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REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DO CORPO EM EDUCAÇÃO FÍSICA

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CORPO: REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DE MESTRANDAS EM 
EDUCAÇÃO FISICA 
 
SILVA, Morgana Claudia – PEF/UEM - INTEGRADO 
morgana.silva@grupointegrado.br 
 
LARA, Larissa Michelle - PEF/UEM – UEM/PR 
laramlara@hotmail.comr 
 
Eixo Temático: Cultura, Currículos e Saberes 
Agência Financiadora: não contou com financiamento 
 
Resumo 
 
Essa pesquisa toma como ponto de partida o corpo principio da existência humana, e meio 
pelo qual o homem se situa no mundo, constrói suas relações e produz seu trabalho. O corpo 
que tomamos aqui como objeto de estudo emerge da síntese das interpretações dos sentidos 
produzido sobre ele por mestrandas dos cursos de pós-graduação stricto-sensu em Educação 
Física, vinculados às Universidades Públicas do Paraná, na medida em que entendemos ser 
determinante à formação do profissional da Educação Física a identificação dessas 
representações que circulam no imaginário social. Para refletir sobre o corpo nos 
aproximamos da teoria das Representações Sociais, proposta por Serge Moscovici(2003), e 
para definições do percurso metodológico orientamo-nos pelos estudos de abordagem 
qualitativo de caráter exploratório, fazendo uso da técnica de entrevista semi-estruturada. 
Nosso foco deu-se na maneira como as mestrandas produzem sua realidade social, ação 
entendida como uma das condições objetivas necessárias à compreensão dos sentidos das 
representações sociais que têm instituídas em seus imaginários sobre corpo. 
 
Palavras-chave: Corpo. Representações sociais. Pós-graduação. Formação. 
 
Introdução 
A pesquisa desenvolvida toma por base a Teoria das Representações Sociais, proposta 
por Moscovici (2003), no intuito de compreender os sentidos dados ao corpo por mestrandas 
dos Cursos de Pós-Graduação em Educação Física vinculados a universidades públicas do 
Paraná. Por representações sociais entendemos as formas de conhecimentos elaborados e 
partilhados socialmente, que contribuem para a construção de uma realidade comum aos 
diferentes grupos sociais. 
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Tomamos como objeto de estudo as representações de corpo, pois entendemos que 
elas sejam um dos principais determinantes teóricos e ideológicos que fundamentam o 
processo de formação do profissional da área de Educação Física. Pensamos que nesse campo 
veiculam diferentes representações de corpo e que, muitas vezes, a área reforça os modelos 
difundidos socialmente. 
Autores como Camargo et al (2011) apontam que o conceito de corpo abrange 
diversos aspectos, podendo perpassar desde o conceito físico ao imaginário. Porém, como 
ponto de partida, os indivíduos sempre produzem representações que, ao serem partilhadas 
socialmente, determinam as várias maneiras do indivíduo sentir e se relacionar com seu 
próprio corpo. Dessa maneira, ”olhar” o corpo na perspectiva das representações sociais nos 
possibilita compreender a relação que os indivíduos têm com seu próprio corpo. 
Apesar de o corpo ser objeto investigativo observado em Programas de Pós-Graduação 
em Educação Física, sua configuração como foco de pesquisa dava-se em abordagens que não 
tangenciavam o diálogo com as humanidades. Ao fazer uma análise, podemos apontar que o 
corpo, até a década de 1980, era visto pelo campo da saúde e pelas manifestações esportivas, 
passando, após, a ser visualizado como algo a ser cultuado, sobretudo em virtude da 
proliferação e popularização das atividades de fitness que se materializavam nas academias de 
ginástica. 
 Darido e Rangel (2005) apontam que essa preocupação com um corpo saudável tem 
como pressupostos o modelo biológico higienista, porém, com características renovadas, 
apresentando relação direta entre o campo das ciências biológicas e o corpo que parte da 
perspectiva da saúde e da estética. Este ponto foi utilizado como forte argumento, até mesmo 
para a intervenção do profissional de Educação Física. 
A história do corpo ou a história contada sobre o corpo configura-se como novos 
sentidos dados a ele, como sínteses dos processos de transformação que ocorreram na 
sociedade e que acabam por marcá-lo, fazendo com que este corpo passe a portar em si essa 
memória. Nas palavras de Andrade (2003, p.119), essas transformações pelas quais passa o 
corpo representa “um constructo social e cultural de diferentes e múltiplos marcadores 
identitários”, o que nos permite inferir em seu discurso que as relações construídas pelo 
homem ao longo de sua vida estão imbricadas por uma rede que atua produzindo efeitos de 
sentido nesse próprio homem e saberes acerca do mundo, permitindo que as representações, 
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algumas vezes, mantenham-se intactas e, noutras, sofram mudanças, gerando rupturas e 
reformulações. 
Ao longo dos tempos sempre ocorreu interferência direta pela e na sociedade nos 
processos de produção dos sentidos do corpo, o que remete nossa reflexão para o fato de ser 
esse corpo fruto do processo sociocultural de construção da história do próprio homem. É nele 
que ficam marcadas as imagens que trazemos � nossas crenças, nossos medos, nossos 
valores, ideias e significados. É esse corpo que produz sentidos, marcado por histórias ora 
individuais, ora coletivas, com influências sociais, culturais, psíquicas e biológicas. É o corpo 
detentor de múltiplos sentidos. 
Os sentidos que o corpo assume são sínteses das relações que os homens travam com o 
mundo e consigo mesmos. Estamos num mundo regido pela modernidade que traz à tona a 
ideia da rapidez das “coisas” e a velocidade da informação, levando os indivíduos a se 
apropriarem de novas formas de pensar, de agir e, até mesmo, de se relacionar com o outro. 
Então, este corpo do qual falamos também sofreu e sofre o impacto da modernidade, pois 
“assim como qualquer objeto o corpo, na sociedade de consumo, dissolve-se no jogo e nas 
trocas simbólicas”, perdendo até mesmo sua identidade, tudo em nome da agilidade que se faz 
cada vez mais determinante nas transformações atuais (FERREIRA, 2001, p. 36). 
Segundo Giddens (1994), o corpo faz parte de um projeto de modernidade, concebido 
como agente de um processo. É moldado por um projeto de construção social: a sociedade 
atual. A modernidade nos projeta para os meios tecnológicos que apontam fórmulas para se 
buscar um modelo de saúde e beleza. O “corpo entendido em sua perspectiva mais ampla, é 
um privilegiado portador de sentidos da cultura, um lócus singular onde pulsam e tomam 
forma diferentes noções de saúde/doença [...]” (BAGRICHEVSKY, 2007, p. 1). 
As relações que são construídas entre os indivíduos atrelam corpo belo à saúde, com 
slogans modernos de que “ter um corpo belo é sinônimo de saúde”. Isso nos é ressaltado nos 
estudos de Siqueira e Faria (2007, p. 174) ao trazerem a ideia “[...] de um corpo com saúde 
que hoje aparece na mídia pode levar a entender que essa noção seja consensual”. Para os 
autores, esse conceito encontra-se em constante reconstrução, variando sua interpretação 
conforme os diferentes contextos. 
A modernidade trouxe à tona a construção imagética de representação de um corpo 
ideal. Sabemos que as discussões sobre a temática do corpo não são novas, uma vez que o 
estudo do corpo como fenômeno ganhou status ao longo do tempo. Porém, apesar das 
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diversas discussões que se formaram em torno dessa temática, não se chegou ainda a um 
conceito próprio, pois ele é transformado segundo o período, a cultura, entre outros. Mesmo 
assim, se buscarmos uma definição, não a encontraremos, pois o corpo vai se moldando 
historicamente. Para cada tipo de sociedade, a concepção de corpo assume “significados 
diferentes”, sendo o que determina esta conceituação é a maneira como a sociedade se 
constituiu. 
A partir do panorama inicial apresentado, não temos por foco definições, mas 
almejamos desvelar “impressões”, “sentidos” que os sujeitos da pesquisa (as mestrandas) 
possuemem seu imaginário sobre corpo. As contribuições teóricas sobre a temática do corpo, 
com interfaces da antropologia, da sociologia, da medicina, sob uma perspectiva histórica, 
fenomenológica, entre outros, tem sido fomentadas. A Educação Física tem focado o corpo 
inicialmente sob o ponto de vista fisiológico e, depois, sob o ponto de vista da saúde. Somente 
mais tarde é que se aproximou de outras ciências no sentido de estabelecer interlocuções, e 
não dependência. Assim, dado o histórico da Educação Física em relação aos vínculos com a 
saúde, partimos da ideia de que, talvez, os discursos da saúde estivessem imbricados nas 
vozes das mestrandas, trazendo ainda o olhar biológico que o campo da saúde sustenta 
atualmente. 
No intuito de compreender esse processo, propusemo-nos a ler as representações sobre 
corpo instituídas na e pela sociedade sob o olhar dessas mestrandas, as quais ocupam parte de 
seu tempo para pensar os modos de fazer a Educação Física. Entendemos que para se 
trabalhar nesta área se faz necessário “tentar” conhecer e entender o corpo, primeiramente o 
seu corpo, no sentido de uma prática educativa que tenha sentido para quem educa e aprende. 
Nessa pesquisa, o corpo escolhido foi o de pós-graduandas (de mulheres). Partimos do 
princípio que, em geral, a representação de um corpo é modelada, em sua maioria, para 
atender a determinados padrões sociais, padrões estes que estão postos “na e pela” sociedade. 
Daí elencarmos como objetivo a identificação das representações sobre corpo de 
mestrandas em Programas de Pós-Graduação em Educação Física do Paraná para apreender 
como elas pensam, sentem, agem e se imaginam em sociedade. Particularmente, buscamos o 
corpo e seus sentidos no imaginário das pós-graduandas, sentidos esses que envolvem suas 
representações de corpo. 
 
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As representações sociais 
A matriz teórica das Representações Sociais como norteadora básica dessa pesquisa se 
deu por optarmos por essa orientação teórica em função de assumirmos ser ela uma das 
condições objetivas determinantes para que possamos refletir sobre dilemas que envolvem o 
imaginário social. Assim, um dos aspectos que consideramos ser necessário destacar remete 
ao fato dos estudos em Representações Sociais portarem algumas características que os 
tornam relevantes à compreensão da maneira como os homens elaboram suas tomadas de 
posições em relação ao mundo. 
Minayo (2011, p.73) aponta que representações sociais é um termo “filosófico que 
significa a reprodução de uma percepção retida na lembrança ou do conteúdo do 
pensamento”. Na área das Ciências Sociais ela é definida como uma categoria do pensamento 
que expressa a realidade do indivíduo, procurando explicá-la, justificá-la ou questioná-la. 
O conceito de Representações Sociais que ora assumimos tem por base as 
contribuições de Moscovici (1978, p.28), para quem, a representação social: 
[...] é um corpus organizado de conhecimentos e uma das atividades psíquicas 
graças às quais os homens tornam inteligível a realidade física e social, inserem-se 
num grupo ou numa ligação quotidiana de trocas e liberam os poderes de sua 
imaginação. 
 
 As representações sociais advêm de sistemas que têm “[...] uma lógica e uma 
linguagem particulares, uma estrutura de implicações que assenta em valores e em conceitos. 
[...], mas como “teorias”, “ciências coletivas” sui generis, destinadas à interpretação e 
elaboração do real”. (id, p.50). Elas cumprem importante função junto ao mundo imagético 
das sociedades na medida em que tornam familiar aos sujeitos aquilo que não lhes é familiar, 
criando assim a condição fundante para que possam se apropriar dos acontecimentos que 
constituem sua significação. 
Retomando o pensamento de Moscovici é sempre bom lembrar que, para ele, as 
Representações Sociais são um conhecimento emergente do mundo no qual as pessoas se 
encontram e interagem, do mundo onde os interesses humanos, necessidades e desejos 
encontram expressão, satisfação ou frustração, pois o conhecimento surge das paixões 
humanas e, como tal, nunca é desinteressado. A partir desse princípio, o autor define 
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Representação Social (2003, p.48) como “[...] uma modalidade de conhecimento particular 
que tem por função a elaboração de comportamentos e a comunicação”. 
As representações sociais, no senso comum, remetem a imagens, ideias, concepções e 
visões de mundo que os indivíduos possuem sobre sua própria condição, e que emergem a 
partir de uma realidade considerada concreta para as Ciências Sociais. Para Moscovici (2005), 
as familiarizações originadas das representações estão apoiadas nas imagens que os 
indivíduos fabricam, quer sejam elas oriundas de uma teoria científica, de um objeto ou de 
uma ação. Elas advêm do resultado/da busca de tornar o “real” algo que é incomum, ou não-
familiar para o grupo; e este incomum propicia as pessoas um sentimento de não-
familiaridade. O que nos era não-familiar, que estava longe, se torna agora algo familiar, ao 
alcance de nossa mão; ou seja, tornamos algo que era abstrato em algo concreto. 
Moscovici (2005, p.54) aponta que “[...] a finalidade de todas as representações é 
tornar familiar algo não-familiar, ou a própria não-familiaridade”. 
[...] as imagens e idéias com as quais nós compreendemos o não-usual apenas 
trazem-nos de volta ao que nós já conhecíamos e com o qual já estávamos 
familiarizados há tempo e que, por isso, nos dá uma impressão segura de algo “já 
visto” (déjá vu) e já conhecido (déjá connu). (MOSCOVICI, 2005, p.58) 
 
 De maneira geral, as pessoas querem se sentir a “salvo” de riscos, atritos e conflitos, 
ou seja, querem sentir-se “em casa”, pois entendem que as coisas sempre se repetam (as 
mesmas situações, os mesmos gestos, as ideias, sempre de novo). Para que ocorra mudanças, 
primeiramente existirá sempre um pouco de resistência. No todo, esta dinâmica das relações: 
[...] é uma dinamica de familiarização, onde os objetos, pessoas e acontecimentos 
são percebidos e compreendidos em relaçao a previos encontros e paradigmas. 
Como resultado disso, a memória prevalece sobre a dedução, o passado sobre o 
presente, a resposta sobre o estimulo e as imagens sobre a “realidade”. Aceitar e 
compreender o que é familiar, crescer acostumado a isso e construir um hábito a 
partir disso, é uma coisa, mas é outra coisa completamente diferente preferir isso 
como um padrão de referencia e medir tudo o que acontece e tudo que é percebido, 
em relação a isso (MOSCOVICI, 2005, p.55). 
 
A representação social é compreendida como um conjunto de símbolos que se 
constitui em ambientes sociais, como casa, escola, rua, trabalho, roda de amigos, entre outros. 
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Ela vai estabelecer como as pessoas devem configurar sua comunicação entre seus pares, e 
nortear os comportamentos dos indivíduos. Elas sempre busca bases teóricas para 
compreender a relação existente entre o homem e a sociedade. 
Ao se estudar as representações sociais pode-se verificar como elas são um 
determinante do comportamento que ora é visto como individual e ora coletivamente. Aliás, a 
coletividade é o ponto de partida dos estudos de Moscovici, uma vez que as representações 
sociais emergem das próprias realidades sociais que se fazem presentes no cotidiano dos 
homems. Nelas, estão implícitas as afirmações, as explicações, os conceitos que certa 
coletividade possui sobre um determinado assunto. De acordo com Moscovici (2003, p.46), 
elas “devem ser vistas como uma maneira específica de compreender e comunicar o que nós 
já sabemos”. 
Dessa maneira, toda representação elaborada por um grupo de indivíduos visa criar 
uma rede de relações na qual aparece o primeiro processo referente à representação sócia �, a 
elaboração dos conhecimentos por uma “certa” coletividade � que leva em consideração a 
organizaçãocognitiva do grupo em questão. 
O corpo nas representações sociais 
Em relação ao campo da Educação Física, historicamente, o corpo sempre foi objeto 
de estudo em diferentes épocas e em distintos contextos. Buscou-se conhecer o corpo que se 
apresentava com base nos acontecimentos sociais de cada época e as várias concepções que 
este corpo possuía, ou seja, as concepções criadas para ele, formando-se “conceitos” que 
orientaram as preferências de cada grupo social. 
Se considerarmos que as representações sociais se caracterizam por se sustentarem 
mais em seus valores do que em seus conceitos, conforme aponta Moscovici (2003), 
poderemos inferir que os conceitos produzidos na Educação Física em relação ao corpo fazem 
parte fundante da sociedade, e estes conceitos são reinventados, organizados e reinterpretados 
de acordo com as crenças e valores sociais. Podemos dizer que, tomar as representações 
sociais como produto social é importante para compreendermos como a Educação Física 
também busca “entender quando e porque um determinado esquema figurativo foi admitido 
por um grupo social e desta maneira expor as práticas sociais que estão relacionadas com 
estas representações” (PEREIRA, 2008, p.15). 
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Para Sá (1998), quando se relaciona um objeto do estudo – nessa pesquisa, o corpo – 
com a teoria das representações sociais, é importante que se considere o contexto sócio-
cultural dos sujeitos investigados (as mestrandas), uma vez que este objeto de estudo deve ser 
apreendido segundo um prisma “conceitual” da teoria que considera as bases funcionais, 
econômicas e sociais de uma cultura, levando em conta a dinamicidade local e a conduta das 
sujeitas nas suas mais diversas interações. 
Mauss (1974) foi um dos primeiros estudiosos a dar enfoque ao corpo como objeto de 
estudo com base na perspectiva sociológica, situando este corpo como a imagem da 
sociedade, e que está inserido na produção dos sistemas simbólicos que a sociedade construiu 
e constrói. Esta sociedade (e consideramos aqui a sua localização em cada época) influencia 
diretamente no pensamento construído coletivamente sobre corpo, pensamento este que nos 
revela um “sujeito” pertencente a uma cultura vigente de certo período determinado. Segundo 
Crespo (1990, p.8): 
[...] os estudos sobre o corpo processam-se num quadro de crise de civilização e 
civilizações; e parece que a história do corpo encontra-se no cruzamento dos 
múltiplos elementos econômicos, políticos e culturais de uma totalidade. Assim, 
temos que aprofundar as investigações sobre as práticas e as representações do 
corpo, pois ainda há muito por conhecer numa área em que a “dimensão escondida” 
das condutas humanas é de uma riqueza imprevisível. 
Os indivíduos não são iguais, existindo múltiplas maneiras de se dar sentido ao corpo. 
Mas, primeiramente é necessário compreender a (de)codificação das representações sobre o 
corpo ao longo dos tempos. Esta (de)codificação aparece tomando-se por base os inúmeros 
estudos que buscam entender como diferentes grupos sociais pensam e agem, tendo como 
objeto central de estudo o corpo. 
Sempre foi familiar a apropriação da temática do corpo no campo da Educação Física, 
e efetivamente ele também é objeto de estudo das Ciências Sociais e Humanas com 
frequência cada vez maior. É notório que este corpo a que nos referimos tenha passado por 
transformações, as quais o descaracterizam, em muitas vezes, como um produto da sociedade, 
sendo “moldado” pela moda, por produtos de cosméticos, cirurgias plásticas e, 
principalmente, pelas academias de fitness, que prometem um corpo “belo/idealizado”. Então, 
essa (des)estruturação que passa o corpo ante às transformações que determinam o ideal de 
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beleza, de acordo com os padrões vigentes do momento, são reflexos dessa fragilização que 
passa o homem na sociedade moderna (GÓES, 1999). 
O processo pelo qual passa o corpo é reflexo da cultura existente. Ele é cada vez mais 
banalizado na sociedade, pois percebemos indivíduos não se relacionando com seu próprio 
corpo (no sentido de não aceitá-lo como é), e sim, buscando sua idealização para atender às 
exigências ou relações simbólicas que são instituídas na e pela sociedade. 
De acordo com Gomes (2006, p.43), a: 
[...] cultura característica da sociedade de consumo capitalista se encarregou de 
banalizar o corpo feminino que se arma de adereços, os quais se tornam signos 
atinentes às exigências midiáticas do mercado, destinando-se ao embelezamento, à 
higiene do corpo, a um tipo de moda que se enquadra na matriz universal símbolo do 
corpo da mulher que se cuida, pois atende aos apelos do consumo. 
Gonçalves (1994, p.28) apresenta os meios tecnológicos como possuidores de uma 
capacidade de produção em massa e dos meios de comunicação como mecanismo de 
padronização de gostos, hábitos e consciências. Ambos padronizam o corpo por meio da 
moda, da estética e da indústria têxtil, ditando normas de comportamento corporal e 
intelectual. 
Podemos dizer que a representação social que indivíduos constroem sobre o corpo faz 
parte do cotidiano social, recebendo significados individuais e sociais. Porém, estas 
“representações recebem influências históricas e culturais, do contato com os universos 
consensuais e reificados, do acesso à ancoragem e à objetivação, transformando o não familiar 
em familiar” (CARVALHO, 2009, p. 21). 
Para Siqueira e Faria (2007), em pesquisa sobre corpo, saúde e beleza, é possível 
identificar que o corpo belo dos anos 1960 (corpo natural) passou a ser identificado como um 
corpo marcado pelos músculos hipertrofiados, nos anos 1980 (acentuando aqui o aumento das 
academias de fitness) e que, nos anos 2000, o corpo almejado era aquele que misturava uma 
boa forma física com atividades que gerassem bem-estar. É claro que essas três categorias 
apresentadas por Siqueira e Faria não vão dar conta da variedade de “corpos” que as 
diferentes sociedades e culturas comportam. 
As imagens quer sejam em revistas, outdoors, televisão, entre outro, legitimam o 
discurso de padrão que a sociedade determina, ou seja, as pessoas devem se ajustar ao modelo 
de corpo e beleza que veicula na sociedade atual. Para Del Priori (2000, p.100), os “discursos 
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são tão mais perigosos quanto mais aderirem de maneira sub-reptícia a nosso quotidiano, 
fazendo-nos confundir sua normalidade com banalidade”. Ainda, para Siqueira e Faria (2007, 
p. 172), o corpo que a mídia explicita é “um espaço onde as representações a seu respeito são 
amplamente construídas e reproduzidas”. Dessa forma, em todas as esferas, a representação 
de um corpo belo é exemplo a ser seguido. 
Sendo assim, pesquisas na área das representações sociais, tendo como objeto o corpo, 
podem remeter a explicações psicosociológicas que tenham origem nas representações, pois o 
corpo, para o homem, constitui-se com base nas representações individuais e sociais, sendo 
construído, reconstruído e desconstruído de diversas maneiras. 
Apoiados em Jodelet (2001), podemos aduzir que a representação social é um saber 
prático, sendo necessário observar três questões: a partir de onde se sabe? O que se sabe? 
Sobre o que se sabe, e com que efeito? Assim, podemos dizer que essas questões podem 
fornecer pistas para compreender que toda representação se origina de um sujeito (as 
mestrandas), seja ele individual ou coletivo, e se refere a um objeto (o corpo). Este corpo 
envolve o conceito das representações sociais, pois ele, o corpo, compreende um saber 
prático, sendo o meio pelo qual o homem está no mundo; é a forma encontrada pelo homem 
para se articular como mundo, de acordo com Merleau-Ponty (1989). 
Os caminhos trilhados 
Tomamos como base para a delimitação do nosso percurso metodológico trilhar pelos 
estudos de abordagem qualitativa de caráter exploratório. Voltaremosnosso olhar para a 
maneira como as atoras sociais da pesquisa produzem sua realidade social, pois entendemos 
ser essa uma das condições objetivas necessárias à compreensão dos sentidos das 
representações sociais que têm instituídas seus imaginários sobre corpo. Como aponta Sá 
(1998, p.26), as representações sociais como “teoria de base” escolhida para o percurso 
metodológico, possuem um “poder convencional e prescrito sobre a realidade. 
Inicialmente foi necessário estabelecer aproximações com a teoria das representações 
sociais para podermos mergulhar nos aspectos que a pesquisa nos possibilitaria e, somente 
depois dessa “familiarização”, passar às entrevistas com as mestrandas. Ao buscarmos 
identificar as representações sociais das mestrandas partimos do princípio que elas possuem 
conhecimento e dão sentido aos seus corpos; elas constroem suas práticas cotidianas. 
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Para podermos trilhar esses caminhos, lançaremos mão dos princípios teórico-
metodológicos dos estudos em representações sociais, considerando que as atoras são 
mulheres que fazem parte de Programas de Pós-Graduação de universidades públicas do 
Estado do Paraná. Nossas trilhas se iniciam considerando que a partir do modo como essas 
mulheres vêem o seu corpo poderemos desvelar quais são os sentidos que elas dão a ele. 
Assim, incursionaremos por suas falas, buscando fazer emergir seus sentidos. Estes poderão 
apontar as interações que vão envolver, de forma simbólica, seu universo humano, ou seja, 
como elas se relacionam, em sua vida, com a temática. 
Essa pesquisa terá como população as mestrandas dos Cursos de Pós-Graduação, 
stritu-senso, em Educação Física das Instituições de Ensino Superior (IES) públicas do Estado 
do Paraná: Universidade Federal do Paraná (UFPR), Universidade Estadual de Maringá 
(UEM) e Universidade Estadual de Londrina (UEL). Conforme nos diz Moscovici (1978), as 
sujeitas sociais (para nós, atoras sociais) são pertencentes a um grupo social específico 
(mestrandas em Educação Física do Paraná) que vivenciam sua realidade objetiva nos 
programas de pós-graduação. 
Para a realização dessa pesquisa, optamos pela utilização da técnica de entrevista 
semi-estruturada1. Um gravador digital e um diário de campo foram os instrumentos 
utilizados para registro dos dados coletados. Esta técnica nos permite um caráter de maior 
interação social entre pesquisadora e mestrandas, possibilitando que a pesquisadora possa 
captar efetivamente os dados pesquisados. 
As entrevistas partirão de uma única pergunta deflagradora que, em princípio, segue a 
seguinte formulação: Como você profissional da Educação Física pensa o corpo? Nessa 
pesquisa, fizemos a opção pela técnica da Análise do Discurso - AD2, que se justifica, em 
Orlandi (1996, p.12), na ideia de que é “pelo discurso que melhor se compreende a relação 
entre linguagem/mundo, porque o discurso é uma das instâncias materiais (concretas) dessa 
relação”. 
 
 
1
 A entrevista semi-estruturada baseia-se em uma ou poucas questões que servem como guia e tem como 
característica a constituição como pergunta aberta. Ela permite flexibilização para o pesquisador poder introduzir 
outras questões que surjam diante do que acontece no processo (a entrevista) pois, de acordo com os discursos 
que surgirem será possível o aprofundamento em relação às informações que se deseja obter. A recomendação 
para seu uso é quando se tem definido de forma clara os meios de análises das informações obtidas durante a 
entrevista. 
2
 Todas as vezes que nos remetermos à análise do discurso usaremos o termo AD. 
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Nossos primeiros achados 
Ao pensar nessas mestrandas partimos do pressuposto que algumas delas buscam um 
campo de trabalho ligado diretamente com a formação de professores/profissionais, ou seja, o 
Ensino Superior, e outras já poderão estar envolvidas nesse campo, quer seja nos cursos de 
Licenciatura ou de Bacharelado, fazendo circular, direta ou indiretamente, os sentidos que 
elas próprias possuem de corpo entre seus estudantes, fomentando a criação de novos 
sentidos. 
Iniciamos nosso trabalho com um “pré-piloto” que nos possibilitou afinar o 
instrumento, testando-o e ajustando-o nos momentos necessários. Nesse processo, buscamos, 
dentro do Programa de Pós-Graduação Associado em Educação Física UEM-UEL, a 
aproximação com a primeira mestranda a participar da pesquisa. Vale ressaltar que antes de 
cada entrevista foram fornecidas às mestrandas informações sobre o porquê da realização da 
entrevista, de sua escolha como sujeito da pesquisa e dos procedimentos éticos que todo 
pesquisador deve ter para resguardar a identidade dos participantes. 
Iniciamos as entrevistas com duas estudantes do Programa na UEM e uma estudante 
do programa na UEL. As entrevistas duraram, em média, 35 minutos, partindo da pergunta 
deflagradora da pesquisa e, a partir da materialização de seu discurso, extraímos questões a 
partir de suas respostas com outras perguntas. 
Em nossas primeiras análises podemos apontar que estas entrevistas do processo do 
“pré-piloto” nos possibilitaram o primeiro olhar de aproximação com o instrumento. Nos 
discursos das estudantes 1 e 2 pudemos identificar um discurso ainda atrelado à formação 
com foco biologicista, buscando, no processo de formação, a fundamentação que aproximasse 
a mestranda de um olhar mais social. Já nossa estudante 3 nos apresentou um discurso 
pautado no conhecimento cientifico, tendo os sentidos de seu corpo representados pelo 
conhecimento técnico-científico da área de seus estudos. 
Estes discursos nos aproximam do que Moscovici aponta sobre representações sociais 
e se apresentam como uma “[...] modalidade de conhecimento particular que tem por função a 
elaboração de comportamentos e a comunicação” (2003, p.48). Trazem como conteúdo 
aspectos da formação profissional e, quanto mais aprofundados em conhecimento técnico-
científico, mais transformações de sentidos possibilitam ao corpo. 
Podemos inferir que esse processo de refinamento do instrumento foi fundamental 
para a dinâmica das entrevistas, a qual nos possibilitou o enriquecimento da proposta inicial 
11737 
 
 
do instrumento a partir da linguagem oral. Este refinamento do instrumento nos dá indícios/ 
pistas que autorizam, a partir de uma pré-análise, apontar que os discursos até agora portam 
em si um assujeitamento na fala das mestrandas, o qual poderá fazer com que desvelemos os 
sentidos dados por elas em relação às representações de corpo. 
REFERÊNCIAS 
ANDRADE, S. S. Saúde e beleza do corpo feminino – algumas representações no Brasil do 
Século XX. Revista Movimento, Porto Alegre, V.9, nº 1, p.119-143, janeiro/abril de 2003. 
BAGRICHEVSKY, M. Do ‘corpo saudável’ que se (des)constitui: imperativos moralizantes 
rumo à saúde persecutória? In: CONGRESSO BRASILEIRO DE CIÊNCIAS DO ESPORTE 
E CONGRESSO INTERNACIONAL DE CIÊNCIAS DO ESPORTE, 15., 2., 2007, Recife. 
Política científica e a produção do conhecimento em Educação Física. Anais ... Goiânia: 
CBCE, 2007. 
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