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A obra traz informações para a compreensão dos fenômenos políticos e destina-se tanto a pesquisadores e estudiosos do tema quanto a entusiastas da política. Alexandra Lourenço Código Logístico 59142 Fundação Biblioteca Nacional ISBN 978-85-387-6575-2 9 7 8 8 5 3 8 7 6 5 7 5 2 A lexan dra Lou ren ço CIÊNCIAS POLÍTICAS Ciências Políticas Alexandra Lourenço IESDE BRASIL 2020 © 2020 – IESDE BRASIL S/A. É proibida a reprodução, mesmo parcial, por qualquer processo, sem autorização por escrito da autora e do detentor dos direitos autorais. Projeto de capa: IESDE BRASIL S/A. Imagem da capa: Nataliya Nazarova/Shutterstock. Todos os direitos reservados. IESDE BRASIL S/A. Al. Dr. Carlos de Carvalho, 1.482. CEP: 80730-200 Batel – Curitiba – PR 0800 708 88 88 – www.iesde.com.br CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ L933c Lourenço, Alexandra Ciências políticas / Alexandra Lourenço. - 1. ed. - Curitiba : IESDE, 2020. 142 p. : il. Inclui bibliografia ISBN 978-85-387-6575-2 1. Ciência política. I. Título. 19-60793 CDD: 320 CDU: 32 Alexandra Lourenço Doutora em Ciência Política pela Universidade Nova de Lisboa (UNL), mestra em Política Social pela Universidade de Brasília (UnB), especialista em Metodologia de Pesquisa em História pela Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) e graduada em Ciências Sociais pela Universidade Federal do Paraná (UFPR). Pesquisadora e vice-coordenadora do Núcleo de Pesquisas em História da Violência (NUHVI) e pesquisadora do Grupo de Estudos em História Cultural e do Laboratório Discursividades, Mulheres e Resistência na Universidade Estadual do Centro- -Oeste (Unicentro), onde atua como professora do Departamento de História desde 2013, com a linha de pesquisa Sociologia política e relações de gênero. Agora é possível acessar os vídeos do livro por meio de QR codes (códigos de barras) presentes no início de cada seção de capítulo. Acesse os vídeos automaticamente, direcionando a câmera fotográ�ca de seu smartphone ou tablet para o QR code. Em alguns dispositivos é necessário ter instalado um leitor de QR code, que pode ser adquirido gratuitamente em lojas de aplicativos. Vídeos em QR code! SUMÁRIO 1 Conceitos básicos da ciência política 9 1.1 Pensamento político e ciência política 9 1.2 O que estuda a ciência política? 16 1.3 A contribuição de Nicolau Maquiavel 23 2 O Estado e o pensamento político 29 2.1 Sociedades políticas 29 2.2 Formação da sociedade e do Estado 34 2.3 Concepções sobre o nascimento do Estado 40 3 O Estado Moderno 49 3.1 Nascimento e extinção do Estado 49 3.2 Finalidade e funções do Estado 55 3.3 Elementos do Estado: território, povo e poder 61 4 Estado e governo 68 4.1 Regimes de governo 68 4.2 Modelos de Estado 76 4.3 Formas e sistemas de governo 83 5 A separação dos poderes como princípio da moderação 89 5.1 A moderação no poder do Estado 89 5.2 A contribuição de Montesquieu 94 5.3 O Estado de Direito 100 6 Sociedade civil e sociedade política 110 6.1 Sistema eleitoral, sistema partidário e eleições 110 6.2 Legalidade e legitimidade 118 6.3 Sociedade civil x sociedade política x bem comum 126 Gabarito 136 Nossas escolhas afetam cotidianamente nossas vidas. Essa afirmação é ampliada quando pensamos em nossas ações como profissionais, cidadãos e eleitores. Por isso, é fundamental que tenhamos alguns instrumentos teóricos que nos permitam fazer a leitura da realidade política e social na qual estamos inseridos. Vivemos em sociedades que se organizam com base na constituição de Estados e governos. Um grupo seleto de indivíduos é escolhido para ocupar as posições que dão vida à governança e tomar decisões que influenciam diretamente a vida da população de cada país. As ações dos Estados são implementadas por meio das políticas públicas e direcionadas à educação, saúde, moradia, economia, segurança etc. Elas são o resultado das escolhas dos indivíduos que ocupam posições de decisão política, motivados pelos grupos de pressão e de interesse. Dessa forma, as relações que se estabelecem entre sociedade civil e Estado definirão o potencial democrático de cada país. Todavia, não são relações de fácil compreensão, pois são permeadas por questões importantes e complexas, como o acesso desigual às condições de participação na sociedade, economia e política. Este livro apresenta teorias e conceitos que poderão ser utilizados para melhor compreender essa realidade. Para organizar nossa discussão a respeito do Estado, o conteúdo está dividido em seis capítulos. No primeiro capítulo, serão apresentados alguns conceitos básicos da ciência política, que auxiliarão na compreensão do nascimento do Estado e de suas formas organizacionais. No segundo capítulo, abordaremos os variados modelos de sociedades políticas e de Estados ao longo da história. No terceiro capítulo, compreenderemos como nascem e como são extintos os Estados, suas funções e seus elementos característicos. Já no quarto capítulo, trataremos dos regimes, das formas e dos sistemas de governo, buscando refletir sobre sua aplicação nos modelos de Estados. No quinto capítulo, será abordada a importância da moderação do poder para o Estado de Direito e para o funcionamento dos regimes democráticos. No sexto e último capítulo, analisaremos a pertinência dos sistemas partidários e eleitorais, bem como a participação da sociedade civil na configuração dos modelos democráticos. APRESENTAÇÃO Em suma, esta obra traz informações para a compreensão dos fenômenos políticos e destina-se tanto a pesquisadores e estudiosos do tema quanto a entusiastas da política. Bons estudos e uma ótima leitura! Conceitos básicos da ciência política 9 Neste capítulo, apresentaremos alguns conceitos importantes para se compreender o que é ciência política e como ela pode nos auxiliar na compreensão da política. Discutiremos questões como a participação da sociedade no governo, os formatos que os governos adquirem, a organização civil para participação na política, a busca da representatividade, a necessidade da existência de uma ordem política. Abordaremos também o contexto do advento dessa ciência e o lugar que ocupa em uma reflexão mais ampla, que chamamos de pensamento político. Finalizaremos com a apresentação do autor Nicolau Maquiavel, considerado por muitos o primeiro cientista político antes mesmo do surgimento da ciência política. Essa compreensão da política, além de importante para a cidadania, pode ser muito empolgante para o pesquisador e estudioso do tema, por isso, convidamos você para os primeiros passos dessa trajetória de conhecimento sobre a ciência política e suas contribuições. Conceitos básicos da ciência política 1 1.1 Pensamento político e ciência política Vídeo A ciência política não foi a primeira forma de reflexão sobre a ação política e o espaço político. O pensamento político é muito mais amplodo que essa ciência. De modo resumido, poderíamos afirmar que são manifestações do pensamento político a ideologia política, a filoso- fia política e a ciência política. Nesse sentido, estamos considerando como pensamento político toda forma de reflexão sobre a ação política e sobre o “mundo da política”. 10 Ciências Políticas Acredita-se que desde os primórdios das primeiras comunidades sedentárias existiu a curiosidade humana de compreender o mundo a sua volta. Todavia, a política ganhou um local de destaque somente na Antiguidade com os escritos de Aristóteles. O filósofo grego, que viveu entre 384 a.C. e 322 d.C., discutia diver- sos temas relativos à vida na cidade, dentre eles a ética e a política. Na obra Política, Aristóteles (2009) defendeu a ideia de que o homem é naturalmente um ser social e político. Segundo ele, os homens ne- cessitam viver em sociedades, precisam estabelecer relações uns com os outros para realizarem objetivos comuns. Nesse convívio, além das relações sociais e econômicas, os homens constroem relações políticas e organizam formas de governo. Em sua análise, Aristóteles afirmava que existiam três formas de governo: a república, considerada o governo de muitos, a monarquia, identificada como o governo de somente um e, por fim, a aristocracia, descrita como o governo dos melhores. Podemos perceber, portanto, que a reflexão sobre a política se ori- ginou na Antiguidade. A seguir, buscaremos definir esse conceito. 1.1.1 O que é política? A política é uma parte intrínseca à organização da coletividade. Como poderíamos definir o termo política? Segundo Bobbio, Matteucci e Pasquino (1998, p. 954), “o conceito de Política, entendida como for- ma de atividade ou de práxis humana, está estreitamente ligado ao de poder”. Então, a política é o agir humano, que está intimamente relacionado à discussão sobre poder e dominação. Isso pode parecer negativo, todavia, como lembra Maquiavel (1990), a política pode não representar o céu, mas sua ausência é o pior dos infernos. Ainda nessa linha de pensamento, cabe lembrar que Weber 1 (1999) nos indica que o fenômeno do poder e da dominação é natural em qualquer organização humana, pois nele estariam assentadas as bases das relações de autoridade legítima e de ordenamento para se atingir os fins coletivos. Com esse conceito podemos compreender que antes mesmo de a ciência política surgir já existiam outras manifestações dela. Como parte do pensamento político, a filosofia política contribuiu e contribui com as reflexões da ciência política ainda que não sejam idênticas. Weber viveu entre 1864 e 1920, foi um sociólogo e jurista alemão considerado um dos fundadores da sociologia. Dedicou-se a vários estudos sobre Sociologia da Religião e entre suas principais obras estão A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo (1905) e Economia e Sociedade (1922), em que ele fala sobre os três tipos ideais ou legítimos de autoridade. 1 Conceitos básicos da ciência política 11 1.1.2 Filosofia política O que é filosofia política ou filosofia da política? Responder a essa pergunta não é uma tarefa fácil, pois existe uma grande variedade de opiniões, mas vamos nos basear em um caminho traçado pela história do pensamento político que observou quais são os aspectos valoriza- dos na reflexão filosófica sobre o “mundo da política”. O primeiro aspecto pode ser definido como a busca pelo Estado perfeito. A filosofia política faz uma reflexão sobre o possível modelo de Estado e governo perfeito ou próximo da perfeição. São construções de pensamento abstrato que não precisam de um modelo concreto observado na vida real. De acordo com Bobbio, Matteucci e Pasquino (1998, p. 494, grifo do original), o exemplo mais antigo, mais notório e clamoroso é e continua sendo a República platônica, modelo ideal de Estado, construí- do mediante um procedimento lógico-abstrato e dedutivo, com tranquila indiferença perante a possibilidade de sua realização efetiva. Na categoria de filósofos políticos de tipo platônico, podem ser agrupados todos os utopistas, descritores e teóricos de modelos de sociedade perfeita: modelos em que o historia- dor moderno reconhece, com sua visão crítica, reflexos, às vezes dolorosos, de experiências concretas, mas que expressam todos igualmente a certeza de encontrar uma solução definitiva do pro- blema político, solução baseada num valor supremo e absoluto de justiça. A obra A República, do filósofo grego Platão (1988), escrita na Anti- guidade, trouxe uma intensa reflexão sobre o modelo ideal de cidade, de vida coletiva e de comportamento humano. Sua cidade-Estado foi descrita de forma idealizada: nela, o governo, os artesões e os políticos eram bons e tinham um comportamento adequado. Essa obra era o re- trato da gestão pública que realmente funcionava de modo harmônico. Outro aspecto presente nas reflexões da filosofia política é a busca por justificar a legitimidade do poder. É importante compreender que a filosofia política contribuiu e contribui imensamente com a reflexão realizada na ciência política, todavia, diferente da ciência política, não necessita basear suas análises em casos concretos nem se deter na análise de como as coisas efetivamente são. 12 Ciências Políticas Nesse contexto, encontramos autores que “ao invés de teorizarem um modelo de Estado ideal, se propuseram a analisar o fundamento das relações políticas, as razões do vínculo de dependência que elas comportam” (BOBBIO; MATTEUCCI; PASQUINO, 1998, p. 493). Podemos observar que os autores estão questionando a nossa real necessidade de viver sob a organização de uma comunidade política. Eles alertam, então, para o fato de que os indivíduos precisam viver sob determinadas regras jurídicas e políticas, por isso existe uma relação de dependência. A preocupação central estava em compreender por que os indiví- duos obedecem, por que é necessário haver um poder político sobre esses indivíduos, “em suma, a determinar o porquê do Estado, os mo- tivos que explicam a obediência que os homens prestam ou negam ao poder” (BOBBIO; MATTEUCCI; PASQUINO, 1998, p. 493). Autores como Hobbes, Locke e Rousseau, que ainda abordaremos neste livro, podem ser considerados representantes dessa linha de pensamento. Para eles, a questão principal não é o Estado perfeito, mas a legitimidade do poder. Eles estão em busca de uma explicação para a eficácia da autoridade (WEFFORT, 2002). Para os filósofos dessa linha, importa menos se a legitimidade do poder se encontra em uma história religiosa, como a ideia de direito divino reconhecido pela Igreja, em um conto de hereditariedade com base na descendência sanguínea, como no caso das monarquias, ou se resulta de um acordo racional da necessidade de um governo. o que efetivamente importa é que em todas essas versões a legitimidade do poder é reconhecida quando existe uma história que convence a maio- ria de que quem manda tem o direito de mandar. Ou seja, a obediência resulta desse reconhecimento e faz com que obedecer seja um ato vo- luntário (WEBER, 1999). A diferença entre os primeiros, preocupados em teorizar o Estado perfeito, e os segundos, que focaram a questão da legitimidade, não é muito rígida, pois em última instância a discussão da legitimidade remete ao modelo que seria considerado ideal e que, justamente por isso, encontrou esse status. O terceiro aspecto possível está no grupo que realiza uma com- preensão geral da política. Esse grupo busca conceituar as relações po- líticas em distinção às outras relações sociais, culturais e econômicas. Conceitos básicos da ciência política 13 O quarto aspecto afirma que a filosofia política nos fornece a refle- xão sobre a metodologia para os estudos sobre o tema. Ou seja, ela deve ser compreendida como metodologia ou, ainda, como uma análi- se crítica sobre os discursos dos atores políticos. A filosofia política foi também classificada como estudo da lingua- gem. Para compreendera importância da possível contribuição dessa linha, basta observarmos as imprecisões das palavras utilizadas nos discursos políticos. É preciso reconhecer que as palavras surgem carre- gadas de emoções nos contextos em que ocorrem esses diálogos. Na compreensão de Bobbio, Matteucci e Pasquino (1998, p. 496), qualquer discurso político é (pelo menos no estado atual) condi- cionado pela linguagem de que é obrigado a servir-se; trata-se de uma linguagem “impura”, ou melhor, de uma linguagem “com vá- rias dimensões”, que no próprio ato em que é usada desempenha funções diferentes: designa, avalia, descreve e, ao mesmo tempo e quase inconscientemente, prescreve; e isto pela simples razão de que os vocábulos de que se serve têm, já de antemão, uma coloração emotiva, são palavras “carregadas”, que contêm uma conotação apreciativa que não é possível eliminar (pelo menos até o presente momento). Os exemplos são numerosos: basta lembrar o uso que se faz correntemente, ao discorrer de política, de palavras tais como “liberdade” ou “igualdade”, que designam, ao mesmo tempo, um fato e um valor ou a possibilidade de dar, ao mesmo fato político, um significado diferente e às vezes opos- to, chamando-o mais com um nome do que com outro (“pena” – “repressão”, “força” – “violência”); basta refletir na incerteza que reina atualmente sobre o exato significado de termos tais como “poder” e “autoridade” e a sua delimitação recíproca. Esses filósofos consideram “impura” a linguagem utilizada nos dis- cursos políticos, pois as palavras não possuem um único sentido e po- dem, ainda, ter seu sentido definido por ideologias e sentimentos. Eles consideram, ainda, que essas palavras possuem várias dimensões, pois podem carregar em si aspectos positivos e negativos ao mesmo tempo. Um exemplo é a palavra igualdade, que pode ser utilizada como algo bom, pois pode significar que os indivíduos possuem direitos jurídicos iguais, mas, em outro contexto, pode significar igualdade social asso- ciada a políticas socialistas, que será algo bom ou mau dependendo do grupo que está discursando. Isso significa que a palavra igualdade não tem uma única interpretação ou uso. Ela não é neutra, depende do uso que se faz dela. 14 Ciências Políticas Percebemos, portanto, que as possibilidades de aplicação dos estu- dos em filosofia política variam conforme o foco da análise. Entretanto, devemos compreender que, em seu conjunto, todas essas abordagens contribuem com os estudos sobre os fenômenos políticos. 1.1.3 Ideologia política Por último, podemos observar a relação entre filosofia política e ideologia. Aqui, a preocupação central está em observar os elementos ideológicos dos discursos, pois se estes se pautam em escolhas de pa- lavras relativamente imprecisas, podemos nos indagar sobre a ideolo- gia existente nas escolhas das palavras. Se a análise do discurso político conduz ou pode conduzir a tão singulares conclusões, é claro que a reflexão filosófica não pode parar aqui, porque reconhecer o caráter valorativo ou ideológico deste tipo de discurso levanta na mente um outro problema, o do porquê de tal caráter, isto é, da necessidade de entender as razões pelas quais a qualificação política é uma qualificação valo- rativa e não apenas descritiva, de encontrar uma explicação das opções que os homens fazem ao atribuir a alguns fenômenos uma relevância política que excluem de outros, e, especialmente, de estabelecer com exatidão o que significa essa atribuição, quais as consequências que daí decorrem, o que, enfim, está realmente posto em jogo. (BOBBIO; MATTEUCCI; PASQUINO, 1998, p. 497) Nesse sentido, podemos afirmar que não existe discurso neutro e que todos eles estão carregados de boa dose de ideologia. Somos seres históricos e ideológicos, atores sociais movidos por valores, crenças, ideias, desejos e emoções, e isso se manifesta no espaço da política. Por isso, no pensamento político também encontramos a ideolo- gia política. Diferente da filosofia, a ideologia se baseia em crenças e estados mentais e emocionais dos indivíduos e, também, naquilo que hoje denominamos de senso comum. Naturalmente, essa é uma defini- ção superficial, pois não existe uma única versão do que consideramos ideologia. Mais do que um problema teórico, o espaço e os atores políticos vão se alterando com o passar do tempo e, portanto, é também um proble- ma de interpretação segundo o momento histórico. Conceitos básicos da ciência política 15 Ao elaborar um dicionário de termos políticos, Bobbio, Matteucci e Pasquino (1998) salientaram a dificuldade em estipular definições rígidas para a linguagem política, afinal essa é uma construção histórica e os termos vão se ressignificando com as transições de gerações e os pro- cessos históricos vivenciados pelas sociedades humanas. Segundo eles: A maior parte dos termos usados no discurso político tem signi- ficados diversos. Esta variedade depende [...] de muitos termos terem passado por longa série de mutações históricas – alguns termos fundamentais, tais como “democracia”, “aristocracia”, “déspota” e “política”, foram-nos legados por escritores gregos. [...] Na linguagem da luta política quotidiana, palavras que são técnicas desde a origem ou desde tempos imemoriais, como “oli- garquia”, “tirania”, “ditadura” e “democracia”, são usadas como termos da linguagem comum e por isso de modo não unívoco. Palavras com sentido mais propriamente técnico, como são todos os “ismos” em que é rica a linguagem política – “socialis- mo”, “comunismo”, “fascismo”, peronismo”, “marxismo”, “leni- nismo”, stalinismo” etc. –, indicam fenômenos históricos tão complexos e elaborações doutrinais tão controvertidas que não deixam de ser suscetíveis das mais diferentes interpretações. (BOBBIO; MATTEUCCI; PASQUINO, 1998, p. V) Desta forma, tanto os discursos quanto as palavras e conceitos definidos para pensar a política não são tão precisos nem têm um único significado. Essas possibilidades de interpretação são comumente exploradas nos discursos que se baseiam no senso comum e principal- mente na ideologia. Como poderíamos definir ideologia? Para Bobbio, Matteucci e Pasquino (1998), podemos defini-la com base em dois sig- nificados: um considerado fraco, que seria o conjunto de ideias relacio- nadas à política; e outro, forte, que seria um conjunto de ideias falsas. Ideologia seria, então, um conjunto de ideias políticas – e, nesse senti- do, não se emite uma avaliação negativa sobre o conceito – ou uma visão falsificada da realidade. Esse entendimento de ideologia como crença falsa foi elaborado pelo pensador do século XIX, Karl Marx, para quem a ideologia significava um conjunto de ideias distorcidas ou invertidas sobre a realidade, criadas pela classe dominante para manter os domi- nados sem a consciência da verdade sobre sua exploração. Quando se trata do exercício do poder, aqueles que têm a posse dos grandes meios de produção inevitavelmente tendem a ficar convencidos (e tratam de convencer os demais) de que a situa- ção de que se beneficiam é, se não a melhor, a menos ruim das 16 Ciências Políticas situações possíveis. Na medida em que os conhecimentos pro- porcionam algum poder, aqueles que detêm o “saber” tendem a acreditar necessariamente que a superioridade da sua cultura só não é reconhecida por ignorância ou por má-fé. Os ricos, por sua vez, costumam crer que a existência de diversidade nas fortunas é “normal”, já que pode ser constatada em todas as sociedades. E os privilegiados se inclinam a considerar seus privilégios como direitos. (KONDER, 2001, p. 26, grifo do original) Nessa segunda concepção do conceito, como uma ideia falsa, en- contraremos todos os autores que adotam a teoria marxista para pensar as relações sociais, políticas, culturais e econômicas. Após essa rápida apresentação de alguns conceitos da ciência política, discutire- mos a seguir essa ciência. 1.2 O que estuda a ciência política? Vídeo Para responder aessa pergunta, iniciaremos dizendo que a ciência política estuda o Estado e todos os elementos que se relacionam com ele, como mostra a Figura 1 a seguir. Esses elementos não são conside- rados de forma isolada, a ciência política observa as inter-relações que se estabelecem entre eles. Ela analisa, ainda, as relações que se estabe- lecem entre esses elementos, o Estado e a sociedade civil. Figura 1 Inter-relações entre Estado e elementos Instituições políticas Burocracia Modelos de Estado Poder e sua relação com o Direito Teorias sobre a política Partidos políticos Instituições políticas Estado Fonte: Elaborada pela autora. Não apresentaremos todos esses conceitos nesta seção, pois serão mais bem trabalhados nos posteriores capítulos deste livro. Todavia, abordaremos de modo introdutório alguns deles. Conceitos básicos da ciência política 17 1.2.1 Partidos políticos Os partidos podem ser definidos como formas de associação da sociedade civil nas quais indivíduos que partilham de uma mesma ideologia se organizam formalmente para disputar o espaço político. Os partidos se desenvolveram na Europa e nos Estados Unidos no século XIX. Para falarmos em partidos, no plural, é necessário que exis- tam diferenças ideológicas entre eles. Com a Revolução Industrial, a burguesia buscou se organizar politicamente e, posteriormente, com o aumento da classe operária, surgiram, já ao final do século XIX, os par- tidos de massa representando os trabalhadores. Anteriormente, havia somente partidos de quadros ou, mais precisamente, partidos das eli- tes (aristocratas e burgueses). Na Inglaterra, o país de mais antigas tradições parlamentares, os partidos aparecem com o Reform Act de 1832 2 , o qual, amplian- do o sufrágio, permitiu que as camadas industriais e comerciais do país participassem, juntamente com a aristocracia, na gestão dos negócios públicos. Antes dessa data, não se pode falar pro- priamente de Partidos políticos na Inglaterra. Os dois grandes partidos da aristocracia, surgidos no século XVIII e desde então presentes no Parlamento, não tinham, fora disso, nenhuma rele- vância nem algum tipo de organização. Tratava-se de simples eti- quetas atrás das quais estavam os representantes de um grupo homogêneo, não dividido por conflitos de interesses ou por di- ferenças ideológicas substanciais, que aderiam a um ou a outro grupo, sobretudo por tradições locais ou familiares. (BOBBIO; MATTEUCCI; PASQUINO, 1998, p. 899, grifo do original) Na maior parte da Europa e da América, durante o século XIX, pre- valeceram partidos com esse formato. Somente no final do século XIX o sistema partidário efetivamente se diversificou com a incorporação da classe operária. Esse foi um marco para pensarmos o surgimento dos Estados Democráticos. Antes da incorporação das massas no processo político, somente poderíamos falar em Estado Liberal. Nos decênios que precederam e se seguiram aos fins do sécu- lo XIX a situação começou a mudar após o desenvolvimento do movimento operário. As transformações econômicas e sociais produzidas pelo processo de industrialização levaram à ribalta política as massas populares cujas reivindicações se expressam inicialmente em movimentos espontâneos de protesto, encon- trando depois canais organizativos sempre mais complexos até Lei de Reforma de 1832, que modificou o sistema eleitoral na Inglaterra. 2 18 Ciências Políticas a criação dos partidos dos trabalhadores. É precisamente com o aparecimento dos partidos socialistas – na Alemanha em 1875, na Itália em 1892, na Inglaterra em 1900 e na França em 1905 – que os partidos assumem conotações completamente novas: um séquito de massa, uma organização difusa e estável com um corpo de funcionários pagos especialmente para desenvol- ver uma atividade política e um programa político-sistemático. (BOBBIO; MATTEUCCI; PASQUINO, 1998, p. 899) Os partidos políticos apresentam características diferentes e sur- gem como resultado das demandas da própria sociedade, segundo o momento histórico do seu advento. Assim, uma mudança na sociedade e a criação de uma nova classe serão a base para o surgimento de no- vos partidos. 1.2.2 Burocracia Como outros conceitos da ciência política, o termo burocracia tam- bém não tem uma única definição, pois passou por transformações ao longo de décadas de teorização. De modo amplo, podemos dizer que o termo assinala a existência de um corpo de funcionários da administra- ção pública que têm suas funções e territórios de competência regidos formalmente, são treinados e selecionados pelo critério de especializa- ção e se encontram em relações hierárquicas. 1.2.3 Espaço político Se caracteriza como o local em que ocorrem as disputas e os confli- tos presentes nas relações entre eleitores e partidos políticos. Confor- me apontam Bobbio, Matteucci e Pasquino (1998, p. 392): Todo sistema político é caracterizado por um certo número de con- flitos: conflitos sobre a distribuição da renda, sobre a intervenção do Estado na economia, sobre as relações Estado-Igreja, ou então conflitos de natureza linguística, étnica, e por aí além. Na medida em que tais conflitos ou linhas de divisão são fatores de mobilização do eleitorado, eles influem no comportamento político dos eleito- res e na estratégia dos partidos e, consequentemente, no desenro- lar da disputa eleitoral. A conformação destes conflitos representa a área do Espaço político. Em resumo, portanto, o Espaço político identifica-se com o espaço da competição eleitoral nos regimes de- mocráticos de massa. Não basta, porém, que existam conflitos – portanto, problemas a resolver e escolhas a fazer – para se poder usar significativamente a noção de Espaço político. Conceitos básicos da ciência política 19 Sendo assim, o espaço político será o local em que ocorre o mo- vimento dos partidos políticos na busca por conquistar os votos dos eleitores nas democracias contemporâneas. 1.2.4 Elites políticas Podemos definir o conceito de elite com base no adjetivo que o acompanha e o qualifica, como política econômica, militar etc. Mes- mo qualificado, esse termo ainda gera razoável debate e até mesmo imprecisão. Albertoni (1990 apud LOURENÇO, 2011) fornece um bre- ve resumo dessas possibilidades conceituais. Segundo ele (1990 apud LOURENÇO, 2011, p. 28), o conceito de elite política se baseia em “uma minoria politicamente ativa que controla os processos de tomada de decisão política. Mais precisamente, a elite política foi metodologica- mente identificada como o conjunto dos atores que ocupam os cargos políticos na estrutura do Estado”. Em uma conceituação ampla, o termo elite se refere à minoria que detém o prestígio e o domínio sobre um grupo social. O termo foi lar- gamente discutido nas obras clássicas dos italianos Gaetano Mosca e Vilfredo Pareto e do alemão Robert Michels, entre o final do século XIX e início do século XX. A busca da definição do conceito de elites e de não elites conduziu esses autores à elaboração do que ficou conhecido como a teoria das elites. Essa teoria foi constituída por um conjunto de ideias que reflete sobre as relações entre elites e massas nas democra- cias contemporâneas e que afirma que em todo regime sempre existe uma minoria que governa e uma maioria que é governada. Esses autores defendiam uma compreensão da sociedade que se baseava na apreciação da realidade dos fatos, e não na sua idealização. Isso lhes permitiu analisar o desenvolvimento histórico das so- ciedades e formular uma lei geral da sua organização política na qual afirmaram que toda sociedade possui inevitavelmente uma minoria que domina e uma maioria dominada. Ao buscarem comprovar esta tese de forma científica, estes autores construí- ram os pilares da teoria das elites e delimitaram inicialmente um objeto de pesquisa (as minorias governantes) que seria a partir de seus estudos consagrado como um dos importantes temas da ciência política contemporânea. (LOURENÇO, 2011,p. 28) Assim como Maquiavel (1990, p. 72) dizia que no estudo da política vale mais “procurar a verdade efetiva das coisas”, eles se empenharam 20 Ciências Políticas no estudo científico da política, buscaram conhecer como ela efetiva- mente funcionava e não como ela deveria funcionar. Ou seja, defen- deram a ideia de que um verdadeiro estudo dos fenômenos políticos deveria ocorrer pela análise da realidade efetiva de maneira científica. 1.2.5 Cultura política Na cultura residem crenças, valores e normas em que o grupo acre- dita com base no seu percurso histórico. Por isso, uma mesma expe- riência política pode apresentar resultados diferentes em países com cultura política também diferente. Bobbio, Matteucci e Pasquino (1998, p. 306) afirmam que se utiliza a expressão cultura política para: designar o conjunto de atitudes, normas, crenças, mais ou menos largamente partilhadas pelos membros de uma determi- nada unidade social e tendo como objeto fenômenos políticos Assim, poderemos dizer, a modo de ilustração, que compõem a Cultura política de uma certa sociedade os conhecimentos, ou, melhor, sua distribuição entre os indivíduos que a integram, rela- tivos às instituições, à prática política, às forças políticas operan- tes num determinado contexto; às tendências mais ou menos difusas, como, por exemplo, a indiferença, o cinismo, a rigidez, o dogmatismo, ou, ao invés, o sentido de confiança, a adesão, a tolerância para com as forças políticas diversas da própria etc.; finalmente, as normas, como, por exemplo, o direito-dever dos cidadãos a participar da vida política, a obrigação de aceitar as decisões da maioria, a exclusão ou não do recurso a formas vio- lentas de ação. É importante observar que a cultura política diz respeito a um con- junto de valores e crenças que orienta as ações dos indivíduos em suas relações políticas. Isso varia em cada sociedade. Um bom exemplo é a crença na ditadura. Existem sociedades que possuem o autoritaris- mo como um elemento da sua cultura política e, nesse caso, tenderão a simpatizar com modelos políticos ditatoriais, ao contrário de outras sociedades que tenham uma cultura política na qual o pensamento au- toritário esteja ausente. 1.2.6 Advento e método da ciência política No decorrer do século XVIII, as ciências da natureza se consolidaram iniciando um período no qual a verdade deveria ser verificada pelos Conceitos básicos da ciência política 21 métodos científicos. Nesse mesmo século, a Revolução Industrial es- tava em processo e o culminar da Revolução Francesa, que buscava encerrar o Antigo Regime, criaram em conjunto um novo modelo de organização política, jurídica, econômica, social e cultural que conhece- mos como modernidade. No século XIX a modernidade já era uma realidade, vivíamos um mo- delo de sociedade que se baseava no trabalhador livre juridicamente, que podia vender sua força de trabalho e que almejava participar da vida política. As massas populares operárias começaram a se organizar e sur- giram os partidos de massa para concorrer com os partidos de quadros (da elite) pelas vagas eletivas do Estado. Esse fenômeno trouxe inquie- tações aos pensadores da época. Havia uma busca por compreender as complexas relações que se estabeleciam entre sociedade e Estado. Essa inquietação também foi constatada na busca das formulações iniciais da sociologia. As greves operárias, os altos índices de suicídio, alcoolismo e revoltas dos trabalhadores, que muitas vezes resultavam na destruição das maquinarias, geraram a necessidade de uma respos- ta àquilo que foi considerado um mal-estar social. Também foi nesse século que a expansão industrial favoreceu o imperialismo e aproximou de modo sistemático os europeus de ou- tras culturas, que poderiam ser estudadas e compreendidas. A curio- sidade por outros povos já datava, pelo menos, das navegações do século XV e XVI, todavia foi no século XIX que surgiram as sociedades de etnologia na Inglaterra e na França. Eram homens com diversas formações que se reuniam para compreender as outras culturas com base nos relatórios e documentos produzidos pelos funcionários pú- blicos que estavam em terras imperiais ou coloniais. Acreditando que a ciência é o modelo adequado e eficaz para se compreender a realidade no século XIX, os pensadores propuseram o surgimento das ciências sociais. Simplificadamente, o argumento era de que já existiam as ciências da natureza no século XVIII e que os fe- nômenos sociais careciam de ciência que os explicasse também, afinal, esses fenômenos teriam regras e leis passíveis de estudo científico. Surgiram então, no século XIX, as ciências sociais, a sociologia, a an- tropologia e a ciência política. Talvez, entre as três, a ciência política seja a que mais se inspirou nos métodos das ciências da natureza. O imperialismo é um conjunto de práticas políticas adotadas por um país para sua expansão econômica, cultural e territorial sobre outros países. O caso mais conhecido de imperialismo ocorreu no século XIX, com a ação dos europeus sobre os países asiáticos e africanos. Curiosidade etnologia: pode ser com- preendida como a ciência que estuda as diversas culturas das sociedades. Seria uma espécie de ciência das etnias. Glossário 22 Ciências Políticas Podemos perceber, com base no que foi explicado, que a ciência política, diferente da filosofia política, da ideologia política e do senso comum, busca utilizar como seu método a observação sistemática, a experimentação e a comprovação. Naturalmente, a comprovação será provisória e restrita somente ao objeto de estudo, mas, ainda as- sim, adquire o status de comprovação científica. A expressão Ciência política pode ser usada em sentido amplo e não técnico para indicar qualquer estudo dos fenômenos e das estruturas políticas, conduzido sistematicamente e com rigor, apoiado num amplo e cuidadoso exame dos fatos expostos com argumentos racionais. Nesta acepção, o termo “ciência” é utili- zado dentro do significado tradicional como oposto a “opinião”. Assim, “ocupar-se cientificamente de política” significa não se abandonar a opiniões e crenças do vulgo, não formular juízos com base em dados imprecisos, mas apoiar-se nas provas dos fatos. (BOBBIO; MATTEUCCI; PASQUINO, 1998, p. 164) A definição não é tão simples quanto pode se apresentar à primeira vista. O sentido pode variar quando levamos em consideração sua utili- zação mais restrita ou, mais precisamente, sua aplicação em uma área demarcada de estudos. Para Bobbio, Matteucci e Pasquino (1998, p. 164): Em sentido mais limitado e mais técnico, abrangendo uma área muito bem delimitada de estudos especializados e em parte ins- titucionalizados, com cultores [isto é, cultivadores de uma ciên- cia] ligados entre si que se identificam como “cientistas políticos”, a expressão Ciência política indica uma orientação de estudos que se propõe aplicar à análise do fenômeno político, nos limi- tes do possível, isto é, na medida em que a matéria o permite, mas sempre com maior rigor [...]. Em resumo, Ciência política, em sentido estrito e técnico, corresponde à “ciência empírica da política” ou à “ciência da política”, tratada com base na metodo- logia das ciências empíricas mais desenvolvidas, como a física, a biologia etc. Partindo dessa caracterização, podemos observar que a ciência po- lítica consolidada na época contemporânea, que é possuidora de uma proposta de estudos empíricos sobre os fenômenos políticos, teve antepassados que colaboraram para sua construção. De acordo com Bobbio, Matteucci e Pasquino (1998, p. 164): Embora a constituição da Ciência política em ciência empírica como empreendimento coletivo e cumulativo seja relativamente recente, podem ser consideradas obras de Ciência política, ao Conceitos básicos da ciência política 23 menos em parte, e na sua inspiração fundamental, também no sentido limitado e técnico da palavra, algumas obras clássicas, como as de Aristóteles,Maquiavel, Montesquieu, Tocqueville, enquanto elas tendem à formulação de tipologias, de gene- ralizações, de teorias gerais, de leis, relativas aos fenômenos políticos, fundamentadas, porém, no estudo da história, ou seja, apoiando-se na análise dos fatos. Esses pensadores, que viveram em séculos passados, já haviam de- monstrado o interesse pelo estudo dos fenômenos políticos com base em documentação histórica e observação dos fatos, antes mesmo da existência da ciência política. Estudaremos na sequência a contribuição de Maquiavel. 1.3 A contribuição de Nicolau Maquiavel Vídeo Nicolau Maquiavel, que viveu no século XVI em Florença, na Itália, é considerado por muitos teóricos o primeiro cientista político da his- tória. Pode parecer um equívoco, pois a própria ciência da política ain- da não havia surgido. Todavia, essa apreciação diz respeito ao método empregado pelo autor para analisar os fenômenos políticos em sua época. Com base em fatos observados e documentos históricos, ele buscou refletir sobre o fenômeno da manutenção e perda do poder. O autor salientou as características necessárias para um governo se manter estável e efetivamente governar, sem a tônica religiosa que era comum em sua época. De modo “amoral”, ou seja, sem julgamen- to com base em valores cristãos que marcavam sua época, Maquiavel buscou verificar experiências que deram certo ou falharam na busca de conquistar e manter territórios e um poder centralizado sobre a po- pulação conquistada. Nesse sentido, podemos afirmar que ele esboça- va uma preocupação em compreender como poderiam se formar os primeiros Estados Modernos. Afinal, sem a unificação e manutenção do território e do poder sobre a população desse território, não seria possível falar em Estado. A principal obra de Maquiavel, O Príncipe, gerou e ainda gera grande debate sobre as intenções do autor. Alguns afirmam que ele buscava dar aos poderosos um manual de dominação, enquanto outros veem na obra dele lições ao povo dominado. Consideramos que as lições do livro servem para os atores atentos aos ensinamentos. 24 Ciências Políticas Contrariando os que viam em Maquiavel um autor “maldito”, Rousseau o defendeu afirmando que, “fingindo dar lições aos prínci- pes, deu grandes lições ao povo” (ROUSSEAU, 2000 apud SADEK, 2002, p. 14). Podemos afirmar que Maquiavel nutria, acima de tudo, uma preo- cupação com a estabilidade do poder político por acreditar que somen- te com um poder estabelecido que governasse em prol do povo e das elites poderíamos ter um cenário para o desenvolvimento das popula- ções mais exploradas. Para o autor, o excesso de disputa pelo poder, gerando guerras e mudanças sucessivas dos grupos que ocupavam os locais de poder po- lítico na Itália, atingia de maneira maléfica principalmente os campone- ses que estavam constantemente sujeitos a situações de insegurança. Se ele defendia a República ou a Monarquia, não é a questão central com a qual nos deparamos, mas sim a importância de se conquistar e manter o poder como forma de estabilidade e governabilidade. Ou seja, seu tema principal era o Estado. Em carta escrita a Francesco Vettori, que à época era embaixa- dor da República Florentina em Roma, em 13 de março de 1513, Maquiavel (1513 apud SADEK, 2002, p. 17) desabafou: “o destino de- terminou que eu não saiba discutir sobre seda, nem sobre lã; tam- pouco sobre questões de lucro ou de perda. Minha missão é falar sobre o Estado. Será preciso submeter-me à promessa de emude- cer, ou terei que falar sobre ele”. Percebemos que o autor se preocupava em analisar o Estado se- guindo seu próprio raciocínio, formulado na expressão a verdade efe- tiva das coisas. Desta forma, ele propõe a observação do Estado real, concreto, capaz de manter a ordem e não uma idealização dele. Diferente da filosofia política predominante, Maquiavel propôs o método da verificação empírica dos fatos políticos. Devemos, segundo ele, discutir a realidade que temos e não a que gostaríamos de ter. O autor levantou questões que são importantes até os dias atuais, como as possíveis relações entre disputas pelo poder político, estabilidade e instabilidade, ordem e caos. Conceitos básicos da ciência política 25 1.3.1 Conquistar e manter o poder de governar Por que era importante manter o poder? Qual era o contexto no qual Maquiavel vivia? Nascido no dia 3 de maio de 1469, em uma Itá- lia formada por vários pequenos Estados, com regimes políticos, de- senvolvimento econômico e cultura variados, a disputa pelo poder era constante. Para Sadek (2002, p. 14), “tratava-se, a rigor, de um verdadei- ro mosaico, sujeito a conflitos contínuos e alvos de constantes invasões por parte de estrangeiros”. A partir do final do século XV, a Península Ibérica passou a vivenciar mais incisivamente as invasões e disputas pelo poder em curto espaço de tempo. Até 1494, graças aos esforços de Lourenço, o Magnífico, a penínsu- la experimentou uma certa tranquilidade. Cinco grandes Estados dominavam o mapa político: ao sul, o reino de Nápolis, nas mãos dos Aragão; no centro, os Estados papais controlados pela Igreja e a república de Florença, presidida pelos Médici; ao norte, o ducado de Milão e a república de Veneza. (SADEK, 2002, p. 14-15) Ao final do século XV, essa relativa estabilidade desapareceu da pe- nínsula e as disputas pelo poder político foram tão intensas que um governo não se mantinha no poder por mais de dois meses. Maquiavel passou sua adolescência nessa instabilidade. Ocupou seu primeiro car- go de destaque na vida pública com 29 anos, em 1498, como segundo chanceler, posição importante da administração pública. Ele exercia um papel de diplomacia viajando dentro e fora da Itália no curto perío- do de retirada da família Médici e instauração da República. Contudo, esse cenário não se manteria por muito tempo, conforme expõe Sadek (2002, p. 15): Suas tarefas diplomáticas sofreram, no entanto, uma brusca in- terrupção quando os Médicis recuperaram o poder e voltaram para Florença. O governante Soderini vai para o exílio e é dis- solvida a república. Era o ano de 1512. Maquiavel foi demitido, proibido de abandonar o território florentino pelo espaço de um ano, e ficava-lhe vedado o acesso a qualquer prédio público. Mas o pior ainda estaria por acontecer: em fevereiro de 1513 foi con- siderado suspeito, acusado de tomar parte na fracassada cons- piração contra o governo dos Médicis. Foi por isso torturado, condenado à prisão e a pagar uma pesada multa. 26 Ciências Políticas Após sair da prisão, Maquiavel não conseguiu retornar à vida pú- blica e passou a se dedicar a estudar e escrever suas obras de análise política. Seus anos de serviço público diplomático associados aos es- tudos dos clássicos resultaram em obras escritas entre 1512 e 1513 (O Príncipe); 1513 e 1519 (Discursos sobre a primeira década de Tito Lívio); 1519 e 1520 (A arte da guerra); 1520 e 1525 (História de Florença). Nessas obras políticas, o autor rompeu com a ideia de ordem na- tural ou eterna e tratou a política como ação humana. Ao analisar os vários principados existentes na Itália, ele afirmou que para formar um Estado forte, com poder centralizado, era necessário mais do que o conquistar por meio das armas ou da fortuna. Para mantê-lo era preci- so conseguir governá-lo, e isso aconteceria somente quando o conquis- tador possuísse virtù, que foi um conceito central na análise do poder desenvolvida por Maquiavel. A virtù implica a capacidade do governan- te de convencer o povo e as elites de que governa para eles, mesmo que não o faça. Ele também deve saber usar adequadamente a “espada pública”, ou seja, o uso da força e da violência, além de gerir adequada- mente as finanças do Estado. O autor também desenvolveu o conceito de fortuna, que seriam as riquezas para poder pagar um exército ou comprar um reino, mas que não garantiam que a população iria obedecer ao governante. O mesmo ocorre com as armas, que podem garantir a conquistade um território pela força, mas não garantem a governabilidade. Assim, a fortuna (ri- quezas) e as armas (força bélica, soldados) podem conquistar um reino, mas não irão dar estabilidade para o exercício do governo. Somente a virtù (sabedoria para governar) irá garantir a continuidade e, por conse- quência, a estabilidade do governo, ao conquistar a obediência dos go- vernados. Por isso, Maquiavel demonstrou que muitos conquistadores em sua época possuíam fortuna e armas, mas não mantinham o poder porque lhes faltava a virtù. Se considerarmos que o Estado Moderno se caracteriza principal- mente pelo território unificado, poder concentrado e pelas regras ju- rídicas comuns, podemos compreender que a preocupação do autor eram os problemas que impediam a formação do Estado Moderno ita- liano. Afinal, somente um governante com virtù conseguiria, além de conquistar os territórios, mantê-los unificados, concentrar o poder no governo, não somente pela força mas pelo reconhecimento da autori- dade, e, ainda, convencer o povo e a elite a viver sob o mesmo orde- namento jurídico de modo a acreditar que isso era em seu benefício. Conceitos básicos da ciência política 27 CONSIDERAÇÕES FINAIS Neste capítulo, buscamos apresentar a ciência política e alguns con- ceitos relacionados a ela. Considerando que em toda sociedade existe uma organização política, é fundamental que possamos compreender o funcionamento do espaço político. O estudo da ciência política nos fornecerá as ferramentas para essa compreensão e nos permitirá uma leitura crítica das relações de poder que se estabelecem entre sociedade e Estado. Por isso, continuaremos nossa discussão sobre o surgimento e a consolidação do Estado Moderno no próximo capítulo. AMPLIANDO SEUS CONHECIMENTOS • CODATO, A.; BRAGA, M. do S. Apresentação: Robert Michels, Gramsci e a ciência política contemporânea. Revista de Sociologia e Política, Curitiba, v. 20, n. 44, p. 5-10, nov. 2012. Disponível em: https://revistas.ufpr.br/rsp/article/view/34416/21340. Acesso em: 14 out. 2019. Esse artigo é excelente para conhecer a relação entre partidos políticos e o potencial de representação das massas. • DOBRYCHTOP, L. H.; CHIARO, L.; FERRAZ, C. E. F. A atualidade do pensamento político de Maquiavel. Jus, ago. 2018. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/68543/a-atualidade-do-pensamento- -politico-de-maquiavel. Acesso em: 14 out. 2019. Esse texto apresenta uma contribuição sobre Nicolau Maquiavel e a atualidade do seu pensamento. • PERISSINOTTO, R. M.; CODATO, A. N. Apresentação: por um retor- no à Sociologia das elites. Revista de Sociologia e Política, Curitiba, v. 16, n. 30, p. 7-15, jun. 2008. Disponível em: https://revistas.ufpr. br/rsp/article/view/13850/9324. Acesso em: 14 out. 2019. A leitura desse artigo ajudará a compreender melhor o que são os estudos sobre as elites políticas e sua importância para pensar o contexto brasileiro das relações entre Estado e sociedade. 28 Ciências Políticas ATIVIDADES 1. Como podemos definir a ciência política? 2. Quais foram as contribuições da filosofia política ao desenvolvimento da ciência política? 3. Por que Maquiavel pode ser considerado o primeiro cientista político? REFERÊNCIAS ARISTÓTELES. Política. Trad. de António de Castro Caeiro. São Paulo: Atlas, 2009. BOBBIO, N.; MATTEUCCI, N.; PASQUINO, G. Dicionário de política. 11. ed. Brasília: Editora UnB, 1998. KONDER, L. Ideologia e política. Revista USP, São Paulo, n. 49, p. 24-29, mar./maio 2001. Disponível em: http://www.revistas.usp.br/revusp/article/view/32905/35475. Acesso em: 21 out. 2019. LOURENÇO, A. O recrutamento das elites políticas no Brasil: o caso de Mato Grosso, 1945- 2007. Lisboa, 2011. Tese (Doutorado em Ciência Política) – Setor de Ciências Sociais, Universidade Nova de Lisboa. MAQUIAVEL, N. O príncipe. São Paulo: Martins Fontes, 1990. PLATÃO. A República. Trad. de Carlos Alberto Nunes. 2. ed. Belém: Edufpa, 1988. SADEK, M. T. Nicolau Maquiavel: o cidadão sem fortuna, o intelectual de virtú. In: WEFFORT, F. C. Os clássicos da política. São Paulo: Ática, 2002. v. 1. WEBER, M. Economia e sociedade. Brasília: Editora UnB, 1999. v. 2. WEFFORT, F. C. Os clássicos da política. São Paulo: Ática, 2002. v. 1. O Estado e o pensamento político 29 Este capítulo tem por objetivo identificar os tipos de sociedade política e de Estado ao longo da história, bem como os pensamentos políticos em épocas passadas a fim de compreender os Estados existentes na atualidade. Vivemos sob a organização política de um Estado, e as ações colocadas em prática por aqueles que governam afetam cotidianamente nossas vidas. Por isso, é fundamental compreender como e por que aceitamos viver sob esse modelo. O Estado e o pensamento político 2 2.1 Sociedades políticas Vídeo Todas as sociedades humanas conhecidas após se tornarem seden- tárias tiveram a necessidade de organizar a vida em coletividade, ou seja, estabelecer regras comuns e dividir as tarefas principais ligadas à alimentação, segurança e direito. Então, foi necessário estabelecer uma divisão de tarefas e cuidar para que as regras e os direitos fossem respeitados. Na busca de atingir os objetivos comuns do grupo ligados à sua sobrevivência, como proteção, alimentação e desenvolvimento, cada sociedade retira um pequeno grupo dentre seus integrantes para cuidar da administração dessas atividades. Assim, enquanto alguns trabalham com agricultura, comércio e ar- tesanato, aquele pequeno grupo zela para que essas atividades sejam corretamente executadas e os objetivos da coletividade sejam atingi- dos. Em outras palavras, enquanto a sociedade trabalha, uma pequena parcela dela, chamada de sociedade política, cuida do funcionamento dos interesses públicos, como obras, segurança e garantia do respeito às regras estipuladas pela coletividade. 30 Ciências Políticas Então, é justo afirmar que a sociedade política deriva da própria ne- cessidade da sociedade de sobreviver e se desenvolver. Muitos autores têm discutido qual seria a origem da sociedade. O motivo pelo qual os humanos não vivem isoladamente tem sido alvo de sociólogos, fi- lósofos e outros estudiosos, inclusive “Alguns pensadores defendem a posição de que [...] [a sociedade] é fruto da própria natureza humana, enquanto outros sustentam que nada mais é do que um ato de vonta- de humana” (BASTOS, 1999, p. 13). A seguir, vamos conhecer algumas doutrinas e teorias que buscam explicar o que é sociedade e por que vivemos dessa forma. Alguns filósofos defenderão a ideia de que a sociedade nasce da vonta- de humana de viver sob um contrato que cria as condições de sobrevivên- cia. Por defenderem a existência da sociedade ligada a um contrato, são conhecidos como contratualistas 1 , bem como as suas teorias. Esses autores estavam mais preocupados em compreender o surgi- mento das sociedades políticas do que a própria sociedade em sentido ampliado. Em seus escritos, defendem a ideia de que criar a sociedade foi um ato da razão humana, pois ao buscarem proteger a própria vida perceberam que essa seria a melhor forma de atingir esse objetivo. A teoria organicista defende a ideia de que a sociedade não se resu- me à mera soma de indivíduos, ela é um organismo dotado de funções próprias. Todavia, o indivíduo tem capacidade de moldar a sociedade segundo a sua vontade pelo uso de sua inteligência e razão. Assim, a sociedade pode ser pensada como fruto da natureza do homem, aliada à participação da vontade e da inteligência humana. A doutrina da sociedade natural foi elaborada por filósofos como Aristóteles, São Tomás de Aquino 2 e outros. Para Aristóteles, o homem é um ser eminentemente social, que necessita se relacionar constante- mente com os outros para poder se desenvolver. São Tomás de Aquino também acreditava que o homem é um ser social e político, que se realiza nas relações com outros homens em sociedade. Portanto, “o homem apresenta uma característica fundamental consistenteem depender de outros homens para a realização plena da sua natureza” (BASTOS, 1999, p. 12). Os homens não viveriam em sociedade somente para satisfazer suas necessidades, mas por serem predispostos a isso. Assim como Hobbes, Locke e Rousseau, que estudaremos neste capítulo, são os principais autores dessa doutrina. 1 Tomás de Aquino nasceu em 1225, na Itália. Foi um importante filósofo e padre da Idade Média. 2 O Estado e o pensamento político 31 Aristóteles, São Tomás de Aquino alertava para o fato de que a vida solitária é exceção (MALUF, 2011). Podemos observar que, para essa doutrina, a vida em sociedade resulta da necessidade humana, uma necessidade natural de viver em coletividade. Partilha dessa percepção o sociólogo Émile Durkheim 3 (2010). Para esse autor, é impossível conceber a existência do homem fora de uma sociedade, pois nossa espécie não nos permite viver isola- damente, não podemos procriar ou realizar individualmente todas as tarefas necessárias à sobrevivência da espécie. Necessitamos estabele- cer relações sociais com outros da nossa espécie e isso, por si só, já nos obriga a viver em sociedade. Portanto, é um equívoco pensar que em algum momento da história os indivíduos decidiram criar a sociedade. Isso pressupõe a possibilidade de a existência humana se perpetuar fora da vida em sociedade. Partilhando dessa perspectiva de que existe uma necessidade fun- damental da nossa espécie de viver em sociedade, e que também trans- mitimos historicamente a cultura de uma geração para outra, podemos compreender que, ao longo dos séculos, as sociedades provavelmente iriam sofrer mudanças. Ao longo da história ocidental, as sociedades se desenvolveram pas- sando de pequenos grupos para nações. Sua evolução passou pela or- ganização de indivíduos em família, grupos de famílias (clãs), cidades, Estados, nações e comunidades internacionais. Então, foi para organizar e administrar as sociedades que as primei- ras sociedades políticas surgiram. Para Bastos (1999, p. 25), sociedade política é “aquela que tem em mira a realização dos fins daquelas or- ganizações mais amplas que o homem teve necessidade de criar para enfrentar o desafio da natureza e das outras sociedades rivais”. Essas sociedades são definidas pelo seu território, pois elas pos- suem direito para agir somente dentro do território que reconhece a sua autoridade. Segundo a maior parte dos manuais que buscam sim- plificar a evolução das sociedades políticas, encontramos a seguinte classificação: primeiro as tribos, depois as cidades-Estados gregas e o Império Romano, em seguida os principados e reinos medievais e, fi- nalmente, o Estado. Durkheim foi um sociólogo francês conhecido como um dos fundadores da sociologia. Suas principais obras são: Da Divisão do Trabalho Social (1893), As Regras do Método Sociológico (1895) e O Suicídio (1897). 3 32 Ciências Políticas Atualmente, a mais conhecida dessas sociedades políticas é o Esta- do Moderno. Ele se caracteriza pela existência de um território unifica- do e com fronteiras demarcadas e reconhecidas internacionalmente, pela existência de um direito único válido para todo o povo desse ter- ritório e um poder centralizado e reconhecido nesse território. Então, consideramos como os principais elementos do Estado o território, o povo e o poder, que serão trabalhados na próxima seção. A palavra Estado deriva do latim status e significa estado, posição e ordem. O Estado também é compreendido como um organismo com funções próprias; um modo de ser de uma sociedade politicamente organizada após o século XVI. Considerado somente como uma das for- mas de manifestação de poder, na Grécia foi identificado como a pólis, ou seja, a cidade-Estado; em Roma como os civitas; na Idade Média e na Moderna como principado, reino e república; e na Germânia como reich e staat (BASTOS, 1999; MALUF, 2011). Buscar as origens do Estado Moderno no Ocidente não é uma tarefa fácil, pois os fatos históricos podem ter variadas interpretações. Desse modo, os historiadores divergem um pouco sobre o tema. Essa ausência de consenso se manifesta com relação quer ao mo- mento do aparecimento do Estado moderno, quer ao nome que a ele se deve dar, quer, ainda, ao porquê do seu aparecimento. Sobre o momento do surgimento do Estado moderno, a maioria dos historiadores atuais considera que isso ocorreu em meados do século XVI, dividindo-se a minoria restante entre os que re- tardam para o XVII a sua ocorrência e os que a antecipam para o século XV, atribuindo aos Estados italianos do quattrocento o mérito da primazia. (FLORENZANO, 2007, p. 16, grifo do original) Apesar da ausência de consenso, podemos observar que a maio- ria dos estudiosos concorda que o Estado Moderno surgiu no século XVI. Então, é importante compreender que na sociedade ociden- tal ele emergiu com a consolidação do sistema capitalista também no século XVI. No capitalismo mercantilista foi necessário um poder cen- tralizado para que a economia pudesse se desenvolver. O capitalismo mercantilista é um sistema de relações amplas de comércio e não po- deria estar sob a vontade dos nobres que controlavam os feudos. Um poder centralizador poderia unificar as leis, criar exércitos e garantir a segurança dos comerciantes e artesãos. O Estado e o pensamento político 33 Na introdução da obra A ética protestante e o espírito do capitalismo, o sociólogo Max Weber (1976) indicou que tanto o Estado como o ca- pitalismo não podem ser considerados como uma criação exclusiva da civilização ocidental. Todavia, o autor alertou para o fato de que: somente na Civilização Ocidental teve lugar o desenvolvimento de um capitalismo racional, de fenômenos culturais dotados de “universal[idade] em seu valor e significado”, e o desenvolvimento de um Estado como uma “entidade política, com uma ‘Constitui- ção’ racionalmente redigida, um Direito racionalmente ordena- do, e uma administração orientada por regras racionais, as leis, e administrado por funcionários especializados”. (FLORENZANO, 2007, p. 11, grifo do original) Weber (1999) afirma que foi primeiro no Ocidente que se desen- volveu plenamente o Estado e, com base na análise da tipologia das formas de dominação, o autor defende que somente um poder que atue como autoridade reconhecida pela sociedade pode ser conside- rado uma forma de dominação legítima. Em sua tipologia das formas de dominação, o autor afirma que ao longo da história podemos en- contrar três tipos puros de dominação legítima. A primeira seria a do- minação carismática, que predominou na Antiguidade. Nessa forma de dominação, a autoridade do líder resulta das suas qualidades ou características pessoais reconhecidas pelo grupo. A segunda forma é a dominação tradicional, na qual a autoridade do líder é reconhecida com base na tradição, no hábito, na ideia de que as práticas devem ser de uma determinada forma porque ao longo do tempo têm sido assim. Esse tipo de dominação marcou principalmente o período medieval. Por último, o autor identificou a dominação racional burocrática. Essa é a forma predominante de dominação que surge com a forma- ção do Estado, com base no Direito (leis centralizadas) e na burocracia. Então, a principal forma de dominação da nossa época é a dominação racional burocrática, que tem a base da autoridade sustentada na cren- ça da legalidade e do funcionamento da administração burocrática. A dominação é, segundo Weber, a probabilidade de que uma ordem en- contre obediência com um determinado grupo de pessoas, sendo legí- tima quando ela ocorre pelo reconhecimento da autoridade do líder ou do governo e ilegítima quando se baseia na força. 34 Ciências Políticas Nesta seção, buscamos apresentar o que é uma sociedade política e o Estado como uma modalidade dela. A seguir, aprenderemos sobre a formação da sociedade e do Estado Moderno. 2.2 Formação da sociedade e do Estado Vídeo As sociedades são formadas por elementos materiais, formaise finalísticos. Compreendemos como elementos materiais os seres humanos e a sua base física; os formais como as normas jurídicas, a forma de organização e as relações de poder; e, por fim, os finalísti- cos como os que possuem uma grande variação, pois dependem dos objetivos comuns que o grupo estabelece, como o desenvolvimento econômico, cultural etc. Dentre esses elementos podemos afirmar que o principal é o mate- rial, pois sem humanos não existe sociedade. Entretanto, não podemos pensar que a sociedade signifique apenas a soma de indivíduos. Para ser uma sociedade, é necessário que esses indivíduos compartilhem entre si um conjunto de crenças, valores e normas que lhes possibilite uma vida em sociedade e uma certa identificação uns com os outros. Por exemplo, uma reunião de 200 pessoas de diversas nacionalidades em uma palestra sobre meio ambiente não forma uma sociedade. Cada uma dessas pessoas pode ser de uma sociedade diferente. Podemos ter uma brasileira, uma francesa, uma tailandesa etc. Nesse caso, essas 200 pessoas formam uma população e não uma sociedade, pois elas não partilham do mesmo conjunto de regras (sociais) e normas (formais). As sociedades humanas se formam a partir dos objetivos comuns e, para sua realização, organizam suas atividades e normas comuns, que devem ser partilhadas pelo grupo. Essas normas são elaboradas com base na cultura de cada grupo, pois consideram as crenças e valores do grupo. Como explicamos na seção anterior, as sociedades políticas surgem das sociedades em geral. Elas significam um grupo de indivíduos que irão administrar a vida em coletividade na busca de realizar os objeti- vos comuns. Então, as sociedades políticas estão relacionadas às ati- vidades de legislar, julgar, executar e cuidar da segurança. O Estado foi o modelo de sociedade política que surgiu na Idade Moderna em períodos diferentes e em locais distintos. O Estado e o pensamento político 35 O Estado é a mais completa das organizações criadas pelo homem. Pode-se até dizer que ele é sinal de um alto estágio de civilização. Nesse sentido o Estado aparece num momento his- tórico bem preciso (século XVI). Não se nega que a Antiguidade Clássica (as cidades gregas e o Império Romano) já apresentasse sinais precursores dessa realidade. Todavia, preferem os auto- res localizar o seu aparecimento no início dos tempos moder- nos, uma vez que só então, em última análise, se reúnem, nas entidades políticas assim denominadas, todas as características próprias do Estado. (BASTOS, 1999, p. 29) Ainda que tenham existido sociedades políticas anteriores ao sécu- lo XVI, será somente nesse período que encontraremos as condições concretas para a definição do Estado Moderno. De acordo com Bastos (1999, p. 34), “Estado é a organização política sob a qual vive o homem moderno. Ela caracteriza-se por ser a resultante de um povo vivendo sobre um território delimitado e governado por leis que se fundam num poder não sobrepujado por nenhum outro externamente e su- premo internamente”. O poder é, portanto, um elemento central na formação do Estado. Muitos autores buscaram defini-lo e a maioria concorda que, ao ser exercido, significa uma forma de impor a vontade em uma relação in- dependente de possíveis resistências. Essa relação pode ser tanto de um indivíduo sobre um grupo ou indivíduo quanto de um grupo sobre outro grupo ou sobre um indivíduo. Nesse sentido, o poder do Estado se exerce pela autoridade reconhecida. Como indica Bastos (1999), o poder do Estado não pode ser supe- rado por nenhum outro poder dentro do território que ele administra. Naturalmente, esse poder resulta da própria autorização da sociedade que atribuiu ao Estado esse papel e deverá, na atualidade, garantir que ele (o Estado) tenha limites com base nos regulamentos impostos por uma Constituição. Para Bastos (1999, p. 26), existe uma relação entre poder político, ordem social e bem comum quando: o poder político é o ponto para o qual convergem os demais poderes na medida em que pretendam influir nos destinos da sociedade. É ainda esse poder, por encerrar em si as funções de editar as normas gerais a que a sociedade deverá obediência (leis) e também a de aplicar essas mesmas normas através da administração e da jurisdição, que se traduz na via por excelên- cia da conformação, no sentido de dar forma à sociedade. 36 Ciências Políticas Nesse sentido, as demandas sociais traduzidas nos movimentos so- ciais e grupos de pressão são fundamentais para conseguir influenciar o modelo de leis que serão elaboradas e aplicadas, pois interferem no coti- diano dos indivíduos. O Estado tem o poder que a sociedade não possui. Se X tem poder, é preciso que em algum lugar haja um ou vários Y que sejam desprovidos de tal poder. É o que a sociologia nor- te-americana chama de teoria do “poder de soma zero”: o poder é uma soma fixa, tal que o poder de A implica o não poder de B. Esta tese (ou este pressuposto, quando a tese não é expressa- mente enunciada) encontra-se em autores tão diferentes ideo- logicamente como Marx, Nietzsche, Max Weber, Raymond Aron, Wright Mills. (LEBRUN, 1981, p. 7) Para compreender o poder do Estado, é preciso considerar que somente ele tem esse poder. O Estado pode legislar, julgar, executar e usar violência física de maneira legítima, a sociedade não. Então, a criação do Estado se justifica na segurança jurídica que ele transmite, na legislação e na organização dos fins que a sociedade busca alcançar. Ele existe para aplicar e executar, garantir e proteger os princípios ge- rais do Direito ou do ordenamento jurídico, seus fins devem ser a rea- lização do bem comum. Nunca deve ficar acima dos valores da pessoa humana e está sempre em constante modificação e desenvolvimento. Para autores como Marx (1977), é uma ilusão acreditar que o Estado irá buscar o bem comum, pois ele seria uma organização política que age em favor dos dominantes. Ao analisar a sociedade capitalista, o autor afirmou que o Estado era o Estado capitalista, pois havia sido criado pelo próprio sistema e funcionava segundo a lógica do modo de produção capitalista. Nesse modo de produção, as relações sociais de dominação se estruturam com base na propriedade privada dos meios (recursos como máquinas, matérias-primas etc.) para produzir. O resul- tado seria a acumulação de riqueza dos que detêm a propriedade e a exploração do trabalho dos que não a detêm. Então, em uma sociedade de desiguais não haveria possibilidade de o Estado trabalhar em bene- fício de todos igualmente, já que seu principal objetivo seria manter a propriedade privada e o sistema capitalista (de desiguais) funcionando. As teorias que resultaram das análises das obras de Marx (1977) têm sido fundamentais para analisar os Estados democráticos concretos, para compreender por que somente após o surgimento dos partidos de massa (dos trabalhadores) podemos falar em democracia e, ainda, para compreender criticamente a importância dos sistemas partidários O Estado e o pensamento político 37 e processos eleitorais. Também é importante considerar que o Estado democrático é animado pelos representantes que ocupam os cargos públicos. Nesse sentido, a disputa política entre desiguais aparece tan- to na escolha dos partidos quanto na dos eleitores. A complexidade do funcionamento dos Estados contemporâneos tem gerado um processo de profissionalização da política. Assim, muitas vezes, o bem comum tem ficado à mercê de burocratas que pouco conhecem a realidade de uma sociedade composta de desiguais. A profissionalização da política também tem sido apontada como uma necessidade do funcionamento das democracias modernas e não apenas como o seu efeito. Segundo Sáez e Freidenberg (2002, p. 138), o avanço da democracia na América Latina nos últimos tempos: supõe um processo triplo. A necessidade de articular regras de jogo assumidas pela maioria e que ao mesmo tempo compuses- sem espaços organizativos mínimosnos quais se realizasse a competição política. A incorporação da mobilização social atra- vés de formas de participação e de representação, e, finalmente, a criação de canais de seleção de pessoal político que liderasse e gerisse a política cotidiana. Essas três faces se referem a temas recorrentes da literatura das ciências sociais e aludem, em uma terminologia mais técnica, à institucionalização do regime políti- co, à intermediação entre as demandas da sociedade e o poder, e à profissionalização da política. Na teoria democrática contemporânea, formulada por Robert Dahl (2000), um princípio fundamental é a existência de vários grupos de pressão autônomos que conseguem se organizar em associações e defender os seus diferentes interesses. Essa democracia só pode se realizar em uma sociedade pluralista na qual os principais agentes so- ciais tenham condição de participar da vida política, tanto pela pres- são quanto pelo exercício dos cargos políticos (LOURENÇO, 2017). Por isso, alguns autores têm questionado o alcance dessa teoria na com- preensão da realidade latino-americana, sublinhando que os longos governos de ditadura, aqui vivenciados, marcaram de forma profunda as nossas instituições e que, portanto, será necessário percorrer um longo caminho para que se possa constatar, nessa parte do continente, aquilo que o teórico americano definiu como poliarquia. A democracia política, chamada por Dahl (2000) de poliarquia, de- pende expressamente de algumas condições formais para sua exis- tência, ou seja, condições básicas para a existência de um regime 38 Ciências Políticas politicamente democrático, com eleições livres, voto universal, liberda- de de expressão e de associação, além da possibilidade de vigilância e responsabilização daqueles que exercem os cargos públicos eletivos. Entretanto, as sociedades nas quais existe muita desigualdade rara- mente conseguem desenvolver um sistema com condições de efetiva competição para todos os setores da sociedade. Assim, mesmo que haja eleições com voto universal, a democracia poderá encontrar dificuldade de se realizar se as condições de liberdade e equidade na organização dos grupos que irão competir nas eleições não existirem. A participação da sociedade no Estado é fundamental, pois somente ele tem a legitimidade e legalidade para ordenar a sociedade. Nesse sentido, os modelos democráticos têm buscado permitir a represen- tação dos diversos grupos de forma mais equitativa nos espaços pú- blicos de decisão. Entretanto, desde o século XIX alguns pensadores da política alertavam sobre a dificuldade da participação das massas. Segundo eles, a classe política ou classe dirigente é extremamente im- portante, uma vez que toma as decisões e determina o caminho que a sociedade deve percorrer. Somente ela terá a capacidade de se orga- nizar, pois a sua condição de minoria facilita esse processo, enquanto o mesmo é inviável em relação às massas. A impossibilidade de orga- nização da maioria é também a razão da manutenção da sua condição de governados. Mais do que a condição de minoria organizada, ela possuiria tam- bém os recursos socialmente valorizados, permitindo-lhe impor a sua dominação. Somente a condição de minoria não explica a organização atingida pela classe política, por isso, esses pensadores alertam para o fato de que essa minoria governante possui interesses semelhan- tes partilhados, o que a torna coesa e a impulsiona a se organizar. Perissinotto (2009, p. 30) afirma que: poderíamos dizer que, de um lado, a condição de minoria é o requisito formal necessário para um grupo se transformar em classe dirigente, já que uma maioria não conseguiria se organi- zar e exercer o domínio político; por outro lado, entretanto, uma determinada comunidade de interesses (religiosos, econômicos, militares, funcionais) torna-se o requisito substantivo para expli- car por que aquela minoria se reúne e age de forma coordena- da, já que a mera condição de minoria não seria suficiente para tanto. Enfim, um grupo, para dominar, precisa ser minoria (via- bilidade técnica da ação conjunta organizada), mas isso não é O Estado e o pensamento político 39 suficiente; precisa também ter interesses em comum (o que gera uma motivação para agir coletivamente e impor o seu domínio sobre outros grupos). Na continuidade dessa visão pessimista sobre a possibilidade de participação das massas no Estado, Robert Michels (1982 apud PE- RISSINOTTO, 2009, p. 79), um importante autor alemão do século XIX, defendeu a ideia de que “as organizações não são meros instrumen- tos a serviço de grupos sociais. Pelo contrário, quando uma organiza- ção se forma e se consolida, ela gera interesses próprios que acabam por se sobrepor aos interesses daqueles que ela, a princípio, deveria representar”. O autor não acredita na realização da democracia, pois, segundo ele, ela necessita de uma série de organizações para garantir o seu fun- cionamento, mas, ao realizá-las, estas se colocam em oposição aos in- teresses democráticos, pois geram uma elite técnica que ocupa e dirige as massas. O conceito de democracia que Michels adotava era, entre- tanto, uma definição de democracia socialista do século XIX, de acor- do com a qual democracia significava autogoverno popular, em que as massas decidiriam seus destinos em assembleias públicas. Portanto, a democracia seria um regime inoperante por questões técnicas, pois multidões decidindo em assembleias públicas era algo impossível. Decorrente dessa incapacidade, surgiriam sempre os re- presentantes, ou seja, uma pequena elite de líderes. Michels (1982) afir- ma que as massas necessitam de líderes ou, mais precisamente, de se submeter a um chefe e que essa tendência universal gera a formação de uma minoria oligárquica que comanda. Para o autor, nas democra- cias contemporâneas, quanto mais complexas se tornam as funções, maior será a separação entre a massa e os que a comandam, devido ao próprio conhecimento técnico que as funções nas organizações de- mocráticas exigem. Contudo, nos dias atuais buscamos compreender a democracia como um regime conflituoso entre o que ela é historicamente em cada país e sua busca por ser um modelo ideal que represente a todos. Po- demos dizer que é exatamente essa relação entre o real e o ideal que alimenta o Estado Democrático de Direito. Para finalizar, é importante salientar que o poder do Estado é um poder político, jurídico e bélico ao mesmo tempo. Na próxima seção 40 Ciências Políticas discutiremos as principais teorias ou concepções sobre o surgimento do Estado e, por consequência, sobre os modelos defendidos pelos au- tores como sendo os mais adequados para a sociedade. 2.3 Concepções sobre o nascimento do Estado Vídeo As principais teorias da origem do Estado são a natural (jusnaturalis- ta), que buscou desvincular os valores humanos da religião; a teológica (religiosa), que afirma que o Estado foi criado por Deus e que existe um direito natural que precede o direito positivo; e a contratualista, para a qual o Estado teve origem em um pacto entre os homens, em que estes cedem parte de seus direitos em prol de um grupo de pessoas e que está relacionada à concepção de interesse coletivo. 2.3.1 Concepção natural A concepção natural, também conhecida como jusnaturalista, bus- cou explicar a necessidade do Estado de modo desvinculado da religião; sua formulação se deu no final da Idade Média e início da Moderna. Para o jusnaturalismo, o Estado deveria existir devido às necessidades da natureza humana. De acordo com essa concepção, existe um direito natural do homem que é anterior ao direito positivado. Ou seja, mes- mo antes das comunidades políticas instituírem as leis dos homens, haveria uma lei preexistente na natureza, um direito que todo homem carrega consigo já no nascimento. Segundo a teoria do direito natural, o Estado teve sua origem na própria sociedade e na ordem regular das coisas, que, com seu desenvolvimento natural,
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