias têm, conforme diversos entendimentos doutrinários, caráter dúplice, mas não em virtude de o réu poder formular pedido de proteção possessória em contestação por força do art. 556 em análise, porém em decorrência do fato de que, nas ações dúplices, qualquer das partes litigantes poderá, dada a própria natureza da discussão jurídica estabelecida (se a posse lícita é do autor ou é do réu), obter a tutela possessória, firmando-se quem é o legítimo possuidor, independentemente do fato de o vencedor integrar o polo ativo ou passivo da ação.11. A natureza das ações dúplices permite que qualquer das partes, independentemente de integrar o polo ativo ou passivo da demanda, experimente vitória judicial que lhe assegure o bem da vida. Araken de Assis define a questão com propriedade: “Do prisma material, é dúplice a ação, provocando o iudicium duplex, na qual a contestação do réu já basta à obtenção do bem da vida. Em geral, o autor pede e o réu somente impede; na actio duplex, o ato de impedir (contestação) já expressa um pedido contrário. Tal característica deriva do direito material posto em causa (rectius: mérito, pretensão processual ou objeto litigioso)”.12. Art. 557. Na pendência de ação possessória é vedado, tanto ao autor quanto ao réu, propor ação de reconhecimento do domínio, exceto se a pretensão for deduzida em face de terceira pessoa. Parágrafo único. Não obsta à manutenção ou à reintegração de posse a alegação de propriedade ou de outro direito sobre a coisa. O art. 557 do NCPC estabelece vedação à propositura de ação petitória (destinada ao reconhecimento de domínio, como é o caso da ação reivindicatória) durante o curso de ação possessória. A vedação em questão justifica-se porque, no âmbito da ação possessória, não pode haver discussões sobre propriedade. Só se ambas as partes estiverem discutindo a posse com fundamento na propriedade. O fenômeno jurídico “posse” é distinto do fenômeno jurídico “propriedade”, e a primeira não decorre necessariamente da segunda,daí a intenção do legislador de, nas ações possessórias, restringir o debate a ser travado entre as partes ao tema “posse”, impedindo-se que os litigantes ajuízem ação entre si de caráter dominial tendo por objeto bem cuja posse é discutida. A parte final do caput do art. 557 do NCPC expressamente ressalva que tanto o autor quanto o réu da ação possessória não poderão estabelecer entre si discussão judicial de caráter dominial sobre o bem em disputa possessória, porém poderão fazê-lo com terceiro: “exceto se a pretensão for deduzida em face de terceira pessoa”. A impossibilidade de ser proposta ação petitória durante a tramitação da ação possessória (de reconhecimento de domínio), ou mesmo de ser formulado pedido contraposto neste sentido, não quer dizer, no entanto, que nas possessórias será vedada qualquer discussão de fundo dominial: o que é defeso é que a discussão dominial (sobre propriedade ou outros direitos reais) componha a causa de pedir e seja o pedido deduzido na ação possessória, ou seja, a ação possessória não pode consistir em veículo para a definição jurisdicional da propriedade atribuível ao autor ou ao réu. Página 6 de 15 A discussão dominial, entretanto, pode ser entabulada incidentalmente (apenas incidentalmente, reitere-se) na ação possessória, como argumento tendente à demonstração da posse e, assim, obter-se a proteção possessória (por exemplo, o autor da ação possessória, mostrando-se dono do bem, comprova, também, ter a posse deste). O fenômeno jurídico “posse”, como se disse, é distinto da propriedade, podendo ou não desta decorrer. O parágrafo único do art. 557 do NCPC, de maneira acerta, dispõe que a proteção possessória reivindicada (reintegração ou manutenção) não será obstada pela mera alegação de propriedade ou de outro direito sobre a coisa. Há que se debater fundamentalmente a posse, que pode ser legitimamente exercida mesmo em face do proprietário do bem que, por alguma circunstância (legal ou contratual), não seja o legítimo possuidor. Art. 558. Regem o procedimento de manutenção e de reintegração de posse as normas da Seção II deste Capítulo quando a ação for proposta dentro de ano e dia da turbação ou do esbulho afirmado na petição inicial. Parágrafo único. Passado o prazo referido no caput, será comum o procedimento, não perdendo, contudo, o caráter possessório. O art. 558 sob análise traz importante disposição normativa acerca do regime legal aplicável às ações possessórias, levando-se em conta o momento de ocorrência da violação à posse. Se as ações de manutenção ou de reintegração de posse forem propostas dentro do prazo de ano e dia contado da turbação ou do esbulho, o respectivo processamento se dará conforme o regramento contido nos arts. 560 e ss. do NCPC e o procedimento será especial, cuja principal característica é a possibilidade de concessão de liminar possessória inaudita altera parte e sem necessidade de demonstração de urgência, de risco de dano irreparável ou de risco de difícil reparação ou de viabilidade jurídica da pretensão autoral; se as ações possessórias em questão forem propostas após o prazo de ano e dia contado da turbação ou do esbulho, o rito aplicável será o comum. De se observar que, mesmo obedecendo ao rito comum, a ação possessória não estará alijada da possibilidade de concessão de liminar. Com efeito, se proposta após ano e dia da turbação ou do esbulho, a ação possessória comportará pleito de medida liminar, porém a título de tutela de urgência ou de evidência (tutelas provisórias), sendo possível a concessão de reintegração ou manutenção de posse em caráter liminar, desde que verificada a presença dos requisitos autorizadores, particularmente o risco de dano irreparável e a viabilidade jurídica da pretensão (o que não se aplica à liminar possessória típica das ações possessória propostas em até ano e dia contados da turbação ou do esbulho). Por derradeiro, registre-se que as ações possessórias propostas em até ano e dia da violação ou do esbulho são chamadas de ações de “força nova”; as ações possessórias aforadas posteriormente a este prazo são denominadas de ações de “força velha”. Página 7 de 15 As ações possessórias de “força nova” comportam concessão de liminar demonstrando- se apenas a violação à posse legítima e o ajuizamento da ação em até ano e dia contados de predita violação; as ações de “força velha” comportam a concessão de tutela provisória (de urgência ou de evidência), preenchendo-se os requisitos respectivos. Art. 559. Se o réu provar, em qualquer tempo, que o autor provisoriamente mantido ou reintegrado na posse carece de idoneidade financeira para, no caso de sucumbência, responder por perdas e danos, o juiz designar-lhe-á o prazo de 5 (cinco) dias para requerer caução, real ou fidejussória, sob pena de ser depositada a coisa litigiosa, ressalvada a impossibilidade da parte economicamente hipossuficiente. Em caso de concessão da liminar de manutenção ou de reintegração de posse, o réu violador da posse será compelido a deixar o imóvel total ou parcialmente invadido. Não obstante, caso este mesmo réu demonstre que o autor da ação provisoriamente mantido ou reintegrado em sua posse (em virtude de decisão liminar) não dispõe de situação financeira suficiente à reparação de perdas e danos suportados pelo requerido caso este seja vitorioso na demanda (vale dizer, caso lhe seja assegurada a posse, julgando-se improcedente a ação possessória proposta pelo autor e revogando- se a liminar), poderá ser pleiteada a prestação de caução por parte do requerente. A caução, que pode ser real ou fidejussória, tem por escopo preservar o réu relativamente aos danos eventualmente decorrentes da privação de posse que lhe foi liminarmente imposta e que, ao fim da ação, mostrou-se improcedente, dado o desfecho da ação desfavoravelmente ao autor. Necessário apontar que a prova da alegada inidoneidade financeira do autor deverá ser contundente, conclusiva, devendo ser necessariamente observado o contraditório relativamente à apuração da afirmação de insuficiência patrimonial do autor para fazer frente aos danos eventualmente suportados pelo réu. Apenas estará dispensado o autor da prestação de caução ora analisada em caso de demonstração, comprovada, de sua hipossuficiência econômica. Uma crítica merece ser expendida acerca do dispositivo legal sob comento: por que não há disposição no mesmo sentido benéfica ao autor, em caso de dar-se o oposto, ou seja, em caso de ser-lhe negada liminar possessória, restando o réu na posse do imóvel, e sobrevir sentença de procedência da ação possessória? Trata-se de questão que, delege ferenda, poderia ser merecedora de atenção por parte do legislador processual civil. SEÇÃO II DA MANUTENÇÃO E DA REINTEGRAÇÃO DE POSSE Art. 560. O possuidor tem direito a ser mantido na posse em caso de turbação e reintegrado em caso de esbulho. Como já apontamos nos comentários ao art. 554 do NCPC, as violações à posse podem ser integrais (há esbulho, ou interrupção integral do exercício da posse) ou parciais (há turbação, ou práticas que dificultam ou embaraçam o exercício pleno da Página 8 de 15 posse), caso em que caberá, respectivamente, ou ação de reintegração de posse, ou ação de manutenção de posse. Art. 561. Incumbe ao autor provar: I - a sua posse; II - a turbação ou o esbulho praticado pelo réu; III - a data da turbação ou do esbulho; IV - a continuação da posse, embora turbada, na ação de manutenção, ou a perda da posse, na ação de reintegração. ■ Prova da posse Por primeiro, incumbe ao demandante demonstrar ser efetivamente possuidor do bem cuja posse afirma ser objeto de violação. A comprovação da posse, de forma documental ou oral em audiência de justificação, é necessária paraque, a um só tempo, demonstre-se interesse de agir (necessidade da tutela possessória) e se obtenha, no mérito, a proteção possessória objetivada. A prova da posse pode dar-se de diversas maneiras: documento comprobatório de aquisição de direitos sobre o imóvel (compromisso de compra e venda, instrumento de cessão de posse, contrato de locação etc.). Além de tais documentos, há outros elementos probatórios que sugerem o exercício da posse: comprovação de pagamento de contas e tributos incidentes sobre o imóvel (impostos prediais, contas de água, luz etc.), depoimentos pessoal ou testemunhal a serem colhidos em audiência de justificação etc. ■ Prova da turbação ou o esbulho praticado pelo réu As violações à posse (esbulho ou turbação) também têm de ser provadas mediante acostamento aos autos de fotografias, documentos outros (atas notariais, por exemplo) ou depoimentos a serem colhidos em audiência de justificação. O registro em imagem da violação à posse também poderá ser tomado como elemento de prova, mormente por conta da facilidade que atualmente há relativamente à sua reprodução (um DVD contendo imagens do esbulho ou o da turbação pode ser facilmente examinável pelo órgão jurisdicional mediante exibição em computador). ■ A data da turbação ou do esbulho Em atenção ao disposto nos arts. 558 e 562 do NCPC, atinentes, em leitura conjugada, à possibilidade de concessão de liminar possessória nas hipóteses em que a ação de manutenção ou de reintegração de posse houver sido proposta em até ano e dia contados da ocorrência da turbação ou do esbulho, mostra-se bastante relevante que o autor comprove quando ocorreu a violação à sua posse. Se a ação possessória for de “força velha” (proposta após ano e dia da ocorrência da violação à posse), descabe a liminar dos art. 558 e 562 do NCPC (cabendo apenas o pleito de tutela provisória de urgência ou de evidência, observados os requisitos respectivos); Página 9 de 15 a contrário sensu, se a ação for de “força nova” (proposta em até ano e dia contados da turbação ou do esbulho), caberá a liminar dos arts. 558 e 562 em questão. A prova da data da turbação ou do esbulho pode se dar mediante juntada de documentos aos autos ou em audiência de justificação. Quer nos parecer que a prova da data da posse mostra-se de mais fácil realização mediante oitiva de testemunhas em audiência de justificação, dada a natural dificuldade de documentar- se a data de uma invasão. Por “data da turbação ou do esbulho” compreenda-se não necessariamente o dia em que estes ocorreram: se a data (o dia, o mês, o ano) não puder ser precisada, poderá ocorrer sua indicação por aproximação. ■ A continuação da posse, embora turbada, na ação de manutenção; a perda da posse, na ação de reintegração O inciso IV do art. 561 tem por objetivo impor ao autor da ação possessória a demonstração de que, em caso de (i) ação de manutenção de posse, deu- se efetivamente sua hipótese de cabimento, a saber, a turbação, que se caracteriza pela prática de atos violadores da posse sem que o legítimo possuidor seja despojado integralmente do exercício da posse do bem, ou, (ii) em hipótese de ação de reintegração de posse, verificou-se o esbulho, consubstanciado na perda total da posse por parte do autor. Art. 562. Estando a petição inicial devidamente instruída, o juiz deferirá, sem ouvir o réu, a expedição do mandado liminar de manutenção ou de reintegração, caso contrário, determinará que o autor justifique previamente o alegado, citando-se o réu para comparecer à audiência que for designada. Parágrafo único. Contra as pessoas jurídicas de direito público não será deferida a manutenção ou a reintegração liminar sem prévia audiência dos respectivos representantes judiciais. ■ Concessão de liminar possessória O art. 562 ora comentado trata da concessão de liminar de reintegração ou de manutenção de posse: se suficientemente instruída a petição inicial, tomando-se por parâmetro as provas indicadas no art. 562 antecedente, a hipótese comportará a expedição de mandado liminar de proteção possessória. Uma das características mais marcantes de dita liminar possessória advém da possibilidade de ser concedida sem a oitiva a parte contrária (inaudita altera parte). Tal possibilidade em nada lesiona os princípios do contraditório e da ampla defesa, dado que o direito de oposição e de resistência do réu relativamente à liminar concedida apenas quedará diferido, postergado, especialmente porque a prévia ciência do requerido acerca do pedido de liminar poderá ocasionar a radicalização do cenário de violação à posse. Na hipótese de a petição inicial não estar aderida de elementos probatórios suficientemente sólidos, do que decorre a impossibilidade de formação de convencimento jurisdicional apto à concessão da liminar possessória de plano, deverá o Página 10 de 15 magistrado designar audiência de justificação com o fito de colher, se possível, provas orais conducentes à necessidade de concessão de liminar possessória. O mais notável aspecto diferenciador da liminar concedida após a audiência de justificação comparativamente à liminar concedida em virtude do exame dos documentos acompanhantes da petição inicial diz respeito ao caráter inaudita altera parte da segunda, dado que a primeira, por força de expressa disposição constante do art. 562, caput, do NCPC, decorrerá de audiência para a qual foi intimado o réu. A atuação do réu em dita audiência de justificação é delimitada pela circunstância de não ser possível a apresentação de contestação, o que ocorrerá apenas a posteriori, em virtude do disposto no art. 564 do NCPC. O réu, portanto, não poderá arrolar testemunhas, as quais poderão ser arroladas pelo autor (nada obstando, evidentemente, que sejam também inquiridas pelo requerido). Liminar possessória contra as pessoas jurídicas de direito público: não será deferida a manutenção ou a reintegração liminar, sem prévia audiência dos respectivos representantes judiciais. Há, no dispositivo legal, em apreço a clara intenção de preservar-se o interesse público, conferindo-se presunção de legalidade das atividades administrativas de modo que não seja possível a concessão de liminar possessória em face do Poder Público em caráter inaudita altera parte. Exige-se, por força deste parágrafo único do art. 562 do NCPC, a “prévia audiência” dos representantes judiciais das pessoas jurídicas de direito público, aqui entendidas como as integrantes da administração direta e indireta. Há que se atribuir literal interpretação à expressa “prévia audiência”: trata-se de locução significativa de prévia manifestação, não se confundindo, em absoluto, com a figura da contestação. A manifestação prévia do Poder Público quando de requerimentos de liminares possessórias em seu detrimento tem caráter bastante assemelhado ao das defesas prévias, que contestação não são. Art. 563. Considerada suficiente a justificação, o juiz fará logo expedir mandado de manutenção ou de reintegração. Após a realização da audiência de justificação, caso exista a formação, pelo magistrado, de convicção suficiente à concessão de liminar de reintegração ou manutenção liminar na posse em benefício do autor, será determinada a expedição do respectivo mandado, em caráter incontinenti. Trata-se de decisão reversível, mormente por conta de seu caráter inaudita altera parte, do que decorre que poderão ser carreados aos autos outros elementos de prova pelo réu que conduzam o órgão jurisdicional a convencimento distinto daquele derivado do juízo unilateral de cognição inerente à audiência de justificação prévia. Art. 564. Concedido ou não o mandado liminar de manutenção ou de reintegração, o autor promoverá, nos 5 (cinco) dias subsequentes, a citação do réu para, querendo, contestar a ação no prazode 15 (quinze) dias. Página 11 de 15 Parágrafo único. Quando for ordenada a justificação prévia, o prazo para contestar será contado da intimação da decisão que deferir ou não a medida liminar. Existindo pedido de proteção possessória em caráter liminar, a decisão inicial proferida na ação possessória encerrará juízos de (i) aferição, em cognição sumária, das condições da ação e dos pressupostos processuais e, ato contínuo, (ii) apreciação do pleito de concessão de medida liminar de manutenção ou reintegração de posse. Após a intimação do autor acerca da decisão inicial, e sendo determinada a citação do réu (concedida ou não a liminar possessória), preconiza o artigo em análise que “o autor promoverá, nos 5 (cinco) dias subsequentes, a citação do réu para, querendo, contestar a ação no prazo de quinze dias”. A respeito dessa disposição legal, é necessário que os termos empregados pelo legislador sejam postos em seus devidos lugares: no ponto em que se lê “o autor promoverá a citação”, há que se entender que o autor promoverá todos os meios necessários para que seja ultimada comunicação do réu, fornecendo contrafé, custas de oficial de justiça, endereço correto do requerido etc., para que o órgão jurisdicional, este sim, empreenda o ato citatório. Os cinco dias para tal conduta do autor (promoção dos meios para que se efetue o ato citatório) são contados da respectiva intimação. Se, antes de apreciar o pedido de liminar possessória, o magistrado decidir pela designação de audiência de justificação, deverá para esta ser o réu necessariamente citado (art. 562 do NCPC). O réu citado para a ação possessória e intimado da realização da audiência de justificação não deverá comparecer a esta munido de contestação, dado que o prazo para apresentação de defesa fluirá apenas a partir da intimação das partes acerca do deferimento ou indeferimento da liminar, o que se dará após a realização da audiência em apreço. Art. 565. No litígio coletivo pela posse de imóvel, quando o esbulho ou a turbação afirmado na petição inicial houver ocorrido há mais de ano e dia, o juiz, antes de apreciar o pedido de concessão da medida liminar, deverá designar audiência de mediação, a realizar-se em até 30 (trinta) dias, que observará o disposto nos §§ 2º e 4º. § 1º Concedida a liminar, se essa não for executada no prazo de 1 (um) ano, a contar da data de distribuição, caberá ao juiz designar audiência de mediação, nos termos dos §§ 2º a 4º deste artigo. § 2º O Ministério Público será intimado para comparecer à audiência, e a Defensoria Pública será intimada sempre que houver parte beneficiária de gratuidade da justiça. § 3º O juiz poderá comparecer à área objeto do litígio quando sua presença se fizer necessária à efetivação da tutela jurisdicional. § 4º Os órgãos responsáveis pela política agrária e pela política urbana da União, de Estado ou do Distrito Federal e de Município onde se situe a área objeto do Página 12 de 15 litígio poderão ser intimados para a audiência, a fim de se manifestarem sobre seu interesse no processo e sobre a existência de possibilidade de solução para o conflito possessório. § 5º Aplica-se o disposto neste artigo ao litígio sobre propriedade de imóvel. ■ O caput do art. 565 do NCPC: dificuldades de interpretação O art. 565 do NCPC foi originalmente inserido no Projeto de CPC quando de sua tramitação na Câmara dos Deputados, e dizia respeito às ações possessórias coletivas (isto é, ajuizadas em face de invasões coletivas) de força nova, com pleito de concessão da liminar possessória de conformidade com o disposto nos arts. 558 e 562 do NCPC. Esta era a sua razão de ser: disciplinar a fase inicial das ações possessórias de força nova que tratassem de invasões coletivas e em que houvesse o pleito de concessão de decisão liminar, até mesmo porque a liminar possessória típica apenas é concessível em possessórias de força nova. Objetivava-se que, nestas ações possessórias com réus múltiplos (invasões coletivas), que contivessem pedido de liminar (ações de força nova) houvesse, antes da apreciação da liminar inaudita altera parte, a designação de audiência de mediação, para que se evitassem os conflitos de grande escala típicos de ações possessórias dessa amplitude, especialmente quando há liminar concedida. Ainda na Câmara dos Deputados, o dispositivo sofreu, nos estertores de sua tramitação nesta casa, modificação consistente na previsão de que se aplica o art. 565 sob análise às ações possessórias nas quais “o esbulho ou a turbação afirmado na petição inicial houver ocorrido há mais de ano e dia ” em que exista pedido de liminar (caput do art. 565 do NCPC). De última hora, mudou-se radicalmente a destinação do dispositivo legal em análise, desligando-o das ações possessórias de força nova coletivas e vinculando-o às ações de força velha coletivas. Houvesse ou não concordância com o conceito e com a ideologia inerentes à redação original do dispositivo (determinante de designação de audiência de mediação previamente à apreciação de pedido de liminar possessória em ações de força nova coletivas), havia ao menos razão de ser e lógica em seu texto: em ações de força nova coletivas com pedido de liminar, dada a concreta possibilidade de geração de tumultos e acirramentos de grandes proporções e riscos à integridade física dos envolvidos quando da reintegração ou manutenção liminar da posse, buscava-se o estabelecimento prévio de mediação, colimando-se a solução menos traumática possível da questão. Com as alterações sofridas, contudo, o dispositivo em sua atual redação ficou um tanto quanto desnaturado e desconexo, gerando algumas dificuldades de interpretação, que podem ser sintetizadas em duas indagações: as liminares possessórias nas ações de força nova estão condicionadas à designação prévia de audiência de mediação? Há liminares possessórias típicas (sem o requisito da urgência) também nas ações de força velha, desde que sejam coletivas? Página 13 de 15 A primeira observação que se faz em face da redação final do dispositivo é a seguinte: em face de sua literalidade (no caput do art. 565 do NCPC consta que tal dispositivo aplica-se às ações propostas após ano e dia do esbulho ou da turbação, de força velha, portanto), a norma em análise não se aplicará às ações possessórias coletivas (invasões coletivas) de força nova com pedido de liminar. Nestas, a teor da expressa letra da lei, a liminar possessória continuará a ser concessível, em regra, sem a oitiva da parte contrária, de plano e sem audiência de mediação prévia, nos termos dos arts. 558 e 562 do NCPC, conjugados. A segunda observação que nos permitimos fazer: a liminar ora cogitada apenas pode ser a decisão liminar geral concessível no regime do CPC (as tutelas provisórias pautadas na urgência ou na evidência), e não a liminar possessória típica prevista na conjugação dos arts. 558 e 562 do NCPC, que não pressupõe urgência. Neste sentir, a alusão à necessidade de designação de uma audiência de mediação prévia acaba por ser desnecessária e redundante, já que tal audiência, nas ações de rito comum (e a ação de força nova é de rito comum), decorre do art. 334 do NCPC, ou seja, independentemente do disposto no caput do art. 565 do NCPC, as ações de força velha ajuizadas em face de invasões coletivas com pedido de liminar necessariamente contariam com a audiência de mediação prévia ex vi do art. 334 do NCPC. Observamos, por fim, que, se for evidente e notório risco de danos irreparáveis de grandes proporções decorrentes da concessão inaudita altera parte de uma liminar possessória e de sua efetivação em ações com grande número de réus, a realidade do caso concreto e a sensibilidade do órgão jurisdicional podem permitir a designação de audiência prévia também
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