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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS, POLÍTICAS E SOCIAIS - CEJURPS CURSO DE DIREITO RECUPERAÇÃO DE EMPRESAS APLICADA AS MICROEMPRESAS E AS EMPRESAS DE PEQUENO PORTE – A RECUPERAÇÃO ESPECIAL LEONARDO TELLES DE ABREU Itajaí (SC), novembro de 2008 II UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS, POLÍTICAS E SOCIAIS - CEJURPS CURSO DE DIREITO RECUPERAÇÃO DE EMPRESAS APLICADA AS MICROEMPRESAS E AS EMPRESAS DE PEQUENO PORTE – A RECUPERAÇÃO ESPECIAL LEONARDO TELLES DE ABREU Monografia submetida à Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, como requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel em Direito. Orientador: Professor Roberto Epifanio Tomaz, MSc. Itajaí (SC), novembro de 2008 III AGRADECIMENTO À Deus, por sua fidelidade, graça e amor. Só tu tens palavras de vida eterna. Aos meus pais, João e Silvete, pelo carinho e dedicação dispensados em todos os momentos da minha vida. O apoio e incentivo de vocês foram vitais para realização desta conquista. Vocês são presentes de Deus para mim. Sou eternamente grato por tudo! A minha amada esposa Ariana que esteve sempre ao meu lado, me apoiando todos os dias. Muito obrigado pelas conversas, pelo incentivo e amor eterno. A todos os amigos e parentes que de alguma forma estiveram me apoiando e incentivando neste trabalho. Aos amigos de turma, por todos os momentos juntos que estarão para sempre na memória. Ao prof. Roberto, pela orientação e auxílio na realização deste trabalho. IV DEDICATÓRIA À Jesus Cristo, meu eterno Senhor e Salvador. Ele é o caminho, a verdade e a vida. V Seca-se a erva, e cai a flor, porém a palavra de nosso Deus subsiste eternamente. (Isaías 40:8) VI TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo aporte ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do Vale do Itajaí, a Coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o Orientador de toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo. Itajaí (SC), novembro de 2008. Leonardo Telles de Abreu Graduando VII PÁGINA DE APROVAÇÃO A presente monografia de conclusão do Curso de Direito da Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, elaborada pelo graduando Leonardo Telles de Abreu, sob o título Recuperação de Empresas aplicada a Microempresa e Empresa de Pequeno Porte – A Recuperação Especial, foi submetida em 20 de novembro de 2008 à banca examinadora composta pelos seguintes professores: Prof. Roberto Epifanio Tomaz, MSc. (Orientador e Presidente da Banca) e pelo Prof. Diego Richard Ronconi, Dr. (Avaliador), e aprovada com a nota (9,75) nove e setenta e cinco. Itajaí (SC), novembro de 2008. Prof. Roberto Epifanio Tomaz. MSc. Orientador e Presidente da Banca Prof. Antônio Augusto Lapa, MSc. Coordenação da Monografia VIII ROL DE ABREVIATURAS E SIGLAS CC Código Civil Brasileiro de 2002 CF Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 CPC Código de Processo Civil CTN Código Tributário Nacional EPP Empresa de Pequeno Porte LC Lei Complementar LRE Lei de Recuperação de Empresas e Falência LSA Lei das Sociedades Anônimas ME Microempresa RFB Receita Federal do Brasil SEF/SC Secretaria Estadual da Fazenda de Santa Catarina IX ROL DE CATEGORIAS Rol de categorias que o Autor considera estratégicas à compreensão do seu trabalho, com seus respectivos conceitos operacionais. Empresa de Pequeno Porte Considera-se EEP a sociedade empresária, a sociedade simples e o empresário registrados devidamente no Registro de Empresas Mercantis ou no Registro Civil de Pessoas Jurídicas, conforme cada caso, que auferir receita bruta anual entre R$ 240.000,00 e R$ 2.400.000,00. Empresário “Toda pessoa física ou toda sociedade que exerce profissionalmente uma atividade, por meio da organização dos fatores de produção em atividade, e desde que tenha assumido o risco do empreendimento1”. Empresas “Atividade, cuja marca essencial é a obtenção de lucros com o oferecimento ao mercado de bens e serviços, gerados estes mediante a organização dos fatores de produção (força de trabalho, matéria-prima, capital e tecnologia)2”. Microempresa Considera-se ME a sociedade empresária, a sociedade simples e o empresário registrados devidamente no Registro de Empresas Mercantis ou no Registro Civil de Pessoas Jurídicas, conforme cada caso, que auferir receita bruta anual até R$ 240.000,00. 1 LIPPERT, Márcia Mallmann, A empresa no código civil: elemento de unificação no direito privado. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. p. 141-142. 2 COELHO, Fábio Uhoa. Manual de Direio Comercial. 18 ed. rev. Atual. São Paulo : Saraiva, 2007. p. 3-4. X Recuperação Empresas “O conjunto de providencias judiciais ou extrajudiciais que visam a preservação da empresa insolvente, a qual interesse importe substancialmente à Sociedade, na condição de possibilidade de retorno ao seu estado de solvência3”, Recuperação Especial Meio de recuperação judicial simplificada, destinada somente aquelas empresas que se enquadram como ME ou EPP. Recuperação Extrajudicial Meio de recuperação judicial, que busca a homologação em Juízo de negociação já firmada com todos os credores ou pela maioria deles. Recuperação Judicial Meio de recuperação judicial de complexo processamento, proposto pelo devedor em juízo, almejando a recuperação da empresa que dependerá da prévia concordância dos credores. 3 RONCONI, Diego Richard. Falência e Recuperação de Empresas: analise da utilidade social de ambos os institutos. Itajaí: Univali, 2002. p. 67. XI SUMÁRIO SUMÁRIO ............................................................................................................. XI RESUMO ............................................................................................................ XIII INTRODUÇÃO ...................................................................................................... 14 CAPÍTULO 1 – CONSIDERAÇÕS ACERCA DE EMPRESAS ........................... 17 1.1 Histórico ......................................................................................................... 17 1.2 Conceito ......................................................................................................... 22 1.3 O empresário ................................................................................................. 26 1.4 Empresário Individual ..................................................................................... 29 1.5 Sociedades Empresariais............................................................................... 31 1.5.1 Sociedade em Nome Coletivo ..................................................................... 34 1.5.2 Sociedade em Comandita Simples .............................................................35 1.5.3 Sociedade em Comandita por Ações .......................................................... 37 1.5.4 Sociedade por Ações .................................................................................. 38 1.5.5 Sociedade Limitada ..................................................................................... 41 CAPÍTULO 2 – CONSIDERAÇÕES A CERCA DE RECUPERAÇÃO DE EMPRESAS .......................................................................................................... 44 2.1 Histórico .......................................................................................................... 44 2.2 Conceito .......................................................................................................... 48 2.3.Recuperação Judicial ...................................................................................... 52 2.3.1 Legitimação .................................................................................................. 52 2.3.2 Pressupostos ............................................................................................... 54 2.3.3 Meios de Recuperação ................................................................................ 57 2.3.4 Abrangência de Credores ............................................................................ 61 2.3.5 Órgãos da Recuperação .............................................................................. 64 2.3.6 Processo da Recuperação judicial ............................................................... 67 2.4 Recuperação Extrajudicial............................................................................... 72 2.4.1 Pressupostos ............................................................................................... 72 2.4.2 Homologação ............................................................................................... 74 2.4.3 Créditos ........................................................................................................ 76 2.4.4 Procedimento ............................................................................................... 77 2.4.5 Efeitos .......................................................................................................... 79 2.5. Recuperação Especial ................................................................................... 80 CAPÍTULO 3 – RECUPERAÇÃO ESPECIAL DE EMPRESAS ........................... 81 XII 3.1 Microempresa e Empresa de Pequeno Porte ................................................. 81 3.1.1 Considerações introdutórias ......................................................................... 81 3.1.2 Definição ...................................................................................................... 85 3.1.3 Inscrição e baixa .......................................................................................... 87 3.1.4 Tributos e contribuições ............................................................................... 90 3.2 Recuperação Especial .................................................................................... 92 3.2.1 Concessão ................................................................................................... 93 3.2.2 Créditos abrangidos ..................................................................................... 94 3.2.3 Procedimentos ............................................................................................. 96 3.2.4 Efeitos ........................................................................................................ 100 3.3 Distinções dos tipos de recuperação empresarial ......................................... 101 3.3.1. Distinção entre recuperação judicial e extrajudicial ................................... 102 3.3.2. Distinção entre recuperação judicial e recuperação especial .................... 105 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................ 111 REFERÊNCIAS DAS FONTES CITADAS ......................................................... 113 XIII RESUMO A empresa caracteriza-se como atividade econômica organizada de produção e circulação de bens e serviços para o mercado, exercida através do empresário, de forma profissional. Existem alguns tipos de empresas dispostos na legislação brasileira, atribuindo, inclusive, tratamento diferenciado a empresas de menor porte, conforme seu faturamento anual, denominadas de Microempresa e Empresa de Pequeno Porte. Quando a empresa passa por período de crise financeira, a fim de evitar sua quebra, pode recorre-se ao instituto da recuperação de empresas, regulamento por lei específica, e que visa assegurar a reorganização da empresa que se encontra em dificuldade financeira. Tal legislação atribui também tipo diferenciado de recuperação àquelas empresas denominadas ME ou EPP. O presente estudo tem como objetivo identificar qual a forma jurídica do plano de recuperação especial e suas especificidades. Para tanto, discorre no seu primeiro capítulo noção geral de empresa, sua conceituação, seus tipos, além de explicitar sobre o empresário e as sociedades empresárias. Ademais, no segundo capítulo trata dos mecanismos de recuperação de empresas e seus três diferentes tipos. Encerrando no terceiro capítulo, quanto a esclarecimentos acerca das ME e EPP, bem como a recuperação especial e as distinções entre os meios recuperátórios, a fim de expor claramente o objeto e finalidade da recuperação especial. INTRODUÇÃO A presente Monografia tem como objeto discorrer a respeito da recuperação judicial aplicada as microempresas e empresas de pequeno porte, denominada recuperação especial. O seu objetivo é identificar qual a forma jurídica do plano de recuperação especial e suas especificidades Para tanto, o Capítulo 1 apresenta considerações preliminares acerca das empresas, seu contexto histórico mundial e no Brasil, sua concepção no CC de 2002, o conceito de empresário, dentro da classificação legal e também disposta pelos doutrinadores da área, bem como a análise, conceito e esclarecimento do empresário individual, por fim faz uma breve análise das sociedades empresárias, através de sua conceituação, classificação e tipos societários apresentados pela legislação pátria, a fim de proporcionar o melhor enquadramento a cada tipo de empresa. Dando seqüência ao objeto temático faz-se mister avaliar a recuperação de empresa, tratado no Capítulo 2 que apresenta o histórico deste instituto, abordando brevemente sua evolução a partir da falência, passando pela concordata e culminando na recuperação, além do conceito de recuperação, sob a égide da Lei n. 11.101/2005 – Lei de Recuperação de Empresas e Falência. Esse capítulo ainda apresenta os tipos de recuperação de empresas, adotado pela lei supracitada, quais sejam: recuperação judicial ordinária, recuperação extrajudicial e recuperação judicial especial. Quanto a recuperação judicial, abordar-se sua legitimação, pressupostos, meios, abrangência de credores e órgãos e processamento, itens que também são analisados quanto a recuperação extrajudicial. Finalmente, o Capítulo 3 verifica os tipos especiais em que se enquadram as empresas, quais sejam as ME e EEP, a recuperação especial e sua distinção entre os tipos recuperatórios. Ainda quanto a análise da ME e EEP 15 este capítulo apresenta disposições introdutórias, sua definição e características, ao passo que na recuperação especial, analisa sua concessão, os créditos que abrange, os procedimentos e efeitos. O presente estudo monográfico se encerra com as Considerações Finais, nas quais são apresentados pontos conclusivos destacados, seguidos da estimulaçãoà continuidade dos estudos e das reflexões sobre à Recuperação Especial aplicada as ME e EEP. A pesquisa dos meios de Recuperação Especial de Empresas se baseia nos seguintes questionamentos: a) A legislação brasileira contempla regras específicas para criação e consolidação de empreendimentos empresarias a serem constituídos tanto por pessoas naturais quanto jurídicas? b) O ordenamento jurídico nacional ao estabelecer regras sobre recuperação de empresas vislumbrou modalidades diferentes que se adequem aos tipos e porte de empresas existentes? c) A atual Lei de Recuperação de Empresas vislumbra uma modalidade de específica para empresas que se enquadram como ME e EPP? Tendo em vista os questionamentos levantados, foram formuladas as seguintes hipóteses para a pesquisa: a) A legislação brasileira vislumbra tipos específicos de empresas com regras diferenciadas quanto ao tamanho e porte de cada empresa; b) O instituto de Recuperação de Empresas versa sobre modalidades diferenciadas que se adequam as espécies de empresas; c) A atual Lei de Recuperação de Empresas vislumbre tipo específico para empresas enquadradas como ME e EPP, com regras e características específicas. 16 Quanto à Metodologia empregada, registra-se que tanto na Fase de Investigação quanto na Fase de Tratamento dos Dados e no Relatório dos Resultados foi utilizado o método com base lógica Indutiva. Nas diversas fases da Pesquisa, foram acionadas as técnicas do referente4, da categoria5, dos conceitos operacionais6, da pesquisa bibliográfica7 e do fichamento8. 4 "Explicitação prévia do motivo, objetivo e produto desejado, delimitado o alcance temático e de abordagem para uma atividade intelectual, especialmente para uma pesquisa". PASOLD, César Luiz. Prática da pesquisa jurídica - idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do direito. 9 ed. rev. Florianópolis: OAB/SC, 2005., p. 241. 5 “palavra ou expressão estratégica à elaboração e/ou expressão de uma idéia". PASOLD, op cite, p. 229. 6 “definição estabelecida ou proposta para uma palavra ou expressão, com o propósito de que tal definição seja aceita para os efeitos das idéias expostas”. PASOLD, op cite, p. 229. 7 “Técnica de investigação em livros, repertórios jurisprudenciais e coletâneas legais”.PASOLD, op cite, p. 240. 8 “Técnica que tem como principal utilidade otimizar a leitura na Pesquisa Científica, mediante a reunião de elementos selecionados pelo Pesquisador que registra e/ou resume e/ou reflete e/ou analisa de maneira sucinta, uma Obra, um Ensaio, uma Tese ou Dissertação, um Artigo ou uma aula, segundo Referente previamente estabelecido”. PASOLD, op cite, p. 233. 17 CAPÍTULO 1 EMPRESAS 1.1 HISTÓRICO Todos ser humano necessita de determinados bens e serviços que supram suas necessidades básicas de sobrevivência, como vestuário, alimentação, saúde, educação etc, os quais são produzidos por organizações econômicas, especializadas nestes fins, e posteriormente negociadas no mercado. Quem estrutura estas organizações são pessoas que combinam determinados componentes, caracterizados como fatores de produção, que com o resultado produtivo, vislumbram a possibilidade do lucro. Coelho9 destaca que: Estruturar a produção ou circulação de bens ou serviços significa reunir os recursos financeiros (capital), humanos (mão-de-obra), materiais (insumo) e tecnológicos que viabilizem oferece-los ao mercado consumidor com preços e qualidade competitivos. Todavia, nem sempre os bens e serviços que se necessita ou almeja para viver, foram produzidos em organizações econômicas especializadas. Se analisar na história, verifica-se que na antiguidade, roupas e as demais necessidades consideradas básicas para nossa vivência, eram produzidas na própria casa, para os seus moradores, onde apenas o eventual excedente era utilizado para trocas de outros produtos, não existindo ainda a exploração comercial10. 9 COELHO, Fábio Uhoa. Manual de Direio Comercial. p. 4. 10 Idem, p. 5. 18 Na Roma antiga, a família dos romanos não era só o conjunto de pessoas unidas pelo sangue, mas também os escravos, além de que as moradas não eram utilizadas tão somente no intuito do abrigo familiar, para convivência e descanso, mas também para a produção de suas necessidades, como roupas, alimentos e demais utensílios de uso diário11. Outros povos da antiguidade, como os fenícios, destacaram- se intensificando as trocas de produtos, estimulando assim a produção de bens destinados especificamente à venda. Esta atividade de fins econômicos, ora denominada comércio, expandiu-se com extraordinário vigor entre os povos. Na Idade Média, como destaca Coelho12, [...] o comércio já havia deixado de ser atividade característica só de algumas culturas ou povos, espalhando- se por todo o mundo civilizado. Durante o renascimento comercial, na Europa, artesãos e comerciantes europeus reuniam-se em corporações de ofício, poderosas entidades burguesas que gozavam de significativa autonomia em face do poder real e dos senhores feudais. Nas corporações de ofícios, foram surgindo normas destinadas a disciplinar as relações de seus filiados, pautando-se nos usos e costumes, em virtude da inexistência de um sistema jurídico próprio para as transações comerciais. Os números de corporações de ofícios foram aumentando e tornaram-se presença constante em feiras e mercados, eliminando as fronteiras nacionais, dando origem às cidades européias, e conseqüentemente, às respectivas normas ou ordenações jurídicas que as regulavam13. Com a evolução do comércio e ampliação de sua atuação nas cidades, as corporações de ofícios começaram a perder prestígio e tornar-se insuficiente para regulamentar as novas relações comerciais, visto que possuíam 11 COELHO, Fábio Uhoa. Manual de Direio Comercial, p. 5. 12 Idem, p. 6. 13 LIPPERT, Márcia Mallmann, A empresa no código civil: elemento de unificação no direito privado. p. 44-45. 19 caráter genérico, não sendo aplicável a novas atividades econômicas. Desta forma, surge um dos principais passos de codificação do Direito Comercial, qual seja o Código Napoleônico, como bem explicita Coelho14: Já no início do século XIX, em França, Napoleão, com a ambição de regular a totalidade das relações sociais, patrocina a edição de dois monumentais diplomas jurídicos: o Código Civil (1804) e o Comercial (1808). Inaugura-se então, um sistema para disciplinar as atividades dos cidadãos, que repercutirá em todos os países de tradição romana, inclusive o Brasil. De acordo com este sistema, classificavam-se as relações que hoje em dia são chamadas de direito privado em civis e comerciais. A delimitação do campo de atuação do Código Comercial era feita, no sistema francês, pela teoria dos atos do comércio. Sempre que alguém explorava atividade econômica que o direito considerava ato de comércio (mercancia), submetia-se às obrigações do Código Comercial (escrituração de livros, por exemplo) e passava a usufruir a proteção por ele liberada. Entretanto, dentro das atividades elencadas como atos de comércio, na codificação comercial francesa, não se encontravam diversas atividades econômicas, que com a evolução das atividades comerciais, passaram a ser consideradas como atividades de comércio. Dentre estas atividades, encontra-se, por exemplo, a prestação de serviços – atividade econômica marcante do processo de urbanização – e atividades econômicas ligadas à terra, como negociação de imóveis, agricultura ou extrativismo15.Assim, após anos de utilização a teoria dos atos de comércio acabou revelando suas insuficiências para delimitar e regulamentar as atividades comerciais. Em grande parte dos países que adotaram promoveram determinados ajustes como no Código Comercial Alemão que definiu os atos de comércio como todos os que o comerciante, em sua atividade, pratica, propiciando um conceito bem mais amplo. 14 COELHO, Fábio Uhoa. Manual de Direio Comercial. p. 6. 15 Idem. p. 7. 20 Não obstante, onde fora concebida, não se distinguem mais os atos de comércio dos civis. Coelho16 explica que “de fato, no direito francês, hoje, qualquer atividade econômica, independentemente de sua classificação, é regida pelo Direito Comercial se explorada em qualquer tipo de sociedade”. A insuficiência da teoria dos atos de comércio, quanto à regulamentação das atividades comerciais modernas, resultou no surgimento da teoria da empresa, como objeto identificador do Direito Comercial. Desta forma, no ano de 1942, surge um novo sistema para regulamentar as atividades econômicas. Tal sistema aumenta a incidência no que concerne ao Direito Comercial, abrangendo e submetendo atividades que antes estavam fora de sua incidência – é o caso da prestação de serviços e atividades ligadas à terra – às mesmas normas aplicáveis às comerciais, bancárias, securitárias e industriais. Denominou-se assim, o novo sistema de disciplina das atividades privadas de teoria da empresa. Ressalta Coelho17, a nova formulação do Direito Comercial, ante o aparecimento deste novo sistema: O Direito Comercial, em sua terceira etapa evolutiva, deixa de cuidar de determinadas atividades (as de mercancia) e passa a disciplinar uma forma específica de produzir ou circular bens ou serviços, a empresarial. Assim, o Código Italiano de 1942 marcou o início da percepção moderna de empresa não pelo conceito em si, mas pelos elementos que a compõem, sendo resultado do grande desenvolvimento do capitalismo e da produção em larga escala. De certo que este novo sistema veio suprir as necessidades da sociedade que antecedeu a elaboração do Código Italiano de 1942, uma vez que esta sociedade e a sociedade que antecedeu a elaboração do Código Comercial Italiano de 1882 possuíam compreensões totalmente distintas sobre no 16 COELHO, Fábio Uhoa. Manual de Direio Comercial, p. 8. 17 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial. 6 ed. : Vol. I. São Paulo : Saraiva, 2002. 21 que dizia respeito à ciência, cultura, religião. Ademais, a produção passou de artesanal para industrial e a conhecida organização da atividade econômica em corporações de ofícios, substituídas pelos conglomerados econômicos18. Neste novo contexto, Lippert19 elucida o papel da empresa: Efetivamente a empresa passou a ocupar um papel social significativo, pois é dela que provêm bens, serviços e receita fiscal do Estado. Também é ela responsável pela transformação da forma pela qual sociedades, associações e profissionais liberais buscam alcançar a consecução dos seus objetivos, uma vez que é da empresa a noção de utilitarismo, de eficiência técnica, de inovação e de economicidade dos meios. Assim, por sua qualidade jurídica e instrumentalidade inequívoca inovadora, a teoria da empresa permanece delimitando o direito comercial da Itália até hoje. Ademais, por sua operacionalidade e por se adequar as exigências da disciplina que permeia a exploração de atividades econômicas por particulares do nosso tempo, a teoria da empresa também inspirou a reforma da legislação comercial, por exemplo, da Espanha em 1989 e de outros países de tradição jurídica romana20. O Código Comercial brasileiro de 1850 seguia fortemente os traços da teoria dos atos de comércio, entretanto, Coelho21 ressalta que: [...] as defasagens entre a teoria dos atos de comércio e a realidade disciplinada pelo Direito Comercial – sentidas especialmente no tratamento desigual dispensado à prestação de serviços, negociação de imóveis e atividades rurais – e a atualidade do sistema italiano de bipartir o direito privado começam a ser apontadas na doutrina brasileira nos anos 1960. 18 LIPPERT, Márcia Mallmann. A empresa no código civil: elemento de unificação no direito privado. p. 112-113. 19 Idem, p. 114. 20 COELHO, Fábio Uhoa. Manual de Direio Comercial, p. 9. 21 Idem, p. 10. 22 Logo que o Projeto de Código Civil de 1975 adotou a Teoria da Empresa, estudiosos brasileiros da disciplina comercial empenharam-se em discutir o tema, a fim de se preparar para tal inovação trazida pela codificação unificada do direito privado. Todavia, o projeto não saiu do papel, tramitando com demasiada lentidão, ao ponto que a doutrina comercialista já desenvolvia suas reflexões à luz da teoria da empresa e alguns juízes começaram a decidir processos desconsiderando o conceito de atos de comércio, utilizando-se do critério da empresarialidade22. Neste período de transição, embora não regulamentado no direito comercial brasileiro a teoria da empresa, alguns dispositivos legais de interesse comercial já se pautaram no sistema italiano ao invés do francês, como exemplos o Código de Defesa do Consumidor de 1990, a Lei de Locação Predial Urbana de 1991 e a lei de Registro de Empresas de 199423. Por fim, Coelho24 destaca que o direito brasileiro, antes mesmo de entrar em vigor o código civil de 2002 – o qual se pautou de vez na teoria italiana – já vislumbrava através da doutrina, jurisprudência e até mesmo em leis esparsas a teoria da empresa. 1.2 CONCEITO Antes de analisarmos a definição de empresa no âmbito jurídico, vale ressaltar a característica da empresa pela noção econômica, uma vez que de certo modo esta decorre de atividades econômicas. Nesta ótica, ressalva Requião25 que a economia política considera, com grande relevância, o papel da empresa como organização dos fatores de produção, ora já citados anteriormente. Ainda mais, relata que - segundo Ferri – a empresa constitui-se num organismo econômico, o qual, como organização se fundamenta em princípios técnicos e leis econômicas. 22 COELHO, Fábio Uhoa. Manual de Direio Comercial, p. 10. 23 Idem, p. 10. 24 Idem, p. 10. 25 REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Comercial. 26 ed, atual. Vol. I. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 50. 23 De forma objetiva apresenta-se como a combinação de elementos pessoais e reais, em função de um resultado econômico, cuja realização se perfaz pela intenção especulativa de uma pessoa, que se chama empresário26. Se atendo a proposta deste estudo, por ora, fica de lado a conceituação econômica de empresa e passasse a verificar a conceituação jurídica. Como explicitado anteriormente à teoria que trouxe a figura da empresa, adotada pelo código civil de 2002, tem origem no sistema italiano, de forma que ambos dispositivos não definem a empresa. De sorte que estes dispositivos, mais especificamente o brasileiro que é a legislação orientadora deste estudo, definem a figura do empresário e de estabelecimento, levando a soma destes uma breve conclusão de empresa. Neste sentido, Reale27, nos seus comentários ao Projeto de Código, caracteriza a empresa como aquela composta por: [...] três fatores, em unidade indecomponível; a habitualidade no exercício de negócios que visem a produção ou a circulação de bens ou serviços; o escopo de lucro ou resultado econômico; a organização ou estrutura estável dessa lucratividade. Deixando assim, o código civil de 2002, de atribuir o conceito jurídico de empresa,juristas e doutrinadores brasileiros tem discorrido na busca de tal compreensão conceitual. Dentre estas estão às formulações propostas por alguns autores: 26 FERRI, Giuseppe. Manuale di Diritto Commerciale. Turim: Unione Tipografia, 1956, apud, REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Comercial. 26 ed, atual. Vol. I. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 50. 27 REALE, Miguel. O projeto de Código Civil: situação atual e seus problemas fundamentais. São Paulo: Saraiva, 1986. p. 119 24 Na concepção de Coelho28: Conceitua-se empresa como sendo atividade, cuja marca essencial é a obtenção de lucros com o oferecimento ao mercado de bens e serviços, gerados estes mediante a organização dos fatores de produção (força de trabalho, matéria-prima, capital e tecnologia). (...) Como atividade econômica, profissional e organizada, a empresa tem estatuto jurídico próprio, que possibilita o seu tratamento com abstração até mesmo do empresário. Já para Bulgarelli29: Atividade econômica organizada de produção e circulação de bens e serviços para o mercado, exercida pelo empresário, em caráter profissional, através de um complexo de bens. E Requião30: Empresa é essa organização dos fatores de produção exercida (...) pelo empresário. Assim, dentro das definições propostas pelos autores, a fim de dirimir o conceito jurídico de empresas, observa-se que representa consenso entre estes, o fator organização dentro da concepção jurídica de empresas. Não obstante, Coelho31 reafirma que a empresa é atividade organizada no sentido de que nela se encontram articulados, pelo empresário, os quatro fatores de produção: capital, mão-de-obra, insumos e tecnologia. Para Requião32, “empresa é essa organização dos fatores da produção exercida, posta a funcionar, pelo empresário. Desaparecendo o 28 COELHO, Fábio Ulhoa. Manual de Direito Comercial.p. 3-4. 29 BULGARELLI, Waldirio Tratado de Direito Empresarial. 2 ed. São Paulo: Atlas, 1995. p. 93. 30 REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Comercial. p. 60. 31 COELHO, Fábio Ulhoa. Manual de Direito Comercial.p. 13. 32 REQUIÃO, Rubens. Curso de direito comercial. p. 57. 25 exercício da atividade organizada do empresário, desaparece, ipso facto, a empresa.” Por esta percepção, Bulgarelli33 ainda determina ser a empresa composta basicamente, de três elementos: o empresário, o estabelecimento e a atividade econômica organizada. Para ele ocorre a transformação jurídica do conceito econômico, ao ponto em que se desloca a ênfase do conceito da organização econômica para empresário, pelo exercício profissional. Neste prisma, observa Negrão34 em sua obra, de que “relacionam-se o empresário, o estabelecimento e a empresa de forma íntima: o sujeito de direito que exercita (empresário), por meio do objeto de direito (estabelecimento) e os fatos jurídicos decorrentes (empresa)” Logo, a empresa caracterizada como atividade econômica organizada, revela seu valor jurídico, ao ponto que serve de referência orientadora para a qualificação do empresário, sem eximir a alusão ao estabelecimento, que emerge da conceituação de organização técnica dos bens e ao empresário, como agente dessa atividade, revelando a intrínseca relação entre os três conceitos35. Poderia, ainda, considerar a empresa, de um modo geral, a organização produtiva, através da união de trabalhadores e bens, de uso comum, e, de modo específico, a atividade econômica organizada exercida profissionalmente, o que denominaríamos, em sentido exato e jurídico, de empresa36. Em suma, verifica-se que a empresa, na nova concepção adotada pelo CC, seria uma atividade econômica, exercida profissionalmente pelo empresário, para a produção e circulação de bens e serviços, visando o elemento 33 BULGARELLI, Waldirio. Tratado de Direito Empresarial. p. 100. 34 NEGRÃO, Ricardo. Manual de direito comercial e de empresa. 5 ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 46. 35 BULGARELLI, Waldirio. Tratado de Direito Empresarial, p. 102. 36 Idem, p. 102 26 lucro, porém, não separada também do elemento risco, inerente a esta atividade produtiva. 1.3 O EMPRESÁRIO Conforme exposto nos parágrafos anteriores, embora tenha a legislação se omitido, quanto à definição da empresa, trouxe, todavia, a definição legal do empresário. Assim, dispôs no art. 966 do Código Civil brasileiro de 2002, que empresário é o profissional exercente de “atividade econômica organizada para a produção ou circulação de bens ou serviços.” Neste sentido, Bulgarelli37 conceitua o empresário como: [...] titular da empresa, o seu sujeito, portanto, aquele que tem a iniciativa da criação da empresa e que a dirige, correndo o risco inerente à atividade empresarial (...), além das funções próprias do empresário (o risco, o direito ao lucro e o poder supremo) o seu dinamismo, uma espécie de força vital que emprestaria à empresa para seu surgimento e posterior crescimento (...). Juridicamente, o empresário é o sujeito de direito, o único, aliás, reconhecido pela lei, em termos de representação empresarial. Assim também, destaca Requião38 que a iniciativa e o risco são elementos caracterizadores da figura do empresário, de modo que: o poder de iniciativa pertence-lhe exclusivamente: cabe-lhe, com efeito, determinar o destino da empresa e o ritmo e sua atividade. (...) O empresário pode valer-se, e normalmente se vale, da atuação e colaboração de outrem, mas a ele cabe a decisão, a ele compete, no caso de diversidade de perspectiva, escolher o caminho que lhe pareça mais conveniente. Compensando o poder de iniciativa, os riscos 37 BULGARELLI, Waldirio. Sociedades comerciais: sociedades civis e sociedades cooperativas; empresas e estabelecimento comercial. 8 ed. São Paulo: Atlas, 1999. p. 319. 38 REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Comercial. p. 77. 27 são todos do empresário: goza ele das vantagens do êxito e amarga as desventuras do insucesso e da ruína. Dentro da definição de empresário, torna-se ainda indispensável realçar as seguintes noções: profissionalismo, atividade econômica organizada e produção ou circulação de bens ou serviços. A atividade torna-se àquela de produção ou circulação de bens e serviços que se dirigem ao mercado, como esclarece Ascarelli39: A produção e a troca não devem, entretanto, estar destinadas necessariamente ao mercado em geral; pode ser suficiente sua destinação a um âmbito restrito (sempre que não seja familiar) ou só a uma pessoa determinada (como para uma atividade consistente em produtos reservados exclusivamente a um só adquirente) ou a um mercado pré- determinado, como sucede para uma cooperativa de consumo (expressamente definida como empresa no Código) que se dedique exclusivamente à aquisição de gêneros para os cooperados. Quanto à atividade empresarial ser econômica é no sentido de que busca gerar lucro para quem a explora, podendo ser o lucro o objetivo da produção ou circulação de bens ou serviços, ou tão somente o instrumento para alcance de demais finalidades40. Todavia, conforme Negrão41 diferencia-se a expressão “econômica” das que qualificam demais atividades previstas no CC, quais sejam: 39 ASCARELLI, Tullio. Iniciación al Estudio del Derecho Mercantil. Barcelona: Bosch, 1964. p. 155. Introdución y traducción de Evelio Verdera y Tuells, apud, NEGRÃO, Ricardo. Manual de direito comercial e de empresa. 5 ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 47. 40 COELHO, FábioUhoa. Manual de Direio Comercial. p. 13. 41 NEGRÃO, Ricardo. Manual de direito comercial e de empresa. p. 47. 28 intelectual, científica, literária ou artística42, a atividade associativa43, as fundacionais de fins religiosos, morais, culturais e de assistência44. Organizada, pois nela se encontram articulados, pelo empresário, os quatro fatores de produção: capital, mão-de-obra, insumos e tecnologia; não sendo empresário quem explora atividade de produção ou circulação de bens ou serviços sem alguns desses fatores. Tem-se ainda a produção de bens como a fabricação de produtos ou mercadorias e a produção de serviços, por sua vez, a prestação de serviços. Já a circulação de bens é a do comércio, em sua manifestação originária, como atividade de intermediação na cadeia de escoamento de mercado e a circulação de serviços como intermediação da prestação de serviços45. Quanto ao empresário, sugere Lippert46: [...] é empresário ou empresária toda pessoa física ou toda sociedade que exerce profissionalmente uma atividade, por meio da organização dos fatores de produção em atividade, e desde que tenha assumido o risco do empreendimento. Neste sentido, este trabalho adota a conceituação de empresário, como sendo aquele que exerce uma atividade econômica, através da organização dos fatores de produção, podendo se caracterizar como pessoa física ou sociedade empresária, de modo que o empresário pessoa física é aquele denominado de empresário individual e que estaremos analisando em seguida. 42 “Não se considera empresário quem exerce profissão intelectual, de natureza científica, literária ou artística, ainda com o concurso de auxiliares ou colaboradores, salvo se o exercício da profissão constituir elemento de empresa.” BRASIL, Código Civil, parágrafo único, art. 966. 43 “Constituem-se as associações pela união de pessoas que se organizem para fins não econômicos”. BRASIL, Código Civil, art. 53. São Paulo: Saraiva, 2008. 44 “A fundação somente poderá constituir-se para fins religiosos, morais, culturais ou de assistência”. BRASIL, Código Civil, parágrafo único, art. 62. São Paulo: Saraiva, 2008. 45 COELHO, Fábio Uhoa. Manual de Direio Comercial. p.14. 46 LIPPERT, Márcia Mallmann. A empresa no código civil: elemento de unificação no direito privado. p. 141-142. 29 1.4 EMPRESÁRIO INDIVIDUAL Conforme verificamos acima, o empresário é aquele que exerce atividade econômica organizada para produção ou circulação de bens ou serviços. Todavia, este empresário pode ser pessoa física ou pessoa jurídica, de modo que o empresário pessoa física é denominado de empresário individual e o empresário pessoa jurídica é a sociedade empresária, este último será abordado no próximo tópico, de modo que vale ressaltar que as regras aplicáveis ao empresário individual não se aplicam aos sócios das sociedades empresárias. Assim, temos no empresário individual a pessoa física (natural) que exerce a atividade econômica, empregando seu dinheiro e organizando a empresa individualmente. Bertoldi47 coloca que “o empresário pode surgir mediante o exercício empresarial desempenhado por uma única pessoa natural – o empresário individual”. Também destaca Requião48 que: À firma individual (hoje denominada firma mercantil individual pela Lei nº 8.394, de 18 de novembro de 1994, art. 32, II, a), do empresário individual, registrada no Registro do Comércio, atualmente Registro Público de Empresas Mercantis, chama-se também de empresa individual e empresário, pelo Código Civil. O empresário individual não possui presença relevante na economia, visto que, em geral não explora atividades econômicas de grande impacto. Coelho49 destaca dois pontos importantes que demonstram esta situação: [...] em primeiro lugar, porque negócios de vulto exigem naturalmente grandes investimentos. Além disso, o risco do insucesso, inerente a empreendimento de qualquer natureza 47 BERTOLDI, Marcelo M. Curso Avançado de Direito Comercial: teoria geral do direito comercial, direito societário. 2 ed. rev. e atual. Vol. I. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. p. 56. 48 REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Comercial. p. 78. 49 COELHO, Fábio Uhoa. Manual de Direio Comercial. p. 20. 30 e tamanho, é proporcional às dimensões do negócio: quanto maior e mais complexa a atividade, maiores os riscos. Desta forma, atividades empresarias de maior impacto econômico são desenvolvidas pelas sociedades comerciais, pois conjugam melhor a questão do investimento e perdas. Os empresários individuais desenvolvem então negócios menores, principalmente na área do varejo, como pequenas lojas de confecções, miudezas em geral, lanchonetes etc. Geralmente utilizará como nome empresarial de sua firma, seu nome de pessoa natural ou do gênero da atividade. É de suma importância ressaltar que o empresário individual, responderá com toda sua força patrimonial de forma ilimitada e que ele difere-se totalmente do sócio de uma empresa societária, visto que este não é empresário, pois “[...] como é a pessoa jurídica que explora a atividade empresarial, não é correto chamar de ‘empresário’ o sócio da sociedade empresária50”. Para ser empresário individual, a pessoa deve estar em pleno gozo de sua capacidade civil, sendo vedada a possibilidade de exercer a atividade empresarial aquele que seja considerado incapaz. São considerados incapazes, os menores de 18 anos não emancipados, ébrios habituais, viciados em tóxicos, deficientes metais, excepcionais e os pródigos e os índios, estes últimos regulados por legislação própria. Como destacado acima o menor emancipado, por qualquer das hipóteses elencadas em lei, pelo fato de estar no pleno gozo de sua capacidade, poderá exercer a atividade empresarial. Por fim, contata-se que o exercício da atividade econômica pode ser exercido por uma pessoa física, a qual arcará com todos os ricos inerentes a atividade, sendo denominada de empresário individual. 50 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial. p.64. 31 1.5 SOCIEDADES EMPRESÁRIAS Como visto no tópico anterior, atividades de pequeno porte, com baixo impacto econômico, normalmente são realizadas por uma pessoa natural. Todavia, atividades com maiores investimentos de capital e de pessoas, com diferentes capacitações e de grande impacto econômico, não subsistem com a pessoa natural. Certamente, seu desenvolvimento requer a união de esforços de diversos agentes, com interesse na percepção de lucros que pode resultar, de forma que esta união poderá assumir variadas formas jurídicas, umas das quais a sociedade51. Discorre Negrão52 quanto a sociedade empresária: [...] é o contrato celebrado entre pessoas físicas ou jurídicas, ou somente entre pessoas físicas (art. 1039), por meio do qual estas se obrigam reciprocamente a contribuir, com bens ou serviços, para o exercício de atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou serviços. Na mesma linha didática, Bertoldi53 conceitua sociedade empresária como “as organizações econômicas, dotadas de personalidade jurídica e patrimônio, constituídas ordinariamente por mais de uma pessoa, que tem como objetivo a produção ou a troca de bens ou serviços com fins lucrativos”. Destas conceituações, percebe-se que as sociedades empresárias são implementadas por um contrato social, cujo objeto social é a exploração de atividade empresarial. Caracterizam-se como ente que surge em 51 COELHO, Fabio Ulhoa. Curdo de Direito Comercial. 9 ed. Vol. I. São Paulo:Saraiva, 2006. p. 03. 52 NEGRÃO, Ricardo. Manual de direito comercial e de empresa. p. 237. 53 BERTOLDI, Marcelo M. Curso Avançado de Direito Comercial: teoria geral do direito comercial, direito societário. p. 160. 32 decorrência de um contrato, uma sociedade contratual, que adquire personalidade jurídica quando devidamente registrada na Junta Comercial54. Assim, compreende-se a sociedade empresária como pessoa jurídica que explora uma empresa, através de mais de uma pessoa, sujeito a registro, conforme regulamentada no art. 982 do Código Civil brasileiro de 2002. As sociedades empresárias são dotadas de personalidade jurídica própria, cuja característica marcante é a capacidade de adquirir direitos e assumir obrigações por si mesmas, de forma que seu patrimônio responde por suas dívidas e obrigações, não se confundindo com o patrimônio de seus sócios. Neste sentido, vale ressaltar, que o adjetivo “empresária” diz respeito a própria sociedade, a titular da atividade econômica e não aos sócios, uma vez que não se trata de sociedade empresária referente a sociedade de empresários, mas sim pela identificação da pessoa jurídica, em sendo a organizadora da empresa55. Desta forma, analisando Coelho56, verifica-se que: Empresário, para todos os efeitos de direito, é a sociedade, e não os seus sócios. É incorreto considerar os integrantes da sociedade empresária como os titulares da empresa, porque essa qualidade é da pessoa jurídica, e não dos seus membros. Quanto à aquisição da personalidade jurídica, atribuída a sociedade empresária, após sua inscrição nos respectivo registro, esta gera três importantes conseqüências: Titularidade jurídica negocial, titularidade jurídica processual e titularidade jurídica patrimonial. A titularidade negocial consiste no fato de que quando um sócio da sociedade empresária atua em um negócio como seu representante, é a 54 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Manual de Direito Comercial. 6 ed. São Paulo: Atlas, 2005. p. 154. 55 COELHO, Fabio Ulhoa. Curdo de Direito Comercial. p.5. 56 Idem. p.5. 33 sociedade empresaria que assume um dos pólos da negociação, ou seja, é a sociedade quem celebra o negócio jurídico, visto que o sócio que a representou não é parte no negócio e sim a sociedade. Já a titularidade processual, possui a mesma linha de entendimento do exposto acima, porém em relação às questões processuais, de modo que a sociedade empresária é capaz de demandar e ser demandada em juízo. A cão será endereçada a pessoa jurídica e não aos seus sócios, da mesma forma que será ela que recebe citação e recorre. Quanto à titularidade patrimonial, a sociedade empresária será dotada de patrimônio próprio, inconfundível e incomunicável com os dos sócios, de modo que ela responderá com seu patrimônio pelas obrigações que assumir ou que seus sócios assumirem. Em hipóteses excepcionais, os sócios poderão responder pelas obrigações da sociedade, todavia esta possibilidade deverá ser devidamente examinada e mesmo assim o sócio somente responderá de forma subsidiária, ou seja, somente quando a sociedade não tiver com que responder ou pelo que a sociedade não conseguiu responder na totalidade. Em suma, as sociedades empresárias são aqueles que correspondem a maior parte das atividades econômicas de nosso pais, cuja característica principal está na associação de mais de uma pessoa, para explorara atividade econômica com fins lucrativos, mediante contrato averbado em registro próprio, tendo personalidade jurídica própria. Nossa legislação pátria prevê cinco tipos de sociedades empresárias, quais sejam: Sociedades em nome coletivo; Sociedades em comandita simples, Sociedades em comandita por ações; Sociedades anônimas e Sociedades limitadas. Destas sociedades empresárias, apenas duas são utilizadas amplamente em nosso sistema econômico, qual seja a sociedade limitada – dado sua flexibilidade, fácil constituição e, assim, mais adequada as pequenas e médias empresas – e a sociedade anônima – embora mais complexa, é voltada para os grandes investimentos e de grande importância no mundo 34 econômico moderno –, sendo que as demais praticamente não estão mais sendo utilizadas no meio empresarial. A seguir passaremos a conhecer, de forma objetiva e sucinta, as características dos cinco tipos de sociedades empresárias para compreender a estrutura empresarial brasileira, afim de agregar maior conhecimento para o entendimento da recuperação destas empresas, que é o objeto deste trabalho 1.5.1 Sociedades em Nome Coletivo As sociedades em nome coletivo, também denominadas de solidárias, são aquelas sociedades em que todos os sócios respondem ilimitadamente pelas obrigações sociais. É espécie de “sociedade comercial constituída de uma só categoria de sócios – solidária e ilimitadamente responsáveis pelas obrigações sociais [...]57”. Aliás, é a responsabilidade solidária dos sócios pelas obrigações sociais, subsidiariamente ao patrimônio social e de forma ilimitada, a principal característica desta sociedade, e a que difere de todas as demais. Quanto esta forma de responsabilidade, explica Coelho58: A exploração de atividade econômica por esse tipo de associação de esforços, portanto, não preserva nenhum dos sócios dos riscos inerentes ao investimento empresarial. Se a empresa não resultar frutífera – eventualidade que nenhum empreendedor ou investidor afasta seriamente –, isso poderá significar a ruína total dos sócios e de sua família [...]. Estão disciplinadas nos arts. 1.039 a 1.044 do Código Civil brasileiro de 2002, de modo que, embora, o Código não defina a sociedade em nome coletivo, a torna clara e evidente no art. 1.039 ao mencionar sua essencial característica, qual seja a responsabilidade solidária. 57 ALMEIDA, Amador Paes de. Manual da Sociedades Comerciais: Direito de Empresa. 15 ed. rev. atual. São Paulo : Saraiva, 2005. p.108. 58 COELHO, Fabio Ulhoa. Curdo de Direito Comercial. p.476-477. 35 Outra característica, também disposta no referido art. 1039, se dá ao fato de que somente pessoas físicas podem tornar parte desta sociedade, afastando totalmente a possibilidade de se constituir de sócias pessoas jurídicas ou até mesmo por outras sociedades empresárias Qualquer um dos sócios poderá administrar a sociedade em nome coletivo, uma vez que todos se encontram na possibilidade de fazê-la. Somente no caso em que o contrato designar o administrador, os demais sócios não poderão exercê-la, além de que não admite em nenhuma hipótese a administração por aquele que não sejam sócios. As sociedades em nome coletivo devem adotar um nome, ou seja, firma ou razão social59, composto pelo nome de um, de alguns ou de todos os sócios, seja por extenso ou de forma abreviada, acompanhados pela expressão “e companhia”, por extenso ou de forma abreviada também. Todavia, quando se utilizar de todos os nomes dos sócios, ao nome não será acrescida a expressão “e companhia”. 1.5.2 Sociedades em Comandita Simples As sociedades em comandita simples são aquelas que se constituem de duas modalidades de sócios, os comanditados e comanditários, tendo aqueles responsabilidade solidária e ilimitada, e estes últimos, responsabilidade limitada. Requião60 explana com propriedade a ocorrência desta sociedade, afirmando que a sociedade em comandita simples surge: [...] quando duas ou mais pessoas se associam, para fins comerciais, obrigando-se uns como sócios solidários, ilimitadamente responsáveis, e sendo outros simples prestadores de capitais, com a responsabilidade limitada às suas contribuições de capital.59 “Firma ou razão social, pois, é o nome sob o qual o empresário ou sociedade exerce o comércio e assina-se nos atos a ele referentes” (Almeida, 2005, p.110) 60 REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Comercial. p.433. 36 Estas sociedades são reguladas pelos arts. 1.045 a 1.051 do Código Civil brasileiro de 2002, que deixa claro através do art. 1.045, duas importantes características, quais sejam: os sócios comanditados somente pode ser pessoas físicas e os sócios comanditários podem ser tanto pessoas físicas como jurídicas. Justamente por ter sua responsabilidade limitada, os sócios comanditários não podem exercer qualquer ato de gestão, ou seja, a administração somente poderá ser realizada pelos sócios comanditados, podendo ser designado no contrato social, somente um destes para o exercício da administração. No silêncio do contrato, todos os comanditados serão considerados administradores. Outra restrição aos sócios comanditários, diz respeito ao nome da sociedade, de forma que a firma ou razão social somente poderá ter o nome dos sócios comanditados, devendo acrescer ao final a expressão “e companhia”. Embora os sócios comanditários estejam sujeitos a estas restrições, estes “têm, como os comanditados, direito de participar da distribuição dos lucros proporcionalmente às suas cotas, bem como tomar parte das deliberações sociais e fiscalizar a administração dos negócios da sociedade61”. Ademais, nos termos do parágrafo único do art. 1.047 do Código Civil brasileiro de 2002, poderão – os comanditários – receber poderes especiais de procurador na realização de negócios determinados. Por fim, compreende-se a sociedade em comandita simples aquele que possui duas modalidades de sócios, de nominados comanditados e comanditários, com responsabilidades sobre as obrigações sociais de forma solidária e ilimitada, e limitada, está última aplicada somente aos comanditários. 61 COELHO, Fábio Uhoa. Manual de Direio Comercial. p.149. 37 1.5.3 Sociedades em Comandita por Ações As sociedades em comandita por ações são sociedades classificadas como sociedades de capitais e institucionais, cujo capital é dividido por ações. Almeida62 bem define esta sociedade como sendo: Aquela em que o capital, tal como nas sociedades anônimas, se divide em ações, respondendo os acionistas apenas pelo preço das ações subscritas ou adquiridas, assumindo os diretores responsabilidade solidária e ilimitada pelas obrigações sociais. Neste sentido, merece destaque o fato de que nas sociedades em comandita por ações a responsabilidade dos sócios é limitada ao preço da aquisição das ações, quando este acionista não participa da administração da sociedade, pois em havendo participação na gerência da sociedade, como diretor ou administrador, este responderá de forma subsidiária, ilimitada e solidária, às obrigações sociais constituídas durante sua gestão. Esta característica essencial é a que difere da outra sociedade por ações, a sociedade anônima. Esta responsabilização dos gestores da sociedade submete- se a regras próprias elencadas nos arts. 1.091 e 1.092 do Código Civil brasileiro de 2002 que são consideradas regras especiais, juntamente com o art. 1.090 do CC, visto que a sociedade em comandita por ações é regulada pelas normas aplicáveis as sociedades anônimas, através da Lei n. 6.404/76. Ainda quanto aos administradores, importante frisar que estes serão obrigatoriamente sócios ou acionistas, nomeados pelo estatuto, por prazo indeterminado, conforme bem preceitua o art. 28263 da Lei n. 6.404/76 e o art. 1.09164 do CC. 62 ALMEIDA, Amador Paes de. Manual da Sociedades Comerciais: Direito de Empresa.p.154. 63 Art. 282. Apenas o sócio ou acionista tem qualidade para administrar ou gerir a sociedade, e, como diretor ou gerente, responde subsidiária, mas ilimitada e solidariamente, pelas obrigações da sociedade. BRASIL. Lei n. 6.404/76, de 15 de dezembro de 1976. Dispõe sobre as sociedades por ações. São Paulo: Saraiva, 2008. 64 Art. 1.091. Somente o acionista tem qualidade pra administrar a sociedade e, como diretor, responde subsidiária e ilimitadamente pelas obrigações da sociedade. BRASIL. Código Civl.. 38 No tocante ao nome empresarial das sociedades em comandita por ações, elas poderão adotar a firma ou denominação, devendo ser ao final destas acrescentado as palavras comandita por ações. Em adotando como nome a firma, “ela necessariamente deverá conter tão-somente os nomes dos sócios diretores ou gerentes65”. Por derradeiro, destaca-se que nestas sociedades a assembléia geral não tem poderes, para sem a anuência dos administradores, mudarem objeto essencial da sociedade, prorrogar seu prazo de duração, aumentar ou reduzir o capital social, criar debêntures66 ou partes beneficiárias, conforme estabelecido no art. 1.092 do Código Civil brasileiro. 1.5.4 Sociedades por Ações Como já mencionado anteriormente, em sendo o objeto principal deste trabalho o estudo do instituto da recuperação judicial especial, neste tópico iremos nos ater apenas às noções gerais das sociedades por ações, visto que se trata de sociedade bastante complexa, com diversas peculiaridades, cujo conhecimento não é imprescindível para a compreensão deste trabalho. A sociedade por ações, também chamada de sociedade anônima, é pessoa jurídica de direito privado, cujo capital social é dividido em ações – espécie de valor mobiliário representativo de um investimento – as quais são livremente negociadas, cujos sócios respondem pelas obrigações sociais de forma limitada ao preço de emissão das ações que possuírem. Neste sentido, discorre Bertoldi67: Pago o preço da ação, está o sócio liberado de qualquer outra responsabilidade patrimonial, de forma que os insucessos da sociedade não irai interferir na esfera de seu 65 BERTOLDI, Marcelo M. Curso Avançado de Direito Comercial: teoria geral do direito comercial, direito societário. p.204. 66 Do latim debo, debui, debitum, que significa dever, obrigação, as debêntures são títulos de créditos emitidos pelas sociedades anônimas, em decorrência de empréstimos por elas obtidos junto ao público. Os titulares de debêntures são, portanto, credores das sociedades anônimas emissoras. (Almeida, 2005, p. 244) 67 BERTOLDI, Marcelo M. Curso Avançado de Direito Comercial: teoria geral do direito comercial, direito societário. p.243. 39 patrimônio pessoal. Esta característica é tida como um atributo facilitador capaz de aglutinar um volume grande de recursos para a sociedade, na media em que o acionista sente-se mais à vontade para nela ingressar. São assim, típicas sociedades de capital, onde não há restrição na negociação das ações, de modo que o importante é a contribuição dos sócios para a construção do capital social, não tendo significado as qualidades pessoais de cada sócio. Os sócios, justamente pela divisão do capital social em ações, são denominados de acionistas. Estas sociedades, independente da natureza de suas atividades, serão sempre empresárias e estão sujeitas as normas estabelecidas na Lei das Sociedades por Ações, Lei n. 6.404/76, sendo o Código Civil aplicável apenas nas omissões da lei, conforme dispõe o art. 1.089 do CC. O nome da sociedade anônima, não poderá utilizar-se de firma ou razão social, devendo sempre ter a forma de denominação. Seu nome deverá sempre fazer menção ao seu ramo de atividade, contudo, poderá ainda utilizar “o nome do fundador, acionista ou de outra pessoa física que tenha contribuído para a formação da empresa68”. Na denominação, deverá ainda constar as expressões“sociedade anônima” ou “companhia”, por extenso ou abreviadamente – S/A ou Cia. – sendo que esta última expressão somente poderá ser utilizada no início ou no meio do nome empresarial, pois se, como bem coloca Almeida69: “utilizada ao final da denominação poderá designar qualquer das diversas sociedades de pessoas, causando com isso confusões manifestamente prejudiciais, o que faltamente ocorreria se adotássemos”. As sociedades anônimas classificam-se em duas espécies, abertas ou fechadas, que se referem à permissão ou não permissão de 68 NEGRÃO, Ricardo. Manual de direito comercial e de empresa. p.387. 69 ALMEIDA, Amador Paes de. Manual da Sociedades Comerciais: Direito de Empresa. p.175. 40 negociarem os valores que emitem, na bolsa de valores70 ou no mercado de balcão71. O critério de identificação destas categorias de sociedade anônima é simplesmente formal72. As sociedades anônimas abertas são aquelas que negociam os valores mobiliados que emitem no mercado de valores, a fim de captar recursos. Bertoldi73 tem que a sociedade aberta: Caracteriza-se pelo fato de buscar recursos junto ao público em geral, oferecendo os valores mobiliários de sua emissão a qualquer pessoa, indistintamente. [...] Exige a lei que, para que a companhia possa ofertar ao público valores mobiliários, é necessário seu registro junto à CVM74. Já as sociedades anônimas fechadas são o inverso, uma vez que não negociam suas ações e outros títulos mobiliários de sua emissão, a fim de captar recursos junto ao público em geral. Discorre Almeida75 quanto à sociedade fechada: É companhia que não formula apelo à poupança pública, obtendo recursos entre os próprios acionistas ou subscritores. É a rigor a sociedade anônima tradicional, restrita a famílias ou grupos e que, por isso mesmo, dispensa a tutela estatal, ao contrario do que ocorre com a companhia aberta, sujeita à fiscalização e controle da Comissão de Valores Mobiliários. 70 “é uma entidade privada, resultante da associação de sociedades corretoras, que exerce um serviço público, com monopólio territorial [...] para a venda e aquisição de valores mobiliários”. (Coelho, 2007, p.186-187) 71 “compreende toda operação relativa a valores mobiliários, realizada fora do mercado da Bolsa de Valores, por sociedade corretora e instituição financeira ou sociedade intermediária autorizada”. (Coelho, 2007, p.186) 72 COELHO, Fábio Uhoa. Manual de Direio Comercial. p.185. 73 BERTOLDI, Marcelo M. Curso Avançado de Direito Comercial: teoria geral do direito comercial, direito societário. p.250. 74 “[...] é uma autarquia denominada Comissão de Valores Mobiliários – CVM. Essa autarquia foi criada pela Lei n. 6.385, de 1976, e juntamente com o Banco Central exerce a supervisão e o controle do mercado de capitais, de acordo com as diretrizes traçadas pelo Conselho Monetário Nacional – CMN”. (Coelho, 2007, p.186) 75 ALMEIDA, Amador Paes de. Manual da Sociedades Comerciais: Direito de Empresa. p. 41 Desta forma, compreendem-se as sociedades anônimas como as sociedades caracteristicamente de capitais, cujo capital social é divido por ações, classificadas como abertas ou fechadas, além de mais peculiaridades dispostas na Lei das Sociedades anônimas. 1.5.5 Sociedades Limitadas A sociedade limitada é o tipo de sociedade mais utilizado em nossa economia. Hoje, sua representatividade entre as sociedades empresárias registradas nas Juntas Comerciais, está acima dos 90%76. Ela é bem consentida no meio empresarial, por dois fatores importantíssimos, que a caracteriza e a torna tão eficaz. Estes fatores são expostos por Fazzio Júnior77 “garante aos sócios contra os indesejáveis efeitos patrimoniais suscetíveis de ocorrer nas sociedades ilimitadas; e ao mesmo tempo, dispensa a complexão estruturação das sociedades por ações [...]”. Em relação à primeira característica, qual seja, a responsabilização dos sócios de forma limitada as obrigações sociais da sociedade, elas permitem que estes possam minimizar as perdas, em caso de insucesso da empresa.Isto porque “uma vez integralizado todo o capital da sociedade, os credores sociais não poderão executar seus créditos no patrimônio particular dos sócios. Preservam-se os bens deste, assim, em caso de falência da limitada78”. Desta forma, explica Almeida79, que nestas sociedades [...] cada sócio assume para com a sociedade a obrigação fundamental de contribuir com o valor de sue quota-parte, para com a constituição do capital social. Contudo, todos os sócios têm a responsabilidade solidária pelo total do capital social, como enfatiza o art. 1.052 do N. Código Civil [...]. 76 COELHO, Fábio Uhoa. Manual de Direio Comercial. p.157. 77 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Manual de Direito Comercial. p. 195. 78 COELHO, Fábio Uhoa. Manual de Direio Comercial. p.153. 79 ALMEIDA, Amador Paes de. Manual da Sociedades Comerciais: Direito de Empresa. p.126. 42 A segunda característica, acima destacada de Fazzio Júnior, diz respeito a livre vontade nas relações entre os sócios, sem os rigores e as complexidades legais adotadas para as sociedades anônimas, até mesmo porque em sendo a limitada uma sociedade contratual. Assim “a sociedade limitada tem como nota predominante uma elástica margem de liberdade de estruturação, principalmente, em cotejo com a burocrática formatação das companhias [...]80”. Importante ressaltar que as sociedades limitadas são caracterizadas como sociedades híbridas, uma vez que possuem características de sociedades de pessoas e de sociedades de capital. Discorre Almeida81 com propriedade ao explicar esta característica das sociedades limitadas: Constitui-se por simples contrato, tal como as sociedades de pessoas. Nela assume especial relevo o relacionamento pessoal entre os sócios, traço inequivocadamente marcante das sociedades de pessoas Por outro lado, tal qual as sociedades de capital, atribui aos sócios responsabilidade limitada, podendo, outrossim, prever a aplicação supletiva de normas da sociedade anônima. [...]. Distingue-se sobremaneira das demais espécies de sociedades, circunstâncias que autorizam defini-la como sociedade híbrida, isto é, nem de pessoas nem de capital, mas composta de elementos comuns a ambas. No que tange a legislação aplicável as sociedades limitas, estas estão regulamentadas pelos arts. 1.052 a 1.087 do Código Civil brasileiro de 2002, de modo que “naquilo que tais disposições legais forem omissas, aplicar- 80 FAZZIO JUNIOR, Waldo. Manual de Direito Comercial. p.195-196. 81 ALMEIDA, Amador Paes de. Manual da Sociedades Comerciais: Direito de Empresa. p.142- 143. 43 se-á as normas da sociedade simples82, salvo se o contrato social prever a regência supletiva da sociedade limitada pelas normas da sociedade anônima83”. A administração das limitadas poderá ser exercida por um ou mais sócios, além de pessoas não sócias, mediante designação no contrato social. Com efeito, estabelece o art. 1.061 que o contrato social poderá permitir administradores não sócios, sendo que, sua designação depende de unanimidade dos sócios enquanto o capital social ainda não estiver integralizado, e de dois terços, no mínimo, após a integralização do total do capital social84. Destaca-se ainda, que as sociedades limitadas podem adotar como nome empresarial a forma de firma ou denominação. Quando optar pela firma, esta deverá ser composta pelo nome de um, de alguns ou todos os sócios, seguidos da expressão “limitada”. Já na forma de denominação,pode constituir-se também com o nome de um dos sócios ou por fantasia, devendo constar, necessariamente, o objeto da sociedade, conforme preceitua o § 2º do art. 1.158 do Código Civil brasileiro de 2002, além da expressão “limitada”. Assim, verifica-se que a legislação brasileira possui clara a definição de empresa, sendo esta atividade econômica organizada, através do empresário, de forma profissional. A empresa pode ser exercida por empresário ou sociedade empresaria, sendo que há alguns tipos de sociedades empresárias regulamentas no Brasil. Ocorre que, quando estas empresas encontram-se em crise financeira, faz-se necessário que mecanismos entre em ação, a fim de evitar seu colapso. Para tanto, nossa legislação criou um mecanismo legal que dispõe acerca desta reorganização da empresa em crise, e que será objeto de analise do próximo capítulo. 82 É aquela sociedade não exercente de atividade econômica organizada para a produção ou circulação de bens e serviços, se dedicando a atividade econômica civil, quais sejam as sociedades de profissionais intelectuais ou dedicadas à atividade rural sem registro na Junta Comercial. (Coelho, 2007, p. 111) 83 BERTOLDI, Marcelo M. Curso Avançado de Direito Comercial: teoria geral do direito comercial, direito societário. p.215. 84 Idem, p.217-218. 44 CAPÍTULO 2 RECUPERAÇÃO DE EMPRESAS 2.1 HISTÓRICO Ao analisar a origem do instituto da Recuperação de Empresas, faz-se necessário uma breve consideração aos institutos da falência e da concordata, visto que destas surgiu à necessidade de criar outros mecanismos àqueles considerados insolventes, culminando no instituto objeto deste trabalho. A falência é um antigo instituto ligado as obrigações, que nos primórdios, possuía claro caráter punitivo, fazendo com que o falido fosse considerado infame e exposto a degradação pública. Segundo Almeida85 seu nascimento está atrelado ao direito romano através do concurso de credores, vindo a ser efetivamente disciplinada na Idade Média com a expansão do comércio terrestre e marítimo. Justamente nesta fase ela é vista como um delito, impondo-se aos falidos penas de prisão até mutilação, motivo este da expressão falência, do verbo latino fallere, que significa enganar, falsear. Superada esta fase, ainda segundo o mesmo autor86 tendo a falência não mais como um delito, mas como um processo de execução patrimonial, distinguindo bons e maus pagadores, buscou-se evitar as danosas conseqüências da quebra, ou seja, da falência aos bons pagadores, por meio da chamada moratória, que seria a dilação das obrigações do devedor para eventual solvência, que nada mais foi do que a antecessora da conhecida concordata. A principal finalidade do instituto da concordata era proteger o devedor honesto, que por motivos diversos se encontrava endividado, da 85 ALMEIDA, Amador Paes de. Curso de falência e recuperação de empresa. 22 ed. São Paulo: Saraiva 2006. p. 6. 86 Idem, p. 297. 45 falência, e conseqüentemente de seus drásticos resultados. Assim, afirma Almeida87: A concordata, com efeito, pondo fim, a uma série interminável de abusos, constituiu-se na solução jurídica destinada a salvar o empresário dos percalços da falência, consistindo, naquela oportunidade, o meio eficaz para assegurar a sobrevivência da empresa, considerada, nos dias atuais, verdadeira instituição social [...]. A concordata originou-se no direito romano, consolidando-se também na Idade Média, embora o direito já abrigasse vários institutos jurídicos que buscavam a composição entre o devedor e seu credor realizando, de certa forma, a recuperação econômica. No direito brasileiro, destaca Almeida88 que a primeira concordata a ser introduzida foi “a concordata suspensiva, assim denominada aquela concedida no decorrer do processo falimentar, quando era restituída ao falido a livre administração dos seus bens”. Neste sentido, o Código Comercial de 1850, hoje revogado, dispunha em seu art. 847: Para ser válida a concordata suspensiva da falência, exige- se que seja concedida por um número tal de credores que represente pelo menos a maioria destes em número, e dois terços no valor de todos os créditos, sujeitos ao efeito da concordata. Assim, a concessão da concordata no antigo artigo disponha que esta somente seria concedida, em havendo a concordância dos credores, característica marcante deste instituto à época. Todavia, em 1890 o Decreto n. 917, trouxe ao direito brasileiro a concordata preventiva que, conforme o nome mesmo prediz, era 87 ALMEIDA, Amador Paes de. Curso de falência e recuperação de empresa, p. 298. 88 Idem, p. 299. 46 aquela requerida preventivamente, a fim de evitar a decretação da falência. A concordata preventiva era dividida em duas especiais: a extrajudicial e a judicial. Como os nomes mesmos já indicam a concordata extrajudicial era aquela firmada extrajudicialmente entre devedor e credores, com a posterior homologação judicial e a concordata judicial era aquela que desde o início era levado em juízo, por isso claramente judicial. A Lei n. 2.024 de 17 de novembro de 1902, consolidou de vez as concordatas preventivas e suspensivas, excluindo-se a concordata preventiva extrajudicial. Todavia, o Decreto-lei n. 7.661 de 21 de junho de 1945, a antiga Lei de Falências, alterou profundamente a lei 2.024, que pôs fim a exigência da aprovação dos credores, adotando a concordata, a partir desta data, caráter de favor judicial concedido pelo juiz. Almeida89 destaca que: Independente da vontade dos credores, desde que atendidas às exigências legais, poderia o devedor comerciante obter sua concordata e, com o seu integral cumprimento, restabelecer seus negócios, recuperando o indispensável equilíbrio econômico-financeiro para a continuidade da atividade negocial. Desta forma, a concordata constituía-se na única possibilidade jurídica para salvar a empresa, demonstrando a importância em que operou o instituto, que, todavia, ao passar dos tempos, necessitou de sucessíveis alterações, numa evolução gradativa, que resultou no surgimento da recuperação judicial90. Analisando a recuperação de empresas, um pouco mais detalhado em sua origem, constata-se que bem antes da edição da atual Lei de Falências, já se propunha meios de recuperar ou salvaguardar as empresas. 89 ALMEIDA, Amador Paes de. Curso de falência e recuperação de empresas. 2006. p. 300. 90 Idem, p. 299. 47 Em sua obra, Ronconi91 destaca que, embora, muitos doutrinadores manifestam-se sobre a sua origem a partir da Segunda Guerra Mundial, onde as conseqüências da guerra geraram uma forte queda das empresas, de modo que os governos das nações atingidas por estes efeitos buscassem mecanismos para o reerguimento das empresas e de suas economias, ela remonta a épocas anteriores a este período. Ressalta ademais o autor92, que conforme se infere da obra de Requião, o instituto da recuperação de empresas não é inovação no sistema brasileiro, sendo de certo um reavivamento já estudado anteriormente. Cita como exemplo da busca pela recuperação no ordenamento jurídico brasileiro, o Alvará de 1756, outorgado no ano posterior ao terremoto que assolou Lisboa, gerando desorganização e ruína do comércio e da navegação desta cidade, revendo as Ordenações Filipinas, no que tratava da matéria. No passar do tempo, as Leis foram sendo aprimoradas até o aparecimento da concordata, por exemplo, que foi uma busca pela recuperação de empresa, conforme se verificou no tópico anterior.
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