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Mineralogia I Universidade Federal do Rio Grande do Sul Instituto de Geociências Departamento de Mineralogia e Petrologia Versão 2010 2 SUMÁRIO 01. Bibliografia .................................................................................................... 03 02. Conceitos Gerais ............................................................................................ 05 03. Breves Tópicos da História de Mineralogia ................................................... 06 04. A Definição de Mineral .................................................................................. 08 05. Gênese dos Cristais......................................................................................... 10 06. Classificações de Minerais ............................................................................. 15 07. Estrutura dos Cristais...................................................................................... 18 08. Defeitos Cristalinos ........................................................................................ 22 09. Elementos Geométricos e de Simetria dos Cristais ........................................ 30 10. Classes e Sistemas Cristalinos........................................................................ 31 11. Formas Cristalinas ......................................................................................... 33 12. Leis Cristalográficas ....................................................................................... 38 13. Holoedria e Hemiedria ................................................................................... 39 14. Projeções Cristalográficas .............................................................................. 40 15. Notações Cristalográficas ............................................................................... 44 16. O Sistema Tetragonal ..................................................................................... 48 17. O Sistema Hexagonal ..................................................................................... 54 18. O Sistema Trigonal ......................................................................................... 58 19. O Sistema Cúbico ........................................................................................... 61 20. O Sistema Ortorrômbico................................................................................. 67 21. O Sistema Monoclínico .................................................................................. 71 22. O Sistema Triclínico....................................................................................... 73 23. Isomorfismo e Polimorfismo .......................................................................... 75 24. Simetria e Singonia......................................................................................... 76 25. Isotropia e Anisotropia ................................................................................... 77 26. Hábito ............................................................................................................. 78 27. Grau de Perfeição ........................................................................................... 78 28. Goniometria .................................................................................................... 79 29. Propriedades Físicas dos Cristais ................................................................... 81 30. Agrupamentos Cristalinos .............................................................................. 92 31. Imperfeições e Deformações..........................................................................100 32. Pseudomorfismo.............................................................................................102 33. Pseudosimetria................................................................................................103 34. O Microscópio Polarizador.............................................................................104 35. Indicatrizes Óticas..........................................................................................107 36. Observações a Luz Polarizada........................................................................110 37. Observações a Nicóis Cruzados.....................................................................114 38. Observações a Luz Convergente ...................................................................121 3 01. BIBLIOGRAFIA Para a disciplina de Mineralogia I não existe um livro-texto único. Os assuntos apresentados neste polígrafo aparecem normalmente na porção introdutória de livros de mineralogia que depois se dedicam a apresentar os minerais mais comuns formadores de rocha. Frequentemente estes livros de mineralogia usam notações cristalográficas diferentes e nomenclaturas diferentes, principalmente no tocante às formas geométricas dos cristais. Por isso, a bibliografia abaixo citada deve ser usada com certa cautela, nunca se prendendo a um único livro e evitando descobrir problemas onde não existem. Os principais e mais tradicionais livros-texto são: Dana, J.D. - 1959 - Dana's Manual of Mineralogy. Revised by C.S. Hurlbut. 7th Ed. John Wiley and Sons, Inc. NY. Dana, J.D. - 1969 - Manual de Mineralogia, revisto por C.S. Hurlbut Jr. Traduzido por Rui Ribeiro Franco. Ao Livro Técnico, SA. Flint, E. - 1965 - Princípios de Cristalografia. Editorial Paz. Moscou. Berry, L.G. & Mason, B. - 1959 - Mineralogy: Concepts, Descriptions, Determinations. W.H. Freeman and Co. San Francisco, California. Phillips, F.C.- 1956 - An Introduction to Cristallography - 2nd Ed.. Longman, Green and Co Ltd, London. Wahlstrom, E.E. - 1956 - Optical Crystallography - 3rd Ed. John Wiley & Sons, Inc. New York. Wahlstrom, E.E. 1960 - Cristalografia Ótica - Traduzido por Rui Ribeiro Franco. Ao Livro Técnico. Fujimori, S., e Ferreira, Y.A - 1985 - Introdução ao Uso do Microscópio Petrográfico – Editora da Universidade Federal da Bahia. Klockmann, E. & Ramdohr P. - 1947 - Tratado de Mineralogia. 2a ed. Editorial Gustavo Gili SA, Barcelona. Luna, I.R., 1955 – Cristalografia. Publicaciones de la Escuela Especial de Ingenieros de Minas, 2ª ed. Olsacher, J. – 1946 - Introduccion a la Cristalografia. Imprenta de la Universidad, Córdoba, Argentina. Lapadu-Hargues, P. – 1954 – Précis de Minéralogie. Masson et Cia, Éditeurs. 4 Winchell, A.N. – 1937 - Elements of Optical Mineralogy, John Wiley and Sons, Inc, London. A internet naturalmente se oferece com uma fonte inesgotável de informações e de excelentes imagens de minerais, bem como textos e apresentações de excelente qualidade a respeito de todos os assuntos tratados neste polígrafo. Com apenas três sites é possível cobrir grande parte das informações que os livros de mineralogia contêm: www.webmineral.com é um site indispensável, completo e constantemente atualizado sobre todas as espécies minerais que existem. www.mindat.org é especializado em fornecer as localidades em que os minerais já foram encontrados, com as respectivas referências bibliográficas. www.galleries.com fornece informações adicionais, com vários detalhes que os outros não discutem. Sites que fornecem um conjunto de informações sobre os colecionadores de minerais são, entre muitos outros, www.rockhounds.com, www.minerant.org e www.vfmg.de. Um site com material educacional é www.mii.org, e inúmeros outros podem ser úteis, dependendo do interesse individual. 5 02. CONCEITOS GERAISAs diferentes espécies minerais seguidamente se apresentam sob a forma de poliedros limitados por faces planas: os cristais. Cristal é definido como sendo "todo corpo que, ao passar do estado gasoso ou líquido ao estado sólido (sublimação ou solidificação), devido à ação de forças interatômicas, adquire uma ordenação estrutural de seus elementos e, por isso, manifestará uma forma poliédrica exterior". Portanto, a característica básica do estado cristalino é o arranjo ordenado dos elementos constituintes da matéria. Quando este arranjo ordenado não é alcançado, a matéria constituirá um corpo amorfo, de estrutura desordenada, à semelhança do vidro, sem forma exterior definida. Portanto, "o aspecto exterior depende do arranjo interno das moléculas constituintes”. A Cristalografia estuda os cristais e se divide em duas partes. A Cristalografia Geométrica "é a parte da ciência dos cristais que tem por objetivo o estudo da morfologia externa que estes apresentam e está inteiramente baseada na existência de elementos de simetria e em algumas leis fundamentais". A Cristalografia Ótica "é a parte da cristalografia que estuda as características dos minerais ao microscópio polarizador, no intuito de identificar as diferentes espécies minerais". A Mineralogia estuda os minerais, que se dividem em transparentes e opacos. A Petrografia descreve as rochas e a Petrologia estuda a origem das rochas. Um cristal, portanto, possui uma composição química definida e uma estrutura atômica definida. Alguns exemplos de espécies minerais comuns: quartzo - SiO2 pirita - FeS2 calcita - CaCO3 cassiterita - SnO2 halita - NaCl Devido à sua estrutura interna, muitos destes minerais apresentam propriedades importantes, que veremos a seguir. 6 03. BREVES TÓPICOS DA HISTÓRIA DA MINERALOGIA O registro mais antigo de mineralogia está no livro chinês San-Hey-Din, "Contos Antigos de Montanhas e Mares", datado de 500 AC, descrevendo 17 minerais, incluindo a maioria dos minerais nativos. Aristóteles (384-322 BC), filósofo grego, o mais importante e mais influente cientista natural da antiguidade, escreveu "Sobre as Pedras", o primeiro estudo científico do mundo mineral. Ao invés de especulações, ele fez observações precisas. Dividiu o Reino Mineral em "Metais" e "Fósseis". Segue-se Theoprastus, um filósofo grego, discípulo de Aristóteles, 372 a 287 AC, que escreveu o livro "Das Pedras", livro que é considerado o primeiro tratado específico sobre minerais, com 16 minerais descritos. Plínio, o Velho, 23-79, foi um almirante romano e cientista do século I que fez o primeiro comentário sobre forma cristalina e qualidade de faces cristalinas, no Volume XXXVII da "História Natural". Faleceu no ano de 79, durante uma erupção do vulcão Vesúvio. Al Biruni (Tadjiks Al Biruni), 972 a 1048, foi a primeira autoridade da história da Mineralogia que forneceu dados precisos sobre densidade e outras constantes físicas de 18 pedras preciosas e metais. Al Khazini foi outra autoridade da época. Avicena (Ibn Sîna), médico, filósofo e cientista de Chorasau (Usbequistão), 970 a 1037, separou, dos metais, uma divisão de minerais sulfúricos, melhorando o agrupamento dos minerais conhecidos. Seu agrupamento (Pedras, Minerais Sulfúricos, Metais, Sais) persistiu com pequenas variações por quase 8 séculos. Este foi seu grande mérito. Albertus Magnus, na realidade Albert von Bollstaedt (1193 a 1280), classificou os minerais em 3 classes: pedras, metais e misturas. Georg Bauer (Georgius Agrícola era seu nome latinizado) 1494 a 1555, médico de Chemnitz, distanciou-se da alquimia. Escreveu "De Natura Fossilium" em 1546 e "De Re Metallica" em 1556. São livros clássicos que reúnem os dados disponíveis à época sobre mineralogia, geologia, mineração e metalurgia. Foi o primeiro a distinguir entre minerais e rochas. Foi dele também a primeira teoria lógica sobre gênese mineral. Leonardo da Vinci foi autor, em 1502, de um Tratado Mineralógico sobre forma, grau de transparência, dureza, densidade, ocorrência e outros caracteres de minerais, incluindo avisos sobre como diferenciar pedras preciosas falsas de verdadeiras. Nesta época dominava na Europa a Alquimia que, entre muitos outros fatos, gerou a procura pela maneira de fazer ouro e a pedra filosofal. Nicolaus Steno, aliás Niels Stensen, dinamarquês, 1638 a 1686, elaborou um texto sobre a constância dos ângulos interfaciais do quartzo. A Lei da Constância dos Ângulos foi a 1ª Lei Fundamental da Cristalografia. Em 1669, na Florença, também reconheceu a anisotropia. Erasmus Bortholinus, 1625 a 1698, descreveu pela primeira vez o fenômeno da dupla refração, que descobriu na calcita da Islândia. Christian Huygens, 1629 a 1695, físico holandês, concluiu pela estrutura anisotrópica dos cristais. Romé de L´Isle, francês, 1736 a 1790, escreveu em 1772 uma descrição completa de todas as formas cristalinas conhecidas à época, usando em suas pesquisas, pela primeira vez, um goniômetro. Torbern Olaf Bergmann, sueco, 1735 a 1784, reconheceu na calcita a "decrescência das moléculas", que permitira calcular todas as faces possíveis em um cristal. 7 Renée Just Haüy, abade francês, 1743 a 1826, foi autor do "Traité de Mineralogie", versando sobre o significado da cristalografia no estudo dos minerais. Christian S. Weiss, 1780 a 1856, é autor da Lei dos Coeficientes Parametrais Racionais, sobre a possibilidade do cálculo exato das faces cristalinas. Com ela, tornou-se possível relacionar todas as relações parametrais das faces que ocorrem em um cristal. I. F. C. Hessel, em 1830, provou matematicamente que, no domínio dos cristais, só podem existir 32 classes cristalinas. M. A. Bravais, francês, 1811 a 1863, determinou em 1850 os 14 Retículos de Bravais, fundamentais para o estudo da estrutura da matéria. Axel Gadolin, russo, em 1867, escreveu sobre as 32 classes cristalinas possíveis. E. S. Fedorov, 1843 a 1919, em 1890 abordou as 230 formas cristalinas possíveis. A. M. Schönflies (1853 a 1928), em 1891 escreveu sobre o mesmo tema. Até aqui temos autores que escreveram especificamente sobre cristalografia. A partir daqui, temos aqueles autores que abordaram especificamente a química mineral. Após Agrícola, a evolução do estudo da química mineral evoluiu com Lomonossow (1711 a 1765), russo que fez análises químicas detalhadas dos mais variados minerais e reconheceu que o âmbar era uma resina vegetal fóssil. Abraham Gottlob Werner, 1749 a 1817, mineralogista da Saxônia, Alemanha, professor da Academia de Minas de Freiberg, achou que o basalto colunar era um cristal, devido à forma definida. Também achou que a origem de todos os tipos de rochas e minerais era a partir de águas superficiais, criando a escola dos "Werneristas". Esta escola se opôs aos "Netunistas", que achavam que tudo se originava a partir do interior da terra. Em 1774 foi autor de uma Sistemática Mineral baseada em 4 classes. Estabeleceu os fundamentos para uma sistemática mineral exata. James Hutton, escocês, 1726 a 1797, estabeleceu a "Teoria da Terra" em 1788, dando uma origem ígnea a tudo. Os "Huttonistas" eram, portanto, plutonistas. Breithaupt, 1791 a 1873, escreveu "A Paragênese dos Minerais", em Freiberg, em 1849, onde estabelece o conceito da paragênese mineral. J. J. Berzelius, 1779 a 1848, químico sueco, autor de "Noveau Système de Minéralogie" em 1819 e Eilhard Mitscherlich, 1794 a 1863, químico alemão, reconheceram a isomorfia e a polimorfia. W.H. Miller, inglês, 1801 a 1880, melhorou o goniômetro de reflexão de Wollastone introduziu os "indices de Miller" para nomear faces cristalinas. Viktor Goldschmidt, 1853 a 1933, melhorou ainda mais o goniômetro, estabelecendo os fundamentos para a moderna cristalografia. Friedrich Mohs, mineralogista austríaco, estabeleceu a "Escala de Mohs" em 1822. Henry Clifton Sorby, inglês, 1826 a 1909, descobriu a técnica de lâminas delgadas de rochas em 1858. Com isto, mudou toda a petrografia. James Dwight Dana, americano, 1813 a 1895, lançou seu Manual de Mineralogia em 1837, com uma sistemática mineral moderna, tornando-se indispensável para qualquer estudioso: o "Dana`s System of Mineralogy". 8 04. A DEFINIÇÃO DE MINERAL “Um mineral é um elemento ou composto químico que normalmente é cristalino e que é resultado de processos geológicos.” Esta definição é ampla o suficiente para incluir a grande maioria das substâncias geralmente aceitas como minerais. Algumas substâncias, entretanto, não se encaixam inteiramente nestes requisitos. Portanto temos que traçar uma linha divisória entre mineral e não-mineral, definindo quais exceções à regra devem ser permitidas. O termo “cristalino”, como usado geralmente em mineralogia, significa um ordenamento cristalino numa escala que possa produzir um padrão indexável de difração (isto é, com índices de Miller) quando a substância é atravessada por uma onda com um comprimento adequado (raios-x, elétrons, nêutrons, etc.). Entretanto, algumas substâncias de ocorrência natural não são cristalinas. Tais substâncias podem ser divididas em duas categorias: - amorfas, que são aquelas substâncias que nunca foram cristalinas e que não difratam raios-x nem elétrons, e - metamictas, que são aquelas substâncias que já foram cristalinas, mas cuja cristalinidade foi destruída por radiação. Há certa relutância, por parte de alguns mineralogistas, de aceitar substâncias amorfas como minerais devido à impossibilidade de caracterizá-las completamente, mas algumas substâncias amorfas foram aceitas como minerais pela Comissão Internacional responsável pela análise e nomenclatura dos novos minerais propostos (CNMMN). As bases para a aceitação de uma fase amorfa de ocorrência natural como um mineral poderiam ser: - uma série de análises químicas quantitativas completas suficientes para revelar a composição química de todas as partículas do espécimen, - informação físico-química (geralmente por espectroscopia) que prove que a fase é única, e - evidência de que o material não pode produzir um padrão de difração “indexável”, tanto em estado natural como depois de tratamento por algum processo físico-químico em estado sólido, como por exemplo por aquecimento. Um caso especial de substâncias não-cristalinas de ocorrência natural são aquelas que são líquidas em condições normais de temperatura e pressão: a água não é considerada cristalina, mas sua forma sólida, o gelo, o é. O mercúrio, no entanto, é reconhecido como um mineral mesmo não ocorrendo em estado cristalino na Terra. O petróleo e suas manifestações betuminosas não-cristalinas não são consideradas minerais. Há vários casos especiais a considerar com conceito de “mineral”: 1) Estabilidade sob condições ambientais Muitos minerais foram formados em condições de alta temperatura e pressão (ou ambas) e são meta-estáveis sob condições ambientais, outras tendem a hidratar ou desidratar quando retiradas de seu lugar de origem. Tais minerais podem requerer 9 procedimentos especiais para prevenir a sua decomposição antes de terminada a investigação. O uso de procedimentos especiais na investigação não impede a aceitação de uma substância meta-estável ou instável como mineral se ela puder ser adequadamente caracterizada e se ela preencher outros critérios para ser um mineral. 2) Substâncias Extraterrestres Substâncias extraterrestres como meteoritos, pedras da lua, etc..., foram, aparentemente, produzidos por processos similares àqueles da Terra e, por isso, tais processos agora são chamados de geológicos, mesmo que o termo “geologia” significasse originalmente o estudo de rochas neste planeta. O estudo das feições geológicas dos planetas, por exemplo, pela NASA, é chamado de “astrogeologia”. Portanto, componentes de ocorrência natural de rochas extraterrestres e poeiras cósmicas são consideradas minerais, como, por exemplo, o mineral lunar tranquilitita. 3) Substâncias Antropogênicas Substâncias antropogênicas são aquelas produzidas pelo homem e não são consideradas minerais. Se tais substâncias forem idênticas a minerais, podem ser chamadas de “equivalentes sintéticos” dos respectivos minerais. 4) Substâncias Antropogênicas modificadas geologicamente Compostos químicos formados pela ação de processos geológicos sobre substâncias antropogênicos tem sido aceitos, até agora, como minerais, como o mineral Laurita, formado pela reação da água do mar com sobras metalúrgicas antigas. No entanto, atualmente muitos materiais exóticos são produzidos e é grande a possibilidade de que tais substâncias possam ser colocadas em um ambiente geológico onde gerem novos produtos que poderiam ser considerados novos minerais. Por isso a CNMMN estipulou que, no futuro, compostos químicos formados pela ação de processos geológicos em substâncias antropogênicas não podem ser consideradas como minerais. Alguns compostos químicos formados pela ação de processos geológicos em rochas ou minerais que foram expostos a tais processos pela atividade do Homem (abertura de minas, entulhos de minérios, abertura de estradas, etc..) foram aceitas como minerais no passado e, se a exposição não foi intencional (não foi feito com o propósito expresso de criar novos minerais), estas substâncias podem ser aceitas como minerais. Compostos químicos formados por incêncios em minas são considerados como um caso especial, porque nem sempre é claro se houve ou não envolvimento humano na causa do incêndio, e por issoais substâncias não são aceitas como minerais. 5) Substâncias Biogênicas São aqueles compostos químicos produzidos inteiramente por processos biológicos sem nenhum componente geológico: cálculo urinário, cristais de oxalato em tecidos vegetais e conchas de moluscos marinhos, etc.. Estes materiais não são considerados minerais. No entanto, se processos geológicos foram envolvidos na gênese do composto, então o produto pode ser aceito como mineral. Exemplos de minerais aceitáveis deste tipo são: - substâncias cristalizadas de matéria orgânica em xisto negro, - guano de morcegos em cavernas - constituintes de pedras calcárias ou fosfóricas originadas de organismos marinhos. 10 05. A GÊNESE DOS CRISTAIS O termo "cristal" vem do grego e significa “gelo transparente”, porque se acreditava que era a forma permanente do gelo endurecido pelo intenso frio das montanhas. Hoje em dia, o público leigo associa o termo a reflexões de luz e transparência. A existência de superfícies planas e as formas simétricas indicam que os sólidos cristalinos possuem um arranjo regular e preciso em sua estrutura interna, que será abordada em outro texto do polígrafo. 1) Como os cristais se formam ? - por solidificação de material antes em estado de fusão; - a partir de soluções, por precipitação de material dissolvido na água; - a partir de gases, como no caso da neve e das fumarolas vulcânicas. Na formação de cristais, temos que considerar dois fatores: a) O primeiro é o Movimento Browniano, descoberto por um botânico de nome Brown em 1827, que consiste no deslocamento contínuo e irregular das partículas que formam uma determinada substância. Com oaquecimento da mesma, ou seja, fornecendo energia à substância, este movimento molecular é acelerado, o inverso acontecendo com o abaixamento da temperatura. A passagem das substâncias do estado sólido para o líquido e depois para gás mostra isso claramente. A quantidade de calor em uma substância é a quantidade de movimento molecular. b) O segundo fato são as forças de atração molecular, que estão associadas à estrutura elétrica da matéria. São elas que mantêm unidas as moléculas de água, os átomos de ferro, etc. Nos cristais existe muito menos energia de movimento molecular que nos líquidos. Aqui as moléculas colocaram-se, após o rebaixamento da temperatura, em posições "confortáveis", ou seja, se dispõe de acordo com suas cargas elétricas em relação às cargas das outras moléculas. Se cada molécula assume a mesma atitude em relação às demais, isto resulta na formação de um arranjo regular, porque a mesma configuração geométrica se repetirá inúmeras vezes. Em outras palavras, o cristal se forma. Portanto, um cristal se forma a baixas temperaturas porque será ali que as moléculas se colocam em posições mais estáveis (com menos energia livre), assumindo uma certa atitude umas em relação com as outras. Este arranjo regular é o "estado cristalino". Algumas substâncias possuem 2 ou 3 arranjos que contém aproximadamente a mesma quantidade de energia livre e assim a substância pode existir em duas ou três formas cristalinas diferentes (polimorfismo). Em condições desfavoráveis, tais como o abaixamento rápido da temperatura, os metais e sais simples sempre cristalizam enquanto que as moléculas grandes e complicadas 11 apresentam problemas na cristalização e geram massas semelhantes a vidro, com uma disposição desordenada das moléculas. 2) Como inicia a cristalização ? A formação de cristais a partir de uma massa em fusão dá-se através de um processo de germinação. Este processo consiste no aparecimento, dentro da massa em fusão, de pequenos cristais espalhados caoticamente, a partir dos quais se formam depois os cristais grandes. Estes cristais pequenos iniciais chamam-se germes cristalinos. Aparecem normalmente um pouco abaixo da temperatura de solidificação oficial do cristal (uns poucos graus a menos), caracterizando um líquido super-resfriado, mostrando que mesmo em substâncias que sempre se cristalizam, existe alguma dificuldade para iniciar o processo de germinação. Em outras palavras, existe grande dificuldade de passar do estado desordenado das moléculas, onde estas estão se chocando a todo o momento, para o estado ordenado. Só algumas têm um choque favorável que lhes possibilita uma acomodação no espaço, surgindo um germe cristalino. Uma vez formados, o crescimento se dá nos germes cristalinos, pois é mais fácil para as moléculas adicionarem-se a cristais já constituídos do que formar novos germes. Este crescimento é causado pela não-saturação (valências atômicas não satisfeitas) da película externa da rede (do germe). Uma vez iniciado o processo de germinação, os cristais crescem até que toda a substância se solidifique, ou seja, quando os cristais se encontram uns aos outros. Por isso, na solidificação não temos normalmente cristais bem formados. Podemos formar cristais por: - evaporação de uma solução; - resfriamento de uma solução, em ambiente não perturbado, com crescimento lento. A dificuldade na formação de germes é uma conseqüência de contínuas flutuações locais de energia, como numa mesa de sinuca: uma bola rápida, ao colidir com outra, às vezes perde quase toda a sua energia, quase parando, enquanto que uma segunda bola se move rapidamente, tendo ganhado a energia perdida da primeira. Imaginando isto com bilhões de moléculas, é fácil ver a dificuldade de formar um germe e a manutenção do mesmo no contínuo bombardeio ao qual o mesmo é submetido. A partir de um tamanho mínimo, o germe é estável. Mas é bem mais fácil que os germes se formem sobre pequenas partículas sólidas, por acaso presentes no líquido, tais como poeira ou cristais de impurezas. O comportamento de massas fundidas e das soluções é muitas vezes errático, porque: - a nucleação depende da pequena probabilidade das moléculas se arranjarem ordenadamente; - a presença de partículas de poeira é apenas acidental. 12 Quando uma dada substância é aquecida, funde-se sempre à mesma temperatura, mas quando se resfria, nem sempre produz os germes naquela mesma temperatura. Isso porque a nucleação é uma questão de probabilidade e não uma certeza absoluta. A probabilidade cresce com o abaixamento da temperatura até que quase todas as substâncias finalmente se cristalizarem. Um resfriamento muito rápido pode levar uma substância a vitrificar, ocorrendo a desvitrificação (uma cristalização) por um rearranjo muito lento das partículas (uma cristalização) no estado sólido. 3) Como os cristais crescem a partir dos germes ? O crescimento dos cristais pode-se dar em camadas moleculares ou multimoleculares. Estas camadas iniciam seu crescimento no centro das faces e não nas arestas e vértices. 13 Para reger este crescimento, Pierre Curie enunciou a seguinte lei: "Os acréscimos perpendiculares às faces do cristal são diretamente proporcionais às suas constantes capilares". Esta constante capilar foi chamada por Wulff de "energia superficial específica" e pode ser definida como "a energia necessária para que um corpo cresça de uma unidade, na superfície que o separa do meio ambiente". Mas o crescimento e a velocidade de crescimento de um germe cristalino dependem: - da forma e dos tamanhos das moléculas ou íons; - da intensidade das forças que as unem; - se a energia liberada pelas moléculas na cristalização é transferida às moléculas vizinhas em solução, que por sua vez tem que se liberar desse calor antes de poder cristalizar; - da velocidade com que a energia de movimento se transfere por colisões sucessivas ao acaso (velocidade com que o calor se difunde). Portanto, quanto mais frio o líquido, mais rápido o crescimento dos cristais. - da quantidade de material que está disponível em solução (extremos: NaCl e SiO2) - da velocidade de difusão da substância dissolvida em direção ao cristal, em meio à fusão ou solução. O processo é complicado, principalmente porque o processo de difusão em torno dos cristais deve adaptar-se a situações geométricas estranhas. O processo de crescimento cristalino a partir de soluções é tão complexo que não se conseguiu calcular as velocidades de crescimento dos cristais. Mesmo o empilhamento de camadas moleculares está sujeito a alterações pela ação de moléculas mais violentas (que precisam sobrepujar uma grandeza crítica). 14 O crescimento das faces se dá em condições de forte supersaturação do líquido. Mas não devemos esquecer que os cristais apresentam faces imperfeitas, com fendas, discordâncias e escorregamentos, que podem ser responsáveis pelo crescimento, quando os cálculos teóricos, lidando com faces perfeitas, indicam um não crescimento. Uma imperfeição, por exemplo, é uma discordância em espiral. A camada não se completa e o cristal cresce em espiral. Pode haver duas espirais opostas (direita e esquerda)que formam camadas concêntricas. Neste caso parece que cresceu por planos. O modo pelo qual as camadas se iniciam provavelmente também varia de uma espécie cristalina para outra, e mesmo de indivíduo para outro da mesma espécie. O grau de supersaturação necessário para o início de novas camadas sobre faces perfeitas provavelmente varia muito de uma substância para outra e também de uma face para outra do mesmo cristal. Só em cristais de estrutura compacta há dificuldade na formação inicial de novas camadas. Na maioria dos cristais, de moléculas de forma irregular, nenhuma face é realmente compacta - todos possuem vazios, onde facilmente novas moléculas se colocam criando, por sua vez, mais espaços vazios. Mas porque as camadas novas iniciam seu crescimento no centro das faces? Aparentemente porque numa solução em repouso, na qual os gradientes de concentração tiveram tempo de se desenvolver de acordo com as leis da difusão e não foram perturbados por correntes de convecção, maior quantidade de substância dissolvida chega ao centro da face por difusão, quantidade essa maior do que nos outros pontos. Mas nem todos os cristais crescem pelo processo de superposição de camadas. Alguns crescem como estrutura em esqueleto, por rápido avanço de ramificações em diferentes direções. Neste caso, as moléculas se empilham de maneira indiscriminada e se colocam na posição correta, sem formar camadas planas. 15 06. CLASSIFICAÇÕES DE MINERAIS Muitas foram as tentativas de classificar os minerais. Na impossibilidade de discutir todas elas, são apresentadas, abaixo, apenas três classificações. A primeira é histórica, a classificação de Dana é da escola norte-americana e a classificação de Strunz é usada na Europa. 6.1 A classificação de Georgius Agricola Georgius Agrícola nasceu em 24 de março de 1494 na cidade de Glochau, na Alemanha, como Georg Bauer. Estudou Filosofia em Leipzig e foi à Itália em 1523, completar seus estudos em medicina. A partir de 1527 trabalhou em Joachimsthal, o centro da mineração da Idade Média. Lá escreveu sobre as doenças relacionadas ao trabalho, como problemas dermatológicos em trabalhadores de minas de sal de pedra. A partir de 1533 trabalhou em Chemnitz, lá vivendo os anos da peste e escrevendo o texto “A Peste”. Não reconheceu o rato como transmissor da doença, mas recomendou higiene no armazenamento de alimentos. Quando a peste voltou a Chemnitz em 1552-53, instalou um “Lazarett”, uma espécie de hospital, reduzindo a mortalidade. Latinizou seu nome para Georgius Agricola, escrevendo “De Re Metallica”, 12 volumes que, por 300 anos, foram a “bíblia” da mineração e da metalurgia. A classificação de Agricola : 1. SIMPLE FOSSILS a. TERRAE (argilla, creta, terra medica) b. SUCCI CONCRETI I. (sal, nitrum) II. (alumen) III. (sulfur, bitumen) IV. (alumen) V. (chrysocolla,aerugo,auripigmentum) c. LAPIDES I. COMMUNI (magnes, haematites, aetites) II. GEMMAE (adamas, smaragdus, carbunculus) III. MARMORA (porphyrites, ophites, Parium) IV.SAXA (arenarium, calcarium) d. METALLA I. (aurum, argentum, plumbum) II. (ferrum) III. (argentum vivum) 2. MIXED AND COMPOSITE FOSSILS a. LAPIS et SUCCUS CONCRETUS b. METALLUM et TERRA c. LAPIS et METALLUM in partibus aequa libus d. LAPIS et METALLUM abundans e. LAPIS abundans et METALLUM f. LAPIS et METALLUM et SUCCUS CONCRETUS 6.2 A classificação de James Dwight Dana James Dwight Dana (1813095) nasceu em Utica, no estado de New York, USA. Geólogo, mineralogista e naturalista, formou-se em 16 Yale em 1833. Seus estudos no Pacífico Sul, no NW dos USA e na Europa, entre outras localidades, modificaram as idéias correntes sobre a formação de montanhas, vulcanismo e origem de continentes e oceanos. Em 1837 Dana publicou “A System of Mineralogy”, que continua sendo padrão até os dias de hoje. Foi o geólogo e mineralogista da expedição norte-americana para a região antártica e mares do Sul comandada por Charles Wilkes (1838-42). Os relatórios de Dana, publicados em grandes volumes com ilustrações elaboradas e um atlas, incluíram Zoophytas (1846), Geologia (1849) e Crustáceos (1852-55). Uma de suas posições mais importantes foi como co-editor, com Benjamin Silliman, do American Journal of Science, onde suas idéias influenciaram grandemente no desenvolvimento da geologia norte-americana. Em 1846 tornou-se sucessor de Silliman em Yale como professor de história natural e geologia. Outros escritos seus incluem o Manual de Geologia (1862), o Manual de Mineralogia (1843), Corais e Ilhas de Coral (1872) e Características de Vulcões (1890). Classificação Dana Velha Classificação Dana Nova Elementos Nativos Classe 1 II Sulfetos Classes 2 & 3 III Óxidos e Hiodróxidos Classes 4, 5, 6, 7, & 8 IV Halóides Classes 9, 10, 11, & 12 V Carbonatos, Nitratos, Boratos Classes (13, 14, 15, 16a, 16b, 17)Carbonatos (18, 19, 20)Nitratos (21, 22, 23)Iodatos (24, 25, 26, & 27)Boratos VI Sulfatos, Cromatos, Molibdatos Classes (28, 29, 30, 31, 32)Sulfatos (33)Selenatos & Telluratos (34)Selenitos - Telluretos - Sulfitos (35, & 36)Cromatos VII Fosfatos, Arsenaitos, Vanadatos Classes (37, 38, 39, 40, 41, 42, 43)Fosfatos (44, 45, 46)Antimoniatos (47)Vanadatos et. al. (48, & 49)Molibdatos & Tungstatos IX Minerais Orgânicos Classe 50 VIII Silicatos Nesosilicatos Classes 51, 52, 53, & 54 Sorosilicatos Classes 55, 56, 57, & 58 Cyclosilicatos Classes 59, 60, 61, 62, 63, & 64 Inosilicatos Classes 65, 66, 67, 68, 69, & 70 Fillosilicatos Classes 71, 72, 73, & 74 Tectosilicatos Classes 75, 76, & 77 S l ã Cl f d Cl 8 17 6.3 A classificação de Hugo Strunz Hugo Strunz nasceu em 24 de fevereiro de 1910 em Weiden, Oberpfalz, Alemanha. Em 1929 iniciou o estudo de Ciências Naturais em Munique, especialmente Mineralogia. Formou-se 1933 em Dr. Phil. E em 1935 Dr. Sc. Techn. Trabalhou em 1933 no Instituto de W.H. Bragg na Universidade de Manchester e em 1935-37 na Universidade de Zurique, com Paul Niggli. Depois trabalhou na Universidade de Berlin com Paul Ramdohr. Em 1941 foi impressa a primeira edição das “Tabelas Mineralógicas”, atualizadas até hoje: referência básica para a classificação cristaloquímica-estrutural sistemática dos minerais em nível internacional. Prof. Hugo Strunz publicou mais de 200 trabalhos individuais. Uma obra, especialmente, foi marcada por Strunz: o Tratado de Mineralogia de Klockmann, Ramdohr e Strunz, agora em sua 17ª edição. Participou intensamente da Federação Alemã de Colecionadores de Minerais. Realizou viagens de estudos para todos os continentes, com exceção da Antártida. Recebeu um grande número de honrarias, medalhas e outros, também de outras federações de colecionadores (russa, francesa e inglesa). A classificação de Hugo Strunz: I Elementos Nativos II Sulfetos III Halóides IV Óxidos e Hidróxidos V Nitratos, Carbonatos e Boratos VI Sulfatos, Cromatos, Molibdatos e Tungstatos VII Fosfatos, Arseniatos and Vanadatos VIII Silicatos Tectosilicatos Filosilicatos Inosilicatos Ciclosilicates Sorosilicatos Nesosilicatos Silicates Não-ClassificadosIX Compostos Orgânicos 18 07. A ESTRUTURA DOS CRISTAIS A existência de superfícies planas e forma simétrica indicam que os sólidos cristalinos possuem um arranjo regular e preciso em sua estrutura interna Robert Hooke (1670) foi um inglês que julgou serem os cristais constituídos de pilhas de partículas esféricas. Christian Huygens (1678), naturalista holandês, aventou a hipótese dos planos de clivagem serem limites naturais da divisão entre camadas planas de partículas. Como na calcita há 3 planos de clivagem, achou que as menores partículas fossem pequenos romboedros formados por pequenas esferas ou esferóides (esferas deformadas). Renée Just Hauy, um abade francês que viveu no final do século XVIII, complementando as idéias de Huygens e Bergmann, estabeleceu uma teoria a respeito da estrutura cristalina, baseado em observações que fez a respeito da clivagem. Observou ele a clivagem da calcita e verificou que: - para o mesmo mineral, os planos de clivagem apresentam sempre disposição semelhante. - nos casos em que há 3 planos de clivagem, de sua reunião resulta um sólido de clivagem, sempre igual para uma dada espécie mineral. Baseado nisso, Hauy supôs que todos os cristais eram constituídos pela justaposição de uma certa quantidade de partículas com a forma de um sólido de clivagem, às quais chamou de moléculas integrantes (minúsculas unidades estruturais). Esta idéia é, na sua essência, correta. Os cristais têm, portanto, como propriedade essencial uma estrutura interna regular, com partículas arranjadas de maneira precisa, formando figuras internas que se repetem periodicamente em todas as direções do espaço. As faces são modalidades na disposição do empilhamento, as inclinações relativas das faces são determinadas por medidas feitas no arranjo cristalino e as simetrias das formas cristalinas são meras indicações da simetria dos seus arranjos internos. A confirmação da existência destes arranjos regulares foi muito importante. Confirma-se a idéia inicial e os pormenores dos arranjos internos podem adquirir complicações fascinantes. O princípio essencial é tão simples como o empilhamento de caixas, só que as unidades estruturais no cristal de calcita não são bolas ovais como sugeriu Huygens, nem tijolos romboédricos como imaginou Hauy. São átomos, grupos de átomos, de formas mais complicadas. Portanto, os corpos amorfos, como o vidro, possuem partículas desordenadas, à semelhança dos líquidos. A forma externa do mineral pode ou não apresentar faces cristalinas, dependendo da gênese do cristal, mas a estrutura interna regular estará presente sempre, mesmo em fragmentos totalmente irregulares. 19 Assim, quase todos os corpos sólidos que conhecemos, inclusive nylon, ossos, dentes, cabelos, penas, seda, algodão, borracha, penicilina, aspirina, etc., estão no domínio do reino dos cristais, onde a ordem e as leis cristalinas constituem a regra. Como exceção, temos vidro, tecidos animais e vegetais e certos plásticos. Mas todas as considerações até o momento aplicam-se apenas às formas holoédricas dos sistemas. As formas de menor simetria, chamadas formas derivadas, são um problema à parte. Para explicar sua gênese, Hauy criou a Teoria do Decrescimento. Formas derivadas surgem quando, ao se formar um cristal, este não cresce por camadas completas. No caso de um cubo, o decrecimento de um ângulo simétrico conduz à obtenção de um octaedro. Um decrescimento em aresta igual em altura e largura, equivalente ao truncamento simétrico das arestas, nos leva ao rombododecaedro. Observando todas as formas cristalinas, Hauy imaginou que, a partir das formas que caracterizam os 6 sistemas, ele poderia derivar as outras formas cristalinas, substituindo vértices, arestas e faces por faces e vértices. Estabeleceu a seguinte lei: "toda a modificação sofrida por um elemento do cristal deverá se refletir em todos os elementos semelhantes a este ". Com isto construiu seu método de derivações das formas cristalinas por truncamentos: Truncadura simples : 1 el. de 1 cristal é subst. por 1 só plano Biselamento : 1 el. de 1 cristal é subst. por 2 planos Rebaixamento : 1 el. de 1 cristal é subst. por 3 planos Rebaixamento duplo : 1 el. de 1 cristal é subst. por 6 planos Mas surgiu outro fato que obrigou Hauy a rever a sua Teoria das Moléculas Integrantes. Hauy mesmo observou vários casos de minerais que apresentavam apenas a metade das faces possíveis, como diamante, turmalina, calcita, dolomita e boracita. Além disso, a explicação de Hauy só se aplicaria aos minerais com 3 planos de clivagem. Hauy então chamou de formas hemiédricas aquelas que apresentam apenas a metade das faces possíveis, ou menos, e formas holoédricas aquelas que cumpriam a sua lei de simetria. A Teoria das Moléculas Integrantes também não concorda com a descontinuidade da matéria que admite a existência de espaços intermoleculares. Assim, Frankenheim (1835), Dellafosse e depois Bravais (l850), modificaram a Teoria de Hauy, baseados na descontinuidade da matéria. Bravais, partindo da noção da homogeneidade dos cristais, formulou a seguinte hipótese: "Sendo os cristais homogêneos, em qualquer ponto as propriedades são as mesmas paralelamente a uma direção dada e diferem nas direções não-paralelas" . Assim há, num cristal, um número infinita de pontos ao redor dos quais a distribuição de matéria é a mesma nas direções paralelas, pontos estes chamados de "pontos análogos ou pontos homólogos". Partindo de um ponto homólogo qualquer dentro de um cristal, podemos construir uma FIADA (uma sequência de pontos) ao longo dos eixos x, y e z. Estes eixos, dois a dois, definirão PLANOS RETICULARES cuja união, em 3 dimensões, originará a MALHA sólida da rede, constituída pelos "paralelepípedos elementares", como os chamou Bravais. 20 O espaço fica, desta maneira, dividido em malhas paralelipédicas, formando uma rede cujos vértices são os nós. Não podem existir outros nós porque estes destruiriam o princípio de construção da rede, no sentido de que há sempre igualdade de condições ao redor de cada um dos nós da rede. Para construir esta malha paralelipédica, precisamos conhecer: - as direções das retas x, y e z, - os ângulos que esses 3 eixos formam entre si, - os parâmetros a, b e c. Com estes dados, construímos a malha fundamental, que vem a ser a molécula integrante de Hauy. A malha fundamental representa a unidade cristalina, assim como a molécula é a unidade dos corpos amorfos. Uma vez definida a malha fundamental, Bravais se preocupou com o surgimento das faces cristalinas, elaborando o seguinte princípio, a chamada LEI DE BRAVAIS: "Para delimitar um cristal, existe um certo número de planos possíveis, sendo os mais comuns, entre eles, os que incluem o maior número de unidades estruturais". Baseado nesta Lei e naquela de Hauy, Bravais imaginou que, tomando um cubo e substituindo um vértice por um plano que corte as 3 arestas, repetindo a operação em todos os vértices, teriamos um octaedro. Assim se chegaria às formas holoédricas: Ex: planos reticulares correspondentes a 111 planosreticulares correspondentes a 110 planos reticulares correspondentes a hkl planos reticulares correspondentes a hhl Portanto, uma rede cristalina é caracterizada por: - parâmetros da rede a, b, e c, que dão as dimensões características das células unitárias, - ângulos interaxiais alfa, beta e gamma. Já vimos que a característica fundamental da rede é de que a posição de qualquer ponto da rede é idêntica, em arranjo e orientação, à posição de qualquer outro ponto. Respeitando esta característica, Bravais procurou aumentar o número de arranjos possíveis, chegando aos 14 retículos de Bravais. É uma espécie de partícula integrante descontínua e, geometricamente, não existem outros retículos além destes 14. Qualquer outra combinação destrói o princípio da vizinhança idêntica dos pontos integrantes da rede. Entre estes 14 retículos, podemos distinguir: - celas primitivas : possuem pontos apenas nos vértices. - celas múltiplas : possuem pontos adicionais em centro de faces e ao longo das diagonais espaciais. 21 O número de átomos numa cela unitária é geralmente um número inteiro pequeno ou um múltiplo de número mostrado pela fórmula química mais simples. Assim, no quartzo a unidade estrutural mostrou ser 3(SiO2) e na halita 4(NaCl). Qualquer subdivisão menor não teria as propriedades do todo. Uma outra designação para os retículos de Bravais é o termo "grupos espaciais". Os 14 Retículos de Bravais são os seguintes: 01 - cubo simples 02 - cubo centrado (interpenetração de dois cubos simples) 03 - cubo de faces centradas 04 - prisma tetragonal simples 05 - prisma tetragonal centrado (interpenetração de 2 prismas simples) 06 - paralelepípedo rômbico 07 - paralelepípedo rômbico centrado 08 - paralelpípedo rômbico de faces centradas 09 - paralelepípedo rômbico de bases centradas 10 - retículo elementar do sistema hexagonal 11 - retículo elementar do sistema trigonal 12 - paralelepípedo monoclínico 13 - paralelepípedo mono-oblíquo ou prisma clinorrômbico (bases centradas) 14 - retículo elementar triclínico Estes 14 retículos só solucionam os casos das classes holoédricas, pois a condição de obtenção de tais retículos era a obediência à simetria geométrica. Schnecke, em 1879, por operações de recobrimento como rotação, translação e a combinação de rotação-translação, descobriu com esta última os eixos helicogiros (binários, ternários, etc.). Obteve assim 65 tipos de grupos espaciais pertencentes a 11 classes de simetria. Schönflies (1891) e Federoff (1894), independentemente um do outro, estabeleceram formas cristalinas por: - reflexão - reflexão com translação - reflexão com rotação Obtiveram 230 formas cristalinas possíveis, pertencentes a 32 classes de simetria. Estava completa a Teoria Reticular de Bravais sob o ponto de vista geométrico. 08. DEFEITOS CRISTALINOS Num cristal real, os átomos estão em vibração térmica e há sempre uma incerteza posicional, pelo que as posições atômicas são definidas como posições médias. Assim, as estruturas dos cristais sempre apresentarão defeitos. A importância destes defeitos é enorme: - permitem compreender a facilidade com que os cristais se deformam plasticamente, sem perder seu caráter essencialmente cristalino; 22 - permitem entender porque suas resistências são muito menores que as que teoricamente se calculam; - várias propriedades dos cristais são dependentes do TIPO e do NÚMERO de defeitos cristalinos, tais como a difusão no estado sólido, a condutividade eletrolítica, a luminescência, a cor, a fotocondução e outros. A caracterização e a determinação da freqüência dos defeitos num cristal são dois aspectos importantes para a utilização industrial dos cristais, naturais ou artificiais. É quase impossível sintetizar um cristal perfeito, procura-se obter cristais com uma dada porcentagem de determinado tipo de imperfeições. Há basicamente dois tipos de imperfeições: - estruturais : são de escala atômica e ocorrem por substituição e/ou deslocamento de átomos; - eletrônicos : dão-se pela ausência de elétrons ou por elétrons covalentes. Os defeitos estruturais podem ser classificados em: 1. PONTUAIS : imperfeição em torno de um ponto, afetando átomos vizinhos. 2. LINEARES : imperfeições ao longo de uma linha. 3. PLANARES : imperfeição que abrange uma área da estrutura. 1. Defeitos Pontuais Ocasionam variações na composição química do cristal e permitem a difusão no estado sólido. Podem ser primários ou secundários no cristal. 1.1 Mobilidade Atômica Certas estruturas não possuem posições fixas para seus átomos, como, por exemplo, KCN ( cianeto de potássio ). Ali, os grupos CN- giram livremente em torno de pontos equivalentes da estrutura, que é cúbica. Quando a temperatura decresce, esta rotação diminui, fazendo com que os átomos imobilizem-se, originando uma estrutura ortorrômbica. 1.2 Átomos Substitucionais Nas estruturas cristalinas ocorre frequentemente a substituição de certos átomos por outros com dimensões semelhantes e capazes de proporcionarem ligações químicas idênticas. A diferença de raios não deve exceder 15% do raio do menor. Ex.: isomorfismo das olivinas (também chamado de solução sólida): Forsterita (Mg2SiO4) Fayalita (Fe2SiO4) 23 Quando íons de valências diferentes se substituem, a neutralidade da rede cristalina é mantida através de outras substituições compensadoras. Ex.: plagioclásios: Anortita CaAl2Si2O8 Albita NaAlSi3O8 Na+ + Si4 = Ca+2 + Al+3 Outro exemplo é a substituição isomórfica de Fe+2 por Mg+2 e Fe+2 por Ni+2. 1.3 Átomos Intersticiais São átomos que ocupam um vazio estrutural. Habitualmente somente átomos pequenos como H, B, C e N conseguem inserir-se nos vazios. Ex.: aço - solução sólida de C em Fe zeolitas - no meio dos tetraedros, os vazios (verdadeiros canais intercomunicantes) estão ocupados por Na+, K+, Ca+2, H2O e outros. Estes são os átomos intersticiais que contribuem para a neutralidade da estrutura. 1.4 Lacunas São posições atômicas não-ocupadas. Determinados compostos, então, podem apresentar uma composição não- estequiométrica. Ex: óxido ferroso (FeO) pode possuir carência de Fe de até 16%: FeO A neutralidade da estrutura é mantida pela oxidação de alguns cátions Fé+2. O óxido de titânio tem estrutura idêntica à halita, mas apenas 85% das posições podem estar efetivamente ocupadas. Além disso, variações nas porcentagens relativas das posições ocupadas fazem com que o composto possa ter carência de titânio ou de oxigênio, assumindo composição não-estequiométrica, variável desde Ti 0,8 O até TiO0,7. 1.5 Defeitos de Frenkel Par de Frenkel é uma lacuna comum átomo auto-intersticial. O número de lacunas é igual ao número de átomos auto-intersticiais. Portanto, a composição permanece a mesma, e tal fato contribui à difusão no estado sólido. Os átomos deslocados não saem da estrutura. 1.6 Defeitos de Shottky Consistem na associação de lacunas, ocorrendo migração de átomos para o exterior do cristal. Para manter a neutralidade elétrica da estrutura, a migração de cada cátion induz à migração de um ânion, de tal sorte que a composição final é mantida. 24 Um tipo especial são os "Farbenzenter" ou centros de cor. São locais onde ocorre a captura de um elétron por uma lacuna deixada por um ânion. Pode ser produzida por irradiação do cristal cim raios X, UV, eletrólise, aquecimento, raios gama e outros. Como resultado, teremos no cristal uma cor anômala. Um exemplo é a irradiação do topázio incolor, que produz uma cor azul. Determinados feixes de luz irão excitar mais ou menos os elétrons dos centros-F. 2. DEFEITOS LINEARES São geralmente designados por "deslocações" e ocorrem ao longo de uma linha. Foram postulados para explicar a razão por que os cristais têm resistências 10 a 104 vezes menores que aquelas que se calculam com base nas forças de atração entre os átomos. Ex.: grafite tem resistência teórica em tração uniaxial de 2000 kg/mm2, mas a tração real é de 20 kg/mm2. Estas deslocações podem ser observadas por: - microscopia eletrônica - difração de raios X - difração de elétrons - exposição do cristal a um solvente, provocando o surgimento de figuras de corrosão nas interseções dos deslocamentos com a superfície do cristal. Num cristal comum existem em média 10 interseções de deslocações por cm2, mas num cristal imperfeito (deformado) podemos ter 10 / cm2 de seção. Quando abundam deslocações, a deformação introduzida nas estruturas cristalinas ocasiona modificações nas propriedades óticas dos cristais. Ex.: faces, clivagens ou maclas curvas; quartzo que, por UV, passa a beta, com 2V de 0 a 10*. extinção ondulante em quartzo, feldspato e mica. As bandas de deformação são áreas estreitas com orientação ligeiramente diferentes. Num cristal perfeito, qualquer circuito de Burguers é fechado (a=b=c). Como deslocação, entretanto, o circuito só fecha se considerarmos um vetor suplementar, que será chamado de vetor de Burguers (b-) ou vetor de escorregamento (s). 25 A linha de deslocação 1 ("canal" ou "anel" do circuito de Burguers) descreve o percurso da imperfeição linear através do cristal, enquanto que o vetor de Burguers descreve a energia da deslocação. Em geral, o vetor de Burguers é oblíquo à linha de deslocação. O vetor pode ser decomposto em duas componentes: paralela e perpendicularmente à linha de deslocação. Há, portanto, dois tipos de deslocações: a) deslocações em cunha b) deslocações de Burguers (ou helicoidais) a) Deslocações em Cunha O vetor de Burguers é perpendicular à linha de deslocação (fig. 13.10a) como se se tratasse de um semi-plano reticular adicional, que penetra como cunha através da estrutura. Isto se dá por dois tipos de movimento: escorregamento e salto Sua enorme importância reside em sua mobilidade, para deformação dos cristais. I) No escorregamento a deslocação move-se na superfície definida pelo vetor de Burguers ou pela linha de deslocação, não necessariamente plana, que é plano de escorregamento. Este movimento é conservativo, não acarreta variação no número de defeitos pontuais. É um processo que exige pouca energia, especialmente nos metais. Pode ser visualizado como se duas partes do cristal escorregassem ao longo de um plano de escorregamento (como dobrar um tapete). A direção do escorregamento é quase inteiramente determinada pela geometria da estrutura cristalina e a direção mais provável corresponderia ao vetor reticular de menor amplitude. II) No salto ("climb") o movimento da linha de deslocação é perpendicular ao plano de escorregamento. 26 É um movimento não-conservativo, pois envolve a criação de interstícios ou o aniquilamento de lacunas. Com freqüência o processo não ocorre ao longo de toda a linha de deslocação, formando os degraus ("jigs"). b) Deslocações Helicoidais Neste caso, o vetor de Burguers é paralelo à linha de deslocação (fig. 13.10b). São resultantes como se houvesse um eixo helicoidal que afetasse as posições dos átomos da estrutura. Em torno da linha de deslocações, os planos reticulares constituem uma rampa helicoidal cujo declive diminui progressivamente com a distância àquela linha. Estas deslocações são importantes para o crescimento, pois a situação mais favorável energeticamente, com as camadas espirais de crescimento. Ocorre em condições muito desfavoráveis para a adição de novos estratos de átomos aos núcleos cristalinos iniciais. O aumento na densidade de deslocações permite, mediante diversos mecanismos, um aumento na capacidade de acomodação de deformação plástica (softening). Paralelamente, quando ocorre o aumento na densidade, os efeitos de suas interferências também aumentaram, dificultando ou impossibilitando o movimentos dos cristais. Há, assim, um aumento da resistência do cristal à deformação (hardening). 3) IMPERFEIÇÕES PLANARES 27 Podem resultar da aglomeração planar de defeitos lineares, quebra na seqüência normal de sobreposição de estratos atômicos ou da interação entre átomos de cristais contíguos. 3.1) Junções Intergranulares Numa rocha qualquer, os cristais encontram-se em contato. Considerando cristais de mesma espécie, ao se passar de um para o outro ocorre, em maior ou menor grau, uma descontinuidade, que são as junções intergranulares. Abaixo, a representação de alguns tipos: a: coincidência reticular parcial entre os grãos b: pequena discrepância estrutural entre os grãos c: grande discrepância estrutural entre os grãos Os átomos da zona de junção adquirem posições de compromisso relativamente às diferentes orientações daqueles cristais. A estrutura da junção intergranular é mais ou menos desordenada, dependendo do grau de desacerto existente entre as estruturas adjacentes. Quando o grau de desacerto é pequeno (menor que 15o), a junção intergranular pode ser descrita em termos de deslocações que afetam o cristal. Quando maior for o desacerto, maior a sua mobilidade. Esta é facilitada pelo aumento da temperatura e dificultada pela presença de átomos estranhos (intersticiais). Estes possuem um papel fundamental na remodelação de agregados cristalinos, ou seja, recristalização (formam-se menos grãos cristalinos) (veja figura na próxima página). 28 3.2) Paredes de Deslocações É um tipo especial de banda de deformação, os "kink-bands". Resultam da deformação mecânica do cristal. Ocorrem em rochas deformadas, como em micas, enfibólios, olivinas, calcita e plagioclásio. A altas temperaturas,as paredes de deslocações são formadas pelo movimento das deslocações por escorregamento e salto. Dividem o cristal em blocos (sub-grãos), praticamente indeformados e ligeiramente desorientados (junções intergranulares são pequenas, da ordem de minutos). É a poligonização. Corresponde a um estado energético inferior ao do cristal deformado, mas superior àquele do cristal recristalizado. A alta temperatura, recristalização e poligonização podem ocorrer simultaneamente. 3.3) Falhas de Empilhamento Ocorrem quando estruturas compactas, como nos metais, onde 60,4% do espaço é ocupado, são "quebradas", quando ocorrem na estrutura estratos em posição "errada". O plano que separa 2 estratos em seqüência "errada" constitui uma imperfeição planar da estrutura, a falha de empilhamento. 29 09. ELEMENTOS GEOMÉTRICOS DOS CRISTAIS São as faces, arestas, ângulos planos (formados por duas arestas), ângulos diedros (formados por duas faces) e os vértices (ângulos formados por 3 ou mais arestas ou faces). Um poliedro sempre apresentará estes elementos, pois é um sólido em 3 dimensões. Os cristais sempre são poliedros convexos. Podemos então aplicar a LEI DE EULER, derivada de um dos maiores matemáticos do mundo, o suíço Leonhard Euler (1707- 1783): Faces + Vértices = Arestas + 2 ELEMENTOS DE SIMETRIA DOS CRISTAIS Existem 4 tipos diferentes de simetria: a) simetria no espaço ( 3 dimensões ): é a simetria de translação (estrutural), quando um elemento se repete num intervalo regular. b) simetria por um plano (2 dimensões): é a simetria por reflexão (por planos), quando um lado é o "espelho" do outro. Plano de simetria é um plano imaginário que divide o cristal em duas porções idênticas e simétricas em que uma é a imagem especular da outra. Anota-se por P, colocando-se como coeficiente o número de planos de mesma espécie existentes no cristal. Ex.: 4P (4 planos de simetria) c) simetria por uma linha ( 1 dimensão): é a simetria de rotação, com eixos de simetria, quando um ponto comanda os outros, todos iguais. Eixo de simetria é uma linha imaginária em torno da qual o cristal, girando em 360º , repetirá "n" posições idênticas no espaço. "n" é a ordem do eixo, que pode ser 2, 3, 4 ou 6. Anota-se os eixos de simetria por "E" (eixo) ou "A" (axis), colocando-se como índice a ordem do eixo e como coeficiente o número de eixos de mesma ordem e de mesma espécie existentes no cristal. Ex.: 6E4 = seis eixos quaternários (de ordem quatro) d) simetria por um ponto (nenhuma dimensão): é a simetria de inversão, pelo centro de simetria, quando a imagem pode ser invertida por um ponto. Centro de simetria é um ponto imaginário no interior de um cristal a partir do qual, em sentidos opostos e a iguais distâncias, encontraremos elementos idênticos. É anotado por "C" . Há 5 regras de simetria: 1) eixo de ordem par com centro de simetria exige plano perpendicular a e ele. 30 2) eixo de ordem par com plano de simetria perpendicular a ele exige centro de simetria. 3) eixo ternário com centro de simetria exclui plano de simetria perpendicular ele. 4) eixo ternário com plano de simetria perpendicular a ele exclui o centro de simetria. 5) dois eixos de ordem par perpendiculares exigem um terceiro eixo de ordem par a eles ortogonal. 10. CLASSES E SISTEMAS CRISTALINOS Trabalhando com os elementos de simetria dos cristais, já observamos que cada cristal possui um conjunto de elementos de simetria. Este conjunto de elementos de simetria chama-se GRUPO PONTO DE SIMETRIA. Ex.: o cubo possui um grupo ponto de simetria 3E4 4E3 6E2 C 3P 6P Demonstrou-se que existem somente 32 combinações possíveis dos vários elementos de simetria, ou seja, existem apenas 32 grupos pontos de simetria. Estes 32 grupos pontos de simetria foram chamados de classes de simetria ou classes cristalinas. Definição completa: classe de simetria ou classe cristalina é o conjunto de cristais diferentes que apresentam o mesmo grupo ponto de simetria. Embora existam 32 classes, a maioria dos cristais comuns cristaliza em apenas 15 classes. A partir destas 15 classes surgiram os 7 Sistemas Cristalinos. Em muitos livros os sistemas hexagonal e trigonal são apresentados como um só, havendo, neste caso, apenas 6 Sistemas Cristalinos. Sistemas Cristalinos são grupos distintos de classes cristalinas, agrupadas pela natureza análoga dos elementos de simetria que se combinam ou pelo modo com que esta combinação se efetua: 1 - sistema cúbico 2 - sistema hexagonal 3 - sistema trigonal 4 - sistema tetragonal 5 - sistema ortorrômbico 6 - sistema monoclínico 7 - sistema triclínico Estes sistemas caracterizam-se: - pela presença indispensável de certos elementos de simetria - pela possibilidade de serem referidos a uma mesma cruz axial. A cruz axial, fundamental para a caracterização dos cristais, é o conjunto de eixos cristalográficos aos quais são referidas as faces dos cristais. Consideram-se, nesta cruz, 2 fatores: 31 - inclinação mútua dos eixos - comprimento relativo dos eixos Por exemplo, a cruz axial do Sistema Cúbico caracteriza-se por possuir 3 eixos de comprimento igual e que possuem, entre si, ângulos de 90 graus. Os Sistemas Cristalinos Nome do Sistema Número de eixos da cruz axial do sistema Inclinação relativa entre os eixos da cruz axial do sistema Comprimento relativo dos eixos da cruz axial do sistema Elementos de simetria indispensáveis do sistema Cúbico (ou Isométrico) 3 90o 90o 90o x = y = z 4E3 Hexagonal 4 90o 90o 120o x = y = z ≠ u E6 Trigonal (ou Romboédrico) 4 90o 90o 120o x = y = z ≠ u E3 Tetragonal (ou Quadrático) 3 90o 90o 90o x = y ≠ z E4 Ortorrômbico (ou Rômbico) 3 90o 90o 90o x ≠ y ≠ z 3E2 Monoclínico (ou Clinorrômbico) 3 90o β 90o x ≠ y ≠ z E2 Triclínico (ou Anórtico) 3 α β γ x ≠ y ≠ z C Cruzes axiais do Sistema Cúbico, do Sistema Tetragonal, dos Sistemas Hexagonal e Trigonal, 32 do Sistema Ortorrômbico, do Sistema Monoclínico e do Sistema Triclínico. 11. FORMAS CRISTALINAS Forma é um conjunto de faces que compõe o cristal. Em seu significado mais comum, o termo forma é usado para indicar a aparência externa geral, mas na cristalografia esta aparência externa é indicada pela palavra hábito. Forma simples é um conjunto de faces equivalentes repetidas pelos elementos de simetria do cristal . Formacombinada é aquela formada por mais de uma forma simples. Forma aberta é um conjunto de faces que não limita espaço. Forma fechada é um conjunto de faces equivalentes que limitem uma porção do espaço. Assim, um cristal normalmente exibe diversas formas em combinação umas com as outras, mas pode ser apenas uma, desde que esta seja uma forma fechada. No caso de formas abertas, necessita-se pelo menos duas delas para formar o cristal, já que qualquer combinação de formas deve encerrar espaço. São formas abertas: 1. Pédion : uma face única 2. Pinacóide : duas faces paralelas 3. Domo : duas faces não paralelas simétricas em relação a um plano de simetria (“telhadinho”). 4. Esfenóide : duas faces não paralelas simétricas em relação a um eixo de simetria binário (“telhadinho torto”) 5. Prisma : forma composta por 3,4,6, 8 ou 12 faces, todas paralelas a um dos eixos, geralmente um dos eixos cristalográficas. 6. Pirâmide : forma composta por 3,4,6,8 ou 12 faces, simétricas a um mesmo eixo, geralmente um dos eixos cristalográficos. São formas fechadas: 1. Bisfenóide : forma de 4 faces, na qual duas faces do esfenóide superior se alternam com as do esfenóide inferior. 2. Bipirâmide : forma de 6,8,12,16 ou 24 faces, que podem ser consideradas como formadas por pirâmides mediante reflexão sobre um plano de simetria horizontal. 3. Escalenoedro : forma de 8 ou 12 faces, cada uma com a forma de um triângulo escaleno. 4. Trapezoedro : forma com 6, 8 ou 12 faces, com forma de trapezóide. 33 5. Romboedro : forma composta por 6 faces cujas arestas de interseção não formam ângulos retos entre si. Pertence ao sistema trigonal. 6. Todas as formas do sistema cúbico. Alguns exemplos de formas combinadas do Sistema Cúbico: Combinação de Cubo com Octaedro, aumentando progressivamente as faces do cubo e diminuindo as faces do octaedro: Combinação de Cubo com Rombododecaedro, aumentando progressivamente as faces do rombododecaedro e diminuindo as faces do cubo: Formação de um Cubo-Octaedro distorcido de Fluorita: nesta seqüência, da esquerda para a direita, foi aumentado o tamanho de uma face do octaedro e depois se diminuiu a distância entre duas faces do octaedro opostas: Forma combinada de Cubo {100} e Trapezoedro (ou Icositetraedro) {211}, como ocorre na Analcima, um mineral da Família das Zeolitas, Classe dos Silicatos: 34 35 36 37 38 12. LEIS CRISTALOGRÁFICAS a) Lei da Constância dos Ângulos (Lei de Stenon / Romé de L´Isle 1772) "Numa determinada espécie mineral, o ângulo diedro formado entre duas faces definidas (homólogas), independente das irregularidades de crescimento presentes, é sempre constante nos diferentes cristais de uma mesma espécie mineral". Em outras palavras, a igualdade dos ângulos permanece preservada nas variações de uma mesma forma cristalina, como no exemplo abaixo, de cristais de quartzo: Este ângulo é a única característica real da simetria cristalográfica. Uma face qualquer, portanto, é definida pela sua posição espacial e pode ser substituída por outra qualquer, paralela, uma vez que os ângulos entre faces adjacentes permanecem constantes. Esta Lei é aplicável a todas as propriedades direcionais, não somente às faces (clivagem, por exemplo). Quando as faces análogas de um cristal tiverem o mesmo desenvolvimento, tendo a mesma dimensão, diz-se que a forma resultante é regular. Se o crescimento das faces é perturbado, desenvolvendo-se algumas faces mais que as outras, fala-se em formas distorcidas. Mas, cristalograficamente, as duas formas são equivalentes, pois os ângulos diedros são iguais e a relação das distâncias a que as faces das duas formas cortam os eixos, são as mesmas. Bons exemplos são os seguintes minerais: Calcita : ab = 116 bc = 64 Anfibólio : ab = 124 bc = 56 Piroxênio : ab = 93 bc = 87 39 b) Lei da Racionalidade dos Índices (Lei de Renée Haüy 1881) "Se tomarmos como eixos coordenados as arestas convergentes num vértice do cristal e considerarmos uma face que intercepte esses eixos, a relação entre os parâmetros desta face e os de outra face qualquer, possível ou existente, sempre será expressa por números inteiros, racionais e simples". Parâmetros da face ABC: OA, OB e OC Parâmetros da face A´B´C´: OA´, OB´ e OC´ OA/OA´ : OB/OB´ : OC/OC` = m, n, p. A face ABC determina intersecções sobre os 3 eixos coordenados, sendo arestas de um paralelepípedo primitivo. Como Haüy determinou experimentalmente, os parâmetros m, n e p são números inteiros, simples e pequenos e a relação entre eles é sempre simples e racional (Princípio dos Pequenos Números). 13. HOLOEDRIA E HEMIEDRIA Forma holoédrica é aquela que apresenta o grau de simetria máximo do sistema ao qual pertence. Forma hemiédrica é aquela que apresenta um número menor de faces que o sólido holoédrico correspondente. Portanto, as formas hemiédricas apresentarão simetria reduzida em relação às formas holoédricas de seu sistema. Assim, no sistema cúbico, há 5 classes. A classe da fluorita possui a simetria máxima do sistema e é a classe holoédrica: 3E4 4E3 6E2 C 3P 6P´ As outras 4 classes apresentam simetria menor e são, portanto, as classes hemiédricas, como a classe da cuprita: 3E4 4E3 6E2. O octaedro da classe da fluorita será um sólido holoédrico e o tetraedro da classe da esfalerita será um sólido hemiédrico. 40 14. PROJEÇÕES CRISTALOGRÁFICAS Para representar os cristais foi necessário desenvolver uma sistemática própria, cuja essência consiste em mostrar um cristal tridimensional numa superfície plana bidimensional. Isto se chama “projeção de um cristal”. Há 4 tipos de projeções: A projeção clinográfica é uma espécie de projeção em perspectiva que representa uma imagem semelhante a um retrato de um cristal em duas dimensões. É um desenho de perspectiva sem ponto de fuga, e é o melhor meio de representar um cristal para leigos. Abaixo, você tem um cristal de magnetita (Fe3O4) de forma combinada cúbica (cubo + octaedro + rombododecaedro + trapezoedro) em projeção clinográfica. A projeção esférica é usada para localizar as faces estritamente de acordo com suas relações angulares e sem consideração pelo tamanho ou configuração. A construção desta projeção pode ser imaginada da seguinte maneira: imaginemos um modelo oco de um cristal contendo uma fonte de luz brilhante. Dentro desde modelo se coloca a fonte de luz e o conjunto é colocado dentro de uma grande esfera oca, de tal modo que a fonte
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