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1 ABERRAÇÕES CROMOSSÔMICAS Variações no número e na estrutura dos cromossomos podem ser encontradas na natureza. Estas variações são conhecidas como aberrações cromossômicas e podem ser: 1. ABERRAÇÕES NUMÉRICAS Cada espécie apresenta um número característico de cromossomo. A maioria dos organismos superiores é diplóide e, conse- quentemente, apresentam 2x cromossomos em suas células somáticas e x nas células gaméticas. Nestas espécies também são encontrados indivíduos com número de cromossomos alterados em relação ao estado diplóide. Assim, numa população de milho (Zea mays), cujo genoma é representado por 10 cromossomos, pode-se encontrar plantas com 18, 19, 21, 30, 40 cromossomos, dentre outros. Com relação à variação numérica, os indivíduos podem ser classificados em aneuplóides e euplóides 1.1.Aneuplóides São os que apresentam um conjunto de cromossomos que não corresponde a um múltiplo exato do genoma da espécie. 1.1.1. Tipos de Aneuplóides A tabela a seguir apresenta alguns tipos de aneuplóides com suas respectivas fórmu- las de número de cromossomos. Na tabela é considerada uma espécie de referência cujo genoma é representado por três cromosso- mos (cromossomos A, B e C). Aneuplóide Fórmula Exemplo Nulissômico 2X - 2 (AB) (AB) Monossômico 2X - 1 (ABC)(AB) Trissômico 2X + 1 (ABC)(ABC)(A) Duplo-trisômico 2X +1 + 1 (ABC)(ABC)(A)(B) Monossômico-tris 2X- l + 1 (ABC)(AB)(A) Tetrassômico 2x + 2 (ABC)(ABC)(A)(A) Aneuplóide Ex.: na espécie humana Nulissômico 44 (22 pares) Monossômico 45 (22 pares + 1) Trissômico 47 (23 pares + 1) Duplo-trisômico 48 (23 pares + 1 + 1) Monossômico-tris 46 (22 pares + 1 + 1) Tetrassômico 48 (24 pares) 1.1.2. Descrição de alguns Aneuplóides a) Nulissômico Indivíduo com variação numérica de cromossomo, que se caracteriza por apre- sentar um par de cromossomos a menos em relação ao diplóide normal. b) Monossômico Indivíduo que apresenta um cromos- somo a menos em relação ao diplóide normal. c) Trissômico Indivíduo que apresenta um cromosso- mo a mais em relação ao diplóide. d) Tetrassômico Indivíduo que apresenta um par de cromossomos a mais em relação ao diplóide. 1.1.3. Uso de Aneuplóides em estudos Genéticos Os aneuplóides têm sido utilizados para localizar ou identificar o cromossomo a que um determinado gene pertence. Para este fim é necessário ter à disposição uma série de monossômicos (ou nulissômicos). Série monossômica é um conjunto de populações diferentes em que cada uma apresenta monossomia para um determinado cromossomo. Assim, para o milho (Zea mays), espécie cujo genoma é representado por 10 cromossomos, deve-se ter uma população com monossomia para o cromos- somo 1, outra com monossomia do cromos- somo 2, e assim por diante, até uma 2 população monossômica para o cromossomo 10. Será considerado como ilustração, uma população, cujo genoma é representado por quatro cromossomos. Nesta população surgiu uma forma recessiva de um gene (a) e deseja-se saber em qual cromossomo este gene está localizado. Para isto deve-se fazer o cruzamento deste indivíduo com os estoques monossômicos e através da análise de segregação na progênie pode-se facilmente identificar o cromossomo a que o gene pertence. A seguir é apresentado um exemplo de identificação de cromossomo através do uso de uma série monossômica: A progênie F1 em que manifesta o fenótipo recessivo, por pseudo-dominância, é identificada e utilizada para reconhecer o cromossomo a que pertence o gene estu- dado. Pseudo-dominância é a manifestação de fenótipo recessivo em população suposta- mente portadora de alelo dominante. Ocorre em razão de deficiências e, ou, perda de cromossomos. Indivíduo Normal Estoque Monossômico Genótípo F1 aa 10 22 33 44 AA Aa aa 11 20 33 44 AA Aa aa 11 22 30 44 A Aa:a (1) aa 11 22 33 40 AA Aa 0 : significa a ausência do cromossomo. (1) pseudo-dominância Será considerado agora que se deseja identificar o cromossomo a que pertence a forma homozigota B. Neste caso, deve-se realizar os cruzamentos do quadro abaixo. Neste caso, a progênie F2 em que se manifesta segregação fenotípica diferencia- da é que deve ser identificada e utilizada como indicativo do cromossomo a que pertence o gene estudado. Indivíduo Normal Estoque Monossômico Genótipo F1 F2 BB 10 22 33 44 bb Bb 3B_1bb BB 11 20 33 44 b Bb:B (3B_:1bb)(1B_) BB 11 22 30 44 bb Bb 3B_:1bb BB 11 22 33 40 bb Bb 3B_:1bb 1.2. Euplóides O termo euplóide é aplicado aos organismos que apresentam conjunto de cromossomos igual a um múltiplo exato do número básico da espécie. 1.2.1. Tipos de Euplóides A seguir são apresentadas as fórmulas cromossômicas, referentes a vários tipos de euplóides, e exemplos tomando como refe- rência uma espécie cujo genoma é repre- sentado pelos cromossomos A, B e C. Tipos Fórmula Exemplo Monoplóides x (ABC) Poliplóides Triplóides 3x (ABC) (ABC) (ABC) Autotetraplóide 4x (ABC)(ABC)(ABC)(ABC) Alotetraplóide 2x + 2x' (ABC)(ABC)(A'B'C')(A'B'C) 1.2.2. Efeitos Fenotípicos de Poliplóides As seguintes manifestações fenotípicas estão associadas aos poliplóides: (a) – Formação de órgãos vegetativos gigan- tes. Devido a esta particularidade a poliploi- dia tem merecido grande atenção por parte dos floricultores e horticultores. Exemplos bem sucedidos de poliploidia na floricultura são encontrados no cravo-de-defunto, boca- de-leão, dentre outros. (b) – Formação de órgãos reprodutivos gigantes e de melhor qualidade. As maçãs poliplóides apresentam frutos maiores e de textura de melhor qualidade. Os milhos poliplóides são mais vigorosos e produzem 20% a mais de vitaminas que o milho normal. (c) – Fator de incorporação de resistência a doenças e outras qualidades desejáveis. A 3 espécie Nicotiana tabaco é sensível ao vírus TMV, mas a espécie N. glutinosa é hiper- sensível, o alotetraplóide resultante do cruzamento destas espécies apresenta também a hipersensibilidade. 1.2.3. Descrição de Alguns Euplóides a) Monoplóides A monoploidia, é mais freqüentemente encontrada em certos organismos inferiores tais como fungos. Em organismos superiores a monoploidia é rara e quando ocorre está associada a indivíduos de baixo vigor. Um exemplo de monoploidia é encontrado em abelhas e vespas. O termo monoplóide distingue-se do termo haplóide, pois este é aplicável ao estado gamético do indivíduo. b) Poliplóides Metade dos gêneros das plantas contem poliplóides, sendo que nas gramíneas cerca de 2/3 são poliplóides. Entretanto, a poliploidia é rara nos animais. b.1) Triplóides Os triplóides se caracterizam pela esterilidade (ou sub-fertilidade) devido o processo de gametogênese ser irregular resultando gametas desbalanceados. Os seguintes exemplos podem ser citados: Certos tipos de maçãs são triplóides e suas características são perpetuadas por enxerto e brotamento. Flores de tulipa que são perpetuadas por propagação vegetativa. Melancias 3x, produzidas a partir do cruzamento entre plantas 2x e 4x, não apresentam sementes e são mais doces. Peixes triplóides que devido a esterilidade apresentam maior conversão alimentar. b.2) Autopoliplóide O prefixo auto e utilizado quandoo poliplóide em questão apresenta as seguintes características: Um autopoliplóide é aquele no qual o correspondente diplóide é uma espécie fértil , que reúne genomas idênticos e que apresenta apenas associações multiva- lentes na meiose. Alguns exemplos são: a) trigo: Triticum monococcum é diplóide (2x = 14) e de baixa produtividade, mas o T. dicoccum é tetraplóide e apresenta grãos grandes e duros os quais são usados na produção do macarrão. b) Tomateiros com número de cromossomos acima de 2x são maiores e produzem frutos mais saborosos que os diplóides. b.3) Alopoliplóides O prefixo ‘alo’ é usado quando o poliploíde apresentar as seguintes caracterís- ticas: contém genomas duplicados de um híbrido mais ou menos estéril; apresenta associações bivalentes durante a meiose, comportando-se, em termos de segregação, como um diplóide normal e reúne, em suas células, genomas de diferentes espécies. A seguir estão alguns exemplos de alopoliplói- des: rabanete Raphanus sativus (2x = 18) X brócoli Brassica oleracea (2x' = 18) ↓ F1 : Híbrido (± estéril) (x + x') ↓ F2 : Raphanobrassica (2x + 2x') Infelizmente o alotetrapoliplóide ra- phanobrassica apresenta folhagens de raba- nete e raiz de brócoli, não tendo valor e importância comercial. Spartinna alterniflora (origem EUA) (2x = 60) X Spartina anglica (origem França e Inglaterra) (2x' = 62) ↓ F1 : Híbrido (± estéril) (x + x') ↓ F2: Spartina maritima(2x + 2x') = 122 4 Primula floribunda (2x = 18) X Primula verticilata (2x' = 18) ↓ F1 : Híbrido (± estéril) (x + x') ↓ F2: Primula kewensis (2x + 2x' = 36) Algodão velho mundo (2x=26 Cr. Grandes) X Algodão americano (2x'=26 Cr. Pequenos) ↓ F1 : Híbrido (± estéril) (x + x') ↓ F2: Algodão novo mundo (2x + 2x' = 26G + 26P) 1.2.4. Poliplóides em Animais Apesar da poliploidia ser freqüente em vegetais ela é relativamente rara em animais. As razões para este fato são as seguintes: a) Os animais, em geral, contam com mecanismos de cromossomos sexuais na determinação do sexo. Entretanto a adição de cromossomos sexuais (X e Y) leva à perda de vigor, debilidades físicas e mentais e esterilidade (ou sub-fertilidade). b) Em geral os animais não apresentam mecanismos de propagação assexual para estabilização do híbrido interespecífico. Exceção é encontrada no camarão de água salgada (Artemia salina) que mostra evidên- cias de poliploidia e apresenta como meio de estabilidade a propagação por partenogênese. c) A hibridação interespecífica é muito difícil em função da anatomia, estrutura de grupo e cios apresentados pelos animais. São exemplos de híbridos interespecífico a mula (jumento com égua), o pintagol (canário comum com belga), dentre outros. 2. ABERRAÇÕES ESTRUTURAIS Durante a intérfase quando os cromos- somos estão mais distendidos e metabolica- mente ativos, eles são mais vulneráveis a variações do ambiente que provocam rupturas de sua estrutura. As aberrações estruturais dos cromossomos resultam de quebra cromossômica seguida de reconstitui- ção em uma combinação anormal. Estas variações podem conduzir a variações fenotípicas interessantes, muitas vezes prejudiciais ao desenvolvimento e adaptação do indivíduo. Muitas delas podem ser detectadas a partir de estudos meióticos, evidenciando o pareamento cromossômico que se torna irregular pela variação do padrão normal. Os rearranjos estruturais são definidos como balanceados e não-balanceados. 2.1. Rearranjos não-balanceados São os rearranjos nos quais o conjunto cromossômico possui informações a mais ou a menos. Os rearranjos não-balanceados envolvem: 2.1.1. Deficiências (deleções) Deficiência é o tipo de aberração onde ocorre a ausência de segmentos cromossô- micos envolvendo um ou mais genes. As deficiências podem originar-se por quebra cromossômica e perda do segmento acêntri- co. Em alguns casos, as deficiências ocorrem por um crossing-over desigual entre cromossomos homólogos desalinhados ou cromátides-irmãs. 5 Os seguintes tipos ocorrem: a) Homozigota terminal Uma deficiência é homozigota quando ocorre em um cromossomo e no seu homó- logo. Ela é terminal quando o segmento cromossômico ausente faz parte da extremi- dade do cromossomo. b) Homozigota intercalar (intersticial) Uma deficiência é intercalar quando envolve a perda de um segmento interme- diário. Apesar de envolver duas quebras a grande maioria das deficiências identifica- das é do tipo intercalar. c) Heterozigota terminal Uma deficiência é heterozigota quando ocorre em apenas em cromossomo, não ocorrendo no homólogo. Apresenta uma sinapse anômala, exibindo um monofila- mento na estrutura bivalente. d) Heterozigota intercalar Uma deficiência heterozigota inter- calar quando envolve a perda de um segmento intermediário em apenas um dos cromossomos. Apresenta uma sinapse anômala, exibindo uma alça no pareamento. 2.1.2. Duplicações Diz respeito a existência de segmentos cromossômicos repetidos ao longo de um determinado cromossomo. Em geral, a duplicação parece ser bem menos nociva que a deleção. As duplicações podem originar-se por crossing-over desigual ou por segregação anormal da meiose num portador de uma translocação ou inversão Alguns segmentos do cromossomo, quando duplicados portam-se como domi- nantes e alguns casos como recessivos. Outros mostram herança intermediária e outros têm efeito cumulativo. Têm-se os seguinte tipos de duplicações: a) Homozigota terminal Uma duplicação homozigota e terminal quando ocorre em um cromossomo e no seu homólogo e o segmento cromossômico du- plicado faz parte da extremidade do cromos- somo. b) Homozigota intercalar (intersticial) Uma duplicação é homozigota e inter- calar quando envolve a duplicação de um segmento intermediário em ambos os homólogos. c) Heterozigota terminal Uma deficiência é heterozigota termi- nal quando ocorre em apenas em cromos- somo, não ocorrendo no homólogo e envolve um segmento da extremidade cromossômica. Apresenta uma sinapse anômala, à semelhan- ça das duplicações. d) Heterozigota intercalar Uma duplicação heterozigota intercalar ocorre quando envolve a duplicação de um segmento intermediário em apenas um dos cromossomos. Apresenta uma sinapse anô- mala, à semelhança das duplicações. 2.1.3. Cromossomos em anel As deleções terminais nos dois braços de um cromossomo podem dar origem a um 6 cromossomo em anel, se as extremidades livres fraturadas se soldarem. Os cromossomos em anel podem dividir-se normalmente durante a mitose ou meiose, mas sujeitos à degeneração. 2.1.4. Isocromossomos São cromossomos que apresentam deficiência total de um dos braços e duplicação completa do outro. Uma hipótese plausível é a que considera a possibilidade de um cromos- somo sofrer fratura exatamente junto ao centrômero, pouco antes da anáfase mitótica ou da meiose II. 2.1.5. Cromossomos dicêntricos São cromossomos que apresentam dois centrômeros. Os cromossomosdicêntricos tendem a quebrar-se na anáfase, se os dois centrômeros estiverem próximos, se um centrômero for inativado, um cromossomo dicêntrico pode ser estável. 2.2. Rearranjos balanceados Quando o conjunto cromossômico possui o complemento normal de informa- ções. Todas as informações genéticas estão presentes, mas acondicionadas de modo diferente. 2.2.1. Translocações São aberrações onde ocorrem transfe- rência de segmentos cromossômicos entre cromátides de cromossomos não homólogos. Existem dois tipos principais: a) Translocação Recíproca Resultam de quebra de cromossomos não homólogos, com trocas recíprocas de segmentos soltos. Quando os cromossomos de uma translocação recíproca balanceada se pareiam na meiose, forma-se uma figura quadrirradial (em forma de cruz). Os gametas formados dependem do tipo de segregação, que pode ser: (a) Alternada; (b) Adjacente I; e (c) Adjacente II. A segregação adjacente II é menos freqüente pois permite que centrômero de cromossomos homólogos se localizem em um mesmo gameta. Devido a este fato a porcentagem de gametas estéreis é inferior a 2/3. 7 b) Translocações robertsonianas Envolve dois cromossomos acrocên- tricos que se fundem próximos à região do centrômero com perda dos braços curtos. Na espécie humana o cariótipo balanceado resultante tem apenas 45 cromossomos, incluindo o cromossomo com translocação, que na verdade é constituído pelos braços longos de dois cromossomos. Como, na espécie humana, os braços curtos dos cinco pares de cromossomos acrocêntricos possuem cópias múltiplas de genes do RNA ribossômico, a perda dos braços curtos de dois destes cromossomos não é nociva. 8 Na figura anterior temos cromossomos dos gametas que podem ser produzidos por um portador de uma translocação robertsoniana, t(14q21q) Embora o portador de uma translocação robertsoniana seja fenotipicamente normal, há um risco de gametas não-balanceados e de prole não- balanceada. 2.2.3. Inversões São aberrações cromossômicas em que um determinado segmento cromos-sômico sofre uma quebra e são reinseridos em ordem inversa. A inversão é dita paracêntrica se as quebras ocorrerem em um mesmo braço cromossômico, e é denominda pericêntrica se o fragmento cromossômico invertido incluir o centrômero. Apresentam os seguintes tipos: a) Homozigota paracêntrica A inversão ocorre no cromossomo e no seu homólogo. O centrômero localiza-se fora do segmento invertido. b) Homozigota pericêntrica O centrômero localiza-se dentro da região invertida. A inversão envolve os dois cromossomos do par de homólogos. c) Heterozigota paracêntrica A inversão ocorre apenas em um dos cromossomos do par de homólogos. O centrômero localiza-se fora do segmento invertido. Apresenta uma sinapse anômala, caracterizada pela formação de alça e laço cromossômico. d) Heterozigota pericêntrica A inversão ocorre apenas em um dos cromossomos do par de homólogos. O centrômero localiza-se dentro do segmento invertido. Apresenta uma sinapse anômala, caracterizada pela formação de alça e laço cromossômico. Quando uma inversão está presente, uma alça é formada durante o pareamento dos cromossomos na meiose I. A ocorrência de uma permuta no local de uma inversão paracêntrica fará com que de cada bivalente surjam dois cromossomos gaméticos anormais (um dicêntrico e outro acêntrico), um normal e outro com a inversão original: A ocorrência de permuta em uma inversão pericêntrica fará com que um bivalente dê origem a dois cromossomos anormais (ambos com uma deficiência e uma duplicação), um cromossomo normal e outro com a inversão original. Uma inversão geralmente não causa um fenótipo anormal nos portadores. Sua importância é para a progênie, pois há o risco de produzir gametas anormais que podem levar a uma prole não-balanceada. 2.2.4. Inserções É um tipo não recíproco de translocação que ocorre quando um segmento removido de um cromossomo é inserido num cromossomo diferente, em sua orientação habitual ou invertida. Como exigem três quebras cromossômicas, as inserções são relativamente raras. 3. ABERRAÇÕES CROMOSSOMICAS NA ESPÉCIE HUMANA Os distúrbios cromossômicos consti- tuem uma categoria importante de doenças genéticas, respondendo por grande proporção de todo o desperdício reprodutivo, mal- formação congênita e retardamento mental que ocorre na espécie humana. As anorma- 9 lidades cromossômicas são responsáveis por 60 ou mais síndromes identificáveis, que coletivamente são mais comuns que todos os distúrbios mendelianos monogênicos juntos. Estima-se que afetam 0,7 % dos nascidos vivos; 2,0 % das gestações em mulheres com mais de 35 anos e 50% dos abortos espontâneos no primeiro trimestre. As anormalidades cromossômicas po- dem ser numéricas ou estruturais. O tipo mais comum é a aneuploidia (nº anormal de cromossomos – extras ou inexistentes). As translocações recíprocas (troca de segmentos entre cromossomos não homólogos) também são relativamente comuns. A freqüência dos distúrbios cromossô- micos, em 10.000 (dez mil) concepções, está representada no quadro abaixo. Tabela 3.1. Resultado de 10.000 (dez mil) Concepções Abortos espontâneos Resultado Concepções nº % Nativivos Total 10.000 1.500 15,0 8.500 Cromossomos normais 9.200 750 8,0 8.450 Cromossomos anormais Total 800 750 94,0 50 Triplóide/tetraplóide 170 170 100,0 - 45, X 140 139 99,0 1 Trissomia do 16 112 112 100,0 - Trissomia do 18 20 19 95,0 1 Trissomia do 21 45 35 78,0 10 Trissomia, outra 209 208 99,5 1 47, XXY, 47, XXX, 47, XYY 19 4 21,0 15 Rearranjos não balanceados 27 23 85,0 4 Rearranjos balanceados 19 3 16,0 16 Outros 39 37 95,0 2 3.1. Anormalidades no nº de cromossomos Um número de cromossomos que não o normal (na espécie humana = 46) é denominado heteroplóide. Um múltiplo exato do número haplóide (n) de cromosso- mos chama-se euplóide, e qualquer outro número é aneuplóide. No homem, os principais distúrbios numéricos são três trissomias autossômicas: do cromossomo 21 (síndrome de Down), do cromossomo 18 (síndrome de Edwards) e do cromossomo 13 (síndrome de Patau); e quatro tipos de aneuploidias dos cromosso- mos sexuais: síndrome de Turner (geralmen- te 45, X), síndrome de Klinefelter (47, XXY), duplo Y (47, XYY) e poli X (47, XXX). A triploidia e a tetraploidia são responsáveis por pequena porcentagem dos casos, sobretudo em abortos espontâneos. 3.1.1. Euploidia Existem relatos de complementos cromossômicos euplóides na espécie humana. Foi observado a triploidia (3n) e a tetraploidia (4n) em fetos, sendo que alguns bebês triplóides nasceram vivos, embora sua sobrevida fosse curta. A triploidia resulta provavelmente de falha de uma das divisões da maturação ovócito ou, geralmente no espermatozóide. Os tetraplóides (4n) sempre são 92, XXXX ou 92, XXYY, sugerindo que a tetraploidia 10 resulta de uma falha da conclusão de uma divisão por clivagem inicial do zigoto. 3.1.2. Aneuploidia A aneuploidia é o tipo mais comum e significativo de distúrbio dos cromossomos humanos, ocorrendo em pelomenos 3 a 4% das gestações reconhecidas. A maioria dos pacientes aneuplóides apresenta trissomia ou, menos freqüentemen- te monossomia. As causas da aneuploidia ainda não são bem compreendidas, mas sabe-se que que o mecanismo cromossômico mais comum é a não disjunção meiótica, uma falha da separação de um par de cromossomos durante uma das duas divisões meióticas, em geral durante a meiose I. 3.1.2.1. Aneuploidia dos Cromossomos Autossomos a) Síndrome de Down – Trissomia do 21 A Síndrome de Down (trissomia do cromossomo 21) é sem dúvida o distúrbio cromossômico mais comum e mais bem conhecido e a causa genética mais comum do retardamento mental moderado. Cerca de 1 criança em 800 nasce com esta síndrome. Em aproximadamente 92% dos portadores da SD observa-se um cromossomo 21 extra em todas as células. Em 3 a 4% dos casos o cromossomo 21 extra está ligado a outro cromossomo, freqüentemente ao 14. Este rearranjo cromossômico é denominado translocação robertsoniana. O indivíduo, neste caso, apresenta 46 cromossomos. As características clínicas da SD incluem retardo de crescimento, vários graus de retardo mental, e um espectro de anomalias somáticas incluindo características faciais e cranianas que fizeram, no passado, com que tal condição recebesse a designação de mongolismo. Estas características incluem face e occipúcio achatados, elevação da fenda palpebral e uma prega no canto interno do olho (pregas epicânticas), bem como orelhas pequenas. Há um aumento de 15 vezes do risco de leucemia e 40% dos portadores tem doença cardíaca significativa. Há uma correlação importante entre a concepção de crianças com Síndrome de Down e a idade materna. Após os 35 anos a mulher tem maior probabilidade de Ter filhos com a SD. Aos 20 anos o risco é de 1:1.600 nascimentos, enquanto aos 35 anos é de 1 em 370. A SD ocorre em todas as raças e em ambos os sexos. As mulheres com SD são férteis e apresentam risco de 50% de apresentarem crianças também afetadas, enquanto que os homens dificilmente se reproduzem. b) Síndrome de Patau – Trissomia do 13 A freqüência desta anomalia cromossômica é de cerca de 1 em 15.000 nativivos. Aproximadamente metade destas crianças morre durante o primeiro mês de vida. Caracteristicamente, elas apresentam uma falha no desenvolvimento normal do cérebro, chamada holoprosencefalia, na qual ocorre ausência da formação normal do córtex frontal. Existem anomalias associadas do crânio e face incluindo fenda labial e palatina, e anomalias da face média. Defeitos peculiares do escalpo são característicos desta síndrome, bem como a polidactilia (dedos e artelhos extras). Sofrem retardo no crescimento e severo retardo no desenvolvimento. c) Síndrome de Edwards – Trissomia do 18 A incidência desta anomalia em nativivos é de aproximadamente 1 em 8.000. A sobrevida pós-natal é baixa; a sobrevida durante mais do que alguns meses é rara, mas há relatos de crianças afetadas com 15 anos de idade ou mais. Cerca de 80% dos pacientes são do sexo feminino, talvez por causa de sobrevida preferencial. 11 As manifestações da trissomia do 18 sempre incluem retardamento mental e atraso do crescimento e. muitas vezes, malformação intensa do coração. A cabeça possui um occipúcio proeminente e a mandíbula é recuada. As orelhas são de implantação baixa e malformadas. O esterno é curto. Os punhos são cerrados de modo típico, o segundo e quinto dedos sobrepondo-se ao terceiro e quarto. Os pés tem plantas arqueadas, com calcâneos proeminentes. 3.1.2.2. Aneuploidia dos Cromossomos Sexuais a) Síndrome de Klinefelter (47, XXY) Trata-se da reversão sexual do indivíduo masculino em direção ao sexo feminino. A incidência é de cerca de 1 em 1.000 meninos nativivos (1 em 2.000 nascimentos totais). Os pacientes são altos e magros, com membros inferiores relativa- mente longos. Parecem fisicamente normais até a puberdade, quando os sinais de hipogonadismo se tornam óbvios. Os testículos permanecem pequenos e os caracteres sexuais secundários continuam subdesenvolvidos. Os indivíduos com Klinefelter geralmente são inférteis. Cerca de 65% deles apresentam problemas educacionais. Podem ter má adaptação psicossocial. Entretanto alguns são imperceptíveis. Estes indivíduos podem se casar e a consumação pode ser efetuada de forma legal. A Constituição cromossômica é de 44 autossomais XXY. É considerado também o indivíduo XXYY. Indivíduos XXXY ou XXXXY são considerados como extremo de Klinefelter. A causa principal é a anomalia meiótica, por exemplo, uma não- disjunção das cromátides tanto na ovogênese quanto na espermatogênese (em menor probabilidade). b) Síndrome de Turner (45, X) Reversão sexual do indivíduo do sexo feminino em direção ao sexo masculino. Ocorre com uma taxa de 0,2 a 0,3 em cada 1.000 indivíduos. Como sintomas mais característicos destacam-se a estatura mais baixa, pescoço alado, e infertilidade (gôno- das vestigiais). Apresentam inteligência normal e raros problemas de comporta- mento. A constituição cromossômica é 44 autossomais + XO. c) Duplo Y (47, XYY) A constituição cromossômica 47, XYY não está associada a nenhum fenótipo obviamente anormal. A freqüência deste cariótipo é de cerca de 1 em 1.000 meninos nativivos. São indivíduos altos e tem um risco aumentado de problemas de comportamento. Possuem inteligência normal e não são dismórficos. São comumente encontrados em hospícios e hospitais, a prevalência deste genótipo na população é de 0,11% contra 3% nas instituições para criminosos insanos. Entre os criminosos insanos com alta estatura a taxa de YY é de 20%. No entanto a razão de serem encontrados também em prisões não está associada a taras sexuais. A fertilidade é regular e parece não haver nenhum risco aumentado de que um homem 47, XYY tenha um filho com cromossomos anormais. d) Poli X O cariótipo 47,XXX é citado como sendo a mais comum anomalia do cromossomo X encontrada em mulheres. Está presente em cerca de 1:1.250 nascimentos femininos. As mulheres triplo X em geral são altas, 70% delas apresentam problemas educacionais. O desenvolvimento sexual geralmente é normal. Não há anomalias anatômicas descritas nestes casos. 12 3.2. Anormalidades da estrutura dos cromossomos Os rearranjos estruturais resultam de quebra cromossômica, seguida de reconsti- tuição numa combinação anormal. A troca de partes de cromossomos ocorre espontaneamente numa baixa freqüência. Também pode ser induzida por agentes causadores de quebras (clastógenos) tais como: radiações ionizantes, algumas infecções virais e muitas substâncias químicas. Os rearranjos estruturais são definidos como balanceados, se o conjunto de cro- mossomos possuir o complemento normal de informações genéticas, ou não-balanceados, se houver informações a mais ou a menos. 3.2.1. Rearranjos não-balanceados Nos rearranjos não-balanceados o fenótipo provavelmente é anormal por causa de deleção, duplicação, ou (em alguns casos) ambas. A duplicação de parte de um cromos- somo é comparável à trissomia parcial; a deleção acarreta uma monossomia parcial. Existem duas síndromes de deleção autossômica bem delineadas, uma com grave retardamentomental associada a deleção de parte do cromossomo 4p (síndrome 4p - ) e a outra a síndrome do miado do gato (ou 5p - ). Os rearranjos não balanceados podem ser: deleções, duplicações, cromossomos em anel, isocromossomos, cromossomos dicên- tricos 3.2.1.1. Sindrome do miado do Gato (5p– ) Deleção do braço curto do cromosso- mo 5. Tal síndrome recebeu esse nome em virtude do choro típico dos pacientes afetados, o qual lembra o miado de gatos. Outras características são hipotonia muscu- lar, microcefalia, pavilhão das orelhas dis- mórficos, pregas epicântricas, malformações dos membros. 2.2. Rearranjos balanceados Os rearranjos cromossômicos não costumam ter nenhum efeito fenotípico se forem balanceados, porque todas as infor- mações genéticas estão presentes, embora acondicionadas de modo diferente. Contudo os rearranjos estruturais representam uma ameaça a geração seguinte, porque os porta- dores produzem uma alta freqüência de gametas não balanceados e, portanto, têm um risco aumentado de uma progênie anormal – com cariótipos não balanceados. Os rearranjos balanceados podem ser: inversão, inserções, translocações recíprocas e translocações robertsonianas. 3.3. Mosaicismo Quando uma pessoa tem uma anormalidade cromossômica, esta geralmen- te está presente em todas as células cultivadas. Contudo, às vezes detectam-se dois ou mais complementos cromossômicos diferentes no mesmo indivíduo. Tal situação é denominada mosaicismo. O mosaicismo pode ser numérico ou estrutural. Uma causa comum de mosaicismo é a não-disjunção numa divisão mitótica pós zigótica inicial. Por exemplo, um zigoto com um cromossomo 21 extra pode perdê-lo numa divisão mitótica e desenvolver-se como um mosaíco 46/47, +21. 4. EXERCÍCIOS 4.1. Uma espécie diplóide 2n = 2x = 18 foi tratada com colchicina para obtenção de autopoliplóides. (a) Quantos cromossomos são esperados nas células somáticas dos poliplóides resultantes de uma, duas e três mitoses sucessivas na presença desse alcalóide? (b) Como atua a colchicina? 4.2. A partir do cruzamento de uma linhagem de cenoura de raiz amarela (yy) com outra de raiz branca (YY), a qual foi submetida a radiações ionizantes, foram observadas na F1 algumas plantas de raízes amarelas. Que tipo de aberração cromossômica estrutural pode- ria explicar esse resultado? Justifique. 4.3. Melhoristas japoneses conseguiram obter melancias triplóides, as quais apresentam a vantagem de não possuir 13 sementes. (a) Sugira a metodologia que deve ter sido utilizada para a obtenção desse triplóide. (b) Qual a razão dessa melancia não possuir sementes? 4.4. Qual(is) das seguintes pessoas é (são) fenotipicamente normal(is)? (a) Uma mu- lher com 45 cromossomos, incluindo uma translocação robertsoniana entre os cromos- somos 14 e 21. (b) Uma mulher com 46 cromossomos, incluindo uma translocação robertsoniana entre os cromossomos 14 e 21. (c) Uma mulher com cariótipo 47,XX + 18. (d) Uma pessoas com translocação recí-proca balanceada. Que tipos de gametas cada um desses indivíduos produz? Que tipos de progênie poderiam resultar, supondo que o outro genitor é cromossomicamente normal? 4.5. Para cada uma das situações a seguir, estabeleça se a análise cromossômica está ou não indicada. Para Qual(is) membro(s) da família, se for indicada? Que tipo de anormalidade cromossômica a família esta- ria sob risco em cada caso? (a) Uma mulher grávida de 29 anos e seu marido de 41 anos, sem história de defeitos genéticos. (b) Uma mulher grávida de 41 anos e seu marido de 29 anos, sem história de defeitos genéticos. (c) Um casal cujo único filho tem a síndro- me de Down. (d) Um casal cujo único filho tem distrofia muscular Duchenne. (e) Um casal que tem dois filhos intensamente retar- dados com neurofibromatose, distúrbio autossômico dominante em geral não associado a retardamento. 4.6. Um recém-nascido com síndrome de Down, quando cariotipado, apresenta duas linhagens celulares: 70 % das suas células possuem o típico cariótipo 47,XX + 21 e 30 % são normais com 46, XX. Quando, provavelmente ocorreu o evento não-disjun- cional? Qual o prognóstico desta criança? 4.7. Se um segmento cromossômico normal é da seguinte forma ...abcd.efghijl...; e um segmento alterado ...abcfe.dghijl.... Que tipo de alteração ocorreu? 5. BIBLIOGRAFIA RECOMENDADA BEIGUELMAN, B. Citogenética Humana. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1982. GARDNER, E.J.; SNUSTAD, D.P. Aberrações cromossômicas. In: ___. Genética. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1987. cap. 12, p.333-353. GARDNER, E.J.; SNUSTAD, D.P. Variações do número cromossômico. In: ___. Genética. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1987. cap. 13, p.355-376. RAMALHO, M.A.P., SANTOS, J.B. dos, PINTO, C.A.B.P. Aberrações cromossômicas. In: ___. Genética na agropecuária. São Paulo: Globo, 1989. cap. 13, p. 249-276. THOMPSON, M.W.; MCINNES, R.R.; WILLARD, H.F. Citogenética clínica: princípios gerais e anormalidades autossômicas. In: ____. Thompson & Thompson: genética médica. 5.ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1993. cap. 9, p.138-157.
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