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IMAGEM
TAMBÉM
SE LÊ
OBJETO/DESIGN
Sandra Ramalho 
e Oliveira
EDITORA ROSARI
2004
PRIMEIRO, O CARDÁPIO
As letras douradas da minha tese de doutorado sumiram. As capas dos 
dois exemplares, depositados na biblioteca da universidade onde eu trabalho, estão sem identificação, 
quase. Considerando-se que se tratava de uma impressão de boa qualidade, fiquei vaidosa, pois é um 
indício de que ela está sendo bastante lida, ainda que sendo uma tese, geralmente sinônimo de leitura 
muito de um texto muito formal e, por isso, enfadonha. Assim, achei que o assunto poderia ser 
interessante para um número maior de pessoas. Seu título é “Leitura de imagens para a 
educação”; foi defendida no Programa de Estudos Pós-Graduados em Comunicação e Semiótica da 
PUC/SP, sob a orientação de Ana Claudia Mei Alves de Oliveira e ela dá origem a este livro. 
*****
Minha preocupação vem sendo, há tempo, o acesso às imagens, ou melhor, à 
significação das imagens. Como professora de arte, muitas vezes eu mesma tinha dúvidas 
diante de determinadas obras. Buscava orientação nos conhecimentos de história da arte, ou na história 
de vida dos artistas. Mas tinha pruridos éticos; como professora, achava que eu não poderia ter certas 
dúvidas. Eu me sentia, por vezes, uma impostora... 
Nesse tempo, preocupavam-me exclusivamente as imagens artísticas. Ainda assim, como 
motivar as pessoas para compreender a arte contemporânea, se agora é que muitos começam a perder 
as resistências em relação à arte moderna (não faz muito que assisti alguém conhecido ficar exultante 
por “descobrir” que Picasso “também sabia pintar”, ao visitar o museu que leva seu nome, em Paris, 
onde as obras do início da sua carreira também estão expostas)? 
Em seguida, novas deduções: fora dos grandes centros, a arte vem sendo 
sistematicamente terceirizada. Quero dizer com isto que nas escolas, mesmo em muitas 
escolas superiores, e até em algumas paredes tidas como respeitáveis, as imagens às quais se refere 
como se arte fosse, são meras reproduções. Nas escolas, a arte está terceirizada em livros, slides, 
transparências e, mais recentemente, em power point. Assim, os alunos não estão estudando arte, mas 
outra mídia, geralmente, a fotografia “da” arte (e não a fotografia “de” arte). E pelo fato de ser outra 
mídia, a imagem fotográfica que reproduz a arte, geralmente a modifica em, no mínimo, três de seus 
elementos constitutivos: dimensão, cor e textura. E esses elementos, já que são 
2
“constitutivos”, eles são básicos, eles constituem a imagem, eles engendram sua significação. E se 
estão distorcidos (ou modificados), implicam modificações na sua significação.
Quando uma reprodução é apresentada “no lugar” da arte, além de a “imagem em questão” não 
ser a “imagem em questão”, seu significado fica inevitavelmente alterado. Lembro-me do impacto que 
senti diante de três exemplares da série “Os Retirantes”, de Portinari, ao subir as escadas do MASP, 
percebendo-os tão mais eloqüentes (porque tão “maiores”) do que as pequenas reproduções que eu 
conhecia...
Diante desta constatação, percebida de diversos modos, ampliou-se o raio do meu interesse 
sobre imagens. Não me desafiavam “apenas” as imagens artísticas, mas todo o universo visual em 
torno de nós, dos rótulos às capas de caderno, do desenho dos biscoitos à estamparia de tecidos, dos 
cartazes às capas de CD, da organização que associa texto verbal a imagens visuais (isto não é 
redundância, como veremos mais tarde), dos jornais à propaganda eleitoral gratuita. Além do mais, ou 
seja, além de podermos estudar com nossos alunos o original dessas imagens, e não sua cópia, os 
exemplares de composição visual no qual elas consistem eram – e são – sempre mais próximos da 
realidade dos alunos, o que faz com que lhes seja mais interessante conhecer melhor. Aí está o 
início (ou o início da formalização) do meu interesse pelo design. 
*****
É necessário – e eu continuo defendendo isto - que as pessoas possam 
conhecer e usar um referencial mínimo para poder decodificar o universo 
de imagens que invade o seu cotidiano. Intuitivamente eu achava que a mesma base 
estrutural que sustentava as imagens da arte também estava presente na base das imagens estéticas do 
cotidiano. Depois, confirmei através de teorias e de exemplos. Primeiro, foi necessário estabelecer 
teoricamente esta classificação. Mas, afinal, o que é arte? Pergunta irrespondível, definitivamente, é 
claro, pois pode ser respondida dos mais diferentes modos. No meu caso, eu precisava saber, ou 
diferenciar, o que era arte do que não era (e o que seriam essas imagens 
que não eram arte?). Jan Mukarovský foi o teórico que me auxiliou, neste sentido. É uma das 
questões que eu trato no primeiro dos meus “textosdesign”, que recebeu o título de IMAGENS 
DO DESIGN, IMAGEM DA ARTE? 
Não menos polêmico é o assunto seguinte: estética. Quais os diversos sentidos e 
interpretações que esta palavra carrega consigo, através da história? E o que hoje atribuímos a ela? Se 
3
imagens nos interessam, seja quanto à criação ou à leitura (e não é melhor escritor aquele que muito 
lê?), os significados da palavra estética, as funções das imagens, sua condição de imagem 
estética ou imagem artística têm que interessar também. Disso aborda o texto que tem como título 
AFINAL, O QUE É ESTÉTICA?, que acabou começando também com um questionamento, 
como o anterior. Tudo a ver... não são as dúvidas que nos fazem pesquisar, buscar conhecimentos?
*****
Confirmada, com a devida unção teórica, a possibilidade de não se ter preconceitos em relação 
às imagens, independentemente de suas funções ou da categoria na qual esteja ela classificada, era 
imperativa a busca de uma via de acesso à significação. Qual a chave que pode abrir a misteriosa porta 
da arte conhecida como “abstrata”, por exemplo? Seria a História da Arte, com seu acervo 
de características de uma sucessão de estilos, movimentos, acontecimentos, vidas? Ou a Psicologia, por 
meio de interpretações das pinceladas daqueles que são compelidos a se expressar através da arte, dada 
a incapacidade das linguagens convencionais para explicitar seus sonhos? Ou a Sociologia, atenta às 
características do contexto, as quais permitem o surgimento de fenômenos artísticos, cada vez mais 
associados a movimentos sociais?
Ora, foi aí que entrou a Semiótica. E, ao entrar também aqui, me obriga a escrever um pouco 
mais, mesmo sendo o mais breve possível. É apenas UMA PINCELADA DE SEMIÓTICA. E 
nem vai precisar pular o capítulo; além de ser um assunto que é bom estar por dentro, pois parece estar 
“na moda”, garanto não ser chata.
*****
 
Tudo é preparação para o que vem depois, que são as leituras de imagens. Antes ainda de 
começar, falta apresentar o “como fazer”, ou seja, o roteiro, ou os passos da proposta metodológica, 
para que os leitores possam depois fazer as suas próprias leituras de 
imagens. Os professores de arte poderão trabalhar com seus alunos usando mil imagens diferentes. 
Os designers de todas as especialidades poderão desconstruir imagens para melhor estudá-las e melhor 
criar novas imagens. E o leigo, bem, para ele vou contar a lição que deu meu Primo Paulo, advogado:
- Legal te interessares tanto por arte! Afinal, nem á a tua área...
- Como não é a minha área? Eu sou gente!
4
Assim, para todos que “são gente”, escrevi UM MODELO PARA LER IMAGENS. 
Foi durante a escrita deste capítulo que senti a necessidade de incluir alguma coisa sobre a violação de 
normas quando da criação de imagens. Mais precisamente, ao estabelecer analogias entre o texto verbal 
e o texto visual. Daí surgiu ABAIXO AS REGRAS. 
*****
Apresento asduas primeiras leituras, que são de duas obras de arte, usando esse modelo que 
venho propondo. Afinal, foi da arte que eu parti... E outra: o mesmo modelo de análise usado para uma 
imagem da arte serve para a análise de uma imagem ou a imagem de um produto do design. Isto será 
mostrado, exatamente pela analogia das leituras e pela semelhança entre os passos. 
No tocante à arte, uma das imagens analisadas é uma colagem de Matisse, a obra chamada 
“Formas”, em um texto verbal intitulado FORMAS MATISSIANAS; a outra é um Portinari da 
série “Os Retirantes”, que se chama “Enterro na Rede”, no capítulo batizado de UM ENTERRO 
SEM CAIXÃO. 
*****
De imagens artísticas para imagens estéticas, entramos no campo da moda; inicialmente, uma 
espécie de introdução, onde lembro que a moda é um profícuo sistema de comunicação entre os seres; 
por isso essa parte recebeu o título de MODA TAMBÉM É TEXTO. 
Ela vem seguida de uma leitura de uma imagem nessa área, intitulada ARGOLAS 
DOURADAS. Como a moda é, intrinsecamente, mutante, e como também é muito complexa, em 
termos de elementos constitutivos e até de figuras que a compõe, tomei formas, as argolas, e cores, os 
dourados, que são recorrentes ao longo da história, para pensar um pouco sobre esta “linguagem” que 
usa o corpo como suporte através da história e da geografia. Igualmente, as argolas douradas servem 
aqui de um exercício de análise do minimalismo e, neste sentido, pretendo ainda aplacar um pouco os 
preconceitos e mostrar as identidades/identificações entre entidades perceptíveis ao olhar. 
*****
5
Não esquecendo da relação, nem sempre harmoniosa, entre design e artesanato, escrevi 
ENQUANTO O ARTESANATO NÃO SE ATUALIZA, para compartilhar com o leitor 
preocupações sobre esta “linguagem” tão designer, como é a “linguagem” artesanal, a qual é 
complementada com a análise de duas imagens tridimensionais. É mais um dos “textosdesign” 
que apresento, o qual batizei de IMAGENS HAND MADE , que consiste em uma minuciosa 
leitura de duas peças de cerâmica figurativa, oriundas da minha terra, o litoral catarinense. Através 
deles faço também uma homenagem à toda produção visual de Florianópolis e adjacências. 
*****
Então, entramos no âmbito do produto. Devo confessar que tenho uma predileção por vidros de 
perfume (e pelo seu conteúdo também). Vai ficar evidente, pois apresento partes selecionadas de meu 
estudo de pós-doutorado, desenvolvido em Paris, sob a orientação do semioticista italiano, radicado na 
França, Andrea Semprini, tendo como objeto de estudo imagens específicas da marca Givenchy. O 
perfume Hot Couture – seu vidro – foi estudado, vindo a compor com outra leitura de frasco 
desenvolvida ainda no doutorado, qual seja, o vidro do perfume Eden, da Cacharel. Iniciamos com 
FRASCOS TAMBÉM SÃO TEXTOS, que contém considerações de ordem geral, tendo como 
foco a significação das imagens, ainda que em forma de vidro de perfume. 
Seguimos com ESSÊNCIA DO PARAÍSO NUMA GOTA, o capítulo onde é 
apresentada a leitura do perfume Eden, da empresa francesa Cacharel e, logo após, é apresentada a 
leitura de Hot Couture, que recebeu o título de UM PRISMA QUE É MAIS QUE UM 
FRASCO. 
*****
Chegamos então no último bloco de textos, este voltado para a publicidade. O primeiro 
capítulo, introdutório como os que antecederam as leituras da moda,do artesanato e dos frascos, 
recebeu o título de PROPAGANDAS, TEXTOS SINCRÉTICOS. Para comprovar esta 
afirmativa, apresentamos as duas últimas leituras de imagens; uma delas refere-se à marca Mont Blanc 
e recebeu o título de UMA CANETA “TRÈS CHIC”. 
6
O outro exercício de leitura de imagem publicitária consiste no capítulo intitulado UM 
DIÁLOGO ENTRE DESIGNERS. Ele encerra esta coletânea, mostrando as relações 
intertextuais que se estabelecem em um texto híbrido ou miscigenado como o da publicidade do 
perfume Hot Couture, de Givenchy. É o último dos “textosdesign” que ora apresento. 
Enfim, são muitos temas; eles todos têm relações entre si, mas apontam para distintas questões. 
São escritos que foram bem sintetizados, “penteados”, simplificados, para facilitar o acesso do leitor... 
afinal, são duas teses saindo da prateleira... e de uma só vez...
Mas não é preciso que o leitor se assuste com isso: além de sintetizado, simplificado e 
“penteado”, tudo foi devidamente “traduzido”, daquele linguajar pomposo das teses para um português 
que todo mundo entenda! 
E, depois de tudo, THE END é o fim!
 
7
IMAGENS DO DESIGN, IMAGENS DA ARTE?
Existem diferenças entre as imagens produzidas nas diversas áreas do design e as imagens 
consideradas obras de arte? 
Para complicar mais a questão, vamos fazer uma outra pergunta: pode uma imagem 
estética, produzida por um designer, destinada a um determinado fim 
específico, vir a tornar-se uma obra de arte? 
Como se sabe, as imagens podem desempenhar vários papéis. Fica então registrado que o 
parâmetro da funcionalidade pode contribuir para o estudo da imagem, mesmo não sendo absoluto nem 
definitivo, uma vez que não se trata de um referencial destituído de polêmica.
 Assim, este pode ser um bom começo para a discussão: analisar as finalidades que podem ter as 
imagens. Isto significa examinar as funções de cada imagem, verificar como ela funciona, para quê ela 
serve, para poder definir se ela é um produto do design ou uma obra de arte.
Existem diversos estudiosos que são contra pensar em arte como um fenômeno que tenha 
“função”, pois a relação entre a arte e o sujeito deveria ser de “pura gratuidade”. Outros dizem 
que o próprio fato de uma imagem “funcionar esteticamente”, já é, em si, uma utilidade, uma função. 
O que se observa é que as funções de uma imagem podem mudar, através não só do tempo, 
como do espaço. E se mudam as funções, conseqüentemente, também pode mudar a categoria dessa 
imagem. Por exemplo, o que em determinado contexto cultural teve função religiosa e persuasiva pode, 
em outro espaço, deixar de tê-las, mesmo que permaneçam outras funções, como a simbólica e a 
estética. Servem como exemplo as Igrejas que são ou que contém relevantes obras de arte sacra, e que 
hoje estão transformadas, praticamente, em museus, pois são abertas permanentemente à visitação – e 
muitas delas cobram ingressos – já que nelas raramente são oficiados atos litúrgicos; nessas 
circunstâncias, inexistem funções religiosas e persuasivas.
Cartazes de espetáculos, como os que foram criados no início do século por 
Toulouse-Lautrec podem, através do tempo, perder sua função informativa. Prova disso é que nos 
recortes desses cartazes, quando da sua reprodução, não há cuidado com elementos verbais, pois certas 
palavras foram cortadas ao meio, já que só tinham sentido quando os cartazes possuíam a função 
informativa. Mas neles ainda restam as funções simbólica e estética. 
Outros tipos de imagem podem servir de exemplo para a ocorrência de mudança nas funções 
das imagens. É o caso das pranchas de botânica, aquelas dos cartazes escolares ou mesmo 
reproduzidas nos livros de ciências, contendo como ilustração de cada planta, o desenho do fruto 
8
“aberto” e “fechado”, da flor, da folha, da árvore inteira. Muitos exemplares dessa categoria de 
imagens são comercializados em galerias de arte.
Para ampliar ainda mais os exemplos, lembramos das imagens produzidas pelos viajantes 
europeus que aqui no Brasil estiveram, como Rugendas, Debret ou Eckhout. Eles desenharam a 
flora e a fauna, os trajes, os costumes, os tipos físicos aqui encontrados na época, com a principal 
finalidade de mostrar,em terras distantes, como a vida acontecia por aqui. As exposições desses 
trabalhos têm levado muita gente aos museus onde se realizam. Hoje, são considerados arte.
Em um olhar panorâmico em direção ao mundo das imagens, poderemos nelas encontrar 
diversas funções: mágicas, religiosas, políticas, estéticas, epistêmicas, 
informativas, decorativas, persuasivas ou até comerciais. Além da função 
simbólica, que parece ser inerente à sua condição de imagem, uma ou mais funções podem se realizar 
em uma mesma imagem.
Exemplificando, praticamente todos os afrescos com temas religiosos, além de sua função 
simbólica, guardam ainda as funções religiosa, estética e persuasiva. Um videoclipe publicitário, 
juntamente com seu caráter simbólico, tem também função persuasiva e comercial, além de apresentar 
uma proposta estética. 
Assim parece claro que as imagens se prestam para diversas finalidades, que podem ser 
chamadas de funções, e que essas funções podem se alterar, ao longo do tempo.
Fica então registrado que o parâmetro da funcionalidade pode contribuir para o estudo da 
imagem, mesmo não sendo absoluto nem definitivo, uma vez que não se trata de um referencial 
destituído de polêmica.
*****
De posse dessas idéias, podemos apreciar (e, quem sabe, adotar) uma afirmação baseada em Jan 
Mukarovský, um estudioso da estética e da significação das imagens; ela pode funcionar como um 
paradigma quando da necessidade de classificação de imagens e pode ser assim resumida: 
quando a imagem tem entre suas funções a função estética, mas ela é 
secundária, temos uma imagem estética;
quando a imagem tem entre suas funções a função estética, e ela é a mais 
importante, temos uma imagem artística. 
9
A partir deste paradigma podemos responder às questões iniciais. Em primeiro lugar, sim, 
existem diferenças entre imagens da arte e imagens do design, na medida em que existem distinções 
entre as funções dessas imagens.
E quanto à segunda questão, um produto do design, uma imagem ou um produto estético pode 
tornar-se, sim, uma imagem ou produto artístico: no momento, no contexto e na medida em que sua 
função estética tornar-se mais importante do que suas outras funções utilitárias.
É o que acontece com muitos produtos do design que já estão em museus, porque são 
representativos de um estilo, ou de um movimento estético, ou significam uma quebra de paradigmas 
ou registram um determinado momento da história.
Neste sentido (e para concluir), é ainda importante lembrar que toda a imagem artística 
é estética; mas nem toda imagem estética é artística.
10
AFINAL, O QUE É ESTÉTICA?
Estamos, todo o tempo, falando de imagem “estética”; devido a mudanças ocorridas, 
igualmente através do tempo, com a palavra estética, torna-se necessário atualizar o conceito que 
está por trás desta palavra. 
Muitos enganos podem ser cometidos ao se ouvir ou usar a palavra estética. Geralmente, ela é 
considerada sinônimo de beleza, e esta beleza sendo considerada como padrão ideal, com 
base no estilo clássico da antiga Grécia e depois, de Roma, princípios formais mais tarde retomados no 
Renascimento, como o equilíbrio e a harmonia.
Mas estamos no século XXI e os equívocos continuam. Daí merecer uma revisão as definições 
que a palavra estética recebeu através da história. Derivada do grego aisthetikós, de aisthanesthai, que 
quer dizer perceber, sentir, a palavra foi usada primeiramente por Alexander von Baungarten, no século 
XVIII, para designar mais do que ciência do belo: o estudo da sensação ou a teoria da 
sensibilidade. Estética, como disciplina da área da Filosofia, é relativamente recente na história do 
pensamento humano, portanto. Mas os homens pensam acerca da natureza da arte, do porquê e do para 
quê da atividade artística muito antes de Baungarten ter batizado esse conjunto de conhecimentos com 
o nome de Estética.
Daí que estética, no sentido de reflexão sobre imagens produzidas pela humanidade, existiu 
desde os tempos mais remotos, mesmo que o termo não fosse usado para nomeá-la; e mesmo que não 
se tenha autores de textos verbais na pré-história, é certo que se pode extrair questões científicas, 
estéticas, a partir da produção gráfica da arte rupestre.
*****
 Podemos ainda considerar como origem da Estética a Antigüidade grega, mesmo que 
não tivesse este nome, como já foi afirmado. Não que os gregos tenham concebido um sistema estético, 
mas certamente elaboraram determinados princípios que não se pode adjetivar de outra maneira que 
não seja de estéticos, os quais podem ser encontrados em diversos pensadores.
Após o período mitológico, ou seja, o período onde a visão do homem grego se delineava 
através de mitos, deu-se um período intermediário entre aquele e o que foi denominado metafísico; 
trata-se do lapso de tempo e espaço chamado de mitológico-poético, onde os poetas como Hesíodo, 
11
Homero, os líricos ou os precursores do teatro como Ésquilo e Sófocles falam de estética cantando, à 
sua maneira, o que entendiam como sendo a beleza.
Nesse período, surge a beleza como atributo de traços e cores, na natureza e na 
figura feminina; posteriormente, os homens também podiam possuí-la, quase sempre associada à força 
ou à bondade. Mais tarde, a beleza passa a ser também qualidade de objetos, bem como da música e 
do canto, com os poetas líricos. É a partir deles, também, que a beleza física começa a ser 
vinculada à beleza moral. Com os trágicos, a beleza é associada à idéia de morte, dando origem a uma 
estética dramática que, transitando em temas que buscam equilibrar loucura humana e espírito de 
justiça, apresenta-os estruturados nas três unidades, espaço, tempo e ação.
Com Pitágoras, inaugura-se o formalismo: os números, as medidas, as figuras, 
as dimensões postos a serviço da harmonia, norma estética proposta para a 
articulação de elementos, aplicável à música e à geometria.
Em Sócrates, evolui um pouco mais o que anteriormente havia sido apenas entrevisto: a fusão 
das idéias de beleza e de bem, conceito denominado kalocagatia, o que viria a ser 
consolidado, posteriormente, por Platão. Para Sócrates, é belo o que cumpre sua finalidade; trata-se de 
uma estética utilitária, mais preocupada com o conteúdo do que com a forma. 
Platão, na obra Hípias maior, dedicada especificamente ao belo, recapitula as propostas 
anteriores, ou seja, posiciona-se frente a conceitos estéticos preexistentes. Nesta obra Platão define 
teses fundamentais para a história da estética, entre as quais se destaca a proposição de uma noção de 
beleza, um conceito de belo, belo em si, belo ideal e não só o belo como 
atributo de alguma coisa. Importante também é a transformação que faz sofrer o conceito de 
beleza utilitária, tomado de Sócrates, ao vincular o belo ao bem, bem em si, acabado e perfeito, e não 
ao útil, como queria Sócrates; para Platão, a beleza suprema está no verdadeiro e no 
bem. É a definição do conceito de kalocagatia.
Há uma diferenciação entre belo e arte para Platão, pois o belo é incorruptível, está 
no mundo das idéias e confunde-se com o bem, enquanto que a arte é uma tekné, 
existe no mundo do sensível, é matéria. E se o mundo sensível é a cópia do mundo das 
idéias, a arte é menor que beleza: faz coisas belas, mas não é beleza em si. Ainda segundo suas teorias - 
e sob influência pitagórica - o ouvido e a vista transmitem as sensações organizadas através das 
medidas, o metron; assim, a beleza nas artes está subordinada a elementos de 
prazer e de ordem.
12
Se, para Platão, a realidade é uma cópia imperfeita das idéias, para 
Aristóteles,seu discípulo, o importante é a realidade, uma vez que as idéias são abstratas; assim, para 
ele, quanto mais se materializa a coisa, mais real se torna o conhecimento e quanto mais a 
imagem é abstrata, mais genérico é o conhecimento.
Da mesma maneira que seus antecessores, Aristóteles não deixou um sistema estético, mas sim 
opiniões sobre o belo e sobre a criação artística, considerada sempre por ele uma técnica, campo onde 
incluiu a música, a poesia e o teatro, deixando de lado as artes plásticas. O valor da arte, para ele, 
residia no fato de ser uma atividade do homem e não por ter um valor em si mesma, uma vez que seus 
esforços estavam centrados na constituição do ser humano.
Reduzida à condição de técnica, Aristóteles diferenciava, como Platão, a arte do belo, que para 
ele era metafísico. Distingue o bem, que para ele tem uma finalidade, do belo, que não a tem. Separa 
ainda o belo moral (cósmico, prático ou útil) do belo formal e, neste último, destaca a importância da 
matemática, pois para ele o belo está condicionado a leis que tornam a forma bela, à simetria e ao que 
chama de determinação, uma modalidade da ordem. 
Fundamental para o estudo de estética são as formulações de Aristóteles sobre a tragédia e, em 
especial, um conceito que viria a ser recorrente na história, diversas vezes utilizada na Filosofia e mais 
adiante na Psicanálise: a catharsis, a purgação das paixões através do 
sofrimento, da tragédia, esta considerada por Aristóteles como a ilusão do verossímil. 
*****
Na Idade Média, deu-se uma incompatibilidade entre o ideal cristão e a preocupação com a 
beleza, pelo fato de se acreditar que o belo suscitava o que é sensível e sensual no 
homem; esta espécie de temor caracterizava o sentimento de época e foi o que levou S. Tomás a 
declarar: “Pulchritudo corporis est pulchritudo maledicta”. Ainda no primeiro período medieval, 
Santo Agostinho, que filosofava para resolver os problemas da sua própria existência - sendo 
considerado o precursor do existencialismo - deixou reflexões sobre o signo e a beleza, inclusive a do 
corpo.
Mas durante esse período, a maior contribuição foi a de S. Tomás de Aquino. Ele distingue três 
categorias de bem: o bem útil, que não é belo porque não é desinteressado; o bem deleitável, 
que pode levar ao pecado da luxúria, através da lisonja; e o bem honesto, desinteressado e 
espiritual, como o belo da alma, onde o bem e o belo se confundem.
13
No seu sistema filosófico, são diversas as abordagens de beleza, sendo que de Aristóteles toma 
duas das três características a ela atribuídas: a integridade ou perfeição e a justa 
proporção ou harmonia. 
A terceira característica tem em S. Tomás mesmo sua origem e por isso merece destaque: 
claritas, que é claridade, que é luz, luz que é Deus, luz que é cor, pois sem luz não há cor e a cor 
torna as coisas mais belas. É esta estética da luz que se presentifica na catedral gótica, mais 
precisamente, na luz passando através dos seus vitrais.
De qualquer maneira, na Idade Média prepondera o valor utilitário da arte, sendo que este 
sentido permanece na transição para o Renascimento, quando o ofício de construir a beleza é um ato de 
fé e fruí-la é a contemplação do divino. A arte é utilizada pedagogicamente para evangelizar, através da 
imitação da natureza ou de alegorias.
*****
No Renascimento, a arte deixa de ser um meio para ser um fim em si mesma e a retomada dos 
ideais da Antigüidade Clássica, com nova roupagem, substitui o misticismo medieval. O homem, como 
centro do universo, é a idéia fundamental, presente nas teorias e confirmado na produção artística, onde 
a beleza sensual glorifica as manifestações mais altas da arte.
Nesse período histórico, surgem tratados sobre a arquitetura e escultura e mesmo sobre as cores, 
e o conceito de beleza passa (ou volta) a ser confundido com o de arte. A 
partir daí também os estilos artísticos adquirem características próprias em regiões diferenciadas, de 
acordo com as influências e o pensamento do respectivo contexto: na Espanha, permanecem resquícios 
medievais, dado o sentimento nacional de religiosidade, o qual disputa espaço com as influências 
estrangeiras; na França, a partir do século XVIII e por influência do racionalismo, a sensibilidade deve 
subordinar-se à razão e às leis dela emanadas.
Em torno deste período da história, diversificam-se as correntes filosóficas e muitos são os 
estudiosos que se ocupam com questões como as sensações, a sensibilidade, a beleza e a arte, em maior 
ou menor proporção. A partir de Baungarten, a Estética passa a ser considerada uma disciplina 
específica, o que torna mais objetiva a busca teórica, ainda que “dentro” da Filosofia. 
Desde que adquiriu o status de área específica do conhecimento, o termo “estética” foi se 
ampliando cada vez mais, quer para designar as teorias do belo e da arte, quer para compreender as 
teorias mais recentes que já não remetem a beleza à sensação ou a arte ao 
sentimento, como nem mesmo ligam a arte à beleza. 
14
*****
Em pleno século XX, um francês, teórico da significação, chamado Algirdas Julien Greimas, 
resgata o sentido de estética como inicialmente proposto por Baungarten, pautado na noção de 
percepção de sensações, concede-lhe nova roupagem e o aprofunda, na medida em que 
estabelece relações recíprocas entre o sensível e o inteligível. Esta espécie de trânsito entre o cognitivo 
e as sensações é o que possibilita o acesso do sujeito ao mundo, independentemente da cara que este 
mundo tem, “bonita” ou “feia”. Isto porque Greimas se afasta de um conceito de estética vinculado ao 
belo e se aproxima da Estética como estesia - percepção através dos sentidos, do mundo exterior, 
análoga ao conceito de Baungarten. Trata-se da experiência do prazer ou mesmo do 
desprazer, das percepções dos sentidos, da sensualidade e da 
sensibilidade.
Nada mais adequado do que esta ampliação, uma vez que, na produção artística contemporânea, 
verifica-se a presença do jocoso, do irônico, do escatológico, da transgressão, da descontinuidade, da 
pluralidade, das interfaces, da atemporalidade, da arte virtual, do chocante, do forte, 
dessacralização, em relação à arte e ao artista.
Enfim, a arte contemporânea produz o que alguns chamam de antiarte. É necessário, pois, 
ampliar os mecanismos de percepção e recepção, bem como a disposição para a reflexão sobre a 
contemporaneidade. 
15
UMA PINCELADA DE SEMIÓTICA
O que é Semiótica?
Antes de tudo, este é o título de um livro de Lúcia Santaella, que bem melhor responderá a 
esta questão específica, pois nele ela dedica-se apenas a respondê-la, ainda que se declare impotente 
para concluir tal tarefa, remetendo o leitor para outras leituras.
Do mesmo modo, Winfried Nöth, em dois trabalhos, quais sejam eles, “Panorama da 
Semiótica” e “Semiótica no século XX”, responde, de um modo respeitável, à aparente simplicidade da 
questão.
Isto tudo me lembra meu querido sobrinho neurocirurgião, o Dr. Marcelo Linhares que, em 
visita, durante meu “postdoc” “à Paris”, fez a mesma aparentemente singela questão. Ouviu tentativas 
de respostas durante a noite inteira... E na noite seguinte, ao encontrarmos brasileiros na Opera Bastille, 
percebendo que faziam a mesma pergunta, exclamou, balançando a cabeça entre as mãos, temendo 
participar de nova pregação: - Não! Eles fizeram “aquela” pergunta (o que é Semiótica)!
Existem muitas histórias sobre apenas “o que é Semiótica”, sem entrar no que seja Semiótica, 
propriamente dita. Exemplos: ainda do livro da Santaella, anteriormente citado, ela coloca: seriao 
estudo dos símios? Ou uma especialidade em Camões? Meu próprio filho, subsidiado por primo Paulo 
(aquele que é gente), dizia que eu era uma semi-ota, mas que, a partir da defesa do doutorado, passaria 
a ser uma ota inteira. 
Também há o caso da vizinha de poltrona de avião, quando eu estava rumo ao congresso 
internacional realizado no México, em 1997, que perguntou, ao saber que me destinava ao congresso de 
Semiótica, se eu era oftalmologista... E isto é verídico!!! 
Encerrando as brincadeiras, embora algumas verdadeiras, – e com elas procurando tirar lições 
– o fato é que Semiótica é uma palavra e um conceito desconhecidos. Isto porque ela é uma nova, em 
termos de organização em sociedade científica, ao menos – área de conhecimentos (para não contrapor 
aos que não aceitam chamá-la de ciência). 
Mas, com tantos senões (é ou não é ciência? é uma área nova, de fato? 
existem várias Semióticas?), parece haver mesmo necessidade de algumas palavras sobre 
Semiótica, neste livro; por outro lado, como se está pretendendo também atingir um público leigo, além 
de estudantes que não tenham tido Semiótica anteriormente no seu currículo, mais evidente ainda 
parece haver a necessidade de apresentar algumas idéias sobre o assunto; e remeter os leitores mais 
interessados a fontes mais completas, profundas ou específicas.
16
*****
A primeira questão que surge, geralmente, quando se pronuncia a palavra Semiótica, é a 
seguinte: o que existe em comum entre Semiótica e Semiologia, este último, um 
termo mais conhecido dos leigos? De acordo com o francês Roger Odin, poder-se-ia escrever um livro 
para estudar em detalhes a totalidade das definições propostas para cada uma destas duas palavras; no 
entanto, ele apresenta três possibilidades. 
A primeira hipótese seria a de considerá-las sinônimos, sendo apenas diferenciadas pelo fato 
de semiologia ser um termo de origem européia e Semiótica, de origem norte-americana. 
A segunda possibilidade apontada por Odin, para diferenciá-las, consiste em se reservar a 
palavra semiologia para a tradição saussureana (teorias dos seguidores do suíço Ferdinand de 
Saussure), e Semiótica para a tradição peirceana (teorias dos seguidores do norte-americano Charles 
Saunders Peirce), não apenas para diferenciar seus pais fundadores, mas para distinguir seus modelos 
teóricos e corpos de referência: estruturalismo no caso da semiologia e pragmatismo, no da Semiótica. 
A terceira relação entre semiologia e Semiótica apontada por Odin diz que, na França, 
Semiótica é freqüentemente usada para designar as teorias propostas pelo francês A. J. Greimas, as 
quais pretendem dar conta do fenômeno da produção de sentido em geral, diferenciando-a assim da 
semiologia européia, que se ocupa do estudo da estruturação das linguagens, além da sua produção de 
sentidos.
Mas, para os iniciados, esta polêmica entre os termos Semiologia e Semiótica passou a ser um 
episódio histórico a partir de 1969, quando Roman Jakobson propôs - e a Associação 
Internacional de Semiótica aceitou – a adoção do termo comum Semiótica para 
designar todo o campo de estudo abarcado tanto pela semiologia quanto 
pela Semiótica.
*****
E “o que é Semiótica” (volta a tal pergunta)...? 
A palavra Semiótica é derivada do grego semeion, que significa signo. E signo significa tudo 
aquilo ou todo aquele que significa, de um modo simplista. 
17
São inúmeros os estudiosos que vêm tentando definir Semiótica, até porque, como já pode ser 
observado anteriormente, existem várias correntes teóricas dentro da Semiótica, e cada uma delas a 
define de acordo com sua visão específica. Algumas dessas conceituações são complexas; todavia, 
pode-se iniciar por definições sucintas, não podendo evitar simplificações grosseiras e lacunares, 
conforme palavras de Lúcia Santaella. Semiótica é a ciência geral dos signos; também 
pode ser considerada a ciência da significação, ou ciência que estuda todas as 
linguagens; ou ainda, “ciência que tem por objeto de investigação todas as linguagens possíveis, ou 
seja, que tem por objetivo o exame dos modos de constituição de todo e qualquer fenômeno de 
produção de significação e de sentido”, se usarmos palavras da já citada estudiosa Lúcia Santaella.
Pode ser ainda definida como a “ciência geral de todos os sistemas de signos através dos quais 
estabelece-se a comunicação entre os homens”, usando-se palavras de T. Coelho Netto; ou conforme 
Odin, inspirado em Greimas: “teoria geral dos sistemas de comunicação, capaz de possibilitar 
o estudo do conjunto dos processos de produção de sentidos, seja intervindo 
nas linguagens verbais, não verbais ou no mundo natural”.
Semiótica também pode ser considerada como um conjunto de meios que tornam possível o 
conhecimento de uma grandeza manifesta qualquer que se propõe conhecer, “tal qual aparece durante e 
depois de sua descrição”, se considerarmos a definição do Dicionário de Semiótica de A. J. Greimas e 
J. Courtés. Ou a ciência dos signos e dos processos significativos (semiose) 
na natureza e na cultura, conforme Nöth. Porém, o próprio Winfried Nöth pondera, a seguir, 
seu conceito integrador, reconhecendo que esta definição não é aceita por todos os estudiosos da área. 
Enfim, são muitos os modos de conceituar esse campo de estudo que é recente, em termos 
históricos, enquanto conhecimento sistematizado, embora remonte às cavernas seu objeto de estudo, 
qual seja, o fenômeno da significação. E, por outro lado, o próprio estudo das linguagens verbais e não-
verbais remontam a Platão, embora não organizados no contexto de uma área específica de 
investigação.
*****
Na História Antiga, esses estudos situavam-se no âmbito da Filosofia; na Idade Média, nos 
domínios de vertentes da Filosofia – Teologia e Lógica, bem como da Gramática e da Retórica; daí em 
diante, dentro de diversas correntes filosóficas e da Filologia; modernamente, na Lingüística, na Teoria 
Literária, na Antropologia, na Semiologia e nas chamadas ciências da Comunicação e da Informação, 
18
até essas diversas vertentes se encontrarem em um estuário caudaloso e desembocarem em um mar 
comum, denominado Semiótica, já na segunda metade do século XX. Daí o questionamento a respeito 
de ser ou não a Semiótica uma ciência recente.
*****
Outra questão polêmica diz respeito a ser ou não a Semiótica uma ciência. Alguns propõem 
como pressuposto para considerar qualquer conjunto de conhecimentos acumulados e em 
desenvolvimento como ciência, o fato de existir um objeto de estudo definido, um 
método de investigação próprio e uma base teórica comum. 
Ora, o que contemporaneamente se considera Semiótica não atende a nenhum dos três 
pressupostos. Não existe um objeto de estudo para a Semiótica: poder-se-ia dizer as linguagens; mas 
como delimitar linguagens, quando hoje se fala da ecossemiótica, da sociossemiótica, da biossemiótica 
e da semiótica da cultura? Conseqüentemente, essa diversidade de objetos de estudo exige equivalente 
multiplicidade de instrumentos de investigação. O mesmo vai ocorrer, como se pode deduzir, do 
referencial teórico necessário para dar conta desse mundo significante. Ou seja, os fundamentos 
semióticos estarão associados ora a bases teóricas das ciências da vida, ou das ciências sociais, ou da 
Física, da Filosofia, ou de uma ou mais subdivisões de alguma dessas ciências, como a Estética, para 
dar conta da especificidade de cada objeto de estudo. Assim sendo, permanece a polêmica.
Como se já não bastassem essas interrogações (Semiótica ou Semiologia? recente ou remota? 
ciência ou não?), a Semiótica contemporânea apresenta escolas ou linhasteóricas distintas, o que já foi 
evidenciado quando da apresentação de definições, pois cada definição encerra um modo particular de 
descrever o que seria a área de estudo, na dependência da matriz teórica a qual se filia seu autor. 
Existem, portanto, diversas linhas teóricas dentro da Semiótica, mas vamos fazer umas poucas 
considerações apenas sobre três delas, que são as mais conhecidas no Brasil. 
Uma delas é a chamada Semiótica Russa, Semiótica Soviética ou Semiótica da Europa 
Oriental, sendo que depois de vários desenvolvimentos nas teorias e após algumas mudanças geo-
políticas havidas naquela região da Europa, hoje é conhecida como Semiótica da Cultura. 
Dizem os autores, entre eles Bóris Schneidermann, autor do livro Semiótica Russa, que na segunda 
metade do século XIX, na Rússia, embora não existisse ainda essa área de conhecimento estruturada, já 
havia uma consciência semiótica, que perdurou praticamente até Stálin assumir o poder. Essa 
consciência se não nasceu, ao menos seus princípios estavam presentes nos estudos do grupo que ficou 
19
conhecido como Círculo Lingüístico de Moscou. Foi aí que surgiu o chamado formalismo russo, dada a 
preocupação daqueles estudiosos com a forma lingüística. 
O Círculo Lingüístico de Moscou inspirou a criação do Círculo Lingüístico de Praga, anos 
mais tarde, já entre as décadas de 20 e 40. Em ambos, havia a predominância de estudos acerca da 
linguagem verbal, com ênfase na análise sintática, especialmente da poesia. Entretanto, já havia o 
prenúncio da possibilidade de estender os princípios da estruturação da linguagem verbal para o estudo 
de outros códigos estéticos, como a pintura, o teatro, o cinema e a arte popular. A esse respeito, uma 
figura fundamental foi Roman Jakobson, que participou de ambos os grupos, além de ter deixado claro, 
em suas obras, a possibilidade do trânsito entre sistemas distintos, a partir de um modelo comum, até 
então usado nos estudos das línguas naturais. 
Com a chegada de Stálin ao poder supremo, deu-se o fechamento do regime na então URSS, 
sendo que, como acontece nessas situações de cerceamento de liberdades individuais e de grupos, 
ficam sob suspeição todos os modos de comunicar. E, neste caso, não foi diferente: o regime político 
passou a interferir tanto na produção artística como na teórica, principalmente nos estudos lingüísticos. 
Mais tarde, na década de 50, é fundado em Moscou o Instituto de Semiótica da URSS, havendo a 
retomada de estudos anteriores e novos desenvolvimentos. Em 1970, a nova geração de semioticistas 
soviéticos passa a denominar a linha específica adotada por eles de Semiótica da Cultura, pelo fato de 
terem como princípio investigar os sistemas de signos sempre levando em 
conta seu respectivo contexto cultural. Na atualidade, os princípios adotados por esses 
estudiosos ultrapassaram os limites da Europa Oriental e a Semiótica da Cultura está presente em 
diversas regiões do mundo. 
Outra das três linhas ou escolas mais reconhecidas no âmbito da Semiótica é chamada de 
Semiótica Americana ou, simplesmente, Semiótica Peirceana. Isto porque seu fundador foi o 
norte-americano Charles Saunders Peirce (1839-1914), o qual deixou uma vasta produção teórica que 
talvez não tenha sido mesmo, até hoje, completamente explorada. O ponto de partida de Peirce não foi 
a língua natural, como foi o caso das outras linhas teóricas da Semiótica. Peirce, que era filósofo e 
matemático, criou uma teoria dos signos associada à lógica, cuja função seria a de classificar e 
descrever todos os tipos de signos. 
Se para Goethe tudo na vida é ritmo, para Peirce, tudo no mundo é signo: os objetos, as idéias 
e o próprio ser humano são entidades semióticas. Este princípio é chamado por seus seguidores de 
visão semiótica universal do mundo ou visão pansemiótica do mundo, pois ele sequer admitia uma 
classificação entre entidades semióticas e não semióticas.
20
Para dar conta de classificar todos os fenômenos desse mundo inteiro semiótico, ou seja, para 
desenvolver a classificação de todos os signos, Peirce criou apenas três categorias; e teve a necessidade 
também de inventar novas palavras para designar essas categorias. Essas palavras foram traduzidas 
para o português como primeiridade, secundidade, terceiridade, repectivamente, do inglês 
Firstness, Secondness e Thirdness. Estas categorias constituem a base das teorias do 
autor, pois são esses os termos que designam as únicas três possibilidades de se 
enquadrarem todos os fenômenos da natureza e da cultura, incluído o 
pensamento, os conhecimentos, e o próprio ser humano.
 As categorias de Peirce podem ser assim sintetizadas: primeiridade, como sendo a capacidade 
contemplativa do ser humano; o ato de apenas ver os fenômenos; o acaso; o espontâneo; secundidade, 
como a capacidade para distinguir e discriminar as experiências, ou a reação aos fatos concretos; 
terceiridade, a capacidade de generalizar os fatos e organizá-los em categorias; neste nível, dá-se, 
segundo ele, a mediação, o crescimento, a aquisição. Essa tricotomia é um modelo teórico que 
possibilita a aplicação em diversas áreas do conhecimento. Do mesmo modo, outra tricotomia pregada 
por Peirce – as noções de ícone, índice e símbolo – tem servido para aproximar e inter-relacionar a 
Semiótica com as chamadas ciências cognitivas. A grande divulgadora e estudiosa da obra de Peirce no 
Brasil é Lúcia Santaella, que já conta duas dezenas de livros publicados com base em teorias 
peirceanas. 
Como essas brevíssimas noções podem mostrar, a Semiótica peirceana, a exemplo de outras 
escolas semióticas, usa uma terminologia hermética, o que muitas vezes afasta interessados no estudo 
do fenômeno da significação. E sua construção teórica é tão original em relação a estudos sobre 
linguagens e significação com base na Lingüística, o que levou Roger Odin, outro francês, estudiosos 
da significação, a afirmar que a Semiótica de Charles Saunders Peirce quase nada tem a ver com a 
semiologia de Ferdinand de Saussure. 
A última fonte teórica semiótica contemporânea, de acordo com a classificação de Santaella, 
em três origens distintas, nasceu e vem se desenvolvendo com mais consistência na Europa ocidental; é 
conhecida como Semiótica Saussureana (por conta de Ferdinand de Saussure), Semiótica da Europa 
Ocidental (para diferenciá-la da semiótica de origem soviética), Semiótica Francesa (mesmo que vários 
de seus seguidores sejam de outras nacionalidades), Semiótica Visual (pelo fato de o estudo da 
visualidade estar muito bem desenvolvidos pelo grupo da chamada École de Paris) e, mais 
recentemente, para se referir a desenvolvimentos posteriores, usa-se a expressão Semiótica 
21
Greimasiana, para designar os adeptos das teorias propostas pelo francês Algirdas Julien Greimas 
e seu grupo de pesquisadores. 
As linhas teóricas, no âmbito das ciências, desenvolvem-se como dinastias: determinado 
cientista professa princípios específicos, utiliza um método aplicável a outros objetos de estudo ou 
descobre certas propriedades de um elemento; seus assistentes acompanham-no, sucedem-no, fazem 
novas descobertas, associam-se a outra geração de discípulos; estes, por sua vez, continuam os estudos, 
aprofundando-os ou, às vezes, mudando seus rumos. E a ela, associa-se outra geração e assim, 
sucessivamente. Isto fica evidente na vertente francesa da Semiótica. Seu pai fundador, o suíço 
Ferdinand de Saussure (1857-1915), partiu do estudo da linguagem; criou a Lingüística, que tinha 
como objeto não apenas o estudode sinais, mas da matriz do comportamento e pensamento humanos, 
uma vez que considerava a linguagem como a formatação de atos, vontades, sentimentos, emoções e 
projetos, ou seja, um dos principais fundamentos das sociedades humanas.
 Saussure, percebendo a possibilidade de estender várias das proposições adotadas para a 
análise da língua natural para outros sistemas de significação, propôs e termo Semiologia para designar 
o estudo geral de todos os sistemas de signos; contudo, fora o estudo mesmo das línguas naturais, 
apenas alguns estudos foram feitos, ainda assim, muito associados à lingüística ou, como “uma 
disciplina anexa” a ela, conforme disse, mais tarde, Greimas.
Na segunda geração dessa abordagem teórica destaca-se o dinamarquês Louis Hjelmslev 
(1899-1965), que estudou o isomorfismo entre diversos sistemas de signos, vindo a propor critérios 
para considerar outros sistemas, que não os das línguas naturais, como linguagem. É sua a 
denominação que designa plano da expressão e plano do conteúdo ao que Saussure havia chamado, 
respectivamente, de significante e significado, termos esses mais familiares aos leigos. Alguns o 
criticam por apenas mudar a terminologia adotada por Saussure neste e em outros fenômenos da 
significação. Outro nome de destaque é o francês Roland Barthes (1915-1980), que agrega a noção de 
sujeito e o sentido cultural ao processo de significação. Dedica-se aos estudos do mito, da língua, do 
teatro, da fotografia, do cinema, da arquitetura, da pintura, da propaganda, da moda e até da medicina e 
da música. Tanto Hjelmslev quanto Barthes têm diversas obras publicadas em português.
Um personagem de grande relevância nesta geração pós-saussurre é o de Algirdas Julien 
Greimas (1917-1992). Ele cria um grupo de pesquisadores dedicado à sociolingüística, cujos interesses 
estavam voltados tanto para a ciência especulativa quanto para a ciência aplicada, tendo inicialmente 
como objeto de estudo o texto literário. Deixou importantes fundamentos teóricos para seus seguidores 
em ensaios e livros.
22
Greimas foi um dos semioticistas que se manteve mais fiel às idéias estruturalistas de 
Saussure, sendo que o objetivo principal do projeto semiótico de Greimas é o de estudar o 
discurso com base na idéia de que uma estrutura narrativa se manifesta 
em qualquer tipo de texto, sendo que a palavra “texto” extrapola, de acordo com essa linha 
teórica, a condição exclusiva de texto verbal. Para Greimas e seus discípulos, um ritual ou um balé 
podem ser considerados textos ou discursos. 
Em decorrência, ele e seu grupo ocuparam-se – e seus seguidores ainda hoje se ocupam – do 
estudo do espaço, da arquitetura, da pintura, da teologia, da televisão e do cinema, da publicidade e da 
moda, do direito e de outras ciências sociais, sempre considerando cada manifestação, em qualquer 
dessas áreas, como textos. 
Em sua obra A Semiótica no Século XX, Winfried Nöth afirma que apenas um esboço 
grosseiro das idéias de Greimas poderia ser apresentado, em um capítulo. Menor ainda é nossa 
ambição nestas poucas linhas, não só em relação a Greimas, mas a toda a Semiótica. Afinal, é apenas 
uma pincelada de Semiótica, conforme prometido. 
23
UM MODELO PARA LER IMAGENS
Para penetrar na complexidade da imagem, com vistas a uma leitura que contemple o seu 
todo, ou para que se perceba integralmente seu plano de expressão, ou seja, tudo aquilo que é 
perceptível ao olhar, é necessário vasculhar o texto, inicialmente tentando definir a linha ou as 
linhas que determinam a macroestrutura da imagem visual, também chamada de 
estrutura básica. É uma diagonal? É um eixo vertical? Diagonais que se cruzam, horizontais paralelas, 
figuras geométricas, ângulos ou um ponto central? Estas são as primeiras indagações que 
devem suscitar uma imagem. Isto porque a estrutura básica da imagem vai dar sustentação à 
composição visual no seu todo e, portanto, será fundamental no jogo de decodificação dos significados.
Definida a estrutura básica da imagem, parte-se para a observação das minúcias, ou seja, para 
a identificação de seus elementos constitutivos, como linhas, pontos, cores, planos, formas, 
cor, luz, dimensão, volume, textura. Que elementos dão origem ao texto visual? E como se apresentam 
outros elementos, que não podem ser chamados de constitutivos porque não compõem a imagem, mas 
que também geram efeitos de sentido, como o suporte, o recorte e a moldura? Aliás, aqui cabe um 
parênteses: quando falamos em “moldura”, é no sentido amplo, não só aquela madeira ou metal, 
decorado ou pintado, mas tudo o que está em torno, que dialoga com a obra. Onde estão esses 
elementos mínimos constitutivos e significantes? Este é o foco do segundo grupo de 
indagações que cada um deve fazer a si mesmo, diante de uma imagem. 
Entre os elementos constitutivos estabelecem-se relações. Assim sendo, identificados os 
elementos constitutivos, buscam-se as articulações entre esses elementos, momentânea e mentalmente 
desfeitas, quando da investigação do rol de elementos que constituem a imagem. As relações, 
articulações ou regras de combinação entre os elementos constitutivos da imagem são chamadas 
procedimentos relacionais. 
Essas relações podem ser encontradas entre elementos, entre elementos e bloco de elementos, 
entre blocos de elementos entre si; também um mesmo elemento pode estar articulado de modos 
diferentes. Por exemplo, entre várias circunferências que compusessem uma imagem, elas poderiam 
estar relacionadas pela repetição ou rebatimento das formas; por outro lado, as mesmas circunferências 
poderiam estar relacionadas pelo contraste de dimensões e de cores; poderiam, ainda, estar relacionadas 
de modo eqüidistante, gerando ritmo, considerando-se o fundo dessas figuras; e poderiam se relacionar 
24
através do procedimento de repetição através da textura, fosse entre as circunferências ou deste bloco 
de circunferências com o seu fundo.
Para clarear um pouco esta composição intrincada que é a imagem, poderemos fazer 
analogias, que são bastante simplistas, mas têm funcionado. Uma das comparações propõe pensar na 
imagem como um texto verbal, onde os elementos constitutivos seriam as palavras, e os procedimentos 
relacionais corresponderiam à sintaxe, ou seja, ao modo de organizar as palavras entre si. Mas é preciso 
cuidado, pois existem distinções para além do aspecto visual de ambos os textos. Uma delas é que nem 
a escrita nem a leitura da imagem são lineares; a outra é que cada elemento não “concorda” com apenas 
um outro elemento, como já foi mostrado acima; ao contrário, ele geralmente está articulado com 
diversos elementos, como que formando uma teia. E a terceira, bem, é um papo para outro capítulo... 
trata-se da “obediência às regras gramaticais”, que já há muito não funcionam quanto às imagens...
Outra comparação pode ser feita entre a criação ou a leitura de uma imagem e um produto 
culinário, um bolo, por exemplo: os elementos constitutivos da imagem seriam os ingredientes, e os 
procedimentos relacionais, o modo de fazer... 
 Enfim, esta proposta para ler imagens faz um desmonte, em busca dos efeitos de sentido, das 
significações. Desconstruindo e reconstruindo a imagem, as articulações entre os elementos são 
processadas. A leitura passa a ser um processamento das relações, onde a cadeia de significações é 
remontada, com base em determinadas regras de combinação, selecionadas para construir a imagem, 
que são os procedimentos relacionais adotados pelo sujeito criador. Como estão organizados 
os elementosno texto? Eis a pergunta seguinte.
Elementos mínimos constituintes articulados através de regras são as marcas da concepção do 
texto visual que, nele deixadas intuitiva ou conscientemente, revelam o momento vivido e as pretensões 
do seu produtor. Em cada texto visual está registrado um discurso, evidenciando uma visão específica, 
a do seu criador. A imagem mostra a sua visão de mundo, suas relações com o seu contexto, além da 
sua capacidade de manipulação do código ao qual pertence a imagem. Todavia, qualquer que seja o 
contexto e a concepção de mundo do produtor e independentemente do código que se utilizar para a 
manifestação, expressão e conteúdo, correlacionados, estarão sempre no seu 
texto, visíveis e ou audíveis. 
Assim, o que o leitor ou o enunciatário da imagem tem diante de si é o texto estético, que é o 
próprio universo de sua leitura. Isso caracteriza a autonomia da imagem: os procedimentos relacionais 
estão ali registrados, e são essas relações que a definem como tal, pois tão logo o criador termine o seu 
25
trabalho, ele não mais lhe pertence. A imagem passa a falar por si mesma, 
independentemente do que seu autor teria querido dizer.
O leitor fica, então, dispensado de pesquisar a história e o contexto do autor da imagem, pois 
os dados indicativos desses e de outros conteúdos estão na própria imagem. Por isso o leitor de um 
texto visual deve transitar incansavelmente de um ou mais elementos mínimos para outros elementos, 
de um tipo ou de vários procedimentos para outro ou outros, de elementos para procedimentos e vice-
versa, deles para o todo da imagem. Em seguida, retorna do todo ao que pode parecer 
detalhe, ou seja, ao que algumas vezes não fica visível diante de um 
primeiro ou segundo olhar.
Munido de seus sentidos e de sua capacidade cognitiva, segue o leitor na direção do 
desvelamento de novos conhecimentos, através de renovadas significações que encontra, transitando 
das partes para o todo e do conjunto do texto estético para seus componentes. São as inúmeras trilhas 
que se entrecruzam no visível da imagem (plano de expressão) ao mesmo tempo em que tecem a 
significação (plano do conteúdo); daí a necessidade de observar minuciosamente toda a imagem, 
resgatando pontos relevantes para, a partir deles, recriar, traduzindo uma teia de elementos e 
procedimentos significantes que, como tal, é construída por meio de linhas paralelas, concêntricas, 
todas relacionadas.
Tudo isto é necessário para que se chegue aos incontáveis 
sentidos de um texto, ao que quer dizer a imagem, ao plano do conteúdo. 
Os elementos constitutivos do texto estético não devem ser considerados como um vocabulário auto-
suficiente apenas, pois estes elementos não adquirem sentido no isolamento, mas sempre e somente na 
relação. A descoberta dessas relações vai conduzir o leitor aos efeitos de sentido, ou ao plano do 
conteúdo.
O acesso às imagens estéticas não é, de modo algum, um processo simples; talvez seja tão 
complexo quanto o universo mesmo dos produtos visuais. O que se propõe é um referencial 
mínimo para a leitura da imagem; parâmetros passíveis de utilização na leitura de diversas 
imagens; uma abordagem que oriente para um modo de ver diferente do habitual; uma estrutura básica 
a ser guarnecida com outros conhecimentos, tanto os já trazidos na bagagem do leitor, quanto aqueles 
que ele se sentirá instigado a buscar a partir da provocação proposta pelo texto estético diante de si.
26
ABAIXO AS REGRAS
Há pouco, ao falar das diferenças entre o texto verbal e o texto visual, lembramos das regras ou 
normas da gramática, aquelas que permitiram ao nosso professor de português nos tirar pontos, ou nos 
rodar, ou riscar nosso trabalho, ou passar por cima com tinta vermelha sobre nossos erros, ou escrever 
aquele esperado “C” com perna bem comprida, nas questões de prova. Todo mundo 
sabe o quê é uma destas coisas, ao menos, dependendo da idade que hoje temos. E agora, que não 
temos mais professor, continuamos errando, sem ter quem nos corrija...
Por que cometemos erros? Porque existem regras para cumprir. Ou, no caso da 
linguagem verbal, porque existe a gramática, um conjunto de leis ou regras, que regulam o uso das 
palavras em um determinado idioma. Assim sendo, na linguagem verbal há o certo e o errado (o que 
está de acordo com as regras da gramática ou não); o professor ensina e depois corrige o que fizemos 
diferente do que foi ensinado por ele e pelo livro que, por analogia, também é chamado de 
GRAMÁTICA.
Antigamente, existiam os chamados cânones em arte, que eram equivalentes às regras 
gramaticais: os olhos deveriam estar no limite entre 1/3 e 2/3 da cabeça, de cima para baixo; o corpo 
deveria medir sete vezes a dimensão da cabeça e assim, sucessivamente. Aí acreditavam os gregos, os 
romanos e mais tarde, os artistas do Renascimento, estava garantida a beleza. Mas muitos 
experimentaram usar os tais cânones e não conseguiram bons resultados...
O que se percebe é que, no âmbito do sistema visual, não existem regras específicas, já há muito 
tempo. Ao contrário, quanto mais original é a imagem, quanto mais ela conseguiu um modo de se 
sustentar (ao mesmo tempo, cumprindo suas funções e quebrando as normas estéticas vigentes). Por 
exemplo, na publicidade, o primeiro a ultrapassar os limites da moldura do outdoor incorreu em uma 
violação de uma norma estabelecida. O precursor de anúncios com cheiro, em revistas, também. 
Existe o habitual, o estabelecido, o quê é tacitamente aceito e reconhecido enquanto tal, seja 
uma embalagem, um cartaz, uma capa de CD. Isto é a norma, ou a regra, ou o paradigma estético. Criar 
algo além disto significa quebrar, violar, romper ou desobedecer as normas, regras ou paradigmas. 
Percebam: todos estes verbos, violar, desobedecer, por exemplo, nos levam à noção de infringir leis, 
nos levam à idéia de marginalidade. Porém, nas “linguagens” visuais, bidimensionais ou 
tridimensionais, quanto mais violada a norma vigente, tanto mais original, 
criativo e... eloqüente é a imagem; porque ela se diferencia das demais da sua classe; ela se 
destaca... 
27
Por este motivo, devemos ter cuidado ao fazer a transposição ou as analogias entre texto verbal 
e texto visual. Além das diferenças já conhecidas, certas palavras próprias do fenômeno de 
comunicação verbal, ao serem utilizadas no âmbito do visual, deveriam merecer uma referência 
qualquer para distingui-la, seja um grifo, um rodapé explicativo, umas aspas. Porque não existe 
uma gramática do visual; não existindo gramática, inexiste uma sintaxe; não existindo 
gramática nem sintaxe, inexiste uma linguagem visual... apenas, uma “linguagem” visual, com 
linguagem entre aspas, quer dizer, uma espécie de “linguagem” que não é exatamente o que se pensa 
quando se diz linguagem. Deu para entender?
Ora, o uso já consagrou a expressão “linguagem” visual. No entanto, esta “falta de cerimônia” 
ao nos apropriarmos de uma terminologia importada de outro sistema, dada a nossa própria 
incapacidade de gerar palavras mais adequadas para designar nosso trabalho, merece, no mínimo, um 
reparo, uma demonstração pública de que sabemos que se trata de uma apropriação. Se é indevida ou 
não, isto é outro papo... 
*****
 
Ao voltar para a questão das regras estéticas, vigentes e/ou consagradas, encontramos em um 
escrito do pensador alemão Walter Benjamin, uma referência ao contexto sócio-cultural europeu da 
primeira metade do século, na qual ele dizia que o povo fruía, sem criticar, aquilo que 
era convencional; o que era verdadeiramentenovo era criticado com 
repugnância. Segundo Benjamin, a massa populacional necessitava da ligação entre a obra fruída 
e a experiência vivida e apresentava, como exemplo, o fato de o público de sua época reagir 
positivamente diante de um Chaplin e negativamente diante de um Picasso, ambos seus 
contemporâneos. O que haveria de diferente entre o cinema de Chaplin e a pintura de Picasso, a ponto 
de fazer com que o público reagisse de maneira oposta? O cinema é um código de massa e a pintura 
não o é? O código audiovisual pode ser usado como uma mídia para a massa populacional, mas o 
visual também pode ser assim entendido: a título de exemplo, todo o acervo da humanidade na forma 
de arte sacra teve e ainda tem a massa como fruidora. Em períodos históricos onde a maioria da 
população não tinha a compreensão do texto escrito, era o código visual que cumpria o papel de 
disseminador dos conteúdos bíblicos. 
O problema estaria na temática? Seriam os temas chaplinianos mais próximos do cotidiano 
vivido pelo homem de então do que os temas de Picasso, como propõe Benjamim? O tema da guerra, 
28
expresso em Guernica, um dos trabalhos mais divulgados da obra de Picasso, poderia ser considerado 
como distanciado da experiência vivida pelo homem da primeira metade do século na Europa? E a sua 
pomba da paz, identicamente conhecida?
Não! Os temas de ambos estavam muito presentes na vida cotidiana; mas a resposta do público 
com relação à obra de Picasso pode estar ligada à impossibilidade de compreendê-la, decorrente da 
falta de conhecimentos de paradigmas estéticos para a leitura; assim, o público reagia 
reacionariamente, afastando-se, na verdade, daquilo que não entendia. 
Eis aí uma situação que coincide com o que se vê e se ouve em relação à produção cultural na 
realidade brasileira contemporânea. Como exemplo, pode ser citada a reação de boa parte do público, 
quando da realização de cada Bienal de São Paulo. Predomina a perplexidade diante da 
vanguarda artística; e a imprensa muitas vezes reforça a visão do senso comum, destacando 
como excentricidade o que na verdade se caracteriza como violação da norma estética. 
Mas as questões envolvendo compreensão ou da rejeição de produtos estéticos estão 
relacionados diretamente ao problema dos paradigmas ou regras estéticas. Vejamos: provavelmente, a 
massa fruidora reagia positivamente diante de Chaplin, não por estar mais próximo da sua experiência 
de vida, mas pelo fato de conseguir fazer uma “determinada” leitura de sua obra, adequada ou não ao 
potencial de significados que Chaplin oferece. Ou seja, a massa “lia” Chaplin com referenciais do 
cinema “literário”, prendendo-se apenas ao enredo, aos paradigmas ou regras do cinema voltado para o 
divertimento, à historinha com happy end, vivenciada no contexto do descompromisso característico da 
busca de lazer. As pessoas não percebiam a quebra da norma estética por trás da poética de Chaplin. 
Claro: se ele iludiu censores, porque não iria entorpecer as massas?
Em relação a Picasso, pelo fato de ele propor novos paradigmas estéticos, explicitamente, ou 
seja, novas formas de apresentar seus temas, ou nova forma de uso do código, quebrando a norma 
estética então vigente para a leitura do código pictórico, havia a rejeição. As pessoas não estavam 
instrumentalizadas para o tipo de leitura que sua obra exigia; nem tinham um outro referencial anterior 
para adotar. 
Por outro lado, o que ocorria, com o cinema de Chaplin, é que dele não era feita uma leitura 
estética; ele era visto, principalmente, como entretenimento. E última análise, ambos, Chaplin e Picasso 
quebraram os paradigmas estéticos de seu tempo, respectivamente, no cinema e nas artes plásticas. 
Porém, Picasso violou a normas estabelecidas e o público o rejeitou, pois não possuía um referencial 
alternativo para compreendê-lo. No caso de Chaplin, ele foi interpretado com referenciais de 
paradigmas ou regras vigentes, diferentes daqueles que ele propunha, mas ainda assim pode ser 
29
compreendido. A leitura da obra de Chaplin, com a devida percepção das 
violações das regras estabelecidas, só foi feita anos mais tarde. 
Se ainda hoje, quando se comemoraram cem anos de cinema, à massa faltam referenciais para 
fruir esteticamente uma obra cinematográfica, prendendo-se muitas vezes apenas ao enredo, mais 
difícil ainda seria haver uma apreciação estética diante de uma nova poética cinematográfica que 
surgia. Como o cinema inicialmente retratava o cotidiano do mundo natural, fazia-se dele a mesma 
leitura que se fazia dos fatos do dia-a-dia; este era o referencial anterior para a leitura de Chaplin.
Analisemos ainda um pouco mais a questão da quebra de paradigmas ou da violação da regra ou 
da norma estética, agora tomando como referência, ainda no cinema, o ritmo (porque o ritmo está 
presente não só na música: há ritmo na dança, no teatro, na poesia, na 
pintura, no cinema, na televisão, e mesmo nas fachadas dos prédios e 
casas). O ritmo acelerado é característico da época atual, onde não se pode perder tempo; e o ritmo é 
um elemento estético que só acontece no tempo. Nosso padrão estético de ritmo, portanto, é o do 
videoclipe. Assim, quem se dispuser a romper com esta norma estabelecida, tem que arcar com o ônus 
de nadar contra a corrente, para tentar impor uma nova estética, uma nova regra. 
No caso do cinema – e de outras “linguagens” que também têm pressa – criar imagens com 
ritmos mais lentos desafia o tempo do cinema moderno, com filmes amplos, detalhistas, um verdadeiro 
antídoto à estética do videoclipe. 
A estética do videoclipe é a estética do ritmo acelerado, tudo paralelamente e ao mesmo tempo, 
em termos tanto de som como em termos de tempo de exposição de imagem, dificultando a 
possibilidade de reflexão sobre o que lhe está sendo apresentado, já que se trata de um código 
audiovisual, que propõe simultânea e sucessivamente uma série de significados: é híbrido e acontece 
no tempo. Essa diversidade exigiria um tempo maior, ou um ritmo mais lento, para a leitura da 
complexidade das articulações de sentido. No entanto, predomina nos meios audiovisuais, o ritmo 
acelerado da estética do videoclipe. 
Tal ritmo faz com que as pessoas se habituem a ele e, em conseqüência, a não conseguir e a não 
gostar de refletir. Esse ritmo rápido passa a ser a norma estética, porque os espectadores vêm sendo 
condicionados pela televisão e pela própria vida a recebê-lo desta forma. Um criador de imagens que 
restitui ao filme um tempo hoje considerado lento, quebra com a norma estética vigente, vindo a ser 
enquadrado em um movimento denominado neo-realista, o que por si só já diz muito.
****
30
Para encerrar este papo sobre quebra de paradigmas estéticos, ou violação das regras visuais 
vigentes, façamos am paralelo com o que nos mostra Thomas S. Kuhn, no seu livro “A Estrutura das 
Revoluções Científicas”. Como o título diz, ele se refere à história da ciência, mas sua premissa serve 
para todos os campos da atividade humana onde há criação. Isto porque o novo assusta, o 
novo ameaça, o novo, no mínimo, causa estranhamento.
Neste estudo, Kuhn comprova, com exemplos de fatos envolvendo as descobertas e as histórias 
de vida de diversos cientistas, como Arquimedes, Newton e Galileu, que quando uma nova descoberta 
contraria o paradigma aceito pelo que chama de “ciência normal”, há um mal estar na comunidade 
científica. De uma maneira mais ou menos enfática, a nova descoberta e seu autor não são prontamente 
aceitos, até porque novos paradigmas sempre colocam em questão aqueles anteriormente vigentes.Para Kuhn, a “ciência normal” é aquela que se ocupa com os “quebra-cabeças”, ou seja, com 
variações em torno de um mesmo - e antigo – paradigma. Diante de um novo paradigma, toda a 
comunidade científica se retrai diante da ameaça que significa o novo paradigma, gerando uma crise 
que enfraquece as regras dos quebra-cabeças em vigor, de tal modo que acaba permitindo a emergência 
de um novo paradigma.
Assim, gradativamente, o novo paradigma, as novas normas vão se estabelecendo, e a 
comunidade científica começa a produzir “quebra-cabeças” sobre a nova descoberta... até o surgimento 
de uma nova quebra de paradigmas... 
É possível estabelecer uma analogia entre um novo paradigma científico e uma nova norma 
estética, na arte ou no design: trata-se sempre de questionar o que está posto, o 
habitual, buscando novos princípios, uma nova ordem. É natural, 
portanto, que violação de uma ordem estabelecida cause estranhamento, 
no mínimo. Mas se sabe também que é questão de tempo a aceitação. Ainda mais no campo da 
visualidade, onde há a cumplicidade do olhar, pois a visão tem uma enorme capacidade de adaptação...
 
31
FORMAS MATISSIANAS
Ao se observar as reações das pessoas diante das imagens em geral, percebe-se que é 
dominante, no senso comum, a idéia de que a arte abstrata é de difícil legibilidade. 
Complementando essa noção, entendem que tanto mais se compreende uma imagem quanto mais 
reprodutora do mundo natural ela é. Assim, o critério para a escolha deste Matisse, entre tantas outras 
imagens, deu-se em virtude do seu distanciamento de uma imagem natural análoga, ou de sua 
proximidade do que é genericamente considerado “abstração”. Para torná-la ainda mais distante de 
referentes anteriores, omite-se, inicial e propositadamente, seu título verbal. Tudo isto para tentar 
mostrar que tal texto não é exclusivamente simbólico, a saber, não é composto por elementos cuja 
significação é convencionada e aleatória. Também não se trata de seu oposto, ou seja, não é uma 
imitação “perfeita” de algo que se pretendeu re-presentar. 
Na sua breve leitura que se segue, pode ser percebido que não se trata do relato descritivo de 
uma história ou de uma cena “literária”, acerca de referentes do mundo “real”, como pessoas, seus atos 
ou sentimentos, nem sobre a flora, fauna ou coisas construídas pelo homem. Antes, trata-se do relato de 
percepções dos elementos constitutivos e de sua estruturação, através de procedimentos relacionais, no 
texto imagético. E das idas e vindas do olhar sobre uma imagem que, mesmo aparentemente abstrata, 
permite emergir efeitos de sentido.
O que se vê? Um suporte, um plano, em forma de retângulo, cuja maior dimensão é a 
horizontal. Sobre o retângulo do suporte, dois outros retângulos cujos maiores lados são os verticais, de 
dimensões equivalentes entre si e guardando, também entre si, um pequeno distanciamento.
Sobre o retângulo da esquerda, mais um retângulo, igual quanto a altura em relação ao qual ele 
se sobrepõe e um pouco menor na largura. Tomando quase toda a área deste retângulo sobreposto há 
uma forma recortada que, sendo vazada, permite a visualização de área igual no retângulo de fundo. 
Contrastando com as retas descritas até aqui, esta forma é composta quase que apenas por 
curvas; a exceção é a base. Sobre o retângulo da direita, há uma forma semelhante, também com 
contornos curvilíneos e base reta. Comparando-se as formas, a altura de ambas é igual, bem como, 
aproximadamente a área de ambas, que ocupam praticamente a mesma área no plano ou nos 
respectivos retângulos que lhes servem de fundo, tomando-os quase totalmente. A diferença é 
que a da esquerda, vazada, deixa o olhar atravessá-la, podendo perceber a 
área do retângulo do fundo; a forma da direita, por estar sobreposta ao seu respectivo plano, 
32
encobre-o com sua área. As duas formas rebatem-se: competem entre si, ao 
mesmo tempo em que dialogam.
Quanto aos contornos, são semelhantes, mas não iguais. A curva intermediária e a curva inferior 
do contorno esquerdo da figura da esquerda são mais pronunciadas do que as curvas do contorno 
equivalente da figura da direita; quanto ao contorno esquerdo, há duas curvas a mais na figura da 
direita.
Quanto às cores, além do suporte branco, são usados dois tons de azul, um muito claro e o outro 
muito forte. A figura da esquerda, recortada em um retângulo azul escuro, sobreposto a outro retângulo 
azul claro, assume a cor do seu plano de fundo; a figura da direita em azul forte, colada sobre o seu 
respectivo retângulo, retira dele a área que ela delimita. As duas formas provocam, no olhar, 
procedimentos comparativos quanto às linhas, aos planos, às cores, às dimensões, aos movimentos; 
trata-se da busca de identificação de igualdades e de diferenças.
Agora, pode-se acrescentar o título verbal da obra: Formas. Sabê-lo agora altera, de alguma 
maneira, a leitura? Mas o que esta obra indica, o que ela mostra? Este texto imagético estuda 
basicamente o contraste: contraste de curvas e retas, contraste de ritmo, de movimento; contraste de 
planos, contraste de cores; jogo de equilíbrio através do contraste das cores e da posição das formas; 
presença/ausência; positivo/negativo: dualidade.
Como pode ser observado, não há uma total arbitrariedade neste texto imagético; os azuis são 
mesmo azuis; um azul, infinito, finito em outro azul, em outro plano ou em outra forma. As formas não 
são outra coisa senão formas, formas azuis; semelhantes, mas não iguais. Elas estão ali e podem ser 
lidas por pessoas que falem qualquer língua, porque o significado está no como elas são construídas, 
portanto, na obra.
Os que procuram penetrar na imagem visual pelo seu enunciado global poderão ver, graças à 
percepção gestáltica, dois torsos, aliás dois torsos femininos, já que as curvas das cinturas e dos 
quadrís são bastante acentuadas. Justamente nesse jogo de contrastes do torso é que essa imagem nos 
diz algo. As formas dos nus agem como actantes, ou seja, de personagens que participam do processo, 
ainda que sem intencionalidade. E nessa espécie de agir mostram, pelo contraste, a dualidade, e pelas 
semelhanças, a possibilidade de comparação. Comparando-se, observa-se a dualidade das coisas, a 
dualidade do ser humano; a dualidade, talvez, da mulher. 
O título da obra é Formas (ou Formes, em francês, no original) e o vocábulo alemão gestalt 
quer dizer forma. São as diferenças entre as formas, formas das coisas, formas de vida, humanas ou 
não. São os contrastes, as diferenças. E a harmonia, o movimento, o equilíbrio conseguem estar 
igualmente presentes em ambas as formas, que são diferentes entre si. 
33
De uma maneira geral, qualquer texto é, em princípio, um gerador de efeitos de sentidos 
diversos. Mas no caso da imagem estética, dada a natureza dos códigos utilizados, a dimensão 
expressiva cada vez mais deixa de ser representação para tornar-se presentificação. É sutil a diferença: 
enquanto representar é estar no lugar de outra coisa, presentificar quer dizer ter semelhanças com outra 
imagem ou coisa, mas sendo uma nova imagem ou coisa, original e autônoma. Um exemplo é 
uma foto 3x4; ela não nos representa; ela nos presentifica: muda a dimensão, a textura, a profundidade, 
a cor... 
Assim, o significado não está fora do texto, em uma imagem anterior; o conteúdo de uma 
imagem estética está na nova imagem e não em uma exterior e anterior, que estaria sendo, 
supostamente, na nova imagem re-(a)presentada. Em síntese, a expressão já é conteúdo, em si. 
No estudoda significação na imagem, a adoção da segmentação do texto em elementos, 
procedimentos, planos, se dá, metodologicamente, para efeitos de análise. O desconstruir e o 
reconstruir a imagem, sempre consideradas as inter-relações desses elementos e planos, o recriar o 
texto, reconstituindo-o a partir dos dados oferecidos pelo plano da expressão e seu relacionar com o 
plano do conteúdo, são estratégias às quais se recorre na busca de meios para uma reeducação da 
cognição mediada pelos sentidos, através da diversificação dos modos de ver - e, por que não, também 
dos modos de ouvir - na tentativa de propiciar uma compreensão mais abrangente da imagem.
Consiste em uma espécie de tradução das operações científicas de análise-síntese, ainda que 
com princípios e dinâmica diferenciados, em função do objeto de estudo. Cada imagem impõe ao 
estudioso o modo de ser conhecida, ou seja, ela ilumina a escolha dos procedimentos metodológicos e 
não vice-versa. Desse “semiotizar” o objeto de estudo é que se determina o modo de decompor o todo 
em elementos, para melhor conhecê-los e apreendê-los em suas articulações; paralelamente encontram-
se as relações dos elementos do todo, o que consiste em reconstituir, a cada momento, uma visão do 
todo que agregue a complexidade das partes.
Trata-se de um processo de análise que busca a significação, que deve estar disponível tanto aos 
profissionais de diversas áreas quanto aos leigos, e que pode ser usado tanto para a compreensão de um 
cartaz, como de uma cena teatral ou o traçado urbanístico de uma cidade.
34
UM ENTERRO SEM CAIXÃO 
Enterro na Rede é um dos quadros da série Os Retirantes, pintado em 1944 pelo brasileiro 
Cândido Portinari, série que hoje pertence ao acervo do Museu de Arte Moderna de São Paulo.
O que se vê? Observe-se, primeiramente, os elementos constitutivos. Depois, a combinação 
entre elementos e procedimentos relacionais. Para que se possa mostrar visualmente o jogo entre os 
elementos constitutivos, utilizamos um esquema visual que apresenta as figuras que nele se estruturam. 
Nesse esquema são destacados um a um os planos de profundidade propostos, diferenciação que é feita 
através do uso de linhas e cores específicas para contornar e destacar a estrutura de cada um deles. 
No primeiro plano de profundidade, mais próximo do olhar, a planta dos pés da mulher central 
ajoelhada, de costas, evidencia-se pela proximidade do espectador, pela centralização e pelo ângulo de 
visão proposto; o olhar percebe a totalidade da planta dos pés porque está na mesma altura que ela. As 
pernas em escorço estão atrás da planta dos pés, escondidas, o que atrai a direção do olhar para os pés, 
dado o destaque que apresentam, efeito que é reforçado por suas dimensões avantajadas. 
A posição dos pés indica a forma que está destacada em toda a 
imagem: o ângulo, elemento que vai se repetir sucessivas vezes, algumas delas formando 
triângulos, como no caso dos pés da mulher central. Os contornos das partes internas e externas dos pés 
não são paralelos e por estarem eles postos, qual mãos postas em oração, compõem a diagonalidade da 
obra e formam dois ângulos que se sobrepõem e remetem o olhar ao centro da tela onde se situa, oculto 
atrás desta mulher, a personagem principal da cena, o morto. Também no centro da tela, o ângulo 
formado pelos pés da mulher central, é rebatido por um grande ângulo - na verdade, um triângulo - que 
se origina do lençol ou rede, situado no terceiro plano de profundidade. 
O corpo da mulher central está no segundo plano de profundidade do quadro. Sua saia 
apresenta dobras que formam ângulos, os quais aparecem também no contorno desta peça do seu traje. 
O mesmo ocorre na blusa: ângulos estão presentes, nas dobras e no contorno. Seus braços abertos 
formam outro grande ângulo, que é paralelo e que se sobrepõe ao ângulo formado pela rede. Nos dedos 
das mãos desta mulher visualizam-se pequenos ângulos, agudos entre os dedos e retos nos terminais. A 
cabeleira desta mulher, também no segundo plano de profundidade, ainda que concebida por 
pinceladas sinuosas, pode ser vista, considerando-se seu contorno, como uma forma triangular. Outros 
ângulos são percebidos nas linhas ambíguas - estampa ou dobra? - das mangas da sua blusa. O 
ângulo formado pelos braços desta mulher remete o olhar para seu 
35
vértice, no tronco do corpo dela mesma, o qual oculta o centro da rede, 
lugar onde está o morto. 
No terceiro plano de profundidade, localizam-se a rede e seus carregadores, duas figuras 
masculinas. O pano da rede apresenta, acima da cabeça da mulher, um suposto quadrado em tom mais 
claro, que tendo uma parte encoberta, deixa aparente, no seu contorno, um ângulo que é rebatido nas 
diversas formas angulares do fundo, na parte superior da tela. A rede forma um triângulo isósceles cujo 
maior lado é o superior, horizontal e quase paralelo ao pau no qual está amarrada, bem como à linha 
que delimita o chão. Uma ponta do pano, à esquerda, sai do vértice em direção ao centro inferior da 
rede; as linhas das dobras do ângulo da direita tomam a mesma direção, indicando o local onde está 
depositado o defunto. 
Também no terceiro plano de profundidade, encontram-se dois carregadores; estando em 
marcha, as aberturas das pernas de cada um dão origem a dois ângulos dispostos em sentido inverso ao 
ângulo inferior oculto da rede por eles ladeado. Há uma complementaridade entre os três, pois o ângulo 
central como que se encaixa, à distância, nas formas dos ângulos que se estruturam nas pernas dos 
carregadores.
Mais dois nítidos ângulos aparecem nos contornos do braço direito do carregador da direita, 
bem menos sutis do que os que estão nas suas mãos e nos que surgem do contraste entre luz e sombra 
nas dobras de sua vestimenta. Neste homem ainda podem ser observados ângulos nos pés, no joelho 
direito e entre a coxa e a perna esquerda. A deformação da sua cabeça é construída através de linhas 
angulosas, onde se destaca o nariz.
O homem da esquerda é delineado também através de linhas angulosas: nos pés, nas dobras da 
calça e da blusa, no encontro entre braço e cintura, nas mãos e na cabeça. Um músculo anguloso 
salienta-se no seu braço direito.
Em contraste com as retas predominantes na tela, encontram-se algumas linhas sinuosas. Elas 
estão no braço direito do homem da esquerda, sobre seu ombro e na amarração da rede. Se o olhar 
percorrer a tela, partindo deste ponto, vai encontrar linhas curvas nos terminais dos músculos expostos 
deste homem, em algumas dobras da saia da mulher central e nos seus dedos dos pés, nos terminais dos 
músculos das pernas do homem da direita, semelhantes aos do homem da esquerda, e nos contornos da 
mulher da direita, no quarto plano de profundidade. No entanto, se se desenhar este percurso, vai-se 
observar que se trata de um trajeto anguloso. 
Ao chegar ao quarto plano de profundidade, vai-se deparar com a mulher da direita, já 
mencionada por suas linhas curvas, como encontradas nas paralelas das dobras da saia, embora seja 
quebrada a linha que demarca o contorno desta saia. Ela possui linhas curvas também no contorno do 
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braço visível, o direito, e na cabeça. Mas sua imagem também apresenta linhas retas e ângulos, que são 
vistos, formando triângulos, a partir do delineamento do seu braço: um formado pelas linhas interiores 
do braço, pescoço e queixo e o outro, que em posição inversa e dimensão semelhante, repete-se na 
manga. Nas mãos desta mulher, aparecem ângulos nos contornos, mais explícitos do que os que 
expressam seus ossos e músculos.
O fundo do quadro é considerado o quinto plano de profundidade. Naparte inferior da tela, 
uma linha horizontal descendente demarca o chão, sobre o qual aparecem pedras e sombras angulosas. 
Quanto à parte superior do fundo, ela é composta por planos de profundidades sobrepostos, delineados, 
preponderantemente, por linhas retas. Em alguns desses planos de profundidade, repetem-se pinceladas 
em forma de sucessivos pontos, gerando uma textura grosseira, a qual é rebatida na saia da mulher 
central.
Destaca-se, no todo da obra, os fortes contornos em preto, preto das trevas e do sentido 
negativo que, por outro lado, põe em evidência e delineia os elementos e formas que compõem o 
quadro. Este preto, especialmente nos músculos expostos e nas dobras das 
roupas, funciona também para dar profundidade, pois é sombra, e para 
compor a textura. Os contornos pretos estão ausentes no fundo, o que evita que figura e fundo se 
misturem. 
A maior parte da tela é monocromática, apresentando diversos tons de cinza que tendem ora a 
azuis diversos, ora aos verdes claros. O cinzento predominante dá a idéia de cinza, o que resta depois 
de um incêndio, ou de cadáver, o que restou depois da vida. 
Na parte inferior da tela, aparece a terra nua, um barro alaranjado, cuja cor contrasta com o 
resto do quadro, realça múltiplos sentidos - da aridez da terra seca e das “vidas secas” ao sangue da dor 
e do sofrimento, passando pelo alaranjado da chama do fogo. O laranja é também uma cor quente, 
ponto de equilíbrio entre o amarelo e o vermelho. Assim sendo, a terra laranja é presentificação de 
equilíbrio, equilíbrio às vezes inatingível. Esta cor, em contraste com os cinzas diversificados, assenta 
a parte cinza das cinzas sobre o laranja das chamas; evita a monotonia no quadro e dá peso à 
composição plástica.
A luminosidade vem do alto e da esquerda, determinando o clareamento das partes das vestes 
que a ela se expõem, bem como um ponto de luz na cabeça da mulher central. O local de origem da luz 
condiciona as partes sombreadas. Azuis claros e límpidos salpicam o traje da mulher da direita, sendo 
um azul da mesma tonalidade do da água de um pequeno lago, à sua direita, semi-seco.
As retas e os ângulos dos contornos, geram uma gestualidade veemente e patética, sendo que a 
veemência é reiterada através do vigor das pinceladas. As retas fazem com que os contornos sejam 
37
grosseiros, originando seres que parecem ser talhados à machado na madeira; tanto estas linhas como 
as poucas curvas que contrastam com elas são usadas na deformação da figura humana.
O equilíbrio axial central é determinado, principalmente, pela forma 
decorrente da posição assumida pela mulher central. A composição apresenta 
uma simetria que não é absoluta: há simetria na mulher central, nos dois carregadores, na rede. A 
quebra da simetria é gerada pela localização da segunda mulher, à direita da tela. A diagonalidade 
presente na estrutura do quadro contrasta com as linhas horizontais do chão, do lado superior do ângulo 
formado pela rede e pela vara paralela a ele.
Retas, originando ângulos, estão presentes de modo recorrente na estrutura da obra. Por vezes, 
o ângulo fica mais evidente por aparecer sublinhado com o uso da cor preta. O elemento plástico chave 
da tela é o ângulo, que presentifica uma cunha, objeto cortante, ou uma seta ou uma ponta de flecha. O 
ângulo pode ser também considerado uma figura incompleta, imperfeita, que pede o que falta, o que 
não há. O ângulo também pode ser visto como uma presentificaçao de boca ou receptáculo. Adotando-
se esse modo de olhar, observa-se a inter-relação entre expressão, no nível da manifestação, e 
significação, no nível do conteúdo.
Os pés da mulher central, vincados por linhas diversas, assim como a superdimensão dos 
demais membros e os músculos evidentes aludem à atividade braçal, no cultivo da terra. Pés 
descalços reforçam esta idéia e presentificam uma noção de pobreza. A 
forma dos pés, grandes, retangulares, com toda a base em contato com o solo, parece colar o ser 
humano àquele chão, àquela realidade. É uma versão da expressão verbal “com os pés no chão”, que 
pode ser entendido como o estado de quem deixou os sonhos de lado.
A partir de uma linha vertical imaginária, traçada do centro da borda superior da tela até os 
pés da mulher central, percorrida pelo olhar, fará com que ele passe pelos vértices dos dois grandes 
ângulos - o que é formado pelos braços abertos da mulher central e o que dá o contorno à rede - e 
estabelece o eixo da composição plástica. 
O vértice do ângulo, formado pelos braços da mulher e o inferior do triângulo, que é a rede, 
são quase coincidentes, sobrepostos. Esta coincidência, reiterada pelo fato de estar a 
rede prenhe do morto, podem indicar que esta mulher é a mãe do defunto. 
Ou teria sido ele quem fertilizou seu ventre? São inúmeros os efeitos de sentido que pode causar uma 
única figura, o triângulo, tantas quantas forem as relações que forem estabelecidas entre tal figura e 
outros elementos da imagem. 
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Sob esta linha estão situados, além do morto, conteúdo da rede e da mulher central, a mão 
esquerda do homem da esquerda, que cria ambigüidade ao se parecer com uma caveira. Esta 
mão/caveira explicita o destino daquele que está contido na rede, aliás, o destino de todos nós, 
lembrando que, mesmo em condições subumanas, aquelas personagens são tão humanas quanto o 
apreciador da obra. Todos temos um crânio, o que nos iguala, independentemente das aparências 
externas. 
Percebe-se que a gestualidade da mulher central deixa em aberto seu(s) sentimento(s). Pelo 
fato de seu rosto não estar aparente, resta a dúvida, a ambigüidade, a ambivalência: imprecação e/ou 
súplica? Revolta ou pedido de clemência? Na abertura da rede, outro efeito de sentido: boca, boca 
aberta, sedenta de água e justiça. A mão esquerda do homem da esquerda, além de poder ser vista 
como uma caveira, pode ser, agora, uma língua nesta boca; “língua de fora”, idéia de cansaço, de 
chegada aos limites, de rendição.
A mão direita do homem da esquerda indica o chão, que lhe é perpendicular, isto é, o chão, a 
terra, a realidade, o destino. A mão direita do outro homem, o da direita, confunde-se com a vara que 
carrega no ombro, na qual descansa esta mão. Ela parece estar recoberta por uma atadura, que amarra a 
mão e o homem ao pau que carrega, prendendo-o na mesma realidade e conduzindo-o ao mesmo fim.
A vara, como figurativização de lança, atravessa o quadro; ela é 
paralela à linha da terra, da realidade, da morte; ambas as linhas, 
horizontais, dão estabilidade à composição, contrastando com a diagonalidade dos 
ângulos e com a emocionalidade da tela, para qual estes ângulos contribuem.
Os terminais retos dos dedos da mulher central remetem à idéia de castração ou à de final 
abrupto. Cabeças pequenas em relação ao corpo e barrigas retraídas, aliadas aos membros 
superdesenvolvidos aludem ao excesso de trabalho, em troca de pouca comida e à sua conseqüência: 
cérebros pouco desenvolvidos.
O peso do corpo do defunto é que dá a forma de triângulo à rede, 
pois ela é flexível, de pano; assim, a forma triangular que o tecido da rede 
adquire, denota um defunto minguado, amontoado no fundo da rede. A rede 
pode ser vista, também, como um buraco, cova ou receptáculo. Outra espécie de metáfora é uma pedra 
no caminho, na parte inferior da tela, com valor de obstáculo, cujo sentido é reforçado pela forma 
angulosa que esta pedra apresenta. 
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O fundo superior é formado por efeitos de superposição de superfícies em diferentes tons de 
cinza esverdeados, onde o preto dos contornos está ausente; a direção das superfícies é dada pelas 
pinceladas. São os infinitoshorizontes de esperança, tão diversificados quanto inatingíveis.
A linha da vara que usam os carregadores para conduzir a rede nela amarrada e a linha da 
terra, ambas levemente descendentes, articuladas à forma da postura arqueada do homem da direita e à 
da mulher da direita formam um sintagma, dando a idéia de determinada direção: para frente e para 
baixo. Indica a necessidade de continuar a caminhada, para a frente, mas para baixo, na direção da terra 
ou do inferior, no sentido descendente ou decadente.
A rede, formada por uma espécie de lençol e a imagem da mulher da direita, considerando-se 
em especial o véu que lhe encobre a cabeça e as pinceladas azuis, cor que remete à Virgem Maria, dão 
origem a outro sintagma, que evoca a paixão de Cristo. Pode ser incluído neste sintagma, igualmente, a 
água, o líquido do mesmo azul que o da roupa desta mulher, insuficiente para cobrir a cavidade do 
lago, podem ser as lágrimas que ela não verte. O pequeno lago, parcialmente seco, é ao mesmo tempo 
metáfora e metonímia de seca.
Tanto os ângulos com abertura para os céus quanto aqueles com 
abertura para a terra podem dar a idéia de cunha, ferindo pelo vértice, 
agressão, violação, ou, pelo lado oposto, pela abertura do ângulo, a idéia 
de abertura mesmo, de vulnerabilidade, de rendição, fragilidade, aceitação 
do estupro inevitável. Neste entrecruzamento de significados através dos ângulos, pode-se 
entrever a ausência de justiça social terrena e também, da justiça celeste ou sua invocação.
É um jogo de forças, de forças desiguais; um jogo no qual já se sabe de antemão quem é o 
ganhador e quem é o derrotado. E o que resta? A submissão, estampada no rosto dos dois homens.
Em síntese, a tela apresenta dois homens carregando sobre os ombros um pedaço de pau, do 
qual pende um pano, ou uma rede, conforme o título do quadro indica. As duas extremidades da rede, 
amarradas às pontas do pau, permitem que o pano fique pendurado, como uma bolsa, e que ela sustente 
um conteúdo. O conteúdo não se vê, mas interrelacionando-se o título da obra à gestualidade das 
mulheres presentes na cena (ambas de joelhos, uma chorando e a outra com braços abertos, dirigidos 
ao alto), deduz-se que é um defunto. 
Se se observar os quatro actantes visíveis na tela dois a dois, ou seja, os dois homens em 
relação às duas mulheres, vai-se perceber que, enquanto as mulheres estão de joelhos, os homens estão 
de pé. São os homens que carregam o defunto, embora ele seja tão pequeno que as mulheres - mesmo 
se frágeis, o que é pouco provável, naquele contexto - poderiam carregá-lo. Dos homens, pode-se ver 
os rostos; os das mulheres, eles não são dados a ver. A postura dos homens é conformada, eles parecem 
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destituídos de emoção. O que dá este sentido a eles é a sua gestualidade, quase estática e a expressão 
dos rostos, que nenhum sentimento permitem perceber. Eles não parecem estar alegres ou tristes. Eles 
estão apenas sérios. 
As mulheres, mesmo sem que se veja a expressão do rosto e 
mesmo que não vertam lágrimas, mostram forte emoção: a gestualidade 
da mulher central, de joelhos, voltada para a rede, e com os braços 
abertos em direção do céu, produz o efeito de desespero; a mulher da direita, 
também de joelhos, adiante do féretro, com sua cabeça baixa, apoiada na mão, confere-lhe um sentido 
de sofrimento contido . 
As pernas dos homens apresentam músculos expostos, de forma longitudinal; as pernas das 
mulheres estão escondidas. Nos pés da mulher central, muito evidentes são os seus dedos, em forma 
circular e a mulher da direita é construída quase que exclusivamente com linhas curvas. As retas e os 
ângulos, na organização de um texto visual, geram efeitos de estaticidade, permanência ou mesmo 
agressividade, além de conduzirem a direção do olhar. Por outro lado, as linhas curvas ou sinuosas são 
mais brandas, conferem mais leveza, mesmo também sendo condutoras do olhar.
Durante todo o processo foi levada em conta a inter-relação entre o código pictórico e o 
verbal, ou seja, entre a imagem da tela, em si, e o título da obra: Enterro na Rede. Isto porque, 
considerando-se a forma assumida pelo defunto, na tela, que não parece a de 
um ser humano, mas um volume qualquer; o costume característico de uma região 
específica, o de levar os mortos a enterrar em uma rede e não em um caixão; o fato de a rede parecer 
mais um lençol, e não uma rede; e mesmo o fato de que a cena retratada não é o enterro, em si, mas a 
caminhada até o local do enterro, ou seja, o préstito, um olhar mais apressado poderia não perceber de 
pronto o significado global do quadro.
Enterro na Rede é um título que facilita o acesso aos inúmeros 
significados da obra. Ao se conhecer o título, não restará dúvidas sobre o que seria o pequeno 
volume dentro do lençol, nem sobre o destino do préstito. Assim se verifica a relevância da inter-
relação obra/título, o que cresce ainda mais em importância em contextos onde não se conhece o autor 
nem maiores detalhes sobre o tema retratado.
Neste encontro/troca entre expressão e conteúdo pode ser observada a dimensão 
epistemológica da obra pois, além de desvendar as relações, precisa também articular as áreas de 
conhecimento que o estudo de cada obra específica leva-o a se defrontar. Vale dizer que, embora este 
texto pictórico traga todo um conjunto de significados em si, passível de leitura em qualquer contexto 
41
sócio-cultural, a apreciação cresce em densidade se se dispuser a conhecer um pouco mais sobre o 
tema, o que, neste caso, é favorecido pelo texto verbal que, sendo o título da obra, com o texto 
pictórico interage. 
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MODA TAMBÉM É TEXTO
No dia em que, em período remoto e sem possibilidade de ser definido com exatidão, um ser 
humano ajeitou de modo diferente ou acrescentou algum detalhe à pele ou ao couro que lhe cobria o 
sexo ou lhe aquecia, foi inventada a moda. 
Temos a tendência de considerar os produtos da moda como elitistas ou supérfluos, bem como 
a simples preocupação com elas; todavia, esses como outros produtos considerados “de luxo” têm 
papéis estéticos, sociais, psicológicos e políticos, além de semióticos, através da história. 
Desde a Antiguidade até a Idade Média, em todos os sistemas sociais baseados na diferença 
de classe, a moda desempenhava um importante papel de diferenciação entre 
membros da classe dominante; que só em um segundo momento a moda chegava às classes 
intermediárias e, raramente, à massa da população. Esta classe usava trajes camponeses, considerados 
“folclóricos”. Também não parece que a situação tenha se alterado, em grande escala, após a Idade 
Média. Talvez se possa estender um pouco mais essa situação no tempo, e afirmar que o acesso das 
classes intermediárias à moda se deu a partir da Revolução Industrial.
Se hoje a excelência do design italiano disputa com a França a primazia na qualidade dos 
produtos na área da moda, o fato é que durante praticamente todo o século XX, a capital da moda foi 
Paris. A atividade inicial das maisons francesas foi a haute couture, que se dedicava à criação de 
modelos exclusivos para igualmente singulares clientes ao redor do mundo. As transformações sociais 
ocorridas durante a segunda metade daquele século incluem uma maior mobilidade social e a 
inserção da mulher no mercado de trabalho – que por sua vez exige uma 
maior mobilidade física. Aliado a esses fatos, acontece a ampliação de uma classe média com 
crescente poder de compra, e surge o prêt-à-porter: os modelos passam a ser mais práticos e 
produzidos em série, e os materiais, não são mais tão “nobres”. É nesse período também que se 
diversificam os produtos oferecidospelas grandes maisons, incluindo uma diversidade de acessórios e 
produtos de beleza. Um novo, maior – e não tão “nobre” – mercado, para produtos de qualidade, 
embora já não mais exclusivos. Mas todos nasceram com a força da respectiva marca, a marca da 
exclusividade, a marca da maison. 
Com um imenso mercado consumidor disponível, e meios de produção em larga escala 
viabilizados, torna-se importante para o sistema capitalista estimular a competição das massas através 
da moda. A produção em série atende às necessidades de uma classe média em expansão (em termos de 
dimensão e de poder aquisitivo), pois pode consumir produtos derivados daqueles 
43
ou associados, por meio da marca, àqueles inacessíveis. Esses produtos, 
simplificados, mas mantendo a marca de origem e traços estéticos universalmente reconhecíveis, 
permite ao consumidor uma ligação com o valor da marca, satisfazendo sua necessidade de consumo 
daquele conceito que a marca significa, através de uma espécie de mimetismo. Ao adquirir produtos 
derivados, pertencentes a uma marca consagrada, como perfumes e acessórios de moda, passamos a 
participar do patrimônio cultural das marcas e ascender ao seu território, conforme disse Danièlle 
Allérès, uma estudiosa do assunto. 
Paralelamente, uma outra indústria se institucionaliza: a das revistas de moda, que 
possibilitavam, e possibilitam ainda, a produção doméstica do vestuário, de acordo com o quê “está na 
moda”. A moda se populariza e, por exemplo, não é estranho uma empregada 
doméstica falar do seu pretinho básico, mesmo sem saber que esta foi uma criação (e 
um conceito, conseqüentemente) de Mademoiselle Chanel, há décadas atrás. Neste contexto de 
democratização, surgem ainda duas formas diferenciadas de resistência: a pirataria, na forma de cópia 
de modelos assinados, ou mesmo a falsificação de modelos prêt-à-porter, e o advento da moda jovem, 
despojada e uniforme, anulando a diferença de classes, fato acontecido no fim do século passado.
Mas o que nos interessa aqui, não é a moda em si, no sentido do que está na moda ou está 
démodé, dépassé; ou se a peça é exclusiva ou se foi comprada em uma cadeia popular de lojas de 
departamento. É isto que nos interessa: a vestimenta como texto visual. Que 
sentidos estão articulados em uma peça exclusiva da haute couture e o que está dizendo o que traja a 
moça no metrô? 
Para tanto, foram escolhidas algumas criações de Givenchy, modelos que foram publicados 
no livro Le Style Givenchy, de Françoise Mohrt. Trata-se de uma obra antológica, uma espécie de 
biografia autorizada, portanto, elaborada com o consentimento deste criador, uma vez que o próprio 
Givenchy é o autor do prefácio e das legendas das fotos. Assim, supõe-se que as imagens que ilustram 
este livro contenham elementos plásticos que apresentam suas principais características, uma vez que 
consistem em exemplares representativos da “linguagem” Givenchy, ou seja, em modelos contendo 
seus elementos plásticos de identificação. 
Pode parecer um paradoxo a escolha de uma marca de luxo e produtos exclusivos de alta 
costura para discutir a estética do cotidiano. Ocorre que, mesmo sendo criados para o consumo direto 
de uma cliente exclusiva, esses cortes, essas dimensões de peças, esses tecidos e essas cores passam, 
em seguida, a povoar as ruas e o universo visual das sociedades ocidentais e, no presente, também das 
orientais, independentemente ou, na melhor das hipóteses, paralelamente às influências culturais 
autóctones. São textos visuais, cores e formas que nos falam, quebrando paradigmas estéticos, 
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revolucionando costumes. Não é sem motivo que ainda se diz que os grandes 
costureiros “ditam” a moda. 
Os textos visuais disponíveis através desse livro intercalam fotografias de modelos com outras 
de objetos e ambientes pertencentes a Givenchy. Em síntese, visualizam-se seu escritório e de seu hall 
de entrada, em Paris; um bouquet de flores (“bouquets altos” são sempre minha preferência, diz ele); 
close de um punhado de alfinetes dourados, com cabeça esférica de vidro cor-de-mel; detalhes das 
portas de seu armário chamado por ele fétiche, em negro e ouro; fotos e aquarela de seus salões em 
Paris; um armário exibindo louça de Limoges e detalhes de outras peças de mobiliário; um torso grego 
em mármore branco, imagem de Afrodite; vasos ornados com máscaras de Baco e cachos de uva; 
também várias cenas, internas e externas, de sua propriedade no Vale de La Loire, denominada 
Jonchet, com destaque para o desenho dos jardins; receitas culinárias, uma foto de um menu e outra de 
seu prato preferido; um close de dois tecidos verdes, um transparente e outro com o avesso branco; por 
último, diversas fotografias do interior e dos jardins de sua propriedade em Saint-Jean-Cap-Ferrat, 
denominada Clos Fiorentina, onde se destaca o uso da cor branca.
Qual o sentido dessas imagens, no livro de Françoise Mohrt e qual o sentido de sua citação 
neste estudo? Ora, como pode ser observado, não se trata de uma espécie de valorização da moda de 
Givenchy, no sentido material, uma vez que coisas simples como as imagens de um pernil de porco 
assado, de um punhado de alfinetes ou de carretéis de linha, também fazem parte deste conjunto de 
ilustrações. E são imagens que podem estar no cotidiano do mais comum dos cidadãos. Igualmente, não 
se trata de expor publicamente a classe e a elegância da vida privada do costureiro, pelo fato de terem 
sido intercalados às suas propriedades e pertences, objetos muito singelos e recortes da natureza. Essas 
imagens estão ali pela sua capacidade de ressaltar elementos estéticos que fazem parte, como um 
sistema visual, da “linguagem” Givenchy. Isto porque são cores e formas que estão presentificados nas 
obras deste criador de moda, algumas vezes explicitamente. É o que o senso comum denomina “fontes 
de inspiração”, mas na verdade, consistem em um fenômeno bem mais palpável do que alguma coisa 
etérea como a inspiração: trata-se da questão da construção de significados visuais. 
Os critérios usados por Givenchy para escolher elementos estéticos, com o objetivo de 
construir o mundo em torno de si, são mesmos que ele usava para criar textos visuais moldados em 
tecidos, linhas, cores, bordados. Porque esse outro material visual, seus pertences e suas escolhas, 
também são textos. A estrutura acentuadamente vertical em um “bouquet alto” 
é a mesma estrutura dominante no conjunto de sua produção visual. E é a 
mesma estrutura longilínea do alfinete e de Audrey Hepburn, musa do costureiro, ou seja, um conceito 
estético. 
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Por outro lado, a integração de todos esses dados visuais, a coerência entre criador/criatura, 
mostrando o conjunto de todas as peças como sendo um único sistema, consiste em um fator 
importante para o fortalecimento da marca Givenchy. São textos visuais que contém sentidos que 
integram o nível narrativo da marca, à “linguagem” Givenchy.
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ARGOLAS DOURADAS
Toda imagem pode ser considerada um texto; e esta é uma reflexão sobre a significação de 
textos não-verbais. Trata-se de verificar "o quê" dizem as imagens, neste caso, uma imagem visual, e 
ainda, de tentar mostrar "como" ela fala. 
O objeto desta análise é um acessório de moda: uma par de brincos dourados. Se observarmos 
imagens femininas através da história, vamos encontrar, em diversos momentos, argolas douradas. E se 
olharmos em mais direções, igualmente vamos encontrá-las em distintos contextos culturais, 
eventualmente também como ornamento masculino, na forma de adornos análogos, como os braceletes 
e os cintos, quenão deixam de ser espécies de argolas. E, em nossa volta, nos dias atuais, vamos vê-los 
aos montes, nos lábios umbigos e lugares ainda mais inusitados de corpos humanos, sejam eles de 
mulheres ou de homens. 
Não vamos aqui examinar um par de argolas particular, com uma textura especial, ou com 
uma forma exclusiva, que quebre o paradigma de argola (quero dizer, sendo aberta, ou oval, ou 
sextavada, por exemplo). Vamos tratar de argolas as mais convencionais: nem enormes nem 
pequeninas; mas redondas, lisas, douradas.
Inicialmente, vejamos os elementos constitutivos dessas argolas: linhas curvas que se repetem 
compondo um par, apenas. E a "cor", o dourado, ou seja, o amarelo metalizado. Como se percebe, é um 
objeto conciso, sintético, de um certo modo, minimalista.
O que um objeto (ou um par dele) tão corriqueiro poderia significar? 
Argolas, além de brincos, são aros e elos. E tem semelhança com anéis, fivelas, cacho de 
cabelos, alças, laços, círculos, curvas, voltas. E absorvem toda a carga semântica, ou os efeitos de 
sentido, desses outros objetos ou formas, que são análogos. 
Argolas fechadas remetem ao sentido de proteção; abertas, ao de liberdade. E as argolas 
formadas por anéis de cabelo já foram muito usados como identificação. Em francês, chamamos os 
brincos de “boucles d'oreilles”, literalmente, arcos ou fivelas de orelhas, que alude à proteção das 
orelhas, também no sentido de afugentar o significado do que por elas passaria em forma de sons, rumo 
aos ouvidos. Há também analogias com a fertilidade, pois "boucles" tem também o sentido de pequena 
boca, ou de órgão genital feminino.
Anéis e brincos são conceitos que se confundem, portanto. Anéis são alguma coisa a mais do 
que simples adornos. Anéis também serviram, há tempos atrás, para identificação, quando traziam, 
geralmente em relevo, o brasão da família, ou as iniciais da pessoa. Neste caso, serviam como sinete, 
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isto é, matriz para impressão, sobre o papel ou lacre, dos dados de identificação, muito usados para 
selar compromissos. 
Anel encerra o sentido do poder, e o sucesso atual de público nos filmes da série "O Senhor 
dos Anéis" (The Lord of the Rings, no original em inglês) mostra a atualidade deste efeito de sentido, 
que atravessa o tempo e permanece nos mais distintos espaços. Possuir um anel pode encerrar a noção 
de ter poderes mágicos; de abrir portas secretas, de estar protegido contra forças desconhecidas. E 
“ring” quer dizer, além de anel, círculo, argola; e circo, ringue, arena; também em inglês, como verbo, 
tem os sentidos de toque ou ressonância de sinos, campainha ou carrilhão. São mais conteúdos que 
podem se somar aos efeitos de sentido de argolas douradas.
Nas Escrituras, várias passagens atribuem a sabedoria de Salomão a um anel que usava. E o 
anel papal, chamado anel do Pescador, é quebrado quando da morte do Papa, mostrando a quebra do 
vínculo entre Deus e os homens, através da desaparição daquele ente.
Mas argolas podem ser ainda alianças, o que acrescenta uma nova bagagem de efeitos de 
significação às argolas. Entre noivos, elas são um acordo de fidelidade, mas podem ser interpretadas 
como a escravidão de um em relação ao outro. Em religiosos, é a submissão a Deus; as freiras são as 
noivas de Deus. Na prática da domesticação de falcões, a partir da colocação de uma argola na perna da 
ave, ela passa a caçar apenas para aquele respectivo dono. Algemas também são argolas. Assim se diz 
que as argolas unem e isolam amo e escravo. 
Aliança, o anel ritual do noivado ou casamento, alude também a noção de compromisso. 
Aliança pode ser ainda um acordo, um pacto, um outro tipo de compromisso, onde posições diferentes 
se reúnem para ações conjuntas, geralmente, tendo como motivação um objetivo comum. Daí veio o 
verbo aliar, que segue o mesmo campo semântico. 
Argolas também são elos, que indicam ligação, união, palavra que tem a mesma origem que 
anel, pois ambas derivam do latim "annellu". A palavra aliança já foi usada desde as Escrituras, pois 
Deus fez diversos pactos com os homens, as alianças. 
Em síntese, além dos efeitos de sentido já mencionados, as argolas em forma circular aludem 
às idéias de ciclo fechado; ciclo solar; encerramento ou continuidade de circuito; eterno retorno; 
homogeneidade; sucessão contínua; totalidade indivisível; unidade; tempo; destino; sol; roda; 
movimento; e perfeição, pois tem como base a figura geométrica que é considerada perfeita e, enquanto 
tal, remete à noção de divino. 
Com relação à cor, as nossas argolas imaginárias, relembrando, são douradas. Não sendo de 
ouro, mas de qualquer outro metal menos nobre, o dourado presentifica o ouro, e rouba dele a carga 
semântica. Como metal perfeito, por ser o mais precioso, o ouro guarda relações com o conceito de 
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imortalidade. Do mesmo modo, a partir de conexões estabelecidas através do tempo, o dourado remete 
à nobreza, ao fogo, à luz, ao divino. E ao sol. E, conseqüentemente, ao se relacionar ao conceito de sol, 
o dourado alude às noções de calor, brilho, luz, conhecimento, riqueza, fecundidade, amor, dominação.
Enfim, uma simples forma circular, como a das argolas, guarda consigo uma série de efeitos 
de sentido que assimila dos sentidos de diversas outras formas análogas. Mas não se trata de apenas 
somar significados fechados, de caráter exclusivamente simbólico, representativo, aleatório ou 
convencionado socialmente. As alusões, atualizações ou mesmo migrações de efeitos de sentido se dão 
a partir da presentificação de elementos. 
Circulares são os planetas, claro, também o sol, e o trajeto dos planetas em torno do sol. 
Contornar uma pessoa ou coisa é um modo de aprisioná-la. Elos unem. Adereços identificam, além de 
adornar. Metais são preciosos e a arte de formatar metal com vistas a produção de pequenos objetos 
exige maestria; é o fazer do ourives, que agrega valor ao metal. Isto tem um custo e quem pode possuir 
esses objetos tem poder. Laços, alças, voltas, enfim, quaisquer linhas curvas sempre causam, ao olhar, a 
sensação de movimento, ao contrário das retas, que surtem o efeito de rigidez. Com estes exemplos 
podemos observar que não são gratuitos os efeitos de sentido que as argolas são capazes de gerar.
Quando as argolas são douradas, essas linhas curvas perfeitas, as formas circulares, inter-
relacionam seus significados com os do ouro. Dessas relações surgem novos efeitos de significação, 
como aconteceria com as relações entre formas e cores em qualquer outro objeto ou imagem. Mas 
nesse caso, como pode ser observado, alguns efeitos de sentido que emanam do ouro, ou do dourado 
são coincidentes com certos significados das argolas, ou do círculo, embora outros sejam 
complementares.
Esses significados da forma, reiterados pela cor - ou pelo material - potencializam esses 
efeitos de sentido e talvez aí esteja a força da carga semântica das argolas douradas, especialmente no 
que diz respeito ao poder, à perfeição, ao divino, ao destino, tanto nas formas circulares como no ouro, 
que geram um certo mistério em torno delas e justificam sua presença nas mais distintas culturas, 
através dos tempos.
Aos designers vale lembrar que não só jóias ou bijuterias como anéis, brincos e alianças são 
argolas douradas. Aldravas, as antigas argolas de metal usadas para bater nas portas antes do advento 
das campainhas, os puxadores do mobiliário, os aros de contornos de luminárias, os acessórios de 
cortinas, detalhes da moda, óculos, entre outros, são objetos que podem consistir em argolas douradas. 
Ficam aqui disponíveis estas referências de significação para tais produtos, que pela sua forma e pela 
sua “cor”, assumem os mesmos efeitosde sentido que possuem os brincos e os anéis dourados. 
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ENQUANTO O ARTESANATO NÃO SE ATUALIZA...
Adélia Borges quase esgotou o assunto quando escreveu “Design e artesanato, um namoro 
promissor”, no seu livro intitulado Designer não é personal trainer. Por conta do “quase” e 
do fato de apresentar adiante uma leitura de um produto artesanal, volto ao assunto.
Em síntese, Adélia desmonta a tese da preservação da “pureza” dos artesãos, mostrando que 
esse patrimônio da identidade cultural não pode ficar congelado, pois seria sua morte. Que esta espécie 
de atualização do produto deve ser feita pelos designers, todos estamos de acordo. 
Enquanto a atualização não acontece, vemos a suposta pureza sendo deturpada, não por 
adaptações de quem conhece a fundo o assunto, mas por inescrupulosos que só visam o lucro. São 
adaptações canhestras, sem o mínimo de coerência interna e, às vezes, distantes das características 
naturais da região ou da cultura local. É o caso do alabastro de plástico ou dos santos moldados em 
gesso. 
Hoje em dia, chegamos ao cúmulo de saber da existência de fábricas de artesanato. E 
se formos aos dicionários, veremos que além de trabalho manual, exercido no âmbito doméstico, da 
tradição do fazer, da associação do aspecto artístico ao utilitário, também aparece como uma das 
dimensões de significado o fato de o produto artesanal não ser criado em série. Ao contrário, como se 
vê artesanato em série! 
Com o advento da Revolução Industrial, houve a valorização dos produtos manufaturados, 
com as superfícies mais regulares, consideradas “mais bem acabadas”. Em contraposição, produtos 
elaborados artesanalmente eram considerados primitivos, rústicos, medievos, destinados ao uso dos que 
não tinham acesso ao equivalente industrializado.
Mas, o avanço dos meios de reprodução, e a conseqüente massificação de produtos geraram a 
falta de identidade. Houve o retorno da valorização dos produtos rugosos, fruto da ação da mão do 
homem sobre eles.
Hoje há uma tendência, em alguns setores, de considerar que tudo o que é hand made é 
superior. São produtos mais valorizados, porque são “mais exclusivos”. Um exemplo, na arquitetura, 
foi a disseminação do estilo mediterrâneo por muitos países distantes daquele mar que emprestou o 
nome ao estilo, no qual os muros e paredes brancas são recobertos por uma áspera argamassa . É 
também o caso, mais recente, da disseminação de texturas artesanais na arquitetura de interiores, seja 
nos revestimentos de paredes ou no mobiliário.
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O fenômeno da significação subjaz a tudo isso, como pode ser observado. Além do aspecto da 
valoração atribuída a determinados materiais e suas propriedades, é interessante observar a mobilidade 
da significação e conseqüente valor, através dos tempos. Ao brilho, por exemplo, tem sido 
atribuído, historicamente, um valor superior do que às superfícies opacas. 
Isto vem do valor dos metais, tais como durabilidade e, no caso de alguns, raridade. Isto sem contar a 
maleabilidade, a qual é conseguida com a ação do fogo, elemento com poderosa carga de significação. 
Mas a sabedoria popular já vaticinou: “nem tudo que reluz é ouro”. Dada a descoberta de 
novos materiais e a massificação de imitações de metais nobres, principalmente do ouro, o brilho vem 
perdendo esta valoração de superior, podendo ser considerado, em alguns casos, um atributo kitsch. Daí 
o advento e a valorização dos metais escovados. Mas o dourado, como morfema (forma mínima com 
significado gramatical), permanece significando.
Quando morei fora do Brasil pude observar como a França trata a questão do artesanato, 
especialmente no que se refere aos alimentos. E percebi como nós estamos, de certo modo, 
ainda deslumbrados com a Revolução Industrial...
Lá o padeiro é o artisan boulanger, e isto tem muito status. O açougueiro, aliás, o artisan 
boucher, por baixo do guarda-pó está de gravata, tem carro do ano, só abre a boucherie poucas horas ao 
dia, antes das principais refeições. Mas vale a pena só olhar um balcão frigorífico de uma boucherie. 
Que carnes! Muitas vêm não só cortadas, mas amarradas com cordão e decoradas... E como eles as 
manipulam com cuidado; e como têm prazer que se procure um produto preparado com esmero; e 
como não se furtam a recomendar como assar ou quantos minutos de fogo...
Enfim, tudo o que é feito por um artisan é mais caro do que um produto equivalente 
industrializado, porque é personalizado e agrega o valor da ação da mão e da 
mente humana. É o preço da exclusividade, ou no mínimo, da seletividade. Em síntese, lá os 
produtos da feira são muito mais caros do que os do supermercado.
Talvez os franceses se excedam em relação à valorização do artesanato. Quando houve uma 
greve de médicos do serviço público por causa de salários, quase não acreditei quando ouvi o 
presidente do sindicato dos médicos usar como principal argumento o fato de que seu trabalho era 
artesanal. Voilà: l’artisan médicin... 
Enquanto nem o artesanato, nem o conceito de artesanato são atualizados, continuamos, aqui 
nos trópicos, pagando mais caro por suco de laranja de caixinha do que pelo suco natural... 
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IMAGENS “HAND MADE”
Vamos agora ver o que nos tem a dizer uma imagem da arte popular, na verdade duas 
imagens, ou seja, um conjunto em cerâmica. Ele é originário da cidade de São José, município da 
Grande Florianópolis, Santa Catarina, onde são desenvolvidos, tradicionalmente, trabalhos em 
cerâmica, utilitária e figurativa.
As duas personagens que formam este conjunto em cerâmica, presentificam, respectivamente, 
dois sujeitos no exercício de suas atividades produtivas: o pescador artesanal e a rendeira, cujos 
instrumentos de trabalho fazem parte do texto estético. São duas pequenas imagens medindo cerca de 
dez centímetros de altura, as quais, em virtude da técnica utilizada, foram coloridas a frio, com tinta 
comum, após a queima da argila. 
Para realizar o estudo dos efeitos de sentido um texto tridimensional, é indispensável 
considerar diversos ângulos de observação. Inicialmente, então, observa-se uma visão de cima das 
imagens, para que se veja o contorno e as dimensões sob esse ângulo específico. 
O primeiro elemento estético a ser observado, é a dimensão das peças; embora elas se 
equivalham na largura, a peça que contém o homem é maior no comprimento; 
tem quase o dobro do tamanho da peça na qual a mulher é a figura 
principal. 
Na peça que contém o pescador, há uma diversidade entre as linhas curvas e retas. O pescador 
está em primeiro plano, pois é a imagem mais alta da peça da qual faz parte, o que lhe confere 
importância. Sobressaem-lhe o chapéu, os olhos e o nariz e se apresenta com postura estática. Esta 
postura, bem como os detalhes anatômicos pouco elaborados, são características da cerâmica popular 
figurativa, mesmo em outras regiões do país.
A peça, vista de cima, apresenta como delineamento o contorno da canoa, onde o pescador 
está sentado; é uma forma simétrica, longitudinal, mais larga no centro e afunilada nas duas 
extremidades, o que as torna pontiagudas; seus lados são duas linhas curvas, dois arcos em posição 
côncava que, ao se encontrarem em dois pontos, desenham o contorno do objeto. Em cada extremidade 
da parte interna da canoa, há uma espécie de rosácea pintada em azul e vermelho sobre um círculo 
verde, as quais se localizam, centralizadas, sobre os triângulos brancos que fazem o acabamento das 
pontas extremas internas do barco. As bordas que contornam a canoa são vermelhas e entre elas 
existem dois bancos, um onde está o pescador e outro que apresenta uma decoraçãoem vermelho sobre 
o fundo branco. O fundo da canoa é azul claro, do tom que se pensa o mar. 
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Na canoa vêem-se quatro peixes cor de prata, sendo um à direita e outro à esquerda do 
pescador, ambos com os rabos angulosos para cima, partes que estão mais próximas do pescador do 
que suas cabeças, uma vez que estes peixes estão na posição diagonal. Colocados nesta direção, eles 
funcionam como setas - rabos mais largos, bifurcados, e cabeças terminando em forma angular, como 
cabeça de setas. Assim, os peixes mesmos fazem o papel de setas. Ainda sendo 
apontado pelos dois peixes laterais, no fundo da canoa está outro pequeno peixe que aponta para o 
pescador, pois sua cabeça está voltada para ele, o que gera o encadeamento de ligações entre o 
pescador, em primeiro plano, elemento destacado, cuja direção dos braços, paralelos aos peixes laterais 
remetem a eles, aos peixes que indicam o mar e o pequeno peixe que faz o olhar retornar ao pescador. 
Fecha-se o círculo que determina a significação de entrelaçamento entre pescador, pescados, mar e 
pescador. 
O fundo da canoa, sendo azul claro, presentifica o mar, de onde vêm os peixes que sobre ele 
estão. Há um quarto peixe, distanciado deste conjunto tanto pelo espaço mesmo quanto por estar 
separado pelo banco da canoa. Ele está localizado entre este banco e o triângulo da proa do barco. Sua 
dimensão é média, em relação aos outros três, ou seja, ele é menor que os dois peixes que apontam 
para baixo e maior que o peixinho do fundo do barco. Sua posição é diagonal em relação tanto ao eixo 
do barco, quanto aos bancos; é mesma disposição dos grandes peixes, apesar de o quarto peixe não 
estar disposto paralelamente em relação a eles. Mas a direção deste último é oposta à dos grandes 
peixes. Enquanto aqueles apontam para o fundo do barco e para o mar, o peixe médio tem o rabo no 
fundo do barco e a cabeça voltada para cima, em direção para o alto e para fora da canoa. Ele, 
indicando a direção, vincula o mundo restrito da canoa com o mundo em torno dela, lá fora.
Os dois bancos do barco, dispostos em direção perpendicular à longitudinal que é 
predominante na canoa, atravessam-na horizontalmente. Um deles está quase encoberto pelo pescador 
que nele está sentado. 
Elementos constitutivos se articulam a cor vermelha, especialmente na cobertura do outro 
banco, que é inteiramente visível, bem como nas bordas da canoa. O segundo banco tem um fundo, na 
cor branca e, sobre ele, no mesmo vermelho das bordas, duas faixas se estreitam em direção ao centro, 
formando um círculo no ponto onde se encontram. Parece um nó de um cinto, trazendo a idéia de que 
sentada ali naquele banco, a pessoa estaria amarrada, em segurança. Sabe-se que a estabilidade de uma 
canoa é precária e, para que não vire, é necessário que o peso de tudo o que está dentro deve ser nela 
bem distribuído. O ponto do banco onde está o nó da faixa vermelha que o decora está centralizado, 
indicando o local exato onde uma pessoa deveria se sentar sem causar instabilidade no equilíbrio do 
barco. Assim, o que parece inicialmente a decoração do banco é uma forma que lembra um cinto de 
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segurança e indica o ponto de equilíbrio do barco. Por outro lado, as cores também reiteram este 
significado: o fundo é branco, paz, tranqüilidade e a faixa e os nós são vermelhos, o perigo.
O vermelho também é usado no contorno das bordas da canoa; é a região do barco limítrofe 
do perigo, o mar. E também são as áreas do barco onde qualquer peso em desequilíbrio pode, mais 
facilmente, fazê-lo virar.
As duas rosáceas idênticas, situadas na proa e na popa do barco, merecem uma atenção 
especial, embora possam parecer, para um olhar descuidado, mera decoração. O contraste do colorido 
com o branco do fundo lhe dão destaque, assim como o da linha curva do contorno do círculo em 
relação às linhas retas do contorno do triângulo onde está inserido. O verde do fundo do círculo rebate 
o verde da calça do pescador; o azul escuro, rebate a cor da sua blusa e o vermelho, os contornos da 
canoa. As rosáceas ficam, através das cores, vinculadas ao pescador e à canoa, mais a ele do que a ela. 
As quatro pétalas, duas azuis, duas vermelhas, inicialmente formam uma flor. Mas podem ser 
também quatro gotas de água, de água do mar, de onde vem o peixe, o alimento, a vida, ou gotas de 
água doce, igualmente vida, água para matar a sede de quem fica tão exposto ao sol que precisa de um 
chapéu para proteger-se. Ou podem ser as pás de um hélice de um motor que a canoa não tem, mas que 
o pescador gostaria que tivesse. Podem ser também as pás do hélice de um ventilador, que dá origem 
ao vento, o mesmo vento necessário para facilitar o singrar do barco, poupando forças ao pescador. 
Mas vento demais não é bom, bom seria poder controlar sua intensidade; e o vento do ventilador é 
controlável... 
Voltando-se à idéia de flor que, de maneira geral, remete a efeitos de 
sentido relacionados ao feminino; são noções como a de círculo, de 
cálice, de receptáculo, de orifício que surgem. Além de poder presentificar as virtudes e a 
perfeição espiritual, o que é reforçado por estar inserida, neste caso, em um círculo, uma flor pode 
ainda remeter para idéias de amor, harmonia, vida, beleza, natureza. Estando nas bordas, onde, 
qualquer direção que tome o barco, para frente ou para trás, estará apontando provavelmente para a 
terra, onde estão, talvez, a vida, o amor... 
No banco encoberto está sentado o pescador. O pescador está descalço, traja calças verdes e 
blusa azul; porta um chapéu amarelo e arredondado, é uma analogia em relação ao sol do qual ele 
precisa se proteger, dada pela forma circular e pelo cor amarela. O homem traz com ele, entre a parte 
externa da sua perna esquerda e o braço esquerdo, paralelo ao seu corpo, um remo na cor laranja. É 
uma peça longitudinal e dada a não consideração da fragilidade da cerâmica quando da elaboração 
deste elemento, a desproteção causada à parte superior, com pequena espessura, faz com que ele se 
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quebre com facilidade, como aconteceu com a peça analisada. Assim, a forma do remo deve ser 
considerada com maior altura do que a apresentada nas fotografias.
Observe-se a cadeia de efeitos que geram os elementos constitutivos, linhas e formas, 
associados às cores. O remo é o único elemento que tem a cor laranja e por isso se destaca. Sua 
situação, entre o amarelo do chapéu e o vermelho das bordas da canoa, fazem com que ele se equilibre 
na composição, uma vez que o laranja é o equilíbrio entre o amarelo e o vermelho. A forma do remo, 
longitudinal, por sua similaridade, aponta para a noção de falo; e sua cor, laranja, reforça essa idéia, ao 
se interrelacionar com seu contorno, já que laranja é uma cor quente, derivada do vermelho, que é a cor 
do sexo, da carne, do sangue.
Exceto o azul claro do fundo do barco, tom obtido da mistura do azul da camisa do homem ao 
branco, as demais cores são puras e nesta exceção pode ser verificada mais uma vez a vinculação 
homem/barco/mar. As extremidades dos membros, compostas por linhas e formas simplificadas, 
juntamente com a predominância de cores puras, evidenciam a ausência do conhecimento de técnicas 
elaboradas na produção deste texto estético.
Os olhos dos peixes e os olhos do pescador são da mesma cor, azul, e a boca do homem 
também é do mesmo vermelho que as bocas dos peixes. Esta similitude, além de ligar os animais de 
dois gêneros, lembra que o peixe, que é alimento, também se alimenta.
Considerando-se o conjunto da peça onde está o pescador, percebe-se que as superfícies são 
lisas, à exceção do chapéu do pescador, cuja textura buscaa semelhança da palha, bem como os quatro 
peixes, cuja textura se assemelha ao mesmo tempo a das escamas e às 
ondas do mar.
Olhando-se para a figura do pescador de frente, observa-se que as linhas internas de contorno 
das suas pernas formam um ângulo muito fechado, que remete para o ponto onde estão, encobertos 
pela calça, seus órgãos sexuais; por outro lado, os contornos externo e interno de ambos os braços, 
formados, cada um por duas linhas curvas paralelas e côncavas, chamam a atenção para um ponto 
central, eqüidistante dos dois braços. Este ponto coincide com o baixo-ventre do homem, o que é 
reforçado pela passagem, pelo mesmo ponto, da linha reta que delimita a barra da sua blusa. 
Vista de lado, a canoa é predominantemente branca e possui um pequeno friso amarelo e 
outro, mais grosso, azul do tom da camisa do homem. Sobre a faixa azul, a inscrição do nome do local 
de origem do barco e da cerâmica: Fpolis, SC. Como ambos os frisos horizontais não são retos, mas 
irregulares, na parte lateral da proa, há uma curva a qual, olhada ao mesmo tempo que o contorno da 
canoa no lado oposto, gera uma forma que se assemelha a um peixe, demonstrando a limitação do 
repertório visual do artista popular. Isto se repete em ambos os lados externos da canoa.
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Ainda deste ângulo, a figura do homem, inserido na canoa, pode ser ainda considerada como 
tendo a conotação fálica, especialmente se se rever a forma vaginal da canoa vista de cima e se se levar 
em conta a forma longitudinal do pescador nela colocado. 
A peça que apresenta a rendeira, vista de cima, mostra o contorno determinado por uma base 
com forma arredondada próxima à oval; sobre esta base, a mesma marca da origem da cerâmica 
grafada: Fpolis, SC. Também sobre esta base e ocupando a maior parte dela, vê-se outra forma circular, 
gerada pela roda da sua saia. Sobre as duas formas circulares, em primeiro plano, está a cabeça da 
mulher e sobre ela, os cabelos presos em um arranjo geram uma quarta forma circular, o que pode ser 
observado de outro ângulo na foto de frente. Da cabeça, sobressaem-lhe as orelhas, além do nariz.
Seu tronco, em escorço sob este ângulo, visto ao mesmo tempo que seus braços estendidos 
para a frente e em conjunto com a linha determinada pelo contorno interno da caixa sobre a qual está a 
almofada, formam um quadrilátero, quase um quadrado, que contrasta com as formas circulares e se 
rebate na caixa da almofada, que tem a forma retangular. Um dos lados desse quadrado só é assim 
delineado porque a mulher não tem seios: o contorno dianteiro de seu tronco, visto de cima, é uma reta. 
Dentro do quadrado se vê, ao fundo, a saia da rendeira. Sua cabeça é contornada por linhas paralelas 
que determinam a presença de uma espécie de xale em torno do pescoço.
Nas inúmeras idas e vindas diante desta imagem, de um elemento para outro, de um conjunto 
de elementos para a cor de um específico, de uma forma para outra, das partes para o todo e vice-versa, 
surgem inúmeros efeitos de sentido, nesse caso, quase tudo remetendo à idéia da natureza feminina.
A forma oval se repete na almofada mas, seus eixos são perpendiculares, ou seja, se traçada 
uma linha imaginária sobre a maior largura da oval da base, esta linha atravessaria a menor largura da 
oval apresentada no contorno da almofada. Ambas as formas, sendo circulares, contrastam com o 
retângulo da caixa prateada sobre a qual ela está e com o quadrilátero vazado formado pela cintura , 
braços da rendeira e pela mesma linha que forma o retângulo justaposto, sendo esta última, levemente 
curva, pois se vê antes a almofada do que a caixa. 
Sobre a almofada, em relevo estão quatro bilros - quatro pequenas formas fálicas que apontam 
para a mulher - pintados de azul claro. Presa na parte frontal da almofada está a renda, com contorno 
feito, a partir de uma seqüência de linhas curvas, acompanhadas, paralelamente, por idênticas curvas 
pontilhadas. As duas seqüências paralelas de curvas, uma de linhas cheias e outra de pontilhadas, são 
pintadas de dourado. Outra linha curva assinala o centro da renda, a qual, da mesma forma, é 
acompanhada, por dentro por uma paralela pontilhada e ambas são pintadas de dourado.
A base amarela aumenta a dimensão da imagem, mas fica ainda aquém da dimensão dada à 
peça que apresenta a figura masculina. Sua forma oval também contrasta com a forma longitudinal e 
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duplamente pontiaguda da canoa. A cor usada, o amarelo, é cor terrestre, mas é também cor do sol e do 
calor, pois o amarelo é uma cor quente. Talvez ele esteja ali para aquecer o que está, invisível, entre a 
própria base e o círculo seguinte, a saia da rendeira: a metade inferior do seu corpo. Este amarelo é 
rebatido no chapéu do homem, o qual também tem em comum com ele a forma circular.
A saia é da cor laranja, cor que é rebatida pelo remo do pescador. Observada a partir de um 
ponto lateral, ver-se-á que esta saia tem a forma de um cone, que tem a forma de um receptáculo, o 
qual esconde estrategicamente a porção inferior do seu corpo. A saia é estampada por vários pontos 
amarelos cercados, cada um, de cinco pontos azuis, dando origem a pequenas flores, sendo que, como 
o cone, a flor também pode aludir à noção de receptáculo. O amarelo do miolo das flores rebate o da 
base e o do xale sobre o ombro, bem como o amarelo do chapéu do pescador. Já os pontos azuis, 
rebatem a camisa do homem e as pétalas de flor das rosáceas da canoa. 
A blusa da mulher é verde, do mesmo tom que o da calça do homem. Embaixo da saia, no 
espaço delimitado pelo quadrado, que seus braços estendidos demarcam, estão escondidas suas pernas 
dobradas, o que pode ser mais bem observado em uma visão lateral ou oblíqua.
O xale, ou grande gola, é amarelo, com detalhes de pequenos pontos laranja, nas bordas, 
dando a impressão de uma franja. Visto de frente, melhor se observa sua forma, determinada pelo 
contorno: dois ângulos superpostos, com vértices quase coincidentes. Separando-se os lados dos 
ângulos dois a dois, tanto o par direito quanto o esquerdo - já que há simetria em toda esta peça de 
cerâmica - formam triângulos ou setas. Do vértice do ângulo superior sai o pescoço da mulher, e na 
direção oposta, ou seja, para baixo, os vértices quase coincidentes ou, visto de outra maneira, as setas, 
apontam para o ventre da rendeira.
A rendeira, observada de frente, oculta a parte inferior do seu corpo, que é encoberta pela 
caixa sobre a qual está a almofada com os bilros, diante do que está a renda. Sob este ângulo, tem-se a 
visão completa da renda: interiormente, uma forma branca oval, determinada por uma linha cheia, 
acompanhada, por dentro, por uma linha pontilhada, que tem a mesma forma, sendo ambas recobertas 
por tinta dourada. Em torno desta oval, a superfície branca da renda continua, terminando em gomos 
formados por curvas subseqüentes - igualmente em linhas cheias e pontilhadas - que determinam a 
borda da renda, a qual também é pintada de dourada. 
O dourado atribui valor à renda, por ser um trabalho precioso e também por ser fonte de 
rendas, no sentido de recursos financeiros. O branco da renda se rebate no branco externo e em alguns 
detalhes internos da canoa, que é o meio para a obtenção de recursos financeiros, ou rendas.
Elementos diferentes somam-se às cores para compor um conjunto de dois personagens, 
totalmente diferentes, se observadas as imagens de modo superficial, considerando seu nível 
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topológico. Através das inúmeras idas e vindas, do estabelecimento de relações e correlações, percebe-
se um princípio comum entre os dois actantes: ambos causam efeitos de sentido que remetem ao seu 
respectivo sexo; e sendo assim, são, efetivamente,muito diferentes entre si. 
Visto de frente, o casal deixa à mostra a porção superior de seus respectivos corpos, pois da 
cintura para baixo vê-se, anterior ao corpo do homem, a forma pontiaguda 
da proa da canoa. Da mulher, o que se vê nesta posição é a renda, sendo 
que o olhar é atraído especialmente pela oval do centro da toalha rendada. 
Assim, a imagem da rendeira é antecipada pelo conjunto formado pelas caixa, almofada, renda e bilros, 
que encobrem a visão, protegendo suas pernas e seus órgãos sexuais. No entanto, a forma circular, a 
oval, é o que aparece em primeiro plano na renda, oval esta circundada por uma outra forma ovalóide, 
com contorno de flor. A forma oval - e também a cor branca - remetem à noção de ovo, o que propõe 
significados como ninho, origem de vida, maternidade e também consiste em uma analogia de um 
orifício. A renda, como uma lente de aumento, amplia o que ela própria encobre. Do homem, o que se 
vê abaixo da cintura é a ponta da canoa, a proa, uma forma que também gera o efeito de sentido que 
remete à noção de um órgão genital masculino. 
A renda, no seu todo, não deixa de ser também uma espécie de flor, pois tem miolo, a oval do 
centro, e as pétalas, que são os seis gomos que circundam o miolo. A flor, que insere a idéia de 
feminino, receptáculo, é a forma que se repete inúmeras vezes na estampa da saia da rendeira e é 
também a forma que se vê, ainda que destituída de miolo, nas extremidades internas do barco.
De uma maneira geral, pode-se perceber que embora inúmeros elementos estéticos 
interliguem as duas personagens, ressalta a afirmação da identidade sexual de cada uma, o que é 
expresso reiteradas vezes; como cada uma é de um sexo, os procedimentos utilizados são diferentes. 
Entre eles destaca-se a dimensão de uma peça em relação a outra.
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FRASCOS TAMBÉM SÃO TEXTOS
Os pequenos frascos, como os de perfume, sempre exerceram uma grande fascinação sobre as 
pessoas. Isto porque está associado, historicamente, ao seu conteúdo, o qual, por sua vez, foi sempre 
vinculado à noção do bem-estar do indivíduo: poções mítico-religiosas, ungüentos medicinais, além do 
uso mais permanente e difundido ao longo da história da humanidade, qual seja, conter e armazenar, 
inicialmente óleos com odores agradáveis e, mais tarde, os destilados perfumados. Ora, em qualquer 
caso, trata-se de líquidos raros, dada a sua composição (o que pode ser deduzido pelas pequenas 
dimensões dos recipientes que os contém), além de preciosos, em virtude das suas finalidades. Daí o 
fato de ter havido sempre uma preocupação com as qualidades estéticas desses frascos, que não deixa 
de ser uma coerência entre conteúdo e continente.
O perfume, em si, também é um texto estético. Isto porque é estético tudo que pode ser 
perceptível através dos sentidos; no caso do perfume, trata-se de um texto olfativo, principalmente. 
Possui ainda, o perfume, um corpo “objetivo”, o qual permite que ele seja também um texto visual, 
desde que seu continente, o frasco, seja transparente. Aí então poderiam ser observadas apenas duas 
qualidades estéticas: a densidade do líquido e sua cor, já que forma teria sido definida pelo frasco. 
Não são muitos os estudos arqueológicos específicos sobre os frascos de perfume, pois sua 
identificação exata fica prejudicada por dois motivos: a inexistência de resquícios que pudessem 
comprovar seu uso, bem como da ausência histórica do hábito de identificar o conteúdo no frasco, 
através da escrita. No entanto, escritos sumerianos do fim do III milênio a. C. apresentam dados sobre a 
composição de perfumes, o que leva a crer que, se havia perfume, deveria haver frascos para contê-los. 
Se inicialmente o perfume parece ser um produto de uso elitista, não é demais lembrar que 
manjedoura Cristo recebeu incenso e mirra dos Reis Magos e que, na Idade Média, tanto a 
Igreja quanto a medicina condenavam os banhos, a primeira, por causa da 
licenciosidade das termas públicas e a segunda, pelo fato da água ser considerada condutora da peste e 
da sífilis. Assim, grande era a produção de perfumes, usados para purificar e desinfetar o ambiente 
nauseabundo e preveni contra doenças. 
Enfim, seu uso democratiza-se cada vez mais e não é de hoje que a Avon chama as classes 
sociais de menor poder aquisitivo, para se manterem perfumadas. A disseminação do uso do perfume 
também está vinculada às mudanças nos materiais usados para armazená-lo: da cerâmica ao vidro, 
passou-se para a porcelana, a opalina, o cristal, com detalhes em metais e pedras preciosas ou semi-
preciosas, voltando depois ao vidro e, mais recentemente, marcas de prestígio começaram 
59
a usar o plástico, principalmente nas tampas, enquanto que marcas populares já utilizam esse 
material integralmente, em substituição ao vidro. 
Mesmo com o barateamento do material empregado, visando a socialização dos produtos – ou 
ampliação das vendas - os grandes fabricantes franceses passaram a oferecer, paralelamente aos 
produtos de linha, edições limitadas ou re-edições de perfumes fora de linha, uns com seus frascos 
originais, outros em frascos com design atualizado. Não é feita publicidade dessas séries limitadas; ou 
contrário, seu lançamento é mantido em segredo, mas a produção se esgota em pouco tempo, dado o 
vazamento de informação, ou informações privilegiadas, passadas por bocas que podem ser igualmente 
adjetivadas.
Essas edições são polêmicas; para os produtores, sendo limitadas (e alcançando um custo 
altíssimo), elas mantém o conceito de exclusividade da marca. Para outros, colecionadores, 
principalmente, é um modo de banalizar o raro. Isto porque grande parte dos perfumes e 
respectivos frascos estão relacionados à sua época e mesmo a acontecimentos históricos, através do seu 
nome ou da forma do frasco; e quando essa relação não é explícita, mesmo assim um produto de 
sucesso passa a ser vinculado àquele momento histórico, por força da sinestesia. Por isso esses 
lançamentos descolados do seu contexto original, ainda que com tiragem limitada, são criticados, 
especialmente quando a mesma fragrância recebe um novo frasco. 
O frasco de perfume é visto como uma espécie de escultura que 
deverá expressar, antes de tudo, a preciosidade do seu conteúdo. Mas existe 
uma infinidade de odores preciosos, que podem ser associados aos atributos que o consumidor 
potencial possui, pensa que possui, ou gostaria de possuir. Esse atributo é o conceito do qual o designer 
parte para criar o frasco, pois é ele que vai fazer, conseqüentemente, a comunicação entre o perfume e 
o consumidor. 
 O designer francês Pierre Dinard que é considerado um dos mais importantes especialistas em design 
de frascos de perfume da atualidade. Ele tem 69 anos, é arquiteto de formação e venceu 35 vezes o 
prêmio de melhor design do FIFI Award; nos últimos 40 anos criou mais de 450 linhas de frascos, entre 
eles Eternity e Obsession, da Calvin Klein.
 Segundo Dinard, um frasco é a primeira impressão sobre o perfume, sendo capaz de 
determinar o sucesso ou fracasso de um lançamento. E o trabalho dos criadores de 
frascos é muito mais difícil do que desenhar uma cadeira ou uma 
lâmpada, porque inclui ingredientes emocionais como amor, paixão e sedução. 
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Há muito tempo a França assumiu lugar de destaque na produção de perfumes, mas foi no 
século XIX que se deu o nascimento da indústria de frascos e o aparecimento das grandes maisons de 
parfum. Quanto aos designers de invólucros, destacam-se os belgas e, com maior produção, os 
franceses, com destaque para Baccarat, Lalique e St. Louis, casas que permanecempor mais de um 
século de criação de frascos de perfumes, além de outros produtos em cristal, igualmente ambicionados 
pelo mercado. A preocupação com a criação de frascos é tão grande que, em determinado momento, 
pintores de prestígio foram contratados para desenhá-los: é de autoria de Salvador Dali o desenho do 
invólucro do perfume Le Roi Soleil, de Schiaparelli, com fabricação de Baccarat; e é de Fernand Léger 
o vidro de Cantillène, de Reveillon, com fabricação de Lalique. 
A partir do pós-guerra, com a grande mudança verificada nos costumes, mudam também as 
mentalidades e os grandes costureiros passam a se interessar pelo mundo da perfumaria: Christian Dior, 
Jacques Fath, Mademoiselle Carven, Yves Saint Laurent, Pierre Balmain, Hubert de Givenchy, Pierre 
Cardin e Nina Ricci, uma vez que Mademoiselle Chanel já se havia interessado anteriormente. Assim, 
o conceito da marca na moda passou a ser associado à perfumaria e vice-versa, pois o perfume também 
agrega valor à marca. 
Mas o que nos interessa aqui é o vidro de perfume como texto 
visual: um objeto estético tridimensional que produz um discurso, ou seja, 
apresenta efeitos de sentidos ao destinatário potencial, o consumidor. 
61
ESSÊNCIA DO PARAÍSO NUMA GOTA
Eden é um perfume da marca francesa Cacharel. O perfume francês, propriamente dito, pode 
não estar ao alcance de qualquer pessoa; porém, a visualização do seu invólucro - da imagem do vidro 
que o contém - pode se dar no cotidiano de todos, através da publicidade ou, com maior probabilidade, 
nas vitrinas das lojas especializadas, no caminho de casa ou nos templos de consumo habitados pela 
massa que nem sempre pode consumir: os shopping centers. 
O vidro de perfume em questão insere-se no sistema visual. Este objeto, por ser 
tridimensional, precisa ser analisado através de diversos ângulos de visão. A imagem não é artística, 
mas estética, pois, além da função que cumpre como objeto estético, tem outra função, utilitária, 
específica e primordial, que é a de conter um líquido perfumado. É um objeto que, como outras peças 
da nossa vida cotidiana, acaba passando desapercebido ou não recebendo as diversas leituras que 
oferece, ou ainda, transmitindo significados sem que muitos se dêem conta disso.
Um objeto estético criado para acondicionar um perfume deve receber um cuidado especial, 
uma vez que o perfume é destinado à satisfação de um sentido, o olfato, através de um produto que, em 
si mesmo, ao sentido da visão diz pouco. Ainda mais no caso deste texto visual, uma vez que o vidro é 
opaco e não se pode ver sequer a cor do líquido. 
O vidro de perfume precisa manter relações coerentes com o produto que contém. Em outras 
palavras, o designer de frascos para perfumes precisa saber decodificar os 
odores para traduzi-los para a “linguagem” visual.
Inicialmente, são observados os elementos e procedimentos que a imagem apresenta. Olhado 
de frente, ou do ângulo que geralmente se vê um objeto dessa natureza - o que é oferecido ao olhar pela 
maneira habitual de arranjá-lo sobre o toucador - seu contorno, ou a forma que ele contém, é instigante, 
uma vez que contraria um princípio estético presente em quase toda a 
história da arte: a simetria. Se uma linha imaginária atravessá-lo de cima a baixo, passando 
pelo meio da tampa, que é simétrica, obtém-se dois lados diferentes.
A tampa é circular, mas não é um círculo, vista deste ângulo, uma vez que o contorno da base 
se dá através de uma reta. Imediatamente abaixo, já no corpo do vidro, a lateral direita é levemente 
curva e a lateral da esquerda apresenta uma curva mais acentuada, especialmente na porção superior, 
próxima da tampa. A face de trás deste vidro de perfume, por ser equivalente, repete a mesma 
descrição, apenas tendo os lados, direito e esquerdo invertidos, já que são os mesmos contornos; o 
ângulo de visão é que muda.
62
A base, como consiste em um corte horizontal na forma do vidro, parece também uma curva 
irregular; seu desenho fica explícito, se a base for observada de baixo: trata-se da forma através 
da qual é sintetizada, usualmente, uma gota. Talvez tenha sido a gota a idéia geradora 
desta forma de vidro, e que o corpo do objeto, em si, seja o prolongamento desta linha curva quebrada. 
Na base estão grafados, na forma de linguagem verbal, o nome do perfume e da perfumaria, 
bem como a logomarca da perfumaria. Parece não ter havido a intenção de uma importante inter-
relação entre estes elementos e o vidro em si, uma vez que se acham ocultos, sob a base, em uma 
reentrância.
Ainda sob este ângulo, observa-se que o ponto localizado na quebra da curva, na ponta 
superior da gota, gera no volume do vidro uma linha, quebrando a circularidade horizontal do vidro, ao 
passo que as laterais curvas e a parte inferior da gota, sob este ponto de vista, geram planos que, 
aumentadas as dimensões, repetem a curva da gota. Ou seja, se fosse possível cortar o vidro em 
diversas fatias, horizontalmente, seria obtida uma sucessão de formas de gotas, inicialmente, cada uma 
um pouco maior que a anterior e, a partir de dois terços da altura do vidro, as dimensões das gotas 
iriam diminuindo, também gradativamente. 
Assim concebido este vidro de perfume, suas laterais são diferenciadas; um lado é 
arredondado e o outro expõe a linha gerada a partir da quebra da curva, na base do vidro. Em relação à 
tampa, que é arredondada, ela rebate um dos lados, formando um conjunto mais harmônico do que o 
lado oposto, onde as formas da tampa e as da lateral, agora frontal proeminente, são contrastantes. 
A tampa, vista a partir de qualquer uma das faces principais do vidro, as duas mais largas, 
lembra a forma fálica, podendo estar penetrando na ou sendo penetrado pela forma do vidro onde ela se 
encaixa. Se o ponto de vista for lateral, mais ainda a forma fálica se evidencia, ou seja, no lado 
arredondado, tampa e vidro, estão quase que indissociados. Se não fosse a faixa prateada, pareceriam 
ser um só objeto. No lado oposto, o anguloso, permanece a forma fálica, porém há uma distinção maior 
entre vidro e seu complemento, a tampa, em virtude da proeminência frontal da linha vertical 
determinada pelo encontro dos dois planos que caracterizam a angulosidade.
Vista de cima, a imagem mostra, em primeiro plano, um círculo verde, a tampa do vidro; em 
seguida, nos quatro planos subseqüentes, vêem-se quatro formas de gota, sendo que, ao se sucederem 
os planos, estas gotas aumentam sua dimensão; as duas primeiras são prateadas e as duas últimas, no 
quarto e quinto planos, são verdes, quase do mesmo verde - apenas um pouco mais escuros - do que o 
verde claro do círculo do primeiro plano.
Há uma intensa centralização em torno de significados que articulam 
gênero, sexo e vida, através das cores e das formas. Seria a lateral arredondada o 
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lado feminino e a angular o masculino? Ou seja, dois gêneros em um mesmo corpo? A idéia da unidade 
de corpos está presente na Bíblia, no Gênesis, e a passagem que faz referência a essa idéia tem como 
cenário o Éden. Foi do primeiro homem, feito de barro, que Deus tirou uma costela para fazer a 
mulher. E então, disse Adão: “Eis agora aqui (...), o osso de meus ossos e a carne da minha carne... ”
A unidade de dois gêneros em um só corpo está também em “O Banquete”, de Platão. 
Segundo ele, chamavam-se andróginos os seres que, diferentes do homem e 
da mulher, possuíam dois sexos. Por terem desafiado os deuses, confiantes em sua força e 
cegos pela presunção, foram por Zeus separados, como castigo. Ao se encontrarem, enlaçavam-se e 
nada mais faziam, até morrer de inanição. Com pena, Zeus muda o sexoda parte inferior para a frente 
dos corpos, permitindo assim que o macho gerasse a descendência na fêmea. 
No frasco de Eden, os dois lados diferentes, o arredondado e o angular, em um mesmo corpo, 
o vidro de perfume, trazem esta idéia dessa dualidade dos gêneros, buscando a completude, diferenças 
que se integram em um mesmo todo, uno. 
No que se refere à cor, destaca-se o verde, cor predominante no jardim, jardim do Éden, 
porque é cor da vegetação, da vida, portanto. O prata na faixa superior do vidro é, ao mesmo tempo, 
contraste com o verde, e complementar ao branco do qual o verde é mesclado. Prata é a “cor” da lua, 
que em uma cadeia associativa de significados remete à água - e, de novo, à vida - e por outro lado, ao 
princípio feminino, contraposto ao princípio masculino, figurativizado pelo ouro. Quanto à forma, a 
gota geradora traz, inicialmente, a idéia de água e de vida, mas pode, ainda significando vida, trazer 
esta idéia através de uma gota de esperma. 
Verde e prata entrecruzam significados que dizem respeito diretamente ao conteúdo do vidro, 
ao perfume: se prata pode ser água purificadora ou símbolo da purificação, o verde é considerado 
tonificante, refrescante e envolvente. Esta associação pretendida não se concretiza, apenas, na 
justaposição das duas cores, mas também na forma como o verde é apresentado. Não se trata de um 
verde puro, mas de um verde misturado com branco, sendo que o branco fica mais evidente em ondas, 
no sentido vertical, que dão um certo movimento ao frasco. O branco é, neste caso, a cor da prata, 
assim como o amarelo é a cor do ouro. O branco também se articula com o verde para melhor integrá-
lo ao prata.
Já que o branco tem como um de seus significados mais fortes a pureza, aqui há também a sua 
inter-relação com a idéia de purificação do prateado, com a tonificação do verde e com uma possível 
função pretendida para o perfume.
Um outro foco de significados está vinculado à transgressão estética que significa a assimetria 
nas duas faces principais desse objeto, o qual também se articula com os outros conteúdos expressos. 
64
Trata-se da quebra de um paradigma de muita relevância em nossa cultura, a simetria. Isso porque 
fomos acostumados, desde as primeiras experiências visuais, a ter contato com formas simétricas, 
desde o peito da mãe, passando pelos animais, folhas e flores, brinquedos e com o nosso próprio corpo.
A partir da constatação da assimetria e da sua aceitação como um modo de violar uma norma 
estética - basta observar os frascos de outros perfumes - pode-se partir para um campo de maior 
abrangência, o das inter-relações, para que se aprofunde seu significado. No verbal do nome escolhido 
para o perfume se encontra, com mais clareza, o significado da transgressão.
A violação de uma norma estética, a simetria, associada ao nome do perfume, gera outra 
cadeia de efeitos de sentido. O nome do perfume é Eden, ou seja, o paraíso terrestre, de acordo com a 
tradição bíblica. O que houve no Éden? Uma transgressão, a violação de uma ordem divina, 
pelo pecado. E o que evoca o paraíso? Jardins, vegetação, água; e homem e mulher, além do pecado, 
pecado esse passível de reparação através do batismo com água, água benta. O que poderia conter um 
frasco de Eden? A água da purificação, uma poção com poderes milagrosos, um extrato do paraíso, 
cuja utilização talvez pudesse, como o batismo, anular os efeitos da transgressão, resgatando a 
condição de felicidade terrena anterior ao pecado, à transgressão.
Se se observar a marca Eden, diminuta, escrita no fundo do vidro, percebe-se, novamente, o 
sentido da transgressão, da violação, paralelamente ao sentido de complementaridade: as duas letras 
“E” foram criadas a partir de semicircunferências - forma circular, feminina - cortadas, cada uma, por 
uma diagonal, a linha reta, longitudinal, o masculino. Dentro de uma visão, pode-se considerar que a 
linha reta transpassa, como uma flecha, a linha curva. De outro modo, pode-se ver os morfemas 
significantes do masculino e do feminino em uma mesma letra, a unidade obtida pelas diferenças 
sobrepostas, graças à escolha do tipo gráfico. É outra alusão ao mito do andrógino, dois gêneros em um 
mesmo corpo. A letra “N” também obedece à mesma regra, ou seja, a linha diagonal da letra, de um 
lado, sai do ponto superior da primeira vertical, mas a segunda vertical é transpassada pela diagonal. 
Ela é formada por linhas retas, enquanto que o “D” é um “D” convencional, idêntico ao tipo usado 
neste texto escrito.
O desenho destas letras pode ser observado na propaganda veiculada em uma revista. Embora 
aqui não seja o objetivo estudar esta peça publicitária, mas sim trazer de um modo mais visível a grafia 
do nome Eden, vale a pena conhecer uma outra tradução, do perfume em si, do seu nome e da forma do 
seu vidro. Para o tradutor que criou a publicidade, a forma do vidro é uma síntese do corpo feminino. E 
Eden é “o perfume proibido”. Interessante ainda se faz observar, nesta tradução, outros aspectos da 
leitura do publicitário, como o uso das cores quentes, do vermelho ao amarelo, que contrastam com o 
verde do produto, e das conotações que elas propõem. 
65
Assim esta peça publicitária possui mais uma utilidade neste estudo: a de mostrar que um 
objeto estético, assim como a obra de arte, estão abertos a diferentes leituras. A que foi aqui feita, 
percebe o perfume como fonte de purificação; a do publicitário, reafirma o perfume como fonte de 
pecado, pois para ele, Eden é o perfume proibido e, conseqüentemente, seu uso seria uma transgressão. 
Trata-se dos efeitos de sentido que um mesmo texto imagético oferece ao leitor.
66
UM PRISMA QUE É MAIS QUE UM FRASCO
Um outro frasco selecionado para análise, foi o vidro do perfume Hot Couture, da marca 
Givenchy. Inicialmente, merece atenção o nome dado a esse produto. Um olhar apressado pode 
confundi-lo com Haute Couture, alta costura. Há a associação direta com a moda Givenchy, através da 
palavra Couture, um substantivo, escrito em francês. Então, percebe-se um jogo entre letras, idiomas e 
significados: Hot, um adjetivo do inglês, substitindo Haute, um adjetivo do francês. O dicionário 
sempre é um bom parceiro quando se busca o significado das coisas. Ora, consultando o Dicionário 
Eletrônico Michaelis, encontram-se as seguintes significações para a palavra hot: quente, 
apimentado, apaixonado, recente, moderno, vivo, forte. Desde modo, na 
construção do significado do nome do perfume, são agregados ao substantivo Couture, costura, os 
sentidos dos diversos adjetivos correspondentes à palavra hot.
A Costura que o nome do perfume lembra é, antes de tudo, alta costura, pois a palavra hot 
substitui haute, mas não apaga seus efeitos de sentido, por dois motivos: pela associação automatizada, 
dado o uso freqüente e conjunto das palavras haute e couture, formando uma expressão única; e pela 
semelhança visual das palavras hot e haute (já que a semelhança fonética é muito menor). E, além de 
essência volátil da alta costura, o perfume oferece outras qualidades, que de adjetivos se transformam 
em substantivos, portanto, em mais produtos a serem consumidos juntamente com o perfume: o 
energético, o picante, a paixão, a novidade, a atualidade, a presença marcante, uma identidade.
Poderia se parar por aí. No entanto, a palavra Couture também merece mais um olhar. Estaria 
aí só para significar costura? Sempre é adequada a ajuda de um dicionário para se avaliar as 
possibilidades de geração de sentidos de um vocábulo. Couture, além do significado mais conhecido, 
ao menos pelos estrangeiros, significa também cicatriz. E oque é uma cicatriz? Um registro 
permanente no corpo, uma coisa que fica na pele, uma marca, uma possibilidade de identidade. 
Couture é então um produto para o corpo, para ficar na pele, para marcar, por muito tempo. Por outro 
lado, sabe-se que uma das principais qualidades químicas de um perfume é a capacidade do seu 
fixador...
Assim sendo, Hot Couture não quer dizer apenas Costura Quente. Hot 
Couture é uma marca, quente, apaixonada; um registro forte, atual; uma 
presença moderna; uma presença talvez agressiva; uma identidade que 
permanece. Por sua vez, a costura de Givenchy também agrega esses atributos, dadas duas 
associações existentes, no caso do perfume Hot Couture: a associação de ambos, moda e perfume, ao 
67
nome da marca Givenchy; à outra associação entre ambas as “linguagens”, gerada pelo nome deste 
perfume, em particular.
*****
Para a análise da imagem visual, buscam-se os elementos constitutivos, no plano de superfície 
da significação. O frasco de Hot Couture é longitudinal; pois sua largura é muito inferior à sua altura. 
Predominam as linhas retas. Seu material é o vidro incolor, transparente, de sorte que ele assume a cor 
do seu conteúdo, o perfume, que é rosa claro. Percebem-se dois pontos de atenção: a tampa, e uma 
imagem vertical, sulcada na parte frontal do vidro. É a imagem de uma mulher de perfil em traje longo, 
ou melhor, um traje longo, supostamente vestido por uma mulher que não é dada a ver, salvo por uma 
suposta cabeça, encimando o conjunto de elementos visuais. Essa imagem feminina se destaca pelo seu 
rebaixamento milimétrico em relação ao plano frontal do vidro. Esse sulco se dá em níveis distintos, 
um para cada superfície de cada uma das partes que compõe a imagem. Também caracteriza essa 
suposta imagem feminina a transparência reduzida, em função da interferência de algum processo no 
tratamento do vidro, que tem como resultado o mesmo que o de jato de areia.
Neste momento, cabe uma pergunta, dada a veemente longitudinalidade tanto da imagem 
feminina quanto do vidro: a figura foi adequada à moldura, ou vice-versa? 
O traje da mulher pode ser dividido em quatro partes. Na primeira parte, observa-se uma 
espécie de bolero, ou seja, uma capa curta que termina acima de cintura, com uma gola muito alta, que 
cobre a metade inferior da sua cabeça. O corpo da capa apresenta bolas em delicado relevo, 
organizadas simetricamente entre elas. Denominando bolas, pois gigantes, ou pontos que tornaram-se 
superfície, segundo Kandinsky, o fato é que a forma circular está em destaque nesse conjunto visual.
Em termos de ergonomia, este relevo, juntamente com o formato do bolero, possibilitam ao 
usuário – ou usuária – do perfume acomodar diagonalmente e oferecer resistência à lateral do dedo 
polegar da sua mão esquerda, enquanto o resto da mão circunda o vidro, tornando-o firme para que a 
mão esquerda possa retirar a tampa. 
A figura do bolero é assimétrica, vista deste ponto lateral oferecido. Ângulos agudos se 
repetem na frente e nas costas da alta gola, bem como na frente do bolero, enquanto que o ângulo que 
delimita costas e bainha do bolero, na parte traseira, é um ângulo reto, tendendo levemente para obtuso, 
pelo fato de o bolero ser mais comprido na frente do que atrás.
Na segunda parte, observa-se o corpo de um vestido longo, muito esguio, com a cintura bem 
marcada, afunilado na parte inferior, lembrando um fuso, determinado por duas longas linhas 
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levemente curvas, uma côncava e outra convexa, as quais se encontram na parte inferior. Há textura 
nesta peça, e pode-se dizer que é assimétrica, pois é determinada por linhas sinuosas, que parecem não 
obedecer a nenhum padrão de simetria. Este elemento em forma de fuso, ou a saia do vestido longo, 
fica em um nível sulcado mais profundamente do que seu complemento, uma espécie de sobressaia. 
A sobressaia é a terceira parte desse conjunto de elementos estéticos, que são planos 
irregulares, arranjados de forma tal que nos passam o efeito de ser um elegante traje feminino que tem 
como suporte o corpo de uma mulher. Esta sobressaia é longa, mais longa do que o vestido. Apresenta 
o efeito de transparência, pois a saia, colocada em um plano mais profundo – que dá a noção de 
interioridade e distância do olhar do enunciatário - pode ser também visualizada. Na parte inferior, a 
sobressaia apresenta três ângulos, dois agudos frente a frente, determinando a bainha da sobressaia e 
seu comprimento, e outro ângulo no lado direito, ou seja, na frente deste traje visto de perfil.
O quarto elemento que compõe essa imagem é mais simples, muito pequeno em relação aos 
demais, mas talvez seja o elemento que tem maior importância na leitura da imagem como um todo. 
Trata-se de uma semi-circunferência que suscita o efeito de sentido de uma cabeça. Sem esta cabeça 
(ou este chapéu), a legibilidade desse corpo feminino vestido ficaria mais inacessível.
O vidro é construído a partir da base que é um trapézio. Como os demais planos que 
contornam o frasco têm origem em cada um dos quatro lados do trapézio, ou seja, no prolongamento 
dessas linhas retas, o frasco apresenta quatro planos que originam um prisma. A base do 
trapézio gerou a frente do perfume, assim considerada por ter a imagem feminina neste lado impressa. 
Sendo originário da base do trapézio, esta é a maior das superfícies, dentre as quatro. Os planos laterais 
do frasco, derivados dos lados inclinados do trapézio, fecham-se ao encontro da parede traseira do 
frasco; isto causa um efeito visual que torna o rosa do perfume mais escuro, o que dá uma noção de 
duas molduras laterais para a imagem feminina. 
A tampa é de plástico, tão incolor e transparente quanto o vidro do frasco; assim, a diferença 
entre os dois materiais não prejudica a noção de conjunto. Essa inter-relação entre vidro, a imagem 
feminina e a tampa é reiterada na concepção da tampa. Sua forma tem ângulos bem marcados, como o 
frasco e a imagem, no entanto, a superfície geradora do elemento tridimensional é um quadrado e não 
um trapézio. A parte superior é dividida quase pala metade por uma diagonal. Abaixo da diagonal a 
superfície é mais fosca, como se fosse jateada, do mesmo modo que a mulher que ilustra o frasco, 
ficando menos transparente do que sua parte superior. Na parte jateada, mais opaca, repetem-se a 
mesmo padrão de bolas do bolero da mulher. Do mesmo modo, rebate a forma frontal do bolero o 
ângulo formado na base frontal da tampa, já que a parte dianteira da base é mais baixa do que a 
traseira. A tampa ainda deixa entrever o prateado do sistema de vaporização, situado na parte superior 
69
do frasco. A prata, que é a cor branca metalizada, possibilita ainda mais o 
reflexo da luminosidade sob este produto do design, gerando efeitos de 
brilho.
A tampa do perfume, como se fosse um pescoço do vidro, e a alta gola da indumentária da 
mulher mantém inter-relações, por se localizarem na parte superior de seus respectivos conjuntos 
visuais, pelas retas e ângulos que delimitam suas formas, e por serem mais estreitas do que as demais 
formas que, localizadas imediatamente abaixo, lhe dão sustentação.
*****
Aqui cabe então aprofundar um pouco o papel da gola no estilo Givenchy. Voltando-se aos 
trajes anteriormente analisados, dentro da amostra pré-determinada, que são as fotografias constantes 
da publicação Le Style Givenchy, vários casos de golas altas apareceram. No vidro de perfume, a gola 
alta volta a aparecer, tão alta que chega a ocultar meia cabeça. Para a análise e atribuição de sentidos a 
essa gola alta na obra de Givenchy, houve a necessidade de buscas emoutras fontes.
Inicialmente, a tarefa foi procurar a ocorrência de golas altas em outros modelos criados pelo 
estilista, fora da publicação estabelecida como limite da amostra para análise. Na página 125 de um 
catálogo de uma exposição ocorrida em Munich, em 1987, denominada “Ars de vivre en France”, 
figura uma foto de uma imagem de um desenhista chamado Gruau para Hubert de Givenchy: a blouse 
Bettina, a blusa branca com gola alta que tanto marcou o estilo Givenchy. E na página 414 do Guia 
Histórico Le costume français, há a foto de um traje de noite com punhos e gola alta em vison. 
Gola, em francês é col, derivado de pescoço, que é cou, ambos originados da palavra latina 
collum. Col então é o nome genérico para gola, uma vez que existem designações variadas, de acordo 
com a diversidade dos modelos de gola. A título de exemplo, a palavra cachecol, usada em português, 
nada mais é do que corruptela da expressão francesa cache-col, literalmente, “esconde-gola”. 
Um dos tipos de gola, mais antigo, pois que estamos agora caminhando do presente ao 
passado em busca da significação, é o collerette, gola confeccionada em tecido fino, quase sempre 
franzida, usada como ornamento. Este collerette era usado tanto por homens quanto por mulheres, 
muitas vezes sendo feitos de renda ou até mesmo recebendo bordados. Existem dois tipos de 
collerettes, ainda que alguns autores denominem o primeiro de collet e só o segundo de collerette: 
grande gola branca, sobreposta à roupa, contornando todo o pescoço e tendo abertura frontal; gola alta, 
70
sustentada por armação de arame ou madeira, situada de uma lateral à outra do traje, passando pelas 
costas, como se fosse um leque.
Ambos são derivados do fraise, modelo de gola trazido por Catarina de Médicis da Itália para 
Paris, quando se tornou rainha da França, no século XIV. O fraise era igualmente branco e usado por 
homens e mulheres da aristocracia. Seu nome deriva de fraises de veau, vísceras de bezerro, com o qual 
mantém relação de semelhança em termos de forma. Também foi chamado fraises en roue de 
charrette, fraises em roda de charrete, por se parecer com uma roda, em cujo eixo se situa a cabeça. Ou 
seja, o fraise é aquele babado branco engomado, alto, formando favos, geralmente rendado, que pode 
ser visto em grande parte dos retratos da nobreza européia, até que o collerette assumiu gradativamente 
seu lugar.
Do fraise ao collerette, do collerette ao collet, do collet à gola alta, eis alguns aspectos a 
considerar, em termos estéticos e semióticos. Primeiro, que todos os ancestrais da gola alta eram, além 
de altos, brancos. O tecido fino branco usado em uma peça tão exposta a máculas era, por si só, um 
sinal de nobreza e distinção. Isto porque, mantê-lo branco, naquela época, era mais difícil que hoje em 
dia. Seria necessário não desempenhar atividades físicas pesadas, e ter alguém que limpasse... Em 
segundo lugar, a altura da gola, muitas vezes sustentada por armações 
inflexíveis, obrigavam as cabeças a se manterem erguidas, em uma 
postura que alonga a silhueta, além de lhe emprestar uma atitude que gera 
efeitos de superioridade, dignidade, altivez. A obra de Givenchy apresenta muitas 
ocorrências de golas altas; a cor mais usada por Givenchy é o branco. Isto vai se refletir também no 
vidro de Hot Couture.
*****
Além da gola alta, outros aspectos da mulher – ou da moda Givenchy – citada no frasco de 
perfume, coincidem com as características encontradas na análise das fotografias dos trajes, a começar 
pela estrutura básica deles, que é a linha vertical; praticamente todos os modelos se ajustam sobre um 
eixo, onde a dimensão longitudinal real é reiterada por meio de outros elementos estéticos próprios da 
costura.
Outro fenômeno estético que ressalta, na imagem de mulher registrada no vidro de perfume, 
são os pois. E eles são tão grandes, proporcionalmente, que passam a ser antes superfícies em forma 
circular do que pontos. Os pois estão em relevo, gerando uma textura no vidro. E eles se rebatem na 
tampa do vidro; lá também se encontram as pequenas formas circulares. Quanto às linhas, as mais 
71
usadas na criação dos modelos Givenchy nesse novo texto visual, são as retas. Aparecem algumas 
curvas; mas se forem bem observadas, elas mesmas, as curvas, mais parecem duas retas, em posições 
diferentes, que se encontram. De qualquer modo, das quatro linhas que contornam o que seria o vestido 
e uma sobrecapa, três são curvas muito pouco acentuadas e a quarta é reta. Outras pequenas linhas 
simulam um tecido estampado, fato pouco encontrado, nos trajes anteriormente analisados. Em 
compensação, se fazemos essas observações, é porque a capa que lhe sobrepõe é transparente, e assim 
aparece uma outra característica bastante presente em Givenchy: a transparência.
Além da transparência, a capa sobre um vestido é outra marca de Givenchy, qual seja, a da 
presença quase constante de um complemento, seja uma capa, um xale, um bolero, ou um manteau-
châle, enfim, uma outra peça de roupa sobre o traje. Na imagem de mulher que ilustra o frasco de 
perfume, o fenômeno encontrado na análise das fotografias se repete, em dose dupla pois, neste caso, 
um mesmo traje apresenta um bolero, e uma capa transparente sobre a saia. A moda Givenchy citada 
através desta imagem propõe envolver, proteger e até esconder a mulher, de certo modo.
*****
Em síntese, o vidro do perfume Hot Couture ressalta propriedades estéticas decorrentes de 
seus elementos constitutivos, que são a transparência, a luminosidade, a longitudinalidade, a 
angulosidade, a valorização da imagem pela moldura, a citação, ou seja:
- a transparência do vidro branco – isto é, incolor -, que em si só é um fato comum, mas aqui 
se torna incomum por possibilitar a visualização da imagem da mulher de qualquer ângulo, 
inclusive causando o efeito de duplicação, quando olhado de ambas as laterais; essa 
duplicação, que é um efeito ótico, implica uma certa magia, pois uma delas aparece e 
desaparece, conforme se move o vidro;
- a luminosidade agindo sobre o material transparente, e sobre o líquido, remete às noções de 
limpidez, de pureza, de brilho, com suas diversas conotações; e remete também a cristal, que 
igualmente gera efeitos de sentido semelhantes, pois qualquer coisa que seja cristalina é 
límpida, clean, verdadeira;
- a longitudinalidade, que propõe as noções de elegância e de síntese;
72
- a angulosidade, através não só de inúmeros ângulos, como também de arestas, presentes na 
imagem da mulher, no vidro e na sua tampa, originados de muitas retas, horizontais e 
verticais, passam as idéias de estaticidade, equilíbrio, delimitação de espaço, marca, 
agressividade, direção, como no caso do ângulo frontal da tampa, que aponta para a imagem 
da mulher – e para o conteúdo do vidro, o perfume;
- o vidro de perfume não deixa de ser uma moldura, que mantém uma relação de 
interdependência com a mulher – e/ou a moda – que a(s) emoldura: a moldura valoriza a 
moda/mulher, que por sua vez dá ao vidro um outro sentido, o de ser moldura dessa imagem;
- a citação, lembrando a moda, que nada mais é do que a impressão dessa imagem de mulher 
sobre uma das faces do vidro de perfume; enquanto que boa parte da produção de frascos para 
perfume sintetizam uma silhueta de mulher no próprio vidro (a tampa sendo a cabeça, e o 
vidro sendo o tronco), este vidro, ou este prisma, serve de moldura ou de redoma para a 
imagem feminina que o ilustra e decora, conferindo a mulher uma condição de destaque, a 
idéia de estar protegida, mas também a noção de distanciamento.Assim sendo, considerando o aspecto ergonômico, o vidro de Hot Couture destina-se à 
mulher moderna, que trabalha, que compete, que tem horários a cumprir e, portanto, não pode perder 
muito tempo: com a mão direita ela fixa o vidro; abre a tampa com a esquerda, com um rápido 
movimento, pois a tampa é de encaixe e não de rosca. A seguir, o dedo indicador da mão direita sai de 
trás do vidro para, agora sobre ele, apertar o vaporizador. Enquanto isso, a mão direita permanece bem 
acomodada em torno do vidro, graças à sua forma de prisma, à reentrância gerada pela imagem sulcada 
da mulher e pela posição do dedo sobre os pois, ou as bolas do bolero. 
Os contornos do vidro, da tampa e da imagem da mulher apresentam inúmeros ângulos, que 
servem de setas, apontando uns para os outros. Esses ângulos encerram sentidos de determinação, de 
força, e de uma certa agressividade, que pode ser associada aos diversos sentidos de expressão verbal 
Hot Couture: uma marca quente, um registro forte, um sentir-se apaixonado, um ser atual. Mas essa 
consumidora, mulher do seu tempo, não obstante sua adesão ao mundo do trabalho, tradicionalmente 
conhecido como mundo dos homens, não abre mão da feminilidade: Hot Couture a trata com carinho, 
embalando-a e protegendo-a com gola alta, capa-bolero e sobre-saia, e decorando seu traje com pois, 
elementos de identificação do estilo Givenchy, mostrados na imagem feminina que adorna o vidro. E 
73
ainda a protege e também a exalta, ao colocá-la em um nicho, dentro de 
uma moldura, de um prisma. 
Hot Couture promete mais feminilidade através da cor do líquido, o cor-de-rosa, que gera este 
efeito de sentido. Nas culturas ocidentais, o azul claro é a cor dos meninos, enquanto o rosa é a cor das 
meninas. Por outro lado, há uma inter-relação com uma flor, a rosa: a palavra francesa rose pode ser 
traduzida simultaneamente por rosa, a flor, ou cor-de-rosa, a cor, e mesmo em português ultimamente 
se tem usado mais a o vocábulo simples, rosa, em detrimento da palavra composta cor-de-rosa, para 
denominar a cor. A única outra cor presente no conjunto é o prata do vaporizador, que é o branco 
metalizado, deixado entrever pela transparência da tampa. Assim como o ouro e o sol carregam em si o 
sentido do masculino, através dos tempos e em diversas culturas, o prata e a lua passam o sentido do 
feminino. Deste modo, o rosa e o prata se complementam. 
E é essa ambigüidade na vida da mulher contemporânea que é apresentada no discurso deste 
vidro de perfume: agressividade e delicadeza; determinação e doçura; tradição 
e modernidade; racionalidade e paixão; força e fragilidade.
O grande ponto de atenção – ou linha de atenção – que é a citação da moda Givenchy através 
da imagem feminina que decora o vidro, e que propõe, além de tudo o mais que já foi visto, que a 
consumidora passe a fazer parte, através do uso do perfume, do mundo Givenchy, o mundo da haute 
couture, do qual o odor de Hot Couture é a essência, em seu duplo sentido.
74
PROPAGANDAS, TEXTOS SINCRÉTICOS
O marketing e a publicidade consistem em atividades e/ou produtos polêmicos, 
principalmente em sociedades onde existe grande desnível social e onde sequer as necessidades básicas 
de toda a população estão asseguradas. Julgamentos de valor acusam esses instrumentos das sociedades 
capitalistas de manipular consciências e estimular o consumo do supérfluo. 
O fato é que esses produtos existem, continuarão existindo e estão permanentemente 
chamando a atenção das pessoas, visto que são imagens visuais e, como tal, são textos, são enunciados 
propostos a cada esquina para toda uma população de enunciatários potenciais. Então, conhecer um 
pouco mais sobre essas imagens, perceber melhor seu modo de funcionar não pode se prestar para outra 
coisa que não seja uma maior consciência do cidadão diante dos enunciados apresentados. 
Entretanto, não pode ser refutada a importância social da publicidade, uma vez que ela invade 
nosso universo visual sem pedir licença. E um dos aspectos que a faz tão poderosa, porque 
detentora de um alto poder de persuasão, é o fato de a publicidade, geralmente, 
articular mais de um sistema de comunicação: trata-se de uma “linguagem” híbrida, sincrética, que se 
apropria, no mínimo, de dois sistemas comunicacionais, o visual e o verbal.
Dois estudiosos da publicidade, os franceses B. Cathelat e A. Cadet, dizem que são cinco as 
funções da comunicação de massa e da publicidade, em relação à sociedade onde se inserem: 
antena, amplificador, foco, prisma e eco. Todas as palavras escolhidas pelos autores 
para denominar essas funções têm um sentido duplo, um segundo sentido metafórico, conforme pode 
ser observado. Isto permite compreender melhor o significado de cada uma dessas funções, 
respectivamente: captar tendências e inovações; ampliar fenômenos localizados (hábitos, práticas, 
atitudes) para o todo da sociedade; focar a atenção em determinado assunto, produto ou mudança 
social; filtrar, decompor e transmitir informações; espelhar a sociedade. 
Por outro lado, os profissionais voltados ao marketing sabem que os pontos básicos para o 
sucesso de um produto no mercado são quatro: o próprio produto, o preço, a distribuição e a 
comunicação. Danielle Allérès, em um estudo sobre o marketing dos produtos de luxo, apresenta 
estratégias diferenciadas nas políticas de comunicação de uma mesma marca, destinadas aos 
igualmente diferentes públicos, de acordo com as possibilidades de acesso aos respectivos produtos. 
Para o que ela chama de produtos de luxo inacessível, como as criações exclusivas da 
alta costura, bem como da joalheria, da cristaleria e da cutelaria, a divulgação é feita através de 
operações de relações exteriores, onde se incluem eventos esportivos ou artísticos, que reúnem 
75
consumidores tradicionais e potenciais, sempre um grupo restrito. Tais eventos dão origem a 
reportagens em revistas seletivas, um método indireto de publicidade, já que visa exclusivamente 
manter o posicionamento e consolidar a marca, uma vez que não foca nenhum produto ou linha de 
produtos em particular. 
No caso do chamado luxo intermediário, seus produtos, como o prêt-à-porter da moda, 
os artigos de couro, os artigos em série da joalheria, da cristaleria e da cutelaria, inicialmente, 
desfrutam dos efeitos de marketing da marca, obtidos em torno da publicidade indireta. Mas como a 
comunicação desses produtos precisa atingir uma fatia maior de consumidores, ainda que limitada, 
principalmente a burguesia emergente, há necessidade de alguma publicidade. No entanto, ela é 
seletiva, discreta e refinada, como por exemplo, nos stands, espaços próprios de uma marca no interior 
de grandes magazines. A razão dessa discrição é o fato de a marca precisar garantir a sua clientela uma 
exclusividade, ainda que relativa.
Quanto aos produtos de luxo acessível, como produtos de beleza, da perfumaria, 
chocolates e bebidas, sua política de comunicação é desenvolvida através de campanhas publicitárias 
completas e importantes, quando do lançamento de um novo produto, quando da expansão de linhas de 
produção ou mesmo da própria marca. Ela deve incluir diversas mídias, jornais, revistas, cinema, 
televisão e outdoors e cartazes menores, para os pontos de venda. 
 Talvez a vertente mais importante da comunicação, principalmente para os produtos aqui 
apresentados, seja o anúncio publicitário. Esta categoria do marketing nasceu em meados do século 
XIX, nos Estados Unidos, chegando mais tarde à Europa. A publicidade impressa lança produtos, 
consolidaa marca, apresenta-se para os consumidores potenciais estabelecidos e mesmo para os que, 
naquele momento, não têm acesso àqueles bens ou serviços. O anúncio invade a intimidade do 
enunciatário. Exposto em vitrines, em páginas de revistas ou outdoors, fica na memória de um público 
que, na primeira possibilidade de uma promoção financeira, vai utilizar a aquisição de um daqueles 
bens materiais como símbolo de status social. 
Tudo isto porque a imagem é eloqüente. São cores e formas que se articulam para 
veicular significados que muitas vezes, mais do que os textos verbais, ficam impressos na consciência 
do seu interlocutor. Daí a importância de estarmos “bem equipados” para compreender o que as 
imagens são e o que elas estão comunicando. 
76
UMA CANETA “TRÈS CHIC”
Outro texto imagético selecionado para estudo das relações de significação na imagem 
publicitária é híbrido, pois é composto por elementos do sistema visual, através do código fotográfico e 
por elementos do sistema verbal, em parte utilizando esses elementos em um arranjo poético e, em 
outra parte, como simples linguagem verbal informativa escrita. Houve a intenção, por parte do criador 
deste texto, de fazer uma analogia entre o poético e o visual, o que torna 
preponderantemente visual, mesmo sendo híbrido ou sincrético; daí o motivo de estudá-lo à luz de 
parâmetros do sistema visual, principalmente. 
A imagem em questão é bidimensional e foi publicada na Revista Exame VIP: uma 
propaganda da caneta tinteiro Mont Blanc, modelo Meisterstück 149 e de um tinteiro da mesma marca. 
O contexto onde está inserida a publicidade por si só já produz algum significado; sabe-se, de antemão, 
que a publicidade pretende atingir o público de uma revista destinada a pessoas que se consideram 
muito importantes.
O espaço retangular da folha de revista foi dividido verticalmente em duas partes iguais, 
dando origem a dois retângulos com as mesmas dimensões entre si. Como o retângulo da página da 
revista é menor na largura, ao ser dividido em dois, gera dois retângulos ainda mais estreitos na largura 
do que na altura. Esta dimensão facilita a acolhida do olhar à imagem de um produto longitudinal, que 
é a caneta. 
Então percebemos que a figura da imagem fotográfica gerada pelo conjunto caneta/tinteiro 
tem as mesmas dimensões e contorno que a poesia visual. Assim colocados, e se actantes podem ser 
tanto pessoas como objetos e conceitos, temos dois actantes análogos, a caneta com tinteiro e a poesia 
que, na inter-relação, reforçam reciprocamente os respectivos significados. 
O que estabelece a divisão das duas superfícies justapostas são as “cores” dos dois fundos, ou 
seja, o branco, ausência ou reunião de todas as cores, fundo do plano da esquerda e o preto, a negação 
ou síntese de cores, fundo do plano da direita.
Embora opostas, ambas situam-se nas extremidades cromáticas, ambas podem ser 
consideradas a ausência de todas as cores ou a presença de todas elas; ambas são ambivalentes; ambas, 
na sua ambivalência, caracterizam-se como elementos estéticos radicais, a não-cor, independentemente 
do fato de estarem destituídos de cor ou somando todas elas. Assim, preto e branco são opostos que, ao 
mesmo tempo, têm características análogas, mas o que predomina no texto é a relação cromática 
opositora entre eles.
77
A maioria das interpretações para as cores ou não-cores, as quais predominam neste texto 
estético, atribuem valor negativo para o preto e positivo para o branco, embora o preto possa aludir 
sentidos como o de noite, boa conselheira, e o branco possa passar a noção de luto, como acontece 
entre os orientais. 
De outro modo, o preto tem sido visto como sinal de peso, no sentido de poder e 
respeitabilidade. Neste texto, em um dos seus lados, o esquerdo, o branco é usado para dar destaque 
aos produtos anunciados, nos quais o preto predomina; no outro lado, o esquerdo, o preto é utilizado 
para destacar forma e conteúdo de um verbal, parte integrante do texto publicitário, o qual remete ao 
lado direito, por ter forma análoga e conteúdo relacionado, que é onde os produtos anunciados estão 
expostos. 
Em síntese, temos uma figura simétrica repetida à esquerda e à direita, ou seja, uma forma 
estreita longitudinal, sobre uma base espessa, associando o branco e o preto. Para que se possa estudar 
as intra-relações entre os elementos de um mesmo código, isola-se a imagem fotográfica, situada no 
plano da direita, que passa a consistir em um recorte do texto publicitário em análise, deixando o todo 
para mais adiante. 
No retângulo de fundo branco, há uma imagem que se caracteriza pela simetria e pelo 
equilíbrio axial, ou seja, pode-se traçar um eixo no seu meio, e se obterão duas metades semelhantes e, 
neste caso, iguais. Sobre uma invisível superfície horizontal, que não se distingue de um suposto fundo 
vertical - pois ambos os espaços são brancos - está um tinteiro com formato quadrangular, do qual se 
vê a face frontal, em primeiro plano. Esta face do tinteiro possui uma base preta, da qual se vê apenas a 
parte frontal, e como se situa abaixo do olhar do leitor, apresenta-se na forma de um pequeno retângulo 
horizontal. A forma adquirida por esta base foi possível porque o olho da objetiva foi 
centralizado em relação aos lados do tinteiro e também centralizado com 
relação a toda a imagem fotografada, composta por um conjunto de dois objetos: o 
tinteiro e, acima dele, a caneta.
 A parte superior do tinteiro também é preta, levemente côncava e sobre ela aparecem a boca, 
por onde se introduz a caneta para sugar a tinta, em segundo plano, bem como a tampa aberta do 
tinteiro, já em quarto plano. Contrariamente à parte inferior, e em função do foco escolhido pelo 
fotógrafo, a parte superior é visível e, embora preta, adquire tonalidade prateada em função do artifício 
da pulverização de gotas d’água sobre ela, juntamente com o efeito da luminosidade que incide sobre 
esta parte superior do tinteiro. Nela ainda se vê, em primeiro plano, uma forma preta, que se situa, 
portanto, na face frontal da parte superior do tinteiro; é uma forma análoga à parte visível da base, 
coincidindo com ela em largura e altura; difere, apenas, do retângulo da base, em função de uma leve 
78
curvatura no contorno do lado superior. Anulado pela transparência do vidro, o espaço entre as duas 
barras pretas horizontais quase paralelas é ocupado pelo branco do fundo.
No segundo plano de profundidade, visível através do vidro transparente que o contém, está 
um cilindro cheio de tinta azul, azul que gera efeitos de profundidade e de infinito. Duas linhas 
verticais e laterais em relação ao cilindro informam que a peça transparente que forma o corpo do 
tinteiro é maciça, e que o cilindro foi nela lapidado ou deixado vazio, dependendo da técnica de 
fabricação utilizada, sendo que vazio é uma das interpretações possíveis de azul, o que aqui geraria 
uma redundância.
Ainda neste plano de profundidade, vê-se a boca do tinteiro, composta por semi-
circunferências concêntricas que se sobrepõem: na parte inferior, colado à parte superior do corpo do 
tinteiro, há uma semi-circunferência preta, mais larga, logo acima uma dourada, estreita, depois outra 
preta, da mesma espessura do que a dourada anterior, após outra dourada mais larga e irregular nos 
contornos, sobre ela mais uma preta, estreita, outra dourada e, finalmente, uma preta, com diâmetro 
menor. Esta peça, a boca do tinteiro, adquire a textura de rosca e, acomodada sobre a parte superior do 
tinteiro, contrasta com a forma da parte externa que lhe é inferiore quadrangular e, ao mesmo tempo, 
rebate a forma de semi-circunferência do cilindro interno que contém a tinta azul.
Além dos dourados do tinteiro e da caneta, bem como os detalhes em prata na pena e o prata 
da luminosidade da parte superior do tinteiro, que rebate e valoriza o prateado da pena, este azul é a 
única cor deste texto publicitário. Ele está no cilindro do tinteiro e é rebatido no reservatório de tinta da 
caneta, que é aparente neste modelo, o que vincula um objeto a outro. Tudo o mais é preto ou branco.
No terceiro plano de profundidade, está o outro objeto do conjunto da imagem, a caneta. O 
foco da máquina parece ter se dirigido, exatamente, para o pequeno ponto vazado da sua pena, o que o 
faz com que ambos cresçam em importância, o ponto e o foco. Através de um artifício fotográfico, 
provavelmente uma fotomontagem, a caneta está, verticalmente, como que 
flutuando sobre o tinteiro. Pronta para ser usada, a pena está à mostra e a tampa foi colocada 
na extremidade oposta à da pena, que no caso desta foto é também a extremidade superior da 
fotografia. 
No entanto, existe uma ambigüidade: o ângulo de visão não deixa claro se a caneta está 
efetivamente no ar, uma vez que a tampa aberta do tinteiro serve de fundo à pena; assim situada, frente 
ao círculo preto que tem inserida, como um friso, uma circunferência dourada - a qual rebate o dourado 
da pena - não se sabe se a caneta está presa à tampa ou solta no ar. O ângulo de visão frontal impede a 
visão da tridimensionalidade dos objetos e sua real localização no espaço. A segunda hipótese 
79
ofereceria uma idéia inverossímil do produto, uma caneta voadora; a primeira, lhe confere mais 
credibilidade e estabilidade; esta é a impressão que prevalece, inicialmente.
A pena da caneta tem design tradicional: as linhas laterais, de cima para baixo, abrem-se 
levemente e fecham-se em seguida, formando dois pequenos ângulos laterais e depois, um ângulo 
agudo, ao se encontrarem no ponto a ser utilizado na escrita. É a manutenção da forma da pena de 
animal, originalmente utilizada para a escrita, que traz da pluma o simbolismo de poder aéreo, superior 
ao mundo terrestre. Talvez aí esteja o porquê de a caneta parecer estar no ar. Mantém-se a 
ambigüidade.
A pena apresenta uma faixa prateada interna e paralela às bordas, que assim sendo, também 
indica a ponta da caneta. O dourado, muito utilizado nestes objetos, presentifica o ouro, o mais nobre 
dos metais, que através da história tem assumido significados de divino, da perfeição, de Deus, do 
conhecimento, da imortalidade, da felicidade, da iluminação, enfim, alude às noções de princípio ativo, 
macho, solar, diurno, ígneo, quente, enquanto que a prata é considerada feminina, lunar, que emana 
sentidos como o de água e o de frio. Se o ouro é a metalização das cores quentes e se a prata é a 
metalização do branco, não é difícil perceber por que, através dos tempos, receberam, ouro e prata, 
essas conotações. Mas o prateado pode, ainda, sugerir efeitos de significado como o de sabedoria 
divina, a pureza, e também o objeto cobiçado, pois a prata, em francês, é l’argent, do latim argentum, 
nome que é dado ao dinheiro, assim como o é la plata, em espanhol, e mesmo prata, em 
português, ainda que com um uso mais restrito, é sinônimo de dinheiro.
No centro dessa pena há um pequeno ponto vazado, que é o foco da máquina fotográfica; dele 
sai uma pequena linha reta vertical vazada, em direção da ponta da pena. Pequenas marcas, ilegíveis, 
estão impressas sobre a pena, provavelmente especificações técnicas da marca e do modelo da pena ou 
da caneta.
Ao continuar o trajeto de baixo para cima na foto, encontra-se o corpo da caneta, com o 
reservatório de tinta azul à mostra e semi-encoberta pela sua tampa, na extremidade superior. A caneta 
é preta e a tampa, também preta, sendo que esta apresenta detalhes em dourado: na parte inferior, três 
linhas paralelas são as circunferências que circundam a tampa cilíndrica, outra linha aparente mostra 
outra circunferência situada próximo à ponta arredondada da tampa. Esta linha rebate as outras três 
linhas douradas da parte inferior da tampa da caneta e também as da boca do tinteiro; ela ainda marca o 
início ou o fim de uma forma vertical, a da haste dourada que permite à caneta ser presa a um bolso. 
Eis aí outra cadeia de significação: no nível cromático, ouro e prata associam-se, formando a 
figura de uma seta que aponta para um conjunto de anéis dourados. 
80
Na extremidade da tampa, quase imperceptível, em função do ângulo de enquadramento 
escolhido pelo fotógrafo, está, em dourado, a marca da caneta. É uma tradução de 
floco de neve em forma de flor, o que pode ser deduzido se se comparar suas bordas, 
parcialmente visíveis com as da flor idêntica que compõe a logomarca Mont Blanc, a qual pode ser 
vista no canto inferior direito do texto, no retângulo oposto, à direita.
No quarto plano de profundidade pode ser vista a tampa aberta do tinteiro, igualmente preta, 
inserindo uma circunferência dourada e tendo a forma de círculo. Ela é a moldura da pena da caneta; 
sua circunferência dourada rebate o dourado predominante na pena e o negro contrasta com ambos os 
elementos dourados, bem como com o prata da pena. Nesta sobreposição de formas ainda se observa o 
contraste das linhas quase retas da pena e da extremidade pontiaguda com a circularidade do negro e da 
linha dourada na tampa.
A circularidade da tampa também destaca o pequeno ponto central da pena da caneta, que é, 
na verdade, o centro do círculo formado pela tampa, além de centro do foco da máquina fotográfica em 
direção à imagem fotografada. Esta sobreposição da pena da caneta sobre a tampa do tinteiro faz com 
que os dois objetos se tornem estreitamente vinculados, umbilicalmente ligados. 
O limite inferior da caneta, após a pena, pertence a um plano anterior e parece estar apoiado 
na parte superior da tampa, evitando a noção de que a caneta está em suspenso. Isto dá unidade aos 
dois objetos e estabilidade à caneta pois, caso contrário, seria frágil seu equilíbrio sobre o ponto que é a 
ponta da pena, uma vez que a caneta está em posição vertical. 
A circularidade deste elemento central, a tampa do tinteiro, estabelece relações análogas com 
o terminal da tampa da caneta, no alto da imagem e também com as semicircunferências formadas pela 
boca do tinteiro e com a base do recipiente que contém a tinta azul, no interior do tinteiro, em termos 
de forma; no que toca às cores, a boca do tinteiro rebate o preto e o dourado da ponta superior da 
tampa da caneta e a boca do tinteiro, contrastando com a cor do cilindro que adquiriu o azul da tinta 
que contém.
Toda esta circularidade contrasta com os retângulos negros da base e da parte superior do 
tinteiro, com as linhas douradas da tampa da caneta - que mesmo se sabendo que circundam um 
cilindro, dados a bidimensionalidade do papel e o ângulo da foto, aparecem como se fossem linhas 
horizontais - e com a discreta linha que marca a base posterior do tinteiro, situada em um quinto plano 
de profundidade; a circularidade também contrasta com as verticais apresentadas no corpo da caneta, 
pela sua haste dourada e pelas linhas laterais quase imperceptíveis do vidro transparente do corpo do 
tinteiro.
81
O fundo branco destaca a figura formada pelos dois objetos e dá a noção de limpeza e 
precisão, o que é reforçado pelas cores da figura. A base negra e os demais detalhes em negro 
conferem seriedade e peso ao tinteiro, o que é quebrado pela transparência e delicadeza do vidro e dos 
dourados, conseguindo assim efeitos simultâneosde ousadia e conservadorismo: o tinteiro gera, ao 
mesmo tempo, efeitos de sentido que podem se opor, como atual e tradicional, leve e pesado, discreto e 
original. De qualquer modo, o tinteiro é construído, no seu conjunto, como um objeto requintado. Até 
mesmo o azul da tinta, que não faz parte de nenhum dos dois objetos, mas do texto estético em análise, 
está a lhe conferir uma espécie de dignidade aristocrática, já que é um líquido azul, como o é o sangue 
azul. 
Por outro lado, na caneta predominam linhas tradicionais; as formas da pena, do corpo e da 
tampa são as mesmas de canetas fabricadas há décadas atrás, antes da existência das esferográficas. 
Talvez por este motivo ela seja assim, isto é, depois da invasão do mercado por produtos de baixo 
custo, uns sem qualquer preocupação estética e outros com cores e desenhos tendendo ao kitch, o 
produto mais requintado passa a ser o modelo tradicional, originário de um tempo no 
qual todas as canetas eram a tinta. A manutenção do desenho conservador também intui a 
idéia de durabilidade, agregando ao produto a noção de qualidade. Quem tem uma Mont Blanc tem 
uma nova ou uma antiga Mont Blanc? Em ambos os casos, possuir uma Mont Blanc confere 
determinado prestígio social e certo requinte em termos de gosto.
A forma da haste da tampa da caneta e sua posição central e vertical remetem o olhar do alto 
para baixo, onde se encontra a pena da caneta, que tendo a forma semelhante a uma seta, conduz para o 
objeto que está abaixo, o tinteiro. Se penetrar no tinteiro, o que está prestes a acontecer, a caneta 
atravessará sua boca circular, rica em elementos estéticos, que são os círculos concêntricos pretos e 
dourados, de tamanhos diferentes, e mergulhará no azul da tinta; após este trajeto que o olhar 
acompanha, ao chegar ao fundo do recipiente que contém a tinta, a circularidade devolve o olhar para o 
centro da figura, onde há mais detalhes, como os da boca e da tampa do tinteiro, além do círculo 
dourado, a figura geométrica perfeita, situada atrás da pena. Diante dele e circunscrito por ele, está a 
contrastante e pontiaguda pena prata e dourado.
Esse conjunto expresso pela imagem fotográfica pode ser descrito como formado por um 
objeto longitudinal, a caneta, na direção de um orifício, receptáculo onde vai penetrar para sorver o 
líquido do qual depende para desempenhar sua função. A tampa está aberta e a mesma posição que lhe 
permite dar espaço para que a pena seja introduzida é a que lhe faz ser contraste, moldura e fundo desta 
forma estética, a pena, tão valorizada na composição que é seu ponto central.
82
Ao dar início à busca das articulações intertextuais, olha-se para os dizeres à direita do plano 
esquerdo, em fundo branco. Na primeira linha, a identificação da caneta através de nome e 
número do modelo; na segunda, ambas em negrito, a informação de que o tinteiro é de 
cristal. Nas duas linhas seguintes, não mais em negrito, fica-se sabendo que os dois objetos 
podem receber gravação do nome do proprietário; nas três posteriores, sabe-se que 
os produtos estão disponíveis nas boutiques Mont Blanc e revendedores autorizados em todo o mundo. 
Na última linha, sempre mantendo o princípio da economia de palavras, lê-se o número telefônico da 
assistência técnica, com prefixo que denota que a ligação é gratuita. 
O que mais dizem essas palavras? Nova rede de significados emerge, decorrente das 
articulações desse texto informativo com as imagens que lhe acompanham. As informações têm função 
estritamente comercial e foram colocadas discretamente, com tipos muito pequenos. Em tudo esses 
dados são coerentes com a elegância do texto e reforçam a idéia passada pela imagem: requinte, 
tradição, exclusividade, status social. O tinteiro não é de vidro, como pode parecer pela 
imagem; é de cristal; houve a necessidade de dizê-lo para complementar o que a imagem não consegue 
dizer. A possibilidade de gravação personalizada, torna os produtos ainda mais exclusivos. Omitem-se 
as palavras “à venda em”; o texto verbal diz apenas: “nas boutiques...e nos revendedores autorizados”. 
Isto quer dizer que não são vendidas em qualquer lugar, mas ainda assim não omite que esses lugares 
especiais existem em todo o mundo. Por último, um número de telefone com ligação gratuita à 
disposição do futuro proprietário, para lhe garantir que a empresa fabricante se preocupa com o 
perfeito funcionamento e a durabilidade do que anuncia. 
Em síntese, os produtos aparentam ser de boa qualidade e duráveis, mas não estão ao alcance 
de qualquer pessoa. É preciso recursos financeiros de certa monta para adquiri-los. Isto não é 
apresentado claramente, mas fica implícito no tipo de mídia escolhido para veiculação, uma revista; 
pelas características da revista, como qualidade de impressão, papel, matérias apresentadas e pelo seu 
próprio nome; pelos elementos visuais e verbais utilizados, que não parecem atraentes ou 
compreensíveis para qualquer indivíduo.
Outras relações são encontradas, atendo-se, agora, ao retângulo da direita, de mesma 
dimensão que o anteriormente estudado, porém tendo o negro como fundo. Esta é a primeira imagem 
com a qual se depara o leitor da revista, o público ao qual se destina a publicidade, pois está à direta da 
página, na parte que primeiro é visualizada quando se folheia a revista, a qual tem as páginas presas 
pela esquerda. E se o negro não lhe despertar a curiosidade por ser uma página predominantemente 
83
negra, diferenciada da maioria das outras páginas da revista, provavelmente o contraste do branco das 
letras e a forma que assumem no espaço retangular irão fazê-lo. O que surge do negro?
Um poema de Gertrude Stein: são palavras entre aspas, e seu nome está colocado, em tipos 
menores, logo abaixo do poema. O quê diz o poema? Escrever é escrever é escrever é 
escrever... é escrever, sendo oito vezes repetido o verbo.
Esta repetição do verbo escrever no infinitivo, que sugere uma tarefa interminável, merece 
outro nível de aprofundamento, já que se trata de uma ação reiterada, no poema descrita. Na imagem 
publicitária está transcrito o que foi escrito pela poetisa: escrever é escrever, é escrever, é escrever...”. 
De saída, uma alusão à durabilidade da caneta. Em seguida, gera também o sentido de 
disponibilidade necessária, permanente e incansável, que a tarefa do escritor exige, significados que 
então se articulam. Por outro lado, escrever é escrever, isto é, a frase propõe-se a definir um conceito 
de escrever e acaba por não defini-lo objetivamente, apenas repetindo que escrever é escrever, o que 
talvez pudesse ser mesmo uma definição. Na definição sem definição concreta, escrever é aquilo que 
bem sabe o que é quem já sabe escrever. Escrever e ler. E ler em inglês. Há um sentido restritivo na 
intencionalidade de não conceituar claramente o ato de escrever como há no uso de um idioma 
estrangeiro.
Outro efeito de sentido pode ser assim estabelecido: mesmo que o futuro usuário não seja um 
amante da escrita, ele pode adquiri-lo através da caneta, pois ela se identifica com determinado status, 
o qual é transferido para quem a utiliza. 
O poema não está em português, mas em inglês. Ora, a revista é brasileira; logo, a manutenção 
do texto em inglês está, automaticamente, limitando o acesso ao seu significado para os que conhecem 
uma segunda língua. De outra sorte, escrito na língua inglesa, o poema apresenta, na leitura, um ritmo 
de valsa. Embora a valsa seja considerada como um gênero popular, historicamente adquiriu 
conotações socialmente distintas. Definitivamente, o texto publicitário não sedestina a todos ou a qualquer um.
Um dado bastante instigante desta peça publicitária é o fato de que o poema, da maneira que 
foi distribuído na página, apresenta aproximadamente, em termos de forma, as mesmas dimensões e os 
mesmos contornos do que os da imagem delineada pelo conjunto da caneta com o tinteiro, ou seja, uma 
parte longitudinal, simétrica, formada por uma ou duas palavras “To; write; is to; write; is to; write, 
desenhando a caneta. No final do poema, apresenta-se um número maior de palavras por linha, to write 
is to write is e to write is to write, desenhando duas barras como os dois retângulos horizontais que 
compõem a base e a parte superior do tinteiro, em preto, na imagem fotográfica. Entre as duas imagens 
de contornos idênticos há, reciprocamente, a tradução verbal do visual e do visual ao verbal, propostos 
84
em códigos distintos, isto é, um mesmo significado, a caneta e o tinteiro, é partilhado por dois 
significantes específicos: a imagem fotográfica e a imagem do poema visual. 
Em diversos aspectos, a parte direita do texto publicitário, a que contém o texto poético, 
estabelece inter-relações com o texto visual da esquerda e mesmo com as informações publicitárias 
colocadas na parte inferior daquela imagem. A exclusividade do uso do preto e do branco imprimem a 
idéia de poder, sobriedade e finesse; são as cores que predominam no texto inteiro, tanto no retângulo 
direito quanto no esquerdo, e são também as cores utilizadas em trajes de noite para homens em 
cerimônias elegantes. 
Mesmo a escolha de um poema reitera o status pretendido para o produto, bem como para 
seus potenciais consumidores, pelos designers dos objetos e pelos criadores da propaganda, 
independentemente do tipo do poema que fosse, uma vez que a linguagem poética, ainda que verbal, 
não é da mesma forma acessível como a linguagem verbal corrente. No entanto, neste caso, forma, 
conteúdo, idioma e colorido interpõem seus significados para reforçar outros já explicitados, o que 
contribui para a unidade e a coerência interna deste texto publicitário que pode parecer inicialmente 
fragmentado em linguagens e partes diversas. Ainda cabe, nesta imagem, observar seu canto inferior 
direito; ali se encontram a logomarca da Mont Blanc e seu slogan, “the art of writing”.
Outras teias de efeitos de sentido podem ser buscadas. Mont Blanc, é sabido, é o monte que 
possui o pico mais alto da Europa, sendo conhecido ainda com o nome de Monte Bianco, na parte que 
ocupa o território italiano. Mas a marca é Mont Blanc, o que denota a referência à parte francesa do 
monte e a intenção de, ao adotar seu nome, relacionar a marca a essa parte da paisagem alpina. 
Observem-se as relações passíveis de serem estabelecidas: primeiramente, aos pés do Mont Blanc estão 
as mais elegantes estações de esqui européias; em segundo lugar, no alto deste monte, situa-se a 
Aguille du Midi, marco pontiagudo cuja visitação pode ser tão almejada quanto pode ser almejado 
possuir uma caneta desta marca. A pena da caneta ou a própria caneta podem ser uma alusão daquela 
Aguille. Em terceiro lugar, nada melhor para escrever do que uma superfície branca, do mesmo branco 
que possuem as superfícies nevadas. O simbolismo do nome Mont Blanc se completa, na sua 
logomarca, com um floco de neve em forma de flor, acima e após a palavra “mont”. É a mesma forma 
que está sobre a tampa da caneta, em dourado, na imagem fotográfica do retângulo da esquerda.
Um último nó de significados a ser observado é o slogan da Mont Blanc: the art of writing , o 
qual também é gerador de inter-relações neste texto: aí está, com todas as letras, o porquê do uso do 
poema de Stein. No slogan surge o conceito que o poema promete, mas não explicita: escrever é 
arte. Arte que a arte escrita, a poesia, não descreve. Ela é. Além disso, estando 
em inglês, reforça a idéia de que se trata de um produto para cidadãos internacionalizados, uma vez que 
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outras multinacionais radicadas no país, dependendo de seu público alvo, traduzem seus slogans para o 
português. 
86
UM DIÁLOGO ENTRE DESIGNERS:
 PUBLICIDADE, MODA E UM FRASCO DE PERFUME
Depois de ter analisado o vidro de Hot Couture, vamos ver o anúncio do mesmo perfume. A 
publicidade de Hot Couture mostra uma mulher longilínea, sobre a qual está sendo feito um vestido 
com tecido cor-de-rosa. É o exercício da técnica conhecida, mesmo em português, como moulage, que 
consiste em talhar e alinhavar (ou alfinetar), ou seja, moldar o traje diretamente sobre o corpo de um 
modelo vivo. Existe um foco de luz sobre os elementos que compõem a cena, que vem da frente e da 
direita de quem olha, o que pode ser observado pelo jogo de claro e escuro sobre o corpo, nas dobras do 
tecido e no fato de cinco mãos estarem aparentes e em atividade, embora seus respectivos corpos não 
apareçam. Todo o fundo é negro, é sombra.
São três mãos à esquerda de quem olha, e duas à direita. Começando pelas da esquerda, a que 
aparece mais no alto, próxima ao quadril da manequim, parece estar segurando um alfinete. A segunda, 
que se situa mais abaixo do que a anterior, na altura da coxa, mostra o pulso com uma almofada para 
alfinetes em vermelho, e alguns alfinetes espetados, dos quais só se vêem as cabeças. Essas duas mãos 
parecem pertencer à mesma pessoa. Uma outra mão, maior, na altura do joelho, segura uma tesoura 
aberta que forma um ângulo, sendo que uma das pontas toca de leve o tecido. As duas mãos, as quais 
estão mais no alto do que a terceira, estão com os dedos abertos, formando ângulos que têm a abertura 
voltada para a mulher.
As mãos que aparecem à direita de quem olha parecem pertencer a uma mesma pessoa. Estão 
esticando o que pretende se passar por uma fita métrica: uma reta cinza. Os dedos dessas duas mãos 
estão abertos, formando ângulos que têm a abertura direcionada para a mulher. Além do pequeno 
detalhe da almofada vermelha, apenas quatro cores estão presentes nesta publicidade: o rosa no tecido 
e, em um tom mais escuro, no slogan; o cinza (ou seria o prateado?) na tesoura, na fita métrica, nos 
sapatos de salto alto, na palavra HOT e no vidro de perfume; o branco, na palavra Couture; e o negro, 
que cobre todo o fundo e o chão, sem deixar que se perceba diferença entre eles.
O braço esquerdo da manequim está dobrado para cima, formando um ângulo agudo e 
sugerindo que a mão está atrás da nuca. O braço direito está para baixo, levemente dobrado, formando 
um ângulo obtuso, e a mão está pousada na lateral da parte superior da coxa, deixada à mostra. O 
tronco da mulher está em diagonal na bidimensionalidade da fotografia, e todo o seu corpo está em 
diagonal no espaço, deduzido pelos efeitos de luz e sombra, pelo contorno do tronco e pelo fato de que 
sua perna esquerda está na frente e é mais comprida do que a perna de trás, a sua perna direita. E 
87
percebe-se que o quadril está deslocado para sua direita – ou esquerda de quem observa – em função do 
contorno.
O tecido rosa cobre o corpo da mulher, da altura do decote até o início da coxa. Daí em 
diante, a perna direita está já coberta, mas a da esquerda, não. O decote é baixo, horizontal, e deixa uma 
parte dos seios a mostra. A parte do tecido que já compõe o vestido possui muitas dobras, algumas 
seguras por meio de alfinetes, as quais se apresentam como retas, na maioria, horizontais. Metros e 
metros de tecido estão espalhados no chão, formando mais dobras, contornando a modelo por trás, até 
chegar onde está o resto da peça, ainda enrolada e o respectivo rolo de tecido, que, em diagonal, como 
que coloca um ponto final na trajetória do tecido e mesmo na própria publicidade, pois se situa na parte 
maisà direita e mais inferior de quem observa. O tecido espalhado no chão apresenta dobras, que 
formam ângulos, determinados pelas linhas de contorno e pelos efeitos de luz. Sobre o rolo de tecido, 
fruto de um procedimento posterior de montagem, está o vidro de Hot Couture, com sua dimensão 
desproporcional em relação à cena, uma vez que está em uma escala maior do que o conjunto 
anteriormente descrito. 
Sobre o vidro, está o nome do perfume: a palavra HOT em cinza, a palavra Couture em 
branco e o slogan, em rosa, le nouveau parfum. Para hot foi usada a mesma fonte da marca Givenchy, 
denominada arial. Mas houve uma intervenção: a letra “O” ficou mais larga do que suas vizinhas “H” e 
“T”. A palavra Couture parece manuscrita. O “C”, maiúsculo, começa como que se enrolando, como 
um fio de linha, no pé do “H” de HOT, e o “t”, toca de leve o “O”.
 
*****
O olhar da mulher está fixo no enunciatário da foto; assim o discurso é na primeira pessoa: a 
mulher não ignora que está sendo vista, ao contrário. Associando-se o olhar à sua pose, o conjunto pode 
passar a idéia de sedução. A cabeça, o rosto, e nele, o olhar, é o ponto de partida para o percurso do 
olhar. Como a cabeça está de lado, ela faz com que o trajeto continue pelo braço direito de quem olha, 
porque uma diagonal pode ser traçada no eixo da cabeça, continuando, sem interrupção, pelo pescoço e 
pelo antebraço, os quais estão chamando a atenção sobre si em função da luminosidade. O olhar 
continua após a pequena dobra do cotovelo, segue até a mão, e aí tem duas opções: o sexo da modelo, 
coberto pelo tecido mas sutilmente marcado por um ângulo mais escuro, definido pelas dobras e 
luminosidade, é a primeira. E a segunda hipótese é continuar descendo, percorrer toda a coxa da 
mulher, e aí surgem novamente duas alternativas: sair do corpo, à direita, no meio da perna, para 
88
acompanhar o caminho do tecido até o vidro de perfume; ou acompanhar a perna até o pé, o bico do 
sapato, pulando para a ponta do rolo de tecido e daí para o perfume.
Assim, os principais pontos de atenção são o rosto iluminado da mulher, o vidro de perfume, e 
sua marca. Há o predomínio das linhas retas, muitas delas diagonais; elas formam muitos ângulos. Há o 
rebatimento de ângulos. As quatro mãos e a tesoura são ângulos que se abrem em direção à manequim. 
Mesmo seu braço direito, dobrado à altura da cabeça, reforçado pelo efeito de luminosidade, forma 
mais um ângulo que se abre sobre ela. Todo esse conjunto de ângulos funciona como se fosse uma aura 
em sentido contrário: não é a luz que se espalha, emanando da figura humana; são focos de luz 
direcionados para a pessoa humana. Ou seria para a costura? ou para a criação? Parece mesmo ser mais 
para a moda, pois o traje está em processo, em ato. Por outro lado, há mais de um autor deste ato de 
criar moda, e os autores deste ato não são dados a conhecer. Daí vários efeitos de sentido podem surgir: 
não é importante a autoria do ato de criar moda? Ou o mais importante é a marca, em si, anulando a 
autoria específica, ou seja, Givenchy é Givenchy, tanto no perfume quanto na haute couture? Ou trata-
se da valorização do trabalho coletivo?
Ainda com relação aos ângulos, apenas um deles é o composto pela tesoura. Mas não seria 
exatamente a tesoura que estaria sendo aludida nos demais ângulos agudos? Sendo rebatimentos da 
forma da tesoura aberta, os ângulos recorrentes não estariam a reforçar o sentido de valorização do ato 
de cortar o tecido, uma etapa fundamental na criação de moda, quando o desenho das formas é 
concebido, a partir do plano que é o tecido? Indo mais longe, não seria a forma da tesoura aberta a 
justificativa para o uso de tantos outros ângulos, também no vidro de perfume? 
No que toca à cor, o único elemento na cor vermelha é a almofada de alfinetes. Ela tem a 
forma redonda. Se traçarmos uma linha reta horizontal, da almofada até o logotipo de Hot Couture, 
vamos encontrar a palavra “hot”; assim se associa ao hot o vermelho, o quente, o 
calor, a cicatriz, ao forte. Isto é reforçado pelo fato de a almofada ter a mesma forma do “o” 
de “hot”. São os mesmos círculos encontrados no bolero da mulher que decora o vidro.
O contorno da mulher repete, com pequenas diferenças, o contorno da mulher que decora o 
vidro de perfume. Por exemplo, o braço direito da mulher da propaganda, dobrado à altura do pescoço, 
rebate e lembra a gola alta da mulher do perfume; seu quadril em ângulo repete o ângulo da frente do 
bolero. Mas para que isto ocorresse, foi necessário considerar como frente do perfume não o lado que, 
de acordo com a proposta ergonômica do vidro, seria a frente, mas o lado de trás. Isto talvez tenha 
ocorrido dada a dificuldade de a modelo fazer uma pose análoga à mulher voltada para direita. Assim, 
na publicidade, a mulher do vidro de perfume está com a frente voltada para a esquerda de quem olha.
89
A palavra Couture, grafada com uma fonte que simula ser manuscrita, 
traz a idéia de que a costura é artesanal, manual, única e que tem uma 
assinatura e uma personalidade própria. Escrita em branco, e se destacando por ser o 
único elemento dessa cor, lembra o giz branco, instrumento usado pelos costureiros para desenhar as 
formas e detalhes da roupa, no tecido a ser cortado. Por outro lado, o perfume, em si, não pode ser 
visto; o vidro parece estar vazio; mas a cor rosa do tecido presentifica a cor do líquido. A mulher 
Givenchy é esguia, longitudinal, como o vidro e como a figura principal da sua publicidade. E o vidro é 
um prisma, que evoca a luz, e a luminosidade tem papel fundamental na propaganda. Então, tanto no 
perfume como na publicidade, a mulher Givenchy não é uma mulher qualquer; ela é uma mulher sob 
um foco, uma mulher que se destaca, como diversos elementos e procedimentos fazem-nos perceber.
Enfim, a publicidade de Hot Couture, assim como o design de seu vidro são coerentes entre 
si, em termos de efeitos de sentido: eles passam a noção da ambigüidade que vive a mulher atual, entre 
a feminilidade e a masculinidade. A feminilidade está na cor rosa e nos pratas (que na propaganda 
aparece como cinza); nas bolas ou pois; na gola alta, nos cuidados com a mulher, no vidro colocando-a 
em um nicho, e na publicidade, focando-a tanto com a luminosidade de fato, em meio a um fundo 
escuro, quanto com os focos das mãos em sua direção; está ainda no Couture, fonte que simula uma 
delicada palavra manuscrita. A masculinidade está na firmeza das retas, está nos ângulos, tanto no 
vidro de perfume quanto na publicidade; está na palavra HOT; está na postura corporal destemida e no 
olhar da mulher que encara o enunciatário.
O perfume é um produto de luxo acessível; a moda, principalmente a haute couture, um 
produto de luxo inacessível. Assim, Hot Couture oferece à mulher a possibilidade de 
acesso ao mundo inacessível, ainda que através de um produto volátil. É 
forte a associação entre o perfume e a moda. No perfume, a silhueta feminina apresenta vários 
elementos de identificação Givenchy: a estrutura alongada, a gola alta, a sobre-saia; afinal, ali está 
presentificada uma imagem feminina bem vestida. E a publicidade se ocupa, da mesma maneira, da 
moda.
*****
Existem diferentes versões da mesma propaganda e tivemos acesso a três delas: uma 
publicação em uma revista popular brasileira, outra, em uma revista de bordo de uma companhia aérea, 
em um vôo internacional (a que foi usada para a análise, por suas condições técnicas serem melhores), 
e a terceira, uma foto tirada de um cartaz, em um ponto de venda, em Paris. Há diferenças entre elas, e 
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vale a pena observar. Entre a primeira e a segunda, existem três diferençasbásicas, quais sejam, a 
dimensão da imagem, em si, a posição do logotipo da marca, e a dimensão do vidro de perfume. 
Na revista popular, a propaganda ocupa duas páginas. A mulher, o tecido rosa que envolve 
seu corpo e cai no chão, e as mãos que se direcionam para ela, ocupam a primeira página. A segunda 
página mostra a marca Givenchy no alto, na cor branca, contrastando com o fundo negro. Logo abaixo, 
a marca do perfume, Hot Couture, e a expressão le nouveau parfum. Mais abaixo, em primeiro plano 
em relação ao tecido rosa que se estende pelo chão, da primeira página para a segunda, está uma 
reprodução do vidro de perfume e, em seguida, colocado como de um modo naturalmente displicente, 
está o rolo de tecido rosa. O topo do vidro de perfume, se traçada uma horizontal em direção à primeira 
página, atinge o quadril da mulher. 
 Na revista de bordo, a mesma foto não parece ter sido cortada, para ocupar menos da metade 
do espaço, em relação à anterior. É a mesma foto, mas ela foi reduzida na sua largura, provavelmente 
fruto de efeito computadorizado, ou a anterior foi alargada, com o mesmo processo. Nesta segunda 
versão foi ainda reduzido o tamanho do vidro de Hot Couture: traçando-se uma linha horizontal do seu 
topo em direção à imagem da mulher, ela atinge seus joelhos, e não o quadril, como na versão anterior. 
Na propaganda publicada na revista de bordo, a foto foi colocada dentro de uma moldura branca. No 
alto da moldura, à direita, aparece a assinatura da companhia e da revista; em baixo, à esquerda, em 
preto, contrastando com o fundo branco, e em dimensão muito menor do que na versão da revista 
popular, está a marca Givenchy; à direita, dentro de uma circunferência traçada em uma linha negra e 
muito fina, está o nome do perfume, a informação que um vidro de 50 ml com spray custa 44 dólares 
americanos e uma informação com caracteres orientais. A circunferência é traçada sobre o ângulo que é 
formado pela ponta direita inferior da foto; assim, no espaço de intersecção entre a circunferência e a 
foto, consta, em branco e em caracteres muito pequenos, o site da marca Givenchy.
Na terceira versão, novas diferenças, embora se perceba que a fotografia que originou as três 
versões é a mesma, pois todos os detalhes da mulher e das mãos que a cercam são idênticos. Assim, as 
diferenças foram pós-produzidas, adequando cada propaganda à respectiva mídia e fatia de mercado. 
Na versão criada para os pontos de venda, o fundo da foto não é mais negro, mas rosa, um tom mais 
claro do que o rosa do tecido. As dimensões são maiores, para permitir a visibilidade de pontos mais 
distantes do que aquele de um leitor de revista. Nesta foto da terceira versão, a marca Givenchy está 
acima da mulher, no alto da foto, em cinza; o vidro de perfume não aparece na foto, mas está – supõe-
se – dentro da sua embalagem, colocada diante do cartaz, sobre uma espécie de bandeja de acrílico 
transparente. E por trás da foto, complementando o cartaz, estão quatro retângulos colocados em quatro 
posições diagonais distintas; eles têm texturas e cores diferentes; suas bordas formam sucessivos 
91
ângulos, como que cortados por uma tesoura de um profissional da costura; assim construídos, estes 
quatro retângulos presentificam quatro amostras de diferentes tecidos: preto, prata com pois, rosa liso e 
rosa com textura. E esse efeito de amostra de tecidos foi o mesmo conceito usado para colocar o título 
de Hot Couture, na embalagem do vidro.
 Na revista popular, a logomarca Givenchy domina, pela dimensão, cor/contraste e situação na 
página; duas páginas são usadas, para concentrar mais a visão sobre um único texto visual; e o vidro do 
perfume está em escala maior do que na versão da revista de bordo. As diferenças entre aquela versão e 
a da revista de bordo passam a noção de que o ou a consumidora da revista do avião já conhece a 
marca, pois a publicidade é bem menor e a marca é muito mais discreta. Deduz-se que há a 
intenção não só de anunciar o perfume, mas igualmente de divulgar e 
firmar a marca. E a propaganda do ponto de venda abandona o contraste da imagem com o fundo 
preto. O rosa de fundo ao mesmo tempo ameniza a visualização e torna o espaço da imagem 
publicitária mais integrado ao ambiente comercial. E a caixa do perfume está ali presente, fazendo 
parte do conjunto da peça publicitária; ambas as estratégias aproximam o ou a consumidor(a) do 
produto. 
92
THE END
Por que é tão difícil terminar (qualquer coisa)? Coisas que achamos ruins, exatamente porque 
não gostamos, ficamos adiando, adiando, adiando o seu fim. Coisas boas, não queremos 
que acabem.
No mundo acadêmico, há um certo preconceito pelo título “Conclusão”, para finalizar 
dissertações ou teses, pois pode parecer pretensioso (e, às vezes, é). Então, criamos eufemismos como 
“Considerações Finais”; “Últimas Reflexões”, coisas assim. Mera hipocrisia, pois o conteúdo não 
muda, só o título.
******
Daí eu começar este difícil finalizar com estas considerações, intitulando-o de THE END. 
Esta expressão inglesa remete, ou alude, ou atualiza, ou sintetiza, ou figurativiza, ou presentifica – sei 
lá, protagoniza alguma ação semiótica – que me leva ao passado ou que traz ao presente o cinema, o do 
escurinho, aquele com final feliz, da ilusão da felicidade, do mundo ideal, do amor que dá certo, aquele 
da infância e da adolescência, sem a necessidade de Estatuto. Aquele fim de filme concluído sem dó 
com um The End escrito com a fonte que chamamos de Blackadder ITC, linhas em forma 
de palavras que se distanciavam do nosso olhar para, semioticamente, dizer isto mesmo: que nós, 
espectadores, não podíamos alcançar o fim, que o filme iria terminar, não obstante a nossa vontade de 
ver as pessoas vivendo felizes para sempre, como éramos dados a supor, aliás, que seriam felizes 
merecidamente, depois de todas as intrigas do enredo. E todos tínhamos nossa frustração de meros 
espectadores sublimada por aquele The End fugidio, que prometia tudo aquilo que eles 
não mostravam, mas que nós, espectadores, éramos capazes de imaginar. 
*****
Depois, expressões em língua estrangeira passaram a ser mal vistas, e aquelas em inglês, 
consideradas “anglicismos” ou “americanismos” (com um ar de desdém). Depois, passaram a ser 
“dominação cultural”. Mais tarde ainda, “politicamente incorreto”. 
Junto com a falta de preconceito em relação ao final feliz se foi nossa infância, nossa 
adolescência, nossa ingenuidade, nossa esperança, nossos sonhos; também a crença de que se pode 
terminar bem uma coisa legal....
93
Terminar uma relação afetiva, por melhores momentos que se tenha vivido em conjunto, 
todos que passaram por isto dizem ser uma experiência terrível. Esta experiência falta no meu 
currículo, mas em compensação, experiência mais rica é ter um cobaia-mor, parceiro solidário de 
um regime de tolerância máxima, que após ler estes originais me falou: “Falta um fim (entre outras 
coisas)”! Pensei, desesperada: “Ah, meu Deus, ‘O’ FIM!” 
*****
Bem, vocês leram aqui algumas partes de dois trabalhos acadêmicos, um de doutorado e outro 
de “post doc” (e aqui, mais do que por obrigação, quero lembrar que fui bolsista da CAPES no 
doutorado e do CNPq no pós-doutorado). Obrigada, povo brasileiro, pois com seus impostos 
possibilita a essas agências ajudar os pesquisadores do nosso país, mesmo que ninguém lhe consulte ou 
esclareça sobre a importância disto.
Fiz nos trabalhos em si, e depois, nos textos, várias lipoaspirações, onde gordura foram 
consideradas as citações, os conceitos pouco conhecidos e mesmo as construções de frases mais 
rebuscadas...Foi tudo para a lixeira.
*****
Eu sou apenas uma modesta “tia de artes” metida, assim como a Semiótica é uma “ciência” 
metida, porque se “intromete” (são os pesquisadores que a levam) em todas as áreas do conhecimento 
humano para tentar ajudar, da medicina às artes, da física quântica à exegese, da hermenêutica à 
estética... 
Mas meu entusiasmo é crescente em relação às idéias aqui contidas porque, como professora, 
na graduação e na pós-graduação, ou orientando meus alunos para aplicar com crianças esta proposta, 
percebo como a prática desta espécie de leitura altera a capacidade de ver, apura o olhar e faz o que é 
mais importante para mim, que é especializar o potencial de extrair das imagens 
seus significados. Em cada turma que dou aula, repito o teste: mostro uma imagem e peço que 
escrevam sobre ela. Ao final do semestre, repito a operação. Depois, eles mesmos se avaliam.
O Design é uma área nova, no âmbito da academia. Tanto é que muitos dos mais famosos 
“designers” da contemporaneidade são arquitetos, ou vêm de outras formações de conhecimento. Mas 
os designers de hoje já “nascem” designers; além do que, já iniciam a criar sob a égide da objetividade 
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e da síntese, ou seja, sob o ritmo, o nível de reflexão e sob a ética de autoria de uma época vivida com 
Internet, ou seja, onde nada é privativo (exclusivo), um valor que foi acalentado durante séculos. 
Sequer o conhecimento é privativo, pois a autoria, porque difícil de comprovar, perde seu valor.
Daí a satisfação de dar a público estes “textosdesign”.
*****
Além de alunos de Design, meu objetivo, neste trabalho, é atingir a pessoa leiga, o “simples” 
mortal que tenha interesse em discutir idéias sobre objetos estéticos do cotidiano, como moda, design e 
publicidade, sobre arte e cultura; e, se possível, oferecer uma maneira a mais, diferente, para lidar com 
as questões que essa produção determina. Tudo do modo mais simples possível. É claro, não são 
assuntos primários; assim, vez que outra pode exigir um pouco mais de concentração... 
Este trabalho trata do mundo de imagens que nos rodeia, de textos visuais que nos seduzem, 
nos fazem ficar alegres, maravilhados, emocionados, frustrados... são imagens que nos fazem correr, 
trabalhar e comprar mais... Isto porque as imagens “falam”, como pudemos observar. E, se não 
sabemos como falam essas imagens, acabamos não podendo fazer nossas escolhas com liberdade.
Aos prezados colegas da academia: não leiam este livro; vocês irão detestá-lo, achá-lo muito 
simples. Leiam outras coisas que eu escrevi. Este trabalho é, antes, para o cidadão 
comum que não gosta de se sentir mudo diante de uma obra de arte, ou que 
consome produtos no cotidiano e só depois se dá conta de não estar precisando deles; ou que deixa de 
comprar o que é bom porque é muito caro. 
E quanto aos alunos, estes “textosdesign” não são apenas para os de Design, mas aos de 
Arte também, que tanto sofrem tentando entender traduções, às vezes até inadequadas, das mais 
complexas teorias importadas, ou tentando se concentrar em cópias apagadas de idéias já 
ultrapassadas...
95
	UM MODELO PARA LER IMAGENS
	ABAIXO AS REGRAS
	MODA TAMBÉM É TEXTO
	ARGOLAS DOURADAS
	ENQUANTO O ARTESANATO NÃO SE ATUALIZA...
	FRASCOS TAMBÉM SÃO TEXTOS
	ESSÊNCIA DO PARAÍSO NUMA GOTA
	UM PRISMA QUE É MAIS QUE UM FRASCO
	PROPAGANDAS, TEXTOS SINCRÉTICOS
	UMA CANETA “TRÈS CHIC”

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