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Impacto Cultural do Contato entre Europeus e Índios

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Aula 1: O Impacto Cultural do Contato entre Europeus e Índios. O século XVI.
 
O objetivo da primeira aula é analisar as diversas percepções construídas pelo europeu sobre os índios, visões que se diferenciam de acordo com as relações estabelecidas: para os portugueses, os colonizadores de fato, as imagens vão desde argila moldável, tabula rasa, página em branco até cães canibais, gentio insubmisso. Já para os franceses, comerciantes ocasionais, eles são os selvagens. Pretende-se refletir sobre os aldeamentos jesuíticos e seu importante papel na aculturação do indígena.
Fique atento aos livros que servirão de base para o conteúdo das aulas, bem como para sua consulta:
 Aula 1 – Vinda e chegada dos portugueses
Quando os portugueses chegaram ao que hoje se conhece como Brasil, não encontraram o ouro e a prata tão sonhados no Velho Continente, nem reinos perdidos habitados por ciclopes e figuras que assinalavam a força que o paganismo ainda exercia na mentalidade dos povos fervorosamente cristãos da Península Ibérica. Mas assim como os espanhóis - oito anos antes - a frota comandada por Pedro Álvares Cabral encontrou um Novo Mundo. Assim como testemunhado por Pero Vaz de Caminha, esse Novo Mundo era habitando por homens e mulheres pardos, que andavam nus e que não se importavam em cobrir suas vergonhas.
A diferenciação dos Índios pelo Portugueses
Os indígenas que habitavam a “recém descoberta portuguesa” eram muito mais diversos do que os lusitanos haviam imaginado. Após os contatos iniciais, os colonos portugueses acabaram fazendo uma distinção da população indígena em dois grandes grupos:
 1 - Tupi-Guarani
O primeiro, que ficou conhecido como tupi-guarani graças às semelhanças linguísticas observadas, abarcava uma série de sociedades que vivia na extensa região litorânea desde São Vicente (no sul) até o Maranhão. Tupinambás, tupiniquins, tupinaê e guaranis são exemplos de sociedades indígenas que faziam parte da família linguística tupi-guarani.
2 - Tapuias
No outro grupo estavam os tapuias (palavra tupi que significa os “fugidos da aldeia”, ou “aqueles de língua enrolada”) que ocupavam regiões mais interioranas. Ao que tudo indica, os portugueses acabaram se apropriando da diferenciação que os tupi-guaranis faziam em relação aos grupos que não faziam parte da sua matriz linguística, colocando sob a mesma nomenclatura sociedades indígenas extremamente diversas como os cariris, jês, e os caraíbas.
 Ao descrever os aimorés (um dos tantos povos classificados como tapuias), o português Gabriel Soares de Souza disse:
“Descendem estes aimorés de outros gentios a que chamam tapuias, dos quais nos tempos de atrás se ausentaram certos casais, e foram-se para umas serras mui ásperas, fugindo a um desbarate, em que os puseram seus contrários, onde residiram muitos anos sem verem outra gente; e os que destes descenderam, vieram a perder a linguagem e fizeram outra nova que se não entende de nenhuma outra nação do gentio de todo este Estado do Brasil”
Gabriel Soares de Souza, Tratado descritivo do Brasil, 1587, pp.78-79.
 
Dentre os tupi-guaranis, a sociedade tupinambá acabou tornando-se uma das mais conhecidas, graças ao intenso contato com os portugueses durante os séculos XVI e XVII. O historiador Stuart Schwartz salientou que os tupinambás viviam em aldeias que possuíam de quatrocentos a oitocentos indivíduos. Tais aldeias eram divididas em unidades familiares que viviam em até oito malocas. As unidades familiares, por sua vez, estavam estruturadas pelo parentesco familiar e obedeciam à divisão sexual do trabalho: grosso modo, aos homens cabiam as atividades de caça, pesca e de guerra, e às mulheres o cuidado com a agricultura e com a casa.
A agricultura era uma prática que diferenciava os tupinambás dos demais povos tupi-guaranis. Para preparar o solo para a semeadura, os tupinambás desenvolveram uma técnica que rapidamente foi incorporada pelos colonos portugueses: a coivara. Essa técnica consistia na abertura de clareiras em determinadas áreas florestais, que em seguida eram queimadas. As cinzas resultantes desse processo eram utilizadas como fertilizantes do solo que, em seguida, era semeado pelas mulheres da aldeia. Dentre os gêneros cultivados estavam o feijão, milho, abóbora, algumas frutas e, principalmente, a mandioca - base da alimentação tupinambá e, mais tarde, de toda a colônia.
Outra característica marcante dos tupinambás era seu ímpeto guerreiro. A guerra tinha funções econômicas e simbólicas para esse povo, na medida em que viabilizava a obtenção de prisioneiros de guerra e a ampliação territorial, além de criar uma intricada rede de status que definia diversos aspectos da vida em sociedade, sobretudo os matrimônios.
Junto com a guerra, os tupinambás praticavam o canibalismo ritual que causou horror e curiosidade aos colonos portugueses. Baseado na cosmogonia tupinambá, o canibalismo era um ritual antropofágico, no qual o inimigo prisioneiro de guerra era (depois de uma iniciação), morto pela sociedade vitoriosa, e tinha suas partes distribuídas dentre os indivíduos do grupo vencedor. A ideia era se alimentar (simbolicamente) das características do oponente.
 Como sugerido há pouco, traçar padrões culturais e sociais dos tapuias é uma tarefa muito difícil, na medida em que eles não formavam um grupo que se identificava como tal. Estudos recentes apontam que os tapuias pertenciam a diferentes troncos linguísticos, ou seja: eles eram os “não-tupis”, o que significa que eles eram muitas coisas.
Um dos povos tapuias mais estudados é o aimoré devido à frequente resistência imposta ao aldeamento e catequese portuguesa. Pertencentes ao grupo etnográfico jê, os aimorés, também conhecidos como botocudos, habitavam o que hoje é o estado do Espírito Santo e o Sul da Bahia.
Eram seminômades, não praticavam a agricultura e tinham uma vida bélica muito desenvolvida, o que só se intensificou com a chegada dos portugueses. A relação entre colonos e aimorés foi tão estremecida que, além de protagonizarem uma das mais importantes rebeliões indígenas da história brasileira (a Confederação dos Tamoios), os aimorés foram os únicos que estavam excluídos da proteção contra a escravização do gentio, promulgada pela Coroa portuguesa em 1570.
Todavia, durante muitos anos, a diversidade indígena e a própria Ilha de Vera Cruz, pareciam não ter despertado o interesse da Coroa portuguesa. Como apontou Manuela Carneiro da Cunha: “todo o interesse, todo o imaginário português se concentra, à época, nas índias, enquanto espanhóis, franceses, holandeses, ingleses estão fascinados pelo Novo Mundo” (CUNHA, 1990: 92). Foi justamente esse encantamento que fundamentou a construção das primeiras imagens europeias sobre a nova humanidade que se apresentava.
A inocência e a ausência de elementos fundamentais que – na perspectiva europeia – balizavam a noção de civilização marcaram os primeiros escritos sobre os índios. A despreocupação com a nudez foi reiterada diversas vezes na Carta da Pero Vaz de Caminha, indicando que esses homens e mulheres andavam nus por lhes faltarem a ideia de vergonha. O mesmo Caminha, assim como Vespucci e, mais tarde, Gândavo e Gabriel Soares de Souza ficaram surpresos com o fato dos tupis não terem em seu alfabeto as letras F, L e R.
Segundo esses homens, essa ausência era a comprovação de que os índios viviam sem Justiça e na maior desordem, pois “se não tem F, é porque não tem fé em nenhuma coisa que adorem (...). Se não tem L na sua pronunciação, é porque não tem lei alguma que guardar, nem preceitos para se governarem; e cada um faz a lei a seu modo (...). E se não tem esta letra R na sua pronunciação, é porque não tem rei que os reja, e a quem obedeçam.” (G.S.de Sousa 1971 (1587):302)
 
Catequização dos índios
As constatações apontadas na tela anterior serviram como norte para a atuação dos religiosos europeus. Se por um lado a Coroa portuguesa só passou a se importar efetivamente com sua colônia americana a partirde 1530, desde os primeiros anos de contato diversos religiosos, sobretudo os jesuítas, iniciaram um intenso trabalho com os grupos indígenas que ficou conhecido como catequese. Num primeiro momento, os jesuítas visitavam as aldeias a fim de conhecer um pouco mais a cultura, hábitos e língua dos índios, aproveitando a oportunidade para fazer pregações e alguns batismos.
Feito o contato inicial, os jesuíta passaram para o segundo estágio da catequese: a conversão, propriamente dita, dos índios. Para tanto, os missionários organizaram os povos indígenas em aldeamentos. O objetivo principal era incutir nesses índios valores e práticas europeias. Desse modo, os índios aldeados além de batizados, também recebiam os primeiros ensinamentos católicos, além de ler e escrever.
Segundo os jesuítas, o aldeamento era fundamental, pois apenas essa estrutura permitia que os índios, de fato, tivessem um canto sistemático com os preceitos cristãos. O padre Manoel da Nóbrega foi um dos que defendeu abertamente os aldeamentos, pois, segundo ele os índios eram tão instáveis que, com a mesma facilidade que eram convertidos, logo voltavam para “sua rudeza e bestialidade”. (Padre Manoel da Nóbrega). Para facilitar a aprendizagem, muitos jesuítas recorreram às encenações teatrais, o que deu origem a um dos primeiro gêneros literários do Brasil.
Nos aldeamentos, os índios ainda eram treinados para exercer ofícios como tecelões, carpinteiros e ferreiros. Depois do treino, muitos iam trabalhar para colonos sob a tutela dos jesuítas - que eram responsáveis, inclusive, pela definição do pagamento dos índios aldeados. Em muitos casos, os aldeamentos acabavam se transformando em pequenas unidades econômicas, cuja principal mão-de-obra era a indígena. Após a missa, muitos índios iam trabalhar na lavoura que garantia a subsistência de todos. Os aldeamentos também tinham como objetivo acabar com a poligamia indígena e com a liberdade sexual que existia em diferentes sociedades, incutindo o modelo cristão de família.
Como a preocupação maior era a conversão dos índios, os aldeamentos recebiam indivíduos dos mais diferentes grupos e sociedades. Dessa convivência surgiu a língua geral (baseada no tupi) que durante muitos anos foi a mais falada em toda a colônia. Esse convívio mais intenso também possibilitou um conhecimento mais aprofundados dos povos indígenas.
As diferenças sociais e culturais existentes entre os grupos indígenas - ilustradas com os exemplos dos tupinambás e dos aimorés - exerceram grande influência nas relações que esses grupos estabeleceram com os portugueses durante os primeiros anos de contato, e foram fundamentais na construção da tipologia indígena pelos mesmos colonos.
As obras ao lado foram feitas pelo pintor neerlandês Albert Eckhout (1610-1666) são documentos que ajudam a analisar de forma eficiente as duas imagens de índio criadas pelos europeus durante os séculos XVI e XVII. As duas imagens retratam índios “brasileiros”, possivelmente guerreiros, já que ambos estão armados de arcos e flechas. No entanto, a composição das obras apontam que tratavam-se de “tipos” distintos de índios. De um lado, está o tapuia, representado por um homem nu, com brincos e cocares que, em tese, seriam típicos desse povo. Do outro, vê-se um índio tupi, que já tem suas vergonhas escondidas e não utiliza nenhum adorno.
Observa-se então, que o tapuia representa o índio selvagem, que nu e enfeitados de plumas e penas vive no meio da selva. Já o tupi aparece como o índio domesticado, aquele que é passível de salvação e que por isso mesmo já vive em outra “selva”, numa floresta ais civilizada, na qual é possível (ao fundo) ver outros índios trabalhando. Como bem apontado por Manuela Carneiro da Cunha “Em 1500, Caminha viu “gente” em Vera Cruz. Falava-se então de homens e mulheres. O escambo povoou a terra de “brasis” e “brasileiros”. Os engenhos distinguiram o “gentio” insubmisso do “índio” e do “negro da terra” que trabalhavam. [...] Pelo fim do século, estão consolidadas, na realidade, duas imagens de índios que só muito tenuamente se recobrem...” (Cunha: 1990, 109).
 
Aula 2 – Impacto cultural do contato entre índios e europeus
EXTRAÇÃO DE PAU-BRASIL NO SÉCULO XVI
Como bem se sabe Pedro Álvares Cabral chegou ao Brasil em 22 de abril de 1500. No entanto, durante os primeiro anos do século XVI os portugueses estavam mais preocupados em participar do comércio feito no Oceano Índico, no qual produtos de grande valor como ouro, prata, seda e especiarias eram negociados. A Coroa portuguesa só foi se preocupar, de fato, com suas terras americanas a partir de 1530.
Dessa feita, os primeiros anos da presença portuguesa no Novo Mundo foram marcados pela atuação dos jesuítas na conversão dos grupos indígenas (por meio da catequese e do aldeamento) e de ações particulares de colonos portugueses que estavam interessados, sobretudo, na extração do pau-Brasil, obtido por meio do trabalho indígena.
 Capitanias Hereditárias
A partir de 1530, a concorrência do comércio do Índico trouxe inúmeros prejuízos aos portugueses, que também começavam a ter suas terras americanas invadidas por outras nações europeias. Era preciso efetivar a presença da Coroa lusitana no outro lado do Atlântico a fim de garantir a posse de suas terras e de conseguir tirar mais proveito da recente aquisição.
A primeira medida tomada pela Coroa Portuguesa data de 1534. Nesse ano, a América Portuguesa foi dividia em dezesseis grandes faixas de terra chamadas de capitanias hereditárias.
Cada uma dessas capitanias seria doada pelo rei a um nobre português (chamado de donatário) que deveria construir vilas, arrecadar impostos e, principalmente, redistribuir a terra para quem pudesse cultivá-la. No entanto, muitos donatários não cumpriram suas obrigações, sendo que alguns chegaram a nunca colocar seus pés em terras brasileiras.
A ineficiência do sistema de capitanias fez com que o rei português tentasse outra forma de administração. Em 1548 foi instituído o governo-geral, uma tentativa de centralizar a administração da América portuguesa.
 Governo Geral
Foi estabelecido em 1548, e o 1º Governador- Geral foi Tomé de Souza, sendo responsável pela construção da cidade de Salvador, na Capitania da Bahia que seria a sede do Governo.
Em 1570(Lei de Liberdade dos Gentios) ficou proibida a escravização de indígenas que foram trocados por africanos, por interesse do coroa portuguesa, uma vez que muitos fidalgos tinham comércio de escravos na guiné.
 
Os colonos que rumaram para outras capitanias, sobretudo aquelas localizadas ao sul da colônia, não respeitaram a lei de rei D. Filipe II. Se para a Coroa portuguesa e para os missionários jesuítas os índios passaram a ser vistos como gentios (ou seja, eram passíveis de salvação), para os colonos que viviam nas capitanias de São Tomé e São Vicente os grupos autóctones rapidamente passaram a ser vistos como negros da terra. Nessas localidades, os indígenas foram escravizados sistematicamente e serviram como mão-de-obra fundamental na expansão territorial levada a cabo pelos colonos paulistas.
No caso das capitanias do Sul, é possível afirmar que a Lei de Liberdade do Gentio (sancionada em 1570) foi letra morta. De acordo com Monteiro, entre os séculos XVI e XVIII era cada vez mais frequente o número de expedições que assaltavam aldeias indígenas transformando seus habitantes em braços para o “serviço obrigatório” (MONTEIRO: 1994, 57). Isso porque, diferentemente do que ocorria na região açucareira da colônia, os paulistas não se inseriram no circuito comercial Atlântico, procurando eles mesmos os braços que iriam trabalhar em suas lavouras. Ao invés de se lançarem para o mar, os paulistas se embrenharam sertão adentro.
Ao analisar a relação entre índios e bandeirantes na origem de São Paulo, o historiador John Monteiro mostrou que a colonização foi um processo plural. Ainda que boa parte da América portuguesa tenha vivenciado experiências comuns advindas do encontro entrecolonos e índios– encontro este que foi marcado pela desintegração de muitas sociedades indígenas e pelo processo de catequização daquelas que conseguiram sobreviver -, a partir de meados do século XVI, a relação entre ambos tomou rumos distintos.
 As Expedições
 O sonho do El Dorado que havia povoado a mente dos primeiros europeus que se lançaram ao mar no século XV, e que em parte havia se materializado em algumas regiões conquistadas pelos espanhóis (como Potosí), ainda acalentava o desejo de muitos colonos portugueses. Foi a procura por ouro e prata que fomentou as primeiras expedições para as regiões interioranas da colônia portuguesa. Entre os anos de 1591 e 1601, o governador geral D. Francisco de Souza armou uma série de expedições em busca de metais preciosos. A vertente paulista, chefiada por João Pereira Botafogo conseguiu encontrar algumas minas próximas à cidade de São Paulo, reacendendo o sonho português. No entanto, as expedições subsequentes não corresponderam ás expectativas criadas pelos colonos.
Ainda que o ouro e a prata não tenham sido encontrados em abundância, a experiência das expedições apresentou um produto extremamente interessante para os colonos: os escravos indígenas. Após terminar seu governo, D. Francisco voltou a Portugal com o intuito de colocar em prática um projeto que visava fomentar a economia das capitanias sulistas da colônia. Com inspiração no modelo da América espanhola, o objetivo era articular diferentes setores econômicos (mineração, agricultura e indústria), tendo como base o uso da mão-de-obra indígena (MONTEIRO: 1994, 59).
Uma vez mais, os colonos portugueses não lograram êxito em suas investidas. Mas a proposta do antigo governador acabou redimensionando os objetivos das expedições para o interior. A busca por ouro deu lugar ao aprisionamento de índios. Embora os colonos utilizassem a procura por metais preciosos frente à Coroa portuguesa - que baixava inúmeras leis proibindo a escravização de indígenas – as expedições organizadas pelos colonos de São Paulo se transformaram em verdadeiras empreitadas escravizadoras.
A rentabilidade da venda dos indígenas escravizados era tamanha, que rapidamente criou-se uma intricada rede de negociações nas capitanias do sul. Praticamente toda a mão-de-obra dessa localidade da colônia era formada por índios escravizados. Os lucros eram tantos que pagavam os custos e riscos de expedições cada vez mais interioranas.
 Aula 3 – Mão de obra indígena e africana e a formação do sistema escravista
Além disso, em meados do século XVI, o valor do escravo africano era relativamente baixo, o que o tornava acessível para muitas pessoas. E, mais do que uma propriedade, o escravo africano representava um investimento, pois, depois de três ou quatro anos, o senhor conseguia recuperar, por meio do trabalho do escravo, o que havia pagado por ele e continuava usufruindo do seu trabalho por muito mais tempo.
Não podemos esquecer que o fato de trabalharem em uma terra totalmente desconhecida também dificultava fugas e possíveis revoltas dos africanos escravizados.
Esses aspectos foram fundamentais na hora de escolher o trabalho compulsório de africanos em detrimento dos indígenas – embora muitos índios tenham trabalhado como escravos na América portuguesa, só que em menor escala.
Fora isso, existiam ainda argumentos religiosos. Na época, a Igreja católica acreditava que os negros africanos não tinham alma. Por isso, o trabalho como escravo seria uma espécie de purgatório em vida para que depois da morte esses homens e mulheres pudessem subir ao reino dos céus.
O fato é que a partir de 1580, africanos de diversas localidades do continente passaram a desembarcar em peso na América portuguesa para trabalhar como escravos em diferentes atividades econômicas.
Os africanos que vieram escravizados para o Brasil tinham origens diversas. O mapa ao lado mostra as diferentes rotas do tráfico de escravos do continente africano para terras brasileiras. Se olharmos o mapa com atenção veremos que existem quatro grandes rotas de comércio.
 
ROTA DO TRÁFICO NEGREIRO
Após a longa travessia, quando finalmente desembarcavam nos portos da América portuguesa, a situação de boa parte dos africanos era péssima. Aqueles que tinham conseguido aguentar a viagem passavam por um breve exame médico e eram rapidamente vendidos.
 
Os africanos mais fragilizados, principalmente aqueles que haviam contraído escorbuto, passavam por um processo de quarentena em galpões localizados na região portuária.
Nesses locais eles recebiam uma alimentação especial para recuperar suas forças o mais rápido possível.
Assim que estivessem mais fortes, eram levados para os mercados onde seriam comprados. A partir de então, o destino desses africanos estava atrelado a de seu senhor e, em muitos casos, eles tinham que continuar a viagem, só que agora pelo interior do Brasil.
Nem todos os africanos recém-chegados resistiam ao período da quarentena. Por isso, era comum encontrar cemitérios nas proximidades do porto. Além dos maus tratos e das doenças adquiridas durante a travessia, muitos escravos boçais, isto é africanos recém-chegados, sofriam de banzo –, uma doença que parecia atacar a alma de alguns africanos que, tomados por uma tristeza profunda, se deixavam morrer.
Para muitos deles era preferível morrer a trabalhar como escravo, pois acreditavam que a morte significava o retorno à sua terra natal, junto a seus ancestrais.
No entanto, a maior parte dos africanos sobrevivia à travessia do atlântico. Dessa forma, o escravo boçal rapidamente era introduzido à sua nova sociedade.
Em seguida, ele recebia ensinamentos básicos do catolicismo, como deveriam se portar perante seu senhor, bem como algumas palavras em português. A partir de então o escravo boçal se juntava ao ladino e ao crioulo na execução das mais variadas tarefas.
Para conseguir cumprir a demanda da produção em larga escala, os escravos enfrentavam jornadas de trabalho que variavam de doze a dezoito horas e eram constantemente vigiados por feitores e capatazes para que otimizassem seu tempo de trabalho.
No ápice da produção do açúcar (século XVI) e do café (século XIX), e no auge do período aurífero (século XVIII), a exploração do escravo era tamanha que a média de vida ativa do cativo variava entre sete e dez anos.
Contudo, estimativas apontam que, mesmo nesse curto tempo de vida ativa, o escravo “pagava” para seu proprietário a quantia que havia sido desembolsada no momento da sua compra e ainda gerava benesses.
A partir do terceiro ano de trabalho, tudo o que era produzido pelo cativo representava lucro ao senhor. Este retorno financeiro relativamente rápido fez com que o escravo fosse visto como uma boa forma de investimento, o que fomentou o tráfico intercontinental de africanos por três séculos.
Essa lógica da exploração total do trabalho escravo intensificou ainda mais a violência inerente à escravidão. Além da obrigação em labutar horas a fio de baixo de sol quente, chuva forte ou em dias frios, o constante reabastecimento de africanos escravizados nos portos do Brasil fez com que muitos proprietários fossem negligentes com os cuidados despendidos aos cativos.
Apesar de cuidados com alimentação, moradia e vestimenta serem de responsabilidade senhorial, a fácil reposição dos escravos ajuda a explicar as péssimas condições de vida que os proprietários ofereciam a seus cativos.
A alimentação que os escravos recebiam costumava ser composta apenas por farinha de mandioca ou de milho, uma porção de carne salgada e, por vezes, um pouco de feijão: o básico para o sustento humano. As roupas desses cativos eram feitas de panos de algodão simples e deveriam durar ao menos um ano.
Muitos escravos que adoeciam eram deixados à própria sorte, pois, como vimos, muitas vezes era mais vantajoso comprar um novo cativo do que cuidar do enfermo.
Junto à rígida e pesada disciplina de trabalho no eito e às chibatas recebidas quando não alcançavama quantidade estipulada de feixes de cana ou cestos de grãos de café, os escravos e escravas ainda enfrentavam outros dois grandes problemas: os acidentes e as condições insalubres de trabalho.
Os acidentes foram comuns nos engenhos de açúcar, mais especificamente:
• Na casa da moenda, onde era extraído o caldo da cana, os cativos que não tomassem cuidado podiam ter o braço inteiro triturado pelas engrenagens ao colocar os feixes de cana na moenda;
• Na casa de purgar, onde o caldo era transformado em melaço, que normalmente era o local de trabalho das escravas, havia sempre o perigo de queimaduras.
As regiões mineradoras também foram palco de acidentes de trabalho. Mesmo que muitos dos africanos escravizados, principalmente os oriundos da Costa da Mina, tivessem conhecimentos milenares sobre mineração aprendidos na África, em diversas ocasiões as minas subterrâneas, que haviam sido cavadas, desabavam, matando dezenas de cativos.
Quando tragédias como essas não ocorriam, os escravos eram obrigados a passar o dia inteiro com parte do corpo submersa nos rios e córregos para realizar o garimpo do ouro.

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