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Conceito de D Const

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FACULDADE JOAQUIM NABUCO. CONSTITUCIONAL I. PROF. JOÃO PAULO CAVALCANTI Página 1 
 
BACHARELADO EM DIREITO 
DIREITO CONSTITUCIONAL I 
PROFESSOR: JOÃO PAULO LIMA CAVALCANTI 
 
 
O DIREITO CONSTITUCIONAL 
 
 
1. CONCEITO DE DIREITO CONSTITUCIONAL 
 
 
No seu conceito clássico, de inspiração liberal, o Direito Constitucional tem 
basicamente por objeto determinar a forma de Estado, a forma de governo e o 
reconhecimento dos direitos fundamentais, segundo Esmein. 
 
Entendendo que o Direito Constitucional pode, em resumo, definir-se como o 
ordenamento supremo do Estado, Santi Romano postula, do ponto de vista material, a 
equivalência dos termos Constituição e Direito Constitucional. Igual concepção 
sustentou Maurice Duverger ao definir o Direito Constitucional pela natureza das 
instituições, ou seja, com aquele que estuda a organização geral do Estado, se regime 
político e sua estrutura governamental. 
 
Em suma, o estabelecimento de poderes supremos, a distribuição da competência, a 
transmissão e o exercício da autoridade, a formação dos direitos e das garantias 
individuais e sociais são objeto do Direito Constitucional contemporâneo. Revela-se 
este mais pelo conteúdo das regras jurídicas – a saber, pelo aspecto material – do que 
por efeito de aspectos ou considerações formais, dominantes historicamente, 
conforme veremos, no constitucionalismo do Estado liberal, ponto de partida que foi 
para a sistematização dessa importantíssima disciplina do conhecimento jurídico. 
 
 
2. A ORIGEM E A CRISE DO DIREITO CONSTITUCIONAL 
 
 
A origem da expressão Direito Constitucional, consagrada há cerca de um século, 
prende-se ao triunfo político e doutrinário de alguns princípios ideológicos na 
organização do Estado moderno. Impuseram-se tais princípios desde a revolução 
francesa, entrado a inspirar as formas políticas do chamado Estado liberal, Estado de 
direito ou Estado constitucional. 
 
Consubstanciava-se numa idéia fundamental: a limitação da autoridade governativa. 
Tal limitação se lograria tecnicamente mediante a separação de poderes (funções 
legislativa, executivas e judiciárias distribuídas em órgãos distintos) e a declaração de 
direitos. 
 
O poder, segundo o constitucionalismo liberal, deveria mover-se, por conseguinte, em 
órbita específica, a ser traçada pela Constituição. Com o emprego do instrumento 
constitucional, aquela concepção restritiva da competência dos órgãos estatais se fez 
dominante. No entanto, encobria ela, em profundidades invisíveis, desde o início, a 
idéia-força de sua legitimidade, que eram os valores ideológicos, políticos, doutrinários 
ou filosóficos do pensamento liberal. 
 
O liberalismo fez, assim, com o conceito de Constituição aquilo que já fizera com o 
conceito de soberania nacional: um expediente teórico e abstrato de universalização, 
nascida de seus princípios e dominada da historicidade de seus interesses concretos. 
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De sorte que, exteriormente, a doutrina liberal não buscava inculcar a sua 
Constituição, mas o artefato racional e lógico, aquele que a vontade constituinte 
legislava como conceito absolutamente válido de Constituição, aplicável a todo o 
gênero humano, porquanto iluminado pelas luzes da razão universal. 
 
A noção jurídica e formal de uma Constituição tutelar de direitos humanos parece, no 
entanto, constituir a herança mais importante e considerável da tese liberal. Em outras 
palavras: o princípio das Constituições sobreviveu no momento em que foi possível 
discernir e separar na Constituição o elemento material de conteúdo (o núcleo da 
ideologia liberal) do elemento formal das garantias (o núcleo de um Estado de Direito). 
Este, sim, pertence a razão universal, traz a perenidade a que aspiram as liberdades 
humanas. 
 
A França, durante a expansão napoleônica, comunicara à Itália os princípios da 
Revolução. Eram os princípios de uma sociedade política fundada sobre o contrato 
social, de uma ordem jurídica apoiada na razão humana, de um Estado que se curvara 
à liberdade individual. Criação dileta das ideologias absolutistas. 
 
Guizot, ministro de instrução Pública, determinou, em 1834, na Faculdade de Direito 
de Paris, a instalação da primeira cadeira de Direito Constitucional. Cometeu-a a um 
professor italiano, Pelegrino Rossi, de Bolonha, especialista na matéria. Da França o 
Direito Constitucional se trasladou a outros países, tornando-se uso corrente no 
vocabulário político dos últimos cem anos, período em que passou a designar o estudo 
sistemático das regras constitucionais. 
 
Verifica-se, porém, que, ao instituir aquele ensino, Guizot tinha, seguramente, 
estabelecido o método e o conteúdo da disciplina recém criada, concentrando-a ao 
redor de um texto – a Constituição – e de uma filosofia política – o liberalismo. 
 
Assim como o Direito Privado ganhara com a Revolução o Código de Napoleão, o 
Direito Público, graças a Guizot, ganhara com a Constituição aquele que, de futuro 
seria o mais importante ramo da Ciência Jurídica: o Direito Constitucional de 
características doutrinárias definidas. Um Direito Constitucional que aspirava a dar ao 
Estado as bases permanentes de sua organização, segundo as correntes de 
pensamento jurídico, individualista e liberal, tomado então por definitivo, absoluto, 
eterno, imutável. 
 
Cumpria, por conseguinte, distinguir, de acordo com as correntes do pensamento 
liberal-burguês, duas modalidades de Constituição: uma verdadeira, legítima, “jurídica, 
e outra meramente “sociológica” ou fática, reprovada pela consciência jurídica, e que 
caracterizaria os Estados Absolutistas e despóticos. 
 
Manifestou-se de maneira forte esse sentimento confinador do poder do Estado 
através de uma Constituição que, ao lavrarem o primeiro documento constitucional 
produzido pela Revolução Francesa, seus autores inseriram no art. 16 a disposição de 
que “toda sociedade na qual não esteja assegurada a garantia dos direitos nem 
determinada a separação de poderes não possui Constituição”. 
 
O Direito Constitucional era, então, o direito da Constituição, direito dos “povos livres”, 
referindo a determinado texto, ou seja, a um conjunto de instituições, regidas pela 
“firma representativa”, sob a inspiração do liberalismo, daquela doutrina que diminuía 
ou confinava os poderes do Estado. 
 
Tendo, historicamente, por base a filosofia jurídica do regime liberal, o Direito 
Constitucional acompanhou a crise do velho Estado burguês, até tomar uma nova 
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configuração conceitual, mais jurídica do que filosófica, com a neutralização, para o 
estudioso ou pesquisador, dos valores aderentes às instituições, objeto daquela 
disciplina: valores, por conseguinte, já de nenhuma interferência na caracterização da 
Constituição ou do Direito Constitucional. Esse Direito Constitucional professadamente 
científico ou apolítico, o Estado liberal só o reconheceu depois que seus juristas 
haviam, com a máxima tranqüilidade, cimentado um Estado de direito fora de todas as 
contestações contra-revolucionárias do absolutismo. 
 
O período seguinte teve um desdobramento constitucional cuja corrente a doutrina 
liberal não logrou interromper. A Constituição, que já deixara de assimilar-se genérica 
e exclusivamente a uma certa forma de organização política – a do liberalismo 
individualista e sua ideologia – passou, doravante, numa acepção mais larga e 
precisa, a representar o espelho real de toda e qualquer organização política. 
 
Pôde, assim, se converter, segundo a observação aguda de Burdeau, naquele “canal 
por onde o Poder passa de seus titular, o Estado, para seus agentes de exercício – os 
governantes”. 
 
Ampliou-se e até certo ponto neutralizou-se, consequentemente, o sentido do 
conteúdoconstitucional, desatado, a seguir, de quaisquer considerações doutrinárias 
ou ideológicas. 
 
As regras fundamentais de estruturação, funcionamento e organização do poder, não 
importa o regime político nem a forma de distribuição da competência aos poderes 
estabelecidos, são, por conseguinte, a matéria do Direito Constitucional. De modo que 
todo o Estado ou toda a sociedade politicamente organizada possui, como já 
assinalava Lassalle, uma Constituição ou um Direito Constitucional. 
 
Aquela acepção de fundo racionalista e normativista, decorrente, historicamente, do 
domínio político da classe burguesa ao colher os primeiros frutos de sua vitória sobre 
os Estados da monarquia absolutista e sua respectiva organização de poder, cedeu 
lugar, hoje, a uma concepção mais ampla e verdadeira de um Direito Constitucional 
político, sem ser, porém, contra ou a favor das instituições que abrange ou encerra. 
 
O Direito Constitucional deixa de ser, portanto, o que fora no século XIX: na doutrina, 
uma filosofia do Direito; na prática, uma espécie de direito público do liberalismo. 
 
Ao termo de suas mais recentes transformações, alcançou ele o grau de autêntica 
Ciência Jurídica: a ciência das normas e instituições básicas de toda e qualquer 
modalidade de ordenamento político. 
 
 
3.DIREITO CONSTITUCIONAL GERAL, DIREITO CONSTITUCIONAL ESPECIAL E 
DIREITO CONSTITUCIONAL COMPARADO 
 
 
Abrange o Direito Constitucional várias Ciências Jurídicas que, ao lado de outras não 
jurídicas, como a Ciência Política, compõem o elenco de matérias que se ocupam do 
ordenamento constitucional do Estado. Essas Ciências Jurídicas integrantes do Direito 
Constitucional em sua máxima amplitude são: o Direito Constitucional Especial, o 
Direito Constitucional Comparado e o Direito Constitucional Geral. 
 
Direito Constitucional Especial – O Direito Constitucional Especial trata do Direito de 
um determinado Estado; a saber, da organização e funcionamento dos poderes 
constitucionais. É disciplina de caráter jurisprudencial, pertence ao Direito Positivo, e 
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tem por objeto a análise de uma Constituição nacional ou estrangeira, exposta e 
interpretada de forma dogmática e com fins programáticos. 
 
Direito Constitucional Comparado – O Direito Constitucional Comparado tem por 
objeto não uma só Constituição, mas uma pluralidade de Constituições. Resulta, 
assim, do cotejo de normas constitucionais de diferentes Estados, mediante critérios 
variáveis. 
 
Um desses critérios consiste em confrontar no tempo as Constituições de um mesmo 
Estado, observando-se em épocas distintas da evolução constitucional, a semelhança 
e discrepância das instituições que o Direito Positivo haja conhecido. 
 
Outro critério de adoção cabível é o da comparação do Direito no espaço, com análise 
às Constituições de vários Estados, vinculados estes, de preferência, a áreas 
geográficas contíguas. 
 
Direito Constitucional Geral – o Direito Constitucional Comparado tem por escopo o 
exame das regras constitucionais de uma multiplicidade de ordenamentos jurídicos. 
Daqui extrai ele, com referência ao poder, e independente das contingências do tempo 
e lugar uma série de princípios, indagações, conceitos e categorias que, unificados 
teoricamente, poderão compor uma teoria geral de caráter científico. 
 
O Direito Constitucional Especial, o Direito Constitucional Comparado e o Direito 
Constitucional Geral guardam entre si inumeráveis pontos de contato e interpretação. 
Não se devem tomar por disciplinas rigorosamente separadas. 
 
 
4. AS RELAÇÕES DO DIREITO CONSTITUCIONAL COM OUTRAS CIÊNCIAS 
 
 
Divide-se o Direito Público em duas partes fundamentais: o Direito Público externo 
(Direito Internacional) e o Direito Público interno. O primeiro regula relações entre 
Estados, o segundo marca a extensão da ordem jurídica relativamente a um 
determinado Estado. 
 
A disciplina básica do Direito Público interno é o Direito Constitucional, que fixa 
normas fundamentais da organização jurídica e condiciona, debaixo de seus 
princípios, os demais ramos do Direito Público, com os quais se relaciona. 
 
 
4.1 O DIREITO CONSTITUCIONAL E O DIREITO ADMINISTRATIVO 
 
 
Das ciências do Direito Público, aquela que se apresenta mais afim ao Direito 
Constitucional é, indubitavelmente, o Direito Administrativo. 
 
O Direito Constitucional relaciona-se com a estrutura e as regras gerais que regulam a 
função, enquanto o Direito Administrativo trata dos detalhes da função. Há, por 
conseguinte, a diferença de grau e não de espécie, de conveniência e não de lógica. 
 
Frisa-se que as Constituições, em geral, trazem princípios básicos do Direito 
Administrativo. Haja vista, a esse respeito, a Constituição brasileira, que contém 
disposições de Direito Administrativo, como as concernentes à desapropriação por 
necessidade ou utilidade pública ou interesse social (arts. 182, 184 e 185), as que 
estabelecem os poderes ou atribuições do Presidente da República e dos Ministros de 
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Estado (arts. 84 e 87, parágrafo único), bem como aquelas pertinentes à 
Administração Pública, definindo o regime jurídicos dos servidores públicos civil e 
militares, e as referentes à constitucionalização administrativa das Regiões, que se 
acham contidas nas quatro seções do Capítulo VII do Título III, relativo à organização 
do Estado (do art. 37 ao 43). São ainda, de teor administrativo as que traçam a 
competência tributária dos Municípios e lhes concedem autonomia, disciplinando 
aspectos da vida municipal (arts. 30 e 31). 
 
 
4.2 DIREITO CONSTITUCIONAL E O DIREITO PROCESSUAL 
 
 
Vários princípios da Constituição vinculam, em nosso País, os dois ramos do processo 
– o civil e o penal – ao Direito Constitucional. 
 
Com o Direito Civil, esse vínculo se declara na concessão, pelo Poder Público, de 
assistência judiciária aos necessitados (art. 5º, LXXIX), no direito de petição aos 
Poderes Públicos contra abusos de autoridades (art. 5º, XXXIV, a) e no chamado 
direito de ação popular em defesa do patrimônio de entidades públicas contra atos que 
lhe sejam lesivos (art. 5º, LXXII). 
 
Com o Direito Judiciário Penal a relação é manifesta quando a Constituição protege a 
liberdade individual contra abusos de poder, a prisão ou detenção ilegal, regula o 
habeas corpus, assegura aos acusados ampla defesa e faz contraditória a instrução 
criminal (art. 5º, III, LXI, LXII, LXIV, LXV, LXVI, LXVIII). 
 
Dispõe ainda, a Constituição sobre as bases de organização do Poder Judiciário, 
institui o recurso extraordinário, seu cabimento e julgamento no âmbito de 
competência do STF (art. 102, III, a, b, c) bem como rodeia o processo das 
necessárias garantias constitucionais. 
 
 
4.3 O DIREITO CONSTITUCIONAL E O DIREITO DO TRABALHO 
 
 
São numerosos os dispositivos constitucionais que inserem princípios de proteção aos 
trabalhadores, consagrando admiráveis conquistas sociais da classe obreira. Medite-
se, a esse respeito, no sindicato livre, no direito de greve, na Previdência Social, no 
salário mínimo, no repouso semanal remunerado, na participação obrigatória nos 
lucros da empresa etc (arts. 6º, 7º, 8º e 9º, CF/88). 
 
 
4.4 O DIREITO CONSTITUCIONAL E O DIREITO FINANCEIRO E TRIBUTÁRIO 
 
 
A esfera do Direito Financeiro e Tributário também não ignora o Direito Constitucional, 
que alí faz presente com suas normas básicas de administração das finanças e 
distribuição da competência tributária no organismo estatal. 
 
 
4.5 DIREITO CONSTITUCIONAL E O DIREITO INTERNACIONAL 
 
 
Duas tendências observadas no campo institucional e que alguns publicitas (Gonzales, 
Arinos etc.) compendiam numa terminologia bastante clara e adequada – a 
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internacionalização do Direito Constitucional e a constitucionalização do Direito 
Internacional – são suficiententemente fortes para inculcar o grau de influência mútua 
verificada entre as mencionadas disciplinas. 
 
A primeira tendência afirma-se na recepção de preceitos de Direito Internacional por 
algumas constituições modernas, que incorporam e chegam até a integrar o Direito 
externo na órbita interna. 
 
A segunda tendência – constitucionalização do Direito Internacional – é, talvez, mais 
recente. Manifesta-se través de inspiração que a ordem constitucional oferece aos 
internacionalistas, abraçados com fervor à idéia de uma implantação de uma 
comunidade universal de Estados, devidamente institucionalizada. 
 
A Carta da ONU (Organização das Nações Unidas) é desses documentos que 
sugerem a imitação, ainda um tanto rude, do modelo constitucional, como se estivesse 
a criar nos três órgãos básicos – Assembléia Geral, o Conselho de Segurança e a 
Corte de Justiça, respectivamente – a imagem dos três Poderes: o Executivo, o 
Legislativo e o Judiciário, que distinguem, com seu perfil característico, a organização 
do Estado Moderno. 
 
Dez princípios básicos estabelecidos pela Constituição de 1988 serão observados na 
condução das relações internacionais da República Federativa do Brasil, a saber: 
independência nacional, prevalência dos direitos humanos, autodeterminação dos 
povos, não intervenção, igualdade entre Estados, defesa da paz, solução pacífica dos 
conflitos, repúdio ao terrorismo e ao racismo, cooperação entre os povos para o 
progresso da humanidade e concessão de asilo político (art. 4º, I ao X). 
 
 
4.6 DIREITO CONSTITUCIONAL E O DIREITO PRIVADO 
 
 
Tanto os demais ramos do Direito Público como todo o Direito Privado se acham em 
posição de inferioridade e sujeição – nunca de igualdade e coordenação- em face do 
Direito Constitucional. É este que, privilegiadamente, encabeça o ordenamento 
jurídico, traçando as regras básicas do sistema normativo. 
 
Interesses, há menos de meio século, reputados exclusivamente individuais e 
aparentemente intangíveis tomaram, como efeito, sua ordenação subsequente pelo 
Direito Constitucional. 
 
Assim se deu com o direito de propriedade e certos direitos civis atinentes à família, 
objeto de minuciosa regulamentação constitucional, com marcado cunho social. O 
amparo às famílias de prole numerosa, a questão do divórcio, o problema dos filhos 
ilegítimos, em alguns países já transcenderam em matéria constitucional. Atente-se ao 
caso da EC 9, de 18/06/1977, que instituiu o divórcio no Brasil, bem como do §6º do 
art. 226 da CF vigente. 
 
Na Constituição brasileira a propriedade e a família mereceram todo o desvelo do 
legislador constituinte. A propriedade aparece com destaque na matéria sobre a ordem 
econômica e social. A função social da propriedade é afirmada como um dos 
princípios constitucionais sobre os quais se assenta a sobredita ordem (art. 5º, XXIII e 
art. 170, III). A propriedade privada, observados os ditames da justiça social, é erigida 
também pelo princípio da ordem econômica (art. 170, II). A família fez-se por igual, 
objeto de ampla proteção dos Poderes Públicos por preceitos expressos da 
Constituição contidos nos arts. 226, 227, 228, 229 e 230. 
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4.7 DIREITO CONSTITUCIONAL E A CIÊNCIA POLÍTICA 
 
É com a Ciência Política, fora as Ciências Jurídicas, que o Direito Constitucional 
matém mais estreitos vínculos. Se alguns constitucionalistasfazem o Direito 
Constitucional inseparável do Direito Administrativo, outros entendem uni-lo de 
maneira particular e profunda à Ciência Política. 
 
 
2. AS FONTES DO DIREITO CONSTITUCIONAL 
 
 
Seguindo aproximadamente as classificações de Xinfra Heras e Biscaretti di Ruffia, em 
que as fontes aparecem como formas de manifestação da norma jurídica, podemos, 
no Direito Constitucional, distinguir duas modalidades de fontes: as escritas e as não-
escritas. 
 
As fontes abrangem: a) as leis constitucionais; b) as leis complementares ou 
regulamentares – figura especial de leis ordinárias que servem de apoio à Constituição 
e fazem com que numerosos preceitos constitucionais tenham aplicação; c) as 
prescrições administrativas, contidas em regulamentos e decretos, de importância 
para o Direito Constitucional, desde que, recebendo a delegação de poderes, entre o 
governo no exercício da delegação legislativa; d) os regimentos das Casas do Poder 
Legislativo, ou do órgão máximo do Poder Judiciário (o caso concreto referido pelo 
professor Afonso Arino da relevância desses documentos quando se deu pelo TSE a 
cassação do registro do Partido Comunista Brasileiro); e) os tratados internacionais, as 
normas de Direito Canônico, a legislação estrangeira, as resoluções da comunidade 
internacional pelos seus órgãos representativos, sempre que o Estado os aprovar ou 
reconhecer; f) a jurisprudência, não obstante o caráter secundário que as normas aí 
revestem, visto que, a rigor, a função jurisprudencial não cria Direito vigente (sua 
importância constitucional é, todavia, extraordinária, atestada pelo exemplos dos EUA, 
onde as sentenças da suprema corte, integram quase metade da Constituição); g) e, 
finalmente, a doutrina, apalavra dos tratadistas, a lição dos grandes mestres, que 
desde Savigny se reputa uma das fontes de Direito, com caráter auxiliar de fonte 
instrumental ou de conhecimento, e não propriamente de fonte técnica. 
 
Quanto às fontes não-escritas, são, essencialmente duas: o costume e os usos 
constitucionais. 
 
O costume forma-se quando a prática repetida de certos atos induz uma determinada 
coletividade de crença ou convicção de que esses atos são necessários ou 
indispensáveis. 
 
Funda-se, pois, o costume no consentimento tácito que o uso reiterado autoriza. Sua 
importância no Direito Constitucional é imensa. Autores, como Duvenger, chegam a 
admitir que não somente completa como modifica a Constituição. Heras entende que o 
costume constitucional guarda traços peculiares, e estes ordinariamente não 
acompanham as demais normas de Direito Consuetudinário. Tais traços vêm a ser: a) 
a criação pública, pelos instrumentos da autoridade, e não pelos particulares, 
contrastando a publicidade do costume constitucional com o anonimato de que a 
tradição reveste o costume do Direito Privado; b) a racionalidade, pois o costume 
constitucional é mais racional do que tradicional e nele a prática cede à convicção 
jurídica e o fato à intenção; c) a brevidade, uma vez que o costume se afirma como tal 
em espaço mais curto de tempo; d) a flexibilidade, oriunda da natureza política ou do 
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conteúdo do costume constitucional, relativo sempre a questões públicas 
fundamentais. 
 
Os usos constitucionais compõem, enfim, a segunda categoria das fontes não-
escritas. Sua relevância é maior nos países desprovidos de Constituição escrita ou 
que possuem textos sumários. No caso da Inglaterra, certos usos, como a dissolução 
dos Comuns, a convocação do Parlamento, constituem matéria constitucional de suma 
importância. Igual fenômeno verifica-se nos EUA, onde as convenções partidárias e 
algumas práticas de funcionamento do Poder Executivo se assentam tão-somente em 
usos constitucionais, cuja importância fica, assim, sobejamente demonstrada. 
 
Debate-se, do ponto de vista doutrinário, qual a natureza desses fatos, se pertencem 
ou não à esfera jurídica, se engendram ou não normas de Direito ou se constituem 
apenas meras praxes convencionais que a tradição, a moral, a convenção e a cortesia 
autorizam ou aconselham. 
 
Constitucionalistas franceses (Hauriou, Burdeau) admitem a caráter jurídico dos usosconstitucionais, equiparando-os a verdadeiras regras de Direito, ao passo que os 
constitucionalistas ingleses se mostram mais prudentes, manifestando a esse respeito 
fortes dúvidas, quando não aderem de plano ao ponto de vista de Dicey, que recusa 
categoricamente valor de preceitos jurídicos às “convenções” - por conseguinte, aos 
usos constitucionais, nomeadamente em razão de carecerem de aplicação ou 
reconhecimento judicial.

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