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Brito, T. (2008). O Marcador de Passos

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o Marcador
de PaSSOS
INDEX BOOKS GROUPS: perpetuando impressões! 27/8/2015
27/8/2015 INDEX BOOKS GROUPS: perpetuando impressões!
 
 
 
INDEX 
BOOKS 
GROUPS 
 
 
Thales Brito
o Marcador
de Passos
ESETec
2008
INDEX BOOKS GROUPS: perpetuando impressões! 27/8/2015
27/8/2015 INDEX BOOKS GROUPS: perpetuando impressões!
 
 
 
INDEX 
BOOKS 
GROUPS 
 
 
Copyright O desta edição:
ESETec Editores Associados, Santo André, 2008. 
Todos os direi los reservados
Revisão técnica: Dra. Regina Christina Wieienska
Capa: Enrico Mistero
ilustração: Edson Ferreira de Lima
Colaboradores:
Dr. Edson Amâncio 
Dra. Sbirlei Lizaki Zolfan 
Raquel Brito 
Ronaldo Ferreira 
Tatiana Bertoni
Solicitação de exemplares: comercial@uol.com.br
Tel. (11) 4990 56 83 (editorial) ! 4438 GÖ 66 (vendas) 
www.esetec.com.br
INDEX BOOKS GROUPS: perpetuando impressões! 27/8/2015
27/8/2015 INDEX BOOKS GROUPS: perpetuando impressões!
 
 
 
INDEX 
BOOKS 
GROUPS 
 
 
Dedico esse livro a Raquel. Brito, 
Sandra R. Russo Brilo e 
Sérgio Brito (in niemorian)
INDEX BOOKS GROUPS: perpetuando impressões! 27/8/2015
27/8/2015 INDEX BOOKS GROUPS: perpetuando impressões!
 
 
 
INDEX 
BOOKS 
GROUPS 
 
 
INDEX BOOKS GROUPS: perpetuando impressões! 27/8/2015
27/8/2015 INDEX BOOKS GROUPS: perpetuando impressões!
 
 
 
INDEX 
BOOKS 
GROUPS 
 
 
Sumário
Introdução........................................................................9
O marcador de passos.......................... .......................12
Não fale com estranhos................................................ 16
Histórico..........................................................................18
Muito prazer, sou o TOC: o diagnóstico..................... 22
O “O” do TOC: obsessões...........................................30
O “C” do TOC: compulsões.......................... ..............33
Fenômenos sensoriais.................................................. 36
Guardiões x Invasores.................................................. 39
Pausa..............................................................................44
Atenção seletiva............................................................ 45
Experiência (A.S. Atenção Seletiva)..........................49
Os dois lados da moeda: ansiedade e depressão....,51
Tensão pré-ataque obsessivo.......................................54
Lentidão obsessiva....................................................... 56
Adoção de novos rituais..................... ...........................58
Contemplando as formas: geometria intrigante........ 60
Pausa..............................................................................62
TOC - atual e passado................................................. 64
O mundo numa grande roda gigante ............................65
INDEX BOOKS GROUPS: perpetuando impressões! 27/8/2015
27/8/2015 INDEX BOOKS GROUPS: perpetuando impressões!
 
 
 
INDEX 
BOOKS 
GROUPS 
 
 
Mudança: o velho e o novo............................................67
Pausa..............................................................................71
Evitação......................................................................... 72
Fantasmas de carne e osso.........................................76
Pausa..............................................................................78
Abstinência - um vazio ilim itado.... .............. ...............79
Pausa.............................................................................. 81
Genética - dos frutos, os genes..................................82
Palavras cruzadas, imagens roíulantes.................... 85
Impulsos - traídos pelos pensamentos.......................87
O comportamento da crença e TOC desenvolvido ...90
Congelado no tempo..................................................... 92
Dormindo no tem po...................................................... 94
Pausa..............................................................................93
Em nome do tempo, da crença e da direção.............. 96
Síndrome de Tourette....................................................99
Quebra de tabus .........................................................103
Passos marcados, outras histórias...... .................... 104
Passos marcados 2 ..................................................... 111
Batalhas.............................................. ......................... 117
Passos à frente............................................................ 119
O sonho fina l................................................................122
INDEX BOOKS GROUPS: perpetuando impressões! 27/8/2015
27/8/2015 INDEX BOOKS GROUPS: perpetuando impressões!
 
 
 
INDEX 
BOOKS 
GROUPS 
 
 
Introdução
Escolhi este título em alusão às obsessões, 
que são aquelas mensagens errôneas, pensamentos 
que vêm à cabeça, causando literalmente transtorno, em 
qualquer momento e lugar. A cada situação, em cada 
passo do cotidiano, as obsessões permanecem mar­
cando os passos, induzindo ao estado de compulsões 
sem limites.
Após tomar ciência de que era portador de 
Transtorno Obsessivo-Compuisivo (TQC) e dar início ao 
tratamento, passei a compreender muitos dos sintomas 
que me perturbavam com ajuda de Dra. Shírlei Lizak 
Zolfan, minha psicóloga. Compreendi o TOC e seus sin­
tomas de tal forma, ao ponto em que parte da própria 
terapia se fez em ter que parar de me aprofundar no 
assunto. Embora desautorizado, me engajei no aprofun­
damento com objetivo social, queria esclarecer o público 
em gera! por meio das questões abordadas neste livro.
Como aconteceu comigo, a maioria dos porta­
dores de TOC só reconhece sua condição ao ter acesso 
na mídia eletrônica ou impressa a informações sobre a 
doença. Optei por escrever um livro, sem a pressão de 
ter que ser breve. Espero não só colaborar com a for­
mação dos profissionais de psicologia, psiquiatria,
0 matradur <7<> j m , 9
INDEX BOOKS GROUPS: perpetuando impressões! 27/8/2015
27/8/2015 INDEX BOOKS GROUPS: perpetuando impressões!
 
 
 
INDEX 
BOOKS 
GROUPS 
 
 
neurologia, mas também com os próprios portadores 
de TOC e seus familiares. Gostaria que os mais leigos 
ao assunto compreendessem do que se trata, sem pré- 
julgamentos ao comportamento alheio.
Ao longo do livro descrevo meu histórico e os 
sintomas que caracterizaram o agravamento do meu 
caso. Acrescento conclusões pessoais, teorias, o ponto 
de vista médico, estatísticas e o que aprendi em terapia.
Minha intenção é oferecer leitura agradável e 
instrutiva, apesar da complexidade e redundância do 
próprio TOC. Gostaria que muitas das crianças hoje, por­
tadoras de TOC, não cheguem à adolescência com 
seus conflitos desnecessariamente agravados Que pes­
soas de qualquer idade possam reconhecer em si mes­
mas ou em alguém próximo, a sombra deste “marcador 
de passos”.
“O Transtorno Obsessivo Compulsivo é um problema 
caracterizado por idéias recorrentes e intrusivas, geral ­
mente acompanhadas de desconforto emocional e de 
comportamentos ritualizados irresistíveis. Até o início dos 
anos 80, pensava-se tratar de um quadro psiquiátrico 
relativamente raro, com incidência muito pequena.
Os sintomas começam tipicamente durante a puber­
dade, afetando tanto homens quanto mulheres de todos 
os grupos étnicos, e também podem ter inicio na infân­
cia. o que ocorre em um terço de todos os casos. Atinge 
igualmente todas as classes sociais.
Existem vários quadros psiquiátricos que costumam 
estar relacionados com o TOC: Tricotilomania, Transtorno 
Dismórfico do Corpo, Transtorno de Tiques, Transtorno 
de Déficit de Atenção e Hiperatividade, e Hipocon­
dria.Também é frequentemente acompanhado por 
depressão (em torno de 75% doscasos), Transtornos 
Alimentares, abuso de substâncias e transtornos de per­
sonalidade. "
Titules Unn,
INDEX BOOKS GROUPS: perpetuando impressões! 27/8/2015
27/8/2015 INDEX BOOKS GROUPS: perpetuando impressões!
 
 
 
INDEX 
BOOKS 
GROUPS 
 
 
"O TOC é considerado uma doença mental grave por 
vários motivos: Está entre as dez maiores causas de 
incapacitação de acordo com a Organização Mundial da 
Saúde; acomete preferencialmente indivíduos jovens ao 
final da adolescência e muitas vezes começa ainda na 
infância; geralmente é crônico e se não tratado, pode se 
manter por toda a vida. Seus sintomas raramente 
desaparecem por completo e, em cerca de 10 % dos 
casos, tendem a um agravamento progressivo. "(Revista 
psique ciência e vida, vol. 9 , Editora Scala)
O m n r a td n r cic [ ta sso s a
INDEX BOOKS GROUPS: perpetuando impressões! 27/8/2015
27/8/2015 INDEX BOOKS GROUPS: perpetuando impressões!
 
 
 
INDEX 
BOOKS 
GROUPS 
 
 
O marcador de 
passos
Todos nós temos hábitos e preferências. Um 
hábito de alinhar o quadro na parede não parece algo 
exuberante. Trata-se apenas de zelar pela disposição 
de um objeto, organizar uma parede. Mas pode se tornar 
um ato caracterizado pela extrema necessidade de 
alinhar o quadro sem que o mesmo esteja fora do prumo. 
O mesmo pode acontecer com outras escolhas, refe­
rentes à música, cor, perfume, prato predileto. Preci­
samos escolher entre a ruiva, a loira e a morena. São 
preferências normais construídas desde a infância. Con­
tudo ao preferir determinada cor: necessariamente rejeito 
outra. E se ao escolher entre a calçada preta e branca, 
sentir que há um local “ideal” para pisar e que escolher 
“errado” fará com eu me sinta tomado por intenso 
desconforto? Nestes casos, provavelmente alguma 
obsessão pode estar se estabelecendo. Ao andarmos 
pela cidade, vemos que cada rua ou calçada ê de um 
jeito, algumas são elevadas, coloridas, rebocadas, incli­
nadas, irregulares, ou acinzentadas. Em São Paulo, até 
recentemente, as calçadas seguiam o padrão do 
mosaico português, pedras pretas e brancas formavam 
desenhos e cercavam os arranha-céus. No interior 
destes, encontramos outros tantos estilos de pavimento. 
Agora, imaginem sentir que seria catastrófico não poder
/ hah's liriti:
INDEX BOOKS GROUPS: perpetuando impressões! 27/8/2015
27/8/2015 INDEX BOOKS GROUPS: perpetuando impressões!
 
 
 
INDEX 
BOOKS 
GROUPS 
 
 
escolher um loca! pré-determinado para pisar e dar 
seqüência aos passos, apenas porque somos impedidos 
por um buraco logo à frente? Honesta e racionalmente, 
isto não parece sensato; entretanto, no papel de um 
marcador de passos, haveria controvérsia...
A melhor forma de ilustrar o assunto talvez fosse 
com o seguinte conto:
Era uma tarde cinzenta, típica de São Paulo. 
O vento forte, somado ao fluxo dos carros da Avenida 
Paulista, parecia cortar o rosto. Os letreiros com 
termômetros marcavam treze graus, isto faltando dez 
para a$ quatro da tarde. Caminhava sem pressa, em 
direção ao Metrô, & parei numa banca de jornais pra 
espiar rapidamente os lançamentos da semana. Não 
queria encarar o horário do “rush", das dezessete 
horas em diante. A dois passos da banca, passou 
por mim um homem relativamente apressado, emi­
tindo um “urro" de irritação, o qual disfarçou simu­
lando, a seguir, um pigarro. Sua fisionomia não era 
das melhores: barba por fazer, óculos precariamente 
remendados com adesivos, face oleosa e suada 
(apesar do frio). Com olhar sisudo, parecia, ao mes­
mo tempo, vulnerável e preocupado. Aparentava uns 
55 anos. Vestia um terno até que alinhado, com a 
mão esquerda ocupada por uma pasta e um guarda- 
chuva de aparência pré-histórica. Com a mão direita 
livre, mexia sistematicamente os dedos numa se­
qüência que dava a impressão de fazer uma espécie 
de cálculo, mesmo com o balançar do braço. Movi­
mentava a boca como se resmungasse ou estivesse 
rezando.
Coincidentemente, caminhávamos na mes­
ma direção. Estava uns cinco metros à minha frente. 
Me rendi à curiosidade, ainda mais quando observei 
que estava a passear sobre o relevo branco da 
calçada e que cerrava o punho direito da mão vazia,
O rn tuv ido r dt' ffissos
INDEX BOOKS GROUPS: perpetuando impressões! 27/8/2015
27/8/2015 INDEX BOOKS GROUPS: perpetuando impressões!
 
 
 
INDEX 
BOOKS 
GROUPS 
 
 
caso pisasse minimamente nas partes pretas. Em 
certos momentos, quando pisava sobre os blocos 
negros, erguia os calcanhares, como se o chão lhe 
queimasse a planta dos pés. Não tolerava um deslize 
sequer, e eu, curioso, mantinha a mesma distância, 
à sua espreita.
Mais próximo do metrô, neste trajeto que 
beirava uns dez minutos, ele parou à frente de um 
dos edifícios. Sua penúltima manobra sobre o branco 
relevo da calçada, o fez antever que a última passada 
teria que ser sobre o extenso retângulo negro, para 
atingir os dois degraus da recepção, igualmente 
negros, antecedendo o capacho instalado logo na 
entrada, com o slogan da corporação sediada no 
edifício. Sem que ele percebesse, notei que parou 
sobre o relevo branco da calçada. Foi quando me 
perguntei. Como será sua reação ante os degraus 
pretos, considerando que ele parece evitar ferozmente 
esta cor? Cada vez mais intrigado, diminui meus pas­
sos para assistir o desenrolar da história daquele 
homem que marcava seus passos. O fluxo de popu­
lares na região era reduzido, mas à medida que alguns 
se aproximaram, o homem olhou brevemente para 
os lados, como quem respira fundo e toma coragem. 
Saltou diretamente para o primeiro degrau do edifício, 
e retomou o equilíbrio. Aumentou a quantidade de 
pessoas que passavam e compreendi que o homem 
receava ter seu comportamento observado por ter­
ceiros. Então escalou os próximos degraus e chegou 
ao capacho do edifício. O homem transpirava irritação 
em pleno frio, abaixou a cabeça levemente e bateu 
forte o pé direito por duas vezes, dando a impressão 
de que estivesse descolando um detrito grudenío da 
sola do sapato. Objetivo e notavelmente irritado, olhou 
em direção da recepção.
Queria testemunhar o “Grand Finale” deste 
percurso, fingi que procurava o número de um ponto 
comercial na fachada ao lado. Pela porta de vidro 
que separava o hall de entrada da rua, localizei o 
protagonista da história. O chão era composto de
1 flüli's Hriu,
INDEX BOOKS GROUPS: perpetuando impressões! 27/8/2015
27/8/2015 INDEX BOOKS GROUPS: perpetuando impressões!
 
 
 
INDEX 
BOOKS 
GROUPS 
 
 
grandes quadrados que lembravam um enorme 
tabuleiro de damas feito de mármore nas cores 
branca e preta, igual aos obstáculos impostos na 
avenida. Agora não poderia perder o desfecho do 
trajeto daquele homem já cansado. Os quadrados do 
chão eram enormes, não haveria como saltar sobre 
eles, por mais que se esforçasse Pisou na parte 
branca, mas não teve jeito, e precisava encarar os 
quadrados negros, aqueles que pareciam queirnar- 
ihe os pés. Passou apressadamente por todos, até 
que enfim aproximou-se da moça recepcionista, 
justamente cercada um último bloco preto. Identificou- 
se e aguardou impacientemente que o anunciassem. 
Tamborilava com os dedos da mão direita, enquanto 
olhava perplexo para os lados, quase subindo pelas 
paredes. Enfim, fora anunciado, agradeceu à moça 
e rumou direto á escadaria, talvez por não querer 
usar ou não suportar a espera dc elevador. Logo após 
iniciar a *prova ” da escadaria, vi que voltou ao primeiro 
degrau, a caçar alguma coisa que poderia ter deixado 
cair, e como não encontrou, deu um sorriso à 
recepcionista, que abordou-lhe com os olhos tentando 
entender o motivo que o fizera voltar. Tornou a iniciar 
sua escalada pelos degraus e novamente retornou, 
agora com gestos de quem pergunta as horas à 
mesma moça. Depois da informação,subiu com 
pressa e não o vi voltar mais. Ao término deste com­
plexo circuito, retomei meu rumo a caminho do metrô.
() marcador de paxsox
INDEX BOOKS GROUPS: perpetuando impressões! 27/8/2015
27/8/2015 INDEX BOOKS GROUPS: perpetuando impressões!
 
 
 
INDEX 
BOOKS 
GROUPS 
 
 
Não fale com 
estranhos
Veja só, rapaz! Então você me detectou! Depois 
de tanto tempo, você descobriu a mim e a minha função. 
Sabe que sou sua mente, não sabe? Tudo o que você 
aprendeu até agora me pertence. Tudo o que você faz, 
gosta ou sente também é meu. Eu dito as regras. Se 
você pensa que seus gostos, vontades, prazeres e 
projetos são seus, enganou-se. Seus pensamentos, 
aliás, são meus. Você escuta minhas ordens, obedece 
aos meus mandamentos. Sempre interagi com o seu 
corpo para processar informações, isto lhe causa repul­
sa? Você reluta e se opõe? Não me importo. Sou o dono 
do pedaço e decido quem faz o que. Seu corpo, sua 
essência rejeita meu papet de comando. Você me 
detectou e por isso tem seu mérito. Mas não imagine 
que conseguirá se desfazer da minha companhia tão 
facilmente. O que você imagina está sob meu controle. 
Não se esqueça das noites mal dormidas, dos seus in­
sucessos, do odor do seu corpo e do cansaço que sen­
tia, além do sangue escorrendo entre seus dedos en­
quanto escrevia neste papel. Eu o prejudiquei ao máximo; 
basta recordar-se dos inúmeros comportamentos 
compulsivos aos quais o induzi. Tenho certeza que 
apenas citá-los seria motivo de enorme vergonha! Desde 
cedo dei tanto trabalho a você. Seu corpo ficou tão
Thal cs Hri'v
INDEX BOOKS GROUPS: perpetuando impressões! 27/8/2015
27/8/2015 INDEX BOOKS GROUPS: perpetuando impressões!
 
 
 
INDEX 
BOOKS 
GROUPS 
 
 
exausto que quase apodreceu. Você mal conseguia 
dormir e, quando conseguia, não queria mais levantar. 
Não me desculpo pelos transtornos que causei! Apenas 
me mostrei eficiente no que faço; trabalho bem, não 
acha? Você me parece um tanto obstinado e curioso, 
certo? Eu o conheço. Dispus as armadilhas nas horas 
certas, e você caiu. Tudo que o favorece, contraria meus 
objetivos. Luto por aquilo a que você se opõe. Sou o seu 
avesso. Sou você de ponta-cabeça, você ordinário e 
destruído, destituído. Minha única falha: você ouviu o eco 
dos meus passos. Já que me encontrou, vou mo apre­
sentar. Nem considere me vencer! Muito prazer, sou o 
Transtorno Obsessivo-Compulsivo. Sou mais conhecido 
por TOC, prefiro este apelido. TOC. Agora, sente-se e 
relaxe... Aceita uma sugestão? Que tal o suicídio?
O marcador d? pasâos 17
INDEX BOOKS GROUPS: perpetuando impressões! 27/8/2015
27/8/2015 INDEX BOOKS GROUPS: perpetuando impressões!
 
 
 
INDEX 
BOOKS 
GROUPS 
 
 
Histórico
Para um bom entendimento, conto parte da 
minha vida: os primeiros sintomas e suas terríveis decor­
rências. Tudo começou cedo em torno dos seis ou sete 
anos. Um menino tímido, bem comportado, mas de certa 
forma detalhista. Era criativo, brincava como toda 
criança. Já demonstrava o sintoma de piscar repetitiva­
mente os olhos, mas não sabia explicar as razoes deste 
comportamento. Hoje sei que isso pode ocorrer com 
relativa freqüência na infância. Esse primeiro sintoma, 
piscar, faz parte da Síndrome de Tourette (ST), carac­
terizada por tiques incontroláveis.
Havia, também, uma tendência perfeccionista: 
isto culminava, por exemplo, em sistematicamente 
organizar meus chinelos em determinada posição, 
simetricamente. Se alguém, por acaso, esbarrasse ou 
tropeçasse neles, eu ficava irritado porque me sentia 
obrigado a reorganizá-los. Meus pais percebiam essa 
preocupação com a simetria, mas como isto ocorria só 
em casa, não oferecia maior problema. Por outro lado, 
o comportamento de piscar, sintoma do Tourette, ocorria 
em qualquer lugar. Na década de 80, oTOCjá era objeto 
de estudo científico, mas permanecia pouco conhecido 
por pessoas leigas. Meus pais, por exemplo, quando
T h t t i : ’.s H n f o
INDEX BOOKS GROUPS: perpetuando impressões! 27/8/2015
27/8/2015 INDEX BOOKS GROUPS: perpetuando impressões!
 
 
 
INDEX 
BOOKS 
GROUPS 
 
 
comentavam sobre o assunto, diziam, com certa ternura: 
“Olha! Ele tem essa mania! ’. Se, ainda hoje há quem se 
surpreenda com o nome do transtorno e seus sintomas, 
naquela época nem sequer imaginavam a existência do 
TOC e Tourette. É comum, mesmo em nossos dias, 
que muitos portadores continuem a sofrer com a falta 
de divulgação. Se não houver identificação dos sintomas, 
muitos danos atingem adultos e crianças. Estas últimas 
podem crescer sob o fardo dos sintomas, alé encontrar 
um sem número de obstáculos na vida adulta.
Meus pais certamente não tiveram culpa. Meu 
quadro não aparentava ser grave e não havia espaço na 
mídia para melhor divulgação. Hoje em dia, as informa­
ções são incomparavelmente mais acessíveis do que 
eram há dez ou vinte anos.
Tive um desenvolvimento relativamente normal, 
até que, por volta dos nove ou dez anos, outros 
comportamentos repetitivos surgiram. Eram como um 
tipo de “visita chata” , que demorava a ir embora. 
Tornaram-se mais complexos, vieram acompanhados 
de obsessões: eu era acometido por pensamentos 
desagradáveis dos quais queria me livrar. Quando 
pessoas não pertencentes à minha família me cumpri­
mentavam com um aperto de mão ou me abraçavam, 
eu "limpava” a área de contato, como se estivesse 
tirando o pó da roupa ou a sujeira das mãos. Era como 
se o contato físico me transmitisse alguma essência 
nociva, inerente a quem que me tocava. E, para me iivrar 
do desconforto, precisava fazer uma espécie de ritua! 
de limpeza. Tudo era ainda tolerável porque resultava 
num mínimo de constrangimento. Mas certas pessoas 
diziam que eu era nojento ou fresco.
Os tiques desapareceram por algum tempo, 
fenômeno comum nos casos de ST. Os rituais de 
limpeza também foram desaparecendo. Mais tarde, na 
adolescência, surgiram outros sintomas, bastante
( ) im irc n d o r dc /x isso * 19
INDEX BOOKS GROUPS: perpetuando impressões! 27/8/2015
27/8/2015 INDEX BOOKS GROUPS: perpetuando impressões!
 
 
 
INDEX 
BOOKS 
GROUPS 
 
 
envolventes e com diferentes temas. Eu estava com 15 
ou 16 anos quando surgiu a necessidade compulsiva de 
acender e apagar a luz de um dos dormitórios da casa, 
incansavelmente. A luz do lado de fora da casa penetrava 
diretamente pelas frestas da janela do meu quarto, o que 
dificultava para que eu pegasse no sono. Eu não hesitava 
em apagá-la pelo interruptor do quarto ao lado. Pas­
saram-se meses, até que destruí o interruptor, desgas­
tado pelo uso. Passado algum tempo, o TOC me fez 
migrar de foco. Desenvolvi outro ritual. Eu tinha que tocar 
a TV da sala, e nos intervalos eu rodeava a mesa de 
centro por uma quantidade significativa de vezes antes 
de me retirar para dormir.
Os sintomas ganharam mais voracidade e trou­
xeram conseqüentes conflitos na minha cabeça. Os 
tiques de piscar voltaram, na companhia de contrações 
musculares de regiões específicas. Mas estes tiques 
nunca foram constrangedores. Eu segurava tão bem os 
impulsos para as ações, que quase ninguém notava. 
Frequentemente, quando meu pai, mãe ou irmã saía de 
casa, um pensamento ruim se apoderava de mim. Surgia 
em minha mente uma idéia como: “Essa é a última vez”, 
o que parecia prenunciar uma tragédia que estivesse 
por vir, eu acreditava que não os veria mais. Então, 
imediatamente interrompia o que estava fazendo e repetia 
tudo desde o começo, até controlar, Impedir a ocorrência 
do pensamento ruim. Muitas vezes, os pensamentos me 
abordavam de novo. Eu precisava repetir o que estava 
fazendo na hora que o pensamento ruim apareceu, 
visava substituir os pensamentos intrusos por outros 
bons, era uma forma de anular o perigo.
Infelizmente, perdi uma pessoa da família. Eu 
melembro claramente das invasões de frases imagina­
riamente escritas, acompanhadas por imagens mentais, 
que me lembravam da despedida. Essas imagens me 
atormentavam impunemente, sem avisar quando viriam..
I In/l i Uniu
INDEX BOOKS GROUPS: perpetuando impressões! 27/8/2015
27/8/2015 INDEX BOOKS GROUPS: perpetuando impressões!
 
 
 
INDEX 
BOOKS 
GROUPS 
 
 
surgiam nos momentos de raiva, alegria, prazer, tranqüi­
lidade e até nas horas mais inusitadas como as de 
refeição, enquanto me servia ou estivesse comendo As 
frases e imagens insinuavam, erroneamente, que teria 
sentido prazer com a perda daquela pessoa, o que me 
deixava transtornado pelo seu teor agressivo. Sem 
dúvida, eu não podia aceitar que um pensamento tão 
horrendo partisse de mim, ainda mais se tratando de 
uma pessoa da família.
Os rituais (também chamados de compulsões) 
eram cada vez mais intensos e impositivos, à medida 
que os sintomas obsessivos (os pensamentos atormen­
tadores) evoluíam. O ritual serve como válvula de escape. 
É um tipo de fuga, destinado a produzir um pouco de 
alívio, a mínima sensação de leveza sobre os ombros. 
Progressivamente, despendia mais atenção tempo para 
desempenhá-los. Um desgaste físico e psicológico sem 
limites. Já estava mais do que na hora de procurar ajuda, 
sabia que algo estava errado, mas não tinha idéia do 
que era. Por vezes, busquei por fim nisso tudo e fracas­
sei. Eu não tinha realmente idéia de estar sofrendo as 
conseqüências do TOC, os sintomas surgiam nas horas 
em que menos se esperava, agregando mais ansiedade 
e, por fim, depressão.
0 marcador c/e ptissos 21
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GROUPS 
 
 
Muito prazer, 
sou o TOC:
o diagnóstico
Identifiquei o TOC em mim assistindo a um pro­
grama de televisão. Estava bastante decepcionado, 
irritado e estressado pela ocorrência dos pensamentos 
invasores, as obsessões. O programa era desses sen­
sacionalistas, que se promovem em cima da desgraça 
alheia. Uma das pautas do dia era sobre TOC e celebri­
dades que assumiram sofrer de seus sintomas, como 
o cantor Roberto Carlos e a atriz Luciana Vendramini. 
No decorrer da matéria foram exemplificados em parte, 
alguns dos conflitos destas pessoas. Mencionaram a 
“impossibilidade de exercer controle sobre os pensa­
mentos obsessivos”, o que prendeu minha atenção: 
— Péra aí! Eu faço essas coisas!
Na seqüência do programa, com outros exem­
plos dos sintomas, me identifiquei ainda mais. Motivado, 
pesquisei na internet para me aprofundar no assunto. Nos 
sites que visitei, tudo bateu. Eu apresentava pelo menos 
de 75% a 80% dos sintomas descritos. Não fiquei em 
pânico, senti-me aliviado, pois achava que definiti-vamente 
estaria enlouquecendo, vivia experiências negativas que 
se convertiam, digamos, em pequenos traumas. Nessas 
pesquisas soube da existência de tratamentos adequados, 
que eu não era o único a sofrer com TOC, e resoivi buscar 
ajuda. Até aí, somente eu mesmo tinha conhecimento da
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existência do TOC em mim, o que abriu caminho para 
uma nova série de obstáculos. Devo falar para alguém? 
Se eu falar, vão acreditar? Corro risco de acharem que 
seja uma justi-ficativa barata para minha falta de interesse 
por certas atividades? Vou ter apoio? Então percebi que 
teria de me arriscar para conseguir apoio e maior 
compreensão, e expliquei à minha família como eram os 
sintomas. Ganhei algum apoio. Saber mais sobre o que 
seria o TOC fez com que eu ganhasse compreensão 
sobre as reações que sofria. A essa altura da vida, eu já 
havia feito muitas coisas, boas e más, cometi erros e 
acertos, term inei meu bacharelado e estava 
desempregado, meu relacionamento social e familiar 
sucumbindo pelo agrava-mento de meu estado. Irritado 
com certas coisas e pes-soas, eu me dispunha 
exclusivamente à prática de exercí-cios físicos, naqueia 
fase já quase intoleráveis pois até nesta hora os rituais 
emergiam. Eu não tinha quase nada e perdia o pouco que 
tinha, dia após dia. Estava desa-nimado, triste, agitado, 
irritado, com olheiras profundas. Desgastado e 
extremamente cansado, mas com uma energia e fúria 
maiores que eu, vivia entre a inatividade e a execução 
impositiva dos rituais. As oscilações de humor eram muito 
freqüentes, principalmente entre a ansiedade e a 
depressão, em curto espaço de tempo e em graus 
extremos.
"Me sinto um primata. Olho para os lados, sinto 
cheiro, escuto, e minhas ações são controladas como 
puro instinto: sede, fome, necessidades e um vigor 
incontrolável que não me deixava pararem um lugar fixo."
“A maioria dos portadores de TOC, só reconhecem 
a sua condição ao ler ou ouvir na mídia algo sobre a 
doença, com uma média de mais de 8 anos desde o 
aparecimento dos sintomas, até ser diagnosticado por 
algum profissional. " (Revista Psique: Ciência & Vida, 
Vol. 9)
O marcador <(<• fxinsos
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Em meio ao meu interesse pelo tratamento, 
soube da existência de alguns centros especializados, 
entre eles o PROTOC, no Instituto de Psiquiatria do 
Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP. 
Teria, primeiramente, que me inscrever para ser atendido, 
um caminho burocrático: passar por uma avaliação em 
qualquer posto de saúde, e conseguir o encaminhamento 
para o HC. Felizmente, com a ajuda do meu convênio 
médico, um psiquiatra me diagnosticou, e consegui elimi­
nar alguns obstáculos. Com o diagnóstico médico, con­
segui me inscrever para a triagem do PROTOC, e 
enquanto aguardava, consegui o número de telefone de 
uma psicóloga que teria sido professora de um colega. 
Liguei quase de imediato e fui muito bem atendido.
Shirle i Lizak Zolfan, é uma profissional 
atenciosa, recebeu título de Mestre em Educação e 
Psicopedagogia, e mostrou ser bastante competente. 
Convidou-me a uma consulta, para que me orientasse 
de alguma maneira. Sem mesmo saber dos meus recur­
sos, abriu-me as portas do seu consultório e abraçou o 
meu caso. Com certeza, jamais alguém me estendeu a 
mão da forma como ela o fez, e só lhe bastou saber 
como eu estava, a partir do que eu lhe contei e aparen­
tava. Essa pessoa, tão especial daí em diante, teve papel 
fundamental em meu tratamento. Aderi à terapia, mas 
teria que dar uma parada na vida, para poder recomeçar. 
Com intenção de que os outros não me vissem com 
maus olhos, comuniquei à minha própria família e a 
alguns colegas, pedindo simplesmente para entenderem 
o que se passava. Continuei evitando determinadas 
situações e algumas pessoas se afastaram de mim, 
gradativamente, mas isto não me fez falta. A psiquiatra 
que me atendeu no convênio receitou, de início, um medi­
camento, a paroxetina, que foi mantido no início do trata­
mento psiquiátrico no HC. A terapia medicamentosa e 
psicológica foram iniciadas em conjunto.
Titules H rilc
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Entre os meus sintomas, muitos são conside­
rados graves e outros mais simples, porém todos geram 
sofrimento. A medicação com a terapia serve exatamente 
para controlar a ansiedade e depressão. Em paralelo, a 
terapia cognitivo-comportamental (TCC) interagia com 
o medicamento, me auxiliando nas tentativas de resistir 
bravamente às demandas impostas pelas compulsões 
e obsessões.
Para que o leitor compreenda o quanto essas 
obsessões poderiam ser perigosas, vou contar um 
episódioque aconteceu antes do início do meu 
tratamento: “Certa vez, quando manuseava uma 
tesoura, sofri um pequeno corte em uma das mãos. No 
momento do corte, invadido por uma das famosas 
obsessões (que daqui por diante chamarei de invasões) 
me propus a me ferir de novo, submeter-me a outra 
incisão, para que esta fosse combinada a um bom 
pensamento, oposto ao teor da obsessão. Eu sabia que 
dificilmente conseguiria ter sucesso na primeira tentativa 
de alívio, e minha mão poderia acabar dilacerada pelos 
cortes, além do risco de infecções. Então fiz um esforço 
de contorcionista para conter esta compulsão. Senti 
grande angústia, mas me contive, evitei um grande 
ferimento. (Essa situação aconteceu antes do diag­
nóstico, próximo à data que rememora a perda do familiar 
a que me referi.)
Até pouco tempo atrás, não existia tratamento 
específico para o TOC; e felizmente nos últimos 20 anos 
foram desenvolvidas terapias que conseguem melhorar 
a vida de mais de 80% dos pacientes e, muitas vezes, 
eliminar os sintomas por completo.
Os recursos de tratamento rnais eficazes foram 
combinados: a terapia cognitivo-comportamental e a 
medicação com um inibidor de recaptação de serotonina. 
A proposta do medicamento é aumentar a concentração
<) m am ulo r de fytssos
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de serotonina, um importante neurotransmissor. No 
entanto, em casos específicos, não produz o efeito espe­
rado ou podem surgir muitos efeitos colaterais. Por 
ocasião do corte com a tesoura, eu nem imaginava o 
que era TOC, e muito menos fazia uso de qualquer 
medicação, mas se estivesse com um tratamento bem 
sucedido, a ação farmacológica do medicamento, a 
princípio, regularia meu humor e minha ansiedade (para 
encarar o dia com mais tranqüilidade), reduzindo a 
sensação de angústia. O problema é que, de início, nem 
sempre as coisas acontecem como se espera. As 
substâncias utilizadas no tratamento podem agir de 
forma inesperada; cada organismo responde de forma 
diferenciada. Isto significa que os efeitos colaterais 
comuns em medicamentos que atuam no sistema 
nervoso central podem ser aceitos por um organismo., 
mas não ser tolerados por outro.
Não respondi ao primeiro medicamento durante 
alguns meses. Sem qualquer melhora dos sintomas, 
meu humor piorou. Os efeitos colaterais eram quase 
todos os descritos pela bula, mas continuei tomando até 
que fosse constatado que a paroxetina não serviria para 
mim. No entanto, me mantive em psicoterapia uma vez 
por semana. Trocamos o medicamento, aumentamos 
as doses, e este foi mais tolerado, causando menos 
efeitos colaterais e melhora do humor, o que pareceu 
ser uma ótima troca. Com a combinação das duas 
formas de tratamento, consegui certo bem-estar. Houve 
mudança também na dosagem administrada. Em geral, 
o tratamento não se dá a curto prazo, dependendo da 
gravidade dos sintomas apresentados. Meu sintoma mais 
grave era a evitação. Para não precisar repetir compor­
tamentos a cada obsessão, passei apenas a evitar 
situações habituais, como as que me remetiam às 
lembranças traumáticas e a novas idéias negativas. 
Comecei a depender da família até para a execução de
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atividades como, por exemplo, pegar um copo. Era como 
se eu fosse uma máquina, paralisada por excesso de 
informação. Relatei à minha psicóloga como eu me 
sentia nessas horas: “— Essa doença é como um 
programa de computador, tudo nela é virtuai, recebo 
mensagens que não são verdadeiramente reais, sou 
alertado sobre perigos inexistentes. Os comandos do 
sistema são capazes de enviar informações destruido­
ras, que paralisam a máquina, programa por programa, 
ação por ação, imagem por imagem, até que reste 
apenas um recurso antes que tudo seja perdido; o botão 
reiniciar.”
Os ataques do TOC me travavam funcional e 
psicologicamente, enquanto desgostos e outras inú­
meras sensações atordoantes aproveitavam-se da situa­
ção. Lembrei-me da fase em que manifestei sérios 
distúrbios no aparelho digestivo. Foi no período que ante­
cedeu a perda do meu familiar, que já estava internado 
em estado grave. Nesta época, o TOC já mostrava sua 
densidade, e eu não tinha idéia disso.
Meu familiar acabava de safar-se de um estado 
de coma, mas quando recebeu alta e retornou para casa, 
fui fazer uma consulta para desvendar o que significavam 
aquelas dores que eu sentia no estômago e o ruído que 
elas causavam. Fiquei surpreso pala decisão do médico, 
que propôs internação imediata Diagnóstico: hemorragia 
digestiva causada por duas úlceras. Relutei e argumentei 
contra a hospitalização, pois sentia apenas certos incô­
modos na altura do abdome Mas a avaliação médica 
constatou que minha face estava pálida e inchada, e que 
eu corria sérios riscos. Fiquei por alguns dias na UTI até 
realizarem uma segunda tentativa de cauterização, e se 
esta não resolvesse o sangramento, o caso seria de 
cirurgia.
Felizmente, não foi necessário que eu fosse 
operado: a cauterização das duas úlceras foi bem
O m am uio r de pttxsus
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sucedida. Três anos mais tarde, este meu familiar, 
infelizmente, se foi, o que acabou por me induzir 
preocupações excessivas, e com isso surgiram duas 
novas úlceras, aíém de esofagite e gastrite. Fui tratado 
com medicamentos, até que as lesões cicatrizassem. 
Segundo os médicos, uma alimentação irregular e ou 
algum fator emocional explicavam as duas primeiras 
úlceras. Considerando que na recorrência eu já praticava 
restrições alimentares, pude deduzir que as causas 
foram exclusivamente emocionais. Hoje percebo que a 
alimentação imprópria pode sim causar sérios danos, 
mas, também, acredito no papel desempenhado pelo 
estado emocional. Eu sofria intensa e inconscien­
temente, e me esforçava para não parecer abalado ou 
transtornado.
Daí a importância de identificar o transtorno 
precocemente, para reduzir as chances de este 
prejudicar outras partes do organismo.
Muitas vezes ficamos presos a velhos 
conceitos, tal como “quem vai ao psicólogo ou ao 
psiquiatra é louco” ou “psiquiatra é pra demente”. É como 
diz minha psicóloga: “Será que louco não é aquele que 
não freqüenta?”, uma perspectiva com a qual concordo 
completamente.
Cheguei bastante debilitado ao tratamento, 
muito ansioso para me recuperar logo, mesmo sabendo 
que não se trata de um processo a curto prazo. É impor­
tante saber que a duração desse tipo de tratamento pode 
variar, dependendo do caso, e não só das técnicas utiliza­
das pela equipe. Os resultados também dependem da 
nossa resposta. O profissional nos avalia em termos de 
histórico de vida, comportamento, vida familiar, entre 
outros aspectosi para escolher o tratamento adequado 
a cada um. Embora exista preconceito por parte das 
pessoas em relação aos “profissionais da mente”, que 
fique claro que os bons fazem uso da ética e da eficiência 
com quaiidade.
Thntes Hn!<.
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O paciente e o médico devem estabeíecer um 
vínculo de confiança mútua, desde que o médico 
responsável ofereça confiança e atenção. Não encon­
tramos atenção e ética similares em amigos ou pa­
rentes. Somos, muitas vezes, atingidos por comentários 
satíricos, constrangimentos, sentimos que somos 
inferiores. Com o psicóiogo ou com o psiquiatra, é 
preciso ser franco nas consultas e contar o que nosafiige, sem pudores e expor o drama que nos atinge. 
Com estas inform ações, certamente eles terão 
condições de restituir a estabilidade aos seus pacientes. 
Como eles mesmos dizem: “O que é ser normal? Cada 
um tem sua própria normalidade. O que existe são os 
padrões."
O niarçüdor <U- passos
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O “O” do TOC:
obsessões
No livro A vida em outras cores (Zamignani e 
Labate, 2002), há um relato sobre o sofnrnento de uma 
paciente, acometida por obsessões cujo conteúdo se 
constituía por imagens mentais dos órgáos genitais da 
sua mãe.
Com este exemplo, ilustrativo para os que 
desconhecem o TOC, pode-se ter maior idéia do que se 
passa. Sem dúvida conseguimos imaginar o sofrimento 
desta paciente, e o que seria dela sem um acompanha­
mento específico. Quanto mais a pessoa tenta não 
pensar no conteúdo obsessivo, mais os pensamentos 
terríveis insistem em permanecer. Outro exemplo comum 
de obsessões: preocupações excessivas com aciden­
tes, doenças, mortes, com imagens que de um carro 
capotado, ou de um funeral. Muitas obsessões caracte- 
rizam-se por impulsos egodistônicos (conteúdos contrá­
rios ao ego e aos valores do indivíduo) sugerindo ações 
como empurrar, agredir ou até jogar algo de valor de 
algum lugar alto, por exemplo.
Os impulsos, como medo de ferir a si mesmo 
(por exemplo, se esfaquear) ou desconhecidos e 
familiares, fazem o portador de TOC, que apresentam 
essas obsessões, evitar o contato com o que lhe pareça
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uma situação de risco. Por exemplo: se a pessoa tem 
algum temor sobre acordar de madrugada e apanhar 
uma faca para ferir a si mesmo, ela tenta evitar o contato 
com o objeto, passa fita adesiva nas gavetas de talheres, 
pede que os outros escondam objetos cortantes etc. 
Quem sente o impulso de dizer palavras obscenas em 
uma missa, evitará ir a cerimônias religiosas, e assim 
por diante.
Não é difíci! imaginar o tamanho do desgosto e 
da angústia causados pelas invasões, e as nefastas 
consequências para a auto-estima. Cada vez que a 
pessoa com o TOC reage às obsessões - como se eias 
fossem reais- a tendência é que estas aumentem 
ferozmente, dando início ao que se tornará uma grande 
“bola de neve” com o passar do tempo .
O medo, a vergonha e a angústia causados por 
esses impulsos, falsamente reais, se convertem em 
estratégias repetitivas para neutralizar os supostos 
riscos. Essas estratégias são as compulsões ou os 
chamados rituais compulsivos, destinados a minimi­
zar, contornar ou eliminar as obsessões.
Diante da preocupação de não ter verificado se 
o gás foi desligado, a maneira que a pessoa com TOC 
encontra, para aliviar os riscos sugeridos pelos rnaus 
pensamentos, é verificar, múltiplas vezes, se realmente 
desligou o gás. Estipula, arbitrariamente, o número de 
vezes que deve checar, ou permanece conferindo até 
que a obsessão desapareça.
Voltando às obsessões, as mais comuns se 
relacionam aos seguintes aspectos:
• Simetria (perfeição, exatidão, alinhamento)
• Impulsos (ferir, insultar ou agredir)
• Religião (pecados, blasfêmia, sacrilégios, culpa, 
escrúpulos)
• Sujeira (contaminação ou nojo)
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• Sexo (obscenidades)
• Dúvidas (quanto aos próprios valores e decisões 
a tomar)
• Preocupações com doenças ou com o corpo 
(estéticas)
• Pensamentos mágicos (números especiais são 
escolhidos ou evitados, ou cores, datas, horários, 
letras etc.)
• Colecionismo (armazenar, poupar, guardar inutili­
dades, sem conseguir se desfazer do que é inútil)
As pessoas com TOC rejeitam seus 
pensamentos porque eles não condizem com suas 
próprias realidades, sentem-se importunadas e angus­
tiadas. Existem relatos em que o portador do TOC teme 
a possibilidade de lhe perguntarem as horas: pois seu 
relógio poderia estar errado, o levando a, involuntaria­
mente, mentir, o que seria um pecado.
O conteúdo obsessivo varia de pessoa a pes­
soa. Um indivíduo teme cometer o “pecado”, outro pode 
temer um acidente, por exemplo. Apesar de listar algumas 
das obsessões mais populares, inúmeras outras podem 
ocorrer e igualmente interferir sobre a qualidade de vida 
do portador.
7 h u i c s U n i o
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O “C” do 
TOC:
compulsões
Recentemente a imprensa de São Pauto 
publicou uma história de uma senhora de posses, que 
resgatava coisas pela rua e colecionava objetos inúteis, 
e que vivia, não se sabe como, em meio a toneladas de 
lixo. Obviamente, esta senhora não tinha o intuito de 
provocar a ira da vizinhança pelo mal cheiro exalado por 
sua coleção, e nem pretendia causar algum dano. Ela 
não se desfazia de todo o lixo porque achava que um dia 
iria precisar de alguma daquelas tralhas. A vigilância 
sanitária foi acionada após protestos da vizinhança e 
foram necessários caminhões para retirar toneladas de 
lixo. Descobriram até um veículo sob o lixo! Nada do 
que aquela senhora colecionou compuisivamente durante 
anos teve qualquer utilidade real, apenas serviu de abrigo 
para ratos enormes, atraiu insetos, produziu insuportável 
ma! cheiro, com risco de contaminações. Seu filho sofria 
do mesmo problema, mas até então em proporções 
menores, provavelmente uma contribuição dos genes 
maternos.
Outros rituais, estes mais freqüentes, são os 
de limpeza. Diante da idéia obsessiva de ser contami­
nado por algum objeto considerado suspeito, o indivíduo 
percebe que ao se lavar insistentemente (principalmente
O nturixuto! <•/■' j-xuisos 33
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na área de contato) ganharia algum alívio, de forma que 
sempre quando as invasões obsessivas ocorrem, a 
pessoa passa s se lavar compulsivamente como forma 
de neutralizar o medo.
Muitas pessoas com este rituai específico 
acabam infectando ou ferindo o local de lavagem em 
excesso, pois esfre.gam e desinfetam essas regiões do 
próprio corpo até a pele ser, em alguma medida, lesada. 
Nenhum desses ritua:s são prazerosos, o alívio que 
proporcionam é breve. Costumam ser desgastantes, leva 
tempo até que o objetivo ds aliviar seja temporariamente 
atingido. A maioria das pessoas com TOC não apresenta 
somente um tipo de sintoma, mas vários ao mesmo 
tempo. Temem determinada’ contaminação e, por isso, 
se lava em excesso. Também pode desenvolver a 
compulsão de simetria ou contagem. Os sintomas flu­
tuam em intensidade ou tema conforme as fases da 
vida, tendendo a piorar em momentos difíceis. Uma das 
conseqüências adversas atribuídas ao TOC é o impacto 
negativo na auto-estima do portador.
Eis uma lista das compulsões mais comuns:
• Verificação e controle;
• Lavagem e limpeza;
• Busca de confirmação e reasseguramento;
• Contagem;
• Simetria (ordem, seqüência, alinhamento,arranjo);
• Colecionar;
• Rituais mentais (rezar, contar números, palavras, 
letras ou frases, imaginar figuras, relembrar 
eventos nos mínimos detalhes etc.);
• Repetição de comportamentos (tocar, olhar, falar, 
pedir que repitam etc.).
I I K i l r s l i r i i o
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Os primeirossintomas, com o passar do tem­
po, podem abrir espaço para outros, ainda mais comple­
xos e diversificados. Pelo fato, que, em muitas vezes, 
contrariam os valores e anseios do portador, criando 
grande confusão. Historicamente, o primeiro nome dado 
para o TOC foi, em francês, “follie de la doute”, a loucura 
da dúvida.
Obsessões e compulsões nos aterrorizam, 
mesmo em momentos mais serenos. Ao longo do 
tratamento, consegui entender muitos dos aspectos que 
mais me incomodavam. Precisei buscar calma, sensi­
bilidade e serenidade em alguns momentos, recursos 
raros para mim.
Tinha a necessidade de explicar os meus sinto­
mas, responder a questões como: “— É uma tentativa 
de tapar o Sol com a peneira?”. Para melhor enten­
dimento do leitor, conto com sua interatividade no capítulo 
seguinte.
(J rnnrcm.hr de fxtssos ■15
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Fenômenos 
sensoríais
Imagine ou apenas se lembre de algo que lhe 
faça sentir repúdio, ódio, nojo, raiva, ou coisa semelhan­
te. Em outros termos, um somatório de sentimentos 
repulsivos e indesejáveis. Perceba o quanto isso incomo­
da. Estou certo? Meu TOC funciona assim, como para 
outros portadores.
Se você estivesse sob minha pele, prova­
velmente estaria com arrepios, ofegante, ansioso, 
enojado e com os batimentos cardíacos mais fortes e 
rápidos. Mas tente se acalmar. Recorde-se daquilo que 
você mais gosta e que pode lhe oferecer prazer. Neste 
caso, também é possível ter arrepios, sentir-se mais 
ansioso, ofegante e com o batimento cardíaco acelerado 
Note que nas duas situações as reações são parecidas, 
tanto para aversão quanto para o prazer.
Para ilustrar mais claramente o significado deste 
primeiro exercício, proponho ao leitor um segundo, para 
entender o que se passa dentro do próprio TOC. Imagine 
você se servindo do prato que mais lhe agrada. Só de 
imaginar você sente aquela famosa “água na boca” . 
Imagine, também, algo muito nojento, como um pulmão 
de um cadáver em decomposição, talvez de alguém 
próximo e querido. O pulmão está disposto sobre seu
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BOOKS 
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alimento predileto, aquele prato suculento que antes 
despertou seu apetite. Qual foi sua reação? Sentiu a 
água na boca, mas com vontade de cuspir, enojado, com 
ânsia de vômito? Finalmente, imagine que estas imagens 
e sensações sobrepostas surjam, realmente, a cada 
refeição, todos os dias. Imagine o tamanho do transtorno 
que se segue: dá para este prato altamente suculento 
ser encarado com naturalidade?
De modo semelhante ao que ocorre com outros 
portadores de TOC, eu me sentia obrigado a neutralizar 
compulsivamente as imagens mentais repulsivas. No 
mínimo, precisava explicitar algum desagrado por meio 
da minha expressão facial. Cada vez mais, eu me encon­
trava confuso, desorientado. Em uma consulta, me 
queixei dessas ocorrências para minha psicóloga, que 
respondeu: “— Calma, respire e pense. Você não precisa 
ir até o fim, isto é, não precisa buscar uma prova conclu­
siva do teor da obsessão. Pense em coisas boas, no 
prazer do que você quer. Pense nas suas necessidades".
Saindo da consulta, eu já queria colocar este 
aprendizado em prática, mas só conseguia, ern raras 
situações, lutar contra as obsessões. O TOC parecia 
sugar as técnicas que Shirlei ensinava, ficava ainda mais 
forte.
É fácil perceber quando estes pensamentos 
incomodam. Entretanto, lutar não é tão fácil assim. Ainda 
existem os hábitos, e mesmo que não ocorram, um mau 
pensamento ocorria, e sem que eu me desse conta, as 
compulsões já estavam presentes. Por outro lado, existia 
a brutal necessidade de afastar o desconforto, sentir 
novamente que eu estava em segurança. Os pensa­
mentos com função de ritual compulsivo serviriam para 
combater a aflição gerada pelas obsessões. Assim, se 
o indivíduo sofre com obsessões (como imagens de um 
acidente), ele deve buscar substituir essa imagem pela 
cena de uma festa comemorativa.
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A princípio, apesar de as invasões surpre­
enderem, saber que tenho possibilidade de usar um 
perfeito pensamento neutralizador, deliberadamente 
produzido, já garantia um pouco de tranqüilidade na 
minha rotina. Embora sua eficácia não fosse completa, 
continuavan a neutralizar o sofrimento gerado pelas 
invasões, com o desempenho efetivo das compulsões, 
aos quais considerei como guardiões. Isto abria espaço 
para um grande campo de batalhas.
Por meio de várias consultas e conversas sobre 
o jogo de forças entre guardiões e invasores, tornei-me 
consciente daquilo que antes me era pouco acessível 
ao entendimento, e pude me satisfazer com as conclu­
sões que apresentarei no capítulo seguinte.
7 iítíte .s B r i t o
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INDEX 
BOOKS 
GROUPS 
 
 
Guardiões
X
Invasores
Em meio à minha aflição para entender o que 
se passava comigo, cheguei a construir um diagrama, 
que certamente parecerá de difícil compreensão aos 
leitores. De qualquer maneira, preferi mantê-lo neste livro 
para que o leitor tenha idéia do grau das dificuldades 
envolvidas. No entanto, reconheço que nem eu mesmo 
conseguiria transpor em palavras esta minha complexa
f) m arav.hr de pa.t so.s
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BOOKS 
GROUPS 
 
 
concepção, o retrato de uma verdadeira aflição particular. 
O que espero tenha ficado claro, neste gráfico, bastante 
intrincado, é que ele representa de maneira absoluta a 
forma como todo este transtorno me conduz.
Agimos movidos por necessidades que procu­
ramos preencher. Como vimos, meu caminho tornou- 
se cheio de obstáculos, eu me congelei no tempo, por 
um longo período. No entanto, não se trata apenas de 
sofrer invasões e executar os respectivos rituais. O 
processo é tão intenso e desgastante que eu deixava de 
fazer qualquer outra coisa, não via saída para lidar com 
minhas necessidades reais e naturais.
Pela minha experiência, dois ou mais fatores 
agravantes não costumam atuar simultaneamente, isto 
significa que a obsessão ocorre com um únicc tema, o 
que não impede ocorrer outro a seguir. Isso acontece 
quando obsessões freqüentes são substituídas por 
outras mais fortes ou inusitadas. Isto me pega despreve­
nido. Com a ajuda da terapia, consegui afastar os sinto­
mas mais fracos, até que eles, praticamente, deixaram 
de influenciar minhas ações. São os sintomas que 
nomeei como “TOC passado”.
Antigas obsessões, às vezes, parecem voitar 
à tona, entretanto estou mais apto a ignorá-las. Nem 
todas as associações referentes ao “TOC passado" 
(eventos, contextos, lembranças, ações) são facilmente 
superadas, mas alcançar essa meta é um grande passo 
rumo à salvação.
Determinadas obsessões não me paralisam 
mais. Este é o caminho a seguir com todos os outros 
obstáculos. Nesta fase, recorro a contrapesos. Se o prato 
da balança pender ainda mais para o lado do mais forte,
Th a (es Uri to
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BOOKS 
GROUPS 
 
 
continuo lutando com pertinácia, para que a carga 
diminua, até que desapareça por completo
Mesmo longe dos 100% de remissão dos 
sintomas, continuei a desvendar os que me cercavam. 
Quando paralisado,eu me perguntava: “— Como isto é 
possível, se meu corpo permanece saudável? Tenho 
mãos, braços, pernas e pés, mas não controlo meus 
atos?”. O TOC me paralisava. Dependia dos familiares 
para que fizessem coisas por mim, dar conta de neces­
sidades básicas, não me enroscar com o que aparen­
temente é simples e muito importante. Não bebia água 
porque tinha o receio de ficar ali, grudado no copo ou, de 
ter de enchê-lo e esvaziá-lo, ou mesmo de me obrigar a 
beber mais do que precisava, um excesso que poderia 
até me fazer algum mal. Não usava determinadas peças 
de roupa e até evitava me trocar. Não saia de casa em 
função das dificuldades; não dava telefonemas para 
manter longe a possibilidade de ter que refazer a ligação. 
Entre tantas evitações, cheguei ao ponto de me asseme­
lhar a um mendigo, visto que alguns hábitos de higiene 
também acabaram ficando de lado.
Com a terapia, aos poucos, retomei algumas 
das atividades. Vagarosamente me pegava fazendo 
coisas que evocavam alguma lembrança ruim. Era um 
tanto complicado, tinha que cumprir meu compro­
misso com a terapia, apesar de quase tudo, principal­
mente em casa, me remeter a essas lembranças ruins. 
Se, por exemplo, tivesse a preocupação de que algo 
fosse acontecer quanto à minha saúde, e estivesse 
usando a camisa da cor “x”, esta peça de roupa passaria 
a ser evitada. Não minto ao dizer que se tratava do grande 
esforço, pois era o que eu fazia, para não acabar impedido 
de usar todas as minhas roupas.
A partir de tudo que já expus não deve ser difícil 
perceber que nós, portadores de TOC, nos deparamos 
com grandes dificuldades, pois às vezes náo temos
! > iuurrn(Ji>r tti> ptiss<
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BOOKS 
GROUPS 
 
 
noção de onde termina uma obsessão e começa outra. 
Comumente os sintomas vêm, arrebentam tudo e 
deixam marcas. E retornam depois, com maior poder 
de devastação. Quando aprendemos a identificar as 
nuances do processo, podemos entender, em meie à 
desordem, aquilo que nos aflige.
Por algum tempo sofri de outra obsessão, que 
inicialmente me incomodou muito. Estava sentado em 
meu quarto pela manhã, ouvindo música, e ievsntei para 
mudar o CD. Ignorei o pensamento invasor, agindo “como 
se deve”, mas queria repetir o meu trajeto desde o ato 
de levantar até a troca do CD. Não ceder à compulsão 
fazia com que eu me sentisse um cúmplice do conteúdo 
repulsivo expresso pela obsessão, então cedi novamente. 
O conteúdo da obsessão, como de costume, não era 
condizente comigo, e progressivamente consegui algum 
poder, aturando ou ignorando cada obsessão. Senti que 
ignorá-las seria possível, ainda que o medo ou descon­
forto subsistisse. Naquele dia não repeti a ação de 
levantar-me e trocar novamente o CD. Minutos depois, 
ainda lutando por conter a compulsão, algo extrema­
mente difícil, entendi o que realmente acontecia. Consta- 
tei que se eu deixasse de repetir compulsivamente os 
rituais de neutralização, a despeito do sofrimento envolvi­
do, não mais compactuaria com as terríveis obsessões. 
Não gosto delas e tenho que ignorá-las até que sumam 
de vez. Não preciso voltar e repetir tudo, bastando ignorá- 
ias e segurar a compulsão. Estranho é que Shirlei já havia 
me dito isso, com outras palavras, mas conseguir isso, 
na prática, foi um grande progresso. Assimilei o signifi­
cado da luta, talvez semanas após aprender a técnica, 
e realmente senti considerável alívio, o qual não imagina­
va ter a capacidade de alcançar. Não é fácii pensar e 
discernir, ser calmo e cauteloso, quando o transtorno 
ocupa mais espaço do que se pode suportar, mas tive 
ímpeto para realizar este importante feito. Sou firme ao
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BOOKS 
GROUPS 
 
 
salientara importância da informação, para entendermos 
que, mesmo entre tanta baderna, podemos aturar e 
ignorar coisas, não importando quão resistentes e 
nojentas elas sejam.
Proponho, agora, um raciocínio similar ao do 
“prato suculento” para falar de fenômenos sensoriais: 
às vezes, quando estamos postos a dormir, pernilongos 
insistem em zumbir em nossos ouvidos. Apenas uma 
vez, hipoteticamente faiando, um se aproxima, zum­
bindo, e então o espantamos. Não se aproximou mais, 
mas não temos certeza se ele desistiu mesmo de nos 
importunar, se fugiu peia fresta da janela, ou se ainda 
ronda à nossa espreita. Sacudimos uma vez o braço, 
achando que o pernilongo voltou, e em seguida, sentimos 
coceira no outro braço. De repente, ela passa a ser mani­
festar por baixo da roupa, ainda que até o momento, 
tenha sido ouvido apenas um único zumbido. Para 
afastar, então, qualquer suspeita ou incômodo, resol­
vemos que se nos cobrirmos por completo afastaríamos 
qualquer risco hipotético. Em seguida, mesmo sob as 
cobertas e com base na remota hipótese da presença 
de um inseto, passamos a ter a sensação do pernilongo, 
sobre a pele, a despeito da proteção exercida pelo 
cobertor e pelo pijama. Muitas pessoas já tiveram uma 
experiência como esta. Penso que a existência de algo 
que talvez possa incomodar, mesmo que pareça insigni­
ficante, faz com que nossos circuitos sensoriais traba­
lhem de forma a intensificar nossa sensibilidade. Nos 
sentimos perturbados mesmo na ausência do agente 
da perturbação. Nosso corpo é preparado para se 
defender, mas na situação do TOC, permanecemos 
sempre em guarda, registrando qualquer evento, e 
distorcendo interpretações, que tendem para coisas 
negativas, que não nos favorecem.
O mcirrador c;’e Ci
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Pausa
Quero, não só quero, mas 
tenho o sonho cie acordar amanhã, 
leve. sem culpas, ou distorções e deso­
brigado de, cumprir qualquer ritual, pen­
sando que tudo isso foi um grande pesade­
lo. Quero abrir os olhos normalmente. sair 
da cama, tom ar meu caje, acender o 
cigarro, ligai a 77. abrir a janela, organizar 
a bagunça, me lavar, fazer exercício, almoçar e 
não me ver forçado a minimizar as tensões das 
invasões.
F melhor, que isso não seja um sonho, 
mas a pura realidade. Quero acordar como se estivesse 
saindo de um coma prolongado. Quero sair, viver.: 
ver, sentir gostos, cheiros, texturas, quero ouvir e não 
mais sofrer, não mais rne lim itar ter que manobrar 
amarguras e ruídos (lesctmfortáveis.
Quero continuar gostando do que gosto, seguir 
meu nimo de acordo com minhas reais necessidades, Fpouco 
assim. F indo isso. Quero que minha rida seja simples, 
mais prazerosa, menos tortuosa, menos traumático. Quero 
me conter quando isso for o melhor. Quero um fazer não 
movido por hábitos, quero passar longe de qualquer ritual.
Quero não ter medo do medo. Quero lutar por 
minhas metas e me desfazer do que não quero. Desejo 
aprender mais e desaprender o que não me serve, não presta 
e não me interessa. Sou homem e não máquina. embora às 
rezes eu me confunda. Quero não ter tanto impulso. c sim 
pulso para me administmr. Fu tenho coragem e já venci 
mudas vezes. Sou guerreiro e já destruí muitos fantasmas 
que me assombraram durante anos.
4 4 t'fiafv.t Uri
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Atenção seletiva
Desde muito cedo tenho pavor de aranhas. Aos 
quatro anos de idade, observei uma pequena aranha 
sobre meu pé, enquanto brincava distraído no quintaj. 
Fiquei assustado com ela e a chutei para bem longe, o 
mais que pude. Quando cresci, o medo já não era tão 
grande assim, no entanto me queixava de que, em todolugar aonde ia, lá estavam estes bichos. Lembro-me de 
um dia no qual cheguei a matar 17 aranhas. Em outra 
ocasião, eu trabalhava junto com um colega e na volta 
do almoço tínhamos o costume de passar pela sua casa, 
a caminho do trabalho. Enquanto esperava, uma aranha 
descia pela teia à minha frente, quase sobre o meu rosto, 
quando o colega voltou , comentei que havia a matado 
ou espantado o animal. Aí ele respondeu: “— É mesmo?! 
E esta que está no seu ombro?”. A princípio desconfiei, 
achando que se tratava de uma brincadeira, mas logo 
percebi o movimento de um ponto preto sobre o meu 
ombro, o que deu fé ao seu comentário. Então a expulsei 
e reclamei indignado: “—Tá vendo? Essa coisa me 
persegue!”. Chegando ao trabalho, me sentei à cadeira 
próxima da parede e fui surpreendido com um movimento 
semelhante no meu ombro. Olhei para o lado e confirmei: 
“— Outra aranha!”. Esta era bem maior que as comuns,
O marrxt.fi/ir de passo*
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BOOKS 
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e parecia querer se alimentar da minha carne, pelos 
movimentos e maneira como me sondava. Desta vez 
virei motivo de piada, porque pedi ajuda para me desfazer 
do “anima!” e quando a esmagamos, deixou um rastro 
marrom na parede. Para mim, as aparições das aranhas 
eram algo substancialmente anormal. Por que motivo 
elas não rondavam e nem escalavam as outras pessoas, 
por que era só comigo que isso acontecia? Por que eu 
tinha medo? Para ter que enfrentá-las, como se fosse 
meu carma? Seria porque eu prestava extrema atenção 
a estes seres com oito patas? Ou pura e simplesmente 
porque estaria freqüentando lugares mais favoráveis ao 
desenvolvimento das aranhas? Pensando bem, fico com 
as duas últimas hipóteses. Eu estava realmente muito 
atento às aranhas, involuntariamente. O resuitado, no 
final das contas, assumia proporções homéricas. E, 
certamente, os ambientes que freqüentava, favoreciam 
a preservação dessa espécie. Eu me dava conta da 
onipresença das aranhas porque tinha medo delas e 
prestava mais atenção aos sinais de sua presença.
Se gostamos de certo modelo de carro, na cor 
vermelha, pode ocorrer de o carro desejado aparecer 
num sonho, e identificamos dezenas deles rodando 
diariamente pela cidade. E a pessoa pode pensar “é um 
sinal, eu tenho que comprar este carro!”. Ao chegar em 
casa, liga a televisão e naquele instante vê o comerciai 
do mesmo carro vermelho. Você já passou por isso? 
Isto é a atenção seletiva: capturamos aspectos do 
ambiente que sequer seriam notados por quem não tem 
fobias ou TOC. Associando as obsessões aos 
mecanismos de atenção seletiva, passamos a evitar 
números, letras, cores, uma infinidades de coisas e 
situações, pois queremos nos poupar do desgaste 
provocado pelos pensamentos invasores. Em um curto 
espaço de tempo, passamos a perder o controle sobre 
as invasões obsessivas. Quanto maior o cansaço, maior
Thafrs tírih)
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BOOKS 
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a incidência das obsessões e o descontrole. Uma vez 
que os rituais compulsivos acompanham as obsessões, 
torna-se difícil contê-los. Por mais que se tente relaxar, 
de algum jeito, parece que o corpo divide-se em duas 
partes: uma que resiste e outra que se engaja na compul­
são. A respiração trava os músculos, ficamos tensos e 
irritados. Tal como se fosse uma superstição, cada 
instante é como se recebêssemos a visita de um oráculo 
que diz: “Se não fizer x, vai acontecer y”. E bastante 
incomodados, desconfiássemos, constantemente, de 
nossa sanidade mentaí. Mesmo que saibamos que nada 
acontecerá, volta e meia cedemos aos rituais. A questão 
da loucura aparece ainda mais quando a ansiedade é 
extrema: falo baixo, como se estivesse em oração, e 
sacudo a cabeça ao mesmo tempo em que pisco os 
oihos e caminho de um lado para outro, sem reparar no 
que faço, apenas sob influência do desconforto e nojo 
gerado pelas horríveis obsessões. São gestos atípicos, 
esquisitos ou ridículos, que nos fazem questionar a 
própria racionalidade. Fazem crer que se está perdendo 
a razão. Vale lembrar que as obsessões do TCC se des­
tacam pelo esforço extremo para que os pensamentos 
normais voltem a prevalecer.
A parceria entre atenção seletiva e contextos 
associados ao TOC é constante. Exemplificando, eu 
evito o número 4 porque ele me causa o maior incômodo. 
Mas o mecanismo de atenção seletiva daria a impressão 
de que este número estaria me perseguindo, o que invia­
bilizaria o resto do meu dia. Apenas um algarismo torna- 
se capaz de trazer à lembrança todos os passos que fiz 
em um dia ruim: o que usei, com quem me relacionei, 
daí em diante, Se nesta ocasião vestisse camiseta azul, 
desse momento em diante passaria a não mais usá-la. 
Ou, se houvesse falado com a pessoa “x", tivesse dito 
determinada coisa, bebido num determinado copo, tudo 
passaria a ser evitado, e meu campo funcional diminuiria 
consideravelmente.
O marcador c/f [kis.vi.s
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BOOKS 
GROUPS 
 
 
Caminho cautelosamente em meio a um cam­
po minado, e muitas vezes minas explodiram, causando 
insatisfação, desânimo, lentidão e mais ansiedade. 
Quando dispensava ajuda para executar atividades 
cotidianas (por exemplo, tomar um simples copo d’água); 
me encontrava tão agitado que, ao encher o copo, na 
pressa, acabava derramando tudo, ou deixava o copo 
tombar, tudo para que não desse tempo de as obses­
sões chegarem. Shiriei não aprovava o uso desta técni­
ca, e afirmava não ser nada benéfica. Segundo ela, por 
mais duro que fosse, nessas horas eu deveria pensar 
na necessidade do momento (beber água), de modo a 
alcançar meu objetivo.
T h a l e s H r ; to
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BOOKS 
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Experiência
(A.S. Atenção Seletiva)
“Nesta fase. parece que o mundo gira ao meu redor. 
Parece, que todas as palavras servem para mim , que tudo 
que vejo é para mim , que os objetos e seus movimentos são 
símbolos e que tudo vai me ensinar uma lição. Como rwer 
achando que tudo é uma mensagem, alguma coisa mágica, 
mística, significativa, algo além do meu alcance, que preciso 
apreender e aprender}' Ihrece que uma única escolha trá 
influenciar todas as outras c repentinamente tudo mudará, 
e as pessoas em volta também. Mas c um sinal de que nimha 
cabeça não anda bem. Essa c a simples explicação para 
tudo isso: Transtorno Obsessivo Compulsivo.
Por essas e outras razões, tinha o cuidado de 
ocultar obsessões e rituais na presença dos outros. 
Perante pessoas de fora da família nunca deixei que 
ocorressem, ou, pelo menos, disfarçava muito bem os 
rituais, tanto que quando comuniquei o meu estado a 
algumas pessoas, elas demonstraram uma certa des­
crença sobre o que eu dizia. Eu, geralmente, lhes trans­
mitia muita inquietação. O receio de “se expor” existe 
mesmo. Eu poderia ser motivo de piadas, apontado como 
louco, ser desrespeitado ou excluído e, quem sabe, até 
perder a cabeça em um momento de fúria. Tudo pela 
falta de informação. As pessoas desconhecem o que se
O mnrrador rfc
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BOOKS 
GROUPS 
 
 
passa a cada crise, e não têm a mínima idéia de que 
sentimos.
As pessoas pensam que as compulsões mais 
populares, como lavar as mãos ou fazer contagem são 
apenas hábitos e nada mais. Ao explicara alguém como 
funcionam as obsessões e compulsões,com freqüência 
maior do que se espera, ouço em resposta: “Ah! Eu 
também tenho isso!”, soando como se fosse um sinal 
de fraqueza nossa reclamar deste sintoma. Parece que 
as pessoas pensam: “Nossa! Como ele se abate por 
tão pouco!”. Diante desta última hipótese, fica claro o 
quão pouco meu interlocutor entendeu, pois há diferen­
ças incalculáveis entre meras “manias” e sintomas 
incapacitantes do TOC. Somente quem sofre de TOC 
tem idéia destas proporções.
Manias são simplesmente hábitos que comu- 
mente as pessoas têm ou adquirem por meio de um 
grupo de convivência. Por exemplo: você prefere ouvir 
música em determinado volume de som, mas se não 
estiver nesta altura, não terá sentirá uma obrigação 
incontrolável de “ter que” posicionar o volume no ponto 
exato da sua preferência. Ou você pode ter o hábito de 
dormir de meias, o que não lhe impedirá de dormir 
estando sem elas. Hábitos como estes são conside­
rados comuns e, se praticados sem excessos, são até 
saudáveis. Pode-se, por exemplo, esquecer de verificar 
a válvula do gás antes de uma viagem, mas seria 
adequado conferir, para prevenir alguma catástrofe. Se 
o TOC fosse apenas isso, sem dúvida que não teríamos 
problemas.
T h n l c s H r iit .
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BOOKS 
GROUPS 
 
 
Os dois lados 
da moeda:
ansiedade e depressão
Após eu apresentar uma pasta recheada de 
anotações sobre minhas vivências cotidianas, um 
psiquiatra do Hospital das Clínicas comentou, com certa 
ironia: “— Você gosta de explicar as coisas, não?”. 
Respondi: “— Parece que sim...” . Ele me orientou a 
trabalhar em cima do que vale a pena, e, afinai, parece 
que ele tinha razão, pois explicar tudo pode mesmo ser 
muito bom. Se, por um lado, posso perder muito tempo 
com futilidades, por outro foi o que me ajudou a compre­
ender uma série de coisas sobre as quais ansiava por 
explicações.
É fato que o TOC sempre é surpreendente. É 
só baixar um pouco a guarda e POW! Quando seu 
“tema” obsessivo parece a ponto de se resolver, ele 
encontra um novo caminho para constranger você, 
outras incursões. O transtorno de ansiedade se tornou 
implacável, atropelou meu percurso, gerou sentimentos 
tortuosos, fui maciçamente oprimido e deprirni.
Entendo esse processo como um círculo. 
Quando a ansiedade atingia o topo, eu vislumbrava o 
horizonte da depressão. A ansiedade me levava a tomar 
decisões que julgo pouco tolerantes, meu comporta­
mento era hiperativo o suficiente para desempenhar
() iimrrcuior th' p<i.s.vo.v J /
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INDEX 
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compulsões nada agradáveis e gerar mais angústia, peta 
tentativa frustrada de executar um ritual malsucedido.
Após atingir o outro lado - a depressão sentia 
ao mesmo tempo um marasmo e uma fúria, o que 
implicava novamente em sentir ansiedade. O humor 
oscilava; bastava qualquer detalhe para modificar 
repentinamente minha disposição e humor.
Em muitos casos, essas mudanças rápidas de 
humor podem ser confundidas como diagnóstico de 
transtorno bipolar do humor, antes conhecido por psicose 
maníaco-depressiva. Alguém pode mesmo ser acome­
tido por dois ou mais transtornos psiquiátricos, de modo 
alternado ou simultâneo (dá-se o nome de comorbidade 
a este fenômeno). Assim, a pessoa que sofre do trans­
torno bipolar e de TOC, pode ter obsessões, compulsões 
e alterações graves de humor. Há, também, comorbidade 
com tricotilomania (arrancar fios de cabelo), transtorno 
dismórfico corporal (forte crença numa feiúra ou imper­
feição acerca de um ou mais aspectos físicos, seja a 
partir de um defeito inexistente ou praticamente imper­
ceptível), transtornos de hábito (como roer as unhas ou 
beliscar a pele) etc. Segundo dados divulgados pela 
ASTOC (Associação de Portadores de Síndrome de 
Tourette, Tiques e Transtorno Obsessivo Compulsivo), 
a depressão e o TOC, em geral, ocorrem conjuntamente 
no indivíduo adulto, e mais raramente em crianças 
e adolescentes. Um dado curioso é que, se o portador de 
TOC apresentar um quadro depressivo, geralmente não 
fica desprovido da capacidade de sentir prazer, diferen­
temente das pessoas apenas com depressão, e estas, 
por sua vez, raramente têm os pensamentos intrusivos 
característicos do TOC.
Em função destes ’’picos*’ de ansiedade, já 
me esqueci de apagar as luzes antes de sair de casa, 
deixei eletrodomésticos ligados, larguei o gás aberto e o 
vidro do carro abaixado, entre outros descuidos deriva-
7 ha/c.t ftrito
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INDEX 
BOOKS 
GROUPS 
 
 
dos do estado ansioso. Conheço outro portador que, ao 
parar o carro numa ladeira, esqueceu de puxar o freio 
de mão e o carro espatifou-se ladeira abaixo. Pensamos 
muito “no depois” e ficamos desconectados do presente. 
No TOC, os pormenores viram enormes obstáculos.
Depois das obsessões e compulsões, marcas 
da ansiedade no TOC, a depressão é parceira que mar­
ca impiedosamente sua presença em diversas fases do 
transtorno. A depressão pode decorrer do emaranhado 
do TOC.
“/ alo de ama roleta russa. A força 
que me fez arrastar um Irem vem à tona, 
espontaneam ente . Uma reação quím ica 
e x p lo s iva , ca u sa d a pelo aum ento da 
ansiedade ”
I ) marcador de pousos
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BOOKS 
GROUPS 
 
 
Tensão
pré-ataque 
obsessivo
Destaquei do livro O homem que fazia chover, 
escrito peto neuroiogista e pesquisador Edson Amâncio, 
um trecho no qual ele descreve a complexa neurofisio- 
patologia do TOC;
“Recentemente, alguns autores (pesquisadores) vêm 
postulando que os sintomas do TOC ocorrem quando 
se desenvolve feedback excitatório nas interligações 
recíprocas entre o lobo frontal e o tálamo e quando, 
concomitantemente, a porção ventromedial (limbica) do 
estriato exerce inibição inadequada. Esses autores 
sugerem que tal hiperatividade frontotalâmica seja o 
resultado da dispursão seletiva da região órbito-frontai 
responsável pela origem dos impulsos interoceptivos e 
ambientais(Amâncio, p112.)
A grosso modo, eu consigo entender que os 
comportamentos repetitivos e agitados do TOC resultam 
de sofisticados processos biológicos. Minhas obsessões 
surgem velozmente, sem que eu me aperceba. Nos estados 
de evitação, cultivava com zelo um pensamento “guar­
dião”, a ser utilizado em caso de necessidade. Eu tentava 
emparelhar um pensamento agradável aos comporta­
mentos que precisasse desempenhar, de forma a dar
M a l e s ttrtir,
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BOOKS 
GROUPS 
 
 
conta de minhas necessidades. Só assim eu me sentiria 
motivado a cuidar de mim, fazer o que meu cotidiano 
exigia. Apesar da dificuldade imensa de perceber quando 
um pensamento normal saia para ceder sua vez à inva­
são, eu só tomava conhecimento de que estava nova­
mente obsessivo quando sentia o impacto desta mudan­
ça. Tais transformações eram freqüentes, e só mais tarde 
pude interpretá-las da seguinte forma: imagine uma roleta 
com a maioria dos números em vermelho, representando 
as invasões, e apenas um ou dois números azuis, per­
meados entre os vermelhos, representando meus reais 
pensamentos. Pela estatística, é obviamente maior a 
probabilidade de rodadas com resultados vermelhos. Eu 
continuava a rodar infinitamente a roleta até obter um 
azul e recuperar minha relativa serenidade. Eram minutos 
ou horas desgastantes.,

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