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AT 1 EDUCAÇÃO INCLUSIVA E ESPECIAL 2 322 S U M Á R IO 3 INTRODUÇÃO À EDUCAÇÃO INCLUSIVA 7 UNIDADE 1 – Conceitos e Fundamentos da Educação Inclusiva 9 1.1 Do Processo De Integração Ao Processo De Inclusão 12 1.2 A Valorização Das Diferenças Na Escola Como Fator De Inclusão 15 1.3 A Organização Docente na Educação Inclusiva 20 1.4 Uma Experiência De Pesquisa Sobre Inclusão Na Escola Regular – A Realidade Discursiva Dos Profissionais 24 1.5 Que Caminhos O Professor Deve Percorrer Para Ensinar E Aprender Na Diversidade? 28 1.6 Algumas Competências Didáticas Para a Educação Inclusiva 31 1.7 Quanto Vale A Contribuição Dos Pais No Processo De Inclusão? 33 1.8 Conto De Uma Experiência De Inclusão/Exclusão Escolar De Uma Pessoa Portadora De Deficiência Visual 38 UNIDADE 2 – Considerações Finais 39 UNIDADE 3 – Introdução à Educação Especial 41 UNIDADE 4 – Retrospectiva Histórica da Deficiência: Do Banido ao Cidadão, de excepcional a especial 41 4.1 Da Antiguidade clássica à Idade Média 43 4.2 A Idade Moderna: da extrema ignorância às novas ideias 44 4.3 Contemporaneidade e as garantias atuais 46 UNIDADE 5 – A ONU e As Conferências Mundiais 46 5.1 Declaração Universal dos Direitos Humanos – 1948 – o começo de tudo 46 5.2 Declaração dos direitos das pessoas deficientes – 1975 48 5.3 Conferência de Jomtien – 1990 48 5.4 Declaração de Salamanca – 1994 49 5.5 Convenção da Guatemala – 1999 50 5.6 Declaração de Pequim – 2000 52 5.7 Declaração de Montreal – 2004 52 5.8 Convenção dos direitos da pessoa com deficiência da ONU e seu protocolo facultativo – New York – 2007 55 UNIDADE 6 – A Legislação Brasileira para Educação Especial e Inclusiva 56 6.1 Breve retrospectiva da educação especial no Brasil 57 6.2 Política Nacional para Educação Especial 60 6.3 Diretrizes Nacionais para educação Especial 64 UNIDADE 5 – A Educação Especial e a Terminologia mais recente para a área 68 UNIDADE 8 – A Pedagogia da Negação x Educação na Diversidade 72 UNIDADE 9 – A Formação de Professores: Saberes, Competências e Atitudes 76 REFERÊNCIAS 81 ANEXOS 2 333 INTRODUÇÃO À EDUCAÇÃO INCLUSIVA Ao longo das últimas três décadas até os dias de hoje o tema inclusão escolar continua a ser amplamente discutido nos espaços educativos e entre as pessoas que direta ou indiretamente, se envolvem com este processo na escola ou em diver- sos ambientes sociais, onde há interação de pessoas. Não se pode negar a polêmi- ca que existe em torno das questões que se relacionam com a inclusão nas escolas regulares de alunos com deficiências ou diferenças individuais acentuadas. Para alguns professores, o cotidiano da educação inclusiva é tão complexo que ele se torna difícil de enfrentar, ou até mes- mo, impossível de acontecer algo de novo. Ele se apresenta, às vezes, de forma tão incerta, tão cheia de dúvidas que gera in- segurança e medo de enfrentar situações inesperadas. Isso, porque dependendo da situação a ser encarada poderá represen- tar uma ameaça a identidade do professor como sujeito que ensina. Não há dúvida de que a atividade do- cente não é simples, principalmente, quando se lida com uma heterogeneidade de maior complexidade. A formação do- cente oferecida nos moldes que se apre- senta nas instituições de ensino superior, infelizmente, não favorece uma visão dessa complexidade que há nas relações socioculturais no espaço escolar. Com isso, o profissional terá que adquirir ex- periências e aprender a lidar com todas as situações inesperadas a partir de uma for- mação continuada em serviço e por meio de estudos. No decorrer desta reflexão vamos ten- tar chamar àqueles que se interessam em entender um pouco mais sobre a comple- xidade do processo de inclusão escolar, no sentido de indicar algumas questões que possam favorecer um repensar sobre como desenvolver uma educação inclusi- va, de forma que a própria ação de refletir possa significar mudança. Para início da discussão destacou-se al- guns conceitos e ideias sobre a educação inclusiva. Educadores que se dedicaram à pesquisa sobre essa temática tentaram contextualizar conceitos de um proces- so inclusivo de educação que consideram pertinente ao direito de participação de todos no espaço escolar. Sobretudo, por meio de práticas e ações estruturadas para atender com igualdade a todos. A discussão de ambos educadores mostrou que para se efetivar a educação inclusiva de fato, haverá a necessidade de trans- formações na estrutura e organização do tempo e espaço escolar. Além disso, é preciso haver formação permanente dos profissionais que atuam diretamente com a diversidade sociocultural presente num mesmo espaço educacional escolar. Uma das tentativas de mudanças de paradigma educacional ficou registrada na substituição do termo integração para o termo inclusão. Mudanças de estruturas e paradigmas são muitas vezes, lentas e até dolorosas. Mudar tradições requer pa- ciência, persistência e enfrentamento de resistências e limites. Infelizmente, não se pode afirmar, hoje, que a inclusão como processo de inserção total, se instalou de fato nas escolas brasileiras e substituiu, 4 5 completamente, o modelo da integração, processo parcial de inserção. Neste sentido, há de se perceber que este sonho de incluir todos num mesmo espaço e com as mesmas oportunidades de aprendizado se realiza lentamente, por meio de tentativas, erros e acertos. Assim sendo, torna-se necessário pensar que o processo de educação inclusiva vai exigir de fato mudança de paradigma educacio- nal e o fim da subdivisão do ensino espe- cial e ensino regular. Entretanto, sabe-se que é direito de qualquer pessoa, ocupar um espaço na escola pública, tendo os mesmos direitos e oportunidades para aprender. Se numa visão tradicional de educação o processo de integração imperou como paradigma de educação ideal, na atuali- dade, urge uma mudança de mentalidade. No contexto da inclusão escolar é neces- sário valorizar as diferenças individuais, no sentido de que aprende-se com maior qualidade quando o professor deixa de ser o único detentor do saber. Num es- paço onde as diferenças individuais são respeitadas e valorizadas haverá espaço para a cooperação, para a solidariedade e para as significativas trocas culturais. Nessa ambiência educativa se instala as oportunidades de aprender com os pares, onde todos os alunos se beneficiam aca- demicamente, tendo a chance de expan- dir suas ideias, emoções e potencialida- des que numa outra situação não lhe seria possível. Para se discutir uma forma mais ade- quada de organização da escola para o desenvolvimento da educação inclusiva, recorreu-se a pesquisadores que com per- tinência levantaram importantes ideias teóricas e práticas de como se fazer inclu- são no espaço da escola regular de ensino. Uma ideia que mereceu destaque e que precisa ser levada em conta é o fato de que num processo de educação inclusiva há a necessidade de formação de grupos de estudos e discussões entre os profis- sionais da educação sobre os problemas educacionais nas escolas. O foco central desse modelo educacional precisa se fun- damentar, prioritariamente, na apren- dizagem do aluno. E para assegurar que ocorra a inclusão, se fará necessário, a compreensão de que é fundamental uma aliança entre teoria e prática em qualquer ação pedagógica que venha a ser execu- tada na escola. Ao tratar neste estudo de uma experi- ência de pesquisa de inclusão na escola regular, a ideia foi mostrar um pouco da vi- vência de uma aventura, que buscou res- postas para incertezas e angústias que faziam parte da realidade de uma educa- dora, que buscava conhecer os caminhos que contribuem para a inclusão/exclusão de pessoas com deficiência no cenárioes- colar. Na trajetória de pesquisa, a realidade do cenário revelou a necessidade de maior conhecimento do processo de educação inclusiva por parte dos profissionais. Mos- trou que para se efetivar a inclusão na es- cola regular é preciso conhecer a essência do processo, planejar e organizar as ações educativas. É necessário acreditar que todos os alunos são capazes de aprender e, que a inclusão só se efetiva de fato, quando há reconhecimento das diferen- ças individuais como fator positivo para enriquecimento do espaço cultural. Quan- do há cooperação e busca de estratégias 4 5 para desenvolver uma educação que va- lorize todos os alunos nas suas variadas habilidades e talentos. É válido ressaltar alguns caminhos que são fundamentais ao professor quando este pretende ensinar e aprender na di- versidade. É preciso ter a coragem de mu- dar o que já está pronto, alçar vôos mais altos e vislumbrar novos caminhos quando se pretende ensinar e aprender num pro- cesso de educação inclusiva. A tarefa de ensinar é complexa, pois motivar alguém a aprender depende de estratégias cria- tivas para fazê-lo de forma eficaz. Assim, todo esse processo educacional vai de- mandar do professor não só conhecimen- tos científicos, mas, também uma tomada de atitude para mudar as velhas práticas, tornando-as espaços de interação e de respeito à cultura e ao conhecimento de todos. A seguir, a preocupação ficou em tor- no da discussão de quais competências didáticas poderiam favorecer a educação inclusiva. Ficou registrado que uma edu- cação inclusiva exige uma ação docente dinâmica e inovadora que vai requerer uma formação docente continuada em serviço. Na versão inclusiva os docentes se colocam como gestores da ação edu- cativa, tomam decisões, e têm liderança compartilhada nos diversos espaços das escolas. Neste sentido, o professor busca estratégias específicas de atendimento educacional especializado para atender às necessidades de todos os alunos. Ficou também registrada a importân- cia da parceria dos pais com a escola para favorecer uma melhor qualidade ao pro- cesso de educação inclusiva. Os pais que acompanham o trabalho da escola, que participam de reuniões, que se aliam à es- cola nas suas dificuldades de lidar com as diferenças individuais estão favorecendo o êxito da inclusão. Contudo, torna-se ne- cessário que a escola abra as portas para a família de forma a envolvê-la como força- -tarefa nesse processo inclusivo de edu- cação. Encerrando a presente discussão ficou exposto o conto de uma história relatada por uma pessoa portadora de deficiência visual que descreveu algumas de suas experiências escolares, com o propósito de contribuir para uma reflexão sobre as ações e atitudes dos profissionais que fi- zeram parte do seu processo educativo. É importante observar na presente história certa fragilidade dos professores para li- dar com as diferenças individuais. Pode- -se analisar também, que algumas ações daquela realidade vivida, infelizmente, podem ser associadas a alguns fatos da realidade educacional do momento atual, configurando ações excludentes. Importa ressaltar que o quadro con- ceitual e teórico que fundamentou este estudo não esgotou as ideias que se rela- cionam com o tema educação inclusiva. É importante lembrar, como foi mencionado neste texto, que é necessário e urgente que os profissionais da educação perce- bam a importância da formação continua- da em serviço. Pois esta é estratégia que pode permitir a melhoria das ações educa- tivas, no cenário da educação inclusiva. Portanto, a partir deste estudo, espe- ra-se que haja uma leitura crítica com rela- ção ao processo de inclusão. Vale lembrar que nunca se discutiu tanto, esse tema, como nos dias de hoje. E nessa perspec- tiva, muitos são os desafios a enfrentar e 6 7 toda e qualquer tentativa de desenvolver uma educação que promova a inclusão de todos na escola ou na vida em socieda- de, implicará em mudanças das condições atuais em que se encontram as escolas re- gulares. Então, fique alerta! 6 6 77 UNIDADE 1 – Conceitos e Fundamentos da Educação Inclusiva O conceito de educação inclusiva é amplo e complexo. Ele se expressa em diferentes formas de concepção e con- textos. Para uma melhor compreensão deste estudo é necessário levar em con- ta a questão dos direitos humanos e das diferenças individuais. Sabemos que a inclusão de todos nas escolas brasileiras, ainda, não é uma realidade de fato. Muitos educadores que se dedicam a pesquisas sobre esse assunto revelam que para ha- ver inclusão escolar na realidade das esco- las regulares de ensino há a necessidade de mudanças de paradigmas educacionais e afirmam que, infelizmente, existe uma cultura que persiste em conservar práti- cas excludentes no cenário das escolas. Neste sentido, a presente reflexão, poderá contribuir com algumas questões sobre o desenvolvimento do processo de educação inclusiva. Elas ressaltam a importância de valorizar as diferenças e oportunizar a todos os alunos, o acesso ao espaço escolar e ao conhecimento cientí- fico com igualdade de oportunidades. Antes de abordar algumas reflexões sobre o paradigma da educação inclusiva, considera-se pertinente analisar os con- ceitos de educadores que se dedicaram e ou dedicam a pesquisar sobre esse pro- cesso educacional. Educadores e pessoas que direta ou indiretamente, defendem o direito de todos na escola com as mesmas oportunidades de acesso e permanência e aprendizagem de qualidade. Nas ideias de Stainback (1999), a edu- cação inclusiva é a prática da inclusão es- colar de todos os alunos, independente- mente, de seu talento, deficiência, origem sócio-econômica ou origem cultural onde todos possam se apropriar, igualmente, de todos os benefícios que a escola pode oferecer. A inclusão é um valor. Ela é o que fazemos com todas as crianças. Ela é o que desejamos para nós mesmos. Nesse mo- delo de educação todos os alunos juntos têm o direito à mesma preparação para a vida na comunidade. Baseado neste conceito pode-se afir- mar que esse tipo de educação requer uma transformação dos sistemas de ensi- no no país. As escolas brasileiras se con- figuram, ao longo da história de educação brasileira até os dias de hoje, no retrato de uma educação para uma parcela da socie- dade. As mudanças ocorrem de forma len- ta com relação ao processo de inclusão de todos no espaço educacional escolar. Bas- ta verificar o índice de evasão, repetência e insucesso no processo de aprendizagem dos alunos. Na visão de Mitler (2003), a educação inclusiva se baseia num sistema de valo- res que faz com que todos os alunos se sintam bem vindos à escola e esta celebra a diversidade que tem como base o gêne- ro, a nacionalidade, a raça, a linguagem de origem, o nível de aquisição educacional e cultural, ou a deficiência. Esse modelo de inclusão, porém, implica em uma reforma radical nas escolas em termos de currícu- lo, avaliação, pedagogia e agrupamento dos alunos nas atividades de sala de aula. Implica, também, no preparo apropriado dos professores mediante uma formação de uma educação e desenvolvimento pro- 8 9 fissional contínuo durante a vida profis- sional. A ideia acima revela que o processo para uma educação inclusiva caminha como ex- pressão de luta para o alcance dos direitos humanos, tendo, portanto, a necessidade de amplas transformações. Mantoan(2003), destaca que a educa- ção inclusiva implica em mudança de pa- radigma educacional. É a nossa capacida- de de entender e reconhecer o outro e, assim, ter o privilégio de conviver e com- partilhar com pessoas diferentes de nós. A educação inclusiva acolhe todas as pes- soas, sem exceção. Esse processo prevê ainserção de todos os alunos de forma ra- dical, completa e sistemática. A inclusão escolar é produto de uma educação plural, democrática e transgressora que provoca uma crise de identidade institucional, que por sua vez, abala a identidade dos pro- fessores, pois parte dos mesmos buscam alunos de modelos ideais, permanentes e essenciais. A ideia de aluno ideal pode nos levar a refletir sobre a cultura da homogenei- dade, muitas vezes, desejada por educa- dores que temem mudanças, utilizam de práticas imutáveis e rotineiras e desvalo- rizam as diferenças individuais. O conceito de educação inclusiva nas palavras de Ferreira e Guimarães (2003) se refere ao acesso à escola de todos os alunos, indistintamente, independente- mente, do fato de apresentarem dificul- dades e ou deficiências. Nesse modelo de educação é preciso criar alternativas téc- nico-pedagógicas, psicopedagógicas e so- ciais que possam contribuir para o proces- so de aprendizagem de todas as crianças, e isto requer mudança de antigos para novos paradigmas. E é a partir da compre- ensão de inúmeros aspectos ligados aos conceitos de igualdade e de diferença, é que se pode investir em seres humanos melhores e mais fraternos. E assim sen- do, haverá significativa contribuição para profundas modificações na área educa- cional. De acordo com Guimarães (2003), a in- clusão escolar que funciona se baseia na ideia de que incluir é mais do que criar con- dições para os deficientes, é um desafio que implica em mudança da escola como um todo, partindo do projeto pedagógico, à postura do professor diante dos alunos. Na educação inclusiva não se espera que o aluno com deficiência se integre à escola, mas que esta se transforme de maneira a possibilitar a inserção total dele. Considerando a ideia acima, vale a pena chamar a atenção pelo fato de que a esco- la precisa de transformação para receber qualquer tipo de aluno, mesmo aqueles com deficiência. Valendo-se disso, uma questão merece ser refletida: Há interes- se e vontade política por parte de todos os profissionais das escolas em mudar, radi- calmente, atitudes, práticas e conceitos? Nas últimas décadas, o tema inclusão tem sido palco de debate para educado- res, pais de alunos com deficiências e pes- soas diretamente ligadas a instituições que lutam pela inclusão e valorização das pessoas que portam alguma deficiência ou dificuldades de aprendizagem. Pensar a educação numa lógica inclusiva é pensá- -la em novas perspectivas educacionais, é caminhar para a busca dos direitos, bem como, levantar a bandeira da igualdade no cenário educativo. 8 9 Para discutir com maior propriedade a educação inclusiva, consideramos neces- sário refletir como esse processo surgiu e como ele vem sendo analisado no cenário da educação escolar. 1.1 Do Processo De Integra- ção Ao Processo De Inclusão Para uma maior compreensão das polê- micas que envolvem a ideia dos processos de integração ao processo de inclusão, Mantoan (2003, p. 22) sugere importan- tes reflexões que podem favorecer uma melhor compreensão desses paradigmas educacionais. A discussão sobre integra- ção e inclusão provoca dúvidas devido aos significados semelhantes, porém, ambos se referem à situações de inserção no en- sino regular de maneiras diferentes e se divergem nos fundamentos teórico-me- todológicos. Para iniciar a discussão ela faz o seguinte registro sobre o processo de integração escolar: Os movimentos em favor da integra- ção de crianças com deficiência surgiu nos Países Nórdicos, em 1969, quando se questionaram as práticas sociais e escolares de segregação. Sua noção de base é o princípio de normalização, que não sendo específico da vida escolar, atinge o conjunto de manifestações e atividades humanas e todas as etapas da vida das pessoas, sejam elas afeta- das ou não por uma incapacidade, difi- culdade ou inadaptação. No processo de integração escolar o aluno participa das atividades escolares na sala de aula do ensino regular e tam- bém do ensino de escolas especiais. Assim sendo, esse aluno transita no sistema es- colar regular e especial, em todos os tipos de atendimento, ou seja, classes especiais em escolas comuns, ensino itinerante, sala de recursos, classes hospitalares, en- sino domiciliar e outros. Neste sentido, o aluno é submetido a um processo parcial de inserção, pois o sistema segrega quando oferece serviços educacionais de forma diferenciada para alguns em lugares especiais, ou seja, a es- cola não muda como um todo, mas os alu- nos precisam se deslocar, e mudar para se adaptarem às exigências de um sistema que prima pela homogeneização e nivela- mento da aprendizagem. Assim sendo, o processo de integração tem por objetivo inserir um aluno ou um grupo de alunos, que já foi anteriormente excluído. O sistema de integração na escola de- nota situações de seleção e discrimina- ção, pois nem todos os alunos com defici- ência cabem nas turmas de ensino regular. Há, infelizmente, resistências por parte de algumas escolas em aceitar a presença de pessoas que possuem características marcantes, sejam elas físicas ou mentais. E a situação é mais constrangedora, ain- da, quando a escola nem se quer avalia as reais condições do aluno de participar das atividades cotidianas do espaço educati- vo. Considerando esta situação, percebe- -se que a escola não muda, não avalia suas estruturas, não mexe no sistema que já se encontra enraizado em ideias inflexíveis e rigidamente registradas num modelo cultural que parece se apresentar resis- tente a mudanças. Em situações onde a integração escolar é o único caminho que a escola adota, con- 10 11 cebe-se uma proposta de trabalho menos holística, pois os objetivos educacionais são reduzidos para compensar as dificul- dades de aprendizagem, os currículos são adaptados e as avaliações são especiais limitando a capacidade de transgressão dos limites individuais, ou seja, é prede- terminada a quantidade de conhecimen- tos que o aluno consegue aprender. Com base nesta afirmação, pode-se entender que num sistema de ensino no qual não se acredita na capacidade do ser humano de ser mais e de aprender sempre fica clara a situação de exclusão. A integração escolar pode ser enten- dida como o “especial na educação”, ou seja, a justaposição do ensino especial ao regular, ocasionando um inchaço, desta modalidade, pelo deslocamento de profissionais, recursos, métodos e técnicas da educação especial às esco- las regulares. (MANTOAN, 2003, p. 23) A ideia acima revela que o objetivo da integração escolar se limita a inserir o aluno na escola regular sem mudanças e abolição dos serviços segregados da edu- cação especial. Além disso, essa modali- dade exige que o aluno é que se adapte às exigências do sistema que já encontra alojado. No caso da inclusão escolar, o trata- mento das diferenças tem uma política de organização que se baseia no prin- cípio da igualdade. Esta no sentido de favorecer o direito a ter direitos iguais. Pois a Constituição Federal prescreve no seu Art. 5º que todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer nature- za, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no país a invio- labilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade. O registro deste artigo é claro e objetivo no que se refere aos direitos de qualquer cidadão ter os mesmos direitos. Neste sentido, caberia a qualquer es- cola investir na organização de seu siste- ma de ensino pautado na ideia de inclu- são. Sobre a questão da inclusão escolar, Mantoan (2003) também sugere uma importante contribuição para as escolas brasileiras, no momento em que discute conceitos, alternativas de melhoria da qualidadedo ensino e favorece um novo olhar sobre a questão da valorização das diferenças individuais no espaço da sala de aula e na escola. Ela enfatiza que para a escola ser inclusiva precisa partir de um bom projeto pedagógico que come- ça pela reflexão. Um bom projeto valori- za a cultura, a história e as experiências anteriores da turma. Os alunos precisam de liberdade para aprender do seu modo, de acordo com as suas condições. E isso vale para os estudantes com deficiência ou não. O processo de educação inclusiva exi- ge de fato mudança de paradigma educa- cional. Exige que chegue ao fim a subdi- visão do ensino especial e ensino regular. Pois é direito de qualquer pessoa, ocupar um espaço na escola pública, e ou, na so- ciedade, seja em qualquer tempo ou es- paço, considerando as normativas insti- tuídas em lei. A partir do momento que se instaura a educação inclusiva no meio educativo ha- verá obstáculos reais a serem transpos- tos, pois os impactos da inclusão numa cultura já instalada podem provocar in- segurança, insatisfação, medo e aversão 10 11 ao processo. Além disso, essa nova visão inclusiva de trabalho vai abalar a rotina da massificação dos programas prontos e indiscutíveis e das classes especiais nas escolas que passarão a não existir mais. Assim sendo, todas as turmas da es- cola inclusiva se constituirão em espa- ços da diversidade. Espaço para as trocas culturais, para o respeito à capacidade de cada aluno para aprender dentro do seu tempo. Tais afirmações podem gerar insegurança e até mesmo descrédito de alguns professores que não acreditam neste modelo de educação. A educação inclusiva vai, com certeza, mexer com conceitos, paradigmas e cul- turas cristalizadas de que não é possível trabalhar na perspectiva da igualdade. Mitler (2003) apud Cláudia Werneck que salienta com propriedade a seguinte contribuição “Traga dúvidas e incertezas, doses de ansiedade, construa e descons- trua hipóteses, pois aí reside a base do pensamento científico do novo século . Um século cansado de verdades, mas se- dento de caminhos.” Nessa reflexão presencia-se a emer- gência de mudanças, de posturas cien- tíficas e complexas. O sujeito dessa so- ciedade atual não pode mais conviver com verdades prontas e incontestáveis. É preciso caminhar para frente em busca de novas ideias e resolução para os pro- blemas que afligem. A realidade atual requer mudança de antigos para novos paradigmas. A tran- sição do processo de integração e inclu- são passa por momentos de desafios, incertezas, conflitos, medos e acima de tudo insegurança de se lançar ao novo. Neste sentido, Mitler (2003) apud Morin (2000), que sugere com pertinência a se- guinte ideia que poderia servir de relação com essa transição de processos: Estamos numa época em que temos um velho paradigma, um velho princí- pio que nos obriga a disjuntar, a simpli- ficar, a reduzir, a formalizar sem poder comunicar aquilo que está disjunto e sem poder conceber os conjuntos ou a complexidade do real. Estamos num período “entre dois mundos”: um que está prestes a morrer, mas que não morreu ainda, e outro, que quer nas- cer, mas que não nasceu ainda. Es- tamos numa grande confusão, num desses períodos angustiantes, de nascimentos que se assemelham aos períodos de agonia, de mortes. A atualidade da era do conhecimento, da globalização e da complexidade impri- me muitos desafios para a escola. Sem contar a questão da diversidade cultural que a cada dia evolui com as novas ideias, com as experiências e com as transforma- ções que ocorrem na sociedade de manei- ra muito rápida. Toda essa mudança tende a provocar certa angústia nos professores que se sentem como se estivessem sem- pre defasados diante da sala de aula. Mantoan (2003) apud Mitler (2000), salienta que os professores do ensino regular se consideram despreparados e incompetentes para lidar com as diferen- ças nas salas de aula, especialmente, ao atendimento de alunos com deficiência, pois seus colegas especializados sempre se distinguiram por realizar unicamente esses atendimentos e exageraram essa capacidade de fazê-lo aos olhos de todos. 12 13 De acordo com a autora pode-se anali- sar que há por parte dos professores certa insegurança para lidar com situações que fogem da normalidade da prática comum do cotidiano. O fato dos colegas especiali- zados exagerar na excelência da sua prá- tica acaba favorecendo aos professores da escola regular de ensino o sentimento de incompetência. Vale a pena lembrar que mesmo a par- tir de alguns acontecimentos como semi- nários e congressos destinados a discu- tir a educação inclusiva percebe-se que a prática da inclusão total e irrestrita é incipiente nas escolas regulares. Muitas tentativas de inclusão escolar se tornam experiências frustrantes devido a ações que não encontram novas alternativas de mudanças que favoreçam uma real edu- cação inclusiva. A importância central em torno desta discussão está no fato de que a exclusão e a discriminação devem ser extintas da escola. Todos os alunos devem ter as mes- mas chances de acesso aos conhecimen- tos e às atividades realizadas pela escola. É preciso que se reconheça que a igual- dade é direito de todos. Que a inclusão é dever da escola e que os profissionais que atuam no espaço educativo reconheçam que as diferenças existem e que elas de- vem ser incluídas dentro da escola para favorecer a riqueza da multiplicidade cul- tural e dos princípios éticos da valorização humana. 1.2 A Valorização Das Dife- renças Na Escola Como Fa- tor De Inclusão Se quisermos que cada pessoa seja um membro respeitado de nossas comu- nidades, não podemos separar algumas crianças de seus pares durante sua vida escolar. Susan Stainback Abordar a questão das diferenças indi- viduais é uma tarefa um tanto complexa. Porque ao mesmo tempo em que falamos em diferenças, falamos de semelhanças. A presente discussão não irá abordar a questão das diferenças de uma manei- ra peculiar. O contexto de discussão vai além das características físicas ou op- ções pessoais por determinadas prefe- rências por coisas ou objetos. As diferenças individuais aqui colo- cadas são mais profundas, se referem à essência da pessoa, por isso, é de funda- mental importância que sejam enalteci- das e valorizadas pela escola. É preciso reconhecer que cada ser humano possui suas especificidades e habilidades natu- rais. São seres humanos diferentes por natureza, pertencem a grupos variados, convivem e desenvolvem-se em cultu- ras distintas. São diferentes por direito. Infelizmente, existem culturas que insis- tem em diferenciar pessoas por condi- ções intelectuais, sociais, físicas, dentre outras. É preciso pensar que tratar pes- soas diferentemente, enfatizando suas diferenças de maneira a inferiorizá-las, é criar estigmas, é excluir. Conviver reconhecendo e valori- zando as diferenças é uma experiên- cia essencial à nossa existência, des- de que definamos a natureza dessa relação, distinguindo o estar com o outro do estar junto ao outro. Estar junto 12 13 ao outro tem a ver com o que o outro é – é um ser que não é como eu sou, que não sou eu. Essa relação estabe- lece uma identidade imposta, forjada e rotulada pelo outro. Estar com o ou- tro, tem a ver com quem é esse outro, esse desconhecido, um enigma que tenho de decifrar e que vai sendo des- velado à medida que se constrói entre nós um vínculo pelo qual nos confron- tamos, nos identificamos e nos cons- tituímos como seres singulares e mu- tantes. (MANTOAN(2004/2205, p. 13 apud SILVA, 2000). A escola como instituição formadora de ideias, não pode destruir as diferen- ças no seu meio. Deve acima de tudo ex- tinguir a tentativa de assegurarhomoge- neidade das turmas escolares e acolher a diversidade cultural existente nos vários pensamentos e vivências pessoais num mesmo espaço. Numa entrevista à revista Pátio, Stainback (2004/2005) respondendo à pergunta se as escolas deveriam estar equipadas para atender a qualquer tipo de criança com necessidade especial ou seria melhor se patologias específicas fossem atendidas somente em educação especial, ela ressaltou que: se quisermos que cada pessoa seja um membro res- peitado em qualquer lugar, não se pode separar algumas crianças de seus pares durante a trajetória de vida escolar. Não há justificativa para a segregação nas escolas e nem na sociedade. Todos os indivíduos têm direito de ser parte in- tegrante de qualquer espaço na socie- dade. Não acredito que apenas algumas pessoas têm o direito de ser parte de todo o grupo, enquanto outras precisam provar o seu valor porque são considera- das diferentes. Quando as crianças não aprendem juntas e não se compreendem mutuamente, enraíza-se o fenômeno do “nós e eles”. É preciso acreditar que toda criança tem algo a oferecer, e seus talen- tos não serão aproveitados pelos pares se segregarmos aquelas percebidas por “nós como eles”. A ideia acima ilustra uma das maiores dificuldades que precisam ser repensa- das e discutidas nas escolas. A constru- ção de novos paradigmas de inclusão deve partir da ideia da valorização das di- ferenças e do direito a igualdade. Na atu- alidade, não é possível negar a política e a organização das diferenças. A socieda- de de hoje vive numa época em que se assiste de maneira acelerada o abalo das certezas. Emerge o paradigma da lógica includente da complexidade. Morin (2002) concebe que a contribui- ção da cultura das humanidades para o estudo da condição humana é fundamen- tal. O estudo da linguagem sob a forma mais consumada que é a forma natural, literária e poética é criada na essência de cada um. No momento em que a escola conceder espaço para que todos se mani- festem, independentemente de crença, etnia, condição física, deficiência, estará criando um conjunto de estruturas para o êxito da inclusão. Na educação inclusiva, as informações devem se transformar em conhecimento. E esse conhecimento precisa ser transformado em sabedoria para que haja compreensão humana. A compreensão humana chega às pes- soas quando se sente e se concebe os humanos como sujeitos. Ela torna as pes- 14 15 soas abertas ao sofrimento e a alegria. E é a partir da compreensão humana que se pode lutar contra o ódio e a exclusão. Considerando as palavras desse autor, percebe-se que as maiores dificuldades da escola em trabalhar com a inclusão ocorre por falta de sabedoria de como lidar com a diversidade humana. Enfrentar essa di- ficuldade exige o trabalho de uma peda- gogia criativa que dialogue com a incerte- za humana, que prepare as pessoas para situações inesperadas, que conscientize as pessoas de que sua própria vida é uma aventura da humanidade. A diversidade humana apresenta-se assim, como algo vivido e a viver. É um ca- minho sem volta. Querendo ou não, todos fazem parte dessa diversidade humana. É preciso, portanto, lutar para adquirir res- peito e o direito de ser diferente. Basea- do nesta reflexão, Ferreira e Guimarães (2003, p. 41), registraram a seguinte ideia: A sociedade está se tornando mais complexa a cada dia: a diversidade au- menta de forma acelerada. Com isso, imperceptivelmente, muda também a forma de compreender o mundo e os próprios semelhantes. É este o novo paradigma que está nascendo: “viver a igualdade na diferença”, “integrar na diversidade” – eis o apelo dos líderes dos movimentos em conflito. O dife- rente fica cada vez mais comum. Partindo desta reflexão, qual é o papel da escola a desempenhar para valorizar todas as pessoas que ocupam um espaço no seu interior? A escola de hoje tem que assumir uma função diferente das quais assumiu no passado. Hoje a demanda so- cial, política e humana exige um novo mo- delo de educação. A escola atual tem uma função mais complexa. O seu processo de formação deve estar pautado no desper- tar da reflexão crítica e sistemática sobre a natureza humana, na importância das diferenças individuais, na valorização da capacidade criadora de cada ser humano, na consciência da incompletude e da ne- cessidade de ser mais a cada dia. Não se pode negar que falta um longo caminho para que as escolas brasileiras incorporem na sua estrutura organizacio- nal todos estes requisitos mencionados. Mas não se pode negar, também, que há tentativas de avanço no aprofundamento de valores e atitudes compatíveis com os ideais de igualdade, diferença, diversida- de e deficiência. Segundo Ferreira e Guimarães (2003), é necessário repensar o significado da prática pedagógica na escola regular, para poder assim evitar os erros do passado, quando os alunos com deficiência eram deixados á margem. Neste sentido, cabe a escola se tornar uma ambiente de ensino e aprendizagem de qualidade, garantindo aos alunos, sem distinção, o apoio e incen- tivo para que sejam sujeitos ativos nesse novo tipo de sociedade. Pode-se concluir, portanto, que é ur- gente repensar sobre a questão das di- ferenças individuais e construir novos paradigmas de convivência humana. Não se pode negar a beleza da diversidade hu- mana. É preciso percebê-la como algo po- sitivo e importante para a compreensão humana. 14 15 1.3 A Organização Docente na Educação Inclusiva Teoria e Prática Segundo Pesquisa- dores Muitos professores reagem com per- plexidade quando se discute questões relacionadas à inclusão na escola regular. Há de se reconhecer que uma expressiva parcela de professores foram formados a partir de um processo de educação tradi- cional onde priorizava-se a memorização de conteúdos prontos e acabados que ao serem ensinados pelo professor da época tornava-se uma verdade única e indiscu- tível. Ao analisar esta ideia pode-se notar que nesse modelo de educação havia pa- dronização do saber e todos aqueles que não se enquadravam ao nível mínimo exi- gido pela escola, eram, totalmente, exclu- ídos dela, sem justificativas que pudes- sem ser discutidas. Certamente, um professor que fora formado nestes moldes educativos e que não tenha uma formação continuada na profissão docente, poderá ter maiores dificuldades de lidar com as diferenças individuais no seu espaço pedagógico de atuação. Admite-se pensar assim, o fato de carregar na sua bagagem cultural um retrato padronizado de ensino incompatí- vel com as necessidades de um paradigma de educação inclusiva. O que pode acontecer, no entanto, com professores oriundos dessa experiência pedagógica tradicional é o fato dos mes- mos encontrar dificuldades de se des- garrar dessa referência de padrões pré- -estabelecidos, rígidos e considerados imutáveis. E isso poderia desencadear uma transferência de posturas, aprendi- zados e crenças para a sua própria prática docente, configurando-a num espaço de educação que favoreça uma relativa par- cela de repetição dos moldes tradicionais de educação. Segundo Mantoan (2003) o argumen- to usado, geralmente, pelos professores quando se vêem diante da possibilidade de envolvimento com um grupo mais he- terogêneo de alunos é dizer que não estão preparados ou não terem sido preparados para desenvolver a inclusão de alunos que não se enquadram no padrão da dita normalidade. Alguns professores reagem, inicialmente, à metodologia de oferecer a todos as mesmas oportunidades nas mais variadas estratégias pedagógicas de tra- balho. Não é novidade que mesmo que o pro- fessor utilize da mesma metodologia para ensinar todos os alunos, os resultados serão diferentes.Porém, sabe-se que há expectativas entre professores de que todos os alunos aprendem os conteúdos num mesmo tempo e espaço. Esta ideia revela a necessidade de co- nhecimento por parte desses professo- res de como se processa a construção do conhecimento. E, enquanto esses se fundamentarem no senso comum para desenvolver sua prática de educação não haverá compreensão científica de como desenvolver de forma eficaz uma educa- ção inclusiva de fato. Considerando esta ideia, vale a pena citar as palavras de Mantoan (2003) que sugere que para se efetivar, na realidade, uma educação inclusiva há a necessidade 16 17 de formação de grupos de estudos e dis- cussões sobre os problemas educacionais nas escolas. Ainda, recomenda que a or- ganização desses grupos deve partir dos próprios professores no momento em que se encontram na escola. As reuniões de- vem ter como ponto de partida as neces- sidades e os interesses comuns de alguns professores, como também, a discussão de estratégias de trabalho na sala de aula e a troca de experiências que deram certo. A questão sugerida acima é pertinente e fundamentalmente, importante para a reflexão dos professores. Pois a intera- ção, as trocas culturais de experiências são estratégias significativas para o de- senvolvimento da educação inclusiva. Se- gundo Mitler (2003) a partir do momento que os profissionais ligados è educação têm compreensão de inúmeros aspectos ligados aos conceitos de igualdade e de diferença, fica mais fácil investir em seres humanos melhores, mais fraternos e isso, consequentemente, vai resultar em boas modificações na área educacional. Neste sentido, o autor chama a aten- ção para a importância da discussão nas escolas de questões ligadas à diferença e igualdade. Acredita-se que o ponto de partida para iniciar um trabalho de edu- cação inclusiva é o conhecimento desses conceitos. Um ensino inclusivo, como se sabe é moroso porque requer a conscien- tização da mudança de paradigmas anti- gos para novos paradigmas. Não é novidade que a implementação de um processo de educação inclusiva irá exigir paciência, estudo, cooperação, solidariedade, conhecimento do funcio- namento da inclusão e uma boa dose de coragem e entusiasmo para enfrentar as incertezas, dúvidas e novidades que vão surgir no cotidiano do cenário educati- vo. E para não se desvencilhar da rota da educação inclusiva, cada profissional en- volvido vai precisar se libertar dos velhos, superficiais e rígidos paradigmas de inte- gração e inclusão parcial na escola de en- sino regular. Mitler(2003, p. 135) oferece uma con- tribuição quando assinala que na escola nunca deve deixar de haver questiona- mentos, e acrescenta: pensar a educação numa lógica bu- rocrática e corporativa de mera adição, confrontação ou justaposição de “pa- péis educacionais” é pensar a educa- ção numa perspectiva profundamente redutora, social e culturalmente per- versa. Reforçar os mecanismos de in- teração solidária e os procedimentos cooperativos é, pois, um imperativo de qualquer política educativa que pre- tenda assumir a educação como uma responsabilidade social. Dessa forma, a interação é uma ativida- de que deve acontecer como fator impres- cindível nos ambientes da escola para que se privilegie a circulação de informações, a cultura da cooperação, o crescimento da formação voltado para a construção de novos conhecimentos, bem como a apren- dizagem do aprender sempre. A educação inclusiva não prevê a utilização de práticas de ensino escolar específicas para esta ou aquela defici- ência e/ ou dificuldades de aprendiza- gem. Os alunos aprendem nos seus li- mites e se o ensino for, de fato, de boa qualidade, o professor levará em conta 16 17 esses limites e explorará conveniente- mente, as possibilidades de cada um. Não se trata de uma aceitação passiva do desempenho escolar, e sim de agir- mos com realismo e coerência e ad- mitirmos que as escolas existem para formar as novas gerações, e não ape- nas alguns de seus futuros membros, os mais capacitados e privilegiados. MANTOAN, 2003, p. 67). As palavras da autora mostram o de- safio que a realidade desse modelo de educação vai exigir do professor e demais pessoas envolvidas no processo de apren- dizagem dos alunos com maiores dificul- dades. Contudo, ainda, vai ser necessário reorganizar as estruturas educacionais embasadas nos moldes de uma educação que privilegia uma minoria. A educação inclusiva impõe a rees- truturação dos espaços em sala de aula. Neste contexto, os alunos não devem se apoiar somente no professor, ou seja, precisam de liberdade para se apoiarem mutuamente com todos os colegas de classe. O papel controlador do professor como único facilitador da aprendizagem deixa de existir e o cenário educativo se abre para que todos ensinem e aprendem juntos. Uma situação que pode contribuir para a aprendizagem de todos se encontra na oportunidade das trocas de experiências através de trabalhos coletivos em grupos pequenos e diversificados que exercitam a capacidade de decisão dos alunos diante da escolha das tarefas. Mantoan (2003, p. 68), destaca a seguinte reflexão com per- tinência: É certo que não se consegue prede- terminar a extensão e profundidade dos conteúdos a serem construídos pelos alunos, nem facilitar/adaptar as atividades escolares para alguns, por- que somos incapazes de prever, de an- temão, as dificuldades e as facilidades que cada um poderá encontrar para realizá-las. Porque é o aluno que se adapta ao novo conhecimento e só ele pode regular o processo de construção intelectual. A maioria dos professores não pensa assim nem é alertada para esse fato e se apavora, com razão, ao receber alunos com deficiência ou com problemas de aprendizagem em suas turmas, pois prevê como será difícil dar conta das diferenciações que um pre- tenso ensino inclusivo exigir-lhes-á. A educação assim compreendida, pro- porcionaria aos professores algumas re- flexões que poderiam favorecer uma nova estratégia pedagógica, onde o aluno dei- xaria de aprender sozinho na sua cartei- ra e passaria a buscar conhecimento com todos ou com aqueles que lhe atribuísse maior confiança ou facilidade de entendi- mento. A superação das dificuldades e insegu- rança poderia ser erradicada a partir de um trabalho voltado à exploração de talentos, ao desenvolvimento de predisposições, à criação de alternativas pedagógicas atu- alizadas e recheadas de possibilidades de transcendência da criatividade. O ensino deixaria de ter apenas uma metodologia para ser mediado e passaria a ser relacio- nado à vida dos alunos e da sociedade em que se vive na realidade atual. O foco central da educação inclusiva 18 19 não se fundamenta, prioritariamente, no ensino e sim, na aprendizagem do aluno. O processo de educação, assim entendi- do, segundo Mitler (2003) implica a exis- tência de processos transformadores que decorrem da experiência, algo inerente a cada sujeito e que depende da ação, da interação e transação entre sujeito e ob- jeto, sujeito e meio. Para que a turma toda seja capaz de aprender novos conhecimentos, o pro- fessor precisa ter consciência de que cada aluno já sabe alguma coisa, e que qualquer educando é capaz de aprender dentro das suas capacidades cognitivas. Saben- do disso, um dos caminhos é trabalhar os conteúdos e atividades respeitando sem- pre as diferenças individuais, oferecendo estratégias pedagógicas dinâmicas, inte- rativas, integradoras, cooperativas e dia- lógicas. Diante dessas sugestões, vale ainda, relembrar a questão já mencionada neste estudo de que o aluno é que vai se adap- tar ao novo conhecimento e que somente ele pode regular o processo de constru- ção intelectual,porém, o professor po- derá contribuir para que haja um equilí- brio emocional diante das dificuldades de aprendizagem que, muitas vezes, surgem e desencadeia falta de segurança, de ou- sadia e de motivação do aluno. Algumas outras ideias propostas por Mantoan (2003, p. 71) apud Gallo 1999), podem servir de sugestões para a melhoria da prática da educa- ção inclusiva: o rompimento das fronteiras entre as disciplinas curriculares; a formação de redes de conhecimen- to e de significações, em contraposição a currículos conteudistas, a verdades pron- tas e acabadas, listadas em programas es- colares seriados; a integração de saberes, decorrente da transversalidade curricular e que se contrapõe ao consumo passivo de infor- mações e de conhecimentos sem sentido; policompreensões da realidade; a descoberta, a inventividade e a au- tonomia do sujeito, na conquista do co- nhecimento; ambientes polissêmicos, favorecidos por temas de estudo que partem da re- alidade, da identidade sociocultural dos alunos, contra toda a ênfase no primado do enunciado desencarnado e no conhe- cimento pelo conhecimento. Aliado a essas contribuições, outras de expressiva importância são sugeridas por Mitler(2003, p. 152) para atender à proposta da educa- ção inclusiva: Aprende-se não só com a escola e, muito menos, só fora dela; Aprende-se a vida inteira, através das formas de viver e conviver; Processos cognitivos e processos vi- tais encontram-se e interagem constan- temente; Aprende-se pelas expressões da au- to-organização da complexidade e da per- manente conectividade de TODOS com TODOS, em todos os momentos e etapas do processo evolutivo; Cada ser vivo, para existir e viver tem que se flexibilizar, adaptar-se, reestruturar- 18 19 -se, interagir, criar, coevoluir e transformar; Diante dessas reflexões, percebe-se que uma proposta de inclusão total vai demandar dos envolvidos no contexto desse processo, algumas posturas inova- doras, atitudes ousadas e conhecimentos biopsicossocial e histórico. Assim, caberá, principalmente o professor, como gestor da sala de aula, promover o ensino para todos, sabendo que cada educando vai aprender dentro do seu ritmo de capaci- dade cognitiva. Porém, o professor pode e deve estimular e transgressão dos limi- tes oferecendo atividades desafiadoras e carregadas de significado e sentido para os alunos. Parafraseando Mantoan (2003), algu- mas práticas consagradas nas escolas não são capazes de ensinar a turma toda. Elas contribuem para uma maior seleção e dis- criminação quando não são desenvolvidas a partir da visão de que cada pessoa pos- sui um processo de conhecimento dife- rente. Assim sendo a autora destacou que é contra a proposta de trabalhos coletivos que se resumem em atividades individuais realizadas ao mesmo tempo pela turma. É contra ensinar com ênfase e unicamente, a partir dos conteúdos programáticos da série. É contra adotar o livro didático como única ferramenta exclusiva de orientação dos programas de ensino. É contra a con- siderar a prova final como único instru- mento para diagnosticar o desempenho escolar do aluno. Outras práticas, segundo a mesma autora, não contribuem para o pleno de- senvolvimento da inclusão. Como por exemplo, não é a favor ao professor que serve-se de folhas mimeografadas e xe- rocadas durante todo o período de ensino para que todos os alunos as preencham ao mesmo tempo, respondendo às mes- mas perguntas, com as mesmas respos- tas. Não é a favor de propor projetos de trabalho totalmente desvinculados das experiências e do interesse da turma, que na maioria das vezes, só serve para demonstrar a pseudo-adesão do profes- sor às inovações. E, também não é a favor da organização do modo fragmentado do emprego do dia letivo, que se apresen- ta com rigidez e determinação de tempo igual para que todos aprendam num mes- mo período, e ainda, com conteúdos es- tanques desta ou daquela disciplina. A rotina escolar desenvolvida nestes moldes retrata a exclusão escolar que de alguma forma atinge àqueles que apre- sentam uma maior dificuldade de apren- der ou deficiência específica ou necessita de maior tempo para aprender. Pode-se imaginar qual seria a reação desses alunos que rejeitam essas propostas de trabalho. Em muitas ocasiões esse ensino seletivo causa indisciplina, passividade, revolta, evasão e frustrações que poderão ser car- regadas pelo resto da vida. Ao refletir sobre as ideias acima, po- de-se concluir que o êxito da educação inclusiva depende, de várias mudanças de paradigma educacional escolar, a co- meçar pela transformação nas práticas educativas da escola regular. Foi possível perceber que com práticas pedagógicas inflexíveis, seletivas, preconceituosas e discriminatórias, a exclusão vai se alastrar e se perpetuar no cenário da escola regu- lar. Acredita-se, também que é necessário que os profissionais envolvidos direta e 20 21 indiretamente, na educação inclusiva tra- balhem, inovem e ousem na implantação e execução desse modelo de educação, acreditando na otimização da perspectiva inclusiva. 1.4 Uma Experiência De Pes- quisa Sobre Inclusão Na Es- cola Regular – A Realidade Discursiva Dos Profissionais A intenção aqui é compartilhar uma experiência de pesquisa sobre a inclusão realizada numa escola da rede regular de ensino, onde havia uma criança com Síndrome de Down de sete anos de ida- de matriculada na educação Infantil de uma escola da rede pública municipal de ensino. Concretamente, a pesquisa foi realizada durante o ano de 2004 e teve por objetivo analisar o desenvolvimento do processo de inclusão realizado a partir da permanência dessa criança nesse am- biente educativo. Espera-se que este relato possa con- tribuir para um novo repensar sobre a educação inclusiva e mostrar que não basta incluir alunos com necessidades educacionais especiais, sem acreditar na possibilidade de aprender todo dia com as experiências cotidianas, sem buscar novas estratégias de trabalho e, sem contudo, buscar conhecimentos que ser- virão de guia no enfrentamento das difi- culdades que tal processo possa deman- dar no cenário da escola. As experiências pesquisadas por Ne- ves(2005) apresentadas aqui fazem parte da rotina de trabalho de profissio- nais que estão diretamente envolvidos no processo de inclusão desenvolvidos pela escola. Tais profissionais contribuí- ram com a pesquisa relatando crenças e ideias sobre como concebiam e trabalha- vam a inclusão no contexto das ativida- des ligadas ao processo. Na perspectiva de analisar crenças e ideias dos profissionais que faziam parte de uma escola que estava envolvida no processo de inclusão e que era a escola considerada modelo para incluir todos os alunos, foram realizadas entrevistas com a diretora, a supervisora pedagógica e a professora da sala de aula onde estudava o aluno incluído. A intenção presente nessa prática investigativa era conhecer alguns ele- mentos importantes relacionados a esse processo inclusivo, e, além disso, refletir fala/ação, crenças e se havia possíveis resistências desses profissionais que participavam diretamente do desenvol- vimento desse processo de inclusão. A esse respeito, a diretora da escola foi a primeira profissional a ser entrevis- tada. A escolha se deu, segundo a pes- quisadora, pelo fato da diretora ser a pro- fissional quem decidia sobre a matrícula, ou não, dos alunos que ingressavam na escola. Segundo Mantoan (2001), esses líderes dão o “tom” do trabalho nas esco- las e podem contribuir bastante para as inovações, como a inclusão, que trazem novas oportunidades educacionais para todos. Ao ser indagada sobre o desenvolvi- mento do processo de inclusãoque acon- tecia na escola em que trabalha e se a mesma acredita na possibilidade de des- se processo dar certo na escola regular, a diretora assim se posicionou: 20 21 Eu acredito que a inclusão dá certo. Muito certo. Tanto que se não houves- se a inclusão eu acho que não seria um trabalho perfeito do profissional da educação. Que a inclusão dá abertu- ra para o próprio profissional da edu- cação, que goste realmente do seu trabalho e tem dom. Vê que é através dessa inclusão é que podemos alcan- çar os nossos objetivos. Porque se nós realizamos algo com uma criança que precisa de mais atenção e carinho e isso temos condições de dar, então nós vamos ver que somos preparados para trabalhar com essas crianças. Então, por isso eu acho que dá certo. E temos que continuar porque através da inclu- são é que vamos alcançar os nossos objetivos. Refletindo sobre seu depoimento, pode- -se pensar que no universo escolar, muitas vezes, ao oferecer mais atenção e carinho para esse ou aquele aluno, poderia estar praticando um preconceito ou discrimina- ção, pelo fato de não acreditar na capacida- de de desenvolvimento do aluno. No depoimento, a diretora ressalta que é através da inclusão que vai alcançar os ob- jetivos, porém não define que objetivos são esses. Pode-se pensar através da sua fala que há certa indefinição do que seja a in- clusão, pois a mesma afirma que a inclusão dá abertura para o profissional da educação que goste, realmente do seu trabalho e tem dom, em seguida, afirma que os profissio- nais estão preparados para trabalhar com essas crianças. Não se pode esquecer de que o preparo para a inclusão se faz no cotidiano e sem- pre. Não se deve afirmar que alguém está, totalmente, preparado porque a realida- de exige sempre posturas diferentes para cada cenário real de educação. Tudo muda a cada tempo e espaço. É preciso crer que é preciso se formar todo dia, a todo tempo e com situações inesperadas que surgem no cotidiano da escola. De acordo com Ferreira e Guimarães (2003, p. 22) “torna-se imperativo refletir alguns conceitos e estudar seus aspectos históricos, culturais e sociais para se com- preender o que está implícito na inserção do aluno com deficiência no ensino regular.” Pois o simples fato de aceitar um aluno com deficiência, afirmar que acredita na inclu- são não significa que o aluno foi totalmente incluído. No decorrer das atividades de entrevis- tas, foi solicitado à supervisora pedagógica um momento para que pudesse responder a algumas questões sobre o processo inclu- sivo da escola. De imediato, segundo a pes- quisadora, foi negada a sua contribuição, pois a mesma relatou que precisava saber que perguntas seriam feitas. Afirmou que não gostaria de responder oralmente às perguntas, ou melhor, responderia se fosse através de questionário para responder em casa. Ainda, acrescentou que não gostaria que fosse gravada a sua voz no aparelho de gravador, instrumento que seria usado no momento da entrevista. Posteriormente, atendendo à solicita- ção da mesma para que fosse realizada a conversa, num outro dia, a supervisora foi procurada para a realização da entrevis- ta. Pesquisadora e supervisora foram para uma sala que estava vazia e iniciaram a con- versa. Ao ser questionada se acredita na in- clusão e qual a sua ideia sobre o processo, assim a supervisora fez a seguinte leitura: 22 23 “Acredito. Os alunos portadores de necessidades especiais devem conviver com crianças do ensino regular porque a convivência no meio de onde há diferen- ças lhes trarão mais oportunidades de socialização e momentos diversificados de aprendizagens também.”. Em sua leitura, ela afirmou com segu- rança a importância do convívio dos alunos com necessidades especiais com crianças do ensino regular. Porém, um fato chamou a atenção: Qual o porquê da inseguran- ça em responder à entrevista oralmente. Considerando esse fato, vale a pena refle- tir: Por que uma pessoa que participa de um processo de inclusão escolar, se envol- ve nas atividades diárias e resiste discutir essa realidade vivida no cotidiano? A partir desse depoimento há de se constatar a dificuldade que muitos profis- sionais, ainda, encontram para trabalhar com o processo de inclusão. Muitos profis- sionais sentem insegurança em discutir o assunto. Têm dificuldade de se livrar das discussões polêmicas que se relacionam com a inclusão. Sentem-se inseguros para tomar atitudes corajosas em relação aos professores, aos pais, à comunidade esco- lar como um todo. Stainback, Stainback e Karagiannis (1999), ressaltam que existem muitas ten- tativas para se resistir ao ensino inclusivo e que talvez o indicador mais revelador da resistência à inclusão esteja contido nas estatísticas referentes aos alunos com deficiência. Pois, o fato de receber alunos com deficiência tende a gerar maior inse- gurança, ao passo que professores e co- ordenadores pedagógicos das últimas dé- cadas quase não tiveram a chance de uma formação que abordasse metodologias inovadoras quanto ao modelo de educação inclusiva. Torna-se imperativo ressaltar que um dos caminhos para melhor formação des- ses profissionais que lidam, diretamente, com todo o processo ensino aprendizagem é o exercício constante e sistemático de compartilhamento de ideias, sentimentos e ações entre todos, diretores, supervi- sores e professores, que devem partir do aprimoramento em serviço. Esse exercício é realizado sobre as experiências concre- tas, os problemas reais, as situações do co- tidiano que, muitas vezes, desequilibram o trabalho inclusivo no interior da escola. É preciso levar em conta que esta pode ser a matéria-prima das mudanças pretendidas para o êxito da educação inclusiva. (MAN- TOAN, 2003) Para dar sequência à importante tare- fa de conhecer a crença desses profissio- nais no que dizia respeito à inclusão, numa outra ocasião, foi solicitado a entrevista à professora da turma nomeada de inclusiva pelos profissionais da escola. A entrevis- ta ocorreu numa sala de aula que também estava vazia, num momento extra da aula. No momento em que foi questionada se a mesma acreditava na inclusão e porquê, a professora afirmou, categoricamente: Eu acredito que possa ter inclusão social, não a inclusão pedagógica no momento, esta está em processo de mudança. As pessoas ainda têm receio, tem medo, por não ter apoio, por a lei não ser cumprida como realmente ela vem escrita. Então o professor de es- cola regular se sente com medo, com receio de trabalhar, por não conhecer e por não ter suporte. 22 23 Nesse depoimento a professora res- salta a impossibilidade de haver inclusão pedagógica no momento. A este respeito como se pode analisar o discurso que re- vela a possibilidade de credibilidade na in- clusão social e não na inclusão pedagógi- ca? Vale pensar, também, sobre o fato de trabalhar com o processo e não se sentir sujeito dele. Essa ideia pode levar a pen- sar que esse processo de inclusão não se efetivou no espaço educacional. Baseado nestes pressupostos, Manto- an (2003, p. 78) oferece uma contribuição quando diz que “o argumento mais fre- quente dos professores, quando resistem à inclusão, é não estarem ou não terem sido preparados para esse trabalho.” E acrescenta que a maioria dos professores tem uma visão funcional do ensino que estão acostumados a lidar na rotina diária e tudo o que pode vir a ameaçar o rompi- mento do esquema de trabalho prático que aprenderam a aplicar em suas salas de aula é inicialmente rejeitado. Acredita-se que o professor é peça fundamental no êxito da inclusão. Ele é sujeito ativo no processo, entretanto, precisa acreditar na possibilidade de pro- mover uma educação inclusiva de fato,ter a consciência da importância do cres- cimento e aperfeiçoamento de suas habi- lidades diante das dúvidas e incertezas do cotidiano da sala de aula e da escola. Reportando ao depoimento da profes- sora, quando destaca que o professor tem receio de trabalhar, por não conhecer, isto poderia estar se constituindo numa teoria criada a partir do receio de que no ques- tionamento da própria prática, nas com- parações, na análise das circunstâncias e dos fatos que provocam perturbações. No plano da educação escolar é preciso aprender com a prática, construir teorias a partir daquilo que funcionou bem na ação desempenhada. A qualidade do trabalho docente não pode se resumir à questão de ter ou não um apoio ou suporte. É preciso reconhecer que aprende-se todo dia com falhas e acertos. E nessa ação, reflexão e ação é que o profissional da educação vai contribuindo para a evolução do processo de ensino e aprendizagem. Não se pode também esquecer que o professor é peça-chave no êxito da inclu- são, por isso, ele não pode se tornar um mero ensinante. Ele precisa deixar esse “medo” e insegurança de trabalhar com as diferenças na sala de aula, sejam ela de qualquer origem e estar consciente de que é possível aprender todo dia. “Quando vivemos a autenticidade exigida pela prática de ensinar-apren- der participamos de uma experiên- cia total, diretiva, política, ideológica, gnosiológica, pedagógica, estética e ética, em que a boniteza deve achar-se de mãos dadas com a decência e com a seriedade.” (FREIRE, 1996, p. 26) A situação real da escola onde se realizou a pesquisa, retratada nos discursos de seus profissionais revelou a necessidade de apri- moramento e conhecimento do real signifi- cado do processo de inclusão, suas crenças em torno do saber teórico e prático pareceu trazer no bojo da subjetivação de ambas um antagonismo presente na identidade e no papel social. Mantoan (2003) destaca que o fato dos profissionais da educação fundamentarem suas práticas e seus argumentos pedagógi- cos no senso comum dificulta a explicitação 24 25 dos problemas de aprendizagem. E essa di- ficuldade pode mudar o caminho da traje- tória escolar de alunos que, muitas vezes são encaminhados indevidamente para as modalidades do ensino especial e outras si- tuações segregativas de atendimento edu- cacional. Morin (2002, p. 99-100) assim se mani- festa com relação à resistência a mudanças: “[...]. Há uma resistência obtusa, inclusive entre os espíritos refinados. Para eles, o de- safio é invisível. A cada tentativa de refor- ma, mínima que seja, a resistência aumen- ta.” As discussões com as profissionais da escola trilharam no eixo dos saberes da in- clusão que aos poucos revelaram algumas ideias frágeis do ponto de vista do conhe- cimento de uma verdadeira educação in- clusiva. Porém, neste sentido, é necessário questionar: Em que cultura de inclusão, es- ses profissionais se sustentaram para assu- mirem a tarefa de desenvolver a educação inclusiva? Há compreensão da complexida- de que envolve as questões de diversida- des e diferenças? Há de se pensar que o processo de inclu- são, em alguns casos é abortado, devido o fato do desconhecimento, em outros, de práticas revestidas de seleção e exclusão que passam despercebidas no tempo e no espaço. E nesse espaço e tempo, o aluno perde a chance de ocupar seu espaço de di- reito na escola e na sociedade. A partir dessa reflexão, Mantoan (2001), dá outra importante contribuição quando diz que nem todos os caminhos levam à in- clusão e que incluir tem a ver com o desafio de reconhecer que a exclusão é a negação da diversidade e das diferenças nas salas de aula. Daí, torna-se necessário que educadores busquem sua excelência em um dos atos mais nobres da vida que é educar respeitan- do as diferenças individuais. E, só a partir da consciência de que todos os seres humanos são constituídos de culturas diferentes e ritmos de aprendizagem variados é que os educadores poderão afirmar-se agentes de transformação pessoal, social e inclusivo. Portanto, vale a pena registrar que os educadores devem ficar atentos às suas atitudes, desde a fala à ação, pois o repen- sar desses dois aspectos é inerente durante toda a trajetória de trabalho escolar. A esco- la enquanto espaço sócio-político-cultural e espaço de direito de todos demanda por educadores que conheçam as estruturas de um ensino para todos e que busquem uma formação que lhes ofereça conhecimento suficiente para trabalhar a educação inclu- siva de todos. 1.5 Que Caminhos O Pro- fessor Deve Percorrer Para Ensinar E Aprender Na Di- versidade? Nesta discussão pretende-se abordar alguns caminhos fundamentais que o pro- fessor deve encontrar para desenvolver práticas pedagógicas de qualidade tendo em vista ensinar a turma toda sem precon- ceitos e exclusão. A expressão parece uma afirmativa simples, mas não é. A dimensão e complexidade que envolve a busca desses caminhos assustam e causam incertezas que irão rondar o dia a dia do professor du- rante seu trabalho. Antes de destacar quais os compromis- 24 25 sos e ações serão necessárias ao professor para que desenvolva uma prática de educa- ção inclusiva de qualidade e dentro dos pa- drões do atendimento à diversidade, torna- -se necessário refletir algumas dificuldades da profissão que o professor enfrenta na realidade dos dias de hoje. Vasconcellos (2003), destacou que nas últimas décadas ocorreram variadas mu- danças na escola brasileira, e isso de certa forma, influenciou as condições de vida e de trabalho dos professores, deixando-os num dilema. De um lado, o professor pondera seu gosto pelo magistério, as alegrias que encon- tra no exercício da função, os anos dedicados à profissão, com também a sua remuneração que, independentemente do valor, de algu- ma forma garante-lhe a sobrevivência. De outro lado, emerge um conjunto de fatores bastante desestimuladores como a falta de reconhecimento de seu trabalho por parte dos dirigentes do sistema de educação, dos pais, da equipe da escola, dos alunos e até dos colegas. Como se não bastasse, a sobre- carga de trabalho, as exigências crescentes frente às condições mínimas que não são ga- rantidas, a falta de clareza do seu papel. Diante desse quadro cabe destacar que esses dilemas precisam que ser discutidos e enfrentados entre toda a equipe de traba- lho, além de ser fator fundamental de refle- xão para cada educador na sua individualida- de, poder encontrar suas próprias respostas. É certo que a tarefa é complexa, contudo, torna-se necessário criar perspectivas holís- ticas em torno da educação escolar. Muitas instituições passam uma visão re- ducionista da atividade docente, de maneira que o professor recém-formado considera- -se um “especialista”, não sendo raro encon- trarmos uma postura até arrogante, quando em alguns casos nem se quer há o domínio dos conteúdos básicos a serem ministrados em sala de aula... (VASCONCELLOS, 2003), P. 14). A situação acima destacada denota a fra- gilidade da formação dos professores para o magistério. Sem contar que muitos deles permanecem muitos anos na carreira docen- te sem uma formação continuada relaciona- da à profissão. E isso poderia se denominar o verdadeiro caos da educação. Nesse sentido, vale a pena questio- nar: Como um professor advindo dessa for- mação única e, provavelmente, ultrapassada no sentido de conhecimentos científicos, dentre outros, poderia favorecer uma apren- dizagem significativa, atualizada e coerente com a diversidade de alunos que ocupa os bancos das escolas de hoje? Seria um equívoco não buscar maior com- preensão para essa face da realidade. É ne- cessário discutir resultados de pesquisas, usar a imaginação,a intuição, a criatividade para encontrar alternativas de melhorias nas situações que fazem muitas vezes o profes- sor colecionar rótulos e estigmas. A situação de muitos professores, como constatamos, está difícil; procuram então, alternativas: O que fazer? Tal pro- cedimento é absolutamente razoável. Ocorre que acabam buscando fora de si a resposta; não percebem que a alternativa tem de fazer parte do seu plano de ação, tem de entrar no seu movimento reflexi- vo. Além disso, não conseguem perceber o que de bom já fazem, não valorizam a própria prática, que seria ponto de parti- da para novos avanços. (VASCONCELLOS, 2003, P. 14) 26 27 O autor procurou mostrar que é neces- sário ganhar clareza em relação às finali- dades e propósitos que se estabelecem como metas, como sonho. É preciso ser capaz de ter a coragem de mudar o que já está pronto, alçar vôos mais altos e vis- lumbrar novos caminhos. Entretanto, o que se verifica é que mui- tos ideais e sonhos morrem, por falta de ousadia e coragem de aprender a apren- der sempre, todo dia, toda hora, com to- das as pessoas que nos cercam. E pode se considerar que é na escola o lugar mais digno de encontrar novos conhecimen- tos. Não se pretende aqui nesta discus- são esgotar as possibilidades de ideias para ensinar e aprender na diversidade. É preciso conscientizar-se da complexidade de uma prática transformadora. Torna-se necessário pensar que o problema não é apenas ter o que fazer e saber o que deve ser feito. O que interessa é interiorizar conceitos, elaborar planos de ação, lançar mão de métodos criativos, construir no- vas competências e descobrir espaços de autonomia. Interessa agora discutir que caminhos o professor deve trilhar para desenvolver uma prática de educação inclusiva com competência e qualidade na docência. De acordo com Imbernon (2000, p. 99), “a qualidade não está unicamente no conte- údo, e sim na interatividade do processo, na dinâmica do grupo, no uso das ativida- des, no estilo do formador ou professor/a, no material que se utiliza.” Desse modo, assume importância a reflexão sobre a prática em um contexto determinado, a fundamentação em estabelecer estraté- gias de pensamento, de percepção, e de estímulos. O professor precisa desenvolver sua capacidade reflexiva. É preciso vencer inércias, ter vontade e persistência. É pre- ciso dialogar com o outro e consigo mes- mo atingindo o nível da crítica que permi- ta agir, melhorar e falar com o poder da razão. Imbernon (2000, p. 48), destaca cinco grandes linhas e eixos de atua- ção na formação permanente do pro- fessor e que as considera como base para uma reflexão dos sujeitos sobre sua prática docente: A reflexão prático-teórica sobre a própria prática mediante a análise, a com- preensão, a interpretação e a intervenção sobre a realidade. A capacidade do pro- fessor de gerar conhecimento pedagógi- co por meio da prática educativa; A troca de experiências entre iguais para tornar possível a atualização em to- dos os campos de intervenção educativa e aumentar a comunicação entre os pro- fessores; A união da formação a um projeto de trabalho; A formação como estímulo críti- co ante as práticas profissionais como a hierarquia, o sexismo, prolietarização, o individualismo, o pouco prestígio etc., e práticas sociais como a exclusão, a intole- rância; O desenvolvimento profissional da instituição educativa mediante o trabalho conjunto para transformar essa prática. Possibilitar a passagem da experiência de inovação (isolada e individual) à inovação institucional. 26 27 Baseando-se nestas reflexões, perce- be-se a necessidade de formação perma- nente do professor a partir do exame de suas teorias implícitas, de auto-avaliação crítica, de recomposição do equilíbrio en- tre os esquemas teóricos e práticos, bem como a aprendizagem do aprender a in- terpretar, compreender e refletir sobre a educação e a realidade social de forma comunitária. Além dessas ideias, Imbernon (2000, p. 69-70) elaborou outras re- lacionadas à formação permanente do professor que são de fundamental importância e merecem destaque: Aprender continuamente de forma colaborativa, participativa, isto é, anali- sar experimentar, avaliar, modificar jun- tamente com outros colegas ou membros da comunidade. Ligar os conhecimentos derivados da socialização comum com novas informa- ções em um processo coerente de forma- ção (adequação das modalidades à finali- dade formativa) para rejeitar ou aceitar os conhecimentos em função do contexto. Aprender mediante a reflexão indi- vidual e coletiva a resolução de situações problemáticas da prática. Ou seja, a partir da prática do professor, realizar um pro- cesso de prática teórica. Aprender em um ambiente formativo de colaboração e de interação social: com- partilhar problemas, fracasso e sucessos com os colegas. Elaborar projetos de trabalho conjun- to e vinculá-los à formação mediante es- tratégias de pesquisa-ação. Tudo isso será obtido mediante processos em que se verifique: Abandono do individualismo e do ce- lularismo na cultura profissional docente. Predisposição numa revisão crítica da própria prática educativa mediante pro- cessos de reflexão e análise crítica. Modalidades de formação adequadas ao que o professor tem como finalidade formativa. Busca do significado das ações edu- cativas, que devem ser compartilhadas com outras equipes docentes tendo em conta o contexto em que se forma. Formação como processo de defini- ção de princípios e de elaboração de um projeto educativo conjunto que preveja o uso de atividades educativas mais ade- quadas à mudança da educação. Formação no lugar de trabalho, na própria instituição educacional. A partir dessa perspectiva, segundo o mesmo autor, o trabalho docente incor- pora um conhecimento profissional que permite criar processos próprios, autô- nomos, de intervenção, em vez de buscar uma instrumentação já elaborada e pron- ta. Dentre as características necessárias para promover esse conhecimento pro- fissional ativo, a formação permanente não deve oferecer apenas novos conhe- cimentos científicos, mas, principalmen- te, processos relativos a metodologias de participação, projetos, observação e diagnóstico dos processos, estratégias contextualizadas, comunicação, tomada de decisões, análise de interação humana. Portanto, há de se perceber ao longo 28 29 dessas ideias que ensinar e aprender são atividades complexas que vão exigir do professor uma boa dose de motivação e um considerável nível de criatividade. 1.6 Algumas Competências Didáticas Para a Educação Inclusiva Para se desenvolver uma ação docen- te inclusiva o professor precisa vencer o desafio da dificuldade de lidar com as di- ferenças. Segundo Campos (2006/2007) o professor precisa desempenhar sua função a partir de uma visão renovada e integral. Mobilizar suas capacidades pro- fissionais, sua disposição pessoal e sua responsabilidade social para desenvolver relações significativas entre o conheci- mento já produzido e a realidade, procu- rando dar sentido à aprendizagem dos alunos. Esse foco assinala a necessidade de transformação de práticas tradicionais onde se privilegiava, simplesmente, a me- morização de conteúdos prontos. Para ser coerente com essas ideias, vale a pena mencionar algumas dimensões de traba- lho docente, que segundo a mesma auto- ra, se tomadas como base da ação peda- gógica educativa poderiam favorecer o desenvolvimento de uma educação para todos, sem distinção. Uma das dimensões é focalizar apren- dizagem dos estudantes, já que a razão do ser docente é facilitar-lhes a aprendi- zagem. O docente sem ser o único agen- te educativo em interação
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