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Texto - O desafio de ensinar

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O Desafio de ensinar 
A aproximação entre as neurociências e a pedagogia pode significar 
melhoria da qualidade de vida para milhares de pessoa 
Não basta entender como se aprende, é preciso 
descobrir a melhor forma de ensinar. Há décadas, a 
psicologia, amparada pela neurociência, difunde que 
quando um aluno que se sente afetivamente protegido é 
desafiado a aprender, ocorrem mudanças físicas e 
químicas em seu cérebro, o que facilita o acolhimento e 
a reconstrução das informações. 
A pedagogia neurocientífica, como denominam alguns 
pesquisadores, pode ser compreendida como o estudo 
da estrutura, desenvolvimento, da evolução e do 
funcionamento do sistema nervoso com enfoque plural: 
biológico, neurológico, psicológico, matemático, físico 
e filosófico. Nessa equação complexa, processos 
químicos e interações ambientais se aproximam e se 
complementam, propiciando aquisição de informações, 
resolução de problemas e mudanças de 
comportamento. Na prática, a aproximação entre as 
neurociências e a pedagogia pode reverter em melhoria 
da qualidade de ensino para milhares de estudantes. 
Os benefícios são bem-vindos – e necessários. Afinal a 
realidade é preocupante. Levantamento do Ministério 
da Educação revela que 20% dos brasileiros entre 15 e 
19 anos são analfabetos, o que representa 12 % da 
população brasileira. Segundo relatório da Organização 
das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a 
Cultura (Unesco), o Brasil tem o sétimo maior 
contingente de analfabetos do planeta. Mais que 
mapear o cérebro, desvendar os meandros de seu 
funcionamento, compreender fluxos e refluxos de 
neurotransmissores, acompanhar dinâmicas complexas 
e transformar passos da resolução de um problema em 
modelos matemáticos, observar e diagnosticar, 
pesquisadores de diferentes segmentos estão 
interessados nas implicações sociais da aquisição de 
conhecimentos que possibilitem a inclusão de milhares 
de crianças, adolescentes e adultos – e não apenas no 
que diz respeito à quantidade de pessoas com acesso à 
escola, mas também levando em conta a qualidade da 
educação oferecida. 
O cérebro humano, porém, não possui nenhum módulo 
automático que permita o domínio de práticas como a 
leitura, a escrita ou cálculo. O aprendizado é sempre 
um processo único, que envolve afeto. Por isso 
conhecer o aluno e tratá-lo como sujeito único pode 
mudar o rumo de sua vida. É fundamental valorizar 
suas experiências. 
A professora de história da escrita do Museu 
Metropolitano de Nova York e ex professora do 
Instituto de Psicologia da USP, Elvira Souza Lima 
costuma contar aos profissionais que assessora uma 
experiência que viveu com os Índios na Amazônia. 
Como na maior parte das escolas que visita, os 
professores de lá se queixavam da “falta de memória” 
das crianças, até para fixar conceitos considerados 
simples como cores. Ela, então, perguntou a um aluno 
de que cor era a árvore. “Depende”, respondeu ele. 
Depende da parte da árvore, do tipo, da hora do dia e 
de como a luz incide sobre ela. Parece banal, mas é 
fundamental que o professor compreenda com o 
cérebro da criança funciona para ajudá-la a aprender. 
Caso contrário, o professor vai teimar que a árvore é 
verde e o aluno apenas vai decorar a resposta, sem que 
isso faça sentido para ele. 
É muito importante que o professor saiba que o cérebro 
humano se organiza em torno da formação de 
significados. Um campo de significação é uma rede de 
informações e experiências relacionadas entre si que 
constituem sentidos para o indivíduo e possibilitam a 
formação de outros significados. A aprendizagem 
formal ocorre se houver no procedimento pedagógico, 
previsão de trazer o novo relacionado a um 
conhecimento prévio do indivíduo, o que facilita 
construções e desdobramentos de sentidos. 
 
Glaucia Leal - Jornalista, Psicóloga, Psicanalista e editora da revista Mente e Cérebro 
Extraído da revista Mente e Cérebro – edição especial nº26

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