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A VOZ DA TOGAok

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A VIDA DO MAGISTRADO
	Eliézer Rosa, conhecido como "o bom juiz", atuou na área criminal na primeira instância do Rio de Janeiro nas décadas de 60 e 70. Este memorável magistrado acreditava num ideal de humanidade justa e é lembrado por sua solidariedade e benevolência para com os acusados e os menos favorecidos socialmente. 
	Além de excelente jurista, ele era homem de belas palavras e suas sentenças decisórias entraram para a História pelo caráter comovente que apresentavam em seu conteúdo. Juiz dedicado e autor iluminado. Felizes os que partilharam aprendizado com ele.
	Em sua obra "A Voz da Toga", Eliézer Rosa descreve a complexidade do cotidiano daqueles que, assim como ele, optam pela carreira de juiz no Brasil.
	O exercício da magistratura traz consigo a beleza da realização da justiça e, consequentemente, da paz social. No entanto, a tarefa do juiz não é algo simples, é trabalho árduo repleto de desafios e prazos a cumprir.
	O próprio autor e também juiz reitera, incansavelmente, nos capítulos de seu livro, a luta diária exigida pela sua profissão, como no trecho a seguir: "Nada na vida profissional do juiz é fácil. Tudo são tropeços e embaraços, se ele realmente deseja produzir um bom trabalho". (ROSA, 1981, p.27)
	Sabe-se, ainda, que o expediente do juiz é tão laborioso que se estende ao seu lugar de descanso. Assim, o magistrado dispõe de pouco tempo para seus interesses particulares e com sua família devido à excessiva demanda de processos e atividades incumbidos ao mesmo em inexoráveis prazos estabelecidos.
	"A testemunha muda dessa dureza de vida do juiz é a sua família. É um recluso, um trabalhador forçado no único lugar onde a liberdade deveria ser total e absoluta. Mas seu lar é sua prisão [...]" (ROSA, 1981, p.60)
	É importante ressaltar que todas as penosas lutas e dores inerentes ao ofício do magistrado não desenobrecem a sublime arte de fazer justiça, isto é, dar a cada um o que é seu por direito.
	.Ademais, a vida do juiz deve ser dedicada a leitura e ao estudo contínuo para aperfeiçoamento profissional. É indispensável que o togado seja sábio em suas atitudes e convicções e, para isto, é necessário que se debruce sobre poucas e essenciais obras.
	Portanto, fica claro que a carreira de juiz, atualmente, no Brasil sobrecarrega o individuo e requer dedicação integral às atividades judiciais. Desse modo, a figura do mediador capaz de dissolver os conflitos sociais e promover a harmonia nas relações humanas vai sendo construída por meio de batalhas diárias que somente aquele que vive as angústias do juiz tem noção do desgaste causado pelos obstáculos à caminho da justiça. 	
	Já nas últimas páginas de seu brilhante enredo, o autor, apaixonado pela missão de distribuir justiça, motiva os que, apesar dos pesares, com ele dividem o mesmo sentimento: 
Siga seu caminho de espinhos e pedras, meu companheiro do futuro e saiba que não é proibido chover no deserto, onde nasce a flor vermelha do cardo, nem é também proibido semear flores no caminho dos homens. Erga sua mão e semeie o bem: amanhã ela nascerá. (ROSA, 1981, pp.78-79)
RELAÇÃO COM OS ADVOGADOS, SERVIDORES E AS PARTES
	É de suma importância que o juiz disponha de um bom relacionamento com aqueles com quem partilha boa parte do seu cotidiano e lutas do local de trabalho.
	Para tanto, é preciso que o juiz seja paciente e gentil com todos os componentes do seu time profissional. 
	"O juiz deve ter a longanimidade necessária para ouvir com paciência as queixas, reclamações e réplicas que a parte oponha aos seus despachos e sentenças". (ROSA, 1981, pp.25-26)
	O autor defende a relevância da compreensão do magistrado quanto aos pedidos e dúvidas dos advogados. "[...] Ouça o advogado". (ROSA, 1981, p.21) Estes estão sempre apressados e preocupados com os prazos severos dos inúmeros processos dos quais se ocupam. Por isso, é fundamental também que o juiz seja pontual e responsável em suas obrigações a fim de não atrapalhar os afazeres dos advogados.
	"Juízes e advogados devem manter as melhores relações de respeito e cordialidade". (ROSA, 1981, p.16)
	Além disso, o juiz deve ser cuidadoso e aprazível ao efetuar os despachos de maneira que não provoque à ira nem as partes e nem os advogados. As palavras a serem utilizadas devem, pois, ser escolhidas com zelo e serem nítidas naquilo que buscam expressar.
	"[...] as palavras vestem o pensamento. Escolha-as como escolhe a roupa com que há de se apresentar no seu gabinete de trabalho. [...] Fale pouco e diga tudo". (ROSA, 1981, p.19)
	Convém, ainda, que o juiz torne-se companheiro de seus auxiliares, por vezes, até desenvolvam relações de amizade, visto que isto aumenta a produtividade dos serviços a partir da cooperação mútua.
	É sabido que as partes litigantes, geralmente, questionam e solicitam informações adicionais acerca das causas. Em determinadas ocasiões até importunam o juiz, porém este deve permanecer brando e com sabedoria proferir uma boa resposta.
	"[...] seja o juiz como a mulher honrada que ouve o galanteio, mas passa imperturbável, como se não o ouvisse. [...] Assim o juiz, em face dos inevitáveis pedidos". (ROSA, 1981, p.36)
	Logo, o segredo para aliviar os ardores e as tensões inerentes ao ambiente jurídico é aliar-se a seus parceiros de jornada e construir, a partir da confiança e respeito entre juízes, advogados e as partes um meio agradável para a realização de suas respectivas funções e, assim, o andamento eficiente dos processos para execução da justiça. 
O JUIZ COMO JUSTIÇA
	O juiz é a figura instituída de poder para julgar e arbitrar conflitos. Sendo assim, o magistrado tem por função principal ministrar a justiça na sociedade.
	"E, para mim, a justiça é o juiz". (ROSA, 1981, p.14) 
	Eliézer Rosa expõe em sua obra a visão de alguns estudiosos que acreditam na lei como única fonte do direito, então é papel do juiz aplicá-la sem hesitar. 
	Por outro lado, para o autor nem sempre a lei exprime o direito do seu povo e o dever elementar do juiz é assegurar os direitos dos jurisdicionados. "Note-se bem e note-se muito: o que importa não é a lei, mas o direito, que vive e vibra na consciência do povo". (ROSA, 1981, p.49)
	O autor aborda ainda a ideia de justiça, que encontra morada na imagem do juiz. Essa noção de justiça não se restringe à simples aplicação da lei, mas está ligada ao respeito do direito, do qual se origina a lei.
	Sendo o juiz a representação da justiça, cabe ao mesmo não se conformar com jurisprudências errôneas e buscar o acerto com força e reverência.
	"Lute o juiz por que seja sua sentença justa. [...] Só a sua consciência lhe atestará se sua sentença foi justa. [...] Faça de sua sentença um poema em honra do direito e da justiça". (ROSA, 1981, p.52)
	Por fim, ao longo de toda a obra percebe-se a grandiosa obra da justiça da qual os magistrados estão encarregados e as dificuldades impostas pela realidade desigual brasileira para efetuar o bem comum. E são estes obstáculos que compõem o fardo dos juízes conduzido durante o trajeto espinhoso em busca da justiça justa.
O CONTATO DO JUIZ COM A LIDE
	A lide pode ser entendida, a partir de uma visão clássica, como: "O conflito de interesses qualificado por uma pretensão resistida ou insatisfeita" (CARNELUTTI, s.d.). É, portanto, um litígio, uma questão judicial em que as partes buscam mostrar e provar a verdade ou razão de seu direito.
	É sabido, também, que o juiz constitui-se como mediador entre as partes e promotor da justiça em caso de oposição de interesses.
 	Posto isso, considera-se incumbência do magistrado que decida a lide nos limites em que a mesma fora proposta. Assim o fazendo de maneira sensata e adequada.
	De inicio, o juiz entra em contato com o material que apresenta as ações judiciais. Sua primeira tarefa é analisar a aptidão das petições iniciais e, somente após passada esta fase, segue-se para o julgamento em uma audiência. 
	A partir daí, o juiz aproxima-se do conflito, em partes, pois deve prevalecer o principio da imparcialidade. Nestemomento o juiz precisa manter-se tranquilo e utilizar seus conhecimentos com sapiência com o propósito de aliviar as tensões e manter a ordem, culminando em um melhor exercício das funções dos envolvidos.
O COMPORTAMENTO DO JUIZ NAS AUDIÊNCIAS
	Como já fora, anteriormente, explicitado os atributos dos quais o juiz deve dispor para o desenvolvimento eficaz do seu ofício, não é difícil imaginar a conduta do magistrado no procedimento das audiências. 
	Embora as audiências sejam repletas de provas e testemunhas, que serviriam para auxiliar o trabalho do juiz na composição do conflito, essa é uma situação extremamente delicada, já que a veracidade dessas ferramentas precisam ser comprovadas e isso requer habilidade por parte do juiz.
	"De todos os momentos angustiosos do juiz, é o da audiência de instrução o mais tormentoso, porque entra o juiz no mundo dos subjetivismos, [...] das simulações e dissimulações". (ROSA, 1981, p.27)
	Ademais, é necessário que o juiz seja claro e compreensível aos integrantes da audiência, bem como: as partes, as testemunhas, entre outros. Assim, o juiz precisa adequar seu vocabulário ao entendimento do receptor a fim de que não seja comprometida a percepção e colocação dos fatos em análise.
	"Tem o juiz de conformar sua palavra ao léxico da testemunha. [...] Não é raro ter o juiz de traduzir as palavras da testemunha". (ROSA, 1981, p.27)
	Em síntese, o comportamento do juiz em audiências resume-se em ter cautela no tratamento com os que ali se encontram e paciência na exposição dos fatos e nas possíveis discussões decorrentes de divergências de pensamento. Além do respeito merecido pelos advogados, peritos e auxiliares.
O JUIZ E SEU APERFEIÇOAMENTO
	É fato que a sociedade encontra-se em constante evolução. Então, sendo o juiz um profissional que lida com os interesses dos componentes dessa sociedade, nada mais lógico que o mesmo transforme-se e acompanhe as mudanças ocorridas na realidade. 
	Dessa forma, o juiz precisa estar em processo ininterrupto de aperfeiçoamento tanto profissional quanto pessoal. Para isso, o mesmo deve empenhar-se na meditação e aprendizagem através de bons livros, peças teatrais e até mesmo estudando sentenças de juristas renomados.
	"É a meditação que fecunda e gera os saberes". (ROSA, 1981, p.68) 
	O autor traça uma ilustração de como seria o juiz do futuro que, em sua opinião, não será substituído pela máquina, mas há de ser aquele dotado de uma visão sociológica do direito, estudioso e convicto dos seus atos de justiça. 
	Afinal, o direito é dinâmico e assim deve proceder o magistrado em busca do aprimoramento da realização da justiça para o bem do seu povo.
O JUIZ E A CONSTRUÇÃO DA SENTENÇA
	A sentença é uma das partes mais importantes do processo. É nessa fase que o juiz decide sobre os pedidos solicitados. 
	É notório, então, o valor da compreensão devida e clara do que foi determinado. Assim, o autor de maneira até didática sugere características essenciais na composição da sentença pelo juiz. Para ele, a sentença deve ser breve, mas sem falhas. Para tanto, é necessário tempo para que os fatos se esclareçam na consciência do magistrado.
	O autor acredita que o juiz deve cuidar-se em embelezar a sua sentença e não temer críticas ou deixar de assim o fazer por falta de tempo, como em geral acontece. Sem deixar, contudo, de priorizar o conteúdo.
	"Quanto mais bela puder ser a forma da sentença, quanto mais elegante for na linguagem pura, escorreita e castigada, melhor será. É claro que a forma não deve prevalecer ao fundo". (ROSA, 1981, p.44) 
	As palavras do autor impulsionam os leitores a utilizar sua criatividade e espírito artístico para encantar e inspirar pessoas à mudança de atitudes indevidas, a partir de uma decisão bem elaborada.
	"Dirão muitos que o estilo consagrado das sentenças não permite novidades. Não é certo. [...] Inove, tenha ousadia e coragem de inovar. (ROSA, 1981, p.45)
O JUIZ E A SOCIEDADE
	O Poder Judiciário foi por muito tempo vislumbrado de forma errada pelas pessoas como algo distante da sociedade. Como se os juízes fossem meros operadores, sem conhecimento da realidade social, para aplicação da lei.
	Porém, o cenário social já não é o mesmo e as pessoas se conscientizaram sobre o exercício da magistratura. Os juízes estão em contato íntimo com a realidade social para que os mesmos sejam instrumentos de autoridade legitimada, comprometidos com a mudança da sociedade e o reconhecimento do Estado Democrático de Direito. 
	Sendo assim, o juiz e a sociedade devem desfrutar de um relacionamento saudável e de ajuda mútua, já que o juiz é aquele que luta pela justiça do seu povo. 
PERFIL DE UM JUIZ EM MINHA PERSPECTIVA
	Em minha concepção, o juiz dos dias atuais precisa ir além do conhecimento técnico do Direito e a interpretação das leis. É fundamental que o juiz se aprofunde em um pensamento globalizado para uma visão mais abrangente da realidade social na qual está inserido.
	A sociedade requer maior especialização dos magistrados em questões que estão em voga. Além disso, é necessária uma maior interação dos magistrados com os valores sociais do meio em que vivem.
	A nova performance de juiz configura uma pessoa dedicada ao exercício pleno de sua função, corajoso em atitudes e humilde para assumir os erros e obedecer às regras submetidas pela profissão.
	O juiz ideal é aquele que prioriza o bem estar dos cidadãos ao seu redor em detrimento de seus próprios interesses. Ele deve ser sensato, justo no verdadeiro sentido do termo e envolvido na árdua missão de propiciar a paz social através da justiça. 
	O perfil de um juiz deve despertar respeito e confiança pelas pessoas aos seu redor. Precisa ser competente e seguro em suas decisões. O bom juiz é aquele que pondera com bom senso, sabe ouvir com cautela e responder com sabedoria. É válido lembrar que o magistrado precisa ser imparcial nas suas deliberações. 
	É notório que não há consenso sobre o perfil de um juiz ideal, mas acredito que algumas qualidades são, incontestavelmente, indispensáveis ao cargo exercido pelo juiz, tais como as apresentadas acima, além de uma desenvolvida capacidade de reflexão e argumentação frente aos fatos. Precisa também ser dotado de senso crítico e autocontrole em situações de extrema pressão a fim de manter seu equilíbrio emocional e psicológico.
	Por fim, acredito que a essência da postura daquele que exerce a magistratura resume-se em integridade de uma vida séria e compromissada com a execução da justiça, vocação humana para a compreensão das mazelas da sociedade brasileira e simplicidade para estar sempre disposto a aprender e reconhecer seus erros. O juiz precisa ser sensível nas suas decisões, visto que tratam-se de casos humanos acima de judiciais, sem deixar de lado a autoridade presente no quesito coercitivo da lei, mas sem exageros opressivos e sempre em busca da justiça.
	
REFERÊNCIAS
BEMFICA, Francisco Vani. O juiz. O promotor. O advogado: seus deveres e poderes. Rio de Janeiro: Forense, 1983.
Dicionário jurídico. Disponível em: <http://www.direitonet.com.br/dicionario>. Acesso em: 18 de junho de 2016.
ROSA, Eliézer. A voz da Toga. 2ª Ed. Rio de Janeiro: Barrister's, 1981.

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