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1 OCORRÊNCIA DE PROTOZOÁRIO OPORTUNISTA DO GÊNERO ACANTHAMOEBA EM ÁGUA DE RECREAÇÃO Michelle Pires Cubilla 1 Alexander Welker Biondo Leonilda Correia dos Santos RESUMO A Acanthamoeba é um protozoário de vida livre, amplamente distribuído no meio ambiente, que pode causar sérias patologias, como a ceratite por Acanthamoeba e a encefalite granulomatosa amebiana. A exposição à água contaminada representa um risco potencial para indivíduos susceptíveis a infecções por esta ameba. O objetivo deste trabalho foi verificar a ocorrência de Acanthamoeba spp. em amostras de águas do rio Tamanduá e rio Tamanduazinho no município de Foz do Iguaçu, Paraná, Brasil, e salientar o risco da exposição de indivíduos susceptíveis a águas contaminadas por Acanthamoeba. Em outubro de 2007 foram analisadas no Laboratório Ambiental da Itaipu Binacional amostras de água provenientes de seis pontos do rio Tamanduá e três pontos do rio Tamanduazinho, totalizando 9 amostras. De cada amostra filtraram-se 3 litros através de membrana de nitrato de celulose. O lavado das membranas foi centrifugado e o sedimento foi utilizado para cultura de Acanthamoeba e para observação microscópica à fresco. Detectou-se a presença de Acanthamoeba spp. em 100% das amostras. O resultado evidencia o risco de desenvolvimento de patologias por Acanthamoeba em indivíduos susceptíveis, sejam usuários de lentes de contato, pessoas com lesões oculares ou imunossuprimidos, frente a utilização destas águas para prática recreativa ou esportiva. PALAVRAS-CHAVE: Acanthamoeba. Água de recreação. Ceratite. Imunossuprimidos. INTRODUÇÃO O gênero Acanthamoeba compreende um grupo de amebas de vida livre que vem, ao longo dos anos, ganhando importância no meio científico devido à possibilidade de causar sérias infecções, algumas vezes fatais (KHAN, 2006). São protozoários que podem viver livremente na natureza e ocasionalmente invadir e parasitar um hospedeiro, causando infecções em humanos e em animais (VISVESVARA; MOURA; SCHUSTER, 2007). Sua patogenicidade depende da 2 susceptibilidade do hospedeiro e de fatores de risco, comportando-se como um parasita oportunista (KHAN, 2006). A Acanthamoeba, atualmente considerada um agente infeccioso emergente (ODDÓ, 2006), pode causar duas doenças bem descritas, a encefalite granulomatosa amebiana e a ceratite por Acanthamoeba, além de provocar outros quadros patológicos (MARCIANO-CABRAL; CABRAL, 2003; KHAN, 2006). A encefalite granulomatosa amebiana é uma infecção oportunista rara, porém quase sempre fatal, que atinge o sistema nervoso central (KHAN, 2006). Esta patologia geralmente acomete indivíduos imunossuprimidos como pacientes debilitados, desnutridos, submetidos à terapias imunossupressoras, diabéticos, dependentes de álcool, com HIV/AIDS ou com outras doenças que inibam o sistema imune. Também já foi relatada em crianças e idosos. Sua porta de entrada pode ser o epitélio olfatório, o trato respiratório ou ainda lesões na pele (MARTINEZ; VISVESVARA, 1997; MARCIANO-CABRAL; CABRAL, 2003). A ceratite por Acanthamoeba ocorre quando a ameba infecta a superfície da córnea, causando ulceração crônica que pode levar à perda da visão (MARCIANO- CABRAL; CABRAL, 2003; KHAN, 2006). Segundo Schuster e Visvesvara (2004), a maioria das ocorrências de ceratite por Acanthamoeba se dá em pessoas imunocompetentes quando a ameba infecta a córnea através de algum trauma ou pequena escoriação. Muitos dos casos de ceratite por Acanthamoeba estão relacionados a usuários de lentes de contato com história de atividades aquáticas ou o uso de soluções salinas caseiras utilizadas na higienização das lentes de contato (MARTINEZ; VISVESVARA, 1997; LINDSAY et al., 2007). Centenas de casos desta doença já foram documentadas em todo o mundo (MARTINEZ; VISVESVARA, 1997). Outras infecções podem ser causadas por este protozoário como lesões cutâneas, pulmonares, sinusite, otite e infecções disseminadas, geralmente em indivíduos imunossuprimidos (MARCIANO-CABRAL; CABRAL, 2003). Além disso, age no ecossistema como carreador e reservatório de bactérias, vírus e outros microorganismos, atuando como vetor de agentes patogênicos e 1 Michelle Pires Cubilla. Farmacêutica Bioquímica – Especialista em Microbiologia Aplicada Programa de Pós Graduação da Universidade Federal do Paraná. Av. Florianópolis, 1262, Jardim Santa Rosa, Foz do Iguaçu, Paraná, Brasil – 85869-010. (45) 9942-5923 - micpires@gmail.com 3 representando um problema para a saúde pública, seja em ralação a doenças na comunidade ou nosocomiais (VISVESVARA; STEHR-GREEN, 1990; FORD, 1999; GREUB; RAOULT, 2002; MARCIANO-CABRAL; CABRAL, 2003; VISVESVARA; MOURA; SCHUSTER, 2007; SANTOS, 2007). Este protozoário tem alta prevalência no meio ambiente (SANTOS; PENKAL, 1999; MARCIANO-CABRAL; CABRAL, 2003; MAGHSOOD, 2005; KHAN, 2006), principalmente em ambientes aquáticos. Vários estudos relatam sua presença em rios, lagos, piscinas, água do mar, água tratada e água mineral (SALAZAR; MOURA; RAMOS, 1982; SANTOS; PENKAL, 1999; TOCZOLOWSKI et al., 2000; WALOCHNIK; OBWALLER; ASPÖCK, 2000; MARCIANO-CABRAL; CABRAL, 2003; GÓRNIK; KUŹNA-GRYGIEL, 2004; KHAN, 2004; TSVETKOVA et al., 2004; LORENZO-MORALES et al., 2005a; LORENZO-MORALES et al., 2005b; MAGHSOOD, 2005; KHAN, 2006; LORENZO-MORALES et al., 2006; SANTOS et al., 2006; CUBILLA, 2008). Desta forma, a exposição à água contaminada constitui um risco potencial de infecção por Acanthamoeba, seja causando ceratite, através do contato com os olhos durante natação, lazer ou outra atividade aquática; seja causando encefalite, pela exposição de indivíduos imunossuprimidos a esta água (FIGURA 1) (OBEID, 2003; KHAN, 2006). FIGURA 1 – Acanthamoeba tem se tornado um problema significante nos últimos anos, principalmente para usuários de lentes de contato expostos a água contaminada. FONTE: KHAN, 2004 4 Nesse contexto, a avaliação da ocorrência dessas amebas em águas onde há atividade humana, seja recreacional, pesca, uso para drenagem agrícola ou para uso doméstico, propicia maior entendimento acerca da distribuição ecológica, bem como serve de alerta quanto ao risco da exposição de indivíduos imunossuprimidos, pessoas fazendo uso de lentes de contato ou ainda com alguma lesão ou escoriação ocular à ambientes aquáticos contaminados (KHAN, 2006; LINDSAY et al., 2007). Conforme Lorenzo-Morales e colaboradores (2006), baseado na distribuição ecológica de Acanthamoeba, existe circulação de cepas entre humanos e o meio ambiente e sendo este um protozoário oportunista e causador de graves patologias, é de grande importância conhecer o perfil de locais onde há atividade recreacional ou esportiva envolvendo água. A bacia do rio Tamanduá possui uma área de 14.534,09 hectares. Está localizada nos municípios de Foz do Iguaçu e Santa Terezinha de Itaipu, no oeste do Paraná, e é responsável pelo abastecimento de água para mais de 40% da população do município de Foz do Iguaçu. A extensão do rio Tamanduá (FIGURA 2 e 3) é de 27.900 metros e desemboca no rio Iguaçu. O rio vem sendo utilizado ao longo dos anos para a agricultura, pecuária, irrigação, captação de água para consumo humano, lazer, esportes radicais como canoagem, e outros fins (FOZ DO IGUAÇU, 2009). FIGURA 2 - RIO TAMANDUÁ. Foz do Iguaçu, Paraná, Brasil. FONTE: GHELLERE, 2008 5 FIGURA 3 - RIO TAMANDUÁ. Foz do Iguaçu, Paraná, Brasil. FONTE: GHELLERE, 2008 OBJETIVOS Verificar a ocorrência de Acanthamoeba spp. em amostras de águas do rio Tamanduá e rio Tamanduazinho no município de Foz do Iguaçu – Paraná – Brasil. Salientar o risco da exposição de indivíduos susceptíveis a infecção por Acanthamoeba, seja no desenvolvimento de ceratite, encefalite ou outra patologia causada por esta ameba. MATERIAIS E MÉTODOS A pesquisa de Acanthamoeba foi realizada em amostras de água coletadas no rio Tamanduá e no rio Tamanduazinho, localizados no município de Foz do Iguaçu, Paraná. No rio Tamanduá foram selecionados 6 pontos distintos e no rio Tamanduazinho foram selecionados três pontos, totalizando 9 amostras. As coletas foram realizadas em outubro de 2007, em frasco estéril com capacidade de 5 litros, observando-se as normas de biossegurança (uso de luvas). 6 O processamento das análises foi realizado no Laboratório Ambiental da Itaipu Binacional em Foz do Iguaçu, Paraná, Brasil. De cada amostra foram filtradas alíquotas de 3 litros, por meio de sistema de filtração a vácuo, com membranas de 0,45 µm de porosidade. As membranas foram lavadas com 5 mL de água deionizada estéril e o lavado foi centrifugado a 2500 rpm por 5 minutos em tubos cônicos de vidro estéreis. Do sedimento foi realizada a observação direta entre lâmina e lamínula em microscópio ótico e a cultura para Acanthamoeba (SANTOS, 1999; GHELLERE, 2008). Para as culturas, inoculou-se 100 L em meio Müller-Hinton semeado previamente com cepa de Escherichia coli. A leitura foi realizada a partir do 7º dia de incubação a 36,0°C 0,5 até o 20º dia, sendo verificada a formação de crescimento ou movimento amebiano (caminhos no meio de cultura). Após o crescimento, os locais suspeitos (caminhos) foram lavados com 1 mL de salina para observação entre lâmina e lamínula, em aumento de 100x e 400x (SANTOS et al., 1999). RESULTADOS As 9 amostras analisadas (100%) apresentaram presença de Acanthamoeba spp. no exame direto e na cultura (FIGURA 1). FIGURA 1 - CISTOS DE Acanthamoeba spp. Microscopia ótica em aumento de 400X. FONTE: Laboratório Ambiental. Itaipu Binacional (2008) 7 CONCLUSÃO O estudo mostrou a ocorrência de Acanthamoeba spp. em 100% das 9 amostras analisadas, sendo 6 do rio Tamanduá e 3 do rio Tamanduazinho, localizados no município de Foz do Iguaçu, Paraná, Brasil, salientando para o risco da exposição à essas águas por indivíduos susceptíveis, seja no desenvolvimento de ceratite, encefalite ou outra patologia causada por esta ameba. Segundo Khan (2006), apesar de se acreditar que a ceratite por Acanthamoeba é uma infecção rara, ela tem se tornado cada vez mais reconhecida como importante problema de saúde humana. Devido à gravidade desta patologia, que pode causar sérios danos à córnea, levando a perda da acuidade visual ou à cegueira, é preciso haver uma maior sensibilização em relação aos cuidados com a saúde e higiene ocular, alertando-se para o risco da exposição dos olhos à água contaminada ou a outro veículo fonte de contaminação, principalmente, por usuários de lentes de contato ou pessoas que tenham alguma lesão nos olhos. Quanto a outras patologias causada por esta ameba, indivíduos imunossuprimidos, fundamentalmente, devem ser orientados a não realizarem atividades em águas contaminadas com Acanthamoeba. No que diz respeito à identificação e diagnóstico, à medida que estes agentes sejam determinados e seus quadros clínicos sejam mais familiares, será possível ter maiores possibilidades de diagnosticar e tratar as infecções por estas amebas, conforme corrobora Oddó (2006). Vale ressaltar a importância de estudos de controle ambiental desta ameba de vida livre, devido a sua versatilidade no ecossistema e sua capacidade de capturar outros microorganismos, exercendo um papel de vetor para bactérias patogênicas ao seres humanos e animais. Sugere-se outros estudos para determinar a importância ecológica e de saúde pública desse protozoário emergente nas águas de recreação. 8 REFERÊNCIAS CUBILLA, Michelle Pires. Pesquisa de Acanthamoeba spp. em água mineral engarrafada em embalagem retornável. 2008. 57 f. Monografia (Especialização em Microbiologia Aplicada), Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2008. FORD, T.E. Microbiological safety of drinking water: United States and global perspectives. Environmental Health Perspectives, v. 107, n. 1, p. 191-206, fev. 1999. FOZ DO IGUAÇU. Prefeitura Municipal. Disponível em: < http://www.fozdoiguacu.pr.gov.br/turismo/br/biblioteca/hidrografiaegeologia.htm>. Acesso em: 01 out 2009. GHELLERE, K. 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LORENZO-MORALES, J. et al. Evaluation of Acanthamoeba isolates from environmental sources in Tenerife, Canary Islands, Spain. Annals of Agricultural and Environmental Medicine, v. 12, p. 233-236, 2005a. LORENZO-MORALES, J. et al. Pathogenic Acanthamoeba strains from water sources in Jamaica, West Indies. Annals of Tropical Medicine and Parasitology, v. 99, p. 751-758, dec. 2005b. 9 LORENZO-MORALES, J. et al. Acanthamoeba isolates belonging to T1, T2, T3, T4 and T7 genotypes from environmental freshwater samples in the Nile Delta region, Egypt. Acta tropica, v. 100, p. 63-69, nov. 2006. MAGHSOOD, A. H. et al. Acanthamoeba genotype T4 from the UK and Iran and isolation of the T2 genotype from clinical isolates. J Med Microbiol, v. 54, p. 755-759, 2005. MARCIANO-CABRAL, F.; CABRAL, G. Acanthamoeba spp. as Agents of Disease in Humans. Clin Microbiol Rev, v.16, n. 2, p. 273-307, 2003. MARTINEZ A. J.; VISVESVARA, G.S. Free-living, Amphizoic and Opportunistic Amebas. 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