Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Avaliação da Resistência ao Cisalhamento de um Solo Argiloso com Adição de Fibras de Papel Kraft Daphne Rossana León Mogrovejo Unicamp, Campinas, São Paulo, Brasil, daphne_mafis@hotmail.com Paulo José Rocha de Albuquerque Unicamp, Campinas, São Paulo, Brasil, pjra@fec.unicamp.br RESUMO: O objetivo deste trabalho é verificar a hipótese de que as fibras dispersas de papel Kraft, provenientes do processo de reciclagem de embalagens de cimento, podem ser utilizadas como estabilizante para melhorar a resistência ao cisalhamento de um solo argiloso. Após realizar ensaios em laboratório de caracterização física, compactação e cisalhamento direto com o solo na umidade ótima a partir de amostras deformadas, foram realizadas análises comparativas do solo sem fibra com as misturas de tal solo com 5%, 10% e 15%, em peso seco do solo, das fibras dispersas de papel Kraft. A partir da realização dos ensaios com três repetições, constatou-se um melhor desempenho da mistura quando adiciona-se 5% de fibras, resultando um aumento do ângulo de atrito da ordem de 48% em relação ao solo sem fibra. Os resultados indicam que a adição deste compósito pode ser mais uma alternativa econômica e sustentável para a estabilização de solos. PALAVRAS-CHAVE: Solo, Embalagens de Cimento, Reciclagem, Ensaios de Laboratório, Avaliação. 1 INTRODUÇÃO Dentre os maiores problemas da atualidade enfrentados pela gestão ambiental, pode-se destacar o impacto provocado principalmente pela grande geração de resíduos sólidos da Indústria da Construção Civil e posterior descarte na natureza. A construção civil é certamente o maior gerador de resíduos de toda a sociedade e seu impacto ambiental está associado ao uso intensivo de recursos naturais não renováveis, além de um grande volume de resíduos gerados e não aproveitados em sua grande maioria. Dentre os materiais descartados das construções, pode-se ressaltar o papel Kraft multifoliado proveniente das embalagens de cimento (sacos). Quase que invariavelmente essas embalagens não são reaproveitadas ou recicladas após o seu uso nas obras, gerando assim, um grande volume deste material. Segundo Buson (2009), após sua utilização, a embalagem acaba não sendo utilizada pelas empresas de reciclagem por encontrar-se contaminada pelo cimento. O papel utilizado nas embalagens de cimento é produzido seguindo as especificações rígidas definidas pelos fabricantes e usuários de sacos multifoliados. Estas especificações exigem a utilização de uma celulose sulfato de alta resistência, de fibra longa, geralmente empregada pura, o que garante à sua fibra excelentes propriedades físicas e mecânicas (BUSON, 2009). Estes materiais, contudo, possuem características importantes e poderiam ser úteis do ponto de vista geotécnico, pois muitas vezes o solo de um determinado local não apresenta as condições adequadas para a aplicação em construções. Ele pode ser pouco resistente, muito compressível ou apresentar características que deixam a desejar do ponto de vista econômico. Neste contexto, uma das alternativas é avaliar a possibilidade de melhorar as propriedades de engenharia do solo. O uso da estabilização não está associado somente a uma medida corretiva, mais do que isso, a uma medida preventiva ou de segurança contra condições adversas, que se desenvolvem durante a construção ou durante a vida da estrutura. Com base nos bons resultados de ensaios físicos e mecânicos obtidos por Buson (2009) no desenvolvimento e análise preliminar de blocos de terra compactada (BTCs), com a incorporação de fibras dispersas de papel Kraft provenientes da reciclagem das embalagens de cimento, esta pesquisa propõe um método de estabilização a partir da adição de fibras dispersas de papel Kraft a um solo argiloso, para avaliar a melhoria de suas propriedades mecânicas, por meio de ensaios laboratoriais; ressaltando que esta proposta é pioneira na área de geotecnia no Brasil. Sendo assim, o desenvolvimento desta pesquisa está associado à análise do comportamento da adição de 5%, 10% e 15%, em peso seco do solo, de fibras dispersas de papel Kraft, provenientes da reciclagem de embalagens de cimento, na resistência ao cisalhamento de um solo. 2 ASPECTOS GERAIS SOBRE APROVEITAMENTO DE RESÍDUOS E ESTABILIZAÇÕES 2.1. Aproveitamento de Resíduos Segundo Hiwatashi (1998), a reciclagem é o resultado de um processo através do qual os materiais que se tornariam lixo, ou estão no lixo, são separados, coletados adequadamente, triados e processados para serem utilizados como matéria-prima pela indústria, envolvendo uma série de agentes e atividades sem os quais não seria viável a recuperação do resíduo. A Norma ABNT NBR 10004/04 ressalta que os resíduos nos estados sólido e semi-sólido são aqueles que resultam das atividades de origem industrial, doméstica, hospitalar, comercial, agrícola, de serviços e de varrição. Ainda segundo a Norma em menção, os resíduos são classificados quanto aos seus riscos potenciais ao meio ambiente e à saúde humana em duas classes: Classe I (perigosos) e Classe II (não perigosos), sendo esta última subdividida em Classe II A (não inertes) e Classe II B (inertes); os resíduos de papel e papelão pertencem à classe II A, com a codificação A006. Conforme Marson et. al. (2010), a Política Estadual de Resíduos Sólidos – PERS –, estabelecida pela Lei Estadual N° 12300/06 e regulamentada pelo Decreto N° 54645/09, define as seguintes categorias de resíduos sólidos para fins de gestão e gerenciamento: resíduos urbanos (provenientes de residências e estabelecimentos comerciais); resíduos industriais (de atividades industriais, mineração e estações de tratamento); resíduos de serviços de saúde (de atividades médico-assistencial humana e animal); resíduos de atividades rurais (da atividade agropecuária); resíduos provenientes de portos, aeroportos, terminais rodoviários e ferroviários, postos de fronteira e estruturas similares; e, resíduos da construção civil (de obras de construção civil e afines). Conforme a Resolução 307 do CONAMA de 17 de julho de 2002 e alterada pelas resoluções 448/12, 431/11 e 348/04, os resíduos da construção civil são classificados em quatro classes: classe A (resíduos reutilizáveis ou recicláveis como agregados); classe B (resíduos recicláveis para outras destinações. Ex: papel Kraft); classe C (resíduos para os quais não foram desenvolvidas tecnologias ou aplicações economicamente viáveis que permitam a sua reciclagem ou recuperação) e classe D (resíduos perigosos oriundos do processo de construção). As experiências bem sucedidas com o desenvolvimento de produtos para a construção civil utilizando resíduos incorporados são impulsionadas, principalmente, pela legislação ambiental onde há uma verdadeira política que visa reduzir a eliminação direta de resíduos em aterros industriais ou sanitários, sem prévia valorização ou tratamento (BUSON, 2009). O papel Kraft natural para embalagens multifoliadas é fabricado com pasta química de sulfato não branqueada, essencialmente de fibra longa, em geral nas gramaturas de 80 a 90 g/m 2 . É altamente resistente ao rasgo e com boa resistência ao estouro (BRACELPA, 2013). Anualmente são produzidas no Brasil aproximadamente 337.000 toneladas de papel Kraft natural para embalagens multifolhadas, o que equivale a 3,3% da produção brasileira de papel (BRACELPA, 2013). Nem todo essepapel é utilizado para o ensacamento de cimento, mas caso o fosse, representaria 2,2 bilhões de embalagens de 50 kg de cimento por ano. A importância do aproveitamento de resíduos deve-se basicamente à possibilidade de desenvolver materiais com boa qualidade e baixo custo a partir de subprodutos industriais, disponíveis localmente, por meio da investigação de suas potencialidades e à interface direta do setor da construção com a cadeia produtiva fornecedora de insumos (ROCHA E CHERIAF, 2003). 2.2. Estabilizações de Solos com Fibras Nogami & Villibor (1995) definiram a estabilização de solos e materiais relacionados (areia, pedregulho etc.), in-situ ou transportado, compactado artificialmente, como sendo a modificação de qualquer propriedade dos solos que melhore seu comportamento mecânico e hídrico, quando sob a ação de cargas e das intempéries. Sabe-se que, a estabilização de solos tem como propósito melhorar as propriedades de: estabilidade volumétrica, resistência, permeabilidade, compressibilidade e durabilidade, através dos mecanismos de estabilização que podem ser mecânica, física e química. Os três métodos mais comuns de estabilização (química) são: a adição de cimento, de cal e de produtos asfálticos. Existem outras estabilizações não convencionais, mas de aplicação restrita por razões econômicas ou de ordem prática. Algumas destas são: adição de licor negro Kraft (VIEIRA, 1994), de DS-328, de cinzas volantes, de vinhoto, de RBI grade 81, de ácido fosfórico, entre outras. Porém, existe também a possibilidade de reforçar materiais e solos com fibras, desde as naturais até as fabricadas pelo homem. Suas características são inerentes ao tipo de material do qual são compostas e seu processo de fabricação. As fibras dispersas de papel Kraft utilizadas nesta pesquisa, por serem provenientes da polpa de celulose das embalagens de cimento, encontram-se na família das fibras naturais. Conforme Bento (2006), a técnica de inclusão de fibras no solo é parte integrante da tecnologia dos materiais compósitos (que são aqueles formados pela combinação de dois ou mais materiais, constituindo um conjunto polifásico que apresenta duas fases básicas: as fibras e a matriz em que as mesmas estão incluídas, sendo as propriedades do conjunto, superior às de seus componentes em separado). No trabalho de Buson (2009), procedeu-se à avaliação de diferentes composições de materiais em compósitos do tipo Krafterra (solos com a incorporação de fibras dispersas de papel Kraft e uma fração de cimento) para a produção de componentes construtivos do tipo Blocos de Terra Compactada – BTCs – e de elementos construtivos para vedação vertical. Para tal, foram realizados estudos e análises com o objetivo de caracterizar o novo material, bem como verificar o desempenho físico- mecânico dos seus componentes e elementos construtivos. 3 MATERIAL E MÉTODOS 3.1. Solo Para o desenvolvimento desta pesquisa, optou- se por utilizar um tipo de solo de textura argilosa, proveniente da região Metropolitana de Campinas, coletado de escavações em obras próximas ao Campo Experimental de Mecânica dos Solos e Fundações da Unicamp (FEC) no município de Campinas/SP. Foram realizados ensaios de caracterização física no solo, normatizados pela ABNT. 3.2. Reciclagem das Embalagens de Cimento Conforme o procedimento de reciclagem das embalagens de cimento proposto por Buson (2009), mas com algumas modificações feitas para esta pesquisa, foram realizados os seguintes procedimentos: limpeza das embalagens de cimento, fragmentação do papel, imersão das embalagens de cimento em água, trituração do papel, retirada do excesso de água da polpa de celulose e dispersão das fibras de papel Kraft em uma argamassadeira. Quanto mais eficiente for a retirada da água em excesso da polpa de celulose, mais fácil será o processo de dispersão das fibras. Entretanto, deve-se evitar que a polpa fique totalmente seca, pois isso dificulta o processo de mistura com o solo. A Figura 1 apresenta com detalhe a polpa de celulose e a fibra obtida no processo. Figura 1. Detalhe da polpa de celulose e das fibras dispersas de papel Kraft. 3.3. Mistura Solos - Fibras Dispersas de Papel Kraft Buson (2009) apresenta um roteiro eficiente para a ordem de colocação dos materiais na mistura do solo com as fibras. Nesta pesquisa foram feitas algumas adaptações, conforme descrito a seguir: colocação das fibras em uma argamassadeira, acréscimo de uma pequena parte do solo para cobrirem-se uniformemente as fibras dispersas e acréscimo do solo restante a esta mistura, alternando com a água necessária para obter a umidade ótima de compactação. 3.4. Preparação de Amostras e Programa de Ensaios Foram analisadas amostras do solo coletado em seu estado natural e quando estabilizado com 5%, 10% e 15% de fibras dispersas de papel Kraft em relação ao peso de solo seco, com três repetições de cada ensaio. 3.4.1. Ensaios de Compactação Os ensaios de compactação foram realizados na energia do ensaio Proctor Normal, segundo a metodologia descrita na Norma ABNT NBR 7182/86, para fins de determinação do peso específico aparente seco máximo (γdmáx) e da umidade ótima (wót) no solo argiloso, no estado natural e após a incorporação das fibras. 3.4.2. Moldagem dos corpos-de-prova Os corpos-de-prova utilizados nos ensaios de cisalhamento direto foram moldados nos parâmetros ótimos (wót e γdmáx) da energia de compactação supracitada. Os solos foram compactados dinamicamente no molde do ensaio de compactação Proctor com energia normal. A amostra compactada foi extraída e a partir dela se talharam os corpos-de-prova com ajuda de um anel metálico padronizado. Os corpos-de-prova mediram aproximadamente 30 mm de altura e 63,5 mm de diâmetro. 3.4.3. Ensaios de Cisalhamento Direto Os corpos de prova foram preparados seguindo a metodologia proposta pela Norma Técnica ASTM D3080/D3080M-11. Para a realização dos ensaios de cisalhamento direto, utilizaram- se tensões normais de 50, 100 e 205 kPa. Para a obtenção dos parâmetros de resistência (ângulo de atrito (ϕ) e intercepto de coesão (c)), utilizou-se a média aritmética dos valores obtidos das envoltórias de resistência plotadas a partir das tensões de ruptura para cada tensão normal. Cabe ressaltar que o critério para definir as envoltórias foi de Mohr-Coulomb. 4 RESULTADOS E DISCUSSÕES Na Tabela 1, encontram-se as informações sobre a distribuição granulométrica (NBR 7181/84), os limites de Atterberg (LL: NBR 6459/84, LP: NBR 7180/84 e LC: NBR 7183/82), o peso específico dos grãos – γs (NBR 6508/84) e as classificações segundo os sistemas USCS (Unified Soil Classification System), AASHTO (American Association of State Highway and Transportation Officials) e MCT (DNER-CLA 259/96). Tabela 1. Caracterização física da amostra de solo e classificações respectivas, segundo os sistemas USCS, AASHTO e MCT. Propriedades analisadas Granulometria segundo ABNT – NBR 6502/95(%) Pedregulho (ϕ > 2 mm) 0 Areia grossa (0,6 < ϕ ≤ 2 mm) 3 Areia média (0,2 < ϕ ≤ 0,6 mm) 11 Areia fina (0,06 < ϕ ≤ 0,2 mm) 17 Silte (0,002 < ϕ ≤ 0,06 mm) 32 Argila (ϕ ≤ 0,002 mm) 37 γs (kN/m 3 ) 29,3 Limites de Atterberg (%) Limite de liquidez (LL) 46 Limite de plasticidade(LP) 32 Limite de contração (LC) 15 Índice de plasticidade (IP) 14 Classificações USCS ML AASHTO A-7-5 (10) MCT LG’ As classes nas quais se enquadra o solo pesquisado neste trabalho são: pela USCS, trata-se de um silte inorgânico de mediana compressibilidade com areia; pela AASHTO, é um solo argiloso, cujo comportamento como camada de pavimento é regular a mau e apresenta grandes variações de volume entre os estados seco e úmido e elevado limite de liquidez; e, pela metodologia MCT, é um solo laterítico argiloso que apresenta resistência à erosão hidráulica quando compactados apropriadamente, mas possui colapsibilidade em estado natural por imersão em água e alta permeabilidade quando apresentam agregados bem desenvolvidos. Na Tabela 2, encontram-se os valores dos parâmetros ótimos de compactação (wót e γdmáx) determinados para o solo, bem como para as respectivas misturas. A partir dos valores apresentados nesta tabela, notou-se que a adição das fibras dispersas de papel Kraft foi responsável por alterações nos parâmetros ótimos de compactação do solo estudado. A adição de 5%, 10% e 15% de fibras, em relação ao peso seco de solo, promoveu reduções da ordem de 4%, 8% e 11%, respectivamente, nos valores de peso específico aparente seco máximo no solo. Verificaram-se também, aumentos da ordem de 5%, 10% e 16%, respectivamente, nos valores de umidade ótima no solo. Tabela 2. Resultados dos ensaios de compactação. Parâmetros Porcentagem de fibras dispersas de papel Kraft 0% 5% 10% 15% Peso específico aparente seco máximo - γdmáx (kN/m 3 ) A 16,1 15,6 14,8 14,4 B 16,0 15,6 14,8 14,5 C 16,2 15,5 14,8 14,4 X 16,1 15,5 14,8 14,4 Sd 0,086 0,012 0,006 0,049 CV(%) 0,54 0,07 0,04 0,34 Teor de umidade ótima - wót (%) A 24,9 26,3 28,2 28,6 B 25,2 26,1 28,3 28,9 C 24,5 26,2 27,7 29,5 X 24,9 26,2 28,1 29,0 Sd 0,315 0,126 0,312 0,486 CV(%) 1,3 0,5 1,1 1,7 Onde: A, B, C são as repetições dos ensaios; X é a média; Sd é o desvio padrão; e CV é o coeficiente de variação. O teste de Dunnett (MONTGOMERY, 2001), ao nível de significância de 5%, mostrou que a adição de fibras dispersas de papel Kraft, independentemente da porcentagem, diminuiu significativamente o valor do peso específico aparente seco máximo e aumentou significativamente o valor de umidade ótima no solo. Acredita-se que o aumento da umidade ótima com o acréscimo do teor de fibras dispersas de papel Kraft nas misturas, esteja relacionado ao maior consumo da água das fibras, ou seja, ao potencial de absorção. As reduções dos valores de peso específico aparente seco máximo podem ser atribuídas à formação de flocos, estabelecendo-se ligações entre as partículas menores e favorecendo (pelo agrupamento desses agregados menores formados pela adição das fibras) a formação de agregados maiores que, consequentemente, produzem um material com estrutura porosa. Das repetições realizadas nos ensaios, optou- se por determinar a média das tensões cisalhantes máximas para cada tensão normal aplicada. Assim, as envoltórias médias para o solo e suas respectivas misturas estão ilustradas na Figura 2. Figura 2. Envoltórias médias de resistência do ensaio de cisalhamento direto. Na Tabela 3 encontram-se os valores de ângulo de atrito interno e intercepto de coesão, determinados a partir das envoltórias de resistência de cada ensaio, bem como os valores médios, desvio padrão e coeficiente de variação. Tabela 3. Resultados dos ensaios de cisalhamento direto. Parâmetros Porcentagem de fibras dispersas de papel Kraft 0% 5% 10% 15% Ângulo de atrito interno - ϕ (º) A 26 37 30 31 B 25 36 30 33 C 25 37 32 29 X 25 37 31 31 Sd 0,39 0,81 1,29 1,69 CV(%) 1,5 2,2 4,2 5,4 Coesão - c (kPa) A 72 71 67 62 B 75 85 67 59 C 76 72 63 66 X 74 76 66 62 Sd 1,70 7,89 2,10 3,18 CV(%) 2,3 10,3 3,2 5,1 Onde: A, B, C são as repetições dos ensaios; X é a média; Sd é o desvio padrão; e CV é o coeficiente de variação. Analisando os resultados apresentados, observou-se que a inclusão de 5%, 10% e 15% de fibras dispersas de papel Kraft, em relação ao peso seco de solo, promoveu aumentos da ordem de 48%, 24% e 24%, respectivamente, nos valores de ângulo de atrito do solo. Verificou-se também aumento do intercepto de coesão da ordem de 3% quando adicionado 5% de fibras e redução da ordem de 12% e 16% quando adicionados 10% e 15% de fibras, respectivamente. O teste de Dunnett, ao nível de significância de 5%, mostrou que a adição de fibras dispersas de papel Kraft, independentemente da porcentagem, aumentou significativamente o valor do ângulo de atrito e indicou que não houve diferença significativa entre os valores do intercepto de coesão nos tratamentos com 5% e 10% de fibras, mas houve diminuição significativa no tratamento com 15% de fibras. Cabe ressaltar que os valores obtidos dos desvios padrão e coeficientes de variação nos ensaios de compactação e resistência ao cisalhamento são aceitáveis, com valores menores do que 10%, indicando que as médias obtidas são válidas. Na Figura 3 apresentam-se as curvas médias da tensão cisalhante vs. deformação cisalhante específica horizontal do solo e das misturas solo-fibra Kraft. 0 50 100 150 200 250 0 50 100 150 200 250 Te n sã o c is al h an te τ ( kP a) Tensão Normal σ (kPa) solo - 0% fibra Kraft solo - 5% fibra Kraft solo - 10% fibra Kraft solo - 15% fibra Kraft Figura 3. Curvas médias de tensão cisalhante vs. deformação específica horizontal das misturas do solo – fibra Kraft. É possível observar que a deformação cisalhante específica horizontal aumenta conforme se eleva a porcentagem de fibras no solo estudado. Entretanto, o tratamento com 5% de fibras não apresentou grandes diferenças nas deformações específicas nem nas variações volumétricas, mas os tratamentos com 10% e 15% acrescentaram ambos os parâmetros, quase ao dobro. Acredita-se, então, que a adição excessiva de fibras fornece ductilidade ao solo, o que faz apresentar maiores deformações e variações volumétricas nos corpos de prova dos ensaios de cisalhamento. As análises estatísticas mostraram que a adição de 5% de fibras no solo contribuiu a uma melhoria significativa nos valores de ângulo de atrito e variações pouco significativas nos parâmetros de compactação, quando comparado com o solo sem fibra; ademais, a mistura do solo com 5% de fibra não apresentou alteração na deformação dos corpos de prova dos ensaios de cisalhamento, sendo que o inverso aconteceu no solo com 10% e 15%. Portanto, com base nestas observações, optou-se por fazer uma otimização dos resultados do ensaio de cisalhamento, isto é, determinar o teor de fibra ideal que forneceria o máximo ângulo de atrito, realizando algoritmos no software Matlab 7.0, a partir do método de diferenças divididas para determinar o polinômio de interpolação (BURDEN E FAIRES, 2010) que permite otimizar o teor de fibra. A partir destas análises, verificou-se que o teor ótimo de fibra seria de 4,7% e o ângulo de atrito máximo atingido seria de 37°. 5 CONCLUSÕES O uso das fibras dispersas de papel Kraft está diretamente ligado com a preocupação ambiental do tema proposto. Entretanto, a contribuição deste trabalho não é unicamente a possibilidadede utilizar este material tão farto na sociedade como estabilizante, mas também auxiliar nos estudos para seu descarte. Independentemente dos percentuais de fibras utilizados nesta pesquisa, os valores de ângulo de atrito se elevaram significativamente, sendo o melhor resultado apresentado quando adicionado 5% de fibras, com um aumento da ordem de 48%. A coesão sofreu diminuições significativas com 10% e 15% de fibras. O possível teor ótimo de fibra para este solo melhorar as suas propriedades geotécnicas significativamente é de 4,7%. Considera-se, portanto, a mistura solo - fibras dispersas de papel Kraft como sendo mais uma alternativa para a estabilização de solos, desde que sejam feitas as análises respectivas das propriedades físicas e mecânicas dos solos; e também como uma alternativa para a redução do impacto ambiental causado pelo descarte 0 50 100 150 200 250 0 5 10 15 20 25 30 Te n sã o C is al h an te τ i ( kP a) Deformação cisalhante específica horizontal εhi (%) CP 50 kPa - 0% fibra Kraft CP 100 kPa - 0% fibra Kraft CP 205 kPa - 0% fibra Kraft CP 50 kPa - 5% fibra Kraft CP 100 kPa - 5% fibra Kraft CP 205 kPa - 5% fibra Kraft CP 50 kPa - 10% fibra Kraft CP 100 kPa - 10% fibra Kraft CP 205 kPa - 10% fibra Kraft CP 50 kPa - 15% fibra Kraft CP 100 kPa - 15% fibra Kraft CP 205 kPa - 15% fibra Kraft desordenado das embalagens de cimento nas obras. AGRADECIMENTOS Ao CNPq, pela concessão da bolsa de estudos ao primeiro autor e à Universidade Estadual de Campinas, por meio do Departamento de Geotecnia e Transportes da Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo, por ter possibilitado a execução do presente trabalho. Ao Eng. Eliezer Laister (Votorantim Cimentos) pela colaboração no fornecimento dos sacos de cimento. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS American Society For Testing And Materials – ASTM International (2011): D3080/D3080M-11 – Standard Test Method for Direct Shear Test of Soils Under Consolidated Drained Conditions. Associação Brasileira De Normas Técnicas – ABNT (1984): NBR 6459 – Solo – determinação de limite de liquidez, método de ensaio. Rio de Janeiro. Associação Brasileira De Normas Técnicas – ABNT (1995): NBR 6502 – Rochas e solos. Rio de Janeiro. Associação Brasileira De Normas Técnicas – ABNT (1984): NBR 6508 – Grãos de solos que passam na peneira de 4,8 mm – Determinação da massa específica. Rio de Janeiro. Associação Brasileira De Normas Técnicas – ABNT (1984): NBR 7180 – Solo – determinação de limite de plasticidade, método de ensaio. Rio de Janeiro. Associação Brasileira De Normas Técnicas – ABNT (1984): NBR 7181 – Solo – análise granulométrica, método de ensaio. Rio de Janeiro. Associação Brasileira De Normas Técnicas – ABNT (1986): NBR 7182 – Solo – Ensaio de Compactação. Rio de Janeiro. Associação Brasileira De Normas Técnicas – ABNT (1982): NBR 7183 – Determinação do limite e relação de contração de solos. Rio de Janeiro. Associação Brasileira De Normas Técnicas – ABNT (2004): NBR 10004 – Resíduos sólidos – Classificação. Rio de Janeiro. Associação Brasileira De Celulose E Papel - BRACELPA (2013): Relatório Estatístico 2011-2012. Disponível na página eletrônica http://www.bracelpa.org.br/bra2/sites/default/files/est atisticas/rel2011.pdf. Acesso em 12/2013. Bento, Priscila Fiochi (2006) Uso de cal e fibras na melhoria de materiais para utilização em estruturas de pavimentos. Dissertação (Mestrado) – Faculdade de Tecnologia, Departamento de Engenharia Civil, Universidade de Brasília, 116p. Burden, R. L.; Faires, J. D. (2010) Numerical Analysis, 9 th edition, Books/Cole, Boston, USA, cap. 3. Buson, Márcio Albuquerque (2009) KRAFTERRA: Desenvolvimento e análise preliminar do desempenho técnico de componentes de terra com a incorporação de fibras de papel Kraft provenientes da reciclagem de sacos de cimento para vedação vertical. Tese (Doutorado) - Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, Universidade de Brasília, 135p. CONAMA (2002): Resíduos da Construção Civil – Resolução N° 307 de 05/07/2002. Ministério do Meio Ambiente, Brasília. Disponível na página eletrônica http://www.mma.gov.br/port/conama/legiabre.cfm?co dlegi=307, com suas respectivas alterações. Acesso em 12/2013. Departamento Nacional De Estradas De Rodagem – DNER (1996): CLA 259/96 – Classificação de solos tropicais para finalidade rodoviárias utilizando corpos-de-prova compactados em equipamento miniatura. Rio de Janeiro. Hiwatashi, Erica (1998) O estudo de cadeias no processo de reciclagem dos resíduos domiciliares inorgânicos de Porto Alegre. Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Administração da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Porto Alegre. Mansor et. al. (2010) Resíduos sólidos – Cadernos de Educação Ambiental, Secretaria de Estado do meio Ambiente (SMA) / Coordenadoria de Planejamento Ambiental (CPLA), São Paulo, 147p. Montgomery, Douglas C. (2001) Design and analysis of experiments, 5 th edition, John Wiley & Sons Inc., Arizona, USA, cap. 3. Nogami, J. S; Villibor, D. F. (1995) Pavimentação de Baixo Custo com Solos Lateríticos, Editora Villibor, São Paulo, 240p. Rocha, Janaíde Cavalcante; Cheriaf, Malik (2003) Aproveitamento de resíduos na construção. In: Coleção Habitare, Volume 4 – Utilização de Resíduos na Construção Habitacional, ANTAC. Porto Alegre, p. 72-93. Vieira, Sergio Vilhena (1994) Estabilização de solos com licor negro Kraft concentrado para fins rodoviários. Dissertação (Mestrado em Ciência Florestal) – Universidade Federal de Viçosa UFV, Viçosa, 126p.
Compartilhar