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Transexualidade e mudança do sexo no registro civil: análise dos conceitos de sexo e identidade de gênero aplicados pelo Judiciário e o grau de eficácia na proteção de Direitos Fundamentais.

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X Semana de Extensão, Pesquisa e Pós-graduação - SEPesq
Centro Universitário Ritter dos Reis
Transexualidade e mudança do sexo no registro civil: análise 
dos conceitos de sexo e identidade de gênero aplicados pelo 
Judiciário e o grau de eficácia na proteção de Direitos 
Fundamentais.
Alice Hertzog Resadori
Especialista em Direito Público com Ênfase em Direito Constitucional, 
mestranda em Direito, com Ênfase em Direitos Humanos 
Centro Universitário Ritter dos Reis
ali.resadori@gmail.com
Roger Raupp Rios
Doutor em Direito pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul e Professor 
do Mestrado em Direito, com Ênfase em Direitos Humanos, no Centro 
Universitário Ritter dos Reis
Centro Universitário Ritter dos Reis
roger.raupp.rios@gmail.com
Resumo: A presente pesquisa tem como objetivo geral proceder à analise dos 
conceitos de sexo e de identidade de gênero presentes nas normas 
constitucionais que os protegem, buscando a interpretação ou as interpretações 
que garantam a maior eficácia dos direitos fundamentais à não discriminação por 
motivo de sexo e à proteção do livre desenvolvimento da personalidade. Será 
utilizada a teoria jurídica geral dos direitos fundamentais proposta por Robert Alexy 
como modelo de interpretação dos direitos fundamentais, e serão levadas em 
conta as três principais teorias que se ocupam do estudo destes conceitos 
empíricos, quais sejam, o essencialismo, o construcionismo social e a Teoria 
Queer. Ainda, serão analisadas decisões judiciais que se referem a casos de 
travestis e transexuais que buscam a alteração do prenome e do sexo no registro 
civil, sem que tenham ou pretendam realizar a cirurgia de transgenitalização. A 
análise de tais decisões tem o objetivo de identificar, na prática, quais são as 
consequências jurídicas da utilização de cada uma das teorias acima referidas 
para conceituar gênero e sexo, a fim de esclarecer qual interpretação garante a 
maior eficácia dos direitos fundamentais.
1 Introdução
Este trabalho tem como objetivo geral analisar os conceitos de sexo e de 
identidade de gênero presentes nas normas constitucionais que os protegem, 
buscando a interpretação que garanta a maior eficácia dos direitos 
fundamentais à não discriminação por motivo de sexo e à proteção do livre 
desenvolvimento da personalidade.
X Semana de Extensão, Pesquisa e Pós-graduação
SEPesq – 20 a 24 de outubro de 2014
X Semana de Extensão, Pesquisa e Pós-graduação - SEPesq
Centro Universitário Ritter dos Reis
Para tanto, será utilizada a teoria jurídica geral dos direitos fundamentais 
proposta por Robert Alexy, que apresenta um método de interpretação dos 
direitos fundamentais que leva em conta as dimensões analítica, empírica e 
normativa da dogmática jurídica, com o objetivo de alcançar a maior proteção e 
eficácia destes direitos.
Ademais, serão analisadas as principais teorias que trabalham com os 
conceitos de sexo e gênero – essencialismo, construcionismo social e Teoria 
Queer – aplicando-as ao caso concreto de travestis e transexuais que buscam 
junto ao Poder Judiciário a alteração do prenome e do sexo no registro civil, 
sem a submissão à cirurgia de transgenitalização. A partir do cotejo entre tais 
teorias, objetiva-se encontrar a(s) interpretação(ões) empíricas dos conceitos 
de sexo e gênero que possibilite(m) a maior eficácia dos direitos protegidos 
pelas normas constitucionais, nos termos delineados por Alexy.
Esta pesquisa se justifica na medida em que o Poder Judiciário tem se 
deparado com diversas ações movidas por travestis e transexuais que 
pleiteiam a alteração do nome e do sexo no registro civil, independente da 
realização da cirurgia de transgenitalização. Considerando que as decisões 
judiciais deferem ou indeferem o pedido de acordo com o conceito de sexo 
empregado pelo julgador, é de extrema importância analisar quais são estes 
conceitos, bem como quais são as consequências de suas aplicações nos 
casos concretos.
2 Problema de Estudo
A discriminação por motivo de sexo é vedada na Constituição da 
República Federativa do Brasil, no art. 3º, IV1. A identidade de gênero, por sua 
vez, é protegida constitucionalmente por meio do direito à liberdade (caput do 
art. 5º2), que garante o livre desenvolvimento da personalidade, da privacidade 
e da proteção às escolhas fundamentais dos indivíduos. Considerando que tais 
normas constitucionais não conceituam sexo e gênero, a presente pesquisa 
busca analisar quais são as interpretações empíricas destes conceitos, a fim de 
identificar qual(is) desta(s) possibilita(m) a maior eficácia jurídica dos direitos 
fundamentais, levando-se em conta, especificamente os casos de travestis e 
1 Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:
[…]
IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e 
quaisquer outras formas de discriminação.
[...]
2Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos 
brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, 
à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
[...]
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transexuais que buscam judicialmente a alteração do prenome e do sexo no 
registro civil, sem a realização de cirurgia de transgenitalização.
Tal análise tem como embasamento a teoria jurídica geral dos direitos 
fundamentais proposta por Robert Alexy na obra intitulada Teoria dos Direitos 
Fundamentais. Para delinear tal teoria geral, o autor parte da distinção entre 
três dimensões da dogmática jurídica, que devem ser combinadas quando do 
exame dos direitos fundamentais: a dimensão analítica, que diz respeito à 
análise dos conceitos elementares do direito vigente, às construções jurídicas 
existentes, à estrutura do sistema jurídico e à fundamentação no âmbito dos 
direitos fundamentais; a empírica, que se refere ao direito positivo válido, à 
jurisprudência e à aplicação de premissas empíricas na argumentação jurídica; 
e a normativa, que, a partir do direito positivo válido, determina qual é a 
decisão correta no caso concreto.
Alexy salienta a importância da dimensão empírica em razão de que as 
normas constitucionais são abertas. Assim, a simples cognição do direito 
legislado não oferece respostas suficientes para compreender os conceitos 
presentes nestas normas. O autor propõe, portanto, uma análise conjunta da 
legislação, da práxis jurisprudencial e a cognição de fatos observados 
empiricamente. Ainda, refere que a determinação da decisão correta no caso 
concreto, a partir do direito positivo válido (dimensão normativa), implica em 
juízos de valor de quem responde a tal questão, que devem ser fundamentados 
de maneira racional. Neste sentido “a dogmática jurídica é, em grande medida, 
uma tentativa de se dar uma resposta racionalmente fundamentada a questões 
axiológicas que foram deixadas em aberto pelo material normativo previamente 
determinado”. (ALEXY, 2006, p. 36) 
Considerando que as normas que protegem os indivíduos da 
discriminação por motivo de sexo e garantem o livre exercício da sua 
identidade de gênero deixam em aberto quais são os conceitos de sexo e 
gênero que devem ser aplicados, chegaremos a interpretações diversas dos 
seus significados, e, consequentemente, do âmbito de proteção das normas 
constitucionais antes referidas, conforme a corrente de pensamento que 
adotarmos para fazer a leitura destes termos.
Originalmente, sexo referia-se “às diferenças entre homens e mulheres, 
mas também à forma como homens e mulheres se relacionavam”. (WEEKS,2010, p. 41) Nos últimos dois séculos, o termo passou a ter um sentido mais 
preciso, dizendo respeito às características biológicas que diferenciam homens 
e mulheres. Esta concepção, chamada de essencialista, é vinculada a uma 
abordagem médica, científica, que determina “o que é aceitável ou não, 
patologizando e/ou criminalizando o que se enquadra no segundo caso” 
(CAMARGO, ROHDEN e CÁCERES, 2011, p. 127).
X Semana de Extensão, Pesquisa e Pós-graduação - SEPesq
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Para esta abordagem essencialista do sexo, a transexualidade é 
compreendida como “uma síndrome complexa caracterizada pela convicção 
intensa de ser de um sexo diferente do seu sexo corporal, juntamente com a 
demanda de mudança de sexo dirigida ao sistema médico e judiciário”. 
(ZAMBRANO, 2003, p. 12) A pessoa transexual tem a convicção de pertencer 
a outro sexo, a aversão ao sexo que possui e o interesse em adequar seus 
órgãos genitais. Neste sentido, a transexualidade é reconhecida pela 
Organização Mundial de Saúde como doença e é descrita na Classificação 
Internacional de Doenças (CID 10) como Transtorno de Identidade Sexual, sob 
o código 64.0.
Esta visão medicalizada da transexualidade parte de uma concepção 
binária de sexo e gênero (homem e mulher, masculino e feminino), e entende 
que deve haver correspondência entre o gênero e o sexo biológico do 
indivíduo, na medida em que as construções culturais do feminino e do 
masculino seriam expressões naturais dos homens e das mulheres. A cirurgia 
de transgenitalização é vista, a partir desta perspectiva, como a cura 
necessária para um equívoco biológico, ou seja, seria a forma de “resolver” 
uma indevida incongruência entre o gênero e o sexo. 
Tal posição abre espaço para que as(os) profissionais da saúde definam 
qual é o sexo da pessoa, levando em conta apenas as características 
biológicas do indivíduo e padrões historicamente consolidados do que 
corresponde ser homem ou ser mulher. Isto limita a esfera da auto-
determinação dos indivíduos, violando seu direito à liberdade.
A visão essencialista é criticada pelo construcionismo social, que 
compreende a sexualidade como um dispositivo histórico, como um corpo de 
conhecimento, e não como um dado da natureza. Esta corrente direciona suas 
críticas aos médicos, cientistas e sexólogos, na medida em que construíram a 
sexualidade como um campo privilegiado do conhecimento.
Ao estabelecer uma esfera especializada de conhecimento, ao buscar 
descobrir as “leis da natureza” que supostamente governam o mundo 
sexual, ao argumentar que a sexualidade tem uma influência 
particular em todos os aspectos da vida e que o corpo fala uma 
verdade final, os sexólogos ajudaram, num certo sentido, a “inventar” 
a importância que nós atribuímos ao comportamento sexual. 
(WEEKS, 2010, p. 44)
Michel Foucault é um dos autores mais influentes do construcionismo 
social, abordagem que tem como principal característica a compreensão de 
que a sexualidade é fruto de fatores históricos e culturais, variando, portanto, o 
sentido social dos atos sexuais conforme as compreensões das diversas 
culturas e dos diversos momentos históricos. Assim, considerando-se que um 
determinado ato sexual não tem um sentido estanque e universal, rompe-se 
com a ideia essencialista de que o sexo e a identidade de gênero têm relação 
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direta. Pelo contrário, passa-se a compreender esta relação a partir das 
complexidades e da variabilidade das sociedades no tempo e no espaço, bem 
como das relações de poder que se reproduzem e produzem as classificações 
dos sujeitos a partir do que se compreende como normal e anormal.
Tal concepção compreende a transexualidade não como uma moléstia, 
e sim como um aspecto identitário dos sujeitos. Contrapondo-se aos 
argumentos que justificam as desigualdades pelas diferenças biológicas entre 
os sexos, entende-se que não são as características sexuais que constroem o 
que é feminino e masculino, mas sim, a forma com que estas características 
são representadas e valorizadas socialmente. Desta forma, para que se 
possam compreender as relações entre homens e mulheres, mais do que 
observar seu sexo biológico, deve-se averiguar tudo o que foi construído 
socialmente sobre eles (LOURO, 2010).
Na perspectiva das múltiplas identidades, pode-se dizer que o gênero 
faz parte do sujeito, constituindo-o e se relacionando com as demais 
dimensões das suas identidades, inclusive com a sexualidade, que muitas 
vezes é confundida com a identidade de gênero. Neste sentido, importa 
salientar que, enquanto as identidades de gênero dizem respeito às 
identificações sociais e históricas com o masculino e o feminino, as identidades 
sexuais se constituem “através das formas como vivem sua sexualidade, com 
parceiros/as do mesmo sexo, do sexo oposto, de ambos os sexos ou sem 
parceiros/as” (LOURO, 2010, p. 26). 
Estes dois conceitos se inter-relacionam: assim, um sujeito feminino 
pode ser heterossexual, homossexual, bissexual ou pansexual por exemplo. E 
tais arranjos podem ser modificados a qualquer momento, pois as identidades, 
tanto de gênero como sexual, são mutáveis e instáveis, constituindo-se e 
transformando-se a todo o tempo.
Ao adotarmos esta concepção de gênero, abandonamos os binarismos 
fechados e limitados e deixamos de considerar como “normais” apenas aquelas 
pessoas que se adéquam aos padrões rigidamente estabelecidos socialmente 
como pertencentes a um determinado sexo ou gênero. Desta forma, 
contrapomo-nos a percepção intransigente que 
gera violações de direitos fundamentais e é fruto do fechar dos olhos 
à realidade: a sexualidade e a vida humana não se deixam enquadrar 
em padrões historicamente definidos por profissionais da saúde ou 
por representantes da opinião da maioria. A vida humana e suas 
manifestações são um "continuum", que não se deixam aprisionar em 
polaridades opostas e compartimentos estanques. (TRF4, Apelação 
Cível nº 2001.71.00.026279-9/RS. Relator Juiz Federal Roger Raupp 
Rios, 14 de agosto de 2007).
Salienta-se que esta posição não vê a cirurgia de transgenitalização 
como necessária para adequar o sexo ao gênero da pessoa, pois compreende 
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o sexo a partir de elementos sociais e identitários, e não apenas de 
características biológicas. Assim, é mulher quem tem uma identidade de 
gênero feminina, não apenas quem tem uma vagina. Tal posição, ao romper 
com a ideia estanque de que sexo se relaciona apenas com as características 
biológicas da pessoa, é mais abrangente do que a visão essencialista, e se 
relaciona com a garantia dos direitos fundamentais da igualdade e liberdade.
Há ainda uma terceira corrente teórica que merece análise, a Teoria 
Queer. Tal teoria corresponde a uma abordagem pós-moderna dos estudos da 
sexualidade, que realiza críticas às categorias universais e fixas das 
identidades e das sexualidades. Diferente do construcionismo, que procura 
analisar a formação das identidades, a Teoria Queer busca identificar de que 
forma se apresentam as normas, o discurso e os mecanismos que as 
justificam.
A principal representante desta escola é Judith Butler, que, influenciada 
por Hegel, Foucault, Derrida, Freud, Lacan, entre outros, propõe uma 
genealogia3 do sujeito, retirando-o de uma condição ontológica, pré-existente e 
metafísica e tratando-o como um processo construídono discurso e pelos atos 
que realiza. Como consequência desta genealogia do sujeito, a autora aponta 
que o sexo e o gênero não são causas das instituições, discursos e práticas, ou 
seja, o sexo e o gênero não as criam. Pelo contrário, eles são efeitos destas 
instituições, na medida em que elas criam e causam o sujeito, pois determinam 
qual é o seu sexo, o seu gênero e a sua sexualidade.
A autora chama a atenção para o fato de que não há que se recusar 
esta política representacional, até porque, não há posição fora deste campo. 
Ela refere que deve ser proposta uma genealogia, uma crítica às identidades 
que são criadas e naturalizadas por estas estruturas. 
Neste sentido, entende que o gênero, em lugar de ser uma 
correspondência socialmente construída do sexo-natural, como propõe o 
construcionismo social, é um ato performativo, ou seja, é uma repetição de 
ações que se constituem com força de autoridade e que produzem os 
enunciados que pronunciam. Na medida em que encobrem as convenções que 
os constituem, acabam por naturalizar tais enunciados, fazendo com que o 
sexo e o gênero pareçam ter estado aqui o tempo todo.
A construção política do sujeito procede vinculada a certos objetivos 
de legitimação e de exclusão, e essas operações políticas são 
efetivamente ocultas e naturalizadas por uma análise política que 
toma as estruturas jurídicas como o seu fundamento. O poder jurídico 
produz inevitavelmente o que alega meramente representar; 
consequentemente, a política tem de se preocupar com essa função 
3 A genealogia pode ser concebida como “um modo de investigação histórica que não tem 
como meta a verdade ou o conhecimento” (SALIH, 2012, p. 21). Ela não se dedica a analisar a 
história, e sim, as condições de emergência do que se considera como história. 
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atual do poder: jurídica e produtiva. Com efeito, a lei produz e depois 
oculta a noção de ‘sujeito perante a lei’, de modo a invocar essa 
formação discursiva como premissa básica natural que legitima, 
subsequentemente, a própria hegemonia reguladora da lei (BUTLER, 
2003, p. 9).
Apesar de compreender a identidade de gênero como uma sequência de 
atos performativos, Butler refere que não há um sujeito, um performer por trás 
destes atos, na medida em que o sujeito é o efeito e não a causa dos mesmos. 
A consequência de não existir um sujeito por trás da ação é de que não há 
nenhum modelo original de sujeito a ser copiado. Ele é instituído conforme o 
contexto específico, e assim, pode ser estabelecido de formas diferentes, que 
não reforcem as estruturas de poder, mas as subvertam. 
As estruturas de poder que constroem o gênero são calcadas na 
heteronormatividade compulsória, nos binarismos homem-mulher, macho-
fêmea e na coerência entre gênero e sexo, o que Butler denomina de gêneros 
inteligíveis. Todos aqueles sujeitos que não mantém esta relação de coerência 
são vistos como abjetos, como incoerentes. A autora chama a atenção para o 
fato de que estes gêneros incoerentes só podem ser concebidos em relação a 
normas existentes. Ou seja, as mesmas normas que proíbem, produzem o que 
estão proibindo, já que ligam sexo, gênero e sexualidade e dizem que esta 
relação de coerência é a verdade e o ideal.
São estas normas, permeadas por relações de poderes, que constroem 
as travestis e transexuais como sujeitos abjetos que devem ser readequados 
pela cirurgia de transgenitalização para chegarem mais perto do ideal 
inteligível. Contudo, o que a autora pretende demonstrar, é que não há nenhum 
elemento dado, fixo e imutável que estabeleça tal ideal. Pelo contrário, são as 
instituições, o poder e o discurso que enunciam e constituem tais modelos de 
sujeitos desejáveis. Butler afirma que mesmo o sexo não deve ser 
compreendido como um elemento fixo do corpo do sujeito, pois ele “não é um 
simples fato ou a condição estática de um corpo, mas um processo pelo qual 
as normas regulatórias materializam o ‘sexo’ e produzem essa materialização 
através de uma reiteração forçada destas normas”. (BUTLER, 2010, p. 155).
Assim, as travesti e transexuais, para a Teoria Queer, não precisam e 
nem devem ser “readequadas” por meio de cirurgia, na medida em que se 
questionam justamente as categorias naturalizadas de sexo e gênero. Desta 
forma, entendemos que, se aplicarmos a Teoria Queer ao caso concreto 
analisado, qual seja de mudança de prenome e sexo no registro civil sem a 
realização da cirurgia de transgenitalização, perceberemos que sexo e gênero 
são performativos, e assim, podem ser alterados, vividos e renomeados de 
diversas formas, inclusive subvertendo o modelo inteligível de sujeito, como 
podem fazer as travestis e transexuais não operadas.
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3 Metodologia
A presente pesquisa tem natureza teórica, fundamentada pela 
bibliografia pertinente ao tema, bem como na pesquisa jurisprudencial realizada 
na Justiça Comum, nos Tribunais de Justiça e nos Tribunais Superiores acerca 
das ações movidas por travestis e transexuais para alteração de prenome e de 
sexo no registro civil, sem que tenham realizado ou queiram realizar a cirurgia 
de transgenitalização. 
Será utilizado como método de abordagem o dialético, haja vista que a 
análise dos conceitos de sexo e identidade de gênero que podem ser aplicados 
às normas constitucionais abertas que lhes garantem proteção, envolve a 
verificação de argumentos e contra-argumentos de cada teoria, de teses e 
antíteses, e a busca por uma síntese, ou seja, pelos conceitos que melhor 
protegem os direitos fundamentais.
Como método de procedimento será utilizado o tipológico, pois o modelo 
ideal de interpretação dos direitos fundamentais é construído a partir da análise 
e comparação de aspectos essenciais entre este modelo e a realidade social e 
legal empírica. Por fim, os métodos de interpretação utilizados nesta pesquisa 
são o sistemático e o sociológico. Utilizar-se-á o método sistemático, pois os 
conceitos de sexo e gênero devem ser compreendidos a partir da sua proteção 
constitucional, e a partir dos diversos direitos fundamentais envolvidos, estando 
todas as leis e decisões judiciais que tratam desta matéria a ela submetidas. 
Ademais, será utilizado o método sociológico, tendo em vista que a presente 
pesquisa parte da premissa de que o direito é um fenômeno histórico e cultural, 
espacial e temporalmente localizado. 
4 Síntese dos Resultados
Esta pesquisa encontra-se em fase inicial, tendo sido realizada, contudo, 
a revisão bibliográfica básica dos temas fundamentais ao seu desenvolvimento. 
Neste sentido, procedeu-se ao estudo da teoria jurídica geral dos direitos 
fundamentais proposta por Robert Alexy, foram levantados os argumentos 
centrais das principais teorias que versam sobre sexualidade - essencialismo, o 
construcionismo social e a Teoria Queer, bem como foram identificados os 
conceitos de sexo e gênero propostos por estas escolas, com suas implicações 
práticas no caso de travestis e transexuais, conforme exposto no ponto 
anterior.
Ainda, foi realizada pesquisa inicial de jurisprudência em tribunais 
estaduais, no Supremo Tribunal Federal e no Superior Tribunal de Justiça, 
tendo sido identificados 6 (seis) decisões referentes ao pleito de mudança de 
prenome e sexo no registro civil sem a realização de cirurgia de 
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transgenitalização. Destas, podemos identificar 3 (três)4 decisões que vinculam 
o sexo exclusivamente a elementos biológicosdos sujeitos, compreendendo, 
portanto, que a alteração do sexo no registro civil depende da cirurgia de 
transgenitalização, pois, do contrário, estar-se-ia diante de um caso flagrante 
de impossibilidade jurídica, já que o registro civil estaria espelhando a verdade 
biológica do autor, não devendo, portanto, ser alterado. Nestes casos, há uma 
clara identificação do conceito de sexo utilizado com aquele proposto pelas 
correntes essencialistas.
Ademais, deparamo-nos com 2 (duas) decisões do Tribunal de Justiça 
do Rio Grande do Sul5 e 1 (uma) do Tribunal de Justiça de São Paulo6 em que 
o relator opina pela alteração do sexo sem que a autora tenha realizado a 
cirurgia, por entender que o prenome e o sexo constantes no registro civil 
devem corresponder ao gênero, e não o inverso, tendo, assim, uma forte 
correspondência com as teorias construcionistas, que levam em conta 
questões identitárias de gênero para a concepção do sexo. Ainda, podemos 
observar um traço Queer nesta decisão, na medida em que compreende que o 
gênero precede o sexo, não sendo uma decorrência e nem tendo uma 
correspondência com este. Salienta-se, contudo, que num dos casos do TJ/RS, 
o relator foi voto vencido, tendo preponderado a posição que compreende o 
sexo como expressão exclusivamente biológica, e assim, foi indeferida a 
alteração deste elemento no registro civil.
5 Conclusões Parciais
A partir do estudo das teorias essencialista, construcionista e Queer, 
podemos perceber que sexo e gênero podem ser interpretados de formas 
diversas, conforme a compreensão teórica utilizada. Enquanto para os 
essencialistas o sexo se refere exclusivamente aos aspectos biológicos dos 
indivíduos, sendo o gênero a expressão cultural decorrente de tais aspectos, o 
construcionismo social entende que sexualidade é fruto de fatores históricos e 
culturais, devendo, assim, o sexo ser compreendido também a partir de 
aspectos identitários dos sujeitos. Já a Teoria Queer se dedica a identificar as 
relações de poder que permeiam as instituições e os discursos e que são 
responsáveis por produzir identidades universais, estáticas e heteronormativas, 
bem como que relacionam o gênero a uma expressão cultural do sexo-natural, 
4 TJSP, Apelação Cível nº 0003070-19.2009.8.26.0663, Relator Elcio Trujillo, 16 de março de 
2011; TJSP, Apelação Cível nº 668.232-4/5-00, Relator Sabastião Carlos Garcia, 26 de 
novembro de 2009 e TJRS, Agravo de Instrumento nº 70026211797, Relator Sérgio Fernando 
de Vasconcellos Chaves, 18 de fevereiro de 2000.
5 TJRS, Apelação Cível nº 70041776642, Relator Rui Portanova, 30 de junho de 2011 e TJRS, 
Apelação Cível, nº 70057414971, Relator Rui Portanova, 05 de junho de 2014.
6 TJSP, Apelação Cível nº 008539-56.2004.8.26.0505, Relator Vito Guglielmi, 18 de outubro de 
2012.
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colocando em cheque, inclusive, a rigidez do sexo, na medida em que o 
compreende como um ato performático, e não como um modelo original pré-
existente.
A aplicação destes conceitos às normas constitucionais que vedam a 
discriminação por motivo de sexo e protegem o livre desenvolvimento da 
personalidade dos sujeitos tem consequências práticas distintas, conforme a 
escola utilizada para compreender tais elementos. Desta forma, buscou-se, 
neste trabalho, analisar tais consequências, a partir dos casos de travestis e 
transexuais que pleiteiam judicialmente a alteração do prenome e do sexo no 
registro civil, sem a realização de cirurgia de transgenitalização.
Neste sentido, conforme os resultados iniciais apontados por esta 
pesquisa, percebemos que, nos casos em que os julgadores aplicaram os 
conceitos formulados pela escola essencialista, os pedidos de alteração de 
sexo foram indeferidos, na medida em que compreendem que o registro civil 
está de acordo com o sexo biológico dos sujeitos, não devendo, portanto, ser 
alterado. Já nas situações em que são levados em conta os aspectos 
identitários de gênero para a concepção do sexo (construcionismo social), as 
decisões judiciais foram no sentido de acolher os pedidos de alteração do 
registro civil. Observamos, ainda, que apenas uma das decisões analisadas 
traz referência à Teoria Queer, ao referir a precedência do gênero em relação 
ao sexo, tendo, contudo, o centro da argumentação calcada no 
construcionismo.
Assim, entre as posições encontradas na jurisprudência analisada, 
podemos desde já concluir que, no intuito de garantir a maior efetividade dos 
direitos fundamentais em análise, como propõe Alexy, as normas 
constitucionais que protegem o livre desenvolvimento da personalidade e 
proíbem a discriminação por motivo de sexo, devem ser interpretadas levando 
em conta o conceito empírico de sexo e de gênero propostos pelo 
construcionismo social, e não pelo essencialismo. Contudo, observamos que a 
aplicação da Teoria Queer no objeto de análise desta pesquisa traria uma 
interpretação ainda mais abrangente das categorias sexo e gênero, garantindo, 
portanto, maior proteção aos direitos fundamentais a eles relacionados. Isto 
porque, esta teoria, ao compreender sexo e gênero como performatividade, 
aceita que os mesmos sejam vividos de diversas formas, inclusive subvertendo 
o modelo heteronormativo e inteligível do sujeito. Assim, a troca do sexo das 
travestis e travestis e transexuais que não se submeteram à cirurgia poderia 
ser realizada, independente da demonstração da existência de traços femininos 
ou masculinos que formam suas identidades de gênero, como se exige nas 
decisões fundamentadas no construcionismo social. 
 
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Centro Universitário Ritter dos Reis
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