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Aula 7 texto I O GOVERNO SARNEY

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O GOVERNO SARNEY 
 
A partir de 1986, com o governo da Nova República (governo José Sarney), 
mudou-se o diagnóstico sobre a inflação brasileira e, conseqüentemente, as novas 
políticas de combate à inflação. Tratava-se de um quadro de inflação inercial. Os 
pressupostos teóricos eram os de que a economia brasileira se encontrava 
altamente indexada, ou seja, todos os negócios, contratos etc. eram firmados com 
base em índices que procuravam garantir a correção monetária dos valores 
envolvidos. Dessa forma, todos os aumentos de preços eram captados pelos índices 
e, automaticamente, repassados para todos os demais preços da economia, 
gerando um processo automático de realimentação da inflação. Foi por meio desse 
diagnóstico inercialista que, como estudaremos depois, a partir do Plano Cruzado 
procurou-se romper com esse mecanismo de propagação da inflação, utilizando 
basicamente o congelamento de preços, salários e de câmbio (a chamada política 
heterodoxa), numa tentativa de eliminar a “memória” inflacionária. 
 
No ano de 1984, o Brasil estava envolvido em um momento muito 
significativo da sua história republicana pois, após vinte anos de um regime militar, 
ganhava força um grande movimento que desejava eleições diretas para presidente 
da República. Este movimento ficou conhecido, por meio da mídia, como o 
movimento por eleições “Diretas Já”. 
 
Tal movimento manifestava o desejo da sociedade brasileira de ter o direito 
de votar diretamente para Presidente da República e, ao mesmo tempo, o desejo 
da volta da democracia e com esta os direitos civis e políticos, bem como um 
melhor ambiente econômico; enfim, havia esperanças por uma nova realidade 
nacional. Havia comícios no país e tentou-se por meio da votação da Emenda Dante 
de Oliveira restabelecer o direito do voto popular e direto para Presidente da 
República. Mas apesar disso, a emenda não foi aprovada no Congresso Nacional por 
falta de “quorum”. 
 
A partir daí, através de uma grande articulação política, e por meio de 
eleições indiretas no Colégio Eleitoral, em 1985, Tancredo Neves foi eleito 
Presidente da República depois de 20 anos de ditadura militar. Porém, Tancredo 
Neves não chegou a tomar posse, pois veio a falecer devido a uma infecção 
generalizada em abril de 1985. Assumiu como Presidente da República o vice de 
Tancredo, José Sarney. 
 
 
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Antes da morte de Tancredo Neves, sua assessoria econômica identificou 
quatro problemas graves que asfixiavam a economia brasileira em meados da 
década de 1980: 
 
 a recessão econômica; 
 os elevados índices de inflação: acima de 200% ao ano; 
 o déficit do setor público e a elevada dívida interna; 
 a dívida externa e a sangria dos juros. 
 
Outros problemas eram também preocupantes: 
 
 a defasagem dos preços de bens e tarifas de serviços públicos prestados 
pelas empresas estatais; 
 os crônicos desequilíbrios na distribuição de renda; 
 o desemprego. 
 
A par dos graves problemas, a herança deixada por Figueiredo ao novo 
governo incluía também ao menos três aspectos positivos no campo econômico: 
 
 a economia retomara o crescimento a partir da segunda metade de 1984; 
 o balanço de pagamentos apresentava uma situação saudável, graças ao 
aumento das exportações; 
 a boa situação das reservas cambiais, que atingiam aproximadamente US$ 
12 bilhões, dando relativa folga ao sucessor para definir e implementar sua 
orientação econômica. 
 
A partir desse diagnóstico e já como Presidente da República, José Sarney 
definiu as diretrizes de atuação do seu governo, contemplando quatro linhas 
básicas: 
 
 crescimento econômico auto-sustentado, com geração de empregos e 
melhoria progressiva dos salários e das condições de vida da população e 
rigoroso combate à inflação; 
 redução do déficit público e controle da dívida interna; 
 equacionamento do problema da dívida externa e da questão dos juros, de 
modo que a transferência de capital para o exterior não prejudicasse os 
 
 
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investimentos necessários e o crescimento econômico, o que exigia uma 
ampla renegociação, com reprogramação global da dívida e dos juros, em 
condições tais que resguardassem a soberania nacional e preservassem o 
povo de sacrifícios insuportáveis. 
 
Havia, porém, grande distância entre os propósitos anunciados e as 
possibilidades concretas para a sua realização. Nas duas décadas do regime militar, 
com ampla utilização de recursos externos, os governos conseguiram promover um 
certo crescimento acelerado da economia brasileira, mas, depois, no início dos anos 
1980, o país quase faliu. O novo governo (civil) pretendia obter, ao mesmo tempo, 
crescimento auto-sustentado, geração de empregos, distribuição de renda, controle 
da inflação e controle das dívidas externa e interna. A questão básica que se 
colocava para viabilizar tal projeto era: com que recursos? Infelizmente, para tal 
questão, não havia resposta segura e factível. 
 
Sarney tinha em seu governo uma equipe econômica indicada por Tancredo 
Neves. A área da Fazenda ficou a cargo de Francisco Dornelles e João Sayad na 
área de Planejamento. A Fazenda adotou uma linha de austeridade (“É proibido 
gastar”), seu titular procurava executar a incumbência (recebida do tio doente e 
que logo após veio a morrer) de reduzir o déficit público e, por conseqüência, a 
inflação (“pôr a casa em ordem”). O Planejamento voltava-se para o médio e longo 
prazos. Em agosto de 1985 ocorreu a substituição de Dornelles por Dílson Funaro 
na Pasta da Fazenda, com o propósito de dar mais unidade e implementar 
mudanças na política econômica. 
 
Os primeiros meses do novo governo (tendo como Presidente da República 
José Sarney) caracterizaram-se por um quase imobilismo. Faltava-lhe comando. 
Primeiro, em decorrência da prolongada agonia de Tancredo e, a seguir, da 
fraqueza e das hesitações de Sarney, inseguro e ofuscado pela sombra todo-
poderosa do deputado Ulysses Guimarães e do PMDB. Mesmo assim, a economia 
cresceu 7,8% em 1985, enquanto a inflação apresentou relativo declínio em alguns 
meses. A expansão das atividades econômicas foi puxada: 
 
 pelas exportações; 
 pela dinamização do mercado interno, impulsionada por três fatores 
principais: 
 
 
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ƒ a credibilidade do novo governo, apesar da morte de Tancredo 
Neves; 
ƒ uma farta safra agrícola, beneficiada por condições climáticas 
favoráveis; 
ƒ o aumento do poder aquisitivo da população, graças à 
concessão de reajustes salariais um pouco acima das taxas de 
inflação. 
 
Mas a falta de medidas de profundidade, que definissem rumos e 
sinalizassem os investimentos, gerava incerteza na economia e insegurança na 
sociedade. Os grandes estrangulamentos não estavam sendo atacados. A escalada 
da inflação (239% em 1985) revelava que a economia não ia bem e os remédios 
tradicionais não surtiam o efeito desejado ou eram insuficientes. Em conseqüência, 
antes de completar um ano, o novo governo corria o risco de perder a credibilidade 
da nação e o respaldo popular que haviam marcado o alvorecer (traumático) da 
Nova República. Igualmente, começavam a deteriorar-se o apoio político e a base 
de sustentação parlamentar. Havia necessidade de uma ação mais corajosa por 
parte do governo. Então, em fevereiro de 1986, no segundo ano do governo 
Sarney, foi adotado o Plano Cruzado.

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