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CRC Caderno de Referência de Conteúdo INTRODUÇÃO1. Seja bem-vindo(a) à disciplina História da América I. Neste livro-texto, você poderá acompanhar como ocorreu o desenvolvi- mento da vida humana no território americano. Para muitos au- tores, essa é uma história que teve seu início há mais ou menos 40.000 anos, mas existem mais dúvidas do que certezas quanto a essa data. A única convicção é de que os homens que chegaram à América antes mesmo de ela receber esse nome desenvolveram uma vida em sociedade, a qual nos deixou um infinito número de indícios ao longo de todo o continente. Naquela época, a vida em sociedade não ocorreu de manei- ra uniforme; ela se deu ao longo de todo o nosso território e em diferentes graus de complexidade social e desenvolvimento tecno- lógico. Apesar disso, de toda a vasta extensão do continente ame- ricano, duas regiões aglomeraram um número maior de pessoas do que em outras localidades, apresentando-nos sociedades mais complexas e vestígios arqueológicos mais abundantes. © História da América I Centro Universitário Claretiano 14 Uma dessas faixas se localiza, genericamente, na região do atual México e América Central, chamada de Zona Nuclear Me- soamericana. A outra faixa se situa na região que compreende as cadeias de montanhas dos Andes e o litoral do Pacífico, numa faixa de terra que se estende do Equador ao Chile, a qual chamamos de Zona Nuclear Andina Central. Nessas duas zonas nucleares, povos como os maias, os as- tecas e os incas construíram organizações sociais que nos enchem de fascínio e dúvidas até os dias de hoje, e, com eles, vários outros povos também ergueram casas, prédios e templos. Mais do que construções e vestígios arqueológicos, é preciso saber que, nesses locais, viveram homens capazes de conduzir sua própria história, dar significado à sua realidade e explicá-la, bem como produzir di- ferentes tipos de sociabilidades. Como na Europa, na Ásia ou em qualquer outro lugar, esses homens construíram relações sociais ao longo do tempo e, como tais, merecem atenção. Por isso, você os estudará nesta discipli- na. Conforme indicamos, nosso enfoque está voltado para a compreensão dos povos que se constituíram ao longo das duas zo- nas nucleares mencionadas. Entretanto, outras referências a res- peito da história de outras comunidades também serão abordadas neste estudo. Antes mesmo de Colombo chegar com suas caravelas à Amé- rica, em 12 de outubro de 1492, esses povos já possuíam uma in- tensa vida e uma fascinante história. Vamos conhecê-las! Ao iniciar esta disciplina, você precisará acompanhar as etapas de aprendizagem com dedicação e interagir constante- mente com seus professores e colegas de curso para, assim, ficar atualizado(a) não só com o conteúdo da disciplina, mas também com as discussões travadas no Fórum ou na Lista. 15© Caderno de Referência de Conteúdo Dessa maneira, se ficar atento(a), participar e interagir, será mais fácil acompanhar o prosseguimento do conteúdo e, com isso, beneficiar-se do alargamento de ideias que trazem as discussões e os debates. Você se sentirá estimulado(a) a desenvolver mais este projeto em sua vida. ORIeNTAÇões PARA O esTUDO DA DIsCIPLINA2. Abordagem Geral da Disciplina Bem- vindos à disciplina de História da América I. Nesta disciplina, vocês verão as principais características da ocupação e desenvolvimento da vida humana no continente Americano e poderão acompanhar as principais características das sociedades americanas que habitaram nosso continente até a chegada dos eu- ropeus em 12 de outubro de 1492. Não quero dizer que a “descoberta” da América fez com que esses agrupamentos humanos simplesmente desaparessem. Ao contrário, muito de sua cultura e de suas tradições são a base da identidade atual de povos americanos, como os peruanos, mexi- canos e bolivianos, por exemplo. O que quero dizer é que, com a chegada dos homens vindos do outro lado do Atlântico, a dinâmica da vida de tais sociedades mudou completamente. A sua forma de produzir, de cultuar seus deuses, de se alimentar, de trabalhar, entre tantas outras coisas, foram definitivamente remodeladas, dando fim à antiga organização que dava uma lógica própria a sua vida cotidiana. É verdade que muitas tribos, etnias e aldeias simplesmen- te viram seus herdeiros morrerem uns após outros, vítimas de doenças, de guerras, da escravidão, da não adaptação aos novos conceitos de vida e trabalho e por tantos outros motivos. Porém, muitos permaneceram vivos e participaram da construção de um novo mundo, de novas sociabilidades e modalidades de trabalho, © História da América I Centro Universitário Claretiano 16 mesmo que isso tenha custado um alto preço. Para que vocês te- nham uma noção precisa disso, tanto o México como o Peru pos- suem mais de 80% de sua população de origem indígena. Contudo, o nosso objetivo não é falar sobre o encontro en- tre os dois continentes. Queremos falar sobre como ocorreu e se desenvolveu a vida dos homens na América, muito antes dela re- ceber este nome, muito antes de ser encontrada pelas caravelas de Cristóvão Colombo. Esclarecendo, aqui, nosso assunto é sobre a história das sociedades antes de Colombo: a América pré-colom- biana. Com certeza vocês já ouviram ou leram alguma coisa a res- peito das sociedades que habitavam o nosso continente antes da chegada dos barcos comandados pelo Genovês. Existem muitos livros, muitas teorias, muitas lendas e mitos que povoam o ima- ginário popular e que se remetem a essas sociedades. No caso do Brasil, temos, por exemplo, as lendas Tupi sobre Yara (a rainha das águas), as Lágrimas eternas de Potyra e sobre Tucumã e a forma- ção da noite. Já para o restante da América, as histórias mais conhecidas falam sobre os povos que tiveram um nível de organização social e material mais complexo, entre eles, os Maias, os Astecas e os Incas. Os Maias e os Astecas viveram onde hoje se localizam os territórios do México e de boa parte da América Central, à exceção do Panamá e das Ilhas do Caribe. Esta região é chamada Meso- América. A história dos Maias prolongou-se por vários séculos, desde dois milênios antes da Era Cristã, até meados do século 16. Porém, o seu apogeu se deu por volta do século oitavo. Recentemente, os Maias voltaram a ganhar espaço na literatura, principalmente aquela de cunho místico-religioso. Muito se comenta sobre a pro- fecia e o calendário Maia, que preveem o fim do mundo para o ano de 2012. Vocês verão mais sobre isso no decorrer desta disciplina. 17© Caderno de Referência de Conteúdo Já os Astecas possuem uma história mais curta. Provavel- mente, a organização de sua sociedade ocorreu por volta dos sé- culos 12 e 13, sendo que o seu apogeu foi atingido rapidamente no século 15. Donos de um poderio militar e de uma ampla fama de violência, os Astecas foram também excelentes construtores. Prova disso foi a construção de sua capital, Tenochtitlan. Localiza- da em uma ilha pantanosa no centro do lago Texcoco, Tenochtitlan possuiu um complexo de pirâmides, aquedutos, ilhas artificiais de plantação e várias outras obras arquitetônicas. Diferentemente dos Astecas e dos Maias, os Incas viveram na parte sul de nosso continente e ocuparam uma grande faixa de terra que vai da região do atual Equador, passando pelo Peru, Bolívia, noroeste da Argentina e norte do Chile. É a chamada Zona Andina Central. No entanto, assim como os Astecas, a organização de sua sociedade foi rápida e seu apogeu ocorreu por volta do sé- culo 15. Sem sombras de dúvida, a cidade de Machu Picchu é o ele- mento mais conhecido e divulgado sobre os Incas. Muitas vezes, ao falarmos sobre os Incas, imediatamente a cidade de Machu Picchu se torna um paralelo inevitável em nossas conversas. O in- teressante é que,para a organização do grandioso império Inca, Machu Picchu não possuiu uma posição de destaque. Porém, a sua importância para nós é realmente merecida. Sabem por quê? O seu descobrimento recente, no início do século 20, permi- tiu que a cidade fosse encontrada intacta. Sem a intervenção espa- nhola na época colonial, Machu Picchu pôde manter a sua organi- zação urbano arquitetônica original, o que nos permite aproximar com mais segurança do estudo desse povo. Aliás, quanto à ocupação espanhola na América, este é um grande problema que encontramos no estudo da história da Amé- rica Pré-Colombiana. Muito de nossas fontes de estudo foram completamente destruídas durante a época da colonização. Outras tantas foram danificadas ou reapropriadas para o uso espanhol. © História da América I Centro Universitário Claretiano 18 A cidade de Tenochtitlan mencionada anteriormente foi completamente destruída pelos espanhóis durante a colonização. As pedras de seus templos foram utilizadas para a construção de edifícios administrativos e igrejas coloniais. O próprio lago Texcoco foi totalmente drenado. Em cima da antiga capital asteca hoje se encontra a capital mexicana, a cidade do México. Justamente por isso, atualmente, naquela cidade, durante escavações para a construção de edifícios ou para a expansão de linhas de metro, é comum que as máquinas encontrem restos ar- queológicos da majestosa cidade de Tenochtitlan. Entretanto, se a cidade foi totalmente devastada, como é que sabemos detalhes sobre a sua construção, bem como os pré- dios que nela existiam? Como podemos saber se ela era, de fato, majestosa? A resposta é simples. Logo que chegaram à América, os colo- nizadores espanhóis começaram a anotar, desenhar e escrever so- bre tudo aquilo que viam. O próprio Colombo foi o primeiro a fazer isso em seus diários de viagem. Porém, grande parte dos relatos foi feito por padres que, durante o processo de evangelização dos povos americanos, descreveram o modo de vida dos nativos, suas práticas religiosas, suas formas de plantar, cultivar, comer, festejar, enfim. Além disso, outros cronistas leigos descreveram as riquezas e grandiosidades que encontraram ao longo de sua peregrinação no novo mundo. Por meio da leitura dessas crônicas é que podemos imaginar como eram as casas, os templos e a vida dos homens que habita- vam a América antes da chegada de Colombo. Um exemplo disso é que um dos mais conhecidos cronistas que descreveu a cidade de Tenochtitlan foi Bernal Diaz del Catillo. Vejamos o que ele nos conta sobre Tenochtitlan: Nesta grande cidade... as casas se erguiam separadas uma das outras, comunicando-se somente por pequenas pontes levadiças e por canoas, e eram construídas com tetos terraceados. Obser- 19© Caderno de Referência de Conteúdo vamos, ademais, os templos e adoratórios das cidades adjacentes, construídas na forma de torres e fortalezas e outros nas estradas, todos caiados de branco e magnificamente brilhantes. O burburi- nho e o ruído do mercado... podia ser ouvido até quase uma légua de distância... quando lá chegamos, ficamos atônitos com a multi- dão de pessoas e a ordem que prevalecia, assim como com a vasta quantidade de mercadorias... cada espécie tinha seu lugar particu- lar, que era distinguido por um sinal. (MEGGERS, 2001, p. 21-22). Reparem que o autor, ao descrever Tenochtitan, deu um enfoque especial ao seu comércio e ao número de pessoas que dele participavam. Além disso, utiliza recursos linguísticos como “ordem, grande, atônito”, para enfatizar a sua surpresa diante da cidade. Em outro ponto da crônica, ele chega a dizer que esta cida- de poderia ser mais bela do que a Roma Antiga fora. Apesar dos relatos desses cronistas serem extremamente importantes para construirmos nossa história sobre os povos pré- colombianos, é preciso que tenhamos muito cuidado. Ao realizar- mos a leitura de uma crônica, devemos fazer com o sinal de alerta ligado o tempo todo. O próprio relato de Bernál Diaz é um exemplo disso. Mas por que tanto cuidado? Os cronistas escreviam aquilo que viam, porém, segundo uma ótica europeia. Assim, descreviam sobre as práticas sociais locais, mas utilizando-se de conceitos, referenciais e paradigmas cristãos ocidentais. Assim, quando viam um governante, o chama- vam de “rei”. Quando viam o filho de um administrador local, o chamavam de “fidalgo”. Quando viam uma mulher vivendo em um templo sacerdotal, a chamavam de “freira”. Ora, é evidente que não existiam freiras entre os povos pré-colombianos, bem como “reis” ou “fidalgos”. Esses são referenciais europeus para descre- ver algo que viam aqui e que se assemelhava com o que tinham lá. Muitas vezes esses conceitos importados tiveram resultados mais prejudiciais à descrição da vida local. A religião é um exemplo claro disso. A religiosidade dos povos americanos e suas práticas ritualísticas foram, invariavelmente, descritas como demoníacas. © História da América I Centro Universitário Claretiano 20 Ora, o demônio é um elemento exclusivo de nossa religiosidade ju- daico-cristã, como poderiam os nativos adorar o demônio se nem ao menos sabiam de sua existência? O referencial europeu não afetou somente a escrita das crô- nicas dos descobrimentos. Até mesmo o desenho e a ilustração do cotidiano nativo sofreram essa influência. Nesse sentido, é importante conhecermos as crônicas e có- dices escritos por espanhóis logo que chegaram à América. Elas são de suma importância. Mesmo porque se configuram como a quase totalidade de fontes escritas que possuímos para o estudo da América Pré-Colombiana. Como vocês verão ao longo de nos- sa disciplina, muitos povos que habitaram o nosso continente há séculos não possuíam qualquer tipo de escrita. Na realidade, uma minoria dominou algum tipo de escrita hieroglífica ou iconográfi- ca, como foi o caso dos Maias. No entanto, o pouco que foi escrito por povos nativos, como os livros de desenho dos Maias, foi destruído por padres espanhóis que relacionaram a sua confecção a práticas de adoração ao diabo. Hoje, somente quatro códices Maias encontram-se dispostos em sua íntegra. Eles fazem parte do pequeno número de quarenta có- dices pré-colombianos da zona mesoamericana que se encontram ainda preservados. Se, por um lado, temos dificuldades com a análise de fontes escritas, uma vez que elas estão deturpadas por conceitos euro- peus ou pelo número reduzido de fontes nativas, por outro, tam- bém não temos vida fácil quando partimos para a análise de fontes materiais, as chamadas fontes arqueológicas. Da mesma forma que os livros maias, muitas obras, pintu- ras, prédios e templos pré-colombianos foram destruídos ou re- apropriados pelos colonizadores. O templo do sol, o chamado Qoricancha em Cuzco, é um exemplo disso. Sobre as pedras que edificavam o Qoricancha é possível encontrar heranças coloniais e arquiteturas contemporâneas edificadas. 21© Caderno de Referência de Conteúdo Além disso, a falta de cuidados e a ação do tempo sobre as construções provocam erosões que destroem os restos arqueoló- gicos e deturpam a sua organização original.Ademais dos efeitos da colonização e da ação do tempo sobre os restos arqueológicos, outro tipo de ação predatória e que prejudicam os nossos estudos é a existência de caçadores de tesouros ou ladrões de túmulo que atuam até os dias de hoje em busca de riquezas como ouro, prata e pedras preciosas. A prática de saques nos túmulos pré-históricos é algo comum em todo mundo, justamente por isso, quando se encontra algum túmulo antigo, são raras as chances de achá-lo in- tacto. Muitas múmias foram decapitadas ou tiveram membros de- cepados para a retirada de joias, por exemplo. Os ladrões não rou- bam somente o ouro, mas prejudicam a compreensão do passado, uma vez que tambémalteram a disposição de objetos e artefatos que possuíam um significado cultural em sua disposição. Como vocês podem reparar, possuímos uma série de difi- culdades para o trabalho de pesquisa da História da América Pré- Colombiana. Como vimos, relatos e achados arqueológicos nem sempre nos apresentam informações seguras. Porém, são essas as principais fontes que possuímos e, por isso, é preciso classificá- las. As principais fontes utilizadas para o estudo da América Pré- Colombiana são: as fontes arqueológicas e as fontes escritas. Além desses dois tipos de fontes, resta-nos apresentar ou- tro tipo de fonte que nos é bastante útil: as fontes etnológicas e antropológicas . As fontes etnológicas derivam do trabalho de et- nólogos que se aproximam de tribos remanescentes para o estudo da memória coletiva de seus habitantes. A antropologia, por sua vez, trabalha na perspectiva da análise dos significados culturais dos objetos encontrados e a sua possível função dentro de uma sociedade antiga. Muitas vezes, a antropologia contribui para a aproximação de grupos de trabalhos de etnólogos às culturas re- manescentes ou aos herdeiros dos antigos povos, na tentativa de descobrir relatos orais que permitam uma melhor análise dos ob- jetos, hábitos e costumes de seus antepassados. © História da América I Centro Universitário Claretiano 22 O trabalho da antropologia e da etnologia é extremamente importante, mas precisa ser feito com rigor metodológico e cien- tífico, uma vez que se corre o risco de se atribuir a elementos do passado significações e interpretações ocidentais, assim como fize- ram os primeiros europeus. A mesma advertência serve aos histo- riadores que podem recorrer às concepções contemporâneas para compreender o passado, cometendo, assim, o temido equívoco do anacronismo. Assim como os cronistas de antigamente, poderíamos in- correr em interpretações do passado de acordo com a nossa visão do mundo atual. Um dos equívocos principais resultantes dessa análise está na subestimação da capacidade inventiva e criativa daqueles povos. Poderíamos analisá-los como atrasados, em rela- ção ao nosso tempo e achar que tudo o que fizeram era impossível sem o auxílio de nossas tecnologias atuais. Um dos principais equívocos no trabalho de história da Amé- rica Pré-Colombiana está no fato de olharmos para o passado com os olhos do presente. Olhamos para as construções do passado, as pirâmides Maias, os grandes blocos de pedra Inca e nos pergun- tamos: como isso era possível sem os cálculos da física moderna, sem o avião, sem os guindastes, sem a dinamite? Durante a década de 1960, a incompreensão da capacidade inventiva e construtiva desses povos fez que uma boa parte da lite- ratura mundial acreditasse na interferência alienígena para a edifi- cação dos prédios. O livro que melhor expressou essas teorias foi a obra Eram os deuses astronautas? , de Erich von Däniken. Sobre as civilizações pré-colombianas, uma que chamou a atenção especial do autor foram os Nazcas e suas intrigantes linhas desenhadas no atual vale de Ica no Peru. Von Däniken afirmou que a obra Nazca somente poderia ser feita orientada por um observador que estivesse no céu, no espa- ço: os extraterrestres. Além disso, sustentou que as linhas retas que acompanham e marcam os desenhos e boa parte da região eram, 23© Caderno de Referência de Conteúdo na realidade, pistas de pouso para aeronaves extraterrestres. Para compreender melhor o assunto, assista ao documentário inspira- do em seu livro e que fala sobre essas linhas, que se encontra dis- ponível em: <http://www.youtube.com/watch?v=FepZlcFrX4Y>. Acesso em: 21 maio 2010. Durante o documentário organizado pelo próprio autor, vá- rias vezes ele recorre a expressões como essas: “sem a utilização do avião isso seria impossível de ser feito” ou “sem os recursos tec- nológicos que temos hoje, isto seria impossível de ser construído”. Seu livro e o documentário, que facilmente pode ser localizado no youtube, estão repletos de concepções etnocêntricas. Versa sobre uma infinidade de povos da antiguidade mundial. Na América, fala dos Maias, dos Astecas, dos Incas, dos Tiahuanacos, dos Nazca e dos habitantes da ilha de Páscoa. Sempre para afirmar a mesma coisa, o passado pré-colombiano nada mais foi do que uma espé- cie de laboratório alienígena. Particularmente, não vejo como acreditar nas hipóteses de Von Däniken. Primeiro, pois a existência de extraterrestres, ou de viagem no tempo, como ele presume ainda não são cientificamen- te comprovadas. Depois, porque vários indícios arqueológicos con- firmam que os povos das civilizações antigas da América eram sim capazes de realizar tais fatos. Para tanto, possuíam uma capacida- de tecnológica diferente da nossa. Possuíram a sua própria manei- ra de construir e de inventar, pautada em outros preceitos lógicos. Ou seja, não eram nem mais atrasados, nem mais evoluídos do que nós, nem melhores e nem piores, mas sim diferentes. Como eles faziam, quais eram suas técnicas talvez jamais sai- bamos. Mas a busca pela sua compreensão dentro de preceitos científicos, seja arqueológico ou historiográfico, essa sim deve ser a inspiração de nossas pesquisas. Um exemplo disso são os chamados quipus, utilizados pelos wari e pelos Incas. Da mesma forma que os Wari, os Incas não possuíam qualquer tipo de escrita. Não desenvolveram tipos ico- © História da América I Centro Universitário Claretiano 24 nográficos, alfabéticos ou hieroglíficos para registrar seus aconte- cimentos, realizar cálculos ou regularem sua imensa sociedade de quase um milhão de km2. Porém, existe um objeto que nos leva a acreditar que, diferentemente do que fizeram outros povos ao re- dor do mundo, como nós mesmos, eles conseguiram desenvolver uma técnica de registro que tornou a escrita simplesmente inútil, justamente os quipus. Os quipus são compostos por uma espécie de corda maior, amarrada em volta do pescoço, com várias outras cordas menores de tamanhos e cores diferentes que saem desse tronco. A cada dez unidades contadas se realiza um nó em uma das cordas ramifica- das sinalizando sua contagem. Justamente por isso, acreditou-se, durante muito tempo, que os quipus serviam somente para a con- tagem e o controle de estocagem. No entanto, estudos mais recentes apontam para a possibi- lidade de que os quipus também servissem como uma forma de escrita. O indício parte das próprias crônicas. Muitas vezes, os cro- nistas, quando queriam obter informações sobre o passado dos incas, recorriam aos quippucamayos (homens que dominavam a técnica dos quipus), e eles lhes contavam com detalhes a história de seus antepassados. Dessa forma, seriam não apenas contado- res, mas verdadeiros escribas do império. Agora, se tomarmos apenas a nossa escrita como exemplo de forma de registro correto, como melhor e mais efetivo, jamais conseguiremos aceitar que os quipus possam ter sido algo que su- primiu a necessidade da escrita entre os Incas. Mais uma vez es- taríamos olhando para o passado tendo o presente como modelo ideal e, na história, isto é um grande equívoco. Na história da América Pré-Colombiana, não podemos nos perguntar: “Eles eram capazes de fazer isso?”, mas sim, “Por que eles não eram capazes de fazer isso?”. Dessa maneira, o que nos importa não é saber como edifi- caram tais construções, mas sim por que o fizeram. Qual o sentido 25© Caderno de Referência de Conteúdo cultural dessas obras? Qual a utilidade dessas obras para a sua or- ganização social e política? Quais as relações de poder que levam homens a construir edifícios como tais? Como se fundamentava sua religião? Enfim, perguntas que nos permitem solucionar uma antiga questão da história: como viveram os homens ao longo do tempo? Um dos capítulos dessa históriaque mais guarda divergên- cias e que é responsável por discussões geológicas, paleontológi- cas, arqueológicas e historiográficas é justamente o primeiro capí- tulo: a chegada do homem ao território americano. Não, não estou falando da chegada dos europeus com seus navios, mas sim da chegada dos primeiros povos que deram início ao povoamento do continente americano. Logo no primeiro dia de Colombo nas ilhas do caribe, ele já encontrou-se com os nativos. Para ele isso não era problema ne- nhum. Até então, pensava que tinha chegado na parte oriental da Ásia, provavelmente uma das ilhas do atual arquipélago do Japão. Passados anos, quando descobriram que a faixa de terra descober- ta por ele não compunha o território asiático, mas sim um novo continente, começou-se a especular: mas de onde teriam vindo esses homens? Eram realmente nativos? Quando as teorias evolucionistas começaram a ganhar corpo no século 19, as perguntas começaram a ser feitas da seguinte for- ma: houve na América um tipo de evolução natural das espécies ou os homens que aqui estavam são resultado de migrações feitas de outras partes do mundo? Sendo a segunda verdadeira, esses homens seriam de uma mesma evolução ocorrida em outra parte do mundo. Aceitando essa especulação, como teriam eles chegado, se não existe nenhum tipo de ligação terrestre entre o continente americano e os demais continentes? Difícil pergunta! Por mais in- crível que pareça, a resposta é um tanto simples: eles vieram a pé. Isso mesmo, caminhando. © História da América I Centro Universitário Claretiano 26 Ao longo desta disciplina, vocês verão que existe uma série de teorias que estabelecem explicações sobre a chegada dos ho- mens no continente americano. Algumas especulam sobre viagens transpacíficas realizadas por pequenas embarcações entre o litoral japonês ou chinês e a costa equatoriana; outras apontam para a migração por meio de sistemas de cabotagem entre o sul do con- tinente americano e a Oceania; outras mais ousadas apostam na ocorrência de viagens transatlânticas que ligariam a África ao lito- ral brasileiro. Além dos diferentes caminhos que os homens poderiam ter tomado para adentrar ao continente americano, outras divergên- cias dizem respeito ao período e à data quando isso teria ocorrido. Não queremos discorrer sobre cada uma aqui, nem tampouco des- cartar a sua validade. Pensamos que todas devem ser considera- das dentro de suas possibilidades científicas. Contudo, entre todas as teorias e todas as hipóteses de ocu- pação do continente americano há uma que é apontada como unânime. Se existem outras rotas e datas para a ocupação, ainda carecemos de maiores informações. No entanto, esta é uma infor- mação extremamente segura. Como especulamos anteriormente, de fato, a vida humana na América não teve início aqui. Ela tem suas origens remontadas ao continente asiático e aos grupos nômades que lá viviam. Du- rante o Período geológico denominado Pleistoceno, que vai de 1,5 milhões de anos até 10.000 anos a.C, as temperaturas da Terra eram muito baixas, uma vez que foi aí que tivemos o início das glaciações e a formação atual do relevo. Nesta época, a alimentação dos grupos humanos era feita por intermédio da caça e da coleta. A agricultura ainda não havia sido desenvolvida. Assim, muito provavelmente, por volta do ano 10.000 a.C, em busca de animais para garantir a sua sobrevivên- cia, os homens teriam passado de um continente para o outro por meio de uma faixa terrestre localizada no estreito de Bering, que fica entre o Norte do Continente Americano e o Continente asiá- tico. 27© Caderno de Referência de Conteúdo Dessa maneira, incentivados pelo instinto de sobrevivência os homens entraram em nosso continente e, a partir daí, teriam dado início a sua ocupação e povoamento. Mas esperem um mo- mento. Acabamos de afirmar anteriormente que não há nenhum tipo de ligação terrestre entre o continente americano e os demais continentes. Assim, como é que eles passaram caminhando de um continente ao outro? Estudos geológicos nos apontam que, por volta de 50.000 a 40.000 anos a.C, ainda no Pleistoceno, as baixas temperaturas levaram ao congelamento de partes consideráveis das águas dos oceanos. Por conta disso, o nível do mar encontrava-se cerca de 100 metros mais baixo do que nos dias atuais e, em alguns territó- rios, a distância do mar para a costa era cerca de 150 quilômetros maior do que nos dias de hoje. Essas condições climáticas e geo- lógicas permitiram a existência de uma conexão terrestre entre os atuais territórios do Alasca e da Sibéria. Este quadro resultou na formação de uma grande ponte for- mada por partes de terra e camadas de gelo. Desse modo, não somente homens como grandes animais puderam passar por este vasto caminho. Um dado interessante é que esta mesma estrutura também se apresentou entre os anos 28.000 e 10.000 a.C, sendo essa últi- ma data a mais provável para a entrada do homem no continente americano. Um dos indícios que permitem termos tanta certeza da presença humana no continente nesta data se dá pelo número alto de achados arqueológicos referentes a esse período, representa- dos, principalmente, pela existência de artefatos de pedra talhada em várias partes de nosso continente datadas de 10.000 a.C. A partir daí, em busca de melhores condições de vida e ali- mento, o homem foi desbravando o continente americano e ocu- pando diferentes áreas até formarem pequenos bandos, tribos, chefias, aldeias, estados e civilizações. © História da América I Centro Universitário Claretiano 28 Glossário de Conceitos O Glossário de Conceitos permite a você uma consulta rápi- da e precisa das definições conceituais, possibilitando-lhe um bom domínio dos termos técnico-científicos utilizados na área de co- nhecimento dos temas tratados na disciplina História da América I. Veja, a seguir, a definição dos principais conceitos desta discipli- na: Ayllus1) : são os agrupamentos familiares que expressam o conjunto social básico da sociedade andina e, por conse- quência, incaica. Carbono 142) : “A datação por carbono 14 é uma maneira de determinar a idade de certos artefatos arqueológicos de origem biológica com até 50 mil anos. Ela é usada para datar objetos como ossos, tecidos, madeira e fibras de plantas usados em atividades humanas no passado relativamente recente” (BRAIN in HOW STUFF WORKS BRASIL, 2011). Chicha3) : bebida alcoólica fermentada andina feita à base de milho. Além da chicha alcoólica, é produzida no Peru uma espécie de chicha sem álcool e de variados tipos de milho; do milho roxo, sai a chicha morada (morena), por exemplo. É consumida no cotidiano, e há lugares pró- prios para isso: são as chamadas “chicherias”, que reme- tem ao período colonial. Coivara4) : sistema de plantio que “consiste em plantar os grãos com ajuda do bastão de semear (huctli) numa cla- reira ganha à selva cortando as árvores e queimando a vegetação menor. Depois que varia segundo a qualidade do solo, mas nunca é muito longo, o rendimento começa a diminuir, o que conduz ao abandono da terra plantada, para que se reconstitua o bosque e se regenere o solo; uma nova clareira deve então ser conquistada à vegeta- ção natural” (CARDOSO, 1990, p. 59). El Niño5) : é um fenômeno atmosférico-oceânico de aque- cimento anormal das águas do oceano Pacífico tropical. Tal fenômeno, cuja atuação sobre as temperaturas mun- diais ainda é motivo de estudo, foi reconhecido por pes- 29© Caderno de Referência de Conteúdo cadores da costa oeste da América do Sul, que notaram o fato de o fenômeno normalmente ocorrer no fim do ano, associando-o ao Natal (Menino Jesus) (FREITAS in BRASIL ESCOLA, 2011). Huacas6) : são consideradas “lugares sagrados” para os povos da região andina central. Podemse apresentar em forma de templos, mas também como cavernas ou rochas. Mitmaq7) : deslocamento forçado de tribos rebeldes para outras áreas para o exercício de trabalhos compulsó- rios. Oaxaca8) : quer dizer “ao sul”, “meridional”. Pachacútec (ou pachacuti)9) : em quíchua, significa “revi- rar a terra” ou “a inversão do mundo”. Por conta disso, muitos autores acreditam que o próprio imperador civi- lizador do império inca, Pachacuti Yupanqui, tenha rece- bido esse nome por ter invertido o sentido desse impé- rio, que, sob seu comando, viveu uma reestruturação e um remodelamento de todo o seu sistema de crenças e organização social, com a incorporação de novos tipos de trabalhadores e sistemas compulsórios de trabalho. Paqarina10) : espécie de matriz tribal da qual um povo se origina. Toda sociedade andina possui uma paqarina à qual remete suas origens. Peruanista11) : estudioso da história do Peru que não tem nacionalidade peruana, como o caso de Peter Kláren, que é americano. Esse tipo de terminologia pode ser aplicado para outros casos, como, por exemplo, ameri- canista, brasilianista etc. Pleistoceno12) : é a época geológica que antecede o Holo- ceno, época em que vivemos. Seu período de duração vai de, aproximadamente, 1,5 milhão a.C. a 10.000 a.C. Geologicamente, é uma época que se localiza no éon Fa- nerozoico, era Cenozoica, período Quaternário. Na Amé- rica, o Pleistoceno teve seu final tardiamente, por volta de 8.000 a.C. Para saber mais sobre essa época, consulte a tabela disposta na ferramenta Material de Apoio. © História da América I Centro Universitário Claretiano 30 Qoricancha13) : em quíchua, significa “campo de ouro” (qori = ouro; cancha = campo), porém, é chamado, também, de Templo do Sol. Hoje, no local onde se encontrava o Qoricancha, em Cuzco, se localiza o Convento de São Domingo. No início da colonização andina, os espanhóis construíram uma igreja em cima do antigo Templo do Sol. Aliás, essa é uma das características da coloniza- ção: substituir os templos e lugares sagrados dos incas (as chamadas huacas) por igrejas e locais santos do ca- tolicismo. Nesses lugares, viveriam deuses locais, que atuariam apenas ali. Assim, essas construções católicas “neutralizariam” tais divindades. Além disso, uma das penalidades impostas aos quíchuas rebeldes era o mit- maq; por meio dele, perderiam o contato com essas di- vindades. Quinoa14) : palavra de origem quíchua, é o fruto de uma árvore chamada “quino”. É uma fruta seca, com muitas sementes em formato elipsoidal. sambaquis15) : são os restos arqueológicos dos povos que viveram em costas marítimas e desenvolveram sua vida tendo o mar como subsistência, seja pela pesca rudi- mentar, seja pelo consumo de moluscos. Assim, todos os restos de utensílios, esqueletos ou conchas amontoadas por tribos litorâneas são denominados “sambaquis”. sazonalidade16) : “relativo a sazão ou estação” (Dicionário Aurélio). Virilocal17) : “relativo a regra, ou costume institucionaliza- do, ou ao padrão de residência a eles associado, segundo o qual, após o casamento, o novo casal passa a viver na localidade (casa, aldeia, acampamento etc.) do homem” (Dicionário Aurélio). esquema dos Conceitos-chave Para que você tenha uma visão geral dos conceitos mais im- portantes deste estudo, apresentamos o Esquema dos Conceitos- chave desta disciplina (Figura 1). O mais aconselhável é que você mesmo faça seu esquema ou seu mapa mental. Esse exercício tam- 31© Caderno de Referência de Conteúdo bém é uma forma de construir seu conhecimento, ressignificando as informações obtidas com base em suas próprias percepções. É importante ressaltar que o propósito desse Esquema dos Conceitos-chave é representar, de maneira gráfica, as relações existentes entre os conceitos por meio de palavras-chave, partin- do dos termos mais complexos para os mais simples. Esse recurso pode auxiliar você na ordenação e na sequenciação hierarquizada dos conteúdos de ensino. Com base na teoria de aprendizagem significativa, entende- se que, por meio da organização das ideias e dos princípios em esquemas e em mapas mentais, o indivíduo pode construir seu conhecimento de maneira mais produtiva e, assim, obter ganhos pedagógicos significativos em seu processo de ensino e aprendi- zagem. Aplicado em diversas áreas do ensino e da aprendizagem es- colar – tais como planejamentos de currículo, sistemas e pesquisas em Educação –, o Esquema dos Conceitos-chave baseia-se, ainda, na ideia fundamental da Psicologia Cognitiva de Ausubel, que es- tabelece que a aprendizagem ocorre pela assimilação de novos conceitos e de proposições na estrutura cognitiva do aluno. Assim, uma vez que há pontos de ancoragem, novas ideias e informações são aprendidas. Tem-se de destacar que “aprendizagem” não significa reali- zar acréscimos na estrutura cognitiva do aluno apenas; sobretudo, é preciso estabelecer modificações para que ela se configure como uma aprendizagem significativa. Para isso, é importante conside- rar as entradas de conhecimento e organizar bem os materiais de aprendizagem. Além disso, as novas ideias e os novos conceitos devem ser potencialmente significativos para o aluno, dado que, ao fixar esses conceitos em suas já existentes estruturas cogniti- vas, outros serão relembrados também. Nessa perspectiva, partindo do pressuposto de que é você o principal agente da construção de seu próprio conhecimento por meio de sua predisposição afetiva e de suas motivações internas e © História da América I Centro Universitário Claretiano 32 externas, o Esquema dos Conceitos-chave tem por objetivo tornar significativa sua aprendizagem, transformando seu conhecimento sistematizado em conteúdo curricular, ou seja, estabelecendo uma relação entre aquilo que acabou de conhecer e o que já fazia parte de seu conhecimento de mundo (adaptado do site disponível em: <http://penta2.ufrgs.br/edutools/mapasconceituais/utilizama- pasconceituais.html>. Acesso em: 11 mar. 2010). Figura 1 Esquema dos Conceitos-chave da disciplina História da América I. Como você pode observar, esse esquema lhe dá, conforme dito anteriormente, uma visão geral dos conceitos mais importan- tes deste estudo. Ao segui-lo, poderá transitar entre um e outro conceito desta disciplina e descobrir o caminho para construir seu processo de ensino-aprendizagem. 33© Caderno de Referência de Conteúdo O Esquema dos Conceitos-chave é mais um dos recursos de aprendizagem que se somam àqueles disponíveis no ambiente virtual, por meio de suas ferramentas interativas, e àqueles rela- cionados às atividades didático-pedagógicas realizadas presencial- mente, ou seja, no polo. Lembre-se de que você, aluno da EAD, deve valer-se de sua autonomia na construção de seu próprio co- nhecimento. Questões Autoavaliativas No final de cada unidade, você encontraráalgumas questões autoavaliativas sobre os conteúdos ali tratados, as quais podem ser de múltipla escolha, abertas objetivas ou abertas dissertati- vas. Responder, discutir e comentar essas questões, bem como relacioná-las com a prática do ensino de História, pode ser uma forma de você avaliar o seu conhecimento. Assim, mediante a re- solução de questões pertinentes ao assunto tratado, você estará se preparando para a avaliação final, que será dissertativa. Além disso, essa é uma maneira privilegiada de você testar seus conhe- cimentos e adquirir uma formação sólida para a sua prática profis- sional. Bibliografia Básica É fundamental que você use a Bibliografia Básica em seus estudos, mas não se prenda só a ela. Consulte, também, as biblio- grafias apresentadas no Plano de Ensino e no tópico Orientações para o estudo da unidade. Figuras (ilustrações, quadros...) Neste material instrucional, as ilustrações fazem parte inte- grante dos conteúdos, ou seja, elas não são meramente ilustrativas, pois esquematizam e resumem conteúdos explicitados no texto. Não deixe de observar a relação dessas figuras com os conteúdos © História da América I Centro Universitário Claretiano 34 da disciplina, pois relacionar aquilo que está no campo visual com o conceitual faz parte de uma boa formação intelectual. Dicas (motivacionais) O estudo desta disciplina convida você a olhar, de forma mais apurada, a Educação como processo de emancipação do ser humano. É importante que você se atente às explicações teóricas, práticas e científicas que estão presentes nos meios de comunica- ção, bem como partilhe suas descobertas com seus colegas, pois, ao compartilhar com outras pessoas aquilo que você observa, per- mite-se descobrir algo que ainda não se conhece, aprendendo a ver e a notar o que não havia sido percebido antes. Observar é, portanto, uma capacidade que nos impele à maturidade. Você, como aluno do curso de Licenciatura em História na modalidade EaD, necessita de uma formação conceitual sólida e consistente. Para isso, você contará com a ajuda do tutor a dis- tância, do tutor presencial e, sobretudo, da interação com seus colegas. Sugerimos, pois, que organize bem o seu tempo e realize as atividades nas datas estipuladas. É importante, ainda, que você anote as suas reflexões em seu caderno ou no Bloco de Anotações, pois, no futuro, elas pode- rão ser utilizadas na elaboração de sua monografia ou de produ- ções científicas. Leia os livros da bibliografia indicada, para que você amplie seus horizontes teóricos. Coteje-os com o material didático, discu- ta a unidade com seus colegas e com o tutor e assista às videoau- las. No final de cada unidade, você encontrará algumas questões autoavaliativas, que são importantes para a sua análise sobre os conteúdos desenvolvidos e para saber se estes foram significativos para sua formação. Indague, reflita, conteste e construa resenhas, pois esses procedimentos serão importantes para o seu amadure- cimento intelectual. 35© Caderno de Referência de Conteúdo Lembre-se de que o segredo do sucesso em um curso na modalidade a distância é participar, ou seja, interagir, procurando sempre cooperar e colaborar com seus colegas e tutores. Caso precise de auxílio sobre algum assunto relacionado a esta disciplina, entre em contato com seu tutor. Ele estará pronto para ajudar você. Centro Universitário Claretiano – Anotações eA D 1 As Origens Humanas da América: Ocupação do Continente e as Primeiras Organizações Sociais do Continente Americano OBjeTIVOs1. Apresentar as dificuldades e limitações no estudo da his-• tória da América pré-colombiana. Conhecer e discutir as principais teorias sobre a ocupa-• ção do continente americano e o desenvolvimento das primeiras sociedades americanas. CONTeúDOs2. Ocupação do território americano.• Pré-história americana.• Nômades, tribos e aldeias: caçadores e coletores na Amé-• rica. Sociedades agrícolas pré-urbanas.• © História da América I Centro Universitário Claretiano 38 ORIeNTAÇões PARA O esTUDO DA UNIDADe3. Antes de iniciar o estudo desta unidade, é importante que você leia as orientações a seguir: Tenha sempre à mão o Esquema de Conceitos-chave e o 1) significado dos termos explicitados no Glossário de Con- ceitos desta disciplina. Pesquise museus, buscando vestígios sobre tais socieda-2) des: a internet está repleta de imagens. Também bus- que entender a cartografia do continente americano e de seu relevo, clima, hidrografia e vegetação originais, visto que essas sociedades viviam em harmonia com o meio ambiente e estabeleceram atividades econômicas e culturais consoantes com as condições naturais No Tópico 5, ao falarmos a respeito dos primeiros euro-3) peus na América, é importante que você saiba que há controvérsias: os vikings já haviam chegado às regiões Sudeste do Canadá e Nordeste dos Estados Unidos por volta do ano 1.000 d.C., e há indícios de expedições eu- ropeias notadamente italianas anteriores à 1492. Consideramos importante destacar a você desde já que, 4) sobre as migrações humanas do continente asiático para a América, alguns antropólogos sustentam que, pelo Es- treito de Bering, teriam ocorrido duas ondas de migra- ção. A primeira – e mais antiga – teria acompanhado as Ilhas Aleutas e, ao chegar à América, seguido pela via li- torânea em direção ao Sul. Vestígios dessa rota estariam submersos pelo aumento do nível do mar ao final do de- gelo ártico. A segunda onda migratória, mais recente, te- ria adentrado a América pelo interior do Alasca, cruzan- do o Estreito de Bering. Por meio dessa onda, teria sido ocupado o interior do Canadá e dos Estados Unidos. Sobre o número de migrações e viagens ocorridas en-5) tre a Ásia e a América na Pré-história, você deve saber que existe uma polêmica, estendida até os dias atuais. Recentemente, uma pesquisa liderada por cientistas brasileiros (envolvendo o Departamento de Genética da USP de Ribeirão Preto), com a colaboração de pesqui- 39© As Origens Humanas da América: Ocupação do Continente e as Primeiras Organizações Sociais do Continente Americano sadores peruanos, chegou a uma conclusão que reto- ma um dos pontos mais controversos da ocupação do território americano. Segundo eles, a migração ocorreu em uma única viagem, feita por grupos de mongoloi- des. Você pode encontrar a pesquisa completa no site disponível em: <http://www.revistapesquisa.fapesp. br/?art=1853&bd=1&pg=1&lg=>. Acesso em: 8 dez. 2008. Previamente, adiantamos a você que muitos dos animais 6) que habitavam nosso continente na Pré-história não re- sistiram a uma série de mudanças climáticas. Entre os animais de grande porte que viveram na América no pe- ríodo Pleistoceno, na idade do Paleolítico, e que foram extintos em nosso continente, encontrava-se o famoso mamute (10.000 a.C.). Na América, existiu uma espécie de cavalo até o Mesolítico e início do Holoceno, aproxi- madamente em 5.500 a.C., a qual se extinguiu. Somente com a chegada dos espanhóis é que a América voltaria a ter cavalos. Durante muito tempo, a terminologia utilizada para de-7) limitar os bandos, assunto que abordaremos no Tópico 6, foi o conceito de “horda primitiva”, de origem marxis- ta. Baseado nos trabalhos de Friedrich Engels, o termo comparava essa organização social a um tipo primitivo de socialismo. Ao longo do século 20, o conceito foi mui- to criticado, dando lugar ao termo bando. Estudaremos, no decorrer desta unidade, o contato 8) entre os povos pré-colombianos e os demais povos do mundo; por isso, é pertinente que você já reflita sobre algumas questões: será que a recusa em acreditarmos que grupos da costa pacífica da Ásia e da América possu- íam contato frequente não nasce de nosso etnocentris- mo,que concebe essas culturas como mais atrasadas do que nós? Será que eles eram tão atrasados como supõe o preconceito ocidental? Da mesma forma, por falta de estudos mais aprofundados, não sabemos quão desen- volvidos eram os povos asiáticos do mesmo período. Será que eles não teriam uma tecnologia suficientemen- te desenvolvida para chegarem aqui com mais frequên- cia do que supomos? © História da América I Centro Universitário Claretiano 40 Par9) a que você acompanhe melhor as idades da Pré-his- tória e o ciclo de desenvolvimento das sociedades não só na América, como também no mundo, apresentamos o Quadro 1, bastante esclarecedor, organizado por Ciro Flamarion Cardoso. Quadro 1 As grandes etapas da Pré-história (simplificado). Fase subfase Características Cronologia no Velho Mundo Cronologia na América Paleolítico Inferior 1ª parte: Só a África é povoada; ao Homo habilis atribui-se a chamada Pebble culture, com seus toscos talhadores de pedra. O homem é caçador- coletor não-especializado e não conhece o fogo. 2ª parte: O homem povoa a África, a metade sul da Eurásia e a Indonésia. Ao Homo erectus, ou Pitecantropo, associa-se a fabricação de artefatos de pedra com duas faces trabalhadas e, mais tarde, de artefatos de lascas. Mais dados a partir de meio milhão de anos atrás, quando possivelmente surge o controle do fogo. Do aparecimento do Homem (5 milhões de anos atrás, segundo R. Leakey) até um milhão de anos antes do presente; os vestígios se tornam mais abundantes a partir de uns 2 milhões de anos atrás. De um milhão de anos atrás a 100000 anos antes do presente, aproximadamente. Na América, talvez a partir de 40000 a. C., penetram caçadores- coletores não- especializados, com instrumental lítico tosco, mas já pertencentes ao tipo Homo sapiens sapiens (que começa no Velho Mundo no máximo há uns 50000 anos). Médio Ao Homo sapiens neanderthalensis e outros tipos humanos seus contemporâneos atribui- se uma industria lítica chamada Musteriense, mais aperfeiçoada e diversificada do que as do Paleolítico Inferior. Têm inicio a caça direta de animais grandes, a vida em cavernas (com a glaciação), os enterros organizados e o culto a crânios de ursos. De 100000 a 40000 anos atrás, aproximadamente. 41© As Origens Humanas da América: Ocupação do Continente e as Primeiras Organizações Sociais do Continente Americano Fase subfase Características Cronologia no Velho Mundo Cronologia na América Superior Ao Homo sapiens sapiens se associa uma série de indústrias líticas de alta qualidade e diversificação, incluindo pontas de projétil e uma industria de osso e marfim (arpões, agulhas, etc.). Apogeu da grande caça especializada. Primeira arte conhecida. De 40000 anos atrás a entre 11000 e 9000 a. C., aproximadamente. Aproximadamente entre 11000 a. C. (talvez bem antes: ponta de Muaco) e 8800/6000 a. C. Mesolítico No Velho Mundo, aparecimento de microlitos (instrumentos de pedra de dimensões muito reduzidas), difusão do arco e flecha, primeiras embarcações arqueologicamente comprovadas. Na América as industrias líticas são diferentes. Mas o mais importante é, no mundo todo, uma diversificação dos modos de vida, conduzindo em certos casos aos primórdios da agricultura. Começa entre 11000 e 9000 a. C. aproximadamente, mas sua cronologia é muito variável segundo as regiões, havendo até hoje grupos ainda mesolíticos no seu modo de vida. Na América, começa entre 8800 e 6000 a. C. aproximadamente; também neste caso a cronologia é variável segundo as regiões. Neolítico Difusão da vida agrícola e as das aldeias. Aparecimento ou difusão da cerâmica, da tecelagem e do polimento da pedra. Nos casos mais favoráveis, os grupos humanos neolíticos se tornam sedentários (coisa rara entre os grupos caçadores, coletores ou pescadores). No antigo Oriente Próximo asiático já havia aldeias plenamente neolíticas por volta de 7000 a. C. O surgimento de um modo de vida plenamente neolítico na América foi muito gradual. Nas regiões mais avançadas, a generalização das aldeias agrícolas sedentárias se da por volta de 2000 a. C. Fonte: adaptado de Cardoso. Além desse quadro, apresentamos a Tabela 1, com a es-10) cala do tempo geológico, que está disponível na Unidade © História da América I Centro Universitário Claretiano 42 1 do livro-texto Fundamentos da Geologia, do curso de Licenciatura em Geografia na modalidade EaD do Clare- tiano. Essa unidade está disponibilizada para você em sua Sala de Aula Virtual, ferramenta Material de Apoio. 43© As Origens Humanas da América: Ocupação do Continente e as Primeiras Organizações Sociais do Continente Americano INTRODUÇÃO à UNIDADe4. Para dar início aos estudos da disciplina História da América I, apresentamos uma questão: você sabe como se deu o desenvol- vimento das sociedades e dos grupos humanos que viveram na América antes da chegada dos europeus? Essa não é uma questão muito fácil de ser respondida, em virtude das dificuldades no estu- do da América pré-colombiana. Talvez não tanto pela complexida- de do assunto, mas, sim, pelas fontes documentais que possuímos para sua averiguação. Há algumas peculiaridades que cercam a história das sociedades pré-colombianas, que dificultam a conso- lidação de teorias unânimes sobre a origem, a vida e os costumes desses homens “americanos”. Na realidade, este é um campo de estudo que possui mais controvérsias e dúvidas do que certezas. Como dissemos, várias dessas dúvidas levantadas nos são impostas pelo tipo e pela qua- lidade de documentação que possuímos. Como você sabe, a prin- cipal fonte utilizada pela Historiografia para a análise do tempo passado em qualquer área é o registro escrito, como cartas, livros, insígnias nas paredes, entre outras. Ocorre que as sociedades pré- colombianas, à exceção de alguns povos mesoamericanos, não de- senvolveram nenhum tipo de escrita. Os maias, importante civilização localizada na Mesoamé- rica, constituíram um tipo de escrita iconográfica associada a desenhos e espécies de hieróglifos. Muitos desses escritos são encontrados em templos ou organizados em forma de códices (espécie de livros). Temos, nas Figuras 1 e 2, exemplos de códices de origem colonial e maia, respectivamente. © História da América I Centro Universitário Claretiano 44 Figura 1 Códice Mendoza, de origem colonial. Figura 2 Códice de Dresden, de origem maia. 45© As Origens Humanas da América: Ocupação do Continente e as Primeiras Organizações Sociais do Continente Americano O grande problema é que boa parte dos códices maias foi queimada pelos colonizadores espanhóis durante o processo de conquista da América. Hoje, somente quatro códices maias se en- contram dispostos em sua íntegra. Eles fazem parte do pequeno número de 40 códices pré-colombianos da zona mesoamericana que ainda se encontram preservados. Outros documentos escritos que nos servem de fonte de pes- quisa historiográfica são os relatos de viajantes, cronistas e padres espanhóis, que anotavam e descreviam o estilo de vida e os deta- lhes do cotidiano dos povos descobertos. Por autores mestiços, ainda foram confeccionados outros livros, seguindo, porém, uma tradição nativa, que nos servem de orientação para a interpretação de artefatos e objetos encontrados em escavações arqueológicas. Esses relatos e anotações escritos por padres e mestiços, também chamados de “códices”, nos impõem alguns problemas que devemos levar em consideração. Uma vez que foram elabo- rados posteriormente à chegada dos espanhóis, não é possível certificarse os acontecimentos descritos são fiéis à tradição da comunidade nativa ou se estariam influenciados por uma menta- lidade europeia difundida ou por uma interpretação da realidade segundo referenciais europeus. Um exemplo claro disso são as chamadas “virgens do Templo do Sol” na sociedade inca, que, para os espanhóis, não passavam de freiras. Ora, é evidente que não existiam freiras no império inca, mas, ao verem as várias mulheres enclausuradas em um prédio de caráter religioso e fechado para o mundo exterior, os espanhóis associaram o local a um convento e as mulheres a freiras. Esse é apenas um dos milhares de exemplos de interpretações da realida- de indígena feita segundo referenciais do mundo europeu. Além dos documentos escritos, outras documentações que muito nos auxiliam na averiguação do passado americano são as © História da América I Centro Universitário Claretiano 46 valiosas descobertas arqueológicas. Esses achados vão desde res- tos de cerâmicas, pontas de lança feitas de pedra e utensílios coti- dianos de caça ou de uso doméstico até urnas funerárias, templos religiosos e grandes construções administrativas. O grande problema dessas fontes é que muitas foram cor- rompidas. Várias construções pré-colombianas foram destruídas e tiveram suas pedras utilizadas para a construção de novos monu- mentos, igrejas e prédios coloniais. A magnífica capital do impé- rio asteca, Tenochtitlán, por exemplo, narrada por vários cronistas – como Bernal Díaz del Castillo – como uma cidade tão ou mais bela do que Roma ou Atenas, foi inteiramente devastada para a construção do que hoje é a Cidade do México. Até mesmo o lago Texcoco, que circundava Tenochtitlán, foi completamente drenado pelos espanhóis. Dos resquícios do império inca, os prédios e as casas da ca- pital Cusco hoje servem de base para edificações modernas. Sobre as pedras do Qoricancha (ou Templo do Sol cusquenho), que signi- fica “campo de ouro”, sendo que, em quíchua, qori é ouro e cancha é campo, localiza-se, por exemplo, o Convento de São Domingo, que foi construído pelos espanhóis em cima do antigo Templo do Sol no início da colonização andina. Aliás, essa é uma das caracte- rísticas da colonização: substituir os templos e lugares sagrados dos incas (as chamadas huacas), em que viveriam os deuses locais, que atuavam apenas ali, por igrejas e locais santos do catolicismo, impondo como penalidade aos quíchuas rebeldes o mitmaq, isto é, o deslocamento forçado das tribos revoltas para outras áreas, para que perdessem o contato com suas divindades. É possível, portanto, por meio desses traços da colonização, encontrar heranças coloniais e arquiteturas contemporâneas edi- ficadas, como você verá na Figura 3, que traz o templo localizado na cidade de Cusco. Observe que, à frente, temos uma arquitetura 47© As Origens Humanas da América: Ocupação do Continente e as Primeiras Organizações Sociais do Continente Americano colonial; atrás, uma arquitetura inca; e, ao fundo, as janelas de vidro, que representam as arquiteturas contemporâneas. Fonte: acervo pessoal. Figura 3 Antigo Templo do Sol. Sobre o Qoricancha, Cieza de León, importante cronista es- panhol, narrou que era possível ver blocos feitos de ouro, lhamas e outros animais típicos, também feitos de ouro e em tamanho natural. Evidentemente, todos esses objetos, que seriam valiosís- simos para a reconstrução do passado pré-colombiano, foram der- retidos pelos próprios colonizadores ou por ladrões. Outra forma de roubo que prejudica a compreensão do pas- sado americano era realizada pelos famosos “ladrões de túmulo”. A prática de saques nos túmulos pré-históricos é algo comum em todo o mundo, e, justamente por isso, quando se encontra algum túmulo antigo, são raras as chances de achá-lo intacto. Muitas mú- mias, por exemplo, foram decapitadas ou tiveram membros dece- pados para a retirada de joias. © História da América I Centro Universitário Claretiano 48 Os ladrões não roubam somente o ouro, mas, como dito, prejudicam a compreensão do passado, uma vez que também al- teram a disposição de objetos e artefatos que tinham um significa- do cultural em sua organização. Por isso, achados como o Senhor de Sipán, feito ocorrido em 1987 graças ao arqueólogo Walter Van, na região do litoral norte peruano, são muito comemorados, pois, além de raros, permitem- nos uma melhor compreensão da cultura encontrada. No caso do Senhor de Sipán, trata-se da cultura Moche (400 d.C.). Observe, na Figura 4, a réplica do túmulo do Senhor de Si- pán, disposta no Museu de la Nación, em Lima, no Peru. Fonte: acervo pessoal. Figura 4 Réplica do túmulo do Senhor de Sipán. Perceba desde já que as fontes para a análise do passado pré-colombiano são de natureza escrita e restos da cultura mate- rial de povos encontrados por escavações e analisados em sítios 49© As Origens Humanas da América: Ocupação do Continente e as Primeiras Organizações Sociais do Continente Americano arqueológicos. Justamente por isso, é necessário afirmar que as fontes não são apenas de característica histórica, mas também pré-histórica. Nesse sentido, o estudo da “história” do passado de nosso continente somente é possível ser feito com a utilização de méto- dos e técnicas de pesquisa próprios da Arqueologia e da Antropo- logia ou Etnologia. Os achados arqueológicos são estabelecidos em suas data- ções por meio do emprego primordial do carbono-14. Aos arque- ólogos, cabem a datação dos locais e a averiguação dos períodos geológicos ou das idades pré-históricas de cada achado. Vale res- saltar, porém, que o carbono-14 não estabelece uma data exata, mas aproximações gerais de idade, e somente serve para a datação de vestígios que tenham em sua composição o elemento químico carbono. Há métodos semelhantes para a datação de outros tipos de compostos. A Antropologia, por sua vez, trabalha na perspectiva da aná- lise dos significados culturais dos objetos encontrados e sua possí- vel função em uma sociedade antiga. Muitas vezes, a Antropologia contribui com a aproximação de grupos de trabalhos etnológicos às culturas remanescentes ou aos herdeiros dos antigos povos na tentativa de descobrir relatos orais que permitam uma melhor análise dos hábitos e costumes de seus antepassados. O trabalho da Antropologia e da Etnologia é extremamente importante; por isso, precisa ser feito com rigor metodológico e científico, uma vez que se corre o risco de atribuir a elementos do passado significações e interpretações ocidentais, assim como fi- zeram os primeiros europeus. A mesma advertência serve aos his- toriadores, que podem recorrer às concepções contemporâneas para compreender o passado, cometendo, assim, o temido equí- voco do anacronismo. Outra importante colaboração às análises das culturas pré- colombianas é dada pelos linguistas. Como nos lembra a arqueólo- ga Meggers (1979, p. 19): © História da América I Centro Universitário Claretiano 50 Sendo a linguagem menos suscetível às pressões adaptativas do que outros aspectos da cultura, modelos de distribuição de linguagem podem revelar antigas conexões entre grupos amplamente separa- dos, permitindo a reconstrução de movimentos populacionais. Segundo essa perspectiva, a construção de uma pirâmide em várias sociedades não é um sinal de que estas tenham tido conta- to, uma vez que o símbolo cultural desempenhado por essa cons- trução pode ter significados que variam entre elas. No entanto, a adoção de algarismos ou letras em alfabetos, que são muito mais particulares a cada sociedade do que as construções, garantiria a aproximação entre distintos povos. Com essas informações prévias, é possível afirmar que a His- tória trabalha em conjunto com muitas outras ciências na averi- guação e interpretação das informações colhidas.De outra forma, precisamos esclarecer que as fontes de variados tipos e distintas abordagens não estão dispostas unifor- memente ao longo de todo o continente. Quanto maior o desen- volvimento tecnológico de uma região ou de um povo, maior sua densidade populacional e, consequentemente, mais numerosos são os vestígios e tipos de fontes deixados para trás. Muitas sociedades de baixa tecnologia e que tinham acesso a produtos de composição perecíveis (como cordas, ossos de ani- mais ou fibras vegetais) jamais serão estudadas, uma vez que seus produtos já podem ter se deteriorado. Assim, os tipos de fontes disponíveis mudam de acordo com o volume populacional da re- gião estudada e, também, com as tecnologias desenvolvidas por cada povo. Por conta disso, Cardoso (1996), importante historiador bra- sileiro, aponta-nos que as fontes de estudos das sociedades pré- colombianas, segundo os tipos, estão dispostas em nosso conti- nente da seguinte forma: Para toda a América:• Restos arqueológicos, os textos em línguas européias redigidos por conquistadores, cronistas, missionários, funcionários reais dos pri- 51© As Origens Humanas da América: Ocupação do Continente e as Primeiras Organizações Sociais do Continente Americano meiros tempos de colonização. [...] O próprio mapa lingüístico da época da conquista, quando é possível reconstituí-lo, torna-se fon- te de grande interesse (p. 9-10). Para a Mesoamérica e zona andina central (Peru, partes • do Chile, Argentina, Equador e Bolívia): Textos em línguas indígenas, provenientes da tradição oral, fixados com caracteres latinos depois da conquista. Merece atenção es- pecial, neste ponto, o imenso trabalho de Bernardino Sahagún jo México (p. 9-10). Para a Mesoamérica (o México, quase que em sua totali-• dade; porções de Honduras, da Nicarágua, da Costa-Rica, da Guatemala e de El Salvador): Códices ou livros de pintura, dos quais só quarenta são pré-colom- bianos, e outros do século 16, mas feitos segundo a tradição indíge- na; e inscrições, principalmente na zona maia, ainda não totalmen- te decifradas na atualidade (p. 9-10). São essas as ferramentas, os objetos e métodos de análise que utilizamos para nos acercar das possíveis origens de nosso território. Entretanto, como já dissemos, mesmo esses esforços e investimentos acadêmicos e científicos não nos permitem possuir muitas certezas sobre esse passado. A América pré-colombiana é um campo em que os pontos pacíficos são poucos e as diver- gências são enormes. Talvez, a principal e mais antiga divergência nesses estudos seja a seguinte: de onde vieram os primeiros “ame- ricanos”? TEORIAS DE ORIGEM DO HOMEM PRÉ-COLOM-5. BIANO Você deve estar um tanto irrequieto com a pergunta que apresentamos anteriormente. Aliás, pode estar, até mesmo, for- mulando novas perguntas, do tipo: mas o homem pré-colombiano não era nativo da América? Não eram os indígenas que se encon- travam aqui quando os europeus chegaram? As respostas para tais questões são não e sim, respectivamente. © História da América I Centro Universitário Claretiano 52 De fato, inúmeras etnias indígenas encontravam-se aqui quando os primeiros europeus chegaram à América, em outubro de 1492. No entanto, estudos zoológicos e paleontológicos apon- tam para o fato de que os esqueletos humanos mais antigos já encontrados no continente são de Homo sapiens; assim, não seria possível a ocorrência de uma evolução da espécie humana em ter- ritório americano. Talvez essa seja uma das poucas concordâncias que todos os estudiosos possuem: a vida humana na América é oriunda de fora do continente. Resolvido esse primeiro dilema, deparamo-nos com outras duas questões também inquietantes: de onde e como vieram es- ses homens? Quando eles chegaram aqui? Essas perguntas conti- nuam sem respostas consensuais até os dias de hoje, mas vamos abordá-las para averiguar as possibilidades existentes. A chegada dos primeiros homens na América A teoria mais aceita a respeito da chegada dos primeiros ho- mens na América é aquela que escreve sobre a passagem de grupos oriundos da Ásia, que teriam entrado no continente americano por uma via terrestre existente entre os dois continentes, no denominado “Estreito de Bering”. Uma das primeiras teorias a desenvolver essa hipótese foi feita por Alex Hrdlicka (1869-1943), quando ele dirigia a seção de Antropologia do Museu Nacional de Washington. Para ele, a origem e ocupação do território americano tiveram as seguintes características, delimitadas pelo pesquisador brasileiro Giordani (1990, p. 62-63) assim: 1) Os índios americanos foram uma raça única [...] 2) A origem racial dos índios é a mongolóide [...] 3) Os índios procedem das regiões setentrionais da Ásia Oriental [...] 4) O Estreito de Bering consti- tuiu o caminho pelo qual se processaram as invasões mongolóides acompanhando a migração da rena [...] 5) A data da entrada dos mongolóides no Continente Americano é relativamente recente [...] 6) As migrações não se processaram de uma só vez [...]. Contudo, se observarmos atentamente a Figura 5, que traz o mapa-múndi em um recorte aproximado dos continentes ame- 53© As Origens Humanas da América: Ocupação do Continente e as Primeiras Organizações Sociais do Continente Americano ricano e asiático, veremos que não há uma faixa terrestre que una as duas porções de terra. Essa observação é verdadeira, mas nem sempre foi assim. Figura 5 Mapa-múndi – em destaque, o Estreito de Bering. Estudos geológicos apontam que, entre 50.000 a.C. e 40.000 a.C., ainda no período Pleistoceno, antecessor à época na qual vi- vemos, denominada Holoceno – que, por sua vez, está localizada no éon Fanerozoico, na era Cenozoica, no período Quaternário, e que vai de 1,5 milhão a.C. a 10.000 a.C., aproximadamente –, as baixas temperaturas levaram ao congelamento de partes consi- deráveis das águas dos oceanos. Por conta disso, o nível do mar encontrava-se cerca de 100 metros mais baixo do que nos dias atu- ais, e, em alguns territórios, a distância do mar à costa era mais ou menos de 150 quilômetros, maior do que atualmente. Essas condi- ções climáticas e geológicas permitiram a existência de uma cone- xão terrestre entre os atuais territórios do Alasca e da Sibéria. Além disso, vale lembrar que as partes mais setentrionais e meridionais do planeta se congelariam primeiro. Assim, o Estreito de Bering teria, além do rebaixamento do nível dos oceanos, con- tado com o congelamento de porções restantes de água. Um dado interessante é que essa mesma estrutura também se apresentou entre os anos 28.000 a.C. e 10.000 a.C. © História da América I Centro Universitário Claretiano 54 Na Figura 6, observe a união entre os continentes americano e asiático no Estreito de Bering, que é denominada “Beríngia”. Figura 6 Estreito de Bering. O que parece um dado curioso para nós, para os cientistas, é motivo de mais especulações. Para eles, essa informação sobre a existência de dois momentos de congelamento do oceano e a formação da faixa terrestre entre a Ásia e a América gera uma po- lêmica em torno de nossa segunda discussão: a data da entrada do homem no continente. Quando chegaram os primeiros homens na América? Para alguns estudiosos, o homem teria entrado na América somente no segundo período de geleiras nos oceanos, ou seja, en- tre 28.000 a.C. e 10.000 a.C. Um dos indícios que permitem termos tanta certeza da pre- sença humana no continente nesse período se dá pelo número alto de achados arqueológicos referentes a tal período, representados, especialmente, pela existência de artefatos de pedra talhada em várias partes de nosso continente, datados de 10.000 a.C. 55© As Origens Humanas da América: Ocupação do Continente e as Primeiras Organizações Sociais do Continente Americano Noentanto, para outra linha de pesquisa, a abundância de achados referentes a esse período é, tão somente, resultado da adoção e confecção de artefatos de pedra por parte dos povos ameríndios. Em outras palavras, as pontas de pedra seriam apenas indícios seguros da existência de uma idade de Paleolítico superior (marcada pelo domínio de indústria lítica de elevada qualidade) na América, mas não a exclusão de vida anterior a esse período. A polêmica ganhou novo fôlego com pesquisas posteriores (ainda sem resultados conclusivos), que apontam para a existência de restos arqueológicos produzidos por seres humanos de tempos anteriores aos convencionados anteriormente. Sobre essas diver- gências, Meggers (1979, p. 23) esclarece que: As discordâncias surgem das informações esporádicas inconclusi- vas da presença do homem no Novo Mundo entre 40.000 e 12.000 anos passados, datação que algumas autoridades aceitam e outras não. O consenso tem sido gradualmente modificado nos últimos anos e as datas mais antigas tendem a ser consideradas com ambi- valência, embora não de todo rejeitadas. Mesmo que controvertidos, esses achados impõem limita- ções às teorias desenvolvidas anteriormente; entre elas, aquela feita por Hrdlicka, uma vez que, por volta de 40.000 a.C., não exis- tiram grupos de mongoloides, e, sim, somente espécies de proto- mongoloides – “um estoque racial menos especializado, do qual mais tarde evoluíram os mongolóides atuais” (CARDOSO, 1992, p. 18). De outra maneira, essas teorias apontariam para um fluxo migratório de várias etnias em vários períodos diferentes, e não para um único grupo ou uma única viagem, como foi sustentado desde o princípio. Independentemente do período de entrada do homem no continente, ainda se sustenta que, a partir do Estreito de Bering, ele teria se espalhado por todo o território ao longo de milênios, e essa ampla difusão teria sido facilitada pelas características ge- ográficas do continente. Ao contrário do Velho Mundo, que pos- © História da América I Centro Universitário Claretiano 56 sui uma grande extensão territorial e acidentes geográficos que impõem barreiras naturais aos fluxos migratórios, o Novo Mundo tem uma área mais compacta e sem maiores acidentes geográfi- cos, facilitando a locomoção humana por toda a sua extensão. Contudo, não são todos que aceitam a teoria do Estreito de Bering como caminho exclusivo para a ocupação da América. Migrações alternativas para a América Para alguns autores, como o antropólogo francês Paul Rivet (1876-1958), o homem não teria chegado ao continente apenas pelo Estreito de Bering, mas teria feito, também, outras rotas. Como escreveu Giordani (1990, p. 63), o autor francês “explica o povoamento da América por quatro correntes migratórias: migra- ção australiana, migração malaio-polinésia, migração mongolóide e migração esquimó”. A concepção de Rivet apud Cardoso (1992, p. 19), sustentada por uma análise de fontes linguistas, explicaria o fato de que: Em poucas dezenas de milênios, se formaram as duas mil e seis- centas línguas, pertencentes a diversos grupos lingüísticos (alguns já residuais), que existiam no continente americano ao começar a conquista européia. Assim como Rivet, autores como o antropólogo português António Mendes Correia (1916) acreditavam em outros caminhos para o povoamento da América. Além dessas hipóteses, não está descartada, nem mesmo, a de contatos marítimos transatlânticos de grupos europeus ou africanos. Um dos achados que alimentam essa hipótese ocorreu aqui no Brasil. O fóssil de hominídeo encon- trado em terras brasileiras pelo arqueólogo Walter Alves Neves (o esqueleto de uma mulher, apelidada de “Luzia”, na região de Belo Horizonte) apresenta características de uma negroide, fato que levantou questionamentos a respeito de uma suposta migração africana. Veja, na Figura 7, a restituição do rosto de Luzia. 57© As Origens Humanas da América: Ocupação do Continente e as Primeiras Organizações Sociais do Continente Americano Figura 7 Restituição do rosto do esqueleto hominídeo encontrado no Brasil (Luzia). No entanto, das diversas teorias de migrações alternativas, hoje, aquela que mais possui certa sustentação teórica é a malaio- polinésia, mas apenas se considerada com uma data mais recente, acerca de 3.000 a.C. Segundo tal teoria, grupos humanos teriam atingido o conti- nente americano pela parte ocidental da costa sul-americana. Para tanto, teriam utilizado pequenas embarcações e beneficiado-se da zona de arquipélagos que se forma na parte sul do oceano Pacífico, entre a Oceania e a América do Sul. Dessa maneira, as migrações teriam seguido uma espécie de “cabotagem”, que permitiu aos grupos migrarem pelas várias ilhotas existentes na região. Não queremos excluir todas as possibilidades. Ao contrário, achamos que elas são extremamente importantes para fomentar novas pesquisas na área. Contudo, diante de tantos questiona- mentos e dúvidas e das diferentes datas e rotas que expusemos ao longo desta unidade, as únicas hipóteses unânimes e inquestioná- veis são as de que o homem chegou à América por volta de 10.000 a.C., tendo como caminho o Estreito de Bering. Já as demais supo- sições carecem de maior fundamentação. Mas o que traz tanta certeza a essa datação apresentada? Os principais indícios que garantem uma data mínima para a ocu- © História da América I Centro Universitário Claretiano 58 pação do território americano entre 11.000 a.C. e 7.000 a.C. são os artefatos líticos encontrados no continente, tais quais as lanças feitas com ponta de pedra, como já mencionamos anteriormente. Considerando a hipótese de que o homem entrou no conti- nente numa data próxima à dos achados de ponta de pedra, fica no ar outra dúvida: não seria possível que ele tenha trazido consi- go o domínio dessa tecnologia? Ou ele a teria desenvolvido já em solo americano? A existência de um Paleolítico Superior na Ásia entre os anos 40.000 a.C. e 9.000 a.C., ou seja, anteriormente ao Paleolítico Su- perior americano, indicaria que, de fato, os homens poderiam ter entrado no continente já de posse dessa nova tecnologia. No en- tanto, a singularidade dos artefatos achados aqui nos leva para a aceitação da segunda hipótese levantada anteriormente. Existiu uma indústria lítica de pontas de pedra de uma tra- dição chamada “Llano” e, até mesmo, variações dela que só en- contramos na América. Para Cardoso (1992), a ideia mais aceitável é a de que a produção de pontas de pedra em nosso continente é uma indústria genuinamente americana. Segundo o autor, essa afirmação se sustenta: [...] por razões tipológicas e cronológicas, em particular para as pontas altamente especializadas da tradição chamada Llano (Clo- vis, Folsom, Scottsbluff, etc.), podendo-se admitir uma origem asiá- tica para o tipo mais generalizado (ou seja, menos especializado) e aparentemente mais antigo de pontas, ligados à tradição chamada Plano (CARDOSO, 1992, p. 25-26). A Figura 8 representa os objetos líticos do Paleolítico Supe- rior americano: (1) Ponta Clovis; (2) Ponta Folsom; (3) Ponta Scot- tsbluff; (4) Ponta Eden; (5) Faca Cody. 59© As Origens Humanas da América: Ocupação do Continente e as Primeiras Organizações Sociais do Continente Americano Fonte: Cardoso (1992, p. 25). Figura 8 Pontas de pedra da tradição Llano. As pontas de pedra, além de nos assegurarem a existência de um Paleolítico Superior na América, apontam para o desenvol- vimento de uma forma de subsistência humana mais elaborada. Esses artefatos, importantes fontes de estudo, foram confecciona- dos pelos homens para que fosse possível a realização de caça de animais da forma direta, o que permitia uma maior segurança na obtenção do alimento em épocas de congelamento da flora e da vegetação. Com a utilização
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