Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
DIREITO CONSTITUCIONAL PROF.DR.FERNANDO A. S. ALVES • 1. CONSTITUIÇÃO EM SENTIDO • SUBSTANCIAL (OU MATERIAL) • Fala-se em Constituição no sentido substancial quando o critério definidor se atém ao conteúdo das normas examinadas. • A Constituição será, assim, o conjunto de normas que instituem e competências dos principais fixam as órgãos do Estado, estabelecendo como serão dirigidos e por quem, além de disciplinar as interações e controles recíprocos entre tais órgãos. • Compõem a Constituição esse ponto de vista, as também, sob normas que limitam a ação dos órgãos estatais, em benefício da preservação da esfera de autodeterminação dos indivíduos e grupos que se encontram sob a regência desse Estatuto Político. • Essas normas garantem às pessoas uma posição fundamental ante o poder público (direitos fundamentais) • Esse é o conceito material de Constituição que o constitucionalismo moderno sugere. É de se notar, contudo, que, ultrapassado o momento histórico caracterizado pela preocupação predominante de conter o poder, o Estado foi levado a assumir novas funções e tarefas, que os desafios da História foram-lhe propondo como essenciais para a própria existência da comunidade política • Ante o risco de dilaceração interna, em e crescentes virtude das angustiantes desigualdades de fato verificadas na sua população, agravadas pelas pressões do crescimento demográfico e acentuadas pela concentração de rendas que o sistema econômico ensejava, o Estado passou a assumir um papel ativo de redefinição social, com vistas a prosseguir o ideal de integração nacional que também lhe compete. • O Estado de direito descobriu que lhe é essencial a busca da justiça social. Deu-se conta, ainda, de que a sociedade se tornou acentuadamente plúrima, em termos de concepção de vida e de interesses essenciais, e de que a todos os membros da comunidade é devida a consideração e o respeito em termos de proteção normativa básica. • Decerto que essa realidade que nos chega até hoje provoca uma redefinição, também, no conceito material da Constituição. • Se os direito continuam relevantes para elementos do Estado liberal de a definição substancial da Constituição, agora também normas de novo tipo serão tidas como cruciais para a ordenação fundamental da comunidade. • A integração política Constituição não pode prescindir a que visa a da verificação de que a sociedade em que atua é plural e que o atendimento das necessidades vitais de todos os seus membros configura objetivo indeclinável para a subsistência da comunidade política • Dessa forma, a Constituição tem por meta não apenas erigir a arquitetura normativa básica do Estado, ordenando- lhe o essencial das suas atribuições e escudando os indivíduos contra eventuais abusos, como, e numa mesma medida de importância, tem por alvo criar bases para a convivência livre e digna de todas as pessoas, em um ambiente de respeito e consideração recíprocos. • Isso reconfigura o Estado, somando-lhe às funções tradicionais as de agente intervencionista e de prestador de Serviços. • Isso é o que observa Konrad Hesse, quando diz que, no processo político da moderna sociedade pluralista, “a compensação entre opiniões, diferentes aspirações, como a interesses e resolução e regulação de conflitos, converteram-se em tarefa arquetípica e condição de existência do Estado”. • O ordenamento jurídico dessa tarefa, indispensável para a formação de uma unidade prossegue política, está entregue, Hesse, à “Constituição, mediante os seus direitos fundamentais”. • É a Constituição que — além de instituir órgãos supremos competências, a e regular-lhes as par de traçar “o procedimento com que se hão de superar os conflitos que surjam dentro da comunidade” — deverá estabelecer “os princípios fundamentais do ordenamento jurídico, e não só da vida estatal em sentido estrito. • Positiva princípios estabelecer e aplicar as normas e critérios para do ordenamento. Ordena todas as esferas de vida essenciais à convivência” • Por outras palavras, a Constituição passa a ser o local para normativamente também delinear aspectos essenciais do contato das pessoas e grupos sociais entre si, e não apenas as suas conexões com os poderes públicos. • É o que Hesse explica, ao escrever que “também são ordenados na Constituição os fundamentos de esferas vitais que nada têm a ver, de forma direta, com a formação da unidade política e ação estatal, como é o caso do ordenamento jurídico civil: matrimônio, família, propriedade, herança, fundamentos do Direito Penal, princípios do ensino, liberdade religiosa ou das relações laborais ou sociais. • Em tudo isso, a Constituição é o plano sentido à forma jurídica determinados princípios que de estrutural básico, orientado por dão uma comunidade.” • O conceito material de Constituição, portanto, segue a inteligência sobre o papel essencial do Direito e do Estado na vida das relações em uma comunidade. • A Constituição, como ordem jurídica fundamental da comunidade, abrange, hoje, na substancial, as normas sua acepção que organizam aspectos básicos da estrutura dos poderes públicos e do exercício do poder, normas que protegem as liberdades em face do poder público e ....... • normas que tracejam fórmulas de compromisso e de arranjos institucionais para a orientação das missões sociais do Estado, bem como para a coordenação de interesses multifários, característicos da sociedade plural. • CONSTITUIÇÃO EM SENTIDO FORMAL • A Constituição, em sentido formal, é o documento escrito e solene que positiva as normas jurídicas superiores da comunidade do Estado, elaboradas por um processo constituinte específico. • São constitucionais, assim, as normas que aparecem no diploma constitucional, que resultam das fontes do direito constitucional, independentemente do seu conteúdo. • Em suma, participam do conceito da Constituição formal todas as normas que forem tidas pelo poder constituinte originário ou de reforma como normas constitucionais, situadas no ápice da hierarquia das normas jurídicas. • Como se nota, a noção de Constituição formal adere a uma concepção igualmente importante — a de fonte do direito • constitucional. • Da mesma forma, a distinção • entre Constituição material e Constituição • formal enseja uma classificação de normas • constitucionais. São dois temas que merecem • ser examinados. • 1. Classificação das Constituições • A classificação das constituições pode se dar de diversas formas distintas, dependendo dos critérios utilizados para distinguir as constituições. • 1.1 Quanto à origem • Quanto à origem observar-se-á a forma de colocação da constituição no Estado, se será imposta ou democrática. • A constituição “promulgada”, “democrática” “popular” quando é elaborada com é chamada de ou a participação do povo que irá ordenar, por meio da democracia direta ou da democracia representativa (eleição direta de uma Assembleia Nacional Constituinte). No Brasil, foram instituídas de forma democrática as constituições de1891, 1934, 1946 e 1988. • As constituições nomeadas como “outorgadas” ou “impostas” são aquelas elaboradas sem a participação popular, impostas pelos governantes ao povo. • Elas são o resultado de uma manifestação unilateral daqueles que exercem a gestão do Estado. No Brasil, foram instituídas de forma outorgadas as constituições de 1824, 1937, 1967 e a emenda constitucional de 1969. • Há, ainda, na classificação de José Afonso da Silva, as constituições nomeadas como “cesaristas”. Elas são fruto de uma elaboração autoritária pelo Estado, mas passam popular posterior por aprovação por meio de plebiscito. • Ex.: Constituição do Chile, elaborada durante a ditadura de Augusto Pinochet (1973-1990) e promulgada em 1980. • Paulo Bonavides cita, também, a classificação Pactuadas”, de “constituições como aquelas que se efetivam por meio de um pacto realizado entre o rei (Executivo) e o Legislativo, determinando que o monarca tenha que se sujeitar a limites constitucionais. • Ex.: Magna Carta de 1215, na qual os barões ingleses obrigaram o rei João I (João sem terra) a assinar e conceder direitos de liberdade e propriedade. • 1.2. Quanto à forma • Quanto à forma classificar as constituições pode-se como constituições “escritas” e “não escritas”. • As constituições escritas são aquelas materializadas em um documento escrito a fim de instrumentalizar e garantir se buscar a obediência de suas determinações. • As constituições não escritas não são e, portanto, não se codificadas materializam constituição. de forma Essas específica como constituições baseiam-se nos costumes e, por isso, são utilizadas em Estados com consuetudinárias. • Ex.: Constituição Inglesa em que parte das normas são costumeiras. • No caso das constituições não escritas é importante salientar que nada que essas constituições impede sejam compostas, em parte, por costumes e em parte por normas escritas. constituição são os costumes, mas • Na Inglaterra, por exemplo, parte da a jurisprudência e as normas basilares que fazem parte da constituição são escritas. • 1.3. Quanto ao modo de elaboração • As constituições poderão ser elaboradas de formas diferentes e em momentos diferentes e esparsos. • A constituição nomeada como “dogmática” é aquela elaborada em um único período, de uma só vez, sofrendo influências da época e do momento em que foi elaborada. • A constituição “histórica” é elaborada “aos poucos”, pois surge com o passar do tempo e com a evolução da sociedade. • 1.4. Quanto à extensão • As constituições classificadas como extensas são “prolixas” ou “analíticas” e são aquelas que, além de versar sobre os conteúdos básicos de uma constituição, optam por abordar outros assuntos no texto constitucional, e por isso ficam bastante estendidas. • No Brasil, a Constituição da República de 1988 é extremamente extensa, pois o regime anterior à constituição era ditatorial e o constituinte entendeu ser mais seguro defender e determinar como seriam as relações estatais no Estado Democrático, por meio do texto constitucional, norma suprema do Estado. • Essas constituições prolixas tendem a ser menos estáveis, pois como tratam de assuntos diversos acabam precisando com mais frequência de uma adaptação legislativa do texto à evolução humana. • As constituições “concisas” ou “sintéticas” possuem um conteúdo restrito ao que é estritamente necessário de ser tratado pela constituição. • Ex.: a Constituição dos Estados Unidos da América é composta de apenas sete artigos originais e vinte e sete emendas. • 1.5. Quanto à finalidade • As constituições podem ser classificadas ao se analisar a finalidade da elaboração do texto constitucional. • É nomeada como “constituição garantia” aquela que pretende garantir os direitos fundamentais frente ao Estado, determinando limites para a atuação do Estado. • A constituição será “dirigente” ou “programática” quando os seus artigos definirem objetivos para o futuro e para a atuação estatal. • O legislador constituinte “dirige” a atuação futura dos órgãos governamentais. • 1.6. Quanto à estabilidade • O nível de estabilidade de uma constituição leva em conta o grau de facilidade que se encontra para modificar o texto da constituição de um Estado. • Entende-se que a colocação da constituição como norma suprema de um Estado exige uma proteção especial para que esse texto seja modificado. • São classificadas como “constituições imutáveis” aquelas que não admitem qualquer tipo de modificação. • Esse tipo de constituição não é popular, devido à dificuldade que ela coloca para a novas demandas sempre trazidas atualização do texto constitucional às pela evolução da sociedade. • As “constituições rígidas” são aquelas que admitem a modificação de seus textos, mas que exigem que a alteração ocorra somente após um processo legislativo mais dificultoso do que o utilizado para a elaboração de leis ordinárias. • As constituições “semi-rígidas” estabelecem um processo legislativo mais complexo para a modificação da constituição somente para parte de seu texto constitucional, sendo o restante modificado modificação nos mesmos critérios de de lei ordinária. Ex.: Constituição Brasileira de 1824. • As “constituições flexíveis” são aquelas que permitem a mudança do texto constitucional, por meio do mesmo processo ordinário de elaboração e modificações de leis. • A rigidez constitucional decorre do princípio de supremacia do texto constitucional, que coloca a constituição como norma suprema do Estado. • Essa observação leva à conclusão de que a constituição é a “norma de validade” que “filtra” todos as leis e atos normativos, para conferir validade a eles, no Estado Constitucional. • Além disso, todas as atuações do Executivo e Judiciário também devem passar pelo crivo da constituição. • O Estado deixou legislativo de ser de Direito, somente um no qual Estado somente passavam as normas por e atos uma normativos “filtragem constitucional” e se efetivou como um Estado Democrático e Constitucional de Direito, a partir do momento que se exige a obediência daqueles à constituição também que aplicam e executam a legislação no caso concreto (Executivo e Judiciário). • A constituição brasileira de 1988 é classificada como maioria uma constituição dos autores, pois rígida pela possui um processo legislativo dificultado para a modificação do texto constitucional. • Entretanto, para Alexandre de Moraes ela se classifica como um a constituição super rígida, pois além de possuir essa rigidez, possui artigos que são imutáveis, conhecidos como Cláusulas Pétreas (Art. 60, § 4º, Constituição). • 1.7. Quanto ao conteúdo • A constituição, quanto ao conteúdo, é classificada como ‘material’ ou ‘formal’. • As constituições que possuem apenas conteúdos essencialmente constitucionais são chamadas de ‘materiais’, pois cuidam somente de matérias, assuntos constitucionais, e reservam à legislação infraconstitucional os outros conteúdos. • As constituições formais, além do conteúdo material, tratam deassuntos extras, colocados na constituição por escolha do legislador constituinte, mas que poderiam estar previstos em outras normas. • A constituição da República de 1988 é uma constituição formal, pois por ser prolixa, além de possuir o materialmente constitucional conteúdo também trata de assuntos que poderiam ser tratados por leis infraconstitucionais. • 1.8. Quanto à sistemática • As constituições, em relação sistemática, são classificadas à sua como ‘codificadas’ quando estão contidas em um só texto, em um só código. • As constituições variadas são as que são compostas por mais de um texto normativo, sendo formadas por um conjunto de leis. Constituição de 1988 • Inicialmente, a classifica-se como autores estão codificada, questionando mas os essa classificação devido à possibilidade de internacionais de direitos tratados humanos poderem com status de emenda ser recepcionados constitucional, após a aprovação da Emenda Constitucional 45 de 2004. (constituição variada por controle de convencionalidade). DIREITO CONSTITUCIONAL PROFESSOR DOUTOR FERNANDO A. S. ALVES PODER CONSTITUINTE • ORIGEM • A ideia de que a Constituição é fruto de um poder distinto dos que estabelece, a afirmação da existência de um Poder Constituinte, fonte da Constituição e, portanto, dos poderes constituídos (dentre os quais o Legislativo) é contemporânea da de Constituição escrita. • Na verdade, é no panfleto de Siéyès, Qu’est-ce que le tiers état?, que isso se afirma explicitamente pela primeira vez. • De fato, era na Antiguidade desconhecida essa ideia. Tanto na Grécia como em Roma as leis de conteúdo constitucional não se distinguiam formalmente das demais e se manifestavam sobretudo nos costumes, alterando-se pelos órgãos ordinários ou pela invenção legislativos individual (Licurgo, Sólon). • Da mesma forma, a Idade Média não a conheceu. e como tais só o decurso do tempo as podia mudar. As regras de matéria constitucional eram costumeiras. Igualmente não se separavam essas regras das outras, por sua forma. • Nos albores da época moderna, a concepção, formulada pelos legistas, de leis fundamentais, caracterizadas por sua matéria, por sua superioridade e por sua estabilidade, trazia implícita essa ideia. Mas, ainda, então, não se chegou a ela. • No século XVIII, desenvolve-se a ideia de “poder constituinte”, na França, a partir de uma profunda mudança de mentalidade que marca o fim da Idade Média e o início da Idade Moderna. • Há uma gradativa substituição do teocentrismo (doutrina ou crença que considera Deus como o centro de tudo) pelo antropocentrismo (ideia na qual se defende que o homem deve estar no centro das ações, da cultura, da história e da filosofia). • Essa mudança de paradigma desenvolve o ideal do “racionalismo”, como decorrência da visão iluminista que traz uma concepção organizacional racionalizada da humanidade. • Resumindo, a ideia básica é a de que não há mais um ser divino que comanda os ideais humanos, mas o próprio ser humano e sua racionalidade definirão as formas de organização das relações estatais. • Esses ideais levam à criação da “Teoria do Poder Constituinte”, idealizada pelo francês Emmanuel Joseph Sieyès, na obra intitulada “O que é o terceiro Estado?”. Na sua publicação, Sieyès questiona o que é o terceiro Estado. • O primeiro Estado seria o clero, o segundo, a nobreza, sendo essas as classes que exerciam o poder. Entretanto, Sieyès afirma que o terceiro Estado seria o povo, que também deveria exercer o poder. • Ele questiona o papel do povo na sociedade e afirma que há uma origem popular do poder. • O povo se torna o detentor da capacidade de elaborar um documento legal com características de superioridade hierárquica legislativa, que ficou intitulado de constituição. • O nome constituição explica muito bem o seu ideal, ou seja, ela cria, viabiliza o nascimento das regras às regras vigentes no Estado. • Sieyès nomeou esse poder de origem popular e titularidade popular de “poder constituinte.” • Entretanto, o poder constituinte não se confunde com os “poderes” constituídos do Estado, ou seja, com o Executivo, Legislativo e Judiciário. O constituinte existe a partir da poder origem popular, sendo um poder de fato. • Ele possibilita a elaboração e modificação da constituição. Por outro lado, na constituição existirá o estabelecimento dos “poderes” constituídos: Executivo, Legislativo e Judiciário. • O poder constituinte é um só e de titularidade do povo. • As ideias de Sieyès levam à possibilidade de estabelecimento do Estado Constitucional de Direito, ou seja, o povo, legítimo titular de poder, elaborando a regra máxima que vai vigorar no Estado. • CONCEITO DE PODER CONSTITUINTE • -Segundo Natalia Masson, O poder constituinte é a energia (ou força) política que se funda em si mesma, a expressão sublime da vontade de um povo em estabelecer e disciplinar as bases organizacionais da comunidade política. • Autoridade suprema do ordenamento jurídico, exatamente por ser anterior a qualquer normatização jurídica, o poder constituinte é o responsável pela elaboração da Constituição, esta norma jurídica superior que inicia a ordem jurídica e lhe confere fundamento de validade. • Por ser um poder que constitui todos os demais e não é por nenhum instituído, é intitulado "constituinte", termo que revela toda sua potência criadora e faz jus à sua atribuição: a criação de um novo Estado (sob o aspecto jurídico), a partir da apresentação de um novo documento constitucional. • No Brasil, o poder do povo está estipulado no artigo 1o, parágrafo único da Constituição da República de 1988: “Art. 1o - Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição”. • Observa-se que no texto do artigo da constituição a palavra “poder” está no singular porque é somente um poder, elementar do Estado. Essa conclusão histórica é fruto do questionamento da Revolução Francesa contra o Absolutismo, colocando limites à atuação do Estado, em prol do interesse popular. • No Brasil, portanto, “todo poder emana do povo”, mas quem é o “povo”? • Segundo a doutrina clássica o povo é constituído por aqueles elencados no artigo 12 da Constituição que trata de nacionalidade, ou seja, o povo são os nacionais de um Estado. • No artigo 2o da Constituição trata-se dos poderes constituídos, Legislativo, Executivo e Judiciário, que não são objeto de tratamento no tópico em questão, pois se diferem do poder constituinte. • O poder constituinte é um poder de fato, pois não existe um regramento específico e normativo para fins de exercício desse poder. • O poder só é exercido quando há, factualmente, a necessidade de se adequar uma nova realidade social e novos valores com o que está disposto e juridicamente disciplinado na constituição. • Entretanto, a consequência do exercício desse poder será jurídica, pois se materializará na constituição. • A convocação para o exercício do poder constituinte se dá, via de regra, por meio da convocação de uma Assembleia Nacional Constituinte. • Observe o preâmbulo da constituição se referindo a essa hipótese: • Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembleia Nacional Constituintepara instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias, promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL. BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil (1988). Brasília: Senado, 1988). • NATUREZA • Qual é a natureza do Poder Constituinte? É ele um poder de fato, isto é, uma força que se impõe como tal, ou um poder de direito, ou seja, um poder que deriva de regra jurídica anterior ao Estado que funda? • Essa questão, na verdade, é o próprio problema do fundamento do Direito. • De fato, o Direito positivo (no sentido de direito posto pelo Estado) se subordina à Constituição, de modo que o fundamento desta é o fundamento de todo o Direito positivo. • Para quem entender que o Direito só é Direito quando positivo, a resposta é que o Poder Constituinte é um poder de fato, no sentido de que se funda a si próprio, não se baseando em regra jurídica anterior. (tese de contornos juspositivistas). • Para os que admitem a existência de um Direito anterior ao Direito positivo, a solução é que o Poder Constituinte é um poder de direito, fundado num poder natural de organizar a vida social de que disporia o homem por ser livre. (tese de contornos jusnaturalistas) • Na realidade, parece preferível a segunda tese. O Direito não se resume ao Direito positivo. • Há um Direito natural, anterior ao Direito do Estado e superior a este. • Deste Direito natural decorre a liberdade de o homem estabelecer as instituições por que há de ser governado. Destarte, o poder que organiza o Estado, estabelecendo a Constituição, é um poder de direito. • PODER CONSTITUINTE ORIGINÁRIO • A autoridade máxima da Constituição, reconhecida pelo constitucionalismo, vem de uma força política capaz de estabelecer e manter o vigor normativo do Texto. • Essa magnitude que fundamenta a validez da Constituição, desde a Revolução Francesa, é conhecida com o nome de poder constituinte originário. • Ao contrário do que ocorre com as normas infraconstitucionais, a Constituição não retira o seu fundamento de validade de um diploma jurídico que lhe seja superior, mas se firma pela vontade das forças determinantes da sociedade, que a precede. • Poder constituinte originário, portanto, é a força política consciente de si que resolve disciplinar os fundamentos do modo de convivência na comunidade política. • O conceito de poder constituinte originário é devedor dos estudos do abade Sieyès, autor do opúsculo Que é o Terceiro Estado ?, verdadeiro manifesto da Revolução Francesa. • No livro, Sieyès assinala, nas vésperas da Revolução, que o chamado Terceiro Estado — que englobava quem não pertencesse à nobreza ou ao alto clero, e que, portanto, incluía a burguesia —, embora fosse quem produzisse a riqueza do país, não dispunha de privilégios e não tinha voz ativa na condução política do Estado. • No livro, o Terceiro Estado reivindica a reorganização política da França. Nesse contexto, Sieyès teoriza sobre o poder constituinte originário. • Sieyès enfatiza que a Constituição é produto do poder constituinte originário, que gera e organiza os poderes do Estado (os poderes constituídos), sendo, até por isso, superior a eles. • Sieyès se propunha a superar o modo de legitimação do poder que vigia, baseado na tradição, pelo poder político de uma decisão originária, não vinculada ao direito preexistente, mas à nação, como força que cria a ordem primeira da sociedade. • Distancia-se, assim, da legitimação dinástica do poder, assentada na vinculação de uma família ao Estado, pela noção de Estado como “a unidade política do povo” • Para isso, cercou o conceito do poder constituinte originário de predicados colhidos da teologia, ressaltando a sua desvinculação a normas anteriores e realçando a sua onipotência, capaz de criar do nada e dispor de tudo ao seu talante. • Entendia que o povo é soberano para ordenar o seu próprio destino e o da sua sociedade, expressando-se por meio da Constituição. • O povo, titular do poder constituinte originário, apresenta-se não apenas como o conjunto de pessoas vinculadas por sua origem étnica ou pela cultura comum, mas, além disso, como “um grupo de homens que se delimita e se reúne politicamente, que é consciente de si mesmo como magnitude política e que entra na história atuando como tal.” • É possível, em todo caso, que um segmento do povo aja como representante do povo, dele obtenha o reconhecimento, e atue como poder constituinte originário — o que correspondia à pretensão da burguesia na Revolução Francesa. • -É nesse sentido que se formou a Assembleia Nacional Constituinte. PODER • CARACTERÍSTICAS DO CONSTITUINTE ORIGINÁRIO • Em suma, podemos apontar três características básicas que se reconhecem ao poder constituinte originário. • Ele é inicial, ilimitado (ou autônomo) e incondicionado. • É inicial, porque está na origem do ordenamento jurídico. • É o ponto de começo do Direito. Por isso mesmo, o poder constituinte não pertence à ordem jurídica, não está regido por ela. • Decorre daí a outra característica do poder constituinte originário — é ilimitado. Se ele não se inclui em nenhuma ordem jurídica, não será objeto de nenhuma ordem jurídica. O Direito anterior não o alcança nem limita a sua atividade. Pode decidir o que quiser. • De igual sorte, não pode ser regido nas suas formas de expressão pelo Direito preexistente, daí se dizer incondicionado. • O caráter ilimitado, porém, deve ser entendido em termos. • Diz respeito à liberdade do poder constituinte originário com relação a imposições da ordem jurídica que existia anteriormente. Mas haverá limitações políticas inerentes ao exercício do poder constituinte. • Se o poder constituinte é a expressão da vontade política da nação, não pode ser entendido sem a referência aos valores éticos, religiosos, culturais que informam essa mesma nação e que motivam as suas ações. • Por isso, um grupo que se arrogue a condição de representante do poder constituinte originário, se se dispuser a redigir uma Constituição que hostilize esses valores dominantes, não haverá de obter o acolhimento de suas regras pela população, não terá êxito no seu empreendimento revolucionário e não será reconhecido como poder constituinte • originário. • Afinal, só é dado falar em atuação do poder constituinte originário se o grupo que diz representá-lo colher a anuência do povo, ou seja, se vir ratificada a sua invocada representação popular. • Do contrário, estará havendo apenas uma insurreição, a ser sancionada como delito penal. Quem tenta romper a ordem constitucional para instaurar outra e não obtém a adesão dos cidadãos não exerce poder constituinte originário, mas age como rebelde criminoso. • Por isso, sustenta-se que a Constituição é o normado pela vontade constituinte, e, além disso, o que é reconhecido como vinculante pelos submetidos à norma. • Sem a força legitimadora do êxito do empreendimento constituinte não há falar em poder constituinte originário, daí não se prescindir de uma concordânciada Constituição com as ideias de justiça do povo. • É por isso, também, que os estudos sobre o poder constituinte originário costumam se referir à eficácia atual, como traço distintivo desse ente. • Quem atua como poder constituinte originário “deve-se consistir numa força histórica efetiva, apta para realizar os fins a que se propõe”. • Não é quem quer ou pensa estar legitimado para tanto que será poder constituinte originário, mas “quem está em condições de produzir uma decisão eficaz sobre a natureza da ordem.” • Pode-se falar em limitação intrínseca do poder constituinte originário, ainda, sob outro ângulo. • Não há espaço para decisões caprichosas ou totalitárias do poder constituinte originário, já que ele existe para ordenar juridicamente o poder do Estado; portanto, vai instituir um Estado com poderes limitados. • “Um poder absoluto que queira continuar a ser absoluto não cabe numa Constituição, (...) que representa uma delimitação frente ao exercício arbitrário do poder ou frente ao domínio puro e duro da arbitrariedade. • PODER CONSTITUINTE DERIVADO • O poder constituinte derivado é também chamado de poder constituinte instituído, secundário, de 2o grau ou remanescente. • O poder constituinte derivado tem esses sinônimos porque tecnicamente ele não é um poder constituinte, mas um poder constituído, uma vez que no momento da elaboração da constituição o legislador constituinte irá determinar juridicamente como o poder constituinte derivado será exercido. • Portanto, a própria constituição estabelecerá como deverá ser exercido, daquele momento em diante, quando se desejar alterá-la. • É exatamente por essa característica que recebe o nome de poder constituinte “derivado”, pois deriva do exercício do poder constituinte originário, que traça suas características na constituição. • Espécies de poder constituinte derivado • O poder constituinte derivado se divide em três espécies: Decorrente, Reformador e Revisor. As três espécies de poder constituinte derivado são previstas e estipuladas pelo próprio texto da constituição, tendo características próprias. • Poder constituinte derivado revisional • A revisão é ampla e genérica, sendo exceção, pois é via extraordinária de modificação da constituição. • A revisão constitucional se dá por meio de emendas constitucionais amplas, chamadas de revisionais, que possuem o intuito de analisar a adaptação do novo texto constitucional à sua aplicação prática, fazendo- se ajustes. • A revisão constitucional está prevista no artigo 3o do ADCT: “Art. 3º. A revisão constitucional será realizada após cinco anos, contados da promulgação da Constituição, pelo voto da maioria absoluta dos membros do Congresso Nacional, em sessão unicameral.” • Assim sendo, a revisão só pode ocorrer 5 anos após a edição da constituição (limitação temporal) e em sessão unicameral do Congresso Nacional, sem distinguir Câmara dos Deputados de Senado Federal. • Além disso, o quórum de aprovação da emenda constitucional revisional deve se dar pela maioria absoluta dos membros do Congresso Nacional, ou seja, "mais que a metade" do número total de indivíduos que compõe o Congresso Nacional. • Poder constituinte derivado reformador • O poder constituinte derivado reformador estabelece a via ordinária de alteração da constituição, tendo caráter pontual e específico, tratando de temas particulares do texto constitucional, em obediência aos limites impostos na própria constituição. • A reforma se faz por meio de ‘emendas constitucionais’. O artigo 60 da constituição prevê a reforma constitucional, por meio de emendas constitucionais específicas, o que não se confunde com o exercício do poder constituinte originário revisor. • Os limites circunstanciais são aqueles que impedem, diante de situações excepcionais, a alteração do sociais texto constitucional. • O objetivo desses limites é preservar a integralidade do Estado Democrático de Direito quando esteja passando por momentos de instabilidade social, que possam impedir a livre manifestação do poder constituinte derivado. • Nesse caso, quando o Estado está passando por um período de Estado de Legalidade Extraordinária, não poderão ser discutidas e aprovadas emendas constitucionais. • As situações que não permitem a reforma do texto constitucional são: Estado de Defesa (Art. 136), Estado de Sítio (Art. 137) e Intervenção Federal (Art. 34). • As limitações materiais referem-se a temas (matérias) que a constituição protege e as coloca como impossíveis de serem restritas ou abolidas pela reforma constitucional. • O legislador constituinte, em regra, permitiu a alteração da constituição, mas alguns conteúdos afirmou que não podem ser restringidos ou abolidos da constituição. Esses temas são intitulados pela doutrina de Cláusulas Pétreas. • Importante chamar atenção para o Art. 60, § 4º, inciso IV, que fala de direitos e garantias individuais e não dos direitos fundamentais, pois a doutrina majoritária tem entendido que sua interpretação deve ser restrita ao exato texto constitucional. • Exemplo de emenda constitucional que tratou de cláusula pétrea, para ampliá-la, foi a emenda 45 de 2004 que incluiu no Art. 5o os parágrafos 3o e 4o, tratando de direitos e garantias individuais. • Portanto, é permitida a mudança trazida pelos parágrafos 3o e 4o do Art. 5o da constituição, pois os direitos e garantias individuais não foram restritos ou abolidos, mas ampliados. • Essa conclusão decorre do entendimento de que direitos e garantias fundamentais não são taxativos, restritos somente ao que já foi positivado, mas exemplificativos, pois a evolução das relações humanas faz surgir novos direitos fundamentais a serem protegidos. • Em relação ao inciso II do § 4º, do artigo 60 da constituição, é importante ressaltar que os aspectos que são cláusulas pétreas do voto são: voto direto (o povo escolhe exatamente a pessoa que vai exercer o cargo), secreto (não há a obrigação de se revelar o voto), universal (todos podem votar e seu voto tem o mesmo peso) e periódico (é obrigatória a consulta a cada período de mandato estipulado na constituição). • Entretanto, não são somente as regras do Art. 60, § 4º da constituição que são cláusulas pétreas, pois a doutrina conclui pela existência das chamadas cláusulas pétreas implícitas. • Essas cláusulas decorrem de um raciocínio lógico. • Assim sendo, o próprio artigo 60 é considerado pelo sistema constitucional como uma cláusula pétrea implícita, pois caso ele fosse alterado por uma emenda constitucional, as cláusulas explicitas poderiam ser desrespeitadas. • Além do artigo 60, todos os dispositivos estruturantes e fundamentais do Estado brasileiro são vistos como cláusulas pétreas, em especial o Art. 1o (fundamentos da República Federativa do Brasil), Art. 3o (objetivos da República Federativa do Brasil) e Art. 34, VII (princípios constitucionais sensíveis). • O Poder Constituinte Derivado Reformador possui limitações formais que se dividem em limitações subjetivas e objetivas. • As limitações formais subjetivas tratam de “quem” pode propor um Projeto de Emenda Constitucional (PEC). São 3 os legitimados para propor uma ‘PEC’: • Art. 60. A Constituição poderá ser emendada mediante proposta: • I - de um terço, no mínimo, dos membros da Câmara dos Deputados ou do Senado • Federal; • II - do Presidenteda República; • III - de mais da metade das Assembleias Legislativas das unidades da Federação, manifestando- • se, cada uma delas, pela maioria relativa de seus membros. • As limitações formais objetivas tratam das outras condições que a constituição impõe para permitir a mudança de seu texto, por meio de emendas constitucionais. • A primeira exigência acerca do regime de votação e aprovação da reforma constitucional é que a PEC seja discutida e votada, em cada casa do Congresso Nacional (Câmara dos Deputados e Senado Federal), e que em cada uma das duas casas a votação tem que se dar em 2 turnos, ou seja, 4 votações ao todo. • Vota-se 2 vezes na Câmara e, se aprovado, vota-se 2 vezes no Senado. Via de regra a PEC começa na Câmara dos Deputados, salvo se proposto por 1/3 do Senado. • Ela só será aprovada se obtiver, em ambas as casas, 3/5 dos votos dos respectivos membros (60%) da maioria absoluta. • O quórum é, portanto, maior que o da aprovação de leis (maioria simples) e da revisão constitucional (maioria absoluta). • Além disso, a matéria que constar de uma PEC e que foi rejeitada ou prejudicada não pode ser reapresentada na mesma sessão legislativa, ou seja, no mesmo ano, independente do quórum. • Poder constituinte derivado decorrente • O poder constituinte derivado decorrente é o poder outorgado aos entes estaduais da federação de editarem as suas próprias constituições. • Nas federações há mais de um poder constituinte, pela existência do poder constituinte decorrente. • O federalismo brasileiro, por ter características próprias, determina que os entes federativos brasileiros não tenham a mesma liberdade do federalismo estadunidense. • Os estados-membros podem editar suas próprias constituições, mas o poder constituinte decorrente é limitado a obedecer os ditames e estar de acordo com a Constituição da República. • O art. 11 do ADCT estabeleceu a existência do poder constituinte derivado decorrente: “Art. 11. Cada Assembleia Legislativa, com poderes constituintes, elaborará a Constituição do Estado, no prazo de um ano, contado da Constituição Federal, promulgação da obedecidos os princípios desta” • Muitas normas das constituições estaduais são repetições da constituição federal e, por isso, recebem o nome de “normas de repetição”. • Somente as normas constitucionais, que não são de repetição obrigatória, permitirão ao estado- membro agir de forma autônoma ao elaborar a sua constituição e estabelecer um regramento próprio. • Portanto, nos estados existe poder constituinte, que é derivado da própria constituição e está, portanto, limitado e condicionado ao poder constituinte originário. • Há uma polêmica em relação aos municípios, pois no artigo 18 da constituição eles estão incluídos no rol de entes federativos, sendo que antes de 1988 eram considerados como autarquias: • “Art. 18. A organização político - administrativa da República Federativa do Brasil compreende a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, todos autônomos, nos termos desta Constituição.” • Diante dessa premissa, questiona-se se os municípios também possuem poder constituinte decorrente. • Entretanto, entende-se que o município não pode exercer poder constituinte e criar constituições municipais, sendo que há somente uma lei orgânica do município que tem a mesma funcionalidade de uma constituição municipal, mas tecnicamente não é um documento constitucional. • A Constituição da República de 1988 não conferiu aos municípios poder constituinte decorrente, somente aos estados. • A lei orgânica do município, portanto, não tem natureza de norma constitucional, não há poder constituinte decorrente municipal, sendo que se for desobedecida não se gera uma inconstitucionalidade, apenas uma ilegalidade. • Poder constituinte difuso • Na sociedade existem grupos, instituições e pessoas que têm poder de interpretar e aplicar a constituição e, como esse poder está espalhado em toda a sociedade, a doutrina o nomeia como ‘poder constituinte difuso’. • Pode-se questionar o motivo desse poder ser visto e intitulado como um poder constituinte, mas essas interpretações podem modificar o sentido do texto constitucional na sociedade, gerando uma mudança nas normas constitucionais. • A sociedade interpreta a constituição de formas distintas a partir de sua evolução histórica e o poder social ganha o nome doutrinário de poder constituinte difuso. • Há uma alteração informal da constituição, pois o texto não é alterado, mas o significado da norma constitucional se modifica provocando-se o fenômeno da MUTAÇÃO CONSTITUCIONAL. • Há a mudança da interpretação da constituição, sem se alterar o texto da norma. • É importante destacar que a mutação constitucional tem que estar presa às normas e ao sistema constitucional, sendo impossível a interpretação do texto constitucional de forma arbitrária. • Assim, como se pode falar em mutação constitucional, pode-se falar também em mutação inconstitucional, que não é permitida, pois vai contra a própria constituição. . • Poder constituinte supranacional • Segundo essa teoria, o poder constituinte é possível de ser exercido além das fronteiras territoriais dos Estados nacionais, por meio da união de Estados, em prol da elaboração de uma constituição comunitária que englobe mais de um Estado. • Esse poder constituinte é chamado de ‘poder constituinte supranacional • A intenção é observar direitos com o ideal de universalidade dos direitos humanos, gerando uma maior interação entre diferentes povos e integração no âmbito interno e internacional. • A União Europeia tem passado por um processo de constitucionalização em “bloco”, e apesar de terem sido frustradas as suas tentativas de unificar os documentos constitucionais dos Estados, o Tratado de Lisboa, que entrou em vigor em 2009, tem fortes características de integração nacional, conforme defende a teoria do poder constituinte supranacional. DIREITO CONSTITUCIONAL PROF.DR.FERNANDO A. S. ALVES • Normas Constitucionais: aplicabilidade e eficácia • As normas constitucionais, apesar de serem dotadas de obrigatoriedade, podem possuir diferentes graus de eficácia. Assim, quanto as normas constitucionais, ao grau de eficácia, são classificadas em: • 1.1 Normas Constitucionais de eficácia plena • As normas constitucionais de eficácia plena têm a possibilidade de produzir efeitos desde o momento em que são editadas e entram em vigor, pois não dependem de outras normas para serem efetivadas. • Elas já são completas e estão aptas a serem seguidas de imediato. • 1.2. Normas Constitucionais de eficácia contida • As normas constitucionais de eficácia contida tiveram restrita após a sua abrangência sua entrada em vigor, pois eram de eficácia plena e foram restritas em sua aplicabilidade. • As normas de eficácia contida poderão ser restritas: • • pelo legislador infraconstitucional. (Ex.: art. 5º, VIII; art. 5º, XIII; art. 37, I da Constituição de 1988); por outras normas constitucionais. (Ex.: arts. 136 a 141 da Constituição de 1988); por conceitos jurídicos consagrados na doutrina e na jurisprudência.(Ex.: conceito de ordem pública na aplicação do art. 5º, XXV da Constituição de 1988). • 1.3.Normas Constitucionais de eficácia limitada• As normas constitucionais de eficácia limitada são o oposto das normas de eficácia plena, pois, no momento de entrada em vigor do texto constitucional, não possuem a possibilidade de serem aplicadas, por dependerem de regulação específica do legislador ordinário para serem regulamentadas. • Segue abaixo a CLASSIFICAÇÃO DE JOSÉ AFONSO DA SILVA • NORMAS DE PRINCÍPIO INSTITUTIVO (ORGANIZACIONAIS) • Nas quais o legislador constituinte indica que é necessária a estruturação posterior do órgão estatal, previsto na constituição, por atuação do legislador ordinário. • As normas de princípio institutivo podem ser impositivas (obrigatórias) ou facultativas. • Ex.: Art. 33: “a lei disporá sobre a organização administrativa e judiciária dos Territórios”. • NORMAS DE PRINCÍPIO • PROGRAMÁTICO • Tratam de programas institucionais a serem cumpridos pelo governo em prol do interesse social. Ex.: Art. 6o (direito à alimentação, art. 196 (direito à saúde) etc. DE NORMAS — REGRAS E • MODALIDADES CONSTITUCIONAIS PRINCÍPIOS • Atenta às particularidades constitucionais, a doutrina das normas lhes flagrou uma classificação, que é de considerável interpretação valia para o processo da constitucional. • Consideradas em conjunto, as normas constitucionais são vistas como a pertencer a um sistema normativo, que lhes imprime uma certa ordem de propósitos e que configura um todo tendencialmente coeso e que se pretende harmônico. • Observou-se, estruturalmente, porém, essas que, normas podiam ser enquadradas em dois tipos normativos, que atraem perspectivas também distintas de solução de problemas de aplicação das normas. • Ganhou a doutrina mais moderna uma classificação das normas, que as separa em regras e princípios. • Em geral, tanto a regra como o princípio • são vistos como espécies de normas, uma vez que ambos descrevem algo que deve ser. • Ambos se valem de categorias deontológicas comuns às normas — o mandado (determina-se algo), a permissão (faculta-se algo) e a proibição (veda-se algo). • Quando se trata de estremar regras e princípios, porém, é bastante frequente o emprego do critério da generalidade ou da abstração. • Os princípios seriam aquelas normas com teor mais aberto do que as regras. • Próximo a esse critério, por vezes se fala também assentaria que a distinção se no grau de de determinabilidade dos casos aplicação da norma. • Os princípios corresponderiam às normas que carecem de mediações concretizadoras por parte do legislador, do juiz ou da Administração. • Já as regras seriam as normas suscetíveis de aplicação imediata. • Valendo-se de outro ângulo, a separação entre regras e princípios por vezes é sugerida como sendo devedora do critério da importância da norma para o conjunto do ordenamento jurídico, especialmente sob o aspecto de ser a norma o fundamento de outras normas, quando então participaria da modalidade do princípio.. • Até a proximidade da ideia de direito é usada para a diferenciação. • Os princípios seriam padrões que expressam exigências de justiça. • Os princípios teriam, ainda, virtudes multifuncionais, diferentemente das regras. • Os princípios, desempenhariam nessa também linha, uma função argumentativa. • Por serem mais abrangentes que as regras e por assinalarem os standards de justiça relacionados com certo instituto jurídico, seriam instrumentos úteis para se descobrir a razão de ser de uma regra ou mesmo de outro princípio menos amplo. • Assim, o informaria princípio da igualdade o princípio da acessibilidade de todos aos cargos públicos, que, de seu turno, confere a compreensão adequada da norma, que exige o concurso público para o preenchimento desses cargos. • Já que os princípios estruturam um instituto, dão ensejo, ainda, até mesmo à descoberta de regras que não estão enunciado expressas em um legislativo, ensejando, com isso, o desenvolvimento e a integração do ordenamento jurídico. • Aqui, cabe pensar no princípio da moralidade e no princípio da publicidade como determinantes da proibição de que público possa um concurso ter prazo sumamente exíguo de inscrição de interessados, em horários e localidades inadequados. • Da mesma forma, cogite-se do princípio da proteção da confiança, que deriva do princípio do Estado de Direito, a inspirar a impossibilidade, que não está a Administração romper, escrita, de súbita e caprichosamente, com uma situação há muito consolidada, que se Estado, inspirando investimentos recursos estabelecera a partir de estímulos do e do comprometimento de particular. • De toda sorte, as tentativas efetuadas de distinguir regras e princípios chocam-se, ceticismo pluralidade às vezes, dos que de normas com o veem na um obstáculo para que se possa, com segurança, situar uma norma em uma ou outra classe. • Isso leva a que alguns sustentem que a diferença entre regra e princípio seria apenas de grau. • A doutrina em torno entre regras e princípios da distinção recebeu contribuição de relevo, tanto teórico como prático, com os estudos de Ronald Dworkin e Robert Alexy. O professor norte-americano Ronald Dworkin O professor alemão Robert Alexy • Os dois autores buscaram esclarecer que a diferença entre regras e princípios não é meramente de grau, sendo, antes, qualitativa. • O critério que desenvolvem auxilia na compreensão das peculiaridades próprias das regras e aquelas próprias dos princípios, a partir de uma maior precisão metodológica. • REGRAS E PRINCÍPIOS EM DWORKIN • E EM ALEXY • No curso dos seus estudos, Ronald Dworkin concordou que um princípio assemelham, na medida em normativo e uma regra se que ambos estabelecem obrigações jurídicas. • O que os estremaria seria, porém, não o maior ou menor grau de vagueza da disposição, mas, sim, o tipo de diretiva que apresentam. • A norma da espécie regra tem um modo de aplicação próprio que a diferencia, qualitativamente, da norma da espécie princípio. • Aplica-se a regra segundo o modo do tudo ou nada; de maneira, portanto, disjuntiva. • Dworkin explica: “se os fatos que uma regra estipula ocorrem, então ou a regra é válida, e a solução que dela resulta deve ser aceita, ou não é válida, e não contribuirá em nada para a decisão”. • Em havendo um regras, a solução conflito entre haverá de se pautar pelos critérios clássicos de solução de antinomias (hierárquico, da especialidade e cronológico). • Ensina Dworkin que os princípios, de seu lado, não automaticamente desencadeiam as consequências jurídicas previstas no texto normativo pela só ocorrência da situação de fato que o texto descreve. • Os princípios têm uma dimensão que as regras não possuem: a dimensão do peso. • Os princípios podem interferir uns nos outros e, nesse caso, “deve-se resolver o conflito levando-se em consideração o peso de cada um”. • Isso, admitidamente, não se faz por meio de critérios de mensuração exatos, mas segundo a indagação sobre quão importanteé um princípio ou qual o seu peso numa dada situação. • Não se resolvem os conflitos entre princípios, tomando um como exceção ao outro. • O que ocorre é um confronto de pesos entre as normas que se cotejam. • Os princípios, como delineados por Dworkin, captam os valores morais os tornam de um da comunidade e elementos próprios discurso jurídico. fala nos princípios mundo normológico • Alexy também convivendo no com as regras. • Para ele, princípios e normas configuram as pontas extremas do conjunto diferentes das normas, — e a distinção é mas são tão importante que Alexy a designa como “a chave para a solução de problemas centrais da dogmática dos direitos fundamentais.” • Toda norma, diz ele, é um princípio ou uma regra, e ambas categorias se diferenciam qualitativamente — não havendo entre eles apenas uma variação de grau. • Os princípios, na sua visão — e que começa, Dworkin aqui, a se —, “são distanciar de normas que ordenam que algo seja realizado na maior medida, dentro jurídicas e das reais possibilidades existentes”. • Os princípios são, por isso mesmo, comandos de otimização. • O grau de cumprimento do que o princípio prevê é determinado pelo seu cotejo com outros princípios e regras (possibilidade jurídica) e opostas pela consideração da realidade fática sobre a qual operará (possibilidade real). • Enquanto os princípios concitam a que sejam aplicados e satisfeitos no mais intenso grau possível, as regras determinam algo. • “Se uma regra é válida, então há de se fazer exatamente o que ela exige, sem mais nem menos”. • Desse princípio modo, pode enquanto um ser cumprido em maior ou menor escala, as regras somente podem ser cumpridas ou não. • A distinção se torna crucial para se compreender que um caso de colisão de regras é diferente, na sua estrutura, de uma hipótese de colisão de princípios. • A colisão de princípios, da mesma forma que o conflito entre regras, refere-se a situação em que a aplicação de duas ou mais normas ao caso concreto engendra consequências contraditórias entre si. • A solução para o conflito entre regras, porém, não é a mesma para o caso de colisão entre princípios. • Um conflito entre regras é solucionado tomando-se uma das regras como cláusula de exceção da outra ou declarando-se que uma delas não é válida. • Já quando os princípios se contrapõem em um caso concreto, há que se apurar o peso (nisso ponderação) consistindo a apresentam nesse mesmo que caso, tendo presente que, se apreciados em abstrato, princípios em nenhum choque desses ostenta primazia definitiva sobre o outro. • Nada impede, assim, que, em caso diverso, com características, o princípio outras antes preterido venha a prevalecer. • A ilustração dessa teoria pode facilitar exemplo de um conflito entre a sua compreensão. Figure-se o o direito fundamental da liberdade de expressão com o direito fundamental ocorrerá se à privacidade que um jornalista desejar alguém expor dados pessoais de numa reportagem. • Os dois direitos têm a índole de princípios, eles não se diferenciam hierarquicamente, nem constituem um a exceção do outro. • Muito menos se há de cogitar resolver o atrito segundo um critério cronológico. • O conflito, portanto, não se resolve com os critérios usuais de solução das antinomias. • Ao contrário, terá que ser apurado, conforme o caso, qual dos dois direitos apresenta maior peso. • Não seria impróprio, que, considerar retratado não vive assim, se o indivíduo uma situação pública relevante, a privacidade terá maior peso do que se ele é ator de interesse público algum fato de significativo, quando o interesse geral na matéria poderá ser arguído para emprestar maior peso à liberdade de expressão. • Admitida essa teoria dos princípios, não será exato afirmar que a generalidade seja a nota definitiva para se identificar um princípio. • Afinal, há normas com alto grau de generalidade que não se enquadram como princípios. • Assim, o preceito que diz não haver crime sem prévia lei que o defina, tido como princípio pela sua generalidade, é, de fato, uma regra, pois exige algo que inevitavelmente somente pode ser ou não cumprido. • As constituições, hoje, são de compostas de regras e princípios. • Um modelo feito apenas de regras prestigiaria o jurídica, mas valor da segurança seria de limitada praticidade, por exigir uma disciplina minuciosa e plena de todas as situações relevantes, sem deixar espaço para o desenvolvimento da ordem social. constitucional não seria • O sistema aberto. • Entretanto, um sistema que congregasse apenas princípios seria inaceitavelmente ameaçador à segurança das relações. CONSTITUCIONAIS SEGUNDO A SUA • NORMAS CLASSIFICADAS FUNÇÃO • Uma tipologia das normas constitucionais pode também atentar para o critério da função que elas exercem. • Há normas que estabelecem um dever para os poderes públicos, uma tarefa para o Estado. • São as normas constitucionais impositivas. • Assim, por exemplo, a que estabelece ser objetivo do Estado a erradicação da pobreza e o fim das desigualdades sociais e regionais (art. 3º, III). • Há normas que instituem garantias para os cidadãos, como a que repele a imposição de sanção penal sem lei que defina previamente a conduta como crime (normas de garantia). • Há normas que reconhecem e conformam direitos fundamentais. • -Outras normas entronizam institucionais. Elas criam ou garantias reforçam instituições necessárias para a proteção dos direitos dos indivíduos. • Assim, a norma que garante a proteção do Estado à família (art. 226), a que assegura a autonomia universitária (art. 227) e a que proclama a autonomia funcional e administrativa do Ministério Público (art. 127, § 2º). • Há as normas chamadas orgânicas, que • criam órgãos. Por vezes são orgânicas e de competência, normas porque também fixam as atribuições dos órgãos. • Há, ainda, normas ditas procedimento, que de estabelecem um modo de agir para os seus destinatários, por exemplo, as que fixam o procedimento básico para a reforma da Constituição. DIREITO CONSTITUCIONAL Hermenêutica das Normas Constitucionais • ‘Hermenêutica’ é uma palavra que vem de ‘Hermes’, o responsável deus grego que era pela interpretação das palavras dos deuses, traduzindo-as para os homens. • A palavra “hermenêutica” trata de uma tentativa de explicar, traduzir, a norma jurídica para que seja compreendida e aplicada na sociedade. • A hermenêutica é a ciência da interpretação, e por meio dela interpreta- se melhor e entende-se quais princípios podem ser utilizados para a compreensão das normas Jurídicas. • A Hermenêutica Jurídica possui uma conhecida como Constitucional, subespécie Hermenêutica consagrada pelo ideal do Neoconstitucionalismo. • Pela importância suprema da constituição é importante que ela seja abordada por técnicas de interpretação específicas. • Alémdisso, a constituição é dotada de caráter político uma série de princípios e normas de a compreensão e que desafiam exigem abordagens específicas de interpretação, por meio da Hermenêutica Constitucional. • Conclui-se que interpretar a constituição é diferente de interpretar as leis infraconstitucionais. • O conflito entre direitos e bens constitucionalmente protegidos resulta do fato de a Constituição proteger certos bens jurídicos (saúde segurança, integridade liberdade territorial, de defesa pública, imprensa, nacional, família, idosos, índios etc.), que podem vir a envolver-se numa relação do conflito ou colisão. • Para solucionar-se compatibilizando-se esse conflito, as normas constitucionais, a fim de que todas tenham aplicabilidade, a doutrina aponta diversas regras de hermenêutica constitucional em auxílio ao intérprete. • Como definido por Vicente Ráo, • “a hermenêutica tem por objeto investigar e coordenar por modo sistemático os princípios científicos e leis decorrentes, que disciplinam a apuração do conteúdo, do sentido e dos fins das normas jurídicas e a restauração do conceito orgânico do direito, para efeito de sua aplicação e interpretação; por meio de regras e processos especiais procura realizar, praticamente, estes princípios e estas leis das normas jurídicas de adaptação científicas; consiste preceitos a aplicação na técnica nelas contidos dos assim interpretados, às situações de fato que se lhes subordinam”. • A primeira posição Constitucional é o da Hermenêutica chamado “Interpretativismo”, que determina que o intérprete se limita pelo texto e pelos princípios explícitos na constituição. • A segunda abordagem é a do “Não Interpretativismo”, na qual o intérprete vai além da norma e defende a aplicação dos valores constitucionais para a compreensão da constituição • A Hermenêutica Constitucional questiona, também, se o intérprete da constituição deve buscar interpretar de acordo com a ‘vontade da lei’ (mens legis) ou de acordo com a vontade do legislador (mens legislatoris). • Os autores subjetivistas entendem que deve-se buscar a vontade do legislador. • Entretanto, a doutrina majoritária entende que deve-se buscar interpretar de acordo com a ‘vontade da lei’, a que está no texto, de forma objetiva. • Em especial porque a lei é inteligente que o legislador, mais sendo capaz de se adaptar a situações não imaginadas pelo legislador. • INTERPRETAÇÃO DA • CONSTITUIÇÃO — NOÇÕES • ELEMENTARES • A atribuição de sentido a um preceito • constitucional é atividade marcada por • considerável potencial, de efeitos vários sobre a ordem jurídica e sobre o quotidiano dos indivíduos. • A atividade destinada a descobrir o • sentido de uma Constituição, que proclama • valores a serem protegidos, seguidos e • estimulados pelos poderes constituídos e pela • própria sociedade, assume inescondível relevo • para a vida social e para a definição do Direito. • Na realidade, não se busca um sentido para • uma norma senão com o objetivo de conformar • a vida social; a interpretação da Constituição • “só faz pleno sentido posta ao serviço da • aplicação”e não se cogita de aplicação sem interpretação. • O trabalho de interpretar a • Constituição, portanto, integra o esforço de • aplicar uma norma constitucional, o que leva que “a • Konrad Hesse a concluir interpretação • constitucional é concretização” • Interpretar a Constituição é buscar • conhecer um ato normativo, uma lei; mas, • quando comparada com a interpretação típica ramos do Direito, a se cerca de • dos outros interpretação • constitucional características • distintas, que lhe desenham um campo único. • A interpretação constitucional tende a • acarretar impacto sobre todo o direito positivo • do Estado, já que é a Constituição a norma • suprema em uma comunidade e a fonte de • legitimidade formal de toda a sua ordem • jurídica. • Dispondo a Constituição sobre as • relações entre os poderes e destes com as interpretação constitucional tampouco, de uma • pessoas, a não se • desprende, ineliminável • pressão ideológica e política. • Os interesses apanhados pela fixação do entendimento de um preceito da Lei Fundamental tendem a ser mais • amplos e avultada, de projeção estrutural mais se comparados com os interesses que, ordinariamente, estão em jogo, quando se cuida de definir normas de setores outros do mundo jurídico. • Acresce que a Constituição está repleta de termos vagos e plurívocos. • Nela se aninham perspectivas divergentes e se adotam fórmulas • de compromisso, por meio das quais se • postergam para o quotidiano da política • ordinária as decisões valorativas apenas • pautadas pelo constituinte. • É característico também da fase histórica • que vivemos a inserção em normas • constitucionais de metas impostas à ação do Estado, muitas delas de feitio social, que impõem um fazer, sem, contudo, indicar o como fazer. • Igualmente é típico das constituições atuais a incorporação de valores morais ao domínio jurídico, não se limitando as Cartas a simplesmente discriminar competências e limitar a ação do Estado — indo-se além, para injetar índole jurídica a aspirações filosóficas e princípios ético-doutrinários. absorvem noções de • As constituições • contemporâneas conteúdo • axiológico e, com isso, trazem para a realidade • do aplicador do direito debates políticos e • morais. • As pré-compreensões dos intérpretes sobre esses temas, melindrosos, descartadas, não têm mas tantas vezes como ser devem ser reconhecidas como tais pelos próprios aplicadores, a fim de serem medidas com o juízo mais amplo, surgido da detida apreciação dos vários ângulos do problema proposto, descobertos a partir da abertura da interpretação da Constituição a toda a comunidade por ela afetada. • A força da Constituição acha-se • também na segurança que ela gera — • segurança, inclusive quanto ao seu significado • e ao seu poder de conformação de • comportamentos futuros. • A interpretação casuística da Constituição é esterilizante, como é também insensata a interpretação que queira compelir o novo, submetendo a sociedade a algo que ela própria, por seus processos democráticos, não decidiu. • Tudo isso confere domínio da hermenêutica jurídica, singularidade, no à atividade de interpretação da Constituição, principalmente em um Estado de direito democrático, em que a Constituição não é meramente semântica, mas aspira à plena força normativa. • A interpretação • da Constituição se torna, assim, propensa a • controvérsias, que se estendem desde as • técnicas que lhe são adequadas até os limites a • que se deve ater. desde o • Entende-se, por isso, que advento • da Constituição de 1988, com a • redemocratização, a atividade de interpretação • constitucional haja ganhado impulso e • motivado crescente interesse. • Sobretudo quando o jurista se deu conta da magnitude do papel do Supremo Tribunal Federal nesse atenções para com as processo, as minúcias da interpretação constitucional e para comas suas consequências receberam a energia de estudos cada vez mais refinados • LEVANDO EM CONTA A ESTRUTURA • DAS NORMAS CONSTITUCIONAIS PARA INTERPRETÁ-LAS • Interpreta-se um preceito para dele se • extrair uma norma (uma proibição, uma • faculdade ou um dever) e com vistas à solução de um problema prático. • Daí que tanto o texto • como os fatos a que ele se refere são • importantes para a inteligência de uma norma. • É sempre oportuno o aviso de Eros Roberto Grau, quando concita a que não nos esqueçamos de que “os textos normativos carecem de interpretação não apenas por não serem unívocos ou evidentes — isto é, por serem destituídos de clareza —, mas sim porque devem ser aplicados a casos concretos, reais ou fictícios” • Por isso mesmo é que “o • intérprete discerne o sentido do texto a partir e • em virtude de um determinado caso dado (...). • A norma é produzida, pelo intérprete, não • apenas a partir de elementos colhidos no texto • normativo (mundo do dever ser), mas também • a partir de elementos do caso ao qual ela será • aplicada, isto é, a partir de dados da realidade • (mundo do ser)” • A norma, portanto, não se confunde com o • texto, isto é, com o seu enunciado, com o conjunto de símbolos linguísticos que forma o preceito. • Para encontrarmos a norma, para que • possamos afirmar o que o direito permite, • impõe ou proíbe, é preciso descobrir o • significado dos termos que compõem o texto e • decifrar, assim, o seu sentido linguístico. • “A disposição, preceito ou enunciado linguístico • — esclarecem Canotilho e Vital Moreira — é o objeto de interpretação; a norma é o produto da interpretação.” • Mas a tarefa do • intéprete/aplicador não se esgota aí; o • significado da norma também haverá de levar • em conta a realidade fática que criou o • problema que suscitou a necessidade de • interpretação. • Daí se extrair que a norma é formada por “uma expressa através de • constitucional medida de • ordenação enunciados • linguísticos (programa normativo) e por uma de dados reais (setor ou • constelação domínio • normativo)”. • A interpretação orientada à aplicação não • se torna completa se o intérprete se bastar com • a análise sintática do texto. • Como as normas • têm por vocação própria ordenar a vida social, • os fatos que compõem a realidade e lhe • desenham feição específica não podem ser • relegados no trabalho do jurista. • Para se definir • o âmbito normativo do preceito constitucional, • para se delinear a extensão e intensidade dos • bens, circunstâncias e interesses atingidos pela • norma, não se prescinde da consideração de • elementos da realidade mesma a ser regida. • A norma constitucional, que possa atuar na assim, para solução de problemas concretos, para que possa ser aplicada, deve ter o seu conteúdo semântico averiguado, em coordenação com o exame das singularidades da situação real que a norma pretende reger. • Servem de exemplo disso as inovações • tecnológicas trazidas pela informática, que não • podem deixar de ser levadas em conta para a • compreensão atual de certas normas • constitucionais. • As peculiaridades da internet, • por exemplo, interferem, certamente, sobre o • tema da liberdade de expressão como • conhecida antes do advento do ambiente • virtual. • Normas constitucionais sobre • monopólio postal também sofrem o impacto de inovações tecnológicas, como a dos correios eletrônicos. • As novas possibilidades de trocas • de dados por vias telemáticas geram impacto • sobre a compreensão do art. 5º, XII, que prevê • a quebra do sigilo das comunicações telefônicas • por ordem judicial. • Repare-se, a esse propósito, que, em 1988, ainda não se difundira o meio eletrônico de troca de dados, realidade já corrente em 1996, quando o legislador interpretou que a ressalva à constitucional pertinente inviolabilidade de comunicações telefônicas também se interceptação do comunicações em sistemas aplicava à fluxo de de informática e telemática. • Como outra ilustração, cabe ressaltar que • não é, tampouco, possível compreender o • conteúdo normativo do enunciado do art. 5º, X, da Constituição Federal (direito à • privacidade e à intimidade) sem levar em conta o estágio de desenvolvimento tecnológico. • Pense-se, por exemplo, que o programa • normativo do preceito parece dizer que aquilo que não é visível ao público deve ser considerado do domínio privado, não podendo, em princípio, ser objeto de livre exposição por terceiros, sem ferir a privacidade de alguém. tecnológico, porém, tornou • O • avanço possível • trazer ao olhar do público, por meio de lentes • teleobjetivas, pessoas em situações que, antes, • eram estritamente privadas. • O desenvolvimento • da técnica mudou a concepção do que é visível • ao público. Essa evolução tecnológica, esse • dado de fato, deve ser levado em conta para a • compreensão do conteúdo normativo da • proteção constitucional do direito à • privacidade. • Tudo isso dá razão à ideia de que “a do conteúdo de uma assim como a sua • concretização norma • constitucional, realização, • somente são incorporam as possíveis quando se • circunstâncias norma é da realidade que a • chamada a regular” • AMBIGUIDADES NO TEXTO CONSTITUCIONAL • As inquietações surgidas no domínio da • interpretação constitucional ligam-se a dúvidas • sobre a identificação da norma com o seu • enunciado. • Muitas vezes, essas perplexidades • surgem porque o constituinte utiliza termos • com mais de um significado, gerando o • problema da ambiguidade. • Um enunciado • ambíguo enseja a que dele se extraia mais de • uma norma, sem que se indique ao intérprete • um parâmetro de escolha. • A ambiguidade pode • resultar da multiplicidade de sentidos da • própria palavra (ambiguidade semântica) ou da • incerteza de sentido resultante do contexto em • que empregada (ambiguidade sintática). • A ambiguidade reside, muitas vezes, na • vagueza do termo ou da expressão. • A Constituição se vale de palavras e expressões • que comportam inteligências variadas, mais ou • menos amplas, que, por vezes, aludem a • propriedades que se revelam em graus • diferenciados. • Assim, por exemplo, a • Constituição veda as penas cruéis (art. 5º, • XLVII), deixando ao intérprete o trabalho de • compreender quando se pode caracterizar como • cruel um castigo aplicado. • O constituinte fala • em devido processo legal, no art. 5º, LIV, expressão que dá ensejo a várias pretensões de • sentido, inclusive permitindo que se fale em devido processo legal material, como sinônimo de exigência de • razoabilidade/proporcionalidade nas ações dos poderes públicos. • Atente-se, por igual, para o • art. 12, § 4º, I, da CF, que enumera como perda da nacionalidade por atividade nociva ao • causa de brasileira a • condenação interesse • nacional. • A ambiguidade pode resultar da existência • de dois significados para uma mesma expressão • ou termo, um deles, técnico, e o outro, natural. • Algumas palavras comuns, quando ingressam • no ordenamento
Compartilhar