Buscar

A influência da forma de preparo dos alimentos no desenvolvimento de doenças crônicas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Prévia do material em texto

einstein: Educ Contin Saúde. 2010;8(2 Pt 2): 96-7
Saúde alimentar
Esta seção tem o objetivo de atualizar o leitor em relação à nutrição e saúde alimentar. A alimentação saudável e segura, baseada 
em informações atuais, pode se refletir na qualidade de vida dos indivíduos e nos tratamentos de saúde a ela associados. Nutrição 
clínica, segurança e higiene alimentar, gastronomia e saúde pública serão tópicos desta seção.
Silvia Maria Fraga Piovacari
Editora da seção
A influência da forma de preparo dos 
alimentos no desenvolvimento de 
doenças crônicas
Rosana Maria Cardoso1, Miguel Ângelo de Góes 
Junior2, Bento Fortunato Cardoso dos Santos3
1 Nutricionista do Hospital Israelita Albert Einstein – HIAE, São Paulo (SP), Brasil.
2 Médico do Centro de Diálise Einstein do Hospital Israelita Albert Einstein – HIAE, São 
Paulo (SP), Brasil. 
3 Gerente Médico do Centro de Diálise Einstein do Hospital Israelita Albert Einstein – HIAE, São 
Paulo (SP), Brasil.
O tratamento térmico de alimentos que contêm açú-
car e/ou lipídios e proteínas pode resultar na produção 
um grupo heterogêneo de compostos com significante 
ação pró-oxidante e pró-inflamatória, conhecidos como 
produtos da glicosilação avançada (AGEs, do inglês ad-
vanced glycation end-products)(1). Os AGEs também são 
formados no organismo sob condições fisiológicas e ge-
rados pela reação não-enzimática da redução de açúca-
res e aldeídos reativos com aminoácidos livres, lipídeos 
e ácidos nucleicos(1-4). Essa reação, conhecida como re-
ação de Maillard, foi assim chamada em homenagem ao 
químico francês Louis-Camille Maillard, que a descre-
veu no início do século 20(1,4). Essa reação, que confere 
importantes características organolépticas aos alimen-
tos, tem impacto importante na saúde. A partir de 1980, 
a fisiopatologia da reação de Maillard ressurgiu no ce-
nário médico, em particular em relação à sua associa-
ção nas complicações do diabetes e envelhecimento(4). 
A formação e acúmulo dos AGEs estão envolvidos 
no desenvolvimento de doenças relacionadas à idade, 
como inflamação, aterosclerose, desordens neurogene-
rativas (como doença de Alzheimer), doenças renais e 
câncer(1-5). 
A reação de Maillard acontece geralmente em três 
estágios. No estágio inicial, ocorre uma condensação 
entre os grupos amina proveniente dos aminoácidos, 
peptídeos ou proteínas e o grupamento carbonila de um 
açúcar redutor, levando à formação da base de Schiff. 
Essa reação, que é instável e, ainda, reversível, podendo 
sofrer rearranjos rapidamente, é seguida pela formação 
de produtos intermediários. O estágio avançado inicia 
com a degradação dos produtos Amadori a carbonilas 
reativas como, cetoaldeídos, dicarbonilas, redutonas, 
entre outros(6). No estágio final, os grupos carbonilas re-
ativos reagem com aminoácidos para formar melanoidi-
nas ou AGEs. Vários produtos de baixo peso molecular, 
resultantes da reação de Maillard como cetoaldeídos, 
glioxal, metilglioxal, 3-deoxiglucosona (3-DG), aminas 
heterocíclicas e acrilamidas vêm sendo descritos como 
tóxicos ao organismo(6).
Os AGEs também podem ser formados pela pero-
xidação lipídica, recebendo a denominação de produ-
tos da lipoxidação avançada (ALEs, do inglês advanced 
lipoxidation end-products)(2). Os efeitos patológicos dos 
AGEs e dos ALEs estão relacionados à sua habilidade 
em modificar as propriedades químicas e biológicas de 
moléculas nativas, pela formação de ligações cruzadas, 
e sua capacidade de ligação a vários receptores celula-
res, promovendo estresse oxidativo celular, ativação de 
células do sistema imune, como NFk-β, e consequente 
produção de citocinas inflamatórias(3,5).
A nutrição é uma importante fonte exógena dos 
AGEs, principalmente na dieta ocidental(5), e o poten-
cial papel biológico destes produtos era ignorado por-
que assumia-se que apresentavam absorção intestinal 
insignificante(1). Aproximadamente 10% dos AGEs pro-
venientes da dieta são absorvidos, existindo uma cor-
relação entre os níveis circulantes e sua concentração 
einstein: Educ Contin Saúde. 2010;8(2 Pt 2): 96-7
97
nos tecidos(2). Desse total, dois terços são depositados 
nos tecidos, onde permanecem biologicamente ativos 
e exercem efeitos patológicos(5). Somente um terço dos 
AGEs absorvidos são excretados na urina, dentro de 
três dias após a ingestão(3). De fato, a ingestão de uma 
refeição com alto teor de AGEs (três vezes maior, com-
parado com a dieta regular) pode elevar os níveis sérios 
dos mesmos em uma vez e meia(3). Em pacientes diabé-
ticos, especialmente aqueles com comprometimento da 
função renal, a excreção urinária dos AGEs absorvidos 
foi marcadamente prejudicada(3). 
Goldberg et al.(2), avaliaram, em 250 alimentos ha-
bituais na dieta americana, utilizando diversos tipos de 
preparo, a quantidade de N-carboximetilisina (CML), 
um AGE formado a partir de precursores como glioxal 
e glicoaldeído pela reação de Cannizzaro(3). Os autores 
observaram que aqueles alimentos ricos em lipídios, 
como manteiga, cream cheese, margarina e maionese 
apresentaram quantidades mais elevadas dos AGEs, 
seguidos de óleos e castanhas. Altos teores de AGEs 
também foram observados em alimentos proteicos, 
como carnes, queijos, seguidos por tofu, peixes e ovos. 
Acredita-se que isto ocorra em decorrência da libera-
ção de radicais livres no decorrer de várias reações de 
lipoxidação, que catalisa a formação de AGEs e ALEs 
durante a cocção de gorduras e carnes(2). A glicoxida-
ção e lipoxidação são promovidas pelo calor, ausência 
de umidade, e presença de metais, fatores importantes 
na produção de gorduras(2). Alimentos compostos basi-
camente de carboidratos, como pães, frutas, vegetais e 
leite apresentaram menores concentrações de AGEs. 
Vários fatores são reconhecidos por afetar a gera-
ção dos AGEs nos alimentos, incluindo a composição 
dos nutrientes, temperatura, umidade, pH e duração 
da cocção(1,5). Métodos de preparo como assar em alta 
temperatura (225°C) e fritar (177°C) favorecem a for-
mação de AGEs, seguidos por assar em menor tempe-
ratura (177°C) e cozer (100°C). O uso de micro-ondas 
demonstrou aumento no conteúdo de AGEs, semelhan-
temente ao método de cozedura (100°C)(2). Esses méto-
dos alternativos de cocção permitem a redução de 50% 
na ingestão de AGEs, mantendo a mesma concentração 
de nutrientes no alimento(2). 
Negrean et al.(5) investigaram os efeitos agudos da 
ingestão alimentar dos AGEs na função vascular de pa-
cientes com diabetes do tipo 2 e observaram nos resul-
tados que, após a refeição com alta quantidade destes 
produtos, foi induzido um prejuízo agudo mais pronun-
ciado na função vascular em comparação aos pacien-
tes que receberam refeições com baixa quantidade de 
AGEs.
Os níveis dos AGEs são elevados em pacientes com 
doença renal crônica, independentemente da presença 
de diabetes, e podem contribuir para alta incidência da 
doença cardiovascular observada nesta população, sen-
do a dieta o maior contribuinte para o pool de AGEs(7).
Em conclusão, a ingestão excessiva de alimentos fri-
tos, assados e grelhados podem superar a capacidade 
natural do organismo em remover AGEs. A tempera-
tura e o método de cocção parecem ser mais críticos na 
formação destes produtos do que o tempo de cocção(2). 
Intervenções, como educação para a população so-
bre modificações na forma de preparo dos alimentos 
– como cozinhar no vapor, na presença de água e em 
baixas temperaturas – parecem ser medidas razoáveis, 
seguras e efetivas na redução da exposição aos efeitos 
tóxicos que os AGEs exercem sobre o organismo(2,3,7), 
causando impacto positivo na saúde de uma forma ge-
ral e, especialmente, nos casos com maiores chances de 
complicações associadas ao seu consumo. 
REFERÊNCIAS
1. Uribarri J, Cai W, Sandu O, Peppa M, Goldberg T, Vlassara H. Diet-derived 
advanced glycation end productsare major contributors to the body’s 
AGE pool and induce inflammation in healthy subjects. Ann N Y Acad Sci. 
2005;1043:461-6.
2. Goldberg T, Cai W, Peppa M, Dardaine V, Baliga BS, Uribarri J, et al. Advanced 
glycoxidation end products in commonly consumed foods. J Am Diet Assoc. 
2004;104(8):1287-91.
3. Yamagishi S, Ueda S, Okuda S. Food-derived advanced glycation end products 
(AGEs): a novel therapeutic target for various disorders. Curr Pharm Des. 
2007;13(27):2832-6.
4. Schalkwijk CG, Stehouwer CD, van Hinsbergh VW. Fructose-mediated non-
enzymatic glycation: sweet coupling or bad modification. Diabetes Metab Res 
Rev. 2004;20(5):369-82.
5. Negrean M, Stirban A, Stratmann B, Gawlowski T, Horstmann T, Götting C, et 
al. Effects of low- and high-advanced glycation endproduct meals on macro- 
and microvascular endothelial function and oxidative stress in patients with 
type 2 diabetes mellitus. Am J Clin Nutr. 2007;85(5):1236-43.
6. Chuyen NV. Toxicity of the AGEs generated from the Maillard reaction: on 
the relationship of food-AGEs and biological-AGEs. Mol Nutr Food Res. 
2006;50(12):1140-9.
7. Uribarri J, Peppa M, Cai W, Goldberg T, Lu M, He C, et al. Restriction 
of dietary glycotoxins reduces excessive advanced glycation end 
products in renal failure patients. J Am Soc Nephrol. 2003;14(3): 
728-31.

Continue navegando