Buscar

DIREITO AO SILÊNCIO

Prévia do material em texto

DIREITO AO SILÊNCIO 
HUGO DE BRITO MACHADO 
Advogado, Professor Titular de Direito Tributário da 
Universidade Federal do Ceará e Desembargador Federal do 
Tribunal Regional Federal da 5.ª Região (Aposentado) 
 
Em editorial de primorosa feitura, o Diário do Nordeste 
comentou o lamentável episódio do qual foi palco o Senado Federal 
quando do depoimento de Celso Pita perante a CPI do Banestado (DN de 
06/05/04). Afirma, com razão, entre muitas outras verdades, que na 
experiência brasileira as CPIs geralmente se transformam em tribunais 
políticos, expondo à execração pública supostos acusados, condenados 
antecipadamente e sem apelação, de acordo com os interesses políticos 
do momento. Reporta-se à prisão do ex-Prefeito de São Paulo e diz que ali 
se viu um desfile de provocações, com o objetivo claro de desgastar o 
depoente, amparado por salvo-conduto emitido pelo ministro Cezar 
Peluso, do Supremo Tribunal Federal, que a ele assegurava o direito de 
não responder às perguntas que lhe fossem dirigidas, para não ser 
obrigado a produzir prova contra si mesmo. E conclui afirmando, com 
inteira propriedade, que em jogo estava a credibilidade das instituições 
políticas, abaladas com o abuso de poder de parlamentares 
despreparados. 
O Direito ao silêncio está assegurado pela vigente 
Constituição. É um direito fundamental que, por isto mesmo, nem por 
emenda constitucional pode ser abolido. A questão que precisa ser 
esclarecida, especialmente para os leitores do referido editorial, e de certa 
forma também para os ilustres Senadores da República, consiste em saber 
se o direito ao silêncio pode ser invocado por quem é intimado a depor na 
condição de testemunha. 
 
MACHADO, Hugo de Brito. Direito ao silêncio. 2004. Disponível em: 
<http://www.hugomachado.adv.br>. Acesso em: 04 out. 2005. 
Direito ao Silêncio 
 
Uma interpretação literal do dispositivo da Constituição que 
garante o direito ao silêncio nos levaria a afirmar que somente o preso 
tem esse direito. Tão absurdo entendimento, porém, já está fora de 
cogitação. Admite-se pacificamente que os acusados em geral têm direito 
ao silêncio. Subsiste, porém, a questão de saber se esse direito pode ser 
invocado por quem é chamado a depor como testemunha. E nas CPIs em 
geral prevalece o entendimento de que as testemunhas não podem 
invocar o direito ao silêncio. 
Daí a insatisfação de alguns parlamentares com o 
entendimento do Supremo Tribunal Federal no sentido de assegurar o 
direito ao silêncio a pessoas convocadas a depor, como foi o caso do ex-
Prefeito Celso Pita. 
Penso que a melhor interpretação é a que tem sido adotada 
pelo Supremo Tribunal Federal. Na verdade ninguém pode ser obrigado a 
se auto incriminar, seja qual for a condição na qual é chamado a 
responder perguntas. Tanto o acusado, como a testemunha, podem ficar 
calados diante de perguntas cuja resposta possa de algum modo implicar 
confissão do cometimento de ilícitos. 
A não ser assim o direito ao silêncio poderá ser facilmente 
contornado. Basta que a convocação se faça na condição de testemunha, 
como parece ocorrer geralmente nas CPIs. E até nas ações penais em 
geral, basta que o Ministério Público, em vez de oferecer denúncia contra 
aquele que quer obrigar a confessar, denuncie outras pessoas e o arrole 
como testemunha. Prestado o depoimento com a auto incriminação a 
denúncia será aditada, com a inclusão, como réu, daquele que antes era 
testemunha. É evidente, portanto, a fragilidade da interpretação restritiva 
da garantia constitucional. 
O direito ao silêncio é uma garantia de todos os cidadão. 
Ninguém, seja réu ou testemunha, pode ser compelido a responder algo 
2
 
MACHADO, Hugo de Brito. Direito ao silêncio. 2004. Disponível em: 
<http://www.hugomachado.adv.br>. Acesso em: 04 out. 2005. 
Direito ao Silêncio 
 
que eventualmente possa implicar confissão de cometimento ilícito. É um 
direito fundamental que integra os ordenamentos jurídicos de todos os 
países civilizados do Mundo. 
A prisão do ex-Prefeito Celso Pita, por desacato, foi na 
verdade um abuso de poder, uma forma oblíqua de desrespeitar a decisão 
do Supremo Tribunal Federal, em prejuízo da credibilidade das instituições 
do País, o que é lamentável sob todos os aspectos. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
3
 
MACHADO, Hugo de Brito. Direito ao silêncio. 2004. Disponível em: 
<http://www.hugomachado.adv.br>. Acesso em: 04 out. 2005.

Continue navegando