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UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE Curso de Direito -Pessoas e Bens- O direito aqui compreendido como um conjunto de caracteristicas inseridas em uma sociedade, operado pela força do espírito dos homens, instaurou com o passar dos anos um conceito que fez com que o individualismo cedesse lugar ao interesse coletivo, como forma de suporte às relações do grupo. Na era moderna e na antiguidade, é instituído por poder competente enquanto na história primitiva pelo costume e tradição da sociedade. Pela compreensão histórica, o direito positivista, aquele instituído pela vontade dos homens para pautar as relações entre os homens, contendo a tendência à expansão individual e egoísta, evoluiu através da ação contratualista do movimento iluminista e das revoluções liberais. Revoluções estas que, ao formarem uma sociedade pautada em direitos e obrigações, relacionados com todos os atos da vida civil, através de um contrato de consentimento da população, exauriram o poder de um rei absolutista e instituíram o Estado que é conhecido até os atuais dias. “Direito é a realização ordenada e garantida do bem comum, numa estrutura tridimensional bilateral atributiva” – Miguel Reale, Lições preliminares de direito. Sob essa perspectiva é possivel analisar que o ato administrativo dessa sociedade somente ocorre através da moralidade administrativa, aquela do qual o conjunto de regras de conduta (normas) é retirado da moral comum e jurídica. Portanto, tal ato administrativo não obedece somente à lei jurídica, mas também à lei ética da própria instituição, pois nem tudo que é legal, no sentido jurídico, é também honesto. Os positivistas, confundindo o direito com a lei, se opõem ao “Ius naturalis”, pois admitem que a ideia de algo que já existe é a realidade do direito positivo, sendo suficiente somente para explicar e preencher a relação jurídica ou as normas estabelecidas pelo Estado. Dessa forma, o positivismo baseia sua efetividade afirmando que seus princípios, pautando a vida social de determinado povo em determinada época, são tão eficientes que são caracterizados como única verdade, explicadas pelas necessidades estabelecidas pelo direito natural. Dessas relações surge o direito objetivo (“norma agendi”), que se dirige a todos, como da vida social, onde está contido e regulado o poder da ação individual. Esse direito se caracteriza pela norma, ou seja, a lei ou o costume. Além desse, surge também o direito subjetivo (“facultas agendi”), sendo a faculdade de agir, como prerrogativa do individuo, decorrente da norma de direito, ou seja, do direito objetivo, pois, como os homens mantém relações na vida social, é importante definir e delimitar o poder de cada indivíduo frente ao sei semelhante. Cabe afirmar, para esse contexto, que o direito objetivo, surgiu, não de fato, após o direito subjetivo, pois, ao nascer o homem já possui personalidade jurídica e, portanto, capacidade para de exercer direitos e deveres na vida civil para proteção do bem jurídico garantido pela norma. Após o nascimento do indivíduo, as normas objetivas estabelecidas defendem a legitimidade de os cidadãos exercerem sua capacidade de fato e, posteriormente, de direito, salvo o caso em que essas mesmas normas estabelecem um rol de incapacidade jurídica. O código civil define que toda pessoa é capaz de direitos e deveres na ordem civil, enquanto a constituição federal defende, em todo o território nacional, no artigo 5°, que “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no país a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade”. No sentido mais amplo, pois a busca pela definição do termo pessoa só resultou em frustração nas mais diversas áreas do conhecimento humano, o termo acaba por ser conceituado como “o homem em suas relações com o mundo ou consigo mesmo.” Relações estas que se diferenciam por três aspectos: O primeiro, função e relação-substância; o segundo, auto-relação (consigo mesmo); o terceiro, hetero-relação, aquela com o mundo social e geográfico. Nesse aspecto, como afirma Scheler – criador da fenomenologia sob a perspectiva da ética e da antropologia filosófica, a pessoa pode ser definida como alguém que desenvolve uma relação com o mundo individualista externo que, após vivenciar uma somatória de elementos culturais, gera uma relação dentro do convívio social. Pode-se concluir que a pessoa, desde sua origem, gerou diretamente um convívio social com outros semelhantes, objetivando o cumprimento de suas vontades e, indiretamente, um padrão ético para a obtenção dos mesmos, saindo de um estado natural para o estado social, como se pode analisar nas diversas obras de cientistas políticos, tais como, Thomas Hobbes, Jean Locke e Rousseau. Em suma, as relações sociais desenvolvidas no mundo, geram, para a obtenção de valores do individuo ou da sociedade, uma série de conflitos que, após o surgimento do direito subjetivo em função do objetivo, estipulou as relações juridicas que compõem e disciplinam os conflitos resultantes de tais relações, ordenando, diretamente, pela força do Estado, do líder religioso, ou, de outro grupo, a conduta das pessoas dentro da sociedade. As pessoas, nascendo e adquirindo a capacidade de direito, detém também uma série de atributos que definem suas personalidades social e jurídica. Esses atributos são denominados de personalíssimos, sendo estes a vida, saúde, higidez física, seus relacionamentos por viver em sociedade, etc. Instituída a personalidade, por fatos psicológicos através desses atributos, o individuo se caracteriza como capaz de exercer seu direito subjetivo, ou seja, atuar com sua personalidade jurídica, que consiste em titular direitos e obrigações na ordem civil. Como a natureza do homem é gerada para o estabelecimento de relações dentro da sociedade, os fatos psicológicos levam o individuo a definir um modo próprio de ser (personalidade social) enquanto os atributos que adquire durante sua formação conferem, à cada ser vivente da Terra, a capacidade de cumprir suas vontades frente aos conflitos gerados por essa relação, ou seja, gera uma personalidade natural, pois, ao nascer com vida a pessoa é sujeito de direitos e obrigações que garantem à estes, o direito de exercer seus direitos no âmbito jurídico, ou seja, a capacidade jurídica de resolver seus conflitos. São aqueles que têm por objeto os atributos fisicos, psíquicos e morais da pessoa em si e em suas projeções sociais, sendo de acordo com o artigo 11 intransmissíveis e irrenunciáveis. Artigo 11 Código Civil – “Com exceção dos casos previstos em lei, os direitos da personalidade são intransmissíveis e irrenunciáveis, não podendo o seu exercício sofrer limitação voluntária”. No entanto, o novo projeto do código civil que, através de uma reanálise do artigo 11, propõe a alteração dos direitos individuais em relação à personalidade – “O direito à vida, à liberdade, à privacidade, à opção sexual e outros reconhecidos à pessoa são natos, absolutos, intransmissíveis, indisponíveis, irrenunciáveis, ilimitados, imprescritíveis, impenhoráveis e inexpropriáveis. Com exceção dos casos previstos em lei, não pode o exercício dos direitos da personalidade sofrer limitação voluntária”. Tais direitos são essenciais, a saber: 1) Integridade Física, pois cada pessoa pode repelir qualquer atentado contra seu corpo; 2) Integridade psíquica e social, que implicana proteção ao bom nome, fama, honra, crédito, liberdade, privacidade, opção sexual e outros reconhecidos à pessoa são natos de tal sorte que não apenas o direito civil protege, mas igualmente o direito penal e a constituição; 3) Direitos pessoais, que implica em liberdade política, religiosa, trabalho, inviolabilidade da residência, cuja violação tem efeitos não apenas na punição penal, mas gera ainda o dano moral; 4) Direito ao nome, segundo o que constar do registro civil, não podendo um terceiro usar nome alheio; 5) Direito à imagem que, igualmente importante, não pode ser exposto causando prejuízo, seja por fotografias, charges, provocando sentimento de vergonha e indagação. Tais direitos, são naturais, não positivos, pois, com a formação e evolução da sociedade, o nascimento da pessoa situada no contexto capitalista já faz com que ela detenha a capacidade de direito e de ter tais caracteres essenciais. De acordo com os ensinamentos de Carlos Roberto Gonçalves – Direito Civil Brasileiro, o conceito de personalidade, que está umbilicalmente ligado ao de pessoa, se caracteriza como uma qualidade ou atributo do ser humano para adquirir direitos e contrair obrigações ou deveres na ordem civil, servindo de pressuposto para a inserção e atuação da pessoa na ordem jurídica. É, portanto, o conceito básico da ordem jurídica, que a estende a todos os homens, consagrando-a na legislação civil e nos direitos constitucionais da vida, liberdade e igualdade. A capacidade jurídica é a aptidão que o individuo tem para ser sujeito de direitos e obrigações, além de exercer para aqueles que são considerados incapazes, os atos da vida civil. A capacidade de direito corresponde ao usufruto das normas já estabelecidas na sociedade, enquanto a de fato corresponde ao exercício dessa capacidade de solução de conflitos, a partir da de direito. A união dessas capacidades confere à todos os indivíduos, como protege a constituição nacional, a capacidade civil plena, ou seja, a capacidade de exercer direitos com base nas normas já estipuladas dentro da sociedade. No entanto, da mesma forma como é protegida a capacidade, para a manutenção da vida social, sem que a sociedade torne à barbárie, a lei estipula um rol que classifica os incapazes de direito, para proteger tanto os próprios quanto os que estão à sua volta. A lei, especificamente no artigo 3° do código civil, classifica algumas pessoas como incapazes ao reconhecer a inexistência dos atributos personalíssimos necessários para que exerçam seus direitos. É, portanto, uma restrição do poder de agir pelas pessoas que não possuem idade para isso, condição mental, ou saúde física. Para o Doutor Professor Miguel Reale, “personalidade todos os homens têm, desde o nascimento. Para se reconhecer a personalidade não é mister indagar do sexo, da idade, ou do discernimento mental. Recém-nascidos ou dementes, todos são pessoas, todos possuem personalidade. Nem todos, porém, dispõem de igual capacidade jurídica, isto é, têm igual possibilidade de exercer certos atos e por eles serem responsáveis. A capacidade pressupõe certas condições de fato que possibilitam o exercício de direitos. Assim, por exemplo, uma criança não é capaz, e o demente também carece de capacidade.” Costuma-se notar que a capacidade de fato está relacionada à materialidade necessária para o exercício, enquanto a segunda é concemente à aptidão legal para a prática dos atos jurídicos. Não bastando o fato de nascer com vida, para obter a capacidade de exercício, é necessário o indivíduo possuir certos requisitos (atributos personalíssimos) que garantam esse poder. Sob esse contexto, fica expresso que não são todas as pessoas que detém a capacidade de fato, que é a aptidão para exercer, por si só, os atos da vida civil. Por essas pessoas estarem privadas de alguns requisitos materiais, como maioridade, saúde, desenvolvimento mental etc., a lei, com o intuito de protegê-las, não lhes negue a capacidade de adquirir direitos, apenas sonega- lhes o de se autodeterminarem, ou seja, de exercerem pessoalmente e diretamente, exigindo sempre a participação de outra pessoa, que as represente ou as assista. Assim, os recém- nascidos e os amentais, possuem apenas a capacidade de direito, podendo, por exemplo, herdar uma herança de seus tutores. No entanto, não têm a capacidade de fato ou de exercício. Nesse caso, os indivíduos exercendo sua capacidade limitada, para proporem qualquer ação em defesa da herança recebida, precisam ser representados pelos pais e curadores, respectivamente. A incapacidade caracterizando-se como falta de aptidão para o exercício de alguns direitos e funções da vida civil, acaba por se dividir em duas espécies, de fato e civil. A primeira, também chamada de natural, resulta das condições psíquicas das pessoas, compreendendo sexo, idade, saúde mental, condições culturais, etc. Por outro lado, a segunda resulta a partir de disposições legais, ou seja, a partir de uma sentença judicial como, por exemplo, a que o artigo 4° do Código Civil específica para os casos de relatividade e que o artigo 3° especifica os de totalidade. Artigo 4°: “São incapazes, relativamente a certos atos, ou à maneira de exercê-los: I. Os maiores de dezesseis e menores de dezoito anos; II. Os ébrios habituais, os viciados em tóxicos, e os que, por deficiência mental, tenham o discernimento reduzido; III. Os excepcionais, sem desenvolvimento mental completo; IV. Os pródigos”. Artigo 3°: “São absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil: I. Os menores de dezesseis anos; II. Os que, por enfermidade ou deficiência mental, não tiverem nenhum discernimento para a prática desses atos”. Para que tais indivíduos possam exercer sua capacidade de direito sem a capacidade de fato, a lei condiciona a validade dos atos à assistência de alguém. Primeiramente, a responsabilidade é dos pais e, na sua falta, ou porque perderam o poder familiar – para o exemplo de sentença de abandono de incapaz, o tutor, para menores, ou curador, para maiores de idade. Caso contrário, qualquer ato praticado sem cumprir tais condições é anulado. Para esses casos, a capacidade de agir é suprida pela representação legal, pois os menores impúberes (até dezesseis anos de idade) serão representados pelos pais, pelos tutores quando os pais não puderem exercer seu papel, ou curadores enquanto os demais, púberes (entre dezesseis e dezoito anos) serão assistidos pelos mesmos. O ausente é a pessoa cujo paradeiro acaba ficando desconhecido, podendo presumir a morte do individuo sem que se tenha descoberto o cadáver. De acordo com o artigo 22 do Código Civil – “Desaparecendo uma pessoa do seu domicilio sem dela haver noticia, se não houver deixado representante ou procurador a quem caiba administrar-lhe os bens, o juiz, a requerimento de qualquer interessado ou do Ministério Publico, declarará a ausência e nomeará um curador”. Feito o pedido judicial por parte dos interessados, o juiz irá nomear um curador especial que difere da curatela normal dos incapazes, aplicando, no entanto, os mesmos princípios gerais para curatela e tutoria normais. Caso o interesse seja do ministério publico, este deverá intervir por meio do artigo 82 do Código Processo Civil – “I - nas causas em que há interesses de incapazes; II - nas causas concernentes ao estado da pessoa, pátrio poder, tutela, curatela, interdição, casamento, declaração de ausência e disposições de última vontade; III - em todas as demais causas em que há interesse público, evidenciado pela natureza da lide ou qualidade da parte”. O juiz ao nomear um curador especial,fixará sobre este os poderes e obrigações, conforme circunstancias, observando, no que for aplicável, o disposto a respeito dos tutores e curadores. Sob essa afirmação, o juiz mandará arrecadar os bens do ausente, ainda não tendo sido considerado como morto e nomeará um curador para fazer a arrecadação destes bens. Dessa forma publicará por editais durante o período de um ano, reproduzidos de dois em dois meses, anunciando a arrecadação de seus bens e propriedades, chamando o ausente a entrar na posso destes para que não sejam partilhados. De acordo com o artigo 653 define que se opera o mandato, através da procuração, quando alguém recebe de outrem poderes para, em seu nome, praticar atos ou administrar interesses. O artigo 682 especifica os casos em que o mandato cessa: “I – pela revogação ou pela denúncia (efetuada pelo ministério público); II – pela morte ou interdição de uma das partes; III – pela mudança de estado de inabilite o mandante a conferir os poderes, ou o mandatário para exercê-los.”. O Código Civil protege, em primeiro lugar, os interesses do ausente até que se comprove a sua morte e, neste sentido, o artigo 26 discorre que – “Decorrido um ano da arrecadação dos bens do ausente, ou, se ele deixou representante ou procurador, em se passando três anos, poderão os interessados requerer que se declare a ausência e se abra provisoriamente a sucessão de bens”, fazendo com que a definição do artigo 31 – “Os imóveis do ausente só se poderão alienar, não sendo por desapropriação (sempre por interesse público, garantido pela constituição) ou hipotecar, quando lhe ordene o juiz, para lhe evitar a ruína”, caia em desuso. Por segundo, protege a expectativa dos sucessores, pois o direito à sucessão efetiva se dá com a morte do autor da herança. No entanto, essa correspondência das expectativas dos sucessores foi pré-estabelecida pelo código civil, em especifico pelo artigo 37 – “Dez anos depois de passada em julgado a sentença que concede a abertura de sucessão provisória, poderão os interessados requerer a sucessão definitiva e o levantamento das cauções prestadas”. Ou seja, a morte do ausente só é declarada de fato após o período de dez anos, onde, nesse meio tempo, ocorra gradualmente a arrecadação dos bens, o requerimento de sucessão provisória e, após dez anos, o requerimento de sucessão definitiva. Em suma, a arrecadação é uma medida que o juiz toma para que o curador selecionado possa administrar o processo desses bens para o caso de o ausente retornar. Caso este não retorne em um período de dez anos, sua morte é declarada e a sucessão provisória, que somente resguarda os bens do ausente, passa a ser definitiva. Para proteção do patrimônio do ausente o artigo 29 dispõe que - “Antes da partilha, o juiz, quando julgar conveniente, ordenará a conversão dos bens móveis, sujeitos a deterioração ou a extravio, em imóveis ou em títulos garantidos pela União”, dessa maneira o juiz protege os bens do ausente para o caso de ele retornar necessitando do uso destes. Em Roma tal regra era concebida como “Fructuarius causam proprietatis deteriorem facere non debet, meliorem facere potest” – não deve permitir a deterioração da propriedade, não usando a coisa arbitrariamente, e sim, cuidar do bem como bônus do pater familiae, ou seja, do pater família, seus antecessores. Para o caso de a morte for presumida, devido o período de dez anos, o parágrafo 2° do artigo 39 do código civil especifica – “Se, nos dez anos a que se refere este artigo, o ausente não regressar, e nenhum interessado promover a sucessão definitiva, os bens arrecadados passarão ao domínio do Município ou do Distrito Federal, se localizados em respectivas circunscrições, incorporando-se ao domínio da União, quando situados em território federal”. A personalidade jurídica, sendo atributo do homem que surge através das suas relações em sociedade e da sua formação moral e ética da personalidade social, que o faz se compreender como individuo situado no mundo para buscar o cumprimento de suas vontades, acompanha-o por toda a sua vida cessando somente com a morte real ou presumida. De acordo com o artigo 6° do Código Civil Brasileiro, “a existência da pessoa natural termina com a morte; presume-se esta, quanto aos ausentes, nos casos em que a lei autoriza a abertura de sucessão definitiva”. É estipulada pelo artigo 8° do Código Civil que dispõe – “Se dois ou mais indivíduos falecerem na mesma ocasião, não se podendo averiguar se algum dos comorientes precedeu aos outros, presumir-se-ão simultaneamente mortos”. No caso de acidentes que resultem em falecimento, é necessário saber qual ocorrera em primazia para reconhecer a questão sucessória. Para isso, o direito encontra, através da prática da medicina legal, as informações técnicas, exempli gratia, o enrijecimento do cadáver, esfriamento, putrefação, etc. Outro método mais efetivo é o testemunho do fato por intermédio de pessoas presentes no local do acidente ou do falecimento. Caso ocorra a comorência não há transferência de direitos entre os mesmos, chamando diretamente à sucessão os seus respectivos herdeiros. Relacionando o caso da morte ao estudo dos indivíduos no mundo surge a tanatologia como uma ciência responsável pelas questões médicas, biológicas e juridicas que a envolve, o que inclui a autópsia, investigação de vestígios e evidências de atos ilícitos, etc. A tanatologia atuando com a evolução tecnológica da medicina alterou o conceito de morte tradicional – ausência de respiração espontânea e falta de movimentos cardíacos, para um conceito mais amplo que se caracteriza por uma perda progressiva das funções corpóreas e, portanto, celulares. Assim, surge nos anos sessenta, o conceito de morte cerebral que, por um processo, efetua a perda de outras funções necessárias à vida humana. A partir dessa proposta de morte cerebral e não de morte em função da para cardiorrespiratória, os conselhos médicos iniciaram um processo que envolve o mundo politico e social sobre o coma irreversível sendo considerado como morte, pois o cérebro passou a ser o objeto central da vida. Do ponto de vista da bioética – “função dos cidadãos de promover a saúde e o bem-estar de todos e, ao mesmo tempo, defender os direitos daqueles que hei de compor as gerações futuras”, cabe-se a pergunta: “A identificação e fundamentação da morte não seria uma convenção da sociedade, assim como o conceito de começo da vida?”. Tal questionamento, quando levantado, gerou uma profunda reflexão moral dentro da sociedade, pois a morte se trata de fato, tanto quando natural quanto quando induzida, de um processo continuo e degradante da função da vida humana. Ementa “CRIMINAL. RHC. PRETENSÃO DE OBSTACULIZAR A INSTAURAÇÃO DE INQUÉRITO, A REQUERIMENTO DO MINISTÉRIO PÚBLICO, QUE VISA À APURAÇÃO DE EVENTUAL CRIME DE ABANDONO DE INCAPAZ. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO-EVIDENCIADO. IMPROPRIEDADE DO WRIT. RECURSO DESPROVIDO.” Não se impede a remessa de documentos à autoridade policial, a requerimento do Ministério Público, para a instauração de inquérito com o objetivo de apurar crime de abandono de incapaz, pois o mero indiciamento em inquérito não caracteriza constrangimento ilegal reparável via habeas corpus. Precedentes. - Recurso desprovido - Trata-se de crime próprio, no sentido de infração que exige qualidades especiais do agente, em razão de seus vínculos com a vítima. Acórdão “Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da QUINTA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, a Turma, por unanimidade, negou provimento ao recurso. Os Srs. Ministros Jorge Scartezzini e Felix Fischer votaram com o Sr. Ministro Relator.”Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro José Arnaldo da Fonseca. Nesse crime, a vítima é pessoa que se encontra sob o cuidado, sob a guarda, vigilância ou autoridade do sujeito ativo, sujeito esse que, em tais condições, dela se afasta fisicamente, abandonando-a totalmente. A relação jurídica de cuidado é caracterizada pelo fato de alguém ter o encargo de zelar, nas devidas circunstâncias, pela saúde e integridade física de outrem. Por outro lado, a relação jurídica de guarda, é caracterizada para o caso de a obrigação é ser mais envolvente, diante da incapacidade natural ou relativa da outra parte. A relação jurídica de vigilância ocorre quando a obrigação se restringe a um compromisso ocasional de observação e proteção acautelatória enquanto a de autoridade ocorre sob a hipótese de um poder-dever de mando e orientação, vinculado a normas de direito público ou direito privado, bastando qualquer uma dessas relações para que ocorra o delito. O comum, porém, é que elas coexistam, ao menos em parte. O pai, por exemplo, no que tange ao filho menor, com quem sai a passeio, mantém sobre ele deveres de cuidado, vigilância, guarda e autoridade. Da mesma forma, os cônjuges entre si e o médico em face de seu paciente assumem deveres de cuidado. O diretor da penitenciária tem a guarda (custódia) dos sentenciados e sobre eles exerce autoridade, nos termos e limites da lei. O guia turístico de uma expedição arriscada deve conservar sua proteção (vigilância) até o final de seu trabalho. O conceito de guarda, por sua "inquestionável flexibilidade no campo penal", inclui igualmente as hipóteses de "qualquer situação fática devidamente demonstrada", como lembra Silva Franco (Tortura: breves anotações sobre a Lei 9.455/97, Revista Brasileira de Ciências Criminais, n° 19, jul./dez. 1997, p. 61, São Paulo: RT). Para esses crimes, a vítima quase sempre é uma criança, de quem se livram os familiares, mas nada impede que os adultos inclusive saudáveis se enquadrem nessa condição. Basta que sofram efetivamente a situação de perigo para a vida ou saúde, provocado por quem tinha o dever prévio de garantir-lhes a incolumidade pessoal. A materialidade do delito, que é de perigo concreto, reside no ato de afastar-se da vitima, colocando-lhe em risco a vida ou a saúde e, portanto, de modo a deixa-la em situação perigosa ainda que por breve instante. De acordo com o artigo 133 do Código Processo Penal - Abandono de Incapaz, o crime se caracteriza por: “Abandonar pessoa que está sob o cuidado, guarda, vigilância ou autoridade, e, por qualquer motivo, incapaz de defender-se dos riscos resultantes do abandono”. Ato este que gera como pena a detenção por um período de seis meses a três anos, podendo variar, devido outros agravantes, tais como os estipulados pelos parágrafos 1°, 2° e 3°: § 1º - Se do abandono resulta lesão corporal de natureza grave: Pena - reclusão, de um a cinco anos. § 2º - Se resulta a morte: Pena - reclusão, de quatro a doze anos. § 3º - As penas cominadas neste artigo aumentam-se de um terço: I - se o abandono ocorre em lugar ermo; II - se o agente é ascendente ou descendente, cônjuge, irmão, tutor ou curador da vítima. III - se a vítima é maior de 60 (sessenta) anos (Incluído pela Lei nº 10.741, de 2003). Ao efetuar uma análise sobre a incapacidade do ser, que pode ser caracterizada como total ou parcial, sabe-se que, para os casos em que a incapacidade for parcial, quando o sujeito detém a capacidade de ter direitos, não de se valer do meio jurídico, para si próprio, visando à resolução dessa relação conflituosa. Nesse contexto, o crime de abandono de incapaz se relaciona, tanto na prática quanto na teoria, com a incapacidade de a vítima exercer, por si própria, a ação de se defender de qualquer perigo, garantindo com isso a manutenção de um direito essencial protegido pela constituição, a vida. Valendo-se da premissa de que, para garantir a capacidade de fato, o individuo necessita de atributos personalíssimos, tais como higidez física e saúde mental, o abandono do incapaz de fato, ou seja, de um idoso ou de uma criança, que somente detém a capacidade de direito, gera por consequência uma sequela no extrato corpóreo do individuo, podendo ocorrer até o falecimento deste, impossibilitando que a vítima defenda um direito natural primordial do homem, o direito da vida.
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