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Fonte das obrigações

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Aula 01 - Fonte das Obrigações (ou contratos)
Este terceiro semestre do curso de Direito Civil é chamado por muitos de “Contratos”, mas na verdade seu nome correto é “Fontes das Obrigações”, porém como o contrato é a maior fonte de obrigação, fica a polêmica.
            No semestre passado foram estudadas as obrigações jurídicas decorrentes das relações dos homens com outros homens. Das relações dos homens com as coisas cuida o Direito Real, assunto de Civil 5. E o principal direito real é a propriedade. Propriedade e contrato são assim os pilares do Direito Civil e da vida de todos nós. Este é o sentido da vida: estudar e trabalhar para se relacionar com as pessoas, celebrando contratos, e se relacionar com as coisas, adquirindo propriedade, tudo para formar umpatrimônio que será transferido após nossa morte a nossa família (Dir de Família, Civil 6), de acordo com as regras do Direito das Sucessões (herança - Civil 7).
            Em Civil 4, no próximo semestre, o estudo dos contratos será aprofundado com a análise das diversas espécies de contratos, não de todos os contratos, mas apenas dos mais importantes (art 425).
            E como se originam as obrigações? Quais as fontes das obrigações, como se criam as obrigações, assunto deste semestre? 1) a maior e mais importante fonte, já disse, é o contrato. As outras fontes são 2) os atos unilaterais (ex: promessa de recompensa, 854), 3) os atos ilícitos (assunto de Civil 1 e neste semestre em Responsabilidade Civil, 927) e 4) a lei propriamente dita (ex: sustento, 1566, IV, alimentos, 1696, assuntos de Direito de Família), ressaltando que na verdade a lei está também por trás das demais fontes.
            Não percamos tempo e vamos logo tratar dos:
             CONTRATOS
  Etimologicamente deriva de “contractus” e de contrair.
            Conceito: negócio jurídico resultante de um acordo de vontades que produz efeitos obrigacionais. Este é o conceito da doutrina, até porque não é missão do legislador fazer definições. Vamos comentar e destacar os aspectos principais deste conceito:
            - negócio jurídico: contrato é negócio jurídico, ou seja, é uma declaração de vontade para produzir efeito jurídico. O contrato é negócio, via de regra, informal, quer dizer, existe uma grande liberdade das pessoas na celebração dos contratos, tanto que a maioria dos contratos pode ser verbal até para facilitar a nossa vida e a circulação de bens (art. 107). Chama-se de autonomia privada este campo do Direito Civil justamente porque a liberdade das pessoas no contratar e no dispor de seus bens é grande.        As partes podem até criar/inventar contratos, igualmente celebrá-los verbalmente, sem formalidades (425). Recomenda-se celebrar por escrito contratos de alto valor, mas não por uma questão de validade e sim por uma questão de segurança, caso surja algum litígio judicial (227). Os contratos verbais são provados em Juízo mediante testemunhas, que são provas menos seguras do que os documentos. Exemplo de contrato solene/escrito é a compra e vende de imóvel (108) e a doação (541). São contratos informais/verbais a compra e venda de móveis, a locação e o empréstimo.
             - acordo de vontades: o contrato exige um consenso, um acordo de vontades. É  esse consenso que vai formar o contrato, principalmente se o contrato for verbal. O consenso é entre pelo menos duas partes. Por isso todo contrato é no mínimo bilateral quanto às partes, afinal ninguém pode ser credor e devedor de si mesmo (revisem confusão, modo de extinção das obrigações visto em Civil 2).  O que se admite é o autocontrato, ou contrato consigo mesmo, quando uma única pessoa vai agir por duas partes (ex: A vai viajar e precisa vender sua casa, então passa uma procuração a seu amigo B autorizando-o a vendê-la a quem se interessar, eis que o próprio B resolve comprar a casa, então B vai celebrar o contrato como vendedor, representando A, e como comprador, em seu próprio nome). São duas vontades jurídicas distintas, embora expressas por uma só pessoa.
            - efeitos obrigacionais: as obrigações têm efeitos estudados em Civil 2, e dois deles se aplicam diretamente aos contratos:
1) a transitoriedade: os contratos, em geral, são transitórios/são efêmeros/têm vida curta (ex: compra e venda de balcão); alguns contratos são duradouros (ex: locação por doze meses), mas um contrato não deve ser permanente. Permanência é característica dos Direitos Reais. A propriedade sim dura anos, décadas, se transmite a nossos filhos, mas os contratos não.
2) o valor econômico: todo contrato, como toda obrigação, precisa ter um valor econômico para viabilizar a responsabilidade patrimonial do inadimplente se o contrato não for cumprido. Em outras palavras, se uma dívida não for paga no vencimento ou se um contrato não for cumprido,  o credor mune-se de uma pretensão e a dívida se transforma em responsabilidade patrimonial. Que pretensão é esta de que se arma/de que se mune o credor? É a pretensão a executar o devedor para atacar/tomar seus bens através do Juiz. E se o devedor/inadimplente não tiver bens? Então não há nada a fazer pois, como dito, a responsabilidade é patrimonial e não pessoal. Ao credor só resta espernear, é o chamado na brincadeira “jus sperniandi”. Realmente já se foi o tempo em que o devedor poderia ser preso, escravizado ou morto por dívidas. O único caso atual de prisão por dívida é na pensão alimentícia, assunto de Direito de Família. Existe também uma prisão civil contra o depositário (assunto do próximo semestre, 652, mas a jurisprudência tem rejeitado essa prisão).
Aula 02 - Elementos, requisitos e pressupostos contratuais
Hoje vamos trabalhar em cima do art 104 do CC, que vocês conhecem de Civil 1.
1 – capacidade das partes: este é o primeiro elemento (art. 104, I), pois o contrato celebrado pelo incapaz é nulo (166, I) e pelo relativamente incapaz é anulável (171, I). A nulidade é assim mais grave do que aanulabilidade. Imaginem uma doença: a nulidade é uma doença fatal, já a anulabilidade é curável. Depois revisem este assunto de Civil 1. Mas o menor e o louco, embora incapazes, podem adquirir direitos e celebrar contratos, desde que devidamente representados. Então os pais representam os filhos, os tutores representam os órfãos e os curadores representam os loucos (assunto de Direito de Família, Civil 6). Desta forma, a capacidade de direito é inerente a todo  ser humano (art. 1º), a capacidade de fato é que falta a algumas pessoas (ex: menores, loucos) e que por isso precisam ser representadas para celebrar contratos (116).
2 – objeto do contrato: é a operação, é a manobra que as partes visam realizar. O objeto corresponde a uma prestação lícita, possível, determinada e de valoração econômica. Falaremos mais de prestação abaixo. Então A não pode contratar B para matar C, nem A pode contratar B para comprar contrabando ou drogas, pois o objeto seria ilícito.  Igualmente o filho não pode comprar um carro com o dinheiro que vai herdar quando o pai morrer, pois a lei proíbe no art. 426 (chama-se de pacta corvina, ou pacto de corvo este dispositivo já que é muito mórbido desejar a morte do pai, e ninguém garante que o filho é que vai morrer depois).
Quanto à possibilidade do objeto, seria impossível contratar um mudo para cantar, ou vender passagens aéreas para o sol.
O objeto também precisa ser determinado ou determinável, conforme visto no semestre passado quanto às obrigações de dar coisa certa ou incerta (243).
Finalmente, o contrato precisa ter valor econômico para se resolver em perdas e danos se não for cumprido por ambas as partes, conforme explicado na aula passada (389). O valor econômico do contrato viabiliza a responsabilidade patrimonial do inadimplente, já que não se vai prender um artista que se recusa a fazer um show. O artista será sim executado patrimonialmente para cobrir os prejuízos, tomando o Juiz seus bens para satisfazer a parte inocente.
Vide art 104, II do CC.
3 – forma: a forma do contrato é livre, esta é a regra, lembrem-se
sempre disso. Existem exceções, mas esta é a regra geral: os contratos podem ser celebrados por qualquer forma, inclusive verbalmente face àautonomia da vontade que prevalece no Direito Civil (107). O formalismo está em desuso nos países modernos para estimular as transações civis e comerciais, trazendo crescimento econômico com a circulação de bens e de riqueza. A vontade inclusive prevalece sobre a forma, nos termos do art 112 que será explicado nas próximas aulas. Quando vocês forem redigir um contrato não há formalidades a obedecer, basta colocar no papel aquilo que seja imprescindível ao acordo entre as partes, até porque, como dito na aula passada, os contratos podem ser verbais, como na compra e venda, locação e empréstimo. Vide art 104, III: assim salvo expressa previsão em lei, a forma do contrato é livre.  Que contratos têm forma especial e precisam ser escritos? Veremos ao longo do curso, mas já se podem adiantar dois: a doação de coisas valiosas (541 e pú) e a compra e venda de imóvel (108). Percebam que os contratos escritos se dividem em “instrumento particular” (feito por qualquer pessoa, qualquer advogado) e “escritura pública” (feita por tabelião de Cartório de Notas, com as solenidades do art. 215).  
Aula 03 - Elementos, requisitos e pressupostos contratuais (continuação)
4 – legitimidade: está próxima da capacidade, vista na aula passada. São irmãs, mas não se confundem. A legitimidade é um limitador da capacidade em certos negócios jurídicos. A legitimidade é o interesse ou autorização para agir em certos contratos previstos em lei. A pessoa pode ser capaz, mas pode não ter legitimidade para agir naquele caso específico. Exs: o tutor não pode comprar bens do órfão (497, I), o cônjuge não pode vender uma casa sem autorização do outro (1647, I), a amante do testador casado não pode ser sua herdeira (1801, III), o pai não pode vender um terreno a um filho sem a autorização dos outros filhos (496). Em todos estes exemplos falta legitimidade e não capacidade às partes. Realmente, o marido não pode vender um imóvel sem a outorga uxória não porque o marido seja incapaz (louco ou menor), mas porque lhe falta autorização para agir, prevista em lei, para proteger a família ( = legitimidade).  Igualmente o juiz não pode comprar o bem que ele penhorou do devedor no processo de execução não porque o magistrado seja incapaz, mas porque lhe falta legitimidade. Ora, com tanta coisa no comércio para ser adquirida, não é razoável o juiz comprar para si um bem que ele mandou tomar, afinal não basta ser honesto, é preciso parecer honesto. Para não esquecerem a legitimidade, que é tão importante, acrescentem a lápis um inciso IV ao art. 104 do CC.
5 – causa: qual o motivo do contrato? Qual a finalidade do contrato? Por que João quer comprar? Por que Maria quer alugar? Isto não interessa, não há relevância jurídica para a causa/motivo do contrato no direito brasileiro. O art 166, III usa a expressão “motivo”, todavia se refere ao objeto do contrato (104, II, ex: alugar uma casa para prostituição infantil). Quando você vai comprar um carro, é juridicamente irrelevante se o carro é para você passear, trabalhar, ou se você vai dar a seu filho, etc. Esse motivo é só do comprador, e o vendedor em geral nem sabe quais os motivos da outra parte. Outro exemplo, você compra anel de noivado, depois acaba o namoro, pode devolver o anel na loja e pedir o dinheiro de volta? Não, justamente porque o motivo da compra não é relevante. Mas e se você é salvo de um afogamento pelo bombeiro Jose, e como retribuição doa um carro ao bombeiro João, Jose pode pedir a anulação do contrato? Sim, pois houve erro como defeito do negócio jurídico, e o motivo da doação foi o salvamento, senão você jamais daria um carro nem a Jose nem a João (140, 171, II). Bom, em termos econômicos, as pessoas contratam  para ganhar dinheiro, para ter conforto, para satisfazer suas necessidades. Nesse sentido o art. 421. E quando o contrato cumpre sua “função social”? Quando viabiliza trocas úteis e justas, afinal ninguém contrata para ter prejuízo. Falaremos mais da função social do contrato nas próximas aulas, mas o motivo do pacto juridicamente deve ser desprezado.
6 – prestação: é uma conduta humana, é um ato ou omissão das partes, é um dar, é um fazer ou é um não-fazer. O contrato é uma fonte de obrigação, e toda obrigação tem por objeto uma prestação que corresponde a um dar, fazer ou não-fazer. Então se eu contrato um advogado para me defender, o objeto deste contrato será o serviço jurídico que será feito pelo bacharel (obrigação de fazer). Outro exemplo: vejam o conceito legal de compra e venda no art. 481. Observem a expressão “se obriga”. Então o objeto da compra e venda não é a coisa em si, mas a prestação de dar o dinheiro pelo comprador e de dar a coisa pelo vendedor. O vendedor se obriga a dar a coisa, e se ele não der, o comprador não pode tomar a coisa, mas sim exigir o dinheiro de volta mais eventuais perdas e danos (389).  O art 475 é uma exceção a este 389, veremos em breve quando formos tratar dos efeitos dos contratos. Assim, admite-se excepcionalmente que, ao invés de apenas resolver a obrigação em perdas e danos (art 947), o credor possa exigir a prestação “in natura”, ou seja, a coisa devida em si. Bom, aguardemos a aula sobre os efeitos dos contratos. Voltando a falar de prestação, o objeto do contrato é uma prestação, essa prestação pode ser de dar, fazer ou não-fazer. O objeto da prestação de dar será uma coisa, o objeto da prestação de fazer será um serviço e o objeto da prestação de não-fazer será uma omissão, conforme visto em Civil 2.
7 –  elementos acidentais: estes não são obrigatórios, mas facultativos, ou seja as partes inserem se quiserem (ex: cláusula penal, 408; encargo na doação, 562, etc).  
Aula 04 - Formação do contrato
Os contratos se formam pelo consenso, pelo acordo de vontades entre pelo menos duas pessoas, sem maiores solenidades (107). A vontade é fundamental nos contratos, por isso todo contrato é consensual. 
Para as pessoas se relacionarem é preciso que elas se comuniquem. A comunicação da vontade pode ser expressa e pode ser tácita. A comunicação expressa é a mais comum e mais clara, se fazendo de forma escrita ou verbal. Já a comunicação tácita é aquela presumida por certas circunstâncias, como o silêncio da outra parte (111, ex: em geral as pessoas gostam de receber presentes, mas ninguém está obrigado a aceitá-los, porém o silêncio do donatário é tido como aceitação, 539; outro ex: 659). Mas em Direito nem sempre quem cala consente, como na assunção de dívida, onde o silêncio do credor importa em recusa da troca do devedor (pú do art. 299). 
As vontades que formam o contrato se chamam de oferta (ou proposta) de um lado, e aceitação do outro lado. Quem emite a oferta é o proponente (ou policitante). Quem emite a aceitação é o aceitante (ou oblato). Nos contratos complexos e de alto valor existem os debates preliminares, avançando as negociações até a maturidade e o fechamento do contrato com o acordo de vontades. Na fase preliminar pode se escrever uma minuta ou rascunho do contrato. Mas para comprar chiclete na barraca ninguém faz isso: as vontades se comunicam, o contrato se forma, nasce e se extingue em segundos. 
Exemplificando, no contrato de compra e venda quem emite a proposta é o vendedor ao efetuar oferta a pessoa indeterminada ( = oferta ao público; ex: sapatos expostos numa sapataria). Esta oferta ao público tem caráter obrigatório pela seriedade e segurança das relações jurídicas (art. 427). Além de obrigatória, a proposta deve ser completa a fim de facilitar a aceitação e o surgimento do contrato, nos termos do art. 31 do Código do Consumidor: "a oferta e apresentação de produtos ou serviços devem assegurar informações corretas, claras, precisas, ostensivas e em língua portuguesa sobre suas características, qualidades, quantidade, composição, preço, garantia, prazos de validade e origem, entre outros dados, bem como sobre os riscos que apresentam à saúde e segurança
dos consumidores." Quanto mais completa for a oferta, facilita seu "casamento" com a aceitação. Se a aceitação não se integrar com a oferta, teremos uma contraproposta do 431. 
Por outro lado, admite-se na compra e venda que o comprador faça a proposta, por exemplo, se uma pessoa vê o relógio do colega e pergunta se quer vendê-lo? Neste caso, o comprador estará estimulando o proprietário a colocar a coisa em leilão. 
Para nosso Código, presentes são as pessoas que contratam diretamente entre si, mesmo em cidades diferentes usando telefone ou internet (parte final do inc. I do art. 428). Já ausentes são aqueles que usam um intermediário ou mensageiro, mesmo que estejam os contratantes na mesma cidade. 
O contrato, uma vez concluído, faz lei entre as partes, e se uma delas posteriormente desistir terá que indenizar a outra pelas perdas e danos causados (430, 389). As referidas minutas não são contratos ainda, então pode se desistir sem problemas. Mas para justificar uma indenização tem que ter havido dano concreto, material ou moral, afinal já foi estudado em Civil 2 que não existe dano hipotético ou eventual (403). 
CLASSIFICAÇÃO DOS CONTRATOS
É importante conhecer esta classificação para fins de interpretação e aplicação dos contratos. 
a) unilateral e bilateral: todo contrato é sempre bilateral quanto às partes (no mínimo duas partes), mas quanto aos efeitos pode ser unilateral ou bilateral. O contrato bilateral quanto aos efeitos é também conhecido como sinalagmático pois cria direitos e deveres equivalentes para ambas as partes. Ex: compra e venda, pois o comprador tem o dever de dar o dinheiro e o direito de exigir a coisa, enquanto o vendedor tem a obrigação de dar a coisa e o direito de exigir o dinheiro; locação, pois o locador tem a obrigação de transferir a posse do imóvel e o inquilino tem a obrigação de pagar o aluguel. Já o contrato de efeito unilateral só cria direito para uma das partes e apenas obrigação para a outra, uma das partes será só credora e a outra só devedora, ex: doação, pois só o doador tem a obrigação de dar e o donatário apenas o direito de exigir a coisa, sem nenhuma prestação em troca. Empréstimo e fiança também são exemplos de contratos unilaterais que estudaremos em breve. 
b) onerosos e gratuitos: nos contratos onerosos ambas as partes têm vantagem e proveito econômico, ex: os contratos bilaterais, onde ambas as partes ganham e perdem. Já os contratos gratuitos só beneficiam uma das partes, então geralmente todo contrato unilateral é gratuito, como na doação e no empréstimo Porém pode haver contratos unilaterais e onerosos quando existe uma pequena contraprestação da outra parte, como na doação modal, aquela onde há um encargo por parte do donatário, ou seja, o doador exige um pequeno serviço do donatário em troca da coisa (ex: A doa uma fazenda a B com o ônus de construir uma escola para as crianças carentes da região; A dá um carro a seu filho com o ônus de levar a mãe para passear todo sábado, art. 553). O encargo tem que ser pequeno, senão descaracteriza a doação. Se o encargo for grande o contrato não será nulo, apenas não será doação, mas outro contrato qualquer. Ex: empresto um apartamento a João sob pagamento mensal de mil reais, ora isto não é empréstimo, mas locação. Outro exemplo de contrato unilateral e oneroso é o mútuo feneratício ( = empréstimo de dinheiro a juros, art. 591). Empréstimo entre amigos em geral não tem juros (= mútuo simples), sendo unilateral e gratuito, mas no empréstimo econômico os juros são naturalmente devidos, tratando-se de contrato unilateral e oneroso. 
c) comutativos e aleatórios: esta classificação só interessa aos contratos onerosos. Só os contratos onerosos se dividem em comutativos e aleatórios. São comutativos quando existe uma equivalência entre a prestação (vantagem) e a contraprestação (sacrifício), ex: compra e venda, troca, locação, etc. Diz-se inclusive que a compra e venda é a troca de coisa por dinheiro. Já nos contratos aleatórios uma das partes vai ter mais vantagem do que a outra, a depender de um fato futuro e imprevisível chamado "alea" = sorte, destino. Ex: contrato de seguro onde eu pago mil reais para proteger meu carro que vale vinte mil; se o carro for roubado eu receberei uma indenização muito superior ao desembolso efetuado, mas se durante o prazo do contrato não houver sinistro, a vantagem será toda da seguradora. Jogo, aposta, compra e venda de coisa futura, são outros exemplos de contratos aleatórios que veremos oportunamente. 
Aula 05 - Classificação dos contratos (continuação)
d) principais e acessórios: contrato principal é aquele que tem vida própria e existe por si só. A grande maioria dos contratos é principal, independente e autônoma. Porém há contratos acessórios cuja existência depende de outro contrato, como os contratos de garantia. Ex: a fiança é um contrato acessório que geralmente garante uma locação principal; a hipoteca é outro contrato acessório que geralmente garante um empréstimo principal. A fiança e a hipoteca vão servir assim para satisfazer o credor caso haja inadimplemento dos contratos principais, trazendo mais segurança ao credor. Veremos fiança no próximo semestre e hipoteca em Civil 5. Tais contratos acessórios seguem os principais (art 184).  
e) instantâneos e de duração: a regra é o contrato ser instantâneo, ter vida curta/efêmera (ex: compra e venda, troca, doação, que duram segundos ou minutos; mesmo uma compra e venda a prazo é instantânea, sua execução é que é diferida no tempo). Já outros contratos são duradouros e se prolongam por dias, semanas e meses (ex: empréstimo, locação, seguro). Não é da essência dos contratos durarem anos e décadas. Os direitos reais é que são permanentes, como a propriedade, a superfície e o usufruto, valendo por toda uma vida.  Se você deseja alugar um imóvel por muitos anos, é mais seguro instituir uma superfície, assunto de Civil 5. E se superfície é melhor do que locação, por que a sociedade usa mais a locação? Porque os contratos são mais simples, podem até ser verbais, enquanto os direitos reais exigem solenidades e formalidades. Em suma: os contratos devem ser no máximo duradouros e não permanentes.
f) pessoais e impessoais: o contrato pessoal é celebrado com determinada pessoa em virtude de suas qualidades pessoais, é chamado assim “intuitu personae” (em razão da pessoa). Ex: contrato um ator famoso para gravar um filme, caso ele desista, não aceitarei o filho no lugar dele. Quando a obrigação é de fazer um serviço, em geral o contrato é personalíssimo. Já nas obrigações de dar uma coisa, o contrato é impessoal, então se A me deve cem reais, não tem problema que B ou C me paguem tais cem reais.  Veremos em breve que, nos contratos impessoais, se admite a execução forçada do contrato, prevista no art. 475 do CC (sublinhem “exigir-lhe o cumprimento”). Falaremos mais em breve deste importante art. 475. Já nos contratos personalíssimos, se o devedor não quiser cumprir sua obrigação, a única saída são as perdas e danos do 389, afinal não se pode constranger uma pessoa a trabalhar sob vara.
g) típicos e atípicos: os contratos típicos têm previsão no tipo/na lei, e foram disciplinados pelo legislador, pois são os contratos mais comuns e importantes com “nomem juris” (nome na lei). Ex: os cerca de vinte contratos previstos no CC, no Título VI do Livro I, do art. 481 ao 853.  Mas estes não são os únicos contratos permitidos, são apenas os mais importantes. Sim, já que a criatividade e necessidade dos homens em se relacionar e fazer negócios pode criar novos contratos não previstos em lei dentro da autonomia privada. Um exemplo de contrato atípico é o leasing, não previsto em lei, mas muito importante na aquisição de bens duráveis, que será visto no próximo semestre (art 425, obs: a lei  Nº 11.649/2008, dispõe sobre procedimento no leasing, não sobre o contrato em si). Quando o contrato é típico, a lei serve para completar a vontade das partes, o que chamamos de norma supletiva (ex: 490, este artigo não éimperativo/obrigatório,
é apenas supletivo, já que as partes podem violá-lo em contrato). Os contratos típicos podem ser verbais, pois existe a lei para suprir suas lacunas. Já os contratos atípicos, como o leasing, devem ser escritos e minuciosos já que não há lei para regulamentá-los. Falando de tipicidade, os Direitos Reais são típicos, não podem ser criados pelas partes (art. 1225). Falando de normas imperativas, no Direito Público a maioria das normas é imperativa, enquanto aqui na autonomia privada encontramos muitas normas supletivas.  Gosto de dizer que, no Direito Civil, se faz tudo que a lei não proíbe, a liberdade é grande, enquanto no Direito Público (Trabalhista, Administrativo) só se faz o que a lei permite.
h) solenes e informais: como na autonomia privada a liberdade é grande, a maioria dos contratos são informais e consensuais, bastando o acordo de vontades para sua formação (107, 104 III). Já em alguns contratos, pelas suas características, a lei exige solenidades para sua conclusão, como no caso da doação e fiança que devem ser por escrito (541 e 819). Já na compra e venda de imóvel, pelo valor e importância dos imóveis, o contrato além de escrito deve ser feito por tabelião, pelo que para adquirir uma casa só o acordo de vontades não basta, é necessário também celebrar uma escritura pública (arts. 108 e 215).  Então os contratos informais podem ser verbais, enquanto os contratos solenes devem ser por escrito, sejaparticular (feito por qualquer pessoa/advogado, como na fiança e doação) ou público (feito apenas em Cartório de Notas, qualquer deles).
i) reais e consensuais: já dissemos que todo contrato é consensual, quer dizer, exige acordo de vontades. Mas em alguns contratos, só o consenso é insuficiente, então além do acordo de vontades, a lei vai exigir a entrega da coisa ( = tradição), por isso se dizem contratos reais.  Podem  até ser verbais/informais, mas não nascem antes da entrega da coisa. Ex: doação de bens móveis (pú do 541), comodato (579), mútuo, depósito (627). Porém na compra e venda, troca, locação, etc., já vai existir contrato após o acordo de vontades e mesmo antes da entrega da coisa, de modo que uma eventual desistência pode ensejar perdas e danos ou até a execução compulsória do 475. Então se A  promete emprestar sua casa de praia para B passar o verão (= comodato), só haverá contrato após a ocupação efetiva da casa por B. Já se A se obriga a alugar sua casa de praia a B durante o verão (= locação), o contrato surgirá do acordo de vontades, e eventual desistência de A, mesmo antes da entrega das chaves, ensejará indenização por perdas e danos (389). A tradição não é requisito de validade, mas de existência dos contratos reais.
j) civis e mercantis: os contratos civis visam satisfazer uma necessidade particular, sem visar diretamente ao lucro (53); já os contratos mercantis serão estudados em Direito Empresarial e têm fins econômicos (981). É fundamental preservar a informalidade dos contratos mercantis para estimular sempre o comércio entre as empresas, com a geração de emprego e renda. Afinal quem produz riqueza é o particular, e não o Estado.
Aula 06 - Contrato de adesão
Concluída a classificação dos contratos, vamos explicar este importante e moderno mecanismo negocial chamado contrato de adesão. Com o desenvolvimento da sociedade e a oferta de serviços ao grande público, se fez necessário criar um contrato previamente pronto por uma das partes, cabendo à outra parte aceitar/aderir ou não. Exemplos: contrato de transporte, luz, telefone, seguro, espetáculo público, contrato bancário, etc. Nestes casos, a parte que adere é o consumidor que não pode discutir as cláusulas, pode apenas aceitá-las integralmente ou não. Imagine que José deseja viajar de Recife para Porto Alegre em vôo direto, mas só existem vôos com escalas e conexões. É evidente que José não poderá exigir que o avião parta direto, terá o consumidor que se sujeitar ao itinerário ou então trocar de companhia ou ainda fretar um avião só para si. Outro ex: o jogo de futebol está marcado para às 16 h, mas José quer que o jogo comece às 21 h, é evidente que o jogo é para o público em geral, e não apenas para José. Os contratos de adesão são assim contratos numerosos para negociação em massa nas relações de consumo, tornando-as mais rápidas e baratas. É contrato muito popular e  a parte deve ler com cuidado o que está assinando para depois não se arrepender, embora o Código do Consumidor proíba cláusulas abusivas nos contratos de adesão, justamente porque não foi objeto de discussão (art 51 da lei 8.078/90). O consentimento neste contrato surge com a adesão. Para alguns doutrinadores o contrato de adesão não seria contrato porque as cláusulas são predispostas e faltaria o consenso, mas eu discordo, e afirmo que o contrato de adesão é importante na vida moderna e o consenso surge com a adesão, existindo o Código do Consumidor justamente para coibir abusos e monopólios. Em suma, o contrato de adesão não é nulo, ao contrário, é válido e importante, recomendando a vocês que cursem oportunamente a disciplina Direito do Consumidor. 
PRINCÍPIOS DOS CONTRATOS
1 – Autonomia da vontade
No direito contratual as partes têm liberdade para contratar ou não, adquirindo direitos e contraindo obrigações, relacionando-se com quem quiser, dispondo de seus bens como entender e até inventando contratos (425). Ao contrário do Direito Administrativo, onde existe muito limite na atuação do gestor. Então se qualquer um de nós ou um empresário pode contratar como quiser, o Prefeito/Governador/Presidente fica sujeito às diretrizes e orçamentos previstos na Constituição e aprovados pelo Poder Legislativo. E deve ser assim, afinal o governante lida com a coisa pública e não com a coisa própria.
Este princípio contratual da autonomia da vontade é um poder criador, sendo amplo mas não absoluto, encontrando limites na ordem pública e nos bons costumes:
- ordem pública: são as leis imperativas/obrigatórias presentes no direito privado e que interessam à sociedade e ao Estado. Ex: 426 (pacta corvina), 421, pú do 2.035). Em que consiste esta função social do contrato? Em trocas úteis e justas, afinal ninguém contrata para ter prejuízo. A propriedade, outro pilar do Direito Civil, também deve ser exercida respeitando sua função social (§ 1º do art. 1228).
- bons costumes: são as maneiras de ser e de agir, correspondendo à influência da moral no Direito. A moral varia de acordo com o tempo e o lugar, de modo que um desfile de moda-praia num shopping center é permitido, mas não na frente do Palácio do Bispo, por violar a moral da maioria da sociedade.  Igualmente nossa moral não aceita o nudismo, todos nós usamos roupas, mas em algumas praias o nudismo já é permitido.
A exigência de que tanto o contrato, como a propriedade, cumpram uma função social, é novidade do Código de 2002 por conseqüência da publicização do Direito. O que é isto? É a intervenção, cada vez maior, do Estado na atividade particular das pessoas e na autonomia privada. Chama-se de dirigismo contratual esta iniciativa do Estado de elaborar leis para dar superioridade jurídica a certas categorias economicamente mais fracas, como os trabalhadores, os inquilinos, os consumidores e os devedores. Leiam um artigo meu sobre este assunto  no nosso site com o título “A importância do Direito Privado apesar da publicização do Direito”, e as criticas que faço ao dirigismo excessivo que atrofia a economia, faz subir os juros, diminuiu a oferta de imóveis para aluguel e mantem milhões de trabalhadores na informalidade.
 2 – Princípio do consentimento ou consensualismo
Todo contrato exige acordo de vontades. No contrato de adesão o consentimento surge com o aceite do consumidor. Nos contratos solenes e reais, o acordo de vontades antecede a assinatura da escritura ou a entrega da coisa.
A vontade é tão importante que ela pode predominar sobre a palavra escrita (art 112, sublinhemintenção, que é a vontade real, e sentido literal, que é a vontade declarada). Assim, aquilo que as partes queriam
dizer é mais importante do que aquilo que as partes disseram, escreveram e assinaram. Não se trata aqui de rasgar o “preto no branco” mas sim de respeitar a vontade das partes.  Exemplos:
a) art. 1899, embora testamento não seja contrato, mas este artigo revela a importância da vontade nos negócios jurídicos.
b) agora um exemplo contratual: José aluga a João por cem reais um quartinho nos fundos de sua casa, mas no contrato, ao invés de escrever “aluga-se um quarto”, se escreveu “aluga-se uma casa”, vai prevalecer a intenção que era de alugar o quarto, João  não vai poder exigir a casa pois sabia que, por aquele preço e naquelas circunstâncias, a locação era só de um aposento.
c) outro exemplo contratual: José morreu e deixou uma casa para seu filho João, só que João precisa viajar e não pode esperar a conclusão do inventário, então João vende a Maria os seus direitos hereditários por cem mil reais (ressalto que não se trata aqui do pacta corvina do 426, e sim da cessão do 1793 pois José já morreu); eis que depois se descobre que José era muito rico e, além da casa, tinha ações, outros imóveis, carros, jóias, aplicações financeiras, etc, neste caso Maria não será dona de tudo pois só o que ela adquiriu, naquelas circunstâncias, foi uma casa, e não tantos bens, embora no contrato constasse que João lhe cedia todos os seus direitos hereditários.  
Nestes exemplos, prevalecerá a vontade sobre aquilo que foi escrito.
Aula 07 - Princípios dos contratos (continuação)
3 -  Princípio da Força Obrigatória: contrato faz lei entre as partes, deve ser cumprido por uma questão de segurança jurídica e paz social. País nenhum  se desenvolveu sem respeitar a propriedade privada e os contratos. Diziam os romanos pacta sunt servanda (= contrato deve ser cumprido), princípio que prevalece até hoje. Celebrado o contrato, ele se torna intangível, não podendo ser modificado unilateralmente, por apenas uma das partes. Se uma das partes não cumprir o contrato, a parte prejudicada exigirá o cumprimento forçado, através do Juiz, ou uma indenização por perdas e danos (art. 475). Todavia, face ao dirigismo contratual comentado na aula passada, a lei permite, excepcionalmente, que o Juiz, nos contratos comutativos de longa execução, diante de um fato novo,  modifique o contrato para manter a igualdade entre as prestações, afinal ninguém contrata para ter prejuízo (art 478). Neste artigo encontramos a chamadaTeoria da Imprevisão (ou cláusula rebus sic stantibus = revogável se insustentável), mas repito, a intervenção do Estado-Juiz nos contratos deve ser a exceção, por uma questão de segurança jurídica. Além disso, só se admite a teoria da imprevisão em contratos longos e diante de um fato novo (ex: compro um carro para pagar em três anos com prestações atreladas ao dólar, eis que por causa de uma guerra no Oriente Médio, o dólar triplica de preço e as prestações se tornam muito vantajosas para o vendedor, devendo então o Juiz modificar o contrato para restaurar o equilíbrio entre as partes; outro exemplo no art 620 do CC; ainda outro exemplo: alugo um apartamento a beira mar, eis que o mar começa a avançar, fico sem praia, desvalorizando o imóvel, justificando uma redução do aluguel). No Direito de Família, fora da autonomia privada, temos outro exemplo da teoria da imprevisão no art. 1699: então se o pai presta alimentos ao filho, e depois o pai perde o emprego ou o filho se torna um craque do futebol, a pensão será certamente reduzida ou extinta. Em suma, a Teoria da Imprevisão permite ao Juiz modificar o contrato a fim de restabelecer o equilíbrio entre as partes em face de um caso fortuito que tornou a prestação excessivamente onerosa para uma das partes.  Caso fortuito é aquele do p.ú. do art. 393, estudado no semestre passado. A Teoria da Imprevisão é assim conseqüência da função social do contrato, que exige trocas úteis e justas, conforme art. 421 e  p.ú. do art. 2035 do CC.  Não discuto a importância e a modernidade da Teoria da Imprevisão, mas ela deve ser aplicada com cautela por uma questão de segurança jurídica e para não proteger o mau pagador. Não é bom para a atividade econômica e para a geração de empregos um Estado interferindo nos contratos. Na dúvida, aplica-se o pacta sunt servanda e não a Teoria da Imprevisão. .
4 –  Princípio da boa-fé: este princípio obriga as partes a agirem num clima de honestidade e decolaboração recíproca para que ambas alcancem o objetivo daquele contrato. A boa fé deve estar na mente de todo contratante. Felizmente esse princípio é naturalmente seguido pela população, tanto que a imensa maioria dos contratos nasce, produz seus efeitos e se extingue sem problemas, só um pequeno percentual é que vai trazer controvérsias e terminar sobrecarregando o Judiciário (113, 422). Todo contrato exige boa-fé, mas em um contrato a boa-fé é exigida com mais rigor: o contrato de seguro (765 – estrita boa-fé e veracidade), então não minta e nem omita circunstâncias importantes sobre o objeto segurado ou sobre sua saúde, para não perder a indenização caso ocorra um acidente ou uma doença. Falaremos mais de seguro no próximo semestre.
 5 – Princípio da relatividade: por este princípio, o contrato é relativo às partes celebrantes, ou seja, não interessa a terceiros/não é absoluto/não é erga omnes (= contra todos). Diziam os romanos: res inter alios acta, aliis neque nocet neque prodest (a coisa contratada entre uns, nem prejudica e nem beneficia terceiros). Este princípio tem exceções, de modo que terceiros não celebrantes podem participar dos contratos, vejamos:
a) os herdeiros: nas obrigações de fazer personalíssimas o contrato não se transfere aos herdeiros, mas nas obrigações de dar sim. Então se A toma cem reais emprestado com B e vem a falecer, os herdeiros de A terão que pagar a dívida a B, dentro dos limites da herança recebida de A. Se A não deixar herança, os filhos não terão obrigação de pagar a dívida (arts. 1792 e 1997).
b) na estipulação em favor de terceiro, quando se pode beneficiar um terceiro com um contrato (ex: alugo minha casa e determino que o aluguel seja pago a meu irmão desempregado; outro ex: faço um seguro de vida para beneficiar meu filho). Tanto o contratante como o beneficiário poderão exigir a prestação se a outra parte atrasar (436). Na estipulação, a qualquer momento o beneficiário pode ser substituído, bastando comunicar ao outro contratante (438).
c) nas convenções coletivas: no Direito do Trabalho e no Direito do Consumidor se permitem que sindicatos e associações negociem relações de trabalho e de consumo com os patrões e os fornecedores. Tais convenções irão obrigar todos os trabalhadores filiados àquele sindicato e todos os consumidores filiados àquelas entidades, e não apenas os dirigentes signatários da convenção. Depois leiam o art. 611 da Consolidação das Leis do Trabalho – CLT, e o art. 107 do Código do Consumidor.       
d) nas obrigações reais, quando muda o devedor porque mudou o proprietário da coisa (ex: 1345); depois revisem obrigações reais, assunto de Civil 2.
e) no contrato com pessoa a declarar: neste o contrato se forma e fica acertado que um dos contratantes irá futuramente indicar a pessoa que adquirirá os direitos, vindo a ocupar o lugar de sujeito da relação jurídica,  art. 467 (ex: compro um apartamento para pagar em quinze anos e celebro um contrato preliminar com a construtora - 462, pois o contrato definitivo só virá ao término do pagamento integral; então, após os quinze anos, posso pedir à construtora-vendedora que coloque o imóvel logo no nome dos meus filhos). Se essa pessoa futura não aceitar o contrato, continuará válido entre os contratantes originários (470, I).
f) na promessa de fato de terceiro: é a possibilidade de um contratante obrigar-se perante outro a obter de terceiro determinada obrigação, sob pena de responder por perdas e danos. Ex: um promotor de eventos promete ao dono de uma casa de shows trazer um artista para cantar na cidade. Se o artista não vier, o promotor será responsabilizado (439). Diferente
da estipulação em favor de terceiro, vista acima, o promotor não vai beneficiar o artista, vai sim se responsabilizar pela sua apresentação. O artista não integra o contrato inicial entre o promotor e o dono da casa de shows, mas sim participará de um segundo contrato com o promotor do evento.
Aula 08 - Hermenéutica contratual
É o estudo da interpretação dos contratos, para revelar o espírito, o sentido, o alcance, a intenção do contrato.  O contrato nasce do acordo de vontades, expresso por palavras verbais ou escritas. Mas na pressa de celebrar um contrato, diante do dinamismo do mundo moderno, bem como por  inexperiência, podem as partes usar palavras que gerem dúvidas. Surgindo assim controvérsia na execução do contrato, caso as partes não consigam resolver o litígio entre si, dialogando, deverão pedir ajuda a um intérprete particular ou púbico. O intérprete particular é o árbitro (revisem arbitragem, Civil 2) e o público é o Juiz.
            O hermeneuta, na interpretação, deve seguir a lei, a jurisprudência e sua consciência. Só com o tempo, muito estudo e experiência, o Juiz se torna um bom intérprete. Não pode o juiz deixar de interpretar um contrato alegando que suas cláusulas são ininteligíveis, como também não pode deixar de julgar um caso alegando omissão da lei (art. 4º da LICC). Mas se o contrato estiver muito mal redigido, realmente incompreensível, pode o juiz declará-lo nulo. E se o contrato for verbal? Então a tarefa de provar a existência do contrato se confunde com a tarefa de interpretá-lo. Equívoco na interpretação do contrato conduz a uma execução distanciada da intenção das partes. A busca dessa intenção, a investigação dessa vontade dos indivíduos é o objetivo da interpretação dos contratos.
            Vejamos algumas regras que podem ajudar o trabalho do hermeneuta:
a) busca da vontade real: qual o espírito, qual a alma, qual a vontade desejada pelo contrato? Esta primeira regra é a mais importante, pois na alma do contrato está o consensualismo ( = acordo de vontades). A vontade real é a desejada pelas partes, que pode ser diferente da manifestada ( = vontade declarada). Deve o Juiz tentar reconstruir o ato de vontade em que se exteriorizou o contrato para buscar a vontade real. Nos contratos deve-se ater mais à vontade dos contraentes do que às palavras. Isto já foi explicado na aula 6 (princípio do consensualismo, art. 112).
b) senso médio: o intérprete deve se colocar no lugar das partes e raciocinar como faria o homem médio, ou seja, a generalidade da população, sem extremos, sem radicalismos, de acordo com os costumes(113). Uma cláusula ambígua interpreta-se conforme o costume do lugar. O senso médio é a sensatez, equilíbrio, razoabilidade, que só vem com estudo e com o tempo. Depois leiam o artigo sobre “O Juiz e a razoabilidade na aplicação da lei” no nosso site. A boa-fé significa que uma das partes se entrega à conduta leal da outra, confiando que não será enganada (ex: comprar carro usado, 422). Uma expressão sem sentido deve ser rejeitada como se não constasse  no texto.
c) fim econômico: todo contrato tem um objetivo econômico, pois ninguém contrata para ter prejuízo e sim para satisfazer sua necessidade e ter um ganho patrimonial. Assim, nos contratos comutativos e onerosos deve-se buscar a equivalência entre as prestações. É a chamada função social do contrato que prevê trocas úteis e justas (421).
d) uma cláusula em destaque prevalece sobre as outras: num contrato uma cláusula em negrito, com destaque, prevalece sobre as outras, justamente porque se presume que aquela cláusula chamou mais a atenção das partes. Assim num contrato datilografado ou digitado, uma cláusula escrita a mão terá prevalência sobre as  outras, caso  haja divergência entre elas.
e) dirigismo contratual: é uma política do Estado para dar superioridade jurídica a classes economicamente fracas como o consumidor, o devedor, o trabalhador e o inquilino (art. 423 do CC; art 47 da lei 8.078/90 e art. 620 do CPC). Entende parte da doutrina, especialmente no Direito do Trabalho, que “in dubio pro misero”, ou seja, na dúvida deve-se favorecer a parte mais pobre. Discordo desta política conforme explicado na aula 6, ao tratar do princípio da autonomia da vontade. O Juiz não pode julgar em favor do mais pobre pois não se pode fazer caridade com o dinheiro dos outros. O Juiz não pode se transformar num Robin Hood estatal. O jurista alemão do séc. XIX Rudolf Von Ihering já alertava na sua obra A Luta pelo Direito, p 85, nota 18, São Paulo, ed. Martins Claret, ano 2000:  “Não existe maneira mais cômoda de render o devido tributo ao espírito humanitário que praticá-lo às custas de outrem”. Nem julgar a favor do rico, para adular, e nem julgar a favor do pobre, por piedade, e sim julgar a favor do justo.
f) contratos benéficos: são aqueles unilaterais e gratuitos (ex: doação, empréstimo, fiança). Na sua interpretação deve-se proteger a parte que fez o benefício, que fez a liberalidade (ex: doador, comodante, mutuante e fiador). Art 114.  Então se A empresta dinheiro a B, deve-se interpretar em favor do devedor/mutuário, conforme o dirigismo contratual (art. 620 do CPC), ou do mutuante/credor conforme art. 114 do CC? Reflitam!
Aula 09 - Efeitos dos contratos
1 – obrigatoriedade: o contrato cria um vínculo jurídico entre as partes dotado de obrigatoriedade. Diz-se que o contrato faz lei entre as partes. Os celebrantes devem honrar a palavra empenhada e cumprir o contrato sob pena de responsabilidade patrimonial (389) ou de, excepcionalmente, cumprimento forçado do contrato, através do Juiz, nos termos do art 475, que será explicado abaixo.
2 – irretratabilidade: uma vez perfeito e acabado, o pacto só pode ser desfeito por outro contrato chamadodistrato (472), e não por imposição de uma das partes. Na autonomia privada, tudo, ou quase tudo, pode ser combinado e desfeito, mas sempre por consenso.
3 – intangibilidade: além de não poder ser desfeito, o contrato não pode ser alterado por apenas um dos celebrantes, sempre vai exigir novo acordo. Excepcionalmente admite-se modificação feita pelo Juiz,  mas deve ser evitado ao máximo para que o Estado não interfira na autonomia privada, trazendo insegurança às relações jurídicas, conforme já explicado na Teoria da Imprevisão do art. 478 (vide aula 7). De regra o contrato é assim irrevogável (= irretratável) e intangível (= inalterável).
4 – efeito pessoal: em relação ao objeto, o contrato cria obrigações de natureza pessoal. O credor exige do devedor o cumprimento da prestação sob pena de perdas e danos. Esta é a regra: descumprido o contrato, resolve-se em perdas e danos do 389 como tenho dito a vocês. Todavia, o Código Civil de 2002 admite expressamente que, em alguns caos, a parte inocente exija o cumprimento forçado do contrato, ao invés da simples perdas e danos contra o inadimplente (475 – sublinhem “se não preferir exigir-lhe o cumprimento”). Então se José vende um carro a João, recebe o preço, mas depois se arrepende e se recusa a entregar o veículo, a regra geral é João pedir uma indenização por perdas e danos (402). Porém, admite a lei a execução in natura do contrato, de modo que o comprador, através do Juiz, pode tomar o carro de José. Esta possibilidade corresponde a um efeito real nos contratos, que geralmente só tem efeitos pessoais, afinal estamos dentro do Direito das Obrigações. Contudo, como o Direito Obrigacional ( = Pessoal, Civil 2, 3 e 4) e o Direito das Coisas (= Real, Civil  5) integram o Direito Civil-Patrimonial, admite-se que, em alguns momentos, eles se interpenetrem. É possível assim atribuir efeito real a certos contratos para que o pacto seja efetivamente cumprido. Mas nem todo contrato admite execução in natura. Tradicionalmente deve-se partir para as  perdas e danos quando a execução forçada for inviável ou causar constrangimento físico ao devedor (ex: se o referido veículo já tivesse sido vendido por José a Maria, João não poderia tomar o carro de Maria, por uma questão de segurança jurídica, pois Maria
nada tem a ver com o problema de José com João; outro exemplo, numa obrigação de fazer, quando um artista desiste de um show, não se pode chamar a polícia e constrangê-lo a se apresentar sob vara, resolvendo-se assim em perdas e danos, art 947). Em suma, a regra é o 389, a execução in natura do 475 só se admite nas obrigações de dar, e se a coisa ainda estiver no patrimônio do inadimplente.
       CONTRATO PRELIMINAR
           Quando duas pessoas querem contratar elas conversam, dialogam, ajustam seus interesses e celebram o contrato. Porém, por dificuldades financeiras, as partes podem celebrar um contrato preparatório com vistas a um outro contrato principal definitivo. Esse contrato preparatório é o contrato preliminar, onde as partes ajustam um compromisso de celebrar futuramente o contrato principal. Enquanto no contrato principal o objeto é uma prestação substancial, no contrato preliminar o objeto é fazer oportunamente o contrato principal.
O contrato preliminar não é uma minuta ou rascunho, é contrato mesmo que visa concretizar um contrato futuro e definitivo (462). É muito usado na aquisição de imóveis a prazo, afinal poucas pessoas podem comprar imóveis a vista e muita gente precisa de habitação.  Se o contrato preliminar for descumprido, ou o contrato definitivo não for celebrado oportunamente, caberá indenização por perdas e danos (465) ou mesmo a execução forçada (463). Na execução forçada o juiz celebra o contrato no lugar da parte que não está cumprindo sua obrigação (464). Então, por exemplo, desejando alguém adquirir um imóvel para pronta moradia, celebra um contrato preliminar de promessa de compra e venda com uma construtora, recebe as chaves e vai pagando as prestações ao longo dos anos. Ao término do pagamento de todas as prestações celebra outro contrato com a construtora, desta vez um contrato definitivo que será levado a registro no Cartório de Imóveis. O contrato preliminar pode ser feito mediante instrumento particular, mas o definitivo vai exigir escritura pública em qualquer Cartório de Notas (108). Se o adquirente tem o dinheiro todo para comprar o imóvel, celebra logo o contrato definitivo. Este assunto será ampliado em Civil 5, no estudo do Direito Real do Promitente Comprador do art 1417
Aula 10 - Institutos relativos aos contratos bilaterais
 Vamos conhecer agora institutos que só se aplicam aos contratos bilaterais, ou seja, àqueles onde ambas as partes têm deveres e direitos recíprocos, são simultaneamente credoras e devedoras.
1 – exceção do contrato não cumprido ou exceptio non adimpleti contractus: a palavra exceção aqui tem significado de defesa, então este instituto é uma manobra defensiva usada por uma das partes para fazer a outra cumprir com sua obrigação. Consiste no seguinte: A e B celebram um contrato e A exige que B cumpra sua obrigação; B então se defende com base no art. 476: se A quer que B cumpra sua obrigação, A deve primeiro cumprir a dele.  Na compra e venda, só posso exigir a coisa depois de pagar o preço. Na prestação de serviço, só posso exigir o diagnóstico do médico depois de pagar a consulta.   No seguro, só posso exigir a indenização depois de ter pago o prêmio. A essência dos contratos bilaterais é o sinalagma e a dependência recíproca das obrigações. Este instituto corresponde à boa-fé e confiança que prevalecem nas relações jurídicas. Se as partes combinarem quem vai cumprir a prestação primeiro, não será possível exercer a presente defesa. Quando as prestações são simultâneas não há problemas (ex: compra e venda de balcão). Ressalto que o mau cumprimento corresponde ao não-cumprimento, assim para exigir a coisa na compra e venda, é preciso pagar o preço total e não apenas parcial.
2 – arras: esta palavra deriva do latim arrha e significa garantia. As arras são um sinal de pagamento para a firmeza do contrato, inibindo o arrependimento das partes. Corresponde a uma quantia dada por um dos contratantes ao outro como sinal/garantia da confirmação de um contrato bilateral. As arras em geral são em dinheiro, mas podem ser em coisas (ex: um carro como sinal na compra de um apartamento). Quanto o contrato é fechado, as arras são devolvidas ou abatidas do preço (417). Se o contrato não for concluído por culpa/desistência da parte que deu as arras, elas serão perdidas em favor da parte inocente. Se quem desistir for a parte que recebeu as arras, terá que devolvê-las em dobro, devidamente corrigida (418). As arras se assemelham à cláusula penal, assunto do semestre passado. Só que as arras são logo entregues, enquanto a cláusula penal só terá aplicação se o contrato for futuramente desfeito.
3 – vícios redibitórios: são os defeitos contemporâneos ocultos e graves que desvalorizam ou tornam imprestável a coisa objeto de contrato bilateral e oneroso (441). Tais defeitos vão redibir o contrato, tornando-o sem efeito.  Aplica-se aos contratos de compra e venda, troca, locação, doação onerosa (pú do 441) e na dação em pagamento (revisem o 356). Exemplos: comprar um cavalo manco ou estéril; alugar uma casa que tem muitas goteiras; receber em pagamento um carro que aquece o motor nas subidas, etc. Em todos esses exemplos poderemos aplicar a teoria dos vícios redibitórios para duas conseqüências, a critério do adquirente: a) desfazer o negócio, rejeitar a coisa e receber o dinheiro de volta; b) ficar com a coisa defeituosa e pedir um abatimento no preço (442).  Justifica-se  a teoria dos VR pois toda obrigação não só deve ser cumprida, como deve ser bem cumprida. Uma obrigação não cumprida gera inadimplemento, uma obrigação mal cumprida gera vício redibitório. Para caracterizar um vício redibitório o defeito precisa ser contemporâneo, ou seja, existir na época da aquisição (444), pois se o defeito surge depois o ônus será do atual proprietário, afinal res perit domino ( = a coisa perece para o dono, ou o prejuízo pela perda espontânea da coisa deve ser suportado pelo dono). Além de contemporâneo o defeito deve ser oculto, ou seja, não estar visível, pois se estiver nítido e mesmo assim o adquirente aceitar, é porque conhecia as condições da coisa (ex: carro arranhado, cavalo com uma perna menor do que a outra, casa com as telhas quebradas, etc).  Se o vício é oculto, porém do conhecimento do alienante que agiu de má-fé, este responderá também por perdas e danos (422, 443). Além de contemporâneo e oculto, o defeito precisa ser grave, e só a riqueza do caso concreto e a razoabilidade do Juiz é que saberão definir o que é grave ou não. Existe um prazo decadencial na lei para o adquirente reclamar o vício, prazo que se inicia com o surgimento do defeito (ex: o adquirente só vai sabe se uma casa tem goteira quando chover, 445 e §§ 1º e 2º ).
 
4 – evicção: a evicção garante o comprador contra os defeitos jurídicos da coisa, enquanto os vícios redibitórios garantem o adquirente contra os defeitos materiais. Evicção vem do verbo evincere, que significa “ser vencido”. Aplica-se à compra e venda e troca (bilateral), mas nas doações não (unilaterais). Conceito: é a perda da coisa em virtude de sentença que reconhece a outrém direito anterior sobre ela. Ex: A é filho único e com a morte de seu pai herda todos os bens, inclusive uma casa na praia; A então vende esta casa a B, eis que aparece um testamento do falecido pai determinando que aquela casa pertenceria a C; verificada pelo Juiz a veracidade do testamento, desfaz-se então a venda, entrega-se a casa a C e A devolve o dinheiro a B.  Chamamos de evicto o adquirente, no exemplo é B, é a pessoa que comprou a casa e que vai perdê-la, recebendo porém o dinheiro de volta e os direitos decorrentes da evicção previstos no art. 450. Evicta é a coisa, é a casa da praia. Evictor é o terceiro reivindicante, é C, que vence. Alienante é A, é aquele que vendeu a coisa que não era sua, e mesmo sem saber disso, mesmo de boa-fé, assume os riscos da evicção (447).  O contrato pode excluir a cláusula da evicção, ou até reforçá-la (ex: se ocorrer a evicção, o alienante se compromete a devolver ao evicto o dobro
do preço pago, 448).   Se a evicção ocorrer numa doação, o evicto não perde nada, pois não pagou pela coisa, apenas vai deixar de ganhar.  Fundamento da evicção: justifica-se na obrigação do alienante de garantir ao comprador a propriedade da coisa transmitida, e que ninguém vai interferir no uso dessa coisa
Aula 11 - Contratos aleatórios 
Já sabemos que contrato aleatório é aquele que, a depender da alea (= sorte, destino), uma das partes terá mais vantagem econômica do que a outra, como no seguro, jogo, loteria e aposta. O contrato aleatório se opõe ao contrato comutativo (revisem classificação dos contratos).  Nosso código, nos arts. 458 a 461, tem uma seção sobre os contratos aleatórios, só que na verdade são compra e venda aleatórias. A c&v é contrato de regra comutativo pois ao preço pago corresponde o valor da coisa. Porém admite-se compra e venda aleatória, conforme referidos artigos, que deveriam estar adiante no código na parte especial dos contratos, junto com compra e venda. Mas já que estão aqui, na parte geral dos contratos, vamos logo conhecer tais espécies de compra e venda aleatórias:
            a) emptio spei: é a compra de uma esperança, quando o comprador assume o risco da existênciada coisa (ex: pago cem reais a um pescador pelo que ele trouxer no barco ao final do dia; a depender da quantidade de peixe capturado, o comprador ou o pescador sairá ganhando, mas mesmo que não venha nada, o preço continua devido, 458; outros exs: colheita de uma fazenda, tesouros de um navio afundado, ninhada de uma cadela, etc). Lembro que o adquirente não deve o preço se o resultado fraco decorre de culpa da outra parte que não se esforçou, afinal a alea não autoriza a má-fé.
            b) emptio rei speratae: aqui o risco é na quantidade, então se não vier nada, ou se nada for produzido, o preço não será devido, depende do que for combinado entre as partes (459 e pú).
            c) risco na destruição: no art 460 a alea decorre não de coisas futuras, mas de coisas existentes, contudo expostas a risco (ex: compra em região sob guerra ou terremoto, maremoto, como comprar um navio que está viajando para o Brasil com defeito no motor e vazamento no casco, e o adquirente assume o risco do naufrágio). Por causa desse risco, o comprador irá obter um preço menor, mas se a coisa perecer antes da entrega, o preço assim mesmo será devido.
            Percebam que em todo contrato existe um risco, e nos contratos aleatórios o risco é da essência do negócio, fazendo parte do contrato aleatório, sujeitando-se as partes a pagar sem nada receber, ou a receber sem nada pagar. Como se vê, é um jogo, porém por motivos mais sérios.
            Na compra e venda aleatória não cabe alegar o defeito contratual da lesão (art 157) e nem a teoria dos vícios redibitórios (441, sublinhem comutativo).
EXTINÇAO DOS CONTRATOS
 
            Se o contrato nasce do acordo de vontades, ele geralmente cessa com o cumprimento da prestação, sendo executado pelas partes, até que os resultados finais previstos sejam alcançados, liberando o devedor e satisfazendo o credor. De regra o contrato nasce para cumprir sua função social e ser extinto pelo adimplemento da obrigação. Todavia encontramos na vida prática a extinção do contrato antes do seu fim natural que é a prestação e o pagamento (revisem pagamento no semestre passado). A classificação doutrinária vacila ao tratar desse tema, pois mistura as expressões extinção, resolução, resilição, rescisão, revogação e desfazimento do contrato. Vamos conhecer uma classificação:
            1  - Resilição bilateral ou distrato: é o contrato feito para extinguir outro contrato (472), quando as partes acordam em extinguir o contrato pela mesma forma exigida para celebrá-lo (ex: se uma compra e venda de bem móvel foi feita por escritura pública, seu distrato pode ser feito por instrumento particular ou até verbalmente; outro ex: inquilino que combina com o locador desocupar o imóvel antes do prazo: locação escrita e distrato verbal). O distrato é um acordo liberatório, desatando o laço que prendia as partes pela vontade comum delas.
            2 – Resilição unilateral: se o contrato e o distrato nascem do acordo, a resilição unilateral tem caráter de exceção, pois rompe o vínculo sem a anuência do outro contratante (473). Empréstimo, mandato e depósito são contratos que, pela sua natureza de exigirem confiança, admitem resilição unilateral (ex: empresto minha casa de campo para meu irmão desempregado morar, posso pedir de volta a qualquer momento, 582; outro bom exemplo, mesmo fora do Direito Civil, é o contrato de trabalho, pois o patrão pode demitir o empregado mesmo contra a vontade dele).
            3 – Resolução: enquanto na resilição o contrato é extinto pela vontade das partes, na resolução o contrato se extingue pelo inadimplemento. Na resolução cessa o contrato por ter o devedor faltado ao cumprimento de sua obrigação, cabendo ao prejudicado exigir perdas e danos ou a execução forçada do já explicado art 475 (vide aula 9). Tacitamente todo contrato sinalagmático tem essa cláusula resolutiva de exigir perdas e danos em caso de inadimplemento, mas se a parte preferir pode inseri-la expressamente (474). Dá-se também a resolução por onerosidade excessiva conforme já vimos na Teoria da Imprevisão (art. 478). Todavia se o inadimplemento decorre de caso fortuito, ou seja, se a inexecução for involuntária, o devedor não pode ser responsabilizado (393, ex: cantor fica gripado e não pode fazer o show contratado).
            4 – Arrependimento: não é comum na lei, então as partes devem prever no contrato o exercício do direito de arrependimento para desfazer o contrato (420). O Codigo do Consumidor admite o arrependimento no art 49 quando a compra é feita por telefone.
            5 – além dessas hipóteses, lembro que o contrato se extingue também se violar o art. 104 do CC (ex: compra e venda de cigarro, eis que o Estado criminaliza o fumo, extinguindo-se o contrato, 104, II); a morte também extingue os contratos personalíssimos, mas as obrigações de dar transmitem-se aos parentes do morto dentro dos limites da herança (1.792).
            Fim da parte geral dos contratos – boas provas!  
Aula 12 - Atos unilaterais
Caros alunos, como dito na aula 1, neste semestre estamos estudando as fontes das obrigações, quais sejam: os contratos, os atos unilaterais e os atos ilícitos ( = responsabilidade civil, 927).
          Terminamos na aula 11 o estudo dos contratos, sua parte geral, pois a parte especial será vista em Civil 4 (a partir do art 481). Já a responsabilidade civil será abordada no final deste semestre.
          Vamos agora começar a falar dos atos unilaterais que são quatro segundo nosso CC: a promessa de recompensa, a gestão de negócios, o pagamento indevido e o enriquecimento sem causa. Não há outros atos unilaterais além desses quatro previstos em lei, diferentemente dos contratos que podem ser atípicos (425). A PR e a GN são atos unilaterais autênticos, enquanto o pagamento indevido e o enriquecimento sem causa estão mais perto da disciplina da responsabilidade civil.
 
          1 – Promessa de Recompensa
Toda pessoa que publicamente se comprometer a gratificar quem desempenhar certo serviço, contrai obrigação de fazer o prometido (854, ex: recompensa para quem encontrar um cachorro perdido, para quem denunciar um criminoso, para quem descobrir a cura do câncer, etc).
          O promitente tem que ter capacidade e a tarefa tem que ser lícita conforme art. 104. A promessa exige publicidade (ex: imprensa, carro de som, panfletos, cartazes). A promessa é feita a qualquer pessoa, ou a determinando grupo social (ex: qualquer aluno da Católica), pois se feita a pessoa certa não é ato unilateral, mas contrato de prestação de serviço (ex: pago cem a João para procurar meu cachorro perdido, neste caso não é ato unilateral mas bilateral/consensual). A lei, tendo em vista uma justa expectativa da sociedade, obriga o autor da promessa a cumprir o prometido,
independente de qualquer aceitação, independente de qualquer anuência de terceiro.
Fundamento: o fundamento da promessa é ético: o respeito à palavra dada. A obrigação tanto é unilateral que mesmo que a pessoa que preste o serviço não tenha conhecimento da recompensa, fará jus à gratificação (855). Mas é óbvio que a recompensa pode ser rejeitada, afinal ninguém pode ser credor contra sua vontade. Quando a promessa é divulgada o credor é potencial e indeterminado.  Só ao satisfazer o requisito exigido é que se define o titular do direito cuja obrigação nasceu da publicação da promessa.
          Oferta ao público: não se confunde com a promessa de recompensa. Esta é também feita ao público, mas a oferta é, por exemplo, o sapato exposto a venda na vitrine de uma loja, ou seja, é uma proposta para realizar um contrato de compra e venda, sem gerar obrigação imediata para a loja.
          Elementos da PR: anúncio público; indicação dos destinatários (toda a sociedade ou certo grupo); tarefa a ser cumprida; recompensa prometida.
Qual o valor da recompensa? Depende do promitente, mas um valor ínfimo pode ser aumentado pelo Juiz (ex: a recompensa é um diploma, hipótese em que o credor deve reclamar, afinal toda obrigação pressupõe teor patrimonial). A recompensa pode ser dinheiro, coleção de livros, passagem de avião, hospedagem em hotel, etc. E se mais de uma pessoa fizer o serviço, quem fica com a recompensa? A lei responde nos arts. 857 e 858.
Revogação: a promessa pode ser revogada? Sim, com a mesma publicidade da divulgação, mas só se não havia prazo para executar o serviço (856).   Pú do art. 856: dispositivo perigoso, pois como a oferta é feita ao público, muita gente pode exigir esse reembolso. A morte do promitente não revoga a promessa, respondendo os bens do falecido pela recompensa.
            Concurso: é semelhante aos concursos de direito administrativo para ingressar no serviço público.  O concurso civil é uma espécie de promessa de recompensa onde várias pessoas se dispõem a realizar uma tarefa em busca de uma gratificação que será oferecida ao melhor (ex: melhor desenho, melhor redação, melhor frase, melhor fotografia, melhor fantasia de carnaval, melhor livro, melhor música, melhor nome para animal do zoológico, etc). O concurso não pode ser revogado, pois o prazo é obrigatório, garantindo o trabalho de quem estiver desenvolvendo uma idéia (859). O concurso é aleatório para o concorrente que pode não ganhar nada, a depender da decisão do árbitro do certame, cuja decisão subjetiva não pode ser questionada (§§ 1º e 2º do art. 859). Todavia se houve corrupção do árbitro ou plágio do ganhador do concurso, admite-se anulação da decisão.  As obras/tarefas apresentadas podem passar a pertencer ao organizador do concurso (860).  
Aula 13 - Atos unilaterais (continuação)
  2 – Gestão de Negócios
 
Conceito: é a atuação de uma pessoa que, espontaneamente e sem mandato (= procuração), administra negócio alheio em situações emergenciais, presumindo o interesse do próximo (861, ex: é gestor de negócio alheio o morador de um edifício que arromba a porta do vizinho para fechar torneira que ficou aberta enquanto o vizinho saiu em viagem; então o gestor fecha a torneira, enxuga o apartamento, manda  secar os tapetes, troca a fechadura arrombada, e depois manda a conta pro dono do apartamento, que terá que indenizar o gestor pelas despesas, 869).
O gestor geralmente é um vizinho, amigo ou parente que vai administrar os negócios alheios sem procuração. Embora a lei use a expressão “negócio”, na verdade a gestão é de “interesse” alheio.
A GN estimula a solidariedade entre as pessoas. O gestor não tem autorização e nem obrigação de agir, mas deve fazê-lo por altruísmo, garantindo a lei o reembolso das despesas feitas. O gestor age deimproviso numa emergência (866), sendo equiparado a um mandatário sem procuração. Se o dono do negocio autoriza o gestor a agir teremos contrato de mandato e não mais GN (ex: no caso da torneira aberta, localiza-se o vizinho por telefone que autoriza o arrombamento, 873, 656).  Há também semelhanças da gestão de negócios com a estipulação em favor de terceiros (vide aula 7).
Trata-se de conduta unilateral do gestor com reflexos no patrimônio do próximo, chamado juridicamente de “dono do negócio”. Digo unilateral pois o gestor age sem combinar com o interessado, não havendo o acordo de vontades (consenso) que caracteriza os contratos. O gestor e o dono do negocio não precisam sequer se conhecer.
Elementos da GN: administração de negocio alheio, atuação de terceiro e falta de autorização do dono do negocio.
Pressupostos: a) ausência de qualquer contrato ou obrigação legal entre as partes a respeito do negócio gerido, pois a gestão é voluntária/espontânea; b) inexistência de proibição pelo dono do negócio, pois o gestor deve agir conforme vontade presumível daquele; c) interesse do gestor de cuidar do negócio alheio, não sendo pura liberalidade, afinal vai querer ser ressarcido das despesas efetuadas; d) o gestor deve agir com intenção de ser útil ao dono do negócio, agindo como ele faria se não estivesse ausente; e) fungibilidade do objeto do negócio, ou seja, o negócio pode ser realizado por terceiro, pois se for ato personalíssimo só o dono pode praticar (ex: não pode um amigo fazer prova no lugar de alguém que está doente e vai perder o concurso); f) ação do gestor limitada a atos de natureza patrimonial.
A gestão é gratuita (= altruísmo), mas o gestor pode ser processado caso não exerça bem sua tarefa (862, 863). Então o gestor pode ser responsabilizado se, mesmo de boa-fé, agir com precipitação e interpretar equivocadamente um fato, causando prejuízo ao dono do negocio. O gestor precisa agir com bom senso, respeitando a lei. Se a GN de um lado estimula a solidariedade entre estranhos, também protege o dono do negocio contra atos de intromissão indevida na sua esfera jurídica (868).
Cumprindo bem sua missão, o gestor será indenizado pelo interessado (869, e § 1º). Se a gestão resultar proveito para o dono do negócio, a gestão independe de aprovação, medindo-se a indenização devida ao gestor pela importância das vantagens obtidas.
Obrigações do gestor: comunicar a gestão ao dono do negocio (864); agir com prudência e probidade em favor do interessado; não fazer operações arriscadas; prestar contas de sua gestão. Obrigações do interessado: ratificar ou desaprovar a gestão após tomar conhecimento dela; indenizar o gestor das despesas feitas; cumprir as obrigações contraídas em seu nome.
Outros exemplos: providenciar um guincho para remover o carro de alguém estacionado na frente de uma casa em chamas; um advogado paga com seu dinheiro um imposto devido pelo cliente; levar uma vitima de atropelamento ao hospital e pagar as despesas médicas; pagar alimentos quando o devedor da pensão está ausente (871: então quem sustenta filhos dos outros pode exigir indenização dos pais); também é gestão de negócios pagar as despesas do funeral de alguém (872); último exemplo: num condomínio, o condômino que age em proveito da comunhão é gestor do negócio de todos, podendo exigir compensação financeira dos demais beneficiários (1.318).
Aula 14 - Atos unilaterais (final)
 3 e 4 – Pagamento Indevido e Enriquecimento Sem Causa
Enriquecer sem causa é enriquecer repentinamente sem motivo justo, sem trabalhar, sem herdar, sem doação e em detrimento de outrem. Enriquecer é muito importante, nossa sociedade exalta o estudo, o trabalho, o lucro e a produção, afinal essa riqueza individual vai gerar empregos, tributos e renda para todos. Mas é preciso enriquecer dentro da legalidade.
Outro modo de enriquecimento lícito, porém usado em simulações é através das loterias oficiais, o que exige cuidado da Justiça. Maus políticos enriquecem à custa da corrupção e alegam que ganharam na loteria... Igualmente em ações de dano moral o Juiz deve ter cautela para não estipular indenizações altíssimas e provocar enriquecimento injusto (ex: Juiz manda pagar um milhão a quem perdeu um dedo
num acidente).
Enfim, enriquecer não é pecado, não é crime, mas tal enriquecimento exige causa justa. Uma das hipóteses de enriquecimento sem causa, ou com causa ilegal, é através do pagamento indevido, por isso estes dois assuntos devem ser estudados em conjunto. PI enseja sempre ESC. Mas nem todo ESC é decorrente de PI. PI é espécie, ESC é gênero.
Ocorre pagamento indevido quando o devedor paga a alguém que não é o credor, ou seja, o recebedor (= accipiens) não é o credor, e o devedor (= solvens = pagador) agiu por engano. Quem recebe pagamento indevido enriquece sem causa (ex: João deve a José da Silva, mas paga a outro José da Silva, homônimo do verdadeiro credor; João efetuou pagamento indevido e vai ter que pagar de novo ao verdadeiro credor, pois quem paga mal paga duas vezes;  João obviamente vai exigir o dinheiro de volta do outro José da Silva que enriqueceu sem causa, mas o verdadeiro credor não precisa esperar, ele não tem nada a ver com isso). Em suma: o PI é típico caso de obrigação de restituir, face ao enriquecimento sem causa, afinal é preciso dar a cada um o que é seu.
Ocorre enriquecimento sem causa quando alguém aufere um aumento patrimonial, em prejuízo de outrém, sem justa causa. Outro conceito: dá-se enriquecimento sem causa quando o patrimônio de certa pessoa se valoriza a custa de outra pessoa, sem causa justificada.
Como ESC é gênero e PI é espécie, há outros casos de enriquecimento sem causa além das hipóteses de pagamento indevido, ex: 578, 1255, pú do 1817, etc. Estudaremos esses exemplos oportunamente, ao longo do extenso curso de Direito Civil.
Elementos do ESC: enriquecimento de um, empobrecimento de outrem, nexo entre esse ganho e essa perda, e finalmente falta de causa justa. Lembro que o proibido não é enriquecer à custa de outrem, mas enriquecer injustamente (ex: nosso conhecido contrato aleatório).
Relação do ESC com a Responsabilidade Civil: nesta o direito de indenizar existe face ao prejuízo sofrido, mesmo que ninguém tenha se locupletado (ex: acidente de trânsito), já no ESC há sempre um patrimônio beneficiado. De qualquer modo, em ambos será necessária a reparação ao prejudicado, e o retorno das coisas ao estado anterior.
Pagamento indevido e cobrança indevida não se confundem, pois no PI paga-se quando não se devia pagar; na CI  cobra-se dívida já paga, então o autor da cobrança deve devolver o dobro ao requerido (940).
Dois efeitos do pagamento indevido:
1 – aquele que enriqueceu sem causa fica obrigado a devolver o indevidamente auferido, não só por uma questão  moral (= direito natural), mas também por uma questão de ordem civil(876, 884) e tributária, afinal como explicar à Receita Federal um súbito aumento de patrimônio? O objetivo dessa devolução é reequilibrar os patrimônios do devedor e do falso credor, alterados sem fundamento jurídico, sem causa justa.
            2 – se o falso credor não quiser voluntariamente devolver o pagamento, surge o segundo efeito que é o direito do solvens de propor ação de repetição do indébito (repetitio indebiti) contra tal accipiens.  Esta ação tem este nome pois, em linguagem jurídica, “repetir” significa “devolver” e “indébito” é aquilo que não é devido. Então a ação é para o falso credor devolver aquilo que não lhe era devido.  Tal ação prescreve em três anos (206, § 3º, IV).
            Também se aplicam as regras do pagamento indevido quando se paga mais do que se deve. Porém não cabe a repetição quando o “solvens” agiu por liberalidade (ex: doação, 877) ou em cumprimento de obrigação natural (ex: gorjeta, dívida de jogo, dívida prescrita, 882, 814) ou quando o “solvens” deu alguma coisa para obter fim ilícito, afinal ninguém pode se beneficiar da própria torpeza (ex: pagou ao pistoleiro errado para cometer um homicídio, não cabe devolução, 883).
            E se o objeto do pagamento indevido já tiver sido alienado pelo falso credor a um terceiro? Bem, se tal objeto era coisa móvel, tal alienação vale por uma questão de segurança das relações jurídicas e porque em geral os móveis são menos valiosos do que os imóveis. De qualquer modo o falso credor vai responder pelo equivalente em dinheiro.
            Mas se o objeto do pagamento indevido for um imóvel que o falso credor já tenha alienado a um terceiro, tal alienação só valerá se feita onerosamente (venda sim, doação não) e o terceiro estiver de boa-fé. Caso contrário o solvens poderá perseguir o imóvel e recuperá-lo do terceiro (879).
Aula 15 - Responsabilidade civil e ato ilícito
Meus pupilos, chegamos hoje ao último tema do semestre, a última grande fonte de obrigação: o ato ilícito, visto por vocês em Civil 1 (art. 186), que enseja a responsabilidade civil (927). Exemplo muito comum na nossa vida: acidente de trânsito, pois motorista imprudente que bate no carro de alguém comete ato ilícito e fica obrigado a reparar o dano. Parece exagero, mas podemos afirmar que no nosso cotidiano inevitavelmente vamos sofrer e causar danos a terceiros.
A RC é tema moderno pois as questões práticas se multiplicam no dia a dia, face ao dinamismo das relações sociais, e ao urbanismo das grandes cidades. Assim quanto maior a diversidade dos riscos para a humanidade, e as seqüelas que brotam dos acidentes, maior o campo de aplicação da teoria da RC. Toda atividade humana pode acarretar a responsabilidade de indenizar se causar prejuízo a alguém. A teoria da RC visa restaurar um equilíbrio patrimonial ou moral violado. Quanto mais se estuda, mais interessante se torna essa matéria. Para proteção das pessoas, face a evolução da RC, é fundamental a celebração cada vez maior de contratos de seguro, inclusive para garantir a indenização da vítima (ex: hospitais devem ter seguro caso seus médicos errem e prejudiquem os pacientes).
Histórico: a teoria da RC decorre do instinto humano de sempre querer reparação pelo mal que outro lhe causara; é a natureza humana que exige responsabilizar as pessoas por seus atos danosos. No Velho Testamento a lei de talião já autorizava “olho por olho, dente por dente” para reparar um dano; um prejuízo não reparado é fator de inquietação social; assim a vingança privada, a justiça com as próprias mãos, o mal pela violência, é o berço da RC. Com a evolução da sociedade, a vingança passou a ser praticada pela autoridade, e não mais pela própria vítima. O passo seguinte foi a substituição dessa vingança por uma coisa ou quantia paga pelo ofensor ao ofendido. Nos dias de hoje permanece essa obrigação do ofensor de indenizar a vitima pelo dano causado, mesmo que em alguns casos não tenha ensejado o acidente por culpa. Como se vê, a doutrina chega ao 3º milênio ciente de que o fundamento da RC não é a culpa, mas o dano, de modo que em alguns casos pode haver obrigação de indenizar independente de culpa, mas não se falará em RC se não houver prejuízo à vítima (pú do 927).
Exemplo: terremoto que provoca vazamento em posto de gasolina, poluindo o rio e deixando a cidade sem água, teremos dano sem culpa e obrigação de indenizar pois comercializar combustível é atividade de risco; outro ex: João atira em Maria, mas ela não escuta o disparo, sequer tomando conhecimento do risco que correu, teremos culpa, teremos até crime de tentativa de homicídio do Código Penal, mas não vai se falar em indenização pois não houve qualquer dano, nem material e nem moral; mais exemplos de ato ilícito com culpa mas sem dano, e que por isso não ensejam RC: pisar um pouco na grama do jardim; entrar, dar uma olhada e sair da casa de uma pessoa sem quebrar nada ou furtar nada.
E que casos são estes que geram a RC? São os fatos jurídicos, ou seja, todo aquele acontecimento, natural ou humano, voluntário ou não, relevante para o direito em virtude dos quais nascem, subsistem e se extinguem as relações jurídicas. (ex: um raio que cai no mar não tem relevância jurídica, mas um raio que cai numa casa implica em morte, sucessão, dano, indenização decorrente de seguro, etc; um raio quem cai numa fabrica de pólvora e provoca incêndio no bairro enseja RC face a atividade

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