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Termodinâmica Aplicada Prof. Fabio Pontes 1 Aula 2: PRIMEIRA LEI DA TERMODINÂMICA Tópicos principais: • Conceitos em termodinâmica; • A natureza da energia; • A Primeira lei da termodinâmica; 1. INTRODUÇÃO A energia está na base da civilização. Ela é usada, a cada dia, em suas várias formas para sustentar a vida, para ficar suficientemente quente ou frio, para nos movermos e para pensar. Todos esses processos envolvem a liberação, a absorção, a transferência ou a conversão de energia. Um imenso esforço global está se desenvolvendo para encontrar novas fontes de energia, para usar a energia disponível de maneira mais eficiente e para conservar seu uso. O acesso à energia é um dos problemas principais que afetam a Humanidade, porque muita coisa depende disso [1]. O estudo das transformações da energia de uma forma para outra chama-se termodinâmica. A primeira lei da termodinâmica, preocupa-se em acompanhar as variações de energia e permite o cálculo da quantidade de calor que uma reação produz. É possível usar a termodinâmica mesmo se não se acredita na existência de átomos, embora, a interpretação das leis da termodinâmica em termos de modelos baseados no comportamento dos átomos e moléculas possibilite aprofundar a compreensão das propriedades da matéria. A ligação entre as propriedades dos átomos e as do grosso da matéria é a termodinâmica estatística, a interpretação das leis da termodinâmica em termos do comportamento médio do grande número de átomos e moléculas que formam uma amostra típica [1]. As leis da termodinâmica governam a química. Elas explicam por que as reações ocorrem e permitem a predição do calor que elas liberam e o trabalho que podem executar. A termodinâmica tem um papel importante em todos os aspectos de nossa vida. Assim, por exemplo, o calor liberado na queima de combustíveis é usado pata comparar o valor do combustível. Da mesma forma, a energia liberada pelos alimentos industrializados é registrada nos rótulos [1]. A termodinâmica estuda como a energia pode ser transformada de uma forma para outra e transferida de um lugar a outro. A eletricidade, por exemplo, pode ser gerada uma usina de força e ser usada em uma fábrica a grande distância. Os alimentos podem ser digeridos em seu estômago e a energia produzida ser usada em sua cabeça [1]. Inicialmente, neste capítulo, são definidos alguns conceitos, que juntamente com os conceitos da estequiometria e da lei dos gases ideais, podem fornecer um fundamento essencial para o entendimento deste tópico [1]. 2. PRINCIPAIS CONCEITOS EM TERMODINÂMICA Força (F): ação atrativa ou repulsiva entre dois ou mais corpos. As forças eletrostáticas têm elevada importância pois se estabelecem entre as partículas elétricas dos átomos e moléculas. Trabalho (W) A propriedade mais fundamental da termodinâmica — porque ela fornece a base da definição dos conceitos principais — é o trabalho, isto é, o movimento contra uma força oposta. Todas as formas de trabalho podem ser consideradas como equivalentes ao trabalho efetuado quando um peso é levantado contra a força da gravidade. A reação química em uma bateria realiza trabalho quando empurra uma corrente elétrica em um circuito. O gás em um cilindro — a mistura de gases quentes de um motor de automóvel, por exemplo, — realiza trabalho ao empurrar o pistão. Podemos identificar um processo que realiza trabalho observando se, pelo menos em princípio, ele é capaz de levantar um peso. A expansão de um gás, por exemplo, pode ser usada para levantar um peso, porque o pistão pode estar ligado ao peso. A corrente elétrica produzida por uma bateria pode ser usada para levantar um peso se o circuito inclui um motor elétrico [1]. O trabalho necessário para mover um objeto até uma certa distância, contra uma força que se opõe, é calculado multiplicando-se a força pela distância: W Fd Um sistema executa trabalho quando se expande contra uma pressão externa. (a) Um gás em um cilindro com um pistão preso. (b) O pistão é liberado e (desde que a pressão do gás seja superior à pressão externa, Pex) o gás se expande contra a pressão Pex. O trabalho realizado é proporcional à Pex e à variação de volume, ΔV, que o sistema experimenta. Este trabalho pode ser calculado pela seguinte expressão [1]. W P V Energia (E): é a capacidade de um sistema de executar um trabalho (e, em última análise, levantar um peso). Se um sistema pode executar muito trabalho, dizemos que ele tem muita energia. Um gás quente comprimido pode executar mais trabalho do que o mesmo gás após ter-se expandido e esfriado, e, por isso, dizemos que ele possui mais energia no início do processo. Quando um sistema executa trabalho na Termodinâmica Aplicada Prof. Fabio Pontes 2 vizinhança, sua capacidade de executar trabalho se reduz e dizemos que sua energia diminuiu. Se executamos trabalho em um sistema, como ao esticar uma mola, aumentamos sua capacidade de executar trabalho e, portanto, podemos dizer que sua energia aumentou [1]. Energia Cinética (Ec): associada ao movimento que um corpo executa. 2 2 c mv E Energia Potencial (Ep): é resultante das atrações e repulsões que um corpo exerce sobre outro. p E mgh Unidades de Energia: Joule (J): energia cinética para acelerar a massa de 1 kg a 1 m2/s2 em 1 m ou a aplicação de 1 N de força em um percurso de 1 m. Assim: 1 J = 1 kg.m2.s-2 ou ainda 1 kJ = 103 J Caloria (cal): 1 cal = 4,184 J. Calor (Q) A energia interna de um sistema, isto é, sua capacidade de realizar trabalho, pode ser alterada pela troca de energia com a vizinhança na forma de calor. Calor é um termo comum que em termodinâmica tem um significado especial. Em termodinâmica, calor é a energia transferida em consequência de uma diferença de temperatura. A energia flui na forma de calor de uma região de temperatura alta para uma região de temperatura baixa. Portanto, em um sistema cujas paredes não são isolantes térmicos, se o sistema está mais frio do que a vizinhança, a energia flui da vizinhança para o sistema [1]. O que é chamado, com frequência, de "energia térmica" de um sistema é a soma das energias cinética e potencial provenientes do movimento térmico caótico de átomos, íons e moléculas. As moléculas que estão em uma região de temperatura alta movem-se mais vigorosamente do que as moléculas que estão em uma região de temperatura baixa. Quando as duas regiões entram em contato, as moléculas que possuem mais energia da região de temperatura alta estimulam o movimento das moléculas da região de temperatura baixa. O resultado é que a energia interna do sistema mais frio aumenta enquanto a do sistema mais quente diminui. O "fluxo" de energia devido à diferença de temperatura é simplesmente a transferência da energia térmica do movimento, a energia associada com o movimento caótico das moléculas [1]. É preciso ter cuidado em não confundir os termos calor e energia térmica. Calor é energia em movimento devido à diferença de temperatura. A energia térmica, ou melhor, a energia do movimento térmico, é a energia associada com o movimento caótico de moléculas em temperaturas acima do zero absoluto [1]. Representamos a energia transferida para um sistema como Q. Portanto, quando a energia interna de um sistema se altera por transferência de energia na forma de calor (sem que nenhum outro processo ocorra), ΔU = Q. Se energia entra em um sistema como calor, a energia interna do sistemaaumenta e Q é positivo; se energia deixa o sistema como calor, a energia interna do sistema diminui e Q é negativo. Assim, se 10 J entram no sistema como calor, escrevemos Q = +10 J e (desde que nenhum trabalho é feito no sistema ou pelo sistema) ΔU = +10 J. Do mesmo modo, se 10 J deixam o sistema, Q = -10 J [1]. Energia entra em um sistema como calor Q > 0 Energia deixa o sistema como calor Q < 0 Como esses exemplos mostram, a energia transferida na forma de calor é medida, como qualquer forma de energia, em joules, J. Entretanto, uma unidade de energia que ainda é muito usada em bioquímica e campos correlatos é a caloria (cal). Na definição original, 1 cal correspondia à energia necessária para elevar de 1ºC a temperatura de 1 g de água. A definição moderna é 1 cal = 4,184 J (exatamente). Esta relação exata define a caloria em termos do joule, a unidade fundamental. A caloria nutricional, Cal, corresponde a 1 quilocaloria (kcal); logo, é importante verificar que unidades estão sendo usadas quando se trata do conteúdo energético de alimentos [1]. Um processo que libera calor para a vizinhança é chamado de processo exotérmico. As reações mais comuns — e todas as combustões, como as usadas nos meios de transporte e no aquecimento — são exotérmicas. As reações que absorvem calor da vizinhança são menos comuns. Um processo que absorve calor é chamado de processo endotérmico. Certos processos físicos comuns são endotérmicos. Um exemplo é a vaporização, que é endotérmica porque é necessário fornecer calor para afastar as moléculas de um líquido umas das outras. A dissolução de nitrato de amônio em água também é endotérmica. Aliás, esse é o processo empregado nas ataduras frias usadas em ferimentos de atletas [1]. Processo exotérmico: liberação de energia térmica (calor) do sistema para o meio ambiente. Processo endotérmico: transferência de calor do meio ambiente para o sistema. Em resumo, calor é a transferência de energia que ocorre em consequência de uma diferença de temperatura. Quando energia é transferida na forma de calor e nenhum outro processo ocorre, ΔU = Q. Quando energia entra em um sistema na forma de calor, Q é positivo; e quando energia sai de um sistema na forma de calor, Q é negativo. Ressalta-se que o calor e o trabalho são formas equivalentes de transferir energia de um sistema para sua vizinhança e, conforme será enunciado mais a frente, a energia total de um sistema isolado é constante [1]. Medida do calor A medida do calor produzido ou absorvido por um processo é usada para acompanhar a mudança da energia Termodinâmica Aplicada Prof. Fabio Pontes 3 interna de um sistema. Entretanto, antes de ver como isso é feito, temos de distinguir entre dois tipos de paredes que podem separar o sistema e sua vizinhança. Se as paredes são isolantes térmicos, o calor não pode atravessá-las mesmo se houver uma diferença de temperatura entre os dois lados da parede. As paredes de uma garrafa térmica são uma boa aproximação porque o vácuo entre elas não permite a condução de energia por moléculas entre as paredes e as superfícies cobertas de prata cortam a transferência de energia por radiação. O termo técnico usado para uma parede que é um isolante térmico é parede adiabática (do grego para "que não passa por"). Um sistema com paredes adiabáticas não é necessariamente um sistema isolado: a energia pode ser transferida de fora para dentro de um recipiente, ou vice- versa, na forma de trabalho. Em um sistema adiabático fechado, ΔU = W. Paredes diatérmicas permitem a transferência de energia na forma de calor [1]. Se o sistema não perde energia na forma de trabalho, o influxo de energia pelas paredes de um recipiente diatérmico aumenta a temperatura do sistema, logo o acompanhamento da mudança de temperatura é um modo de medir o calor transferido e, portanto, inferir a mudança da energia interna. Para converter uma mudança de temperatura em energia, precisamos conhecer a capacidade calorífica, C, isto é, a razão entre o calor fornecido e o aumento de temperatura que ele provoca [1]: ou Calor Fornecido Q Capacidade Calorífica C Aumento de Temperatura T Uma grande capacidade calorífica significa que uma dada quantidade de calor produz um pequeno aumento de temperatura. Uma pequena capacidade calorífica significa que mesmo uma pequena quantidade de energia transferida na forma de calor produz um grande aumento de temperatura. Conhecida a capacidade calorífica, pode-se medir a variação de temperatura, ΔT, do sistema e, então, calcular o calor fornecido [1]: Q = CΔT A capacidade calorífica é uma propriedade extensiva: quanto maior for a amostra, mais calor é necessário para aumentar sua temperatura e, portanto, maior sua capacidade calorífica. É comum, portanto, registrar a capacidade calorífica específica (freqüentetnente chamada de "calor específico"), c, que é a capacidade calorífica dividida pela massa da amostra (c = C / m), ou a capacidade calorífica molar, Cm, que é a capacidade calorífica dividida pela quantidade (em mols) da amostra (Cm = C / n) [1]. Podemos calcular a capacidade calorífica de uma substância a partir de sua massa e sua capacidade calorífica específica usando a expressão C = mc. Se conhecemos a massa de uma substância, sua capacidade calorífica específica e o aumento de temperatura que ocorre em um processo, a energia dada a substância na forma de calor é [1]: Q = CΔT = mcΔT Podemos usar uma expressão semelhante, C = nCm, para a capacidade calorífica molar de uma substância e escrever [1]: Q = CΔT = nCmΔT Essas expressões podem ser rearranjadas para o cálculo da capacidade calorífica específica ou molar a partir do aumento de temperatura provocado por uma dada quantidade de calor. Um ponto a notar é que a capacidade calorífica específica de uma solução diluída é normalmente igualada à do solvente puro (comumente água) [1]. Sistema e meio ambiente Para acompanhar a energia, dividimos o mundo, por conveniência, em duas partes. A região na qual estamos interessados, que pode ser, por exemplo, um recipiente contendo um gás, uni bécher de ácido ou uma fibra de músculo, é chamada de sistema (Figura a seguir). Tudo o mais, como, por exemplo, o banho-maria em que a mistura de reação está imersa, é chamado de vizinhança ou de meio ambiente. A vizinhança inclui a área onde fazemos observações sobre a energia transferida para o sistema ou retirada do sistema. O sistema e a vizinhança formam o universo, porém, com frequência, a parte do universo que é afetada em um processo é formada pela amostra, o vaso que a contém e um banho de água. Nestes casos, que incluem a maior parte dos processos deste livro, teremos de medir mudanças somente na amostra e sua vizinhança imediata [1]. Um sistema pode ser aberto, fechado ou isolado (Figura a seguir). Um sistema aberto pode trocar matéria e energia com a vizinhança. São exemplos de sistemas abertos os motores dos automóveis e o corpo humano. Um sistema fechado tem uma quantidade fixa de matéria, pode trocar energia com a vizinhança. São exemplos de sistemas fechados as bolsas de gelo usadas no tratamento de lesões de atletas. Um sistema isolado não tem contato com a vizinhança. Podemos imaginar um sistema isolado como completamente selado por paredes isolantes térmicas. Uma boa aproximação de sistema isolado é o café quente dentro de uma garrafa térmica [1]. Vaso ou Fronteira Termodinâmica Aplicada Prof. Fabio Pontes 4Sistema aberto: troca matéria e energia com o meio ambiente. Sistema fechado: troca apenas energia com o meio ambiente. Sistema isolado: não troca nem energia nem matéria com o meio ambiente. Energia interna do sistema (U) O conteúdo total de energia é chamado de energia interna. Não podemos medir o valor absoluto da energia interna de um sistema porque ele inclui as energias de todos os átomos, de seus elétrons e dos componentes dos núcleos. O melhor que podemos fazer é medir as variações de energia. Se um sistema realiza um trabalho de 15 J, por exemplo, ele consumiu uma parte da energia armazenada e dizemos que sua energia interna diminuiu 15 J, e escrevemos ΔU = - 15 J. Na termodinâmica, o símbolo ΔX significa uma diferença na propriedade X. Logo, neste caso, é medida a variação da energia interna [1]. f i U U U Em que Ui é a energia interna no início do processo e Uf é a energia interna no final do processo. 3. PRIMEIRA LEI DA TERMODINÂMICA Em muitos processos, a energia interna de um sistema muda em consequência do trabalho e do calor. Por exemplo, quando uma centelha acende a mistura de vapor de gasolina e ar no motor de um automóvel em movimento, o vapor queima e se expande, transferindo energia para a vizinhança na forma de calor e de trabalho. Em geral, a variação de energia interna de um sistema fechado é o resultado dos dois tipos de transferência. Assim, podemos escrever [1]: Q W U Essa expressão resume o fato experimental de que o calor e o trabalho são formas de transferência de energia e, portanto, de variação da energia interna de um sistema. A diferença molecular fundamental entre trabalho e calor é que, quando energia é transferida na forma de trabalho, o sistema movimenta moléculas da vizinhança em uma direção definida (pense nos átomos de um peso que se movem simultaneamente para cima), mas durante a transferência de energia na forma de calor as moléculas da vizinhança movem-se caoticamente (pense nos átomos de um objeto quente empurrando os átomos da vizinhança para movimentos randômicos mais vigorosos) [1]. A primeira lei está relacionada fortemente à conservação de energia, mas vai além. O conceito de calor não se aplica às partículas isoladas tratadas na mecânica clássica. A mesma pode ser enunciada da seguinte forma: “A energia não se cria, nem se destrói, apenas se transforma de uma forma em outra”. Variável de estado: são funções ou propriedades que não dependem da trajetória. Ex: Volume, temperatura, pressão, altitude, energia interna, dentre outras. A importância das funções de estado na termodinâmica é que, como elas só dependem do estado atual do sistema, se ele muda de um estado a outro, a variação da função de estado não depende de como a mudança foi feita. Uma função de estado é como a altitude em uma montanha. Podemos escolher vários caminhos diferentes entre dois pontos da montanha, mas a mudança de altitude entre os dois pontos será sempre a mesma, independentemente do caminho. Da mesma forma, se aumentamos a temperatura de 100 g de água, originalmente em 25ºC, até 60ºC, a energia interna variará uma certa quantidade. Se, todavia, aquecermos a mesma massa de água, em 25ºC, até a temperatura de fervura, deixarmos vaporizar toda a água, deixarmos condensar o vapor e resfriarmos o condensado até 60ºC, a variação total da energia interna é exatamente a mesma do processo anterior [1]. O trabalho realizado pelo sistema não é uma função de estado. Ele depende de como a mudança foi produzida. Por exemplo, poderíamos deixar um gás, em 25ºC, expandir-se, em temperatura constante (colocando-o em contato com um banho de água), até 100 cm3 de duas maneiras diferentes. No primeiro experimento, o gás poderia empurrar um pistão e realizar uma certa quantidade de trabalho contra uma força externa. No segundo, o gás poderia empurrar um pistão no vácuo e não realizar trabalho, porque não existe uma força oposta. A mudança de estado é a mesma em cada caso, mas o trabalho realizado pelo sistema é diferente: no primeiro caso, W é diferente de zero; no segundo caso, W = 0. De fato, até mesmo a linguagem cotidiana sugere que o trabalho não é uma função de estado, porque nunca falamos de um sistema como possuindo uma certa quantidade de "trabalho" [1]. Aberto Fechado Isolado En erg ia Int ern a Termodinâmica Aplicada Prof. Fabio Pontes 5 Da mesma forma, o calor não é uma função de estado. A energia transferida a um sistema como calor depende de como a mudança é produzida. Suponhamos, por exemplo, que desejamos aquecer 100 g de água de 25ºC até 30ºC. Uma possibilidade seria fornecer energia na forma de calor, usando um aquecedor elétrico. O calor necessário pode ser calculado a partir da capacidade calorífica específica da água: Q = (4,18 J/(ºC.g).(100 g).(5ºC) = + 2 kJ. Outra, seria agitar a água vigorosamente com pás até que 2 kJ de trabalho fossem transferidos. Neste último caso, toda a energia requerida é transferida como trabalho e não como calor. Assim, no primeiro caso, Q = +2 kJ; e, no segundo caso, Q = 0. O estado final do sistema, porém, é o mesmo nos dois casos. Como o calor não é uma função de estado, não deveríamos falar de um sistema como possuindo uma certa quantidade de "calor" [1]. Como a energia interna é uma função de estado, podemos escolher qualquer caminho conveniente entre os estados inicial e final de um sistema e calcular ΔU para aquele caminho. O resultado terá o mesmo valor de ΔU que teria o caminho verdadeiro entre os dois estados, mesmo que este último seja tão complicado que não seja possível calcular ΔU diretamente. Em alguns casos, podemos usar nosso conhecimento intuitivo das moléculas para predizer a variação de energia interna sem ter de calculá-la. Por exemplo, quando um gás ideal se expande isotermicamente, suas moléculas continuam a se mover na mesma velocidade média. Como não existem forças entre as moléculas, sua energia potencial total também permanece a mesma, ainda que a separação média tenha aumentado. Como a energia cinética total ou a energia potencial total não mudam, a energia interna do gás também não muda. Segue-se, portanto, que quando uma amostra de um gás ideal muda, por qualquer caminho, entre dois estados, desde que a temperatura dos estados inicial e final seja a mesma, sabemos imediatamente que ΔU = 0 [1]. Convenção para o sinal de Q, W e ΔU: W > 0: trabalho de expansão – sistema sobre o meio ambiente. W < 0: trabalho de compressão – meio ambiente sobre o sistema. Q > 0: processo endotérmico – meio ambiente para o sistema. Q < 0: processo exotérmico – sistema para o meio ambiente. ΔU > 0: sistema absorve energia. ΔU < 0: sistema libera energia. 4. ENTALPIA (H) Se o sistema tem paredes rígidas, seu volume permanece constante mesmo quando ocorrem outras mudanças, logo, nenhum trabalho de expansão é executado. Suponha também que o sistema não executa trabalho de não expansão (por exemplo, não é uma bateria elétrica acionando um motor elétrico). Podemos, então, fazer W = 0 (ΔU = W + Q) e escrever que em volume constante e sem trabalho de não expansão: U Q [1]. Em outras palavras, em um sistema deste tipo a mudança de energia interna é igual à energia a ele fornecida na forma de calor e podemos seguir mudanças na energia interna acompanhando o fluxo de energia na forma de calor que entra ou sai do sistema. Em química, entretanto, estamos mais interessados nas transferências de calor em pressão constante. Muitas reações químicasocorrem em recipientes abertos para a atmosfera e, portanto, em pressão constante de cerca de 1 atm. Esses sistemas podem se expandir ou contrair livremente. Se um gás se forma, ele trabalha contra a atmosfera para ocupar espaço. Embora nenhum pistão esteja envolvido, trabalho é realizado. Se, por exemplo, em algum processo, nós fornecermos 100 J de calor para o sistema (Q = +100 J) e o sistema realiza 20 J de trabalho (W = —20 J) ao se expandir em pressão constante, a energia interna só aumenta 80 J. Precisamos de outra função de estado que permita o acompanhamento das variações de energia em pressão constante e que leve em conta automaticamente as perdas de energia do trabalho de expansão [1]. Transferência de calor sob pressão constante A função de estado que permite obter informações sobre as variações de energia em pressão constante é chamada de entalpia, H [1]: H U PV Em que U, P e V são a energia interna, a pressão e o volume do sistema. Podemos ver que a entalpia é uma função de estado notando que U (da primeira lei), P e V são funções de estado; logo, H = U + PV tem de ser também uma função de estado. O que temos de mostrar agora é que uma consequência dessa definição é que a variação da entalpia de ton sistema é igual ao calor liberado ou absorvido em pressão constante [1]. Imaginemos um sistema em pressão constante, no qual a energia interna varia ΔU e o volume, ΔV. Segue-se, então, pela definição de entalpia, que a variação de entalpia é [1]: H U P V em pressão constante Usamos agora ΔU = Q + W, em que Q é a energia fornecida ao sistema na forma de calor e W é a energia fornecida na forma de trabalho. Então [1], H Q W P V Suponhamos, agora, que o sistema só pode executar trabalho de expansão. Neste caso usando a W = - Pext.ΔV, tem- se [1]: ext VQ PH P V Termodinâmica Aplicada Prof. Fabio Pontes 6 Por fim, como o sistema está aberto para a atmosfera, a pressão é igual à pressão externa, isto é, Pext = P, e os últimos dois termos se cancelam de modo que [1]: H Q A variação de entalpia é igual ao calor fornecido ao sistema em pressão constante [1]. É possível mostrar que, para um sistema que só pode realizar trabalho de expansão, em pressão constante e sem trabalho de não expansão: H Q . A importância dessa equação é que, como as reações químicas geralmente ocorrem cm pressão constante, cm reatores abertos para a atmosfera, o calor que elas fornecem ou utilizam pode ser igualado à variação de entalpia do sistema. Segue-se que, se estudamos a reação em um calorímetro aberto para a atmosfera, a medida do aumento de temperatura nos dá a entalpia da reação. Se, por exemplo, uma reação libera 1,25 kJ de calor nesse tipo de calorímetro, podemos escrever Q = -1,25 kJ. É importante compreender que a entalpia não é uma medida da energia do sistema no mesmo sentido fundamental da energia interna. É na verdade um instrumento para acompanhar e explicar os efeitos da mudança de volume durante trocas de calor sob pressão constante. Quando transferimos energia, na forma de calor, a um sistema cm pressão constante, a entalpia do sistema aumenta nessa mesma proporção. Quando energia deixa um sistema em pressão constante, na forma de calor, a entalpia do sistema diminui nessa mesma proporção. A formação de iodeto de zinco a partir de seus elementos, por exemplo, é uma reação exotérmica que (em pressão constante) libera 208 kJ de calor para a vizinhança por mol de ZnI2 formado: Zn(s) + I2(s) → ZnI2(s) Pode-se, então, dizer que ΔH = -208 kJ porque a entalpia da mistura de reação diminuiu em 208 kJ nessa reação. E como um processo endotérmico absorve calor, então, quando nitrato de amónio se dissolve água, por exemplo, a entalpia do sistema aumenta. Observe que ΔH < 0, para reações exotérmicas, e ΔH > 0, para reações endotérmicas. Capacidades caloríficas dos gases em volume e pressão constantes Como explicado anteriormente, a capacidade calorífica C é a constante de proporcionalidade entre o calor fornecido a uma substância e o aumento de temperatura produzido (Q = CΔT). Entretanto, o aumento de temperatura e, portanto, a capacidade calorífica dependem das condições de aquecimento, porque, em pressão constante, parte do calor é usada para o trabalho de expansão e não para o aquecimento do sistema. Temos de aprimorar nossa definição de capacidade calorífica [1]. Como o calor transferido em volume constante pode ser identificado com a variação da energia interna, ΔU, podemos combinar ΔU = Q com C = Q / ΔT e definir a capacidade calorífica em volume constante, Cv, como [1]: v U C T Do mesmo modo, como o calor transferido sob pressão constante pode ser identificado com a variação de entalpia, ΔH, podemos definir a capacidade calorífica em pressão constante, Cp, como [1]: p H C T As capacidades caloríficas molares correspondentes são essas quantidades divididas pela quantidade de substância e são representadas por Cv,m e Cp,m. As mesmas para um sólido têm valores comparáveis, assim como para os líquidos, mas o mesmo não ocorre com os gases. A diferença reflete o fato de que os gases se expandem muito mais do que os sólidos e líquidos quando aquecidos e um gás perde mais energia quando aquecido a pressão constante do que um sólido ou um líquido. Podemos usar a definição de entalpia e a lei dos gases ideais para obter uma relação quantitativa simples entre Cp e Cv para um gás ideal. As duas capacidades caloríficas molares de um gás ideal se relacionam por [1]: , ,p m v mC C R Como exemplo, a capacidade calorífica molar em volume constante do argônio é 12,8, logo, o valor correspondente em pressão constante é 12,8 + 8,3 = 21,1; uma diferença de 65%. A capacidade calorífica em pressão constante é maior do que em volume constante porque em pressão constante nem todo o calor fornecido é usado para aumentar a temperatura: parte volta à vizinhança como trabalho de expansão e C = Q / ΔT é maior (porque AT é menor) do que em volume constante (quando toda a energia permanece no sistema) [1]. Assim, A capacidade calorífica molar de um gás ideal em pressão constante é maior do que em volume constante e a equação anterior relaciona as duas quantidades [1]. Em qualquer processo físico: f i H H H Em qualquer reação química: p r H H H Em que: Hp e Hr são, respectivamente, as entalpias dos reagentes e dos produtos. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. ATKINS, P; JONES, L. Princípios de Química: Questionando a Vida Moderna. Porto Alegre: Bookman 2010. 2. ATKINS, P; DE PAULA, J. Físico-Química. Vol. 1 e 2. Rio de Janeiro: LTC, 2008. Termodinâmica Aplicada Prof. Fabio Pontes 7 3. ÇENGEL, Y.; BOLES, M. Termodinâmica. 7ª ed. Porto Alegre: McGraw-Hill, 2013. 4. LEVENSPIEL, OCTAVE. Termodinâmica Amistosa para Engenheiros. São Paulo: Edgard Blücher LTDA, 2002. 5. MORAN, M. J.; SHAPIRO, H. N. Princípios de termodinâmica para engenharia. 6ª. ed. Rio de Janeiro: LTC, 2009. EXERCÍCIOS DE PRIMEIRA LEI 01. Suponha que um gás sofra uma expansão de 500 mL contra uma pressão de 1,20 atm e não houve troca de calor com a vizinhança durante a expansão. a) Qual foi o trabalho realizado na expansão? b) Qual foi a mudança de energia interna do sistema? 02. Um pistão confina 0,100 mol de Ar(g) em um volume de 1,00 L em 25°C. Dois experimentos são feitos. a) O gás expande-se até 2,00 L contra a pressão constante de1,00 atm. b) O gás expande-se reversível e isotermicamente até o mesmo volume final. Que processo executa mais trabalho? 03. Enquanto se expande, um gás recebe o calor Q = 100 J e realiza o trabalho W = 70 J. Ao final do processo, podemos afirmar que a energia interna do gás: a) aumentou 170 J b) aumentou 100 J c) aumentou 30 J d) diminuiu 70 J e) diminuiu 30 J 04. Qual é a variação de energia interna de um gás ideal sobre o qual é realizado um trabalho de 80 J durante uma compressão isotérmica? a) 80 J b) 40 J c) Zero d) – 40 J e) – 80 J 05. Um cilindro de parede lateral adiabática tem sua base em contato com uma fonte térmica e é fechado por um êmbolo adiabático pesando 100 N. O êmbolo pode deslizar sem atrito ao longo do cilindro, no interior do qual existe uma certa quantidade de gás ideal. O gás absorve uma quantidade de calor de 40 J da fonte térmica e se expande lentamente, fazendo o êmbolo subir até atingir uma distância de 10 cm acima da sua posição original. Nesse processo, a energia interna do gás: a) diminui 50 J b) diminui 30 J; c) não se modifica d) aumenta 30 J; e) aumenta 50 J. 06. Considere um cilindro de paredes termicamente isoladas, com exceção da base inferior, que é condutora de calor. O cilindro está munido de um êmbolo de área 0,01 m² e peso 25 N, que pode mover-se sem atrito. O êmbolo separa o cilindro em uma parte superior, onde existe vácuo, e uma parte inferior, onde há um gás ideal, com 0,01 mol e volume inicial de 10 litros. À medida em que o gás é aquecido, o êmbolo sobe até uma altura máxima de 0,1 m, onde um limitador de curso o impede de subir mais. Em seguida, o aquecimento prossegue até que a pressão do gás duplique. Com base nessas informações, é correto afirmar: (01) Enquanto o êmbolo estiver subindo, o processo é isobárico. (02) Após o êmbolo ter atingido o limitador, o processo é adiabático. (04) O trabalho realizado no trecho de expansão do gás é de 2,5 J. (08) A temperatura no instante inicial é igual a 402 K. (16) O calor fornecido ao gás, na etapa de expansão, é utilizado para realizar trabalho e para aumentar a temperatura do gás. (32) O trabalho realizado pelo gás durante a etapa de expansão é igual ao trabalho total realizado pelo gás desde o início do aquecimento até o momento em que o gás atinge o dobro da pressão inicial. Resultado: Soma = __________ 07. Quando um gás ideal sofre uma expansão isotérmica, a) a energia recebida pelo gás na forma de calor é igual ao trabalho realizado pelo gás na expansão; b) não troca energia na forma de calor com o meio exterior; c) não troca energia na forma de trabalho com o meio exterior; d) a energia recebida pelo gás na forma de calor é igual à variação da energia interna do gás; e) o trabalho realizado pelo gás é igual à variação da energia interna do gás. 08. Uma certa quantidade de ar contido num cilindro com pistão é comprimida adiabaticamente, realizando-se um trabalho de -1,5kJ. Portanto, os valores do calor trocado com o meio externo e da variação de energia interna do ar nessa compressão adiabática são, respectivamente, a) -1,5kJ e 1,5kJ b) 0,0kJ e -1,5kJ Termodinâmica Aplicada Prof. Fabio Pontes 8 c) 0,0kJ e 1,5kJ d) 1,5kJ e -1,5kJ e) 1,5kJ e 0,0kJ. 09. A primeira lei da termodinâmica diz respeito à: a) dilatação térmica b) conservação da massa c) conservação da quantidade de movimento d) conservação da energia e) irreversibilidade do tempo 10. A Primeira Lei da Termodinâmica estabelece que o aumento da energia interna de um sistema é dado por ∆U = Q + W, no qual Q é o calor recebido pelo sistema, e W é o trabalho que esse sistema realiza. Se um gás real sofre uma compressão adiabática, então, a) Q = ∆U b) Q = W c) W = 0 d) Q = 0 e) ∆U = 0
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