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113 Caderno de Estudos Ciência e Empresa, Teresina, Ano 8, n. 2, nov. 2011. RESENHA CRÍTICA LASSALE, Ferdinand. A Essência da Constituição. 9. ed Rio de Janeiro: Editora Lúmen Júris. 2010, 48 p. Resenhado por Ivonaldo da Silva Mesquita 1 Maria do Rosário de Fátima Melo Silva 2 Nessi da Silva Torres Reis 3 1 CREDENCIAIS DO AUTOR Ferdinand Lassalle nasceu em Breslau (atualmente Wroclaw na Polônia), em 1825. É considerado um precursor da social-democracia alemã. Estudou comércio em Leipzig e regressou a Breslau onde iniciou estudos de filosofia na Universidade de Breslau (1843). Mudou-se depois para Paris para preparar tese de doutoramento. Organizou o movimento operário alemão, que, embora inspirado nas ideias socialistas de Karl Marx, apresentava um viés nacionalista, em contraste com o internacionalismo marxista. Em Berlim, entrou em contato com as ideias socialistas de Friedrich Hegel e Ludwig Feuerbach. Informações sobre sua produção intelectual dão conta de que ele produziu uma conferencias, publicadas depois com o título original O que é uma Constituição? No Brasil, a publicação editada pela editora Lumén Juris, com base no teor político e jurídico da obra optou por publicá-la sob o título A Essência da Constituição. Participou da fundação e direção da Associação Geral dos Operários Alemães (1863). Mudou-se depois para a Suíça, onde morreu em duelo, perto de Genebra, em agosto de 1864. Publicou, ainda, as obras A Filosofia de Heráclito (1858), O Legado de Fichte (1860), das quais não foram encontrados registros complementares (fonte: Nota explicativa da obra A Essência da Constituição e Google). 2 RESUMO DA OBRA Em A ESSÊNCIA DA CONSTITUIÇÃO Ferdinand Lassalle procura responder O que é Constituição? Subsidiando uma melhor compreensão sobre este instrumento de 1 Mestrando em Direito Constitucional (Universidade de Fortaleza – UNIFOR, 2011). Pós-graduado em Direito Processual (Universidade Estadual do Piauí - UESPI, 2007). Graduado em Direito (UESPI, 2003). Advogado OAB/PI 4063. Professor de Direito Constitucional da Faculdade das Atividades Empresariais de Teresina - FAETE. Professor de Direito UESPI. Ex Procurador Chefe da Agência de Defesa Agropecuária do Estado do Piauí – ADAPI (2007-2010). E-mail: ivomesquita@yahoo.com.br 2 Graduanda em Direito (FAETE, 2011) 3 Graduanda em Direito (FAETE, 2011) 114 Caderno de Estudos Ciência e Empresa, Teresina, Ano 8, n. 2, nov. 2011. inquestionável relevância para a organização da estrutura de um Estado. Iniciando suas considerações, o autor esclarece sobre as condições favoráveis à criação de uma Constituição, suas origens, como se constitui e se desenvolve o seu processo de formatação, enquanto instrumento que norteia as ações estatais, quer em fase de organização/fundação, quer para estabelecer uma nova ordem política após uma situação de ruptura. O autor conceitua Constituição como “a fonte primitiva da qual nascem a arte e a sabedoria constitucionais”. Assim sendo, considera um fundamento vinculado à noção de globalidade sob o ponto de vista de orientação normativa. Defende-a como instrumento formal que não tem a função de ditar normas, e sim estabelecê-las, visando à organização do poder bem como dos fatores reais de poder que constituem cada nação. Nesse sentido reforça, a Constituição é “a lei fundamental de um país”, ou seja, aos seus fundamentos deverão ser submetidas todas as leis infraconstitucionais”, denominando-a de força ativa que vincula a si todas as demais leis e instituições jurídicas vigentes. Em outros termos, uma vez promulgada uma Constituição, a partir daquele ato, todas as leis infraconstitucionais deverão está em conformidade com seus fundamentos, sob pena de serem declaradas inconstitucionais. Prosseguindo com suas considerações, o autor utiliza-se de suposições e realidades político-sociais fictícias a fim de continuar esclarecendo sua própria definição e tecendo considerações relativas às forças que devem ser contempladas no texto constitucional, denominando-as de fatores reais do poder. Identifica-os como sendo aqueles segmentos da sociedade que apesar de não comporem a estrutura do Estado, não podem ser ignorados e tão pouco deixados à margem do texto constitucional, para que este não venha a ser considerado apenas, uma folha de papel. Nesse processo, o reconhecimento desses fatores faz com que a natureza fundamental da lei seja suficiente para caracterizar sua eficácia. LASSALLE visando aprofundar a compreensão sobre o conceito de Constituição, como lei fundamental, distinta das infraconstitucionais destaca-lhe ainda, três características básicas: 1ª - esclarece que lei fundamental é uma lei básica ou seja, serve de base para as leis comuns; 2ª - ressalta que a lei fundamental constitui as demais ... “deverá informar e engendrar as outras leis comuns originárias de si” e, 3ª - a lei fundamental é regida pelas necessidades de organização de uma Nação e, por exigência dessas necessidades, condiciona a si as demais instituições jurídicas 115 Caderno de Estudos Ciência e Empresa, Teresina, Ano 8, n. 2, nov. 2011. vigentes. É, portanto, uma força ativa, constituída pelos fatores reais de poder de uma determinada sociedade, que influi de tal forma na essência das outras leis e as obriga a ser o que são e como são sem a possibilidade de alternativas. Em relação aos fatores reais que efetivamente influenciam o cotidiano de uma sociedade, LASSALE explica que são originários dos segmentos que a integram, portanto, se constituem em partes legítimas de uma Constituição. Visando fornecer maior visibilidade sobre essa tese, ou seja, sobre a influência dos desses fatores, integrantes de uma sociedade, o autor supõe hipoteticamente que, em uma determinada nação de regime de governo monarquista, devido a um grande incêndio, todas as suas leis vigentes foram destruídas, perdendo total e definitivamente todo o seu aparato jurídico. Em decorrência do fato, para a elaboração da uma nova Constituição seria legítimo envolver cada segmento que compõe aquela sociedade no seu processo de construção, para que pudesse ser produzido um instrumento que representasse a vontade de todos. Tais segmentos seriam: o rei, a aristocracia, a grande burguesia, os banqueiros, a pequena burguesia, a classe operária, a consciência coletiva e a cultura geral do povo. Segmentos esses, que ele denominou ora de fragmento, ora de parte, ou de partícula de uma Constituição. Uma vez não atendidas a essas forças, vislumbra-se uma Carta Constitucional que não possibilita o atendimento das demandas, anseios e expectativas da sociedade, e, portanto, não indicaria formas de solução para seus conflitos, ao contrário, pode aprofundá-los. No hipotético Estado, cujo sistema de governo seria monarquista, a nova Constituição teria que contemplar todos os segmentos do tecido social ao qual serviria. O rei, a quem as forças coercitivas estão subordinadas é uma das partes da Constituição; a nobreza, os grandes proprietários agrícolas, enquanto grupo com forte influência na Corte, também; os grandes industriais que, uma vez negados os seus interesses, suas industriais poderiam sofrer problemas que acarretaria sérios prejuízos para o Estado; os banqueiros tendo em vista que é um segmento que viabiliza investimentos; a pequena burguesia e a classe operária enquanto uma das forças que impulsiona o processo de produção também com seus interesses. Acrescenta-se ainda, a consciência coletiva, a cultura geral do povo que ao longo dostempos definem costumes, tradições, e valores. Todos esses segmentos representam partículas da Constituição e constituem um complexo sistema de interesses, subjetividades e 116 Caderno de Estudos Ciência e Empresa, Teresina, Ano 8, n. 2, nov. 2011. diversidades próprias de cada parte. A ESSENCIA DA CONSTITUIÇÃO permite ver (mais uma vez) que esse instrumento normativo maior de um Estado não é invenção dos tempos modernos. Desde os tempos antigos verifica-se na história, alusões à existência de uma Constituição quer escrita, quer arraigada na cultura de cada país por meio de costumes, precedentes, dentre outros. A diferença era que, não sendo ouvidas as forças que compunha cada sociedade, o povo era obrigado a suportar o peso das constituições absolutistas e as imposições dos respectivos regimes. LASSALE ressalta ainda, que cada país possuiu e continua possuindo sua Constituição. No entanto, avalia-se que a diferença para as dos tempos atuais, consiste em que estas (na maioria dos países) tendem a ter a participação efetiva das forças que movem a Nação; são sempre escritas e os legisladores procuram dialogar com representantes dos setores organizados da sociedade na perspectiva de tornar o texto constitucional o mais fiel possível às aspirações das camadas sociais que integram cada país. A partir dessa compreensão, passa-se a perceber com mais clareza porque uma constituição ditada não representa os interesses de uma sociedade. Independente do regime desse ou daquele Estado, o legislador moderno deve procurar elaborar uma Constituição prevendo interesses das “forças” próprias de cada segmento. LASSALE ressalta a presença de uma Constituição em todo Estado e chama atenção para a Constituição real a qual ele atribui também o conceito de Constituição efetiva e a caracteriza pela participação das forças internas a cada Estado em seu texto. Segundo ele, não é “possível imaginar uma Nação onde não existam os fatores reais do poder, quaisquer que eles sejam”. É claro que são fatores mutáveis conforme costumes e escalas de valores de cada sociedade e época. Se tais fatores e expectativas de um povo fossem sempre as mesmas, não haveria necessidade de se aspirar uma constituição reformulada. O instrumento constitucional defasado, do ponto de vista das necessidades estatais e da população não representa sua realidade, é como se não tivesse existido e se assemelha a algo eliminado definitivamente. A eficácia e durabilidade de uma Constituição podem ser constadas quando se verifica em sua origem a observância aos fatores ressaltados. Quando uma Constituição escrita não corresponde à realidade da nação prevalecerá inevitavelmente, conflitos difíceis de serem controlados. No entanto, na prática, a Constituição escrita desaparecerá diante da constituição “real” “efetiva” aquela que representa os verdadeiros anseios e mobilidade 117 Caderno de Estudos Ciência e Empresa, Teresina, Ano 8, n. 2, nov. 2011. de uma Nação. LASSALE chama atenção, ainda, sobre o fenômeno de, as vezes, uma Constituição se transformar em um simples pedaço de papel. Tal fato decorre no caso de uma promulgação prematura, sem a participação das forças que compõem a sociedade a que vai servir. Em não sendo prevista a sua essência, certamente os fatores reais e efetivos do poder existentes no país foram ignoradas e as chances de ser uma constituição representativa são, praticamente, nulas. Afirma o autor “De nada servirá o que se escrever numa folha de papel, se não se justifica pelos fatos reais e efetivos do poder”. 3 CRÍTICA DOS RESENHISTAS Traçadas as considerações que no corpo da resenha foram sendo articuladas com as ideias do autor, ressaltamos a atualidade do texto de FERDINAND LASSALE quanto aos argumentos utilizados para definir uma Constituição efetiva, como aquele que tem em sua essência o poder emanado das forças reais que compõem um Estado. É uma consideração que se identifica com a realidade do Brasil, vivida em um passado recente com a elaboração da Constituição de 1988, uma vez que, também na prática, foi provada a validade constitucional a partir da elaboração do seu texto para o qual os legisladores contemplaram em grande parte, a evolução e o progresso do Estado Brasileiro em conformidade com as “forças” que o integram e o compõem. Apresentado em: 11.10.2011 Aprovado em: 18.10.2011
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