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IMUNIDADE E TIPOS DE RESPOSTA IMUNOLÓGICA 11 CONCEITO Imunidade é a capacidade do organismo de reconhecer substâncias, considerá-las estranhas e promover uma resposta contra elas, tentando eliminá-las. A palavra imunidade origina-se do latim immunis, que se referia a indivíduos livres de impostos, de encargos pesados, a pessoas protegidas ou beneficiadas em relação às demais. A grande maioria das substâncias que o organismo reconhece como “estranhas” consiste em microrganismos ou substâncias que não são próprias dele e, portanto, a eliminação desses agentes é um mecanismo de proteção. No caso de existirem células anômalas, como células neoplásicas, também ocorre defesa diante do agente endógeno. Assim, quase sempre a imunidade é benéfica ao indivíduo. Em uma minoria de casos, o organismo passa a reconhecer como agente “estranho” um componente endógeno próprio do organismo ou responde de forma exacerbada contra certos agentes exógenos. Nesses casos, a defesa passa a ser prejudi- cial. Assim, imunidade não é sinônimo de defesa benéfica, em- bora isso se dê na maioria dos casos. A imunidade ocorre por meio do reconhecimento, da me- tabolização, da neutralização e da eliminação de substâncias consideradas estranhas ao organismo (Figura 1.1). IMUNOLOGIA E IMUNOPATOLOGIA Imunologia é o estudo da imunidade, cujo sufixo tem origem no grego logos, que significa palavra, discurso sobre. Imuno- patologia é o estudo das alterações da imunidade, cujo sufixo Figura 1.1 Conceito de imunidade. 18 capítulo 1 IMUNIDADE E TIPOS DE RESPOSTA IMUNOLÓGICA tem origem no grego pathos, que significa doença. A imunopatologia estuda em especial as alergias, as doenças auto-imunes e as imunodefi- ciências (Figura 1.2). A descrição da defesa do organismo precedeu ao conhecimento da existência de microrganismos. Jenner, em 1796, tentou demonstrar uma defesa contra varíola humana a partir de varíola em vacas; não conseguiu que sua teoria fosse aceita, apesar de ter feito até uma auto-inoculação. Koch, no século XIX, fez referência aos “microrganismos”. Com Pasteur, em 1880, reconheceu-se o início da imunologia com a aplicação da vacina anti-rábica. Metchnikoff, em 1887, descreveu a ingestão e a digestão de microrganismos por células fagocitárias, estudando estrelas-do-mar. Em 1890, von Behring utilizou o termo “anticorpos” (Figura 1.3). A imunologia está cada vez mais relacionada à etiopatogenia das diferentes doenças e, ao estudar os processos utilizados pelo hospedeiro, na manutenção de sua estabilidade, no confronto com substâncias consi- deradas estranhas ao organismo, deixa implícito o fato de abranger ciências básicas e clínicas. O objetivo do estudo da imunologia é conhecer os conceitos da respos- ta imunológica, os elementos inerentes a ela, como esses elementos estão envolvidos nos mecanismos de defesa do organismo, como pode ser feita a avaliação imunológica e como as alterações do sistema imu- nológico podem levar a doenças. O entendimento dos conceitos imu- nológicos das alergias e das doenças auto-imunes, seus mecanismos etiopatogênicos e fisiopatológicos determinando sinais e sintomas, per- mite a verificação de como tais mecanismos estão imbricados no trata- mento básico das doenças imunológicas do ser humano. O estudo das imunodeficiências implica o conhecimento da imunologia básica com os conceitos dos mecanismos envolvidos no imunocomprometimento, suas repercussões clínicas e a investigação do comportamento da respos- ta imunológica, permitindo o diagnóstico dessas deficiências. SISTEMA IMUNOLÓGICO O sistema imunológico é aquele responsável pela imunidade, ou seja, que determina a defesa do indivíduo contra agentes agressores. Anatomicamente, é constituído por dois sistemas: monocítico – macrofágico ou fagocítico mononuclear; e linfocítico ou linfocitário – daí ser referido como sistema linfocítico-macrofágico (Figura 1.4). Anteriormente, o sistema monocítico-macrofágico era conhecido como sistema reticuloendotelial (SRE). O sistema monocítico-macrofágico atua com uma constante vigília para o hospedei- ro. Diante de agentes estranhos, principalmente microrganismos intracelulares e célu- las neoplásicas, as células deste sistema realizam quimiotaxia, fagocitose e sintetizam citocinas. O sistema monocítico-macrofágico tem, ainda, grande importância por pro- mover a apresentação de antígenos ao sistema linfocítico, sendo que muitas das células linfocíticas só são ativadas mediante esta apresentação antigênica (Figura 1.5). Entre as funções do sistema linfocítico, destacam-se a vigilância, uma defesa espe- cífica mediada por mecanismos complexos e a produção de citocinas. É peculiar a este sistema uma memória imunológica para o agente agressor, que pode perdurar por vários anos (Figura 1.6). Figura 1.2 Conceito de imunopatologia. Figura 1.3 Início da imunologia. Figura 1.4 Conceito e denominação do siste- ma imunológico. IMUNOLOGIA 19 RESPOSTA IMUNOLÓGICA A resposta imunológica é o mecanismo pelo qual o organismo reconhece e responde à substância que considera estranha (Figura 1.7). As células da resposta imunológica são oriundas de células primordiais da medula óssea, as quais dão origem à linhagem linfóide e à linhagem mielóide, ambas indepen- dentes quanto às células a que darão procedência. Poderá haver comprometimento nas células do tronco linfóide, sem que isso implique deficiência do tronco mielóide, sendo também verdadeiro o inverso (Figura 1.8). A célula primordial linfóide, na presença principalmente de interleucina 3 e 7 do estroma da medula óssea, dá origem aos linfócitos. Neutrófilos, monócitos, macrófagos, mastócitos, basófilos, eosinófilos e plaquetas são provenientes da linhagem mielóide, na presença de IL-3, fator estimulador de crescimento de colônias de granulócitos, monócitos/macrófagos (GM-CSF) e fator estimulador de crescimento de neutrófilos (G-CSF), células estas de importância no desenvolvimento de uma resposta imunológica. A maioria das células dendríticas tem origem mielóide, entre- tanto, algumas destas células têm progenitores linfóides. CLASSIFICAÇÃO DA RESPOSTA IMUNOLÓGICA A resposta imunológica, que se dá principalmente em órgãos linfóides periféricos, pode ser classificada em primária e secundária, ativa e passiva, inata e adaptativa, humoral e celular (Figura 1.9). RESPOSTA PRIMÁRIA E SECUNDÁRIA A resposta primária é a reação do organismo quando entra em contato pela primeira vez com uma substância considerada estranha. O resultado é a ativação inicial do sistema macrofágico, seguida de ativação do sistema linfocítico. Há participação de várias células, incluindo monócitos, ma- crófagos, linfócitos timo-dependentes (T) e bursa equivalentes (B), com formação de imunoglobulinas principalmente do isótipo M (IgM), resul- tando na formação de células de memória B e T (Figura 1.10). Figura 1.5 Funções do sistema monocítico-macrofágico. Figura 1.6 Funções do sistema linfocítico. Figura 1.7 Conceito de resposta imunológica. Figura 1.8 Origem das células da resposta imunológica. 20 capítulo 1 IMUNIDADE E TIPOS DE RESPOSTA IMUNOLÓGICA Na resposta secundária, por sua vez, o organismo já manteve contato prévio com a substância estranha. Há ativação seqüencial de sistema ma- crofágico e linfocítico. Uma grande diferença é que na resposta secundária o organismo já conta com a presença de linfócitos B e T memória. A reação dá-se de forma mais rápida e mais intensa tanto para a formação de no- vas imunoglobulinas com maior afinidade ao antígeno quanto para o apa- recimento de novos linfócitos T. A imunoglobulina predominante na res- posta secundária é a IgG, sendo o início dado pela IgM. Assim, um con- tato prévio com um microrganismo é importante para o desenvolvimento de uma melhor defesa imunológica pelo indivíduo (Figura 1.11). A aplicação prática de uma resposta imunológicase- cundária é o uso de vacinas: o organismo tem um contato inicial com agentes atenuados fornecidos pelas imuniza- ções e, diante de um agente agressor in natura, terá uma melhor defesa pelas células de memória, fazendo com que na grande maioria dos casos não apareçam sintomas ou sinais clínicos ou estes sejam frustros. RESPOSTA ATIVA E PASSIVA A resposta ativa ocorre quando o organismo recebe subs- tâncias estranhas ou antígenos que determinam uma rea- ção imunológica. É o caso das vacinações ou das imuni- zações (Figura 1.12). Nas vacinas podem ser administra- dos toxóides, microrganismos mortos ou vivos atenuados. Toxóides são toxinas destoxificadas, ou seja, toxinas tratadas em que foi retirada a parte que causa danos ao organismo, permanecendo a porção capaz de determinar uma resposta imunológica. São exemplos o toxóide tetâ- nico e o diftérico. A toxina tetânica tratada com formalina perde sua toxicidade, mantendo a capacidade antigênica. A resposta imunológica a toxóides é alta, permanecendo células de memória por longos períodos de tempo. Das bactérias mortas, o exemplo é a Bordetella pertussis, contra a coqueluche. O nível de resposta imunológica a bactérias mortas é bem mais baixo e, portanto, a eficá- cia da vacina é menor. Atualmente tem sido dada prefe- rência para vacinas acelulares, ou seja, sem a bactéria completa, apenas com componentes da bactéria, princi- palmente o toxóide pertussis; há melhor tolerância e maior imunogenicidade. A bactéria viva Mycobacterium tuberculosis pode ser ate- nuada, dando origem à vacina BCG (Bacilo de Calmete e Guérin). É útil em populações de locais onde a tubercu- lose é endêmica, prevenindo com alta eficácia a menin- gotuberculose em crianças. O enfraquecimento de vírus vivos, como o vírus da poliomielite da vacina Sabin, do sarampo e da rubéola, tornando-os atenuados leva à perda de grande parte da patogenicidade, permanecendo a capacidade de gerar uma resposta imunológica, geralmente com formação de células de memória de meia-vida longa (Figura 1.13). Figura 1.10 Conceito de resposta primária. Figura 1.9 Classificação da resposta imunológica. Figura 1.11 Conceito de resposta secundária. IMUNOLOGIA 21 O vírus vivo atenuado da poliomielite da vacina Sabin é administrado por via oral e a defesa dá-se inicialmente na mucosa digestiva, permanecendo a eliminação fecal de alguns vírus não-destruídos, o que é útil em populações nas quais se está tentando erradicar a poliomielite, pois há disseminação fecal do vírus atenuado, imunizando outros indivíduos. Vírus vivos atenuados, assim como bactérias vivas atenuadas, podem ter risco de desenvolvimento da doença em pacientes imuno- comprometidos. A vacina oral contra a poliomielite é constituída por três sorotipos de vírus vivos atenuados da poliomielite. Em pacientes com imunodeficiência do tipo celular, a baixa resposta imunológica contra o vírus pode causar doença, apesar da menor patogenicidade desse vírus. Em países que visam à erradicação da poliomielite, o risco desses pacientes com baixa defesa imunológica não é considerado durante campanhas de vacinação, ficando por conta do médico a contra-indicação de tais vacinas a pacientes com deficiência da imunidade celular e com ausência total de anticorpos. A vacina Salk é uma indicação para esses indivíduos por não apresentar risco de desenvolvimento da doença; é formada por três sorotipos de vírus mortos, obtidos a partir de culturas de células tratadas com formalina. O poder antigênico da Salk é bem menor do que o da Sabin, além de não promover imunidade intesti- nal. Ainda hoje existem cepas originais de Salk. Na resposta passiva são recebidos produtos da resposta imunológica provenien- tes de linfócitos B ou T (Figura 1.14). Anticorpos, como produtos da resposta passiva de células B do isótipo G, são recebidos durante a vida fetal por passagem transplacentária. São úteis em defesas contra microrganismos para os quais a mãe já tenha desenvolvido uma resposta imunológica, como é o caso de a criança já possuir ao nascimento IgG antitetânica. A amamentação natural permite a passagem de IgA pelo leite. Já os leites industrializados com fórmulas semelhantes ao leite humano não contêm imuno- globulinas. Essa diferença é importante porque no início da vida a criança ainda não tem IgA para defesa, que se formará com o evoluir da idade. O colostro é o leite mais rico em IgA e durante toda a lactação há IgA no leite materno. A administração de anticorpos é muito útil nas doenças em que não houve tempo suficiente para o organismo comba- ter os agentes agressores, com sinais e sintomas muito graves ou naquelas conhecidas por terem evolução rápida e grave. Assim, na doença tetânica ou diftérica já instalada são utiliza- das antitoxinas antitetânicas ou antidiftéricas isoladas de indi- víduos que apresentaram a doença. A gamaglobulina humana é a fração das proteínas plas- máticas separada por eletroforese e que contém uma grande quantidade de anticorpos. A gamaglobulina laboriatorialmen- te preparada e tratada é constituída por um pool de gamaglo- bulinas de diferentes indivíduos sadios. É útil para pacientes com deficiência de IgG, pois a quase totalidade de gamaglo- bulina humana é formada por IgG, sendo mínima a quantida- de de outros isótipos da mesma. A gamaglobulina oriunda de populações em que há endemias de sarampo e de hepatite por vírus A pode ter indicação em casos especiais dessas doenças. A gamaglobulina hiperimune é proveniente de inoculações sucessivas de antígenos específicos em animais de laboratório, resultando na formação de anticorpos específicos que podem ser úteis em ocasiões em que é necessária uma rápida resposta imune. Pode causar problemas por serem anticorpos de outra Figura 1.12 Resposta ativa e sua aplicação. Figura 1.13 Exemplos de resposta ativa. Figura 1.14 Exemplos de resposta passiva por produtos de linfócitos B. 22 capítulo 1 IMUNIDADE E TIPOS DE RESPOSTA IMUNOLÓGICA espécie, como eqüina ou bovina, constituindo-se, portanto, em substâncias muito diferentes dos anticorpos humanos. O soro, por conter a fração gamaglobulina, pode ser utilizado em casos de necessidade da presença imediata de anticorpos e não sendo possível a administração de anticorpos específicos, aos quais sempre se deve dar preferência. Na resposta passiva os produtos recebidos podem ser prove- nientes de linfócitos e de monócitos (Figura 1.15). O primeiro a ser descrito foi o fator de transferência, obtido de um macerado de células mononucleares quando se pretendia transferir as subs- tâncias sintetizadas por tais células. Atualmente, quase não é mais utilizado, preferindo-se substâncias mais específicas separa- das, como o interferon α, que promove a defesa antiviral, sendo utilizado em determinados casos de hepatite pelo vírus C. A IL-3 pode ser útil para aumentar a hematopoese pela medu- la óssea, em casos de aplasias e em algumas leucoses. O fator estimulador de crescimento de colônias de granulócitos pode ser útil em neutropenias. A IL-2 é o principal fator de crescimento e de diferenciação de linfócitos T, sendo utilizada quando há ne- cessidade de defesa por essas células. RESPOSTA INATA E ADAPTATIVA A resposta imunológica inata ou inespecífica é aquela pela qual o organismo respon- de sempre da mesma forma, qualquer que seja o agente agressor (Figura 1.16). O tipo ou qualidade de resposta não varia, podendo modificar apenas a quantidade. É a primeira defesa do organismo com atuação imediata contra qualquer agente. Não determina uma imunidade permanente, apesar de poder agir por vários dias. Os componentes da resposta inata são: barreira mecânica, fagócitos atuando por meio de quimiotaxia seguida por fagocitose, sistema complemento e células natural killer ou NK. Esses componentes já existem ao nascimento, não se modificando com o tempo. A via clássicado complemento apresenta todas as características de uma resposta inata, fazendo a ligação entre a resposta inata e a adaptativa. As células da resposta inata apresentam receptores para estruturas que se repetem em diferentes patógenos, não sendo necessária uma resposta tão discriminativa como para a resposta adaptativa. A resposta imunológica adaptativa, específica ou adquirida vai sendo desenvolvida com a idade, havendo necessidade do contato com o antígeno para sua aquisição. Assim, com o tempo essa resposta vai se modificando, tornando-se mais eficiente. Trata-se de uma reação específica para cada antígeno, variando quanto à qualidade e à intensidade (Figura 1.17). A resposta adaptativa combate substâncias de extrema variabilidade. Suas células apresentam receptores de alta diversidade e especificidade. A resposta adaptativa ocorre quando a inata é insuficiente para debelar o agente agressor. Há necessidade de maior tempo para seu início, principal- mente frente aos primeiros contatos com as substâncias. A resposta adaptativa dá-se pela imunidade humoral e celular. Na defesa humoral, os principais responsáveis são proteínas plasmáticas, as imuno- globulinas, sintetizadas por linfócitos bursa equivalentes (B) diferenciados em plasmócitos. A resposta adaptativa celular ocorre por ação direta de células, os linfócitos timo-dependentes (T). Os linfócitos são altamente es- pecíficos para cada patógeno, resultando em reações extremamente dirigidas Figura 1.15 Exemplos de resposta passiva por produtos de linfócitos T e de mo- nócitos. Figura 1.16 Conceito e componentes da respos- ta inata. IMUNOLOGIA 23 Figura 1.17 Conceito, características e compo- nentes da resposta adaptativa. contra as características de cada agente agressor, havendo, por isso, acentuada heterogeneidade nesse tipo de resposta. Na resposta adaptativa são formados linfócitos T e B memória que permitem um reconhecimento antigênico mais rápido e uma melhor defesa em contatos subseqüen- tes. O resultado é uma imunidade duradoura, protegendo o organismo contra infecções pelo mesmo agente. Pequenos linfócitos oriundos da célula progenitora linfóide da medula óssea diri- gem-se ao timo ou permanecem na medula, dando origem a linfócitos T e B, respecti- vamente. Essas células migram para os órgãos linfóides secundários: linfonodos, baço e tecido linfóide associado às mucosas (MALT), para que se efetue a resposta adapta- tiva. Os linfócitos T são responsáveis pela imunidade celular, enquanto os B produzem anticorpos, os quais constituem a imunidade humoral (Figura 1.18). A inflamação é resultante dos diferentes mecanismos da resposta imunológica na tentativa de manter a homeostasia do organismo e recuperar os tecidos lesados. É o resultado da ativação da resposta inata ou da inata em conjunto com a adaptativa. Nos próximos capítulos serão analisados os diferentes componentes da resposta imunológica inata e adaptativa. Figura 1.18 Origem da imunidade celular e humoral. 24 capítulo 1 IMUNIDADE E TIPOS DE RESPOSTA IMUNOLÓGICA EXEMPLOS CLÍNICOS Caso 1 Criança com oito meses de idade, do sexo feminino, apresentando coriza e tosse produtiva há um dia. Iniciou o quadro com febre, diarréia e vômitos há seis horas. Ao exame, apresentava desidratação moderada e ausculta de roncos pulmonares. Evolução: Foi tentada a hidratação oral, porém, apesar dos antieméticos, continuou a apresentar vômitos. Foi então internada para hidratação endovenosa e observação. Após seis horas da internação, foram observadas manchas de Köplick. A criança foi isolada, e foi administrada vacina contra sarampo aos demais pacientes da enfermaria com idade inferior a um ano ou que haviam recebido apenas a primeira dose da vacina, ou na incerteza de vacinação prévia. Discussão: Até 48 a 72 horas após o contato, dá-se preferência à resposta ativa atenuada, por meio da imunização contra vírus do sarampo, por ter resultados tão ou mais rápidos do que a resposta ativa pelo vírus do sarampo in natura. É preferível a imunização de crianças contactantes de baixa idade à observação da possibilidade de desenvolver a doença. A imunização ativa contra sarampo feita precocemente é prejudicada pela presença da resposta passiva por anticorpos maternos recebidos por via transplacentária. Antes de um ano de idade, anticorpos maternos contra sarampo ainda estão presentes na criança, o que diminui a eficácia vacinal. Até há algum tempo, a primeira dose da vacina anti-sarampo era feita em crianças com menos de um ano de vida e repetida depois, por ser o sarampo até então endêmico. Pelo controle da doença, principalmente por intermédio da imuni- zação ativa, houve mudança no calendário vacinal, tentando-se evitar a menor eficácia da resposta ativa à vacina com a interferência da resposta passiva dos anticorpos maternos. Caso 2 Paciente com 37 anos de idade, do sexo feminino, apresentando febre, dor de garganta, dificuldade de ingestão e irritabilidade há um dia. Há duas horas começou a ter contratura em braços e pernas. Ao exame físico, apre- sentava trismo, espasmos tônicos, generalizados e dolorosos. Foi encontrada lesão de ferimento cortante infectado. Não sabia referir sobre vacinas. Evolução: Foi diagnosticado tétano, que evoluiu com piora dos espasmos. Foi realizada intubação endotraqueal, debridamento do ferimento e administração de penicilina e antitoxina tetânica. Discussão: No caso em questão, com quadro de tétano instalado, a toxina do bacilo tetânico pode se unir à célula nervosa, determinando o quadro clínico. Ao se administrar antitoxina, a toxina do agente irá se unir à an- titoxina, poupando a célula nervosa. IMUNOLOGIA 25 REFERÊNCIAS Abba AK, Lichtmann AH. Cellular and molecular Immunology. 5th ed. Philadelphia: WB Saunders Company; 2003. Akashi K, Kondo M, Cheshier S, Shizuru J, Gandy K, Domen J, Mebius R, Traver D, Weissman IL. Lymphoid development from stem cells and the common lymphocyte progenitors. Cold Spring Harbor Symp Quant Biol. 1999; 64: 1-12. Allon R, Feigelson S. 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