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UAB/IFMT LICENCIATURA EM MATEMÁTICA FILOSOFIA DA EDUCAÇÃO Professor Organizador: Francis-Elpi de Oliveira Nascimento. Cuiabá – MT, junho de 2017. Sumário 1. O PROBLEMA DO MUNDO FÍSICO: COSMOLOGIA......................................................4 1.1. O MUNDO FÍSICO NA FILOSOFIA............................................................................4 1.1.1. A Filosofia Cosmológica grega................................................................................4 1.1.2. A Filosofia do mundo físico na Idade Média...........................................................5 1.1.3. A ciência do mundo físico nos tempos modernos....................................................5 1.1.4. O espaço da filosofia natural hoje...........................................................................5 1.2 COSMOLOGIA....................................................................................................................6 1.2.1. Esclarecimento de terminologia..............................................................................6 1.2.2. Cosmologia: objeto e conteúdo...............................................................................6 1.3. FILOSOFIA DA CIÊNCIA (EPISTEMOLOGIA)..........................................................7 1.3.1. Filosofia da Ciência: problemática..........................................................................7 2. O PROBLEMA DO SER: METAFÍSICA..............................................................................8 2.1. O PROBLEMA FILOSÓFICO DO SER........................................................................8 2.1.1. Questões sobre o ser na filosofia grega...................................................................8 2.1.2. A “Filosofia Primeira” de Aristóteles......................................................................9 2.2. METAFÍSICA.................................................................................................................9 2.2.1. Metafísica: origem do termo....................................................................................9 2.2.2. Metafísica: sentido do termo.................................................................................10 2.2.2.1. Metafísica como realidade não-física............................................................10 2.2.2.2. Metafísica como estudo do ser (Ontologia)...................................................10 2.2.3. Metafísica: a alma da Filosofia..............................................................................10 2.2.4. Metafísica: conteúdo básico...................................................................................11 3. O PROBLEMA DO CONHECIMENTO: INTRODUÇÃO À TEORIA DO CONHECIMENTO...................................................................................................................12 3.1 O CONHECIMENTO COMO QUESTÃO FILOSÓFICA...........................................12 3.1.1 Conhecimento: um pequeno panorama histórico...................................................12 3.1.1.1 Platão...............................................................................................................12 3.1.1.2 Aristóteles.......................................................................................................13 3.1.1.3 Racionalismo...................................................................................................13 3.1.1.4 Empirismo.......................................................................................................14 3.1.15 Kant..................................................................................................................16 3.2 TEORIA DO CONHECIMENTO..................................................................................18 3.2.1 Teoria do Conhecimento: objeto.............................................................................18 3.2.2 Teoria do Conhecimento: diferenciação da Lógica................................................19 3.2.3 Teoria do Conhecimento: conteúdo........................................................................19 3.2.3.1 Possibilidades do conhecimento.....................................................................19 3.2.3.2 Natureza (essência) do conhecimento.............................................................20 3.2.3.3 Origem (fontes) do conhecimento..................................................................20 3.2.3.4 Espécies (formas) de conhecimento................................................................21 3.2.3.5 Validade (verdade) do conhecimento..............................................................21 4. EDUCAÇÃO HUMANA: FILOSOFIA DA EDUCAÇÃO.................................................21 4.1. A EDUCAÇÃO COMO PROBLEMA FILOSÓFICO..................................................21 4.1.1. As teorias da educação na história.........................................................................22 4.1.1.1. Os ideais gregos da educação........................................................................22 4.1.1.2. Educação Medieval........................................................................................23 4.1.1.3. Educação nos tempos modernos....................................................................23 4.2. FILOSOFIA DA EDUCAÇÃO.....................................................................................24 4.2.1. Filosofia da Educação: conceituação.....................................................................24 4.2.2. Filosofia da Educação e Pedagogia...................................................................24 4.2.3. Filosofia da Educação: conteúdos.........................................................................25 4.2.3.1. Educação: conceituação.................................................................................25 4.2.3.2. Os princípios da educação.............................................................................25 4.2.3.3. As dimensões da educação.............................................................................25 4.2.3.4. O sujeito da educação....................................................................................25 4.2.3.5. Os agentes da educação.................................................................................26 4.3. Concepção, Tendências e Correntes na Educação Brasileira........................................27 4.3.1. As teorias não-críticas:...........................................................................................27 4.3.1.1. Pedagogia Tradicional....................................................................................28 4.3.1.2. Pedagogia Nova.............................................................................................28 4.3.1.3. Pedagogia Tecnicista......................................................................................29 4.3.2. As teorias “crítico-reprodutivistas”:......................................................................29 4.3.2.1. Teoria do ensino enquanto violência simbólica.............................................30 4.3.2.2. Teoria da escola enquanto aparelho ideológico de Estado (A.I.E.)...............30 4.3.2.3. Teoria da escola dualista................................................................................30 4.3.2.4. Consequências destas Teorias........................................................................31 4.3.3. A teoria crítico social dos conteúdos.....................................................................31 4.4. Para uma Teoria Crítica da Educação............................................................................33 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS......................................................................................36 1. O PROBLEMA DO MUNDO FÍSICO: COSMOLOGIA 1.1. O MUNDO FÍSICO NA FILOSOFIA 1.1.1. A Filosofia Cosmológicagrega O mundo é uma realidade problemática sob múltiplos aspectos: sua origem, seus elementos constitutivos fundamentais, sua duração, seu fim último. Acerca do mundo e com vistas à solução dos problemas mencionados, pode-se formular um duplo discurso, científico e filosófico. No primeiro caso, propõe-se uma descrição dos fenômenos, especialmente em suas relações de conjunto e em seu devir, interpretando-os segundo critérios lógicos, destinados a estabelecer entre eles uma ordem, uma estrutura, uma lei de conservação e evolução. No segundo caso, apresenta-se uma interpretação geral dos fenômenos do universo, em sua natureza essencial, em suas propriedades, em seu fundamento último. Essa distinção entre discurso científico e filosófico é conquista bem recente do pensamento humano. Ela tornou-se possível apenas com o surgimento das ciências experimentais, isto é, durante o século XVII. Antes disso, as pesquisas dos metafísicos e os estudos dos astrônomos e físicos eram considerados partes de uma disciplina: a filosofia. (MONDIN: 1980, 46) O mundo físico foi objeto da primeira reflexão filosófica (pré-socráticos: “filosofia cosmológica”). Os primeiros filósofos gregos buscavam encontrar o “estofo primeiro” de todas as coisas. Não haveria, debaixo da infinita diversidade de seres no mundo, alguns poucos elementos de que seriam compostas todas as coisas? A aurora do pensamento grego filosófico coincide com o estudo das questões relativas à “natureza” (physis). A filosofia pré-socrática se caracteriza pela busca da chave unificante de toda realidade sensível. Para eles, o único constante e permanente é a matéria original e o movimento. Tratam de encontrar esse algo “imortal e sempre jovem”, que constitui o fundo primordial de tudo o que existe. O fundo das coisas é a “physis1”, ou seja, a natureza, substância constante através das mudanças. Que é aquilo que está em tudo e de que tudo é feito? (MANDRIONI: 1964, 84) A primeira filosofia sistemática sobre o mundo físico é a “Física” de Aristóteles. (Aristóteles era um observador apaixonado da natureza: pesquisava o comportamento dos animais, das plantas, do curso dos astros e daí, como resultado, suas obras: “História dos Animais”, “Sobre as plantas”, “Sobre o céu”, “Metereológica”, etc.). Nesta obra Aristóteles trata do “ente móvel”, isto é, o ser submetido à mudança, o ser material. A “Física” é um tratado filosófico, metafísico, mas engloba também aspectos que hoje seriam científicos, uma vez que não havia ainda a distinção entre saber filosófico e saber científico; o saber era global. 1 Physis - (1) o princípio da evolução ou do progresso, na natureza. (2) a natureza enquanto fonte de progresso e evolução. (3) segundo os filósofos pré-socráticos, é a matéria que é fundamento eterno de todas as coisas e confere unidade e permanência ao Universo, o qual, na sua aparência é múltiplo, mutável e transitório. 1.1.2. A Filosofia do mundo físico na Idade Média Na Idade Média, praticamente desapareceu o interesse filosófico pelo mundo físico, pois toda cosmologia era explicada à luz da Revelação e da Sagrada Escritura. 1.1.3. A ciência do mundo físico nos tempos modernos No início da Idade Moderna (séculos XVI – XVII) a natureza física volta a tornar-se o centro de interesses da reflexão humana. Muda, porém, o método de abordagem da natureza: não mais a perspectiva especulativa, mas a experimental. A nova metodologia da “Física” contém os seguintes elementos: observação dos fenômenos naturais, constatação de sua regularidade e formulação das leis dos fenômenos. Trata-se, assim, do nascimento da ciência experimental. O nome antigo – Física – é conservado, mas muda a sua perspectiva e seu conteúdo. Seus grandes nomes são: Francis Bacon, Galileu, Newton, etc. 1.1.4. O espaço da filosofia natural hoje Diante do espaço que a ciência ocupa no campo do saber, podemos nos perguntar: com o extraordinário desenvolvimento científico, haverá lugar para uma “Filosofia do mundo físico”? Não nos bastam as ciências para compreender o mundo físico e natural? Haveria ainda no mundo segredos reservados para a Filosofia? É preciso afirmar desde o início que o estudo das coisas materiais não pode ser esgotado pelas ciências positivas. Existe um autêntico saber filosófico que versa também sobre a natureza sensível e que se em um primeiro momento acreditou poder esgotar ele sozinho o estudo deste mundo, como também em um primeiro momento o acreditava fazer a ciência positiva, hoje é preciso voltar à afirmação da autonomia e competência de ambos os saberes, sobre a base de uma estreita interdependência. Tanto o pan- filosofismo como o cientismo revelaram-se incapazes de uma explicação exaustiva no que concerne o problema da natureza sensível. (MANDRIONI: 1964, 82) Verifica-se hoje um renovado interesse pela reflexão filosófica nesse campo, surgido principalmente em decorrência exatamente da grande fragmentação e especialização das ciências. Faz-se necessário construir uma visão mais total e integradora do universo físico, uma “cosmovisão” unitária e fundamentada. Disse o grande filósofo Wittgenstein: “ainda que todas as questões científicas fossem resolvidas, nossos problemas vitais não seriam sequer tocados”. Os próprios físicos contemporâneos sentiram essa necessidade e alguns deles até enveredaram pela reflexão filosófica. Assim, por exemplo, Albert Einstein escreveu a obra “Como vejo o universo” e Steven Hawkins faz o mesmo na “Pequena História do Tempo”. 1.2 COSMOLOGIA 1.2.1. Esclarecimento de terminologia Faz-se necessário uma breve distinção entre os termos “Cosmologia” e “Filosofia da Natureza”, os quais, na realidade, representam a mesma realidade: Cosmologia: vem do grego (kosmos) e significa ordem e, por extensão, mundo; trata-se de um termo largamente usado nos tratados escolásticos clássicos. Hoje o termo “Cosmologia” designa também uma ciência, que tem por objeto elaborar teorias de modelos do universo, sua origem, sua formação, etc., ou seja, uma ciência afim da Astronomia. Filosofia da Natureza: traduz a antiga denominação latina “Philosophia Naturae” ou “Philosophia Naturalis”. 1.2.2. Cosmologia: objeto e conteúdo O objeto material da Filosofia da Natureza é o conjunto dos entes naturais materiais. Estes entes são estudados também pelas ciências experimentais, porém, sob a perspectiva de suas causas próximas ou imediatas (por exemplo, as leis que regem determinados comportamentos dos corpos, sua constituição química, etc.). A filosofia natural se pergunta – com um esforço metafísico – pelo seu ser, buscando as causas mais profundas. Por isso, o objeto formal da Filosofia da Natureza é o ser do ente corpóreo. (ARTIGAS, M. Introducción a la Filosofia. p. 62) A Metafísica Natural procura alcançar uma compreensão filosófica dos conceitos básicos da ciência natural, como espaço, tempo, movimento, força, energia, matéria, vida orgânica, etc., estabelecer, na medida do possível, seus constitutivos essenciais e, a partir deles, elaborar uma imagem filosófica do universo. (BRUGGER: 1962, 194) O conteúdo básico da Cosmologia assim se expressa: Extensão: o ser material é um ser extenso. Em que esta extensão consiste? Distingue-se ela da substância? Quantidade/Qualidade: a qualidade é reduzível ou não à quantidade? Espaço: limitado ou ilimitado? Real ou ideal? E o vácuo? Tempo: correlativo ao espaço: é real ou ideal? Movimento: como interpretá-lo? Absolutamente ou relativamente? Movimento e ação à distância: causalidade física, determinismo, etc. Categorias do ente físico: o inorgânico e o vivo.A vida é ontologicamente superior à matéria? O ensino de Cosmologia requer hoje conhecimentos aprofundados sobre as novas teorias físicas (Teoria da Relatividade, Teoria dos Quanta, etc.) e até conhecimento sobre matemática teórica. 1.3. FILOSOFIA DA CIÊNCIA (EPISTEMOLOGIA) A ciência tornou-se um dos assuntos específicos da filosofia mais recente: o que é verdadeiramente um conhecimento científico? Quais são as suas características, fundamentos e pressupostos? Qual é a finalidade da ciência e seu lugar na cultura humana? A discussão sobre as proposições científicas nasceu a partir dos anos 20 do século XX no movimento chamado “Neopositivismo”. Representado principalmente pelo “Círculo de Viena” (Carnap, Schlick, Reichenbach), o Neopositivismo, ao mesmo tempo em que estabelece o conhecimento científico como único válido, discute a fundo o estatuto e a metodologia da ciência. Para o neopositivismo, a única função da Filosofia é exatamente ser “Filosofia da Ciência”, com sua “atividade clarificadora da linguagem científica”. A discussão mais ampla sobre a ciência, o método científico e o lugar da ciência na cultura é prosseguida por filósofos posteriores, como Karl Popper (crítico do Círculo de Viena), Gaston Bachelard, Thomas Kuhn, Larry Laudan, Alexander Koyré e outros. 1.3.1. Filosofia da Ciência: problemática A Gnosiologia é uma disciplina que se ocupa com o conhecimento humano em geral, enquanto Epistemologia deve ocupar-se com o conhecimento científico e seu método. Foi na segunda parte do século XIX que a Epistemologia ganhou corpo como disciplina filosófica e é atualmente uma das disciplinas mais importantes. Epistemologia é a disciplina filosófica que se ocupa com a forma da ciência. Ela indaga sobre as afirmações científicas; por isso mesmo ela é uma reflexão crítica, de estilo filosófico, sobre tudo o que a ciência faz. Ela é, por conseguinte, uma Filosofia da Ciência. Ela indaga sobre os critérios de cientificidade e sobre o método científico. Delimitar o campo das ciências experimentais e das não-experimentais, avaliar criticamente a natureza e o valor do conhecimento científico, analisar e discutir a linguagem usada na ciência, etc., estão entre as principais tarefas da Epistemologia. (OLIVEIRA: 1990, 195-196) Uma ciência particular pode ser considerada tanto do ponto de visa de seu conteúdo, quanto de sua forma. Conteúdo é a matéria estudada pela ciência. São os objetos e assuntos que cada ciência estuda. Forma é o modo como cada ciência se organiza: é a estrutura, é a lógica, que mostram e garantem que aquilo que é estudado e afirmado é feito de modo correto e científico. Conteúdo são as leis, as teorias e os objetos de cada ciência. Forma é a maneira de organizar o conteúdo. É aquilo que constitui propriamente a ciência. A Epistemologia se ocupa da Forma da ciência. (OLIVEIRA: 1990, 196) Elencamos como temas fundamentais da Filosofia da Ciência: O método da pesquisa científica. Os elementos fundamentais da ciência, tais como: observação, verificação, hipótese, lei, teoria, etc. A natureza das teorias científicas e sua capacidade de explicar a realidade. O papel cultural e social da ciência. Ciência e ideologia. Ciência e outras dimensões da cultura humana: ciência e filosofia, ciência e arte, ciência e religião. 2. O PROBLEMA DO SER: METAFÍSICA 2.1. O PROBLEMA FILOSÓFICO DO SER A Filosofia, na sua dimensão mais profunda, se pergunta sobre o ser em geral. O que é tudo o que existe? Só existe o que é sensorial, o que atinge os nossos sentidos? Podemos dividir tudo o que existe em “matéria” e “espírito”? Quais são os princípios fundamentais do ser? A noção do “ser” é a mais universal de todas. Tratando do ser em si, a Filosofia se caracteriza como “Filosofia Geral”: fundamenta-se e caracteriza-se aqui a visão geral de todas as coisas. 2.1.1. Questões sobre o ser na filosofia grega Já a primeira filosofia grega, os pré-socráticos, no intuito de entender a racionalidade da natureza física, às vezes transborda para questões mais gerais. Por exemplo: a questão do uno e do múltiplo. Há multiplicidade ou unidade do ser? Talvez existiria um só ser e a multiplicidade seria apenas aparente? Parmênides e Heráclito discutem sobre a questão da identidade e do devir. Parmênides dizia que o ser É, idêntico a si mesmo, e a mudança é apenas aparente. Heráclito, por sua vez, tinha opinião contrária: não há o ser, só existe a mudança. Não há nada que permaneça, “tudo muda” (panta rei). Platão dividiu a realidade em dois mundos (dualismo platônico): a realidade sensível, a matéria, é o “mundo das sombras”, da aparência. O verdadeiro ser é ideal: o “Mundo das Ideias”. Daí a sua divisão do conhecimento entre “doxa” e “episteme”, correspondendo à sua metafísica dualista. 2.1.2. A “Filosofia Primeira” de Aristóteles Aristóteles viu a necessidade de fundamentar uma “filosofia primeira”, ou seja, uma filosofia básica, que se ocupasse em investigar os primeiros princípios e as primeiras causas de tudo o que existe: é o seu tratado de “Metafísica”. Para Aristóteles, a “filosofia primeira” (Metafísica) é o coração e alma de toda a Filosofia. Ocupando-se da noção mais universal – a do “ser” – a Metafísica constitui-se no fundamento de toda a Filosofia: aqui é que se decide o tipo de filosofia e se plasma a visão geral da realidade. Desta visão geral do ser ou da realidade depende a visão dos seres em particular, do mundo, do homem, da vida, etc. (isto é, a “filosofia segunda”). A parte culminante da Metafísica aristotélica e depois também de São Tomás é a Teologia Natural: a causa primeira e última do ser, que é Deus. A “filosofia primeira” aristotélica tornou-se o referencial para toda a filosofia até hoje. Os assuntos e a terminologia de Aristóteles (ato, potência, essência, existência, substância, acidente, etc.) são retomados e reelaborados por filósofos posteriores até os dias de hoje. Na Metafísica, Aristóteles afirma que a Filosofia Primeira estuda os primeiros princípios e as causas primeiras de todas as coisas e investiga o “Ser enquanto Ser”. Ao definir a ontologia ou metafísica como estudo do “Ser enquanto Ser”, Aristóteles está dizendo que a Filosofia Primeira estuda as essências sem diferenciar essências físicas, matemáticas, astronômicas, humanas, técnicas, etc., pois cabe às diferentes ciências estudá-las enquanto diferentes entre si. À Metafísica cabem três estudos: 1. O do ser divino, a realidade primeira e suprema da qual o restante procura aproximar-se, imitando sua perfeição imutável; 2. O dos primeiros princípios e causas primeiras de todos os seres ou essências existentes. 3. O das propriedades ou atributos gerais de todos os seres, sejam eles quais forem, graças aos quais podemos determinar a essência particular de um ser particular existente. A essência ou “ousia” é a realidade primeira e última de um ser, aquilo sem o qual um ser não poderá existir ou deixará de ser o que é. À essência, entendida sob essa perspectiva universal, Aristóteles dá o nome de “substância”: o substrato ou o suporte permanente de qualidade ou atributos necessários de um ser. A metafísica estuda a substância em geral. (CHAUÍ: 1995, 218-219) 2.2. METAFÍSICA 2.2.1. Metafísica: origem do termo A palavra “Metafísica” deve sua origem a uma denominação especial na classificação das obras de Aristóteles feita no século I por Andrônico de Rodes. Como os livros que tratam da Filosofia primeira foram colocados na edição das obras do Estagirita a seguir dos livros de Física, chamou-se aos primeiros “Metafísica”, isto é, “aosque estão detrás da Física”. Esta designação, cujo sentido primitivo parece ser puramente classificador, teve posteriormente um significado mais profundo, pois, com os estudos que são objeto da filosofia primeira, se constitui um saber que pretende penetrar no que está situado para além ou detrás do ser físico enquanto tal. (FERRATER MORA: 1965, 260) 2.2.2. Metafísica: sentido do termo O termo “Metafísica” pode ter dois sentidos básicos, os quais são correlatos: 2.2.2.1. Metafísica como realidade não-física É o sentido apontado acima, na citação de Ferrater; trata-se de uma realidade “além da física”, não fenomênica e, ainda, o que não pode ser atingido por nenhuma experiência ou conhecimento sensório, é apenas objeto do conhecimento intelectivo ou que é deduzido pela lógica racional, através do raciocínio discursivo. Assim, por exemplo, “alma”, “liberdade”, “Deus” são realidades metafísicas. 2.2.2.2. Metafísica como estudo do ser (Ontologia) Trata-se da disciplina filosófica – caracterizada a partir de Aristóteles – que trata sobre o ser em geral, suas propriedades e seus fundamentos. Neste sentido, a Metafísica também leva o nome de “Ontologia” (do grego “ontos” = ser + “logia” = ciência), termo criado pelo filósofo alemão Jacob Thomasius, no século XVII. A metafísica é a investigação filosófica que gira em torno da pergunta “O que é?”. Este “é” possui dois sentidos: 1. Significa “existe”, de modo que a pergunta se refere à existência da realidade e pode ser transcrita como “O que existe?”. 2. Significa “natureza própria de alguma coisa”, de modo que a pergunta se refere à essência da realidade, podendo ser transcrita como “Qual é a essência daquilo que existe?”. Existência e essência da realidade em seus múltiplos aspectos são, assim, os termos principais da metafísica, que investiga os fundamentos, as causas e o ser íntimo de todas as coisas, indagando por que existem e por que são o que são. (CHAUÍ: 1995, 207) 2.2.3. Metafísica: a alma da Filosofia Toda ciência verdadeiramente filosófica se pergunta pelo ser de seu objeto e tem, portanto, uma relação direta com a Metafísica, que estuda o ser em toda a sua amplitude. (ARTIGAS, N. Introducción a la Filosofia. p. 52) O núcleo da filosofia é a Metafísica: é o que lhe confere unidade. Os demais ramos da filosofai estudam seus temas sob o ponto de vista ou enfoque da metafísica, a que Aristóteles chama justamente de “filosofia primeira”. Por esta razão, a divisão da filosofia não dá lugar a disciplinas filosóficas meramente justapostas e relacionadas entre si de modo externo. (ARTIGAS, N. Introducción a la Filosofia. p. 53) 2.2.4. Metafísica: conteúdo básico Existem várias perspectivas de se desenvolver a Metafísica: a clássica (baseada na filosofia aristotélica-tomista), a existencialista, a fenomenológica (inspirada em Husserl, Heidegger, etc.) personalista, etc. 3. O PROBLEMA DO CONHECIMENTO: INTRODUÇÃO À TEORIA DO CONHECIMENTO 3.1 O CONHECIMENTO COMO QUESTÃO FILOSÓFICA A filosofia, no correr dos séculos, se preocupou com o conhecimento, formulando a esse respeito várias questões: Qual a origem do conhecimento? Qual a sua essência? Quais os tipos de conhecimento? Qual o critério da verdade? É possível o conhecimento? (ARANHA& MARTINS: 1985, 96) São, portanto, várias as questões que se pode colocar sobre o conhecimento e que são assunto da Filosofia. Citamos como exemplos: Espécies de conhecimento: o conhecimento é um só ou pode ser diferenciado em tipos? Existe só uma espécie de conhecimento ou mais de uma? Natureza do conhecimento: o que é conhecer? Conhecer é reproduzir ou criar a realidade? Alcance do conhecimento: até onde alcançam os nossos conhecimentos? Conhecemos só o que podemos perceber pelos sentidos ou podemos conhecer algo além da percepção dos sentidos? Validade e verdade do conhecimento: quais são os critérios da verdade? Como distinguir a verdade da falsidade? São essas e outras questões filosóficas sobre o conhecimento que são tratadas numa disciplina chamada “Teoria do Conhecimento” ou “Gnosiologia”. 3.1.1 Conhecimento: um pequeno panorama histórico Embora o problema do conhecimento tenha preocupado os filósofos desde a Antiguidade, somente a partir da Idade Moderna a teoria do conhecimento adquiriu grande importância, passando a ser tratada como uma das disciplinas centrais da filosofia. Para esse processo de valorização da teoria do conhecimento contribuíram, de forma decisiva, as obras do filósofo francês René Descartes (1596-1650), do filósofo inglês John Locke (1632- 1704) e do filósofo alemão Immanuel Kant (1724-1804). (COTRIM: 1993, 70) 3.1.1.1 Platão Para Platão, o conhecimento é uma recordação, pois conhecer é recordar. O verdadeiro conhecimento é inato em nós, não precisamos confiar em nossos sentidos para obter conhecimento sobre o mundo. O verdadeiro conhecimento é formado por conceitos (ideias que já estão em nossa mente), e não por informações (ideias que chegam até nós por meio dos sentidos). (RAEPER, W. & SMITH, L. Introdução ao estudo das Idéias. p. 19) 3.1.1.2 Aristóteles Aristóteles contesta Platão, afirmando que nossa alma (mente) não possui nenhum conhecimento ou ideias inatas (somos uma “tabula rasa”). Todo conhecimento é adquirido pela experiência sensorial. Temos, além dos sentidos, uma faculdade superior: a inteligência, que elabora o material dos sentidos e forma um outro tipo de conhecimento: o conhecimento intelectual (ou intelectivo). Para Aristóteles, o trabalho básico da inteligência é a abstração: da imagem individual a inteligência tem o poder de captar uma ideia universal (o conceito). Em seguida, a inteligência liga conceitos em juízos, raciocínios, etc.; isso se chama ciência, obra do intelecto. 3.1.1.3 Racionalismo O Racionalismo é uma corrente filosófica baseada nas operações mentais para definir a viabilidade e efetividade das proposições apresentadas. Aqui estamos no século XVII. O racionalismo é uma volta ao platonismo. A inteligência possui ideias próprias, inatas e independentes da experiência sensorial (ideias matemáticas, da alma, de Deus, etc.). Essas ideias são o fundamento da verdadeira ciência e não a experiência sensorial, que não é confiável. Essa corrente surgiu como doutrina no século I antes de Cristo para enfatizar que tudo que é existente é decorrente de uma causa. Muito tempo depois, já na Idade Moderna, os filósofos racionalistas adotaram a matemática como elemento para expandir a ideia de razão e a explicação da realidade. Dentre seus adeptos, destacou-se o francês René Descartes que elaborou um método baseado na geometria e nas regras do método científico. Suas ideias influenciaram diversos outros intelectuais, como Spinoza e Leibniz. Este, por exemplo, desenvolveu o método de cálculo infinitesimal e defendeu o Racionalismo dizendo que algumas ideias e princípios são percebidos pelos nossos sentidos, mas não estão neles as origens. Seus argumentos tinham grande amparo da geometria, da lógica e da aritmética. As elaborações de Descartes também impulsionaram muito o método científico em função das quatro regras que utilizou para elaborar seu método racionalista. As regras diziam que jamais se deveria acolher algo como verdadeiro enquanto não fosse verificado, que era preciso fragmentar as dificuldades para examiná-las mais de perto, que era preciso impor ordem aos pensamentos e, por fim, fazer enumerações e revisões para não correr o risco de omissões. A partir da Idade Moderna, o Racionalismo obteve grande crescimento comocorrente filosófica e não se pode desvincular essas ideias das aplicações matemáticas. Tradicionalmente, o Racionalismo era definido pelo raciocínio como operação mental, discursiva e lógica para extrair conclusões. As inovações humanas apresentadas com o advento do Renascimento consolidaram o Racionalismo com o acréscimo de elaborações e verificações matemáticas. Para o Racionalismo, tudo tem uma causa inteligível, mesmo que não possa ser demonstrada empiricamente. O Racionalismo foi importante elemento do mundo Moderno para superar o mundo Medieval, pois privilegia a razão em detrimento das experiências do mundo sensível, ou seja, o método mítico como se tinha acesso ao conhecimento durante a Idade Média. Assim, o Racionalismo é baseado na busca da certeza e da demonstração. O Racionalismo se tornou central ao pensamento liberal, que, por sua vez, pretende propor e estabelecer caminhos para alcançar determinados fins em nome do interesse coletivo. Assim, o Racionalismo está na base do planejamento da organização econômica e espacial da reprodução social, abrindo espaço para as soluções racionais de problemas econômicos e/ou urbanos com base em soluções técnicas e eficazes. (Informações em: http://www.infoescola.com/filosofia/racionalismo/ - acessado: 05/06/2017) 3.1.1.4 Empirismo Corrente filosófica dos séculos XVII e XVIII que propõe uma volta ao aristotelismo. Não há ideias inatas, todo o conhecimento provém da experiência sensorial. A única fonte de conhecimento é a experiência dos sentidos. O empirismo é a posição filosófica que aceita a experiência como base para a análise da natureza, procurando rejeitar as doutrinas dogmáticas. Usado pela primeira vez pela Escola Empírica, uma escola de praticantes da medicina na antiga Grécia, o termo empirismo deriva da palavra grega empeiría (ἐμπειρία), que designa conhecimento ou habilidade obtida por meio da prática, sendo também a origem da palavra “experiência”, por intermédio do termo latino "experientia". Object 1 Empiristas defendem que o conhecimento é primariamente obtido pela experiência sensorial, alguns empiristas radicais vão além afirmando que o conhecimento só é obtido pela experiência sensorial e por nenhuma outra forma. A posição empirista é frequentemente contrastada com o racionalismo, que estabelece a razão como origem do conhecimento, independente dos sentidos. O conceito e a busca de evidências como fonte primária de conhecimento existiu durante toda a história da filosofia e ciência, desde a Grécia antiga, mas foi com o surgimento do chamado Empirismo Britânico, no século XVII, que consolidou-se como uma posição filosófica específica, sendo o filósofo John Locke considerado o fundador do empirismo como tal. Os principais filósofos do Empirismo Britânico foram John Locke, George Berkeley e David Hume. Locke é famoso por sua comparação da mente humana com uma folha em branco, 'tábula rasa', na qual as experiências derivadas das impressões dos sentidos são impressas. Desta forma, haveriam duas formas de surgimento de ideias, pela sensação e pela reflexão, com ideias podendo ser simples ou complexas. As ideias simples não são passíveis de análise, sendo referentes as qualidades primárias e secundárias dos objetos. Sendo as primárias aquelas que definem o que o objeto é essencialmente, por exemplo, uma mesa tem como qualidade primária o arranjo específico de sua estrutura atômica, qualquer outro arranjo faria outro objeto e não uma mesa. As qualidades secundárias tratam das informações sensoriais acerca do objeto, definindo seus atributos (cor, sabor, espessura, etc). Ideias complexas combinam ideias simples e constituem substâncias, modos e relações. Desta forma, segundo Locke, e discordando dos racionalistas, o conhecimento humano acerca dos objetos do mundo é a percepção de ideias que estão em concordância ou discordância umas com as outras. Esta hipótese tornou- se a base da posição empirista. Preocupado que a posição de Locke levaria ao ateísmo, Berkeley formulou a hipótese de que as coisas só existiriam na medida em que são percebidas. Para além destas, existiriam as entidades que percebem, tendo sua existência garantida mesmo sem que outro as perceba. Exagerando a alegoria da 'tábula rasa', Berkeley defendeu que a ordem que vemos na natureza é a escrita de Deus. Por isto, sua posição é hoje conhecida como idealismo subjetivo. Na sequência desta discussão, o filósofo Hume moveu a posição empirista na direção do ceticismo. Para Hume, a recusa de Berkeley se daria pelo fato de que o empirismo possui implicações que não são aceitas pela maioria dos filósofos, devido a convicções pessoais. No campo conceitual, Hume utiliza a distinção de argumentos, proposta por Locke, entre demonstrativos e prováveis e a expande, dividindo os argumentos em demonstrações, provas e probabilidades. Sendo as provas, aqueles argumentos da experiência aos quais não se pode oferecer oposição. Hume afirma ainda que a razão por si mesma não poderia fazer surgir qualquer ideia original, ao mesmo tempo em que desafia a causalidade, ao afirmar que a razão não seria capaz de concluir que a existência de uma causa seja um requisito absoluto. Derivações posteriores incluem ainda o Empirismo Lógico, tendo como expoentes os filósofos Nelson Goodman, W. V. Quine e Hilary Putnam e Karl Popper, e o Pragmatismo2, desenvolvido especialmente a partir das discussões entre Charles Sanders e William James. (Informações em: http://www.infoescola.com/filosofia/empirismo/ - 05/06/2017) 3.1.15 Kant Pensador alemão do século XVIII, pretende ser uma síntese entre o Racionalismo e o Empirismo. Para ele, não há ideias inatas, mas categorias da mente, pelas quais elaboramos o material da experiência sensorial. Por exemplo: as categorias de “espaço” e “tempo” são próprias da mente. Essas categorias elaboram o material indeterminado (“fenômeno”), que vem da experiência dos sentidos: em si, sem o material dos sentidos, as categorias são “vazias”, não têm conteúdo nenhum, são apenas “formas” para elaborar o material dos sentidos; por outro lado, o fenômeno (material dos sentidos) se não for elaborado pelas “categorias”, não é compreendido. O conhecimento, portanto, é, ao mesmo tempo, objetivo (porque seu conteúdo vem de fora: o “fenômeno”) e subjetivo (porque a mente acrescenta algo de si, “enquadra” o material dos sentidos). O nosso conhecimento só provém dos 2Fil corrente de ideias que prega que a validade de uma doutrina é determinada pelo seu bom êxito prático [É esp. aplicado ao movimento filosófico norte-americano baseado em ideias de Charles Sanders Peirce 1839-1914e William James 1842- 1910.]. sentidos (“fenômenos”), mas estes “fenômenos” são elaborados pela inteligência. A inovação de Kant consiste em afirmar que a realidade não é um dado exterior ao qual o intelecto deve se conformar, mas, ao contrário, o mundo dos fenômenos só existe na medida em que “aparece” para nós e, portanto, de certa forma participamos da sua construção. (ARANHA & PIRES: 1985, 178) Tal como Copérnico dissera que não é o Sol que gira em torno da Terra, mas é esta que gira em torno daquele, também Kant afirma que o conhecimento não é o reflexo do objeto exterior: é o próprio espírito que constrói o objeto do seu saber. Nesse sentido, dizemos que Kant realizou uma “revolução copernicana”. (ARANHA & PIRES: 1985, 179) Outra afirmação de Kant: o nosso conhecimento se limita aos “fenômenos”: conhecemos as coisas, tal como elas se apresentam aos sentidos. Nãopodemos conhecer as coisas como são em si, independentemente de nós (o “noumenon”). Muito menos há conhecimento de objetos que não são fenomênicos (negação da Metafísica como ciência). Immanuel Kant foi uma dos principais pensadores do período moderno da filosofia. Abordando questões que abrangiam desde a moralidade até a natureza do espaço e do tempo, Kant é reconhecido particularmente por promover a reunião conceitual entre o racionalismo, que tem em Descartes seu maior expoente, e o empirismo, tal como apresentado por Hume. Desta forma reunindo o potencial da razão humana e a relevância da experiência no processo de aquisição produção de conhecimento. Kant comparou a si mesmo com Copérnico, que reverteu a forma como vemos o sistema solar, na medida em que seu trabalho promoveu uma revolução similar na filosofia. Isto ocorreu quando Kant demonstrou como os problemas metafísicos tradicionais poderiam ser superados pela suposição de que a concordância entre os conceitos que usamos para conceber a realidade e a própria realidade, surge da conformação desta realidade na mente humana, de modo ativo e de forma que todos os humanos possam experimentá-la, e não porque nossos conceitos mentais passivamente reflitam a realidade, sem nada adicionar. Destarte, para Kant, a experiência era de extrema importância, mas a mente humana era a condição de possibilidade para qualquer experiência. A mente humana é o que nos permite transcender a mera atitude passiva em relação a realidade e termos experiências genuínas. Em sua Crítica da Razão Pura, de 1781, Kant leva este trabalho a cabo e busca afastar o ceticismo de filósofos como David Hume, promovendo a dissolução do impasse entre racionalistas e empiristas. Sua posição não implica em relativismo da realidade, de fato Kant defende uma realidade objetiva, para a qual cunhou o termo “coisa em si”, porém, se não pelas configurações específicas da mente humana a experiência da “coisa em si” é impossível, de modo que só temos acesso ao resultado de nossos conceitos aplicados sobre a realidade, para o que utilizou o termo “fenômeno”. Desta forma, não temos acesso à coisa é si, mas a mente humana não altera a realidade, enquanto coisa em si, ela altera a nossa experiência da realidade, o fenômeno, em última instância, a mente humana torna possível a experiência. Devido a estas mesmas configurações, conceitos como espaço e tempo são compartilhados por todas as mentes, de modo a tornar possível a comunicação, o conhecimento e a moral. Em ética, seu principal legado é o conceito de imperativo categórico, que utilizou para afastar a visão utilitarista. Em termos de filosofia politica, Kant foi uma expoente da ideia de que a Paz Perpétua seria o resultado da história universal, sendo atingida, em algum momento, e garantida sem um planejamento racional, mas pela cooperação internacional. O autor defendeu um estado baseado na lei, ou uma reunião de indivíduos sob a lei, com um governo republicano. Kant recusou a democracia direta, pois esta oferece risco a liberdade individual, comparando a democracia com o despotismo, uma vez que esta estabelece um poder executivo que pode governar contra a liberdade dos indivíduos que discordam da maioria. Criticou ainda que a democracia é normalmente identificada com a ideia de que todos governam, mas de fato o “todo” não é a totalidade. O autor propunha um governo misto, composto de elementos da democracia, aristocracia e monarquia, o que deveria servir para evitar as suas formas degeneradas, respectivamente anarquia, oligarquia e tirania. As posições e teorias de Kant continuam a ser estudadas ativamente, em campos clássicos como a política e a metafísica, assim como em campos contemporâneos como a ciência cognitiva e filosofia da psicologia. Entre seus maiores críticos encontramos os filósofos Arthur Schopenhauer e Johann Georg Hamann. (Informações em: http://www.infoescola.com/biografias/immanuel-kant/ – Acessado: 05/06/2017) 3.2 TEORIA DO CONHECIMENTO 3.2.1 Teoria do Conhecimento: objeto A Teoria do Conhecimento é uma reflexão filosófica com o objetivo de investigar as origens, as possibilidades, os fundamentos, a extensão e o valor do conhecimento. (COTRIM: 1993, 70) A Gnosiologia (grego: “gnosis” = conhecimento + “logia” = ciência) estuda a essência do conhecimento, a possibilidade de conhecer a realidade, as origens ou fontes de conhecimento, as formas ou espécies em que se reveste o conhecimento, bem como a validade do conhecimento em geral, isto é, o que é a verdade e qual o seu critério. (BAZARIN: 1985, 41) A Teoria do Conhecimento visa analisar a estrutura mental humana enquanto estrutura cognitiva, a qual tem duas funções básicas: a percepção e o entendimento. Os elementos da estrutura mental são: a sensibilidade (sentidos), a memória, a imaginação e o intelecto. O objeto da Teoria do Conhecimento é, portanto, o ato de conhecer humano. Envolve diversos aspectos: Possibilidade do conhecimento. Natureza (essência) do conhecimento. Origem (fontes) do conhecimento. Espécies de conhecimento. Validade do conhecimento (questão da verdade). Embora o problema do conhecimento tenha preocupado os filósofos desde a Antiguidade, somente a partir da Idade Moderna a teoria do conhecimento adquiriu grande importância, passando a ser tratada como uma das disciplinas centrais da filosofia. Para esse processo de valorização da teoria do conhecimento contribuíram, de forma decisiva, as obras do filósofo francês René Descartes (1596-1650), do filósofo inglês John Locke (1632- 1704) e do filósofo alemão Immanuel Kant (1724-1804). (COTRIM: 1993, 70) 3.2.2 Teoria do Conhecimento: diferenciação da Lógica Entretanto, se perguntássemos a diferenciação entre Lógica e Teoria do Conhecimento, o que poderíamos ressaltar? Vejamos: A Lógica trata do conhecimento em si, internamente (melhor dizendo: do pensamento), sua estrutura, sua correção, sem considerar a sua referência a um objeto; a Teoria do Conhecimento trata do conhecimento enquanto referido a um objeto. A lógica trata do conhecimento (pensamento) no aspecto formal (forma, estrutura), sem ater-se propriamente ao seu conteúdo; a Teoria do Conhecimento trata do conhecimento no aspecto material, isto é, seu conteúdo. A Lógica trata, enfim, do pensamento (pensamento é sempre uma operação mental); a Teoria do Conhecimento trata do conhecimento (conhecimento é sempre objetivo, sempre o conhecimento de alguma coisa). 3.2.3 Teoria do Conhecimento: conteúdo 3.2.3.1 Possibilidades do conhecimento É possível conhecer um objeto? É possível chegar à certeza no nosso conhecimento? Qual o alcance do nosso conhecimento? Até que ponto podemos, realmente, conhecer algo? A essas questões, temos as seguintes posições: Não: é a posição do ceticismo (não é possível um conhecimento certo); mas o próprio ceticismo absoluto é contraditório, pois ao afirmar que nada podemos conhecer, nos dá, automaticamente, um conhecimento (o nada conhecer)! Sim: temos a capacidade real de conhecer objetos (posição de Aristóteles, São Tomás, Fenomenologia, etc.). Em termos: é a posição do empirismo (limita o alcance do conhecimento, afirmando que somente podemos conhecer objetos dos quais temos experiência sensorial) e de Kant (somente podemos conhecer fenômenos, mas não as essências, a “coisa em si” dos objetos). 3.2.3.2 Natureza (essência) do conhecimento Aqui nos questionamos: O que significa “conhecer”? O que é determinante no conhecimento:o sujeito (consciência) ou o objeto? O conhecimento é “representação” ou “criação” do objeto? O objeto que está na nossa consciência é reflexo real ou é inteiramente construído pela mente? A essas questões, temos as seguintes posições: Filosofia clássica (realismo): o conhecimento é objetivo, a mente representa o objeto. Kant: o conhecimento é objetivo e subjetivo. Idealismo3: o conhecimento é subjetivo, a mente cria o objeto. 3.2.3.3 Origem (fontes) do conhecimento Qual a origem ou fonte dos conhecimentos humanos: a experiência ou a razão? De onde tiramos os nossos conhecimentos: da experiência, da razão ou de 3 O idealismo é uma corrente filosófica que emergiu apenas com o advento da modernidade, uma vez que a posição central da subjetividade é fundamental. Seu oposto é o materialismo. Tendo suas origens a partir da revolução filosófica iniciada por Descartes, é nos pensadores alemães que o Idealismo [1] está em geral associado, desde Kant até Hegel, que seria talvez o último grande idealista da modernidade. Muitos, ainda, acreditam que a teoria das ideias de Platão é historicamente o primeiro dos idealismos, em que a verdadeira realidade está no mundo das ideias, das formas inteligíveis, acessíveis apenas à razão. ambas as fontes? A essas questões temos as posições abaixo: Empirismo: da experiência sensorial exclusivamente. Idealismo: da razão exclusivamente. Filosofia Clássica: de ambas as fontes. O universo do conhecimento não é uma cópia do universo objetivo, mas uma construção efetuada pela inteligência, a partir dos dados sensíveis e correspondentes, sob sua forma imaterial, às realidades da experiência (...) O universo do conhecimento é, pois, o universo real, mas apreendido pelo espírito, segundo o modo imaterial que lhe é próprio (...) Nosso saber tem sua origem nos dados sensíveis, e de outra parte, que a razão compõe, a partir desses dados, um universo inteligível. (COTRIM: 1993, 75) 3.2.3.4 Espécies (formas) de conhecimento O conhecimento humano é único ou existem diferentes tipos de conhecimento? De modo geral, distinguem-se as seguintes espécies: Conhecimento sensorial (sensível): percepção direta dos objetos pelos sentidos, mediado pela imagem sensível, sempre concreto e do individual. Conhecimento intelectual (intelectivo): conhecimento próprio da inteligência; pelo processo de abstração, mediado pelo “conceito” ou “ideia”; sempre universal, elemento da ciência. Conhecimento intuitivo: compreensão, captação direta, imediata e unitária do objeto, sem a mediação do conceito (a linguagem, porém, explicita-se pelo conceito). As posições com referência às formas de conhecimento assim se estabelecem: Empirismo: admite só o conhecimento sensorial, exclusivamente. Maioria dos filósofos: admite dois gêneros de conhecimento: o sensorial e o intelectivo. Intuitivo: alguns filósofos propõem um terceiro gênero de conhecimento: o intuitivo (Bergson, Scheler, etc.). 3.2.3.5 Validade (verdade) do conhecimento “Quem julga que conhecemos tudo e que o conhecemos perfeitamente e que somos capazes de comunicar tudo o que conhecemos, comete um exagero não menor e não menos falso que o dos céticos. A verdade é que nas questões filosóficas nada é simples. Toda solução simples é uma solução falsa. E em geral é uma solução preguiçosa – como o é o ceticismo que nos livra de todo o dever de investigação longa e árdua, porque para ele nada há para investigar. A realidade é terrivelmente complexa e a verdade sobre ela também deve ser terrivelmente complexa. Só por um trabalho longo e árduo pode o homem apropriar-se de uma parte dela, não muito, mas sempre alguma coisa.” (BOCHENSKI, J.M. Questões Filosóficas) 4. EDUCAÇÃO HUMANA: FILOSOFIA DA EDUCAÇÃO 4.1. A EDUCAÇÃO COMO PROBLEMA FILOSÓFICO A educação, como todos sabemos, trata-se de um dado humano, ou seja, é resultado de uma construção cultural. É um fato que o ser humano não nasce “feito”, “pronto”; ele deve se formar, passa por uma longa fase de aprendizagem (a mais longa de todos os animais), precisa adquirir conhecimentos, habilidades e outros elementos para sobreviver, integrar-se no grupo social e, enfim, ter uma vida realmente digna e humana. É um fato que as gerações mais velhas “educam” as gerações mais novas (mesmo nas culturas mais primitivas), moldam o indivíduo de acordo com certos valores. O meio primordial da educação é o grupo familiar não obstante, a educação é complementada depois no meio social mais amplo, através de suas instituições típicas, como a escola, a Igreja, o Estado, etc. A educação levanta algumas interrogações ou questões mais de fundo sobre essa realidade: O que é mesmo a educação? Em que ela consiste? Que significa educar? Educar é moldar um indivíduo ou desenvolver suas potencialidades? Quais são os parâmetros da educação? Educar a partir de quê? De que ideias, modelos ou princípios? Quais são as dimensões da educação ou que aspectos da realidade humana a educação deve abranger? Quais são os valores envolvidos na educação? Quais são as finalidades da educação? A quem compete educar? Como fica a questão da família diante da educação? O Estado tem o direito de educar? Quais os compromissos e os limites do educador? Quais são as finalidades das instituições educacionais? O papel da família, Estado, Igreja quanto à educação? 4.1.1. As teorias da educação na história 4.1.1.1. Os ideais gregos da educação Podemos destacar os seguintes elementos da “filosofia da educação” grega: A educação fundamenta-se sobre o conceito do homem como sendo primariamente racional. A educação como desenvolvimento intelectual da personalidade, o que acarreta não só a aquisição da ciência, mas envolve também o aspecto moral (o viver segundo a razão; identificação socrática do sábio com o bom). Educação para o exercício da cidadania. O homem cabal é o cidadão. Aspecto estético da educação. O direito fundamental de educação pertence ao Estado (para Platão, direito exclusivo, os filhos devem ser entregues ao Estado para serem educados; os romanos transferem esse direito à família: “patria potestas”). 4.1.1.2. Educação Medieval Citamos como características da educação do Medievo: Influência do ideal grego: intelectualismo, trabalho “liberal”. Fundamenta-se sobre os princípios cristãos. Mesmo influenciado pelo intelectualismo grego, dá ênfase preponderante ao aspecto moral. Ênfase no ascetismo4 como controle da vontade. 4.1.1.3. Educação nos tempos modernos a) Rousseau: a educação moral Jean-Jacques Rousseau é o primeiro filósofo a tratar especificamente da educação, de modo específico na obra “Emílio”. Para o pensador francês, o homem é bom por natureza e a sociedade o corrompe (bom selvagem). Diante dessa concepção antropológica, a educação trata-se do desenvolvimento das capacidades naturais do indivíduo; é ela um processo e deve acompanhar o desenvolvimento natural do indivíduo, sem forçar etapas. Os primeiros movimentos da natureza são sempre honestos e não há perversidade original no coração humano. (ROUSSEAU. Emílio) A natureza quer que as crianças sejam crianças antes de serem homens. A infância tem certos modos de ver, de pensar e de sentir inteiramente especiais: nada é mais tolo do que querer substituí-los pelos nossos. (ROUSSEAU. Emílio) b) Pestalozzi, Herbart, Froebel: teóricos da educação no século XIX Os teóricos citados acima se restringem a comentários sobre a educação escolar. Pestalozzi: respeito à individualidade do educando; educação centrada não no conteúdo, mas no desenvolvimento intelectual; saber correspondente ao poder (conquistade técnicas), importância da relação pessoal professor / educando. Herbart: educação voltada para a modificação de conduta do educando. Froebel: educação pela atividade. 4 Ascetismo – (1) doutrina de pensamento ou de fé que considera a ascese, isto é, a disciplina e o autocontrole estritos do corpo e do espírito, um caminho imprescindível em direção a Deus, à verdade ou à virtude. (2) o conjunto de práticas, evitações e comportamentos condicionados por esta doutrina. c) Educação no século XX: Dewey, Killpatrick, Montessori, Freinet, Piaget, Makarenko No século XX surge uma “multidão” de autores que tratam da questão educacional e concorrem para a renovação pedagógica e metodológica. Seus princípios filosóficos são diversos: pragmatismo, personalismo, marxismo, etc. Não obstante, a nível profundo, o princípio educacional é comum a todos os pensadores: o aluno como sujeito da própria educação, liberdade, métodos auto-avaliativos, métodos, sócio-ativos, etc. 4.2. FILOSOFIA DA EDUCAÇÃO 4.2.1. Filosofia da Educação: conceituação A Filosofia Educacional procura compreender a educação em sua integridade, interpretando-a por meio dos conceitos gerais que guiem a nossa escolha de objetivos e diretrizes educacionais. (KNELLER: 1964, 12) A filosofia educacional depende da filosofia geral ou formal na medida em que os problemas da educação são de caráter filosófico geral. Não podemos criticar a política educacional vigente ou sugerir novas diretrizes sem tomar em consideração problemas filosóficos gerais como: a) a natureza da vida boa, que é um alvo primordial da educação; b) a natureza do próprio homem, que é o homem que estamos educando; c) a natureza da sociedade, pois a educação é um processo social; d) a natureza da realidade suprema, que todo o conhecimento procura penetrar. Portanto, a filosofia educacional envolve, entre outras coisas, a aplicação da filosofia formal ao campo da educação. (KNELLER: 1964, 13 – grifo acrescentado) São tarefas da Filosofia da Educação: 1. analisar a linguagem educacional; 2. fazer a hermenêutica geral do processo educativo; 3. analisar a estrutura constante do educacional; 4. divisar a teleologia da tarefa educativa. (FULLAT: 1995, 86 – grifo acrescentado) 4.2.2. Filosofia da Educação e Pedagogia A filosofia da educação é o campo da filosofia que se ocupa da reflexão sobre: os processos educativos, os sistemas educativos, a sistematização de métodos didáticos, entre outros temas relacionados com a pedagogia. Já a Pedagogia é a ciência da educação. Alimenta-se ela dos seguintes ramos do conhecimento: a) De outras ciências humanas (biologia, psicologia, sociologia, etc.) para o conhecimento da realidade educacional e de seu processo; b) Da Filosofia para estabelecer fundamentos e princípios teóricos da educação. Assim sendo, a Filosofia da Educação é a reflexão e a análise filosófica da realidade educacional. São, pois, diferentes, mas, ao mesmo tempo, correlativas: a Filosofia da Educação oferece a fundamentação e os princípios à Pedagogia e; esta, oferece dados de reflexão e análise àquela. 4.2.3. Filosofia da Educação: conteúdos 4.2.3.1. Educação: conceituação A palavra “educação” possui duas raízes semânticas: Educere: tirar, extrair, desenvolver as potencialidades. Educare: conduzir, guiar. Educação é a prática dos meios aptos para o desenvolvimento das possibilidades humanas do sujeito da educação. (FULLAT: 1995, 25) Educação é o processo que visa a levar o indivíduo, simultaneamente, a explicitar as suas virtualidades e a encontrar-se com a realidade para nela atuar de maneira consciente, eficiente e responsável, tendo em vista a continuidade e o desenvolvimento social, para serem atendidas as necessidades e as aspirações individuais e coletivas. (NERICI, I. O homem e a educação. p. 16) 4.2.3.2. Os princípios da educação A Filosofia da Educação possui a tarefa de questionar a própria educação sobre os princípios basilares de sua tarefa; quais são, afinal, os modelos e parâmetros a serem seguidos na tarefa educativa? Que tipo de ser humano queremos formar? No fundo, os princípios da educação baseiam-se e fundamentam-se numa filosofia antropológica, isto é, o modelo de educação que possuímos nasce de nosso modelo antropológico (forma de organização social pelo homem). 4.2.3.3. As dimensões da educação Diz-se que a educação deve ser “integral”; mas quais são os aspectos do ser humano que devem ser educados? Em que se constitui esta integralidade? Dimensão física e psicomotora. Dimensão intelectual. Dimensão psicológica. Dimensão social. Dimensão moral. Dimensão religiosa. Dimensão prático operativa. 4.2.3.4. O sujeito da educação A Filosofia da Educação se questiona sobre quem é, realmente, o sujeito ou quais são os sujeitos do ato educativo; aqui temos, então, os elementos proporcionados pelas ciências biológicas, psicológicas e sociais para o conhecimento da realidade biopsíquica do educando. • Platão – Conhecimento vem do intelecto. “A inteligência possui ideias próprias, inatas e independentes da experiência sensorial (ideias matemáticas, da alma, de Deus, etc.). Essas ideias são o fundamento da verdadeira ciência e não a experiência sensorial, que não é confiável.” • Aristóteles – (anterior à tábula rasa de John Locke ) O conhecimento vem da experiência pelos sentidos através dos mecanismos de uma faculdade superior: a inteligência cujo trabalho básico é a abstração e ligar os conceitos em juízos, raciocínios, etc. • Kant - Pensador alemão do século XVIII, pretende ser uma síntese entre o Racionalismo e o Empirismo. Para ele, não há ideias inatas, mas categorias da mente, pelas quais elaboramos o material da experiência sensorial. O conhecimento, portanto, é, ao mesmo tempo, objetivo (porque seu conteúdo vem de fora: o “fenômeno”) e subjetivo (porque a mente acrescenta algo de si, “enquadra” o material dos sentidos). O nosso conhecimento só provém dos sentidos (“fenômenos”), mas estes “fenômenos” são elaborados pela inteligência. Outra afirmação de Kant: o nosso conhecimento se limita aos “fenômenos”: conhecemos as coisas, tal como elas se apresentam aos sentidos. Para orientar a ação educativa em relação ao sujeito da educação surgem as teorias sociais que tentam explicar o homem em sua relação com a sociedade e estas teorias passam a influenciar fortemente a Educação, algumas delas já abordamos, mas outras precisarão ser pesquisadas por vocês. Procure saber mais sobre algumas delas: Racionalismo; Positivismo; Iluminismo; Idealismo; Neopositivismo; Pragmatismo; Personalismo; Marxismo, etc. 4.2.3.5. Os agentes da educação Destacam-se como agentes da educação as seguintes instituições: família, escola, Estado, Igreja, etc. Mas, afinal, qual o papel de cada uma dessas instituições? Ressalte-se que a educação primeira recai sobre a família e que depois as outras esferas da sociedade se encarregam de complementar esta formação por introduzir conceitos, princípios, valores que talvez sejam estranhos ao círculo familiar mas que permeiam a sociedade. Neste processo de “educação social” três esferas têm destaque: a Escola; o Estado e a Igreja. Não é nosso interesse abordar as questões de crenças e valores religiosos, mas tão somente apontar que os mesmos contribuem definitivamente para a concepção de ser humano, de cidadania, de sociedade e tantos outros conceitos que nos são inerentes e caros. Não obstante, é nosso interessedesvelar filosoficamente através da análise da Teoria da Escola como Aparelho Ideológico do Estado, as implicações da Escola enquanto instituição proporcionada pelo Estado e suas consequências. Estas precisam ser desveladas no contexto da formação de professores para que os futuros profissionais da educação não se deixem enganar e não sejam ingênuos, pois a educação não é “neutra”. O conhecimento também não é neutro e mesmo a filosofia não é neutra, prova disto é que existiam filósofos nazistas. Assim sendo, o conhecimento, a educação está sempre a serviço de alguma coisa que chamamos de “ideologia” (lembra-se dos sofistas que eram pagos para dar razão a quem os pagava), identificar as diversas ideologias e se posicionar a respeito delas é condição para o exercício da cidadania e imprescindível para quem quer ser professor/educador. Por esta razão em algum momento da formação neste curso (6º semestre – EJA) vocês analisarão o texto: ALTHUSSER: A ESCOLA COMO APARELHO IDEOLÓGICO DE ESTADO. 4.3. Concepção, Tendências e Correntes na Educação Brasileira As informações a seguir são um breve relato das contribuições presentes no livro: “Escola e Democracia”, de Demerval Saviani, em que o mesmo analisa e propõe o estudo das teorias da educação em sua relação com as diversas concepções de educação. Em seu livro Demerval analisa a situação da educação desde a época da sociedade sem escolas, passando pelas escolas, tradicionais nova tecnicista, em suas relações com o sistema socioeconômico vigente numa sociedade capitalista. Em seus apontamentos ele considera as concepções e tendências na educação brasileira como participantes de dois grandes grupos e propõe um terceiro: 4.3.1. As teorias não-críticas: Visão da educação como instrumento de equalização social, portanto, de superação da marginalidade. A sociedade é concebida como essencialmente harmônica, tendendo a integração de seus membros. Sendo a Marginalidade uma distorção acidental que deve ser corrigida através da educação, tendo esta, portanto, ampla margem de autonomia em face da sociedade. 4.3.1.1. Pedagogia Tradicional Inspirada no ideário da Revolução Francesa “Educação como direito de todos”, com objetivo de consolidar a democracia, transformar súditos em cidadãos, como antídoto à ignorância. A Escola é centrada no professor, necessitando de um professor eficiente que seja capaz de realizar a transmissão de conhecimentos. Ignora ou não dá atenção às lutas de classes na sociedade, tratando-as como “normais” e um simples reflexo da democracia. Resultados: Não foi bem-sucedida porque não foi capaz de universalizar o conhecimento e nem todos os bem-sucedidos neste modelo de escola conseguiram se ajustar na sociedade competitiva e excludente. 4.3.1.2. Pedagogia Nova Também conhecida como “Escolanovismo”: vê a educação como corretora da marginalização; sua função seria ajustar e adaptar os indivíduos à sociedade, para que sejam capazes de cumprir com sua função social (preestabelecida no sistema capitalista e de classes). Sob inspiração biológica e psicológica, propunha ser fundamental “aprender a aprender”. Suas contribuições consistem em um deslocamento dos “eixos” do processo educativo: Do intelecto para o sentimento. Do lógico para o psicólogo. Do conteúdo para o método. Do esforço para o interesse. Da disciplina para a espontaneidade. Da quantidade para a qualidade. Função do Professor: é visto como um estimulador do processo de aprendizagem. Principais consequências: Houve um afrouxamento da disciplina e um consequente rebaixamento do ensino para as camadas populares; não obstante proporcionou um aprimoramento da qualidade do ensino destinado às elites que possuem todos os recursos necessários a uma aprendizagem significativa. Como resultado obteve: Um agravo do problema da marginalidade. Difundiu o conhecimento técnico-pedagógico como fundamental. Reforçou a ideia de que é melhor uma escola para poucos do que uma escola diferente para muitos. 4.3.1.3. Pedagogia Tecnicista Emprestou o seu modelo da relação empresarial que pressupunha: organização, divisão do trabalho, mecanização do processo e operacionalização de objetivos. Introduziu as técnicas e os instrumentos técnicos, dando primazia ao processo de ensino e aprendizagem. É o processo que define o que os professores e alunos farão, como e quando o farão. Nesta concepção, a marginalização se dá através do surgimento daquele que se rotula como: incompetente, ineficiente e improdutivo. A questão é aprender a fazer, sendo o controle feito através de formulários a serem preenchidos. Teve como consequências para a classe trabalhadora (os mais pobres e dependentes da educação pública) os conteúdos rarefeitos e irrelevante ampliação de vaga em face aos índices de evasão e repetência. Isto se dá porque a educação está em sintonia dos interesses dos dominantes não dos dominados. Essas teorias são denominadas “não-críticas” porque desconhecem (ou não reconhecem) as determinantes sociais do fenômeno educativo. 4.3.2. As teorias “crítico-reprodutivistas”: Visão da educação como instrumento de discriminação social, logo fator de marginalização. Visão da sociedade dividida em classes antagônicas, e da marginalidade como fenômeno inerente a própria estrutura da sociedade que pressupõe o embate entre as classes. Vê a Educação como inteiramente dependente da estrutura social, sendo geradora da marginalidade, e tendo como função reforçar e legitimar a marginalização pela classificação e separação gerando as dualidades: dominantes X dominados; fortes X fracos; capazes X incapazes. As Teorias Crítico Reprodutivista postulam não ser possível compreender a educação senão a partir de seus condicionamentos sociais. Explicam o fracasso de todas as propostas anteriormente citadas porque o papel da escola era (é) reproduzir a sociedade de classes e reforçar o modo de produção capitalista (Bourdieu e Passeron). 4.3.2.1. Teoria do ensino enquanto violência simbólica. A função da educação é a de reprodução das classes sociais; pela reprodução cultural ela contribui para a reprodução social. Através da reprodução são dissimuladas as relações de força existentes (ocorre também através de jornais, igreja, moda, propaganda, educação familiar, etc.) Nesta concepção, a marginalização se dá através de grupos, sendo as classes dominadas as excluídas socialmente porque ficam à margem da sociedade por não possuírem força simbólica e representativa. 4.3.2.2. Teoria da escola enquanto aparelho ideológico de Estado (A.I.E.) A Escola, enquanto aparelho ideológico do estado contribui como um mecanismo construído pela burguesia para garantir e perpetuar seus interesses. Segundo Althusser existe a luta de classes mesmo na Escola, ainda que se diga que a educação é um direito de todos assegurado pelo governo, o controle e a luta de classes está presente na Escola, embora seja praticamente diluída. A escola se constitui no instrumento mais “acabado” de reprodução das relações de produção no modo capitalista. Os Marginalizados de acordo com esta teoria é toda a classe trabalhadora a quem as forças dominantes querem perpetuar em sua condição de dominados e alijados dos benefícios da sociedade moderna a que teriam direito se não estivessem à margem e sem saber como sair de sua condição devido ao controle ideológico. 4.3.2.3. Teoria da escola dualista. Proposta por Baudelot e Establete, diz que: “a escola, em quepese a aparência humanitária e unificadora, é dividida em duas grandes redes, as quais correspondem a divisão da sociedade capitalista com suas duas classes fundamentais: burguesia (escola de alto nível, ensino particular/público que abrange todos os níveis) e proletariado (escola pública padrão, precária e sem condições para uma melhoria no nível). Sendo assim a Escola reforça e legitima a marginalização, impedindo o desenvolvimento da ideologia da classe do proletariado e da luta revolucionária; (pois contribui apenas para a formação da força de trabalho necessária para servir e apoiar a ideologia burguesa); sendo assim, age duplamente como fator de marginalização. 4.3.2.4. Consequências destas Teorias Estas teorias mencionadas colocaram em evidência o comprometimento da educação (a Escola institucionalizada) com os interesses das classes dominantes e disseminaram entre os educadores desânimo e pessimismo por acharem que não é possível romper com as barreiras para mudar a atual situação de dominação e controle. Mas como dizia Einstein: “É tolice fazer algo do mesmo jeito e esperar um resultado diferente”. 4.3.3. A teoria crítico social dos conteúdos. Também denominada pedagogia revolucionária, busca “construir uma teoria pedagógica a partir da compreensão de nossa realidade histórica e social, a fim de tornar possível o papel mediador da educação no processo de transformação social.” As propostas desta tendência foram desenvolvidas, no Brasil, por Dermeval Saviani, o qual se baseia em vários autores, como: Marx, Grasmci, Kosik, Snyders, entre outros. Junto a Saviani, temos vários outros educadores que elaboram a favor desta corrente, dos quais destacamos José C. Libâneo, Carlos R. J. Cury e Guiomar N. de Mello. Como as outras tendências progressistas, a Crítico-social dos conteúdos também está preocupada com a função transformadora da educação em relação à sociedade, sem, com isso, negligenciar o processo de construção do conhecimento fundamentado nos conteúdos acumulados pela humanidade. Segundo Aranha (1996), a Pedagogia Crítico-social dos conteúdos, ou, como também é conhecida, a Pedagogia Histórica-crítica, busca: “Construir uma teoria pedagógica a partir da compreensão de nossa realidade histórica e social, a fim de tornar possível o papel mediador da educação no processo de transformação social. Não que a educação possa por si só produzir a democratização da sociedade, mas a mudança se faz de forma mediatizada, ou seja, por meio da transformação das consciências”. (ARANHA, 1996, p. 216). Pode-se perceber, na fundamentação desta tendência, uma preocupação com a transformação social, contudo, para tal, parte-se da compreensão da realidade, a partir da análise do mundo do trabalho, das vivências sociais, buscando entendê-lo não como algo natural, mas sim como algo construído culturalmente e neste sentido, tornando-o importante no processo de transformação social a mediação cultural. Da mesma maneira, é imprescindível conceber que a educação (via instituição Escola) trabalhe amplamente com os conteúdos. Neste caso, Libâneo (1994), a respeito do papel da escola, diz que: “A difusão de conteúdos é a tarefa primordial. Não conteúdos abstratos, mas vivos, concretos e, portanto, indissociáveis das realidades sociais. A valorização da escola como instrumento de apropriação do saber é o melhor serviço que se presta aos interesses populares, já que a própria escola pode contribuir para eliminar a seletividade social e torná-la democrática. Se a escola é parte integrante do todo social, agir dentro dela é também agir no rumo da transformação da sociedade. Se o que define uma pedagogia crítica é a consciência de seus condicionantes histórico-sociais, a função da pedagogia dos conteúdos é dar um passo à frente no papel transformador da escola, mas a partir das condições existentes”. (LIBÂNEO, 1994, p. 69 – grifo acrescentado). Ele continua afirmando: “Assim, a condição para que a escola sirva aos interesses populares é garantir a todos um bom ensino, isto é, a apropriação dos conteúdos escolares básicos, que tenham ressonância na vida dos alunos. Entendida nesse sentido, a educação é 'uma atividade mediadora no seio da prática social global', ou seja, uma das mediações pela qual o aluno, pela intervenção do professor e por sua própria participação ativa, passa de uma experiência inicialmente confusa e fragmentada (sincrética) a uma visão sintética, mais organizada e unificada”. (LIBÂNEO, 1994, p. 69). Para Libâneo, portanto, é fundamental que se entenda que: “A atuação da escola consiste na preparação do aluno para o mundo adulto e suas contradições, fornecendo-lhe um instrumental, por meio da aquisição de conteúdos e da socialização, para uma participação organizada e ativa na democratização da sociedade”. (LIBÂNEO, 1994, p. 70). Assim sendo, o processo educativo: “É passagem da desigualdade à igualdade. Portanto, somente é possível considerar o processo educativo em seu conjunto como democrático sob a condição de distinguir-se a democracia como possibilidade no ponto de partida e a democracia como realidade no ponto de chegada. Consequentemente, aqui também vale o aforismo: democracia é uma conquista; não um dado. (...) Não se trata de optar entre relações autoritárias ou democráticas no interior da sala de aula, mas de articular o trabalho desenvolvido nas escolas com o processo de democratização da sociedade. E a prática pedagógica contribui de modo específico, isto é, propriamente pedagógico para a democratização da sociedade, na medida em que se compreende como se coloca a questão da democracia relativamente à natureza própria do trabalho pedagógico”. (SAVIANI, 1987,80-82). Não se tem a pretensão de esgotar, a discussão sobre as tendências progressistas, muito pelo contrário, o intuito é o de fazer uma introdução a respeito de cada uma delas, para, a partir daqui, indicar um processo de aprofundamento posterior. Contudo, ainda abordar, de forma sucinta, características gerais do Construtivismo. O Construtivismo sintetiza as teorias que buscam vislumbrar os processos de construção do conhecimento, assim como discutir a complexidade do processo de aprendizagem. Vários autores dedicaram-se a estudos nesta linha, dos quais destacamos: Piaget (Epistemologia genética ou Construtivismo liberal piagetiano) e Vygotsky (Construtivismo sócio-histórico); mas também, é importante lembrar-se de Emília Ferreiro e Remi Wallon. Neste momento, é importante frisar que as teorias construtivistas buscam uma superação das teorias inatista e empirista, as quais buscam explicar as origens (fontes) do conhecimento, em que o inatismo afirma que o conhecimento é a priori (o sujeito nasce com os saberes – relacione com o pensamento dos filósofos) e, por outro lado, o empirismo acredita que o conhecimento é produzido a partir das sensações, das experiências (o sujeito é uma tábula rasa e suas experiências vão fornecendo os conhecimentos ao longo da vida – relacione com o pensamento dos filósofos). O conhecimento não pode ser concebido nem de uma forma (inata) nem de outra (conhecimento a posteriori) e, sim, o conhecimento necessariamente vai ser construído a partir das experiências e pelas características próprias do sujeito (fatores externos e internos do indivíduo – relacione com o pensamento dos filósofos), ou seja, cada indivíduo passa por várias etapas, em que organiza o pensamento e a afetividade. Diante dessa perspectiva, destaca-se