Buscar

MassCulture DicCom

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 3, do total de 9 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 6, do total de 9 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 9, do total de 9 páginas

Prévia do material em texto

CULTURA DE MASSA 
SiLvi11 Borelli 
Simone Luci Pereira 
O tema da culrura de massa mostra-se fundamental para a compreensão dos 
processos e embates por que passam as questões cultma.is na modernidade capi­
talista. Sua presença nos debates sobre cultura, arre, mercado e política- tanto na 
esfera acadêmica, como em outras arenas sociais, e até no senso comum - aéesta e 
justifica a pertinência de retomarmos a contextualização desce tema, seus principais 
marcos conceitua.is e históricos e as perspectivas para o debate contemporâneo. 
Estudos teóricos e críticos sobre o fenômeno começam a surgir nas décadas 
de 1920-30, impulsionados pela presença e força que a cécnica e os meios de 
comunicação de grande alcance e seus conteúdos passam a ter naquele momen­
to. Entretanto, como sugere Marcín-Barbero (1997), é necessário compreender 
que os meios e a cultura massiva não surgiram repentinamente nessa época, 
mas viveram a gestação lenta e gradual de seus principais elementos nos sécu­
los anteriores, desde o alvorecer da modernidade ocidental. Nos processos de 
massificação da sociedade durante o século x1x parecem estar as origens daquilo 
que viria, apenas no século XX, a ser nomeado "cultura de massa". 
Por isso, retoman1os aqui criticamente um pouco desse processo histórico. A 
ideia de uma sociedade de massas cem matrizes históricas, sociais e políticas nos 
processos de industrialização, urbanização e estabelecimenro de uma economia de 
mercado, desde o início do século XIX, em países como Inglaterra e França. Surgia 
assim o fenômeno das massas, da aglomeração urbana, das multidões na rua, das 
revoltas trabalhadoras, como a Revolução de 1848, a Comuna de Paris, entre ouu-as. 
Máquinas, multidões, cidades: um trinômio que significava o progresso, o fascínio, 
mas também o medo devido ao estranhamenco que as novas condições de vida 
impunham aos indivíduos, que se viam desgarrados das relações familiares, tradi­
cionais, rurais, com suas correlatas relações de fidelidades, tradições, concepções de 
tempo regido pela natureza, ligação com a terra. Mas o medo advinha também por 
parte das elites, que viam uma ameaça constante na mistura e proximidade física 
entre diferences (social, cultural e economicamente falando). Vai-se construindo, 
a partir de então, ramo um processo de incorporação (que não excluía também 
os processos de opressão e exclusão) dessas camadas populares recém-chegadas do 
campo, transformadas em "massas urbanas", aos elementos de consumo e à cultura 
hegemônica; como também teorias formuladas pelo pensamento conservador da 
101 
102 
UJ o 
! o 
elice da época que pudessem compreender essas massas e seu comportamento, bem 
como forjar códigos e ações para o seu ordenamenro/disciplinamento e controle. 
Essa multidão, ou massa, passa a ser construída, representada e encarada, no 
pensamento médico, urbanista, social e ftlosófico do século XIX e início do xx, 
como uma totalidade amorfa sem objetivos ou projetos, ameaçadora do controle 
e da ordem social. A formulação de teorias conservadoras serviria para explicar 
o fenômeno das massas, organizando a visão da burguesia/elite sobre as camadas
baixas da população, consideradas perigosas, por isso devendo ser controladas e 
reprimidas, sob o risco de, sem isso, acabarem com a civilização, racionalidade 
e progresso que se buscava no século das Luzes. Dentre estas teorias, surgem 
as ideias de Alexis de Tocqueville sobre a maioria e seu poder, como também 
as de Stuart Mil!, pressupondo que a junção de indivíduos isolados com sua 
consequente agregação levaria a uma uniformização de diferentes e ao império 
da mediocridade coletiva. 
É nessa época que começam os escudos sobre a psicologia das multidões, 
cujos argumentos partem da noção de que as massas sempre têm ações incons­
cientes, irracionalistas, bestializantes, e por isso precisariam ser controladas pela 
parcela racional e civilizada da sociedade. Den cro desse pensamento conservador, 
pode-se perceber também as ideias de Gustave Le Bon, para quem as massas são 
decorrência da sociedade industrial, que cria multidões articuladas à turbulência 
e onde uma cerca alma coletiva leva os indivíduos a agirem em grupo de maneira 
diversa da forma como se comportariam se estivessem isolados. Em comum, essas 
formulações guardam uma visão pessimista e uma ideia pejorativa dessas massas e 
da sociedade que então se edificava sob sua presença, significando ajuntamento, 
multidão, mistura, uniformização, homogeneização, irracionalidade. 
Essas ideias ganharam lastro e se tornaram dominantes nas primeiras décadas 
do século XX, quando os sinais explícitos da presença das tecnologias que torna­
ram possíveis os meios de comunicação massivos se fàziam patentes. Este ideário 
acabou _por balizar - seja para ratificar, seja rechaçar - correntes de pensamento 
que se dispuseram a pensar os conteúdos dessas mensagens veiculadas de maneira 
incensa e maciça via rádio, jornais, revistas, publicidade, TV, em que vigoravam o 
paradigma da manipulação e inconsciência das massas, ou, contrariamente, como 
nos estudos norte-americanos dos anos 1940-50, que viam na cultura de massa a 
democratização superando hierarquias e conflitos sociais, contra o pessimismo já 
demonstrado do pensamento aristocrático europeu, e na crença de que essa cultura 
massiva era a cultura das massas, advinda e produzida por esta parcela social. 
Assim é que podemos compreender o surgimento do conceito ou da teoria 
da cultura de massa. Já desde o início do século xx, vinha se desenvolvendo 
nos Estados Unidos a construção de uma corrente de escudos e de pensamento 
com enfoque microssociológico e emográfico dos modos de comunicação na 
organização social, bem como uma preocupação em concribuir com métodos 
científicos para resolução dos desequilíbrios sociais. 
ESCOLA DE CHICAGO 
Esta Escola propõe noções, como a de ecologia humana, para pensar grupos 
segregados nas cidades, negros, jovens, imigrames, em que a noção de organis­
mo, seu funcionamento e a relação com o ambiente traria a busca por ferra­
mentas para análise das atitudes, comportamentos dos grupos no "laboratório 
social" (que eram as cidades), e na fundação dos meios de comunicação nesses 
processos de assimilação, mobilidade etc. Robert Park, entre outros pensadores, 
influenciados pelo sociólogo Georg Sim mel e suas noções sobre a metrópole, a 
vida mental, a personalidade do citadino que convive com diversos e intensos 
estímulos nervosos, cria aquilo que foi uma marca na Escola de Chicago: a 
busca pela análise empírica de situações e grupos concretos escudados pela via 
etnográfica, na qual a ambivalência da personalidade urbana- individualizada 
mas também uniformizada diante da homogeneização dos comportamentos-vai 
se expressar também na concepção de meios de comunicação do grupo, visco 
como simultaneamente fator de emancipação ou aprofundamento da experi­
ência individual e causador da superficialidade das relações. 
Por volta da década de 1920, vai-se operando um processo de transforma­
ção social e cultural, que já vinha gesrando desde o início da Modernidade, 
mas que nessa época é flagrante. Uma associação entre o estabelecimento de 
uma economia de mercado assentada na industrialização e nas transformações 
que deram as bases tecnológicas para a estrutura social que se implantava; a 
urbanização como modelo socioeconômico e modo de vida por excelência do 
sistema capitalista, com todas as mudanças culturais, perceptivas, sensoriais 
e nas sociabilidades que isso trazia; o estabelecimento de uma sociedade de 
consumo, em que este passa a ser o ingrediente-chave do estilo de vida e da 
culcura das sociedades modernas ocidencais; meios de comunicação que passam 
a ter alcance antes não visto, como rádio, cinema, publicidade, jornais, revistas, 
cinema, TV, que difundem valores, comportamentos,bens simbólicos que se 
querem totalizances, alcançando o maior número possível de pessoas. 
Este último aspecto, interligado a codos os outros, torna-se central para o esta­
belecimento de uma cultura de massa, com w11 conteúdo que salienta mudanças 
na cultma e nas formas de comunicação; de algo verbal, seja no padrão literário e 
escrito, seja na oralidade popular e tradicional, as culturas de massa veiculariam um 
103 
104 modelo/padrão de linguagem audiovisual ou "verbo-vaca-visual" (Lima, 2011), 
que romaria a frente como norma hegemónica de comunicação nesta nova era. 
Conhecendo esse conrexro, bem como as noções referentes à massificação 
da sociedade desde o século XIX, e, ainda, na esteira das preocupações da Escola 
de Chicago, é que podemos compreender ainda mais "os empirismos do novo 
mundo" (Mactelart, 2001), ou seja, escudos preocupados com a materialidade 
dos fenômenos ligados à comunicação e cultura de massa produzidos nos EUA. 
Estes nos interessam, dentre outros motivos, por ser aqueles em que se pode 
identifica r, mais própria e explicitamente, um enfoque sobre a cultura de massa, 
termo a partir de então assumido e teorizado. 
MASS COMMUNICATION RESEARCH 
Em 1927 foi publicada a obra de H. Lasswell, Propaganda techniques in the 
world war, um marco do campo de escudos denominado Mass Communication 
Reserach, que nas décadas seguintes congregaria autores desde a Engenharia das 
comunicações, passando pela Psicologia, Sociologia, com propósicos teóricos e 
enfoques divergentes, mas que podem ser percebidos no que têm de comum, a 
saber, uma orientação empirista e até quantitativa de estudos; uma orientação 
pragmática com forre inclinação política e instrumental; e uma cerra noção 
de modelo comunicativo e de cultura de massa que fundamenta esses estudos. 
Sem nos deter mais profundamente em rodas as nuances e particularidades de 
rodos esses escudos, cumpre saber que havia entre eles uma corrente füncionalista, 
que se originou nos escudos de Lasswell e se propagou nos de P. Lazarsfeld e R. 
Merron, mas que tem como inspiração o esrrucural-funcionalismo britânico, 
predominante na amropologia social de então, com base sociológica muito forte 
que remontava aos pressupostos de Émile Durkheim. O estrutural-funcionalismo
pensa o sis�ema social em sua globalidade, como um organismo cujas diferentes 
partes desempenham funções de integração e coesão para a manutenção do 
sistema. Assim, no que diz respeito aos conteúdos propagados pelos meios de 
comunicação de massas, a preocupação é compreender os efeitos das mensagens, 
onde os meios são vistos mais geralmente como onipotentes, causa única e 
suficiente dos efeitos verificados, o que faz que a audiência seja encarada como 
passiva, exposta sem proteção aos estímulos advindos dos meios, como na 
ação de urna "agulha hipodérmica" (termo de Lasswell) que atingiria camadas 
profundas de maneira quase imperceptível e inconsciente. 
Nessa linha funcionalisca norte-americana, a concepção dos meios e da cultura 
de massa roma a forma de algo instrumental, como ferramenta ou mecanismo 
de regulação da sociedade, construindo uma teoria que acabava por servir para a 
manutenção e reprodução dos valores do sistema social capitalista e do estado de 
coisas existente. A visão de cultura de massa que subjaz disso é uma noção que 
lembra os teóricos da massificação da sociedade do século x1x, segw1do a qual uma 
determinada visão sobre as massas parece ter aqui se transformado na correlata 
ideia de cultura de massa, isto é, algo homogêneo e alienante, construído para 
gerar tipos específicos de efeitos desejados, seja pelos donos dos conglomerados 
de comunicação, seja pelo Estado. Algo encarado como disfunção e degradação 
da cultura superior, degradando o gosto e reiterando a redundância, a repetição, 
em que o parâmetro são os elementos da cultura formal ou erudita, e a cultura 
de massa é vista pela lente da ausência e da inferioridade. 
Nas décadas seguintes a esses pioneiros escudos de mídia norte-americanos, 
vai-se criando um espírito mais crítico a isso, chegando até a se esboçar (com 
Marshall McLuhan e outros) um certo otimismo com relação à cultura de 
massa e sua afirmação positiva por seu poder democrarízanre. 
Entretanto, ainda nas décadas de 1930 e 1940, surge outro referencial de 
interpretação do fenômeno da cultura e dos meios massivos, que teve no cen­
tro de suas preocupações, entre outras coisas, a crítica profunda a esse modelo 
inscrumencal, funcionalista e acrítico de pensar os fenômenos, edificando-se 
uma reflexão que, criticando a racionalidade desenvolvida pelo sistema capi­
talista (presente inclusive nos escudos das mídias), propõe um olhar radical de 
questionamento sobre a técnica e seus usos na cultura. Nascia nos anos 1920,
na Alemanha, a Escola de Frankfurt, que teve naquele momento como seus 
principais expoentes T. Adorno. M. Hokheimer e W Benjamin. 
INDÚSTRIA CULTURAL 
No conceito cunhado em 1947 por Adorno e Horkheimer, indúst ria cultu­
ral, já se mostram as bases desta reflexão, na própria crítica que os autores fazem 
ao termo cultura de massa. Segundo eles, este termo rrazia uma confusão ao 
dar a entender que cultura de massa referia-se à cultura produzida de maneira 
espontânea pelas massas populares. 
A construção da teoria crítica da sociedade moderna passa, para os frankfurtia­
nos, pela rejeição da cultura de massa como cultura, pela afirmação do conceito de 
indústria cultural e pela constatação da impossibilidade de existência de tradições, 
culrura popular, obra de ane e espaço para o autêntico no mundo moderno. 
Para Theodor W Adorno, por exemplo, a sociedade moderna está permeada 
de falseamento ideológico intrínseco, que impede o surgimento de manifes-
105 
8 
2 � � 
106 rações de originalidade, criatividade e atividade - no pleno sentido da ação 
realizada por sujeiros ativos - e que impossibilita qualquer forma de produção 
ou recepção culturais críticas. Assim sendo, indústria cultural, no sentido mais 
preciso do conceito frankfurciano, produz mercadorias resulrantes de processo 
de fabricação padronizado e homogeneizado no inrerior de uma sociedade na 
qual a ideologia é a sociedade como fenômeno (Adorno, 1962). 
A radicalidade frankfurciana - e fundamentalmenre adorniana, na medi­
da em que Walter Benjamin, por exemplo, se distancia inúmeras vezes, das 
concepções adornianas (Koche, 1978) - é compreendida quando inserida 
em conrexto histórico mais amplo. Em um mundo esrilhaçado pela ameaça 
nazifascisra, derurpado pela ascensão stalinista e projetado idilicamente nos 
espaços audiovisuais - da já competenre indústria culrural americana-, torna­
se justificável o surgimento de uma interpretação cujo pressuposto estético é 
o da negatividade, e cuja perspectiva analítica revela um inequívoco tom de
desencantamento, resultante do diagnóstico da presença de uma sociedade
fragmentada, descontínua e em processo acelerado de desagregação. Esses
elementos servem de base para a construção não só de um método científico,
denominado pelo próprio Adorno como dialética negativa, mas também do
referencial teórico de enunciação dos pressupostos da estética da negatividade.
Os frankfurtianos, em permanente processo de mobilidade em direção ao 
exílio norte-americano, viveram um momento histórico trágico marcado pela 
perda das esperanças e pela impossibilidade de realização de qualquer utopia. 
Há que se lamentar, entretanto, que uma reflexão cão precisa no diagnóstico de 
um modelo de organização da racionalidade moderna- modelo fundamentado 
no papel determinante da produção, nas tendências ao controle da informação 
e na preponderância da administração técnica- não tenha conseguido projetar 
novas utopias em meio ao caos evidente. Ainda que, e paradoxalmente, seja 
difícil supo� a possibilidade da imaginação nesse momenco de utopias,que não 
as associadas às experiências bolchevista-stalinista ou nazifascista. 
Um dos grandes problemas da concepção adorniana diz respeito à im­
possibilidade de desvincular culrura e manifestações estéticas e artísticas da 
contaminação onipresente da ideologia; os produtos culrurais nas sociedades 
modernas são permanentemente fabricados e absorvidos pelos mecanismos vo­
razes da indústria cultural. A existência da verdadeira culrura ou de verdadeiras 
obras de arte está diretamente relacionada à presença de expressiva autonomia, 
capaz de negar a sociedade na qual estão inseridas. 
Os equívocos dessa abordagem localizam-se em dois pontos: em uma noção de 
cultura informada por uma concepção em que a estética é exclusivamente aquela 
da arte moderna, e em uma proposta que transforma a produção, a producividade 
e a racionalidade em elemencos determinantes para codas as demais articulações 
no interior da sociedade. Nessa perspectiva, os producores não criam, repetem; 
os produtos não marcam rupcuras, são sempre os mesmos; e os receptores não 
criticam, apenas consomem e reproduzem passivamente a ideologia intrínseca. 
Os contornos desta reílexão emaranharam-se, e muito, com a consolida­
ção histórica da cultura de massa e a ampliação dos espaços das mídias em 
todo o mundo. 
CULTURA DE MASSA NO BRASIL 
No Brasil, isso ocorre a partir de meados dos anos 1960, quando se observa 
uma cisão que segmentou o campo cultural em três fragmentos polarizados e ex­
cludentes: o culro, o de massa e o popular. Por quesrões que hoje parecem óbvias, o 
massivo foi responsabilizado, ao mesmo tempo, pela vulgarização do erudito e pela 
degradação do popular. Para os críticos desse projeto de modernidade, a "cu.lrura de 
massa" -que não deve ser confi.mdida com a noção de indústria cultural (Adorno, 
1986) - comou-se a razão mesma do processo de modernização, e os meios de 
comunicação passaram a ser seus principais instrumentos de realização. Do ponto 
de vista teórico, o que se pode observar nesse debate, hoje em dia, é a presença 
significativa da tradição frankfurciana para se pensar a cultura contemporânea. 
Os parâmetros da Escola de Frank.fure começaram a ser apropriados no 
Brasil no final dos anos 1960, tanto por intelectuais marxistas quanco por 
críticos radicais ao marxismo. Um dos trabalhos pioneiros, Arte e sociedade em 
Marci1Se, Adorno e Benjamin, publicado em 1969, é de autoria de José Guilherme 
Merquior, um "liberal" e "impenitente adversário dos frankfurcianos" (Cohn, 
1986: 29). No mesmo ano, entretamo, a editora Civilização Brasileira publicou, 
numa tradução pioneira de José Lino Grünnewald, a hoje famosa reflexão de 
Walter Benjamin A obra de arte na era de sua reprodutibilidade técnica (1985). 
Em seguida, nos anos 1970 e 1980, o pensamenco frankfurtiano construiu uma 
trajetória baseante visível e se consolidou no interior de um debate marxista, já 
significativo nas décadas anteriores, mas apropriado e adaptado, nessa época, 
com o objetivo de interpretar, criticamenre, o modelo de modernização e os 
processos de industrialização da cultura no Brasil. 
São vários os intelectuais que escreveram sobre Benjamin e Adorno, ou 
traduziram seus artigos, passando a desenvolver uma reflexão baseada nos prin­
cípios da teoria crítica, abrindo brechas para problematizar o lugar da cuJtura 
107 
108 no interior do debate marxista - determinação/dominância, superestrutura/ 
infraestrutura - e sedimentando uma tradição de pensar as mídias (numa melhor 
precisão do conceiro frankfurciano: pensar a indústria cultural) sob a ótica do 
que se denominou crítica ideológica dos meios, entendidos, estes últimos, como 
representantes de uma fase complexa de modernização do capitalismo adminis­
trado. Esta abordagem atravessou as últimas décadas, mantendo-se ativa dentro 
do campo da reflexão sobre cultura de massa, indústria cultural e modernização. 
ESTUDOS CULTURAIS INGLESES 
Dos anos 1980 em diante, na América Latina, é possível notar a presença 
de reflexões que se mostram em diálogo com aquelas construídas pelos escudos 
culturais ingleses, os quais, desde os anos 1970, viviam uma diáspora mundial, 
comando características diferenciadas em cada localidade. Esses estudos, ao afir­
marem a cultura como questão-chave para o entendimento dos processos sociais, 
salientam-na corno cultura comLUn, ordinária, numa relação em que a vida diária 
não deve estar ausente da reflexão, em que o cotidiano deve ser o foco principal de 
interpretação, sempre numa perspectiva de se pensar a materialidade da vida. Por 
aqui, influenciou fortemente o pensamento latino-americano sobre comunicação e 
cul cura, mais precisamente, as formulações de Jesús Marcín-Barbero e Nésror García 
Canclini (Escosteguy, 2001 ), interessados em pensar na presença cada vez maior da 
indústria cultural na vida cotidiana e na questão da cultura popular em meio a isso. 
O processo conjuntural em que se manifestaram as formulações inglesas, nos 
anos 1950-60, parece ser correlato ao que ocorreu na América Latina na década 
de 1970-80 com a globalização, a crise do horizonte marxista, o debate sobre a 
modernidade, as indústrias culturais, a sociedade de consumo. Isso tudo levou a 
um redimensionamenro dos posicionamentos teórico-conceituais vigentes, tais 
como o rµarxismo determinista- que buscava ver e explicar os conflitos por meio 
de uma única contradição (a de classe)-, impedindo de se pensar a pluralidade 
de matrizes culturais. Um marxismo de corre gramsciano passa a ganhar força 
nesses estudos, para uma melhor compreensão sobre as relações entre cultura e 
classe social, redesenhando assim não só o sentido da cultura, como também o da 
política, permitindo reconhecer as culturas populares e a formação de identidades. 
Na perspectiva do filósofo italiano Antonio Gramsci, entrariam em jogo 
noções como negociações, compromissos, mediações e busca por hegemonia, 
relativizando o conceito de ideologia e colaborando para a reformulação e crítica 
de uma teoria funcionalista sobre os meios de comunicação de massa como 
poderosos e absolutos. Negociações seriam como uma mescla de elementos de 
oposição e adaptação, um misto de lógicas contraditórias que representam ramo 
os valores dominantes como também as apropriações por pane dos receptores 
relacionadas com suas formas de vida. 
Destaca-se o fato de não se poder compreender o popular como algo pro­
duzido pelo povo ou para o povo, mas sim como aquilo que é adorado pelas 
camadas populares, apropriado por elas, por ser adequado às suas concepções 
de mundo. Vem daí a noção de não se pensar a cultura popular como algo em 
si mesmo, isolada, pura, autônoma, mas situada num campo mais complexo 
de relação de forças, de luta por hegemonia dentro do campo cultural. 
Nesse sentido é que Marrín-Barbero argumenta que a cultura vista nas so­
ciedades urbanas latino-americanas não se encontram comparcimentadas·encre 
cultura popular, massiva e erudita, de forma cristalizada e estanque, mas sim 
envolvidas numa cadeia complexa de interferências, contaminações, misturas, 
em que não se pode alimentar uma visão utópica de um popular, de um povo 
bom, ingênuo, autêntico, porque ligado ao passado, ao rural; em detrimento 
do que é urbano, moderno, visro como ruim. E, mais, como se estivessem 
separados. Deve-se pensar a cultura urbana atual não só como aquilo que é 
produzido pelo povo, mas pelo que o povo consome, suas apropriações, seus 
hábitos de leitura, audição, diversão. Isso cudo sugere a ideia de mestiçagem, 
com a complexidade do urbano colocando moderno e arcaico junros. 
Assim, os conteúdos da cultura massificada propagados pela indústria cultural, 
mesmo modificados de suas formações originais, miscigenados com outras formas 
culturais, ou ainda buscando uniformizar diferenças, estilos, épocas, linguagens, 
mostram-se ainda revelando elementospopulares; o que hoje chan1amos de culturas 
de massa são elementos de matrizes culturais, de tradições populares de séculos 
passados que nos interpelam a partir do massivo (Martín-Barbero, 1997), trazendo 
a noção de "cultura popular de massas" para se pensar esses fenômenos, asswnindo 
que a cultura passa por embates, por movimentos de dominação e subordinação 
interiores, em que nada pode ser afirmado como aucêncico, autônomo, indepen­
dente e interior a si mesmo, havendo uma luca cultural, com pontos de contenção 
e de resistência, apropriação e expropriação de bens culturais. 
Dessa maneira, se a ideia de cultura de massa passa por embaces em seu 
trajeto histórico como conceito, desde uma empolgação funcional isca, passando 
pela crítica frankfurriana, até chegarmos aos reposicionamentos dos escudos 
culturais britânicos e latino-americanos, é preciso compreender que não há um 
consenso definitivo sobre essas definições, como se esses períodos históricos 
fossem se alternando e anulando as considerações anteriores. O que se quis 
mostrar aqui foi a constituição de um debate, em sua história e na contempo­
raneidade, que se encontra vivo e dinâmico. 
109

Outros materiais