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Resumo das Escolas Criminológicas Eduardo Vaz

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Dedico esta compilação de textos criminológicos 
primeiramente aos meus mais que abençoados 
avós, Osmar e Sofia (in memoriam), e Accioly e 
Madalena, com quem aprendi que na vida é 
necessário que algumas coisas acabem, para que 
outras novas aconteçam, 
 
Aos meus pais, Yara e Afonso, pelo 
incondicional apoio em todos os sentidos, mesmo 
com tantas divergências, 
 
À tia Mari, pelas valorosas idas e vindas, 
 
À minha noiva Ana Claudia, pela genuína 
compreensão frente a minha ausência nesse tempo 
de elaboração, 
 
Aos grandes amigos, Fábio Luis Reway, João 
Paulo Bortot Soares, Jorge Govoni, Marcos 
Leonardi Redivo, Nayara Weber, Suelen 
Lustosa, César Umata, Gustavo Jaruga, Michel 
Christian, Bruno Guimarães, Thomas Basso, 
Victor Hugo, brilhantes companheiros, 
 
E a todos os ilustres mestres, com quem tive a 
grata satisfação de aprender nobres lições do 
Direito e da Vida. 
 
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“O único modo de escapar da corrupção causada pelo sucesso 
é continuar trabalhando.” 
 
Albert Einstein 
 
 
 
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SUMÁRIO 
 
1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................................... 6 
2 DESENVOLVIMENTO ...................................................................................................................................... 9 
2.1 DIFERENÇA ENTRE DIREITO PENAL E CRIMINOLOGIA ........................................................ 9 
2.2 TEORIAS DA CRIMINOLOGIA .............................................................................................................. 10 
2.2.1 Teoria clássica............................................................................................................................................ 10 
2.2.2 Teoria positivista ....................................................................................................................................... 14 
2.2.3 Escola psicanalítica ................................................................................................................................... 21 
2.2.4 As escolas sociológicas e a criminologia do consenso e do conflito ................................................ 24 
2.2.4.1 Criminologia do consenso ............................................................................................................... 28 
2.2.4.1.1 Escola de Chicago e a teoria ecológica .................................................................................. 28 
2.2.4.1.2 Escola da socialização defeituosa ........................................................................................... 30 
2.2.4.1.3 Teoria do contato diferenciado ............................................................................................... 31 
2.2.4.1.4 Teoria das subculturas .............................................................................................................. 32 
2.2.5 Escola estrutural funcionalista ................................................................................................................ 33 
2.2.5.1 Visão de Émile Durkheim ............................................................................................................... 34 
2.2.5.2 Visão de Robert Merton e a teoria da criminalidade ................................................................... 37 
2.2.6 Escola do Labelling Aprouch ................................................................................................................. 39 
2.2.7 Teoria crítica .............................................................................................................................................. 47 
3 CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................................................ 52 
REFERÊNCIAS ....................................................................................................................................................... 53 
ANEXOS ..................................................................................................................................................................... 54 
ANEXO I .................................................................................................................................................................... 55 
ANEXO II .................................................................................................................................................................. 56 
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1 INTRODUÇÃO 
 
 Você alguma vez já se perguntou sobre como as leis penais são criadas? Ou 
então: quais subsídios fundamentam a criação de tais leis? Neste e-book você 
encontrará um resumo completo de criminologia, que lhe ensinará tudo o que você 
deveria aprender na faculdade ou em um curso específico e que talvez não teve 
oportunidade. Aproveite! 
 
 Para começar, você sabe a diferença entre Direito Penal e Criminologia? Nos 
trechos abaixo você vai entender a diferença entre essas disciplinas e terá ainda um 
resumo LEGAL do que é necessário aprender para entender o básico da 
criminologia. 
 
 Se você é uma pessoa que já conhece o assunto, serve também! Você pode 
estar pensando: “Se eu já sei de criminologia, para que quero o básico?” E eu 
respondo: “Porque relembrar o essencial do básico em poucas páginas é sempre 
um privilégio”. 
 
 Bem, primeiramente quero me apresentar. Meu nome é Eduardo Vaz e sou 
bacharel em Direito. Já fui estagiário em escritórios de advocacia e no Ministério 
Público de Estado do Paraná. Recentemente fui aprovado no teste seletivo do 
Tribunal de Justiça do Estado do Paraná para ser conciliador. Em 2.013 terminei 
com muito esforço a minha monografia, apresentei-a à banca e tive a sensação 
maravilhosa de ser aprovado com nota 9.0. 
 
 Sim. Infelizmente não foi 10.0. Mas por quê? Porque algumas coisas 
aconteceram no caminho, como problemas com a instituição de ensino. 
 
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 Devo imensamente agradecer ao meu orientador, Professor Evandro – a 
pessoa que me forneceu as chaves para formular meu tema: “Ausência do Trabalho 
como Fator Criminógeno”, bem como indicou fontes bibliográficas e todo o 
material necessário. 
 
 Naquele trabalho tratei sobre como a ausência de um labor digno e justo 
pode ser um fator natural que motiva e encaminha pessoas à prática de atitudes 
tidas como delituosas. Para realizar tal trabalho, precisei pesquisar sobre as escolas 
criminológicas, a definição de trabalho, a visão social e antropológica do labor, o 
valor constitucional do labor e, ainda, como o trabalho social é visto pelos direitos 
humanos. 
 
 Então, a partir das buscas referentes ao tema da monografia, surgiu a ideia de 
compilar toda a pesquisa bibliográfica que realizei ao longo de dois anos de 
confecção do meu trabalho de conclusão de curso com as diversas anotações das 
aulas de Criminologia que tive com o inteligentíssimo Professor Criminalista 
Robson Galvão. E o resultado está neste e-book que você acaba de receber. 
 
 Aqui vou tratar, com linguagem acessível, das principais escolas 
criminológicas, ou seja, como o estudo sobre o crime e o criminoso se 
desenvolveram do século XVIII ao XXI. 
 
 Nas páginas seguintes você passará a entender e ter embasamento científico 
para fundamentar sua opinião sobre quem é criminoso e por que os crimes 
ocorrem, e, ao final, refletir sobre as principais escolas criminológicas e ser mais 
preciso na análise dequalquer delito. Além disso, oferecerei subsídios para você 
saber se posicionar com fundamento em qualquer debate em que o assunto seja 
direito penal, punição, crime, castigo, maioridade penal, tráfico de drogas, estupro, 
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sequestro, etc. Enfim, com esse estudo você entenderá as minúcias do saber 
criminológico, e o melhor: de forma simples, clara e objetiva. 
 
 Continue lendo e entenda por que nem tudo o que as grandes mídias 
veiculam em noticiários é o que parece. Uma viagem pelo mundo criminológico 
desde o século XVIII até os dias atuais, completamente resumida para você. Uma 
pesquisa que elaborei a partir das aulas de Criminologia e da dedicada pesquisa que 
realizei para meu trabalho de conclusão do curso de direito, pela Faculdade Dom 
Bosco, em Curitiba, no Estado do Paraná. 
 
 Prontos? Vamos começar! 
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2 DESENVOLVIMENTO 
 
2.1 DIFERENÇA ENTRE DIREITO PENAL E CRIMINOLOGIA 
 
A Criminologia funciona de modo diferente que o Direito Penal. 
 
Em suma, o Direito Penal trata da criação de normas penais aos atos considerados 
crimes, os quais não podem ser praticados pela sociedade. Entretanto, ele não tem condição de 
tratar das políticas criminais – isso não faz parte de sua missão. 
 
Nessa esteira, eis que surge a Criminologia, isto é, o pensamento criminológico, que vem 
fornecer subsídios para que o legislador crie leis penais que sejam eficientes, interessantes, 
efetivas, úteis, justas. Neste sentido: o que pode orientar o legislador a definir crime ou não, 
senão a Criminologia? 
 
Assim explicam os autores Hassemer e Muñoz Conde (2011, p. 7): 
 
Caso se questione, hoje em dia, qual o objeto da Criminologia, ninguém terá dúvidas 
em responder que é o estudo (empírico) da criminalidade, entendendo tal como “o 
conjunto de todas as ações e omissões puníveis dentro de um determinado âmbito 
temporal e espacial”. Neste sentido, considera-se preferível utilizar, neste âmbito, o 
termo “criminalidade” em vez de “delito”, porque aquele evoca uma consideração 
global mais adequada para descrever o objeto da Criminologia como ciência de caráter 
social do que individual, a que se alude o termo “delito”. 
 
Valendo-se do acima dito, convém destacar o que explica a ciência criminológica. Esta 
explica tanto o fenômeno criminal, como também situações concretas – por exemplo, as recentes 
invasões nas favelas do Rio de Janeiro, em especial a do Complexo do Alemão, em que câmeras 
flagraram traficantes fugindo com fuzis e metralhadoras. 
 
Desse exemplo vem a pergunta: trata-se de quadrilha? Ou de gangues? Nesse sentido, 
empiricamente se observa que, por vezes, o legislador não faz uso do saber criminológico, que 
será a seguir exposto, dificultando, assim, a ação social da máquina estatal que, por sua vez, 
deflagra a não (ou fraca) existência de política criminal eficiente. 
 
10 
 
 
Antonio García-Pablos de Molina e Luiz Flávio Gomes (2012, p. 30) conceituam a 
ciência da Criminologia: 
 
Cabe definir a Criminologia como Ciência empírica e interdisciplinar, que se ocupa do 
estudo do crime, da pessoa do infrator, da vítima e do controle social do 
comportamento delitivo, e que trata de subministrar uma informação válida, 
contrastada, sobre a gênese, dinâmica e variáveis principais do crime – contemplado 
este como problema individual e como problema social –, assim como sobre os 
programas de prevenção eficaz do mesmo, e técnicas de intervenção positiva no 
homem delinquente e nos diversos modelos ou sistemas de resposta do delito.1 
 
Observa-se que a criminologia possui papel importante quanto a fornecer subsídios para 
a criação, bem como aplicação do direito penal. Isso porque é ela que trata de aproximar as 
instâncias informais da lei, criando um vínculo o qual possui capacidade de buscar traduzir a 
realidade em que está inserido o indivíduo, e o fator indutor da criminalidade. 
 
2.2 TEORIAS DA CRIMINOLOGIA 
 
Feita a distinção acima, passa-se a analisar o momento histórico em que a criminologia 
se torna uma ciência propriamente dita, para posteriormente expor os estudos que se 
desdobraram e que compõem as principais escolas criminológicas na atualidade, e que possuem 
pertinência com o tema proposto neste e-book. 
 
2.2.1 Teoria clássica 
 
Durante o final do século XVII e início do século XVIII, viveu-se na humanidade a Era 
das Luzes. Nesse período surgiram novas classes sociais e os burgueses (banqueiros e homens de 
negócio), isso devido à Revolução Industrial. 
 
O grande expoente da Teoria Clássica foi Césare Beccaria. Para entender a teoria, faz-se 
necessário entender o momento histórico em que a sociedade vivia, tendo em vista a forma de 
punição aplicada aos que eram tidos como infratores. 
 
 
1Sobre esta e outras possíveis definições da Criminologia, vide MOLINA, 1999, p. 43 e ss. 
11 
 
 
Nessa fase histórica não havia somente a pena que restringia a liberdade, desta feita 
proporcionando ao detento a possibilidade de trabalhar, e sim existiam os chamados suplícios 
medievais, estes que eram uma forma de punição da sociedade medieval. 
 
Zaffaroni (1998, p. 114) apud Shecaira (2012, p. 85) aponta diretrizes da Escola Clássica: 
 
Para o pensamento utilitarista, a pena era uma forma de curar uma enfermidade moral, 
disciplinando o instinto dos pobres com prêmios e castigos, em uma espécie de talião 
disciplinador. Para a Escola Criminológica Clássica, fundada no contratualismo de uma 
burguesia em ascensão, a pena era a reparação do dano causado pela violação de um 
contrato (o contrato social de Rousseau). [...] No direito penal de uma sociedade 
baseada metaforicamente nesse mesmo contrato, não há como evitar a necessária 
reparação do dano por meio da pena. Daí é que se surgem penas certas e determinadas, 
como decorrência dessa matemática preparatória fixa. Essas medidas é que levarão os 
códigos iluministas, como o Napoleão e o Código do Império Brasileiro de 1830, a 
impor penas fixas. 
 
Os suplícios medievais obedeciam à “matemática da dor”, esta que era um ritual em que 
havia uma teatralidade. Algo que chama atenção para essa forma de punição é que ela não era 
uma forma desenfreada de fazer sofrer, de aplicar a dor; ao revés, obedeciam a cálculos na forma 
de se executar as penas. Por ser uma teatralidade, para cada personagem havia um papel próprio, 
seja o suplicado, o carrasco, o Estado, seja a multidão que a assistia. Todos esses personagens 
faziam parte do “código jurídico da dor”. 
 
Foucault (2004, p. 31) descreve: 
 
Inexplicável, talvez, mas certamente não irregular nem selvagem. O suplício é uma 
técnica e não deve ser equiparado aos extremos de uma raiva sem lei. Uma pena, para 
ser um suplício, deve obedecer a três critérios principais: em primeiro lugar, produzir 
uma certa quantidade de sofrimento que se possa, se não medir exatamente, ao menos 
apreciar, comparar e hierarquizar; a morte é um suplício na medida em que ela não é 
simplesmente privação do direito de viver, mas a ocasião e o termo final de uma 
graduação calculada de sofrimentos: desde a decapitação – que reduz todos os 
sofrimentos a um só gesto e num só instante: o grau zero do suplício – até o 
esquartejamento que os leva quase ao infinito, através do enforcamento, da fogueira e 
da roda, na qual se agoniza muito tempo; a morte-suplício é a arte de reter a vida no 
sofrimento, subdividindo-a em “mil mortes” e obtendo, antes de cessar a existência, the 
mos exqidsite agonies. [...] O suplício faz correlacionar o tipo de ferimento físico, a 
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qualidade, a intensidade, otempo dos sofrimentos com a gravidade do crime, a pessoa 
do criminoso, o nível social de suas vítimas. Há um código jurídico da dor; a pena, 
quando é supliciante, não se abate sobre o corpo ao acaso ou em bloco; ela é calculada 
de acordo com regras detalhadas: número de golpes de açoite, localização do ferrete em 
brasa, tempo de agonia na fogueira ou na roda (o tribunal decide se é o caso de 
estrangular o paciente imediatamente, em vez de deixá-lo morrer, e ao fim de quanto 
tempo esse gesto de piedade deve intervir), tipo de mutilação a impor (mão decepada, 
lábios ou língua furados). 
 
Para a aplicação dos suplícios medievais o Estado dispunha de justificativas, uma vez 
que poderia ser controverso determinar o suplício para determinadas pessoas. 
 
A justificativa do Estado era que a repugnância não era do suplício, e sim do crime e do 
criminoso, como se fosse ao infrator apresentado um espelho de sua conduta delituosa. 
 
Nesse contexto medieval, social, histórico, ainda se enquadrava a tortura, esta que servia 
tanto como meio de prova, como meio de punição. 
 
Nilo Batista (2000, p. 265) apud Shecaira (2012, p. 85) descreve a tortura no período 
medieval e dá dimensão da publicação do livro Dos delitos e das Penas, de Beccaria: 
 
“Se o suspeito não confessou nem contra ele se produziu prova plena (como nas 
insuficientes combinações de boato mais uma só testemunha, ou de indícios mais boato 
etc.), ou ainda se ‘vacila em suas respostas’, um despacho raivoso (‘para que não 
ofendas mais os ouvidos de teus juízes’) o encaminhará à tortura”. Dos delitos e das penas, 
inicialmente publicado sob pseudônimo, teve acolhida surpreendentemente grande. 
Nos anos seguintes, Beccaria viaja à França para fazer uma série de conferências e 
acaba por disseminar suas ideias por toda a Europa. Dos delitos e das penas é a pedra 
fundamental do direito penal liberal e da própria criminologia clássica, razão por que 
também foi a maior fonte de críticas dos pensadores positivistas, especialmente pelo 
radical mecanismo de racionalidade a que deveriam estar sujeitos os condenados e que, 
já naquela época, estava sendo submetido à prova. 
 
Entretanto, numa determinada altura histórica começou a haver um medo político das 
ambiguidades desse ritual. O povo que assistia muitas vezes era tomado por sentimento de 
resiliência vendo o sofrimento do suplicado. Dessa forma, com o povo solidarizando-se, por 
13 
 
 
muitas vezes havia invasão do cadafalso, ocasiões em que o carrasco era executado e o suplicado, 
salvo. 
 
Foucault (2004, p. 53) afirma: 
 
Para definir o problema político trazido pela intervenção popular na ação do suplício, 
basta citar duas cenas. Uma data do fim do século XVII: situa-se em Avignon. Aí 
encontramos os principais elementos do teatro do tormento: confrontação física do 
carrasco e do condenado, a inversão da justa: o executor perseguido pelo povo, o 
condenado salvo pelos revoltosos e a violenta reviravolta da maquinaria penal. 
 
Diante das ocasiões onde se invertiam a justa, bem como com a instabilidade política 
que tal episódio proporcionava, o Estado houve por bem abolir os suplícios e, historicamente, é 
nesse contexto que se insere a Escola Clássica da Criminologia. Diante desse medo político 
surgiu a necessidade de mitigar as penas, de se “humanizar” as penas – nasce a Escola Clássica. 
 
Foucault (2004, p. 63-64) afirma: 
 
Essa necessidade de um castigo sem suplício é formulada primeiro como um grito do 
coração ou da natureza indignada: no pior dos assassinos, uma coisa pelo menos deve 
ser respeitada quando punimos: sua “humanidade”. Chegará o dia, no século XIX, em 
que esse “homem”, descoberto no criminoso, se tornará o alvo da intervenção penal, o 
objeto que ele pretende corrigir e transformar, o domínio de uma série de ciências e de 
práticas estranhas – “penitenciárias”, “criminológicas”. Mas, nessa época das Luzes, não 
é como tema de um saber positivo que o homem é posto como objeção contra a 
barbárie dos suplícios, [...] mas [como] o que ela deve deixar intacto para estar em 
condições de respeitá-lo. Noli me tangere. Marca o ponto de parada imposto à vingança 
do soberano. O “homem” que os reformadores puseram em destaque contra o 
despotismo do cadafalso é também um homem-medida: não das coisas, mas do poder. 
 
A palavra humanização, no fragmento abaixo, é utilizada com aspas por Michel 
Foucault de forma irônica. Isso porque os suplícios foram meramente abolidos por ocasião, 
oportunidade, por conveniência, justamente nesse momento histórico, em que os suplícios 
entravam em decadência, haja vista a interferência não autorizada da massa que assistia ao teatro 
punitivo. 
 
Foucault (2004, p. 12) escreveu: 
14 
 
 
 
Dentre tantas modificações, atenho-me a uma: o desaparecimento dos suplícios. Hoje 
existe a tendência a desconsiderá-lo; talvez, em seu tempo, tal desaparecimento tenha 
sido visto com muita superficialidade ou com exagerada ênfase como “humanização” 
que autorizava a não analisá-lo. De qualquer forma, qual é sua importância, 
comparando-o às grandes transformações institucionais, com códigos explícitos e 
gerais, com regras unificadas de procedimento; o júri adotado quase em toda parte, a 
definição do caráter essencialmente corretivo da pena, e essa tendência que se vem 
acentuando sempre mais desde o século XIX a modular os castigos segundo os 
indivíduos culpados? Punições menos diretamente físicas, uma certa discrição na arte de 
fazer sofrer, um arranjo de sofrimentos mais sutis, mais velados e despojados de 
ostentação, merecerá tudo isso acaso um tratamento à parte, sendo apenas o efeito sem 
dúvida de novos arranjos com maior profundidade? No entanto, um fato é certo: em 
algumas dezenas de anos, desapareceu o corpo supliciado, esquartejado, amputado, 
marcado simbolicamente no rosto ou no ombro, exposto vivo ou morto, dado como 
espetáculo. Desapareceu o corpo como alvo principal da repressão penal. 
 
A Escola Clássica surgiu buscando encontrar a igualdade de todos os cidadãos ante a lei, 
escrever leis que pudessem ser compreendidas por todos os indivíduos e não apenas pelos juristas 
e, ainda, tratando de que determinadas leis fossem aplicadas não de forma desviada da moral 
pelos juristas e juízos, nessa perspectiva, limitando o âmbito das leis penais ao mínimo necessário 
para minimizar o delito. 
 
2.2.2 Teoria positivista 
 
Nessa senda, em que a Escola Clássica busca pôr fim aos suplícios e às torturas 
medievais, eis que surge a Escola Positivista. Esta busca, numa análise comparativa, lutar contra o 
delito a partir de um saber científico de suas causas, isso na busca de proteger a nova classe social 
burguesa industrial. 
 
Antonio García-Pablos de Molina e Luiz Flávio Gomes (2012, p. 184) destacam a 
crucial diferença de pensamento da escola clássica para a positivista, senão vejamos: 
 
O positivismo criminológico representa o momento científico, de acordo com a famosa 
lei de Comte, sobre as fases e estágios do conhecimento humano: a superação, 
portanto, das etapas “mágica” ou “teológica” (pensamento antigo) e “abstrata” ou 
“metafísica” (racionalismo ilustrado). Significa, também – segundo Ferri – uma 
mudança radical na análise do delito: os clássicos haviam lutado contra o castigo, contra 
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a irracionalidade do sistema penal do “antigo regime”; a missão histórica do 
positivismo, pelo contrário, seria lutar contra o delito, lutar contra ele por meio de um 
conhecimento científico de suas causas (vere scire est per causas scire), com objetivo de 
proteger a ordem social: a nova ordem social da nascente sociedade burguesa industrial.A Escola Positivista possui três grandes precursores: Cesare Lombroso, Raffaele 
Garófalo e Enrico Ferri. Esses autores partiram de uma pergunta em comum, qual seja: Por que 
certas pessoas cometem crimes e outras não? 
 
Parte-se do pressuposto que o crime se submete a uma regra de causalidade, portanto o 
crime estaria submetido às regras de ausência física e mecânica que concebem todos os elementos 
do universo. Para os autores acima citados, crime pertenceria à categoria de objetos que podem 
ser empiricamente verificáveis através dos sentidos. 
 
Baratta (2002, p. 38-39) elucida: 
 
A reação ao conceito abstrato de indivíduo leva a Escola positiva a afirmar a exigência 
de uma compreensão do delito que não se prenda à tese indemonstrável de uma 
causação espontânea mediante um ato de livre vontade, mas procure encontrar todo o 
complexo das causas na totalidade biológica e psicológica do indivíduo, e na totalidade 
social que determina a vida do indivíduo. Lombroso, em seu livro L’uomo delinquente, 
cuja primeira edição é de 1876, considerava o delito como um ente natural, “um 
fenômeno necessário como o nascimento, a morte, a concepção”, determinado por 
causas biológicas de natureza sobretudo hereditária. 
 
Nesse deslinde, Lombroso acredita que crime seria uma patologia inerente à anatomia do 
indivíduo criminoso, que seria um ser portador de uma deformidade anatômica. 
 
Lombroso (1896, p. 245) afirma: 
 
Rugas frontais – é verdadeiramente típico o modo de se apresentar a característica 
destas rugas em alguns criminosos ainda jovens. São tão profundas que a fronte se 
apresenta em tais casos reiteradamente pregada, ou com uma incisão como uma ferida 
proveniente de um corte. 
 
Césare Lombroso parte do paradigma etiológico, este que faz os criminosos serem 
submetidos a intervenções cirúrgicas, classificando-os como se houvesse nexo de causalidade 
16 
 
 
rugas da pessoa, com a propensão para o crime, por exemplo. Ainda, o referido autor colaciona 
em seus apontamentos o criminoso nato, que poderia ser empiricamente dissecado, como os 
doentes dentro de um hospital. 
 
Hassemer e Muñoz Conde (2011, p. 24) afirmam: 
 
O início desta etapa científica, que deu lugar ao nascimento da Criminologia como 
disciplina científica autônoma, se deve, sobretudo, ao médico italiano Cesare 
LOMBROSO (1835-1909), que em sua obra L’ Uomo delinquente [...] e, posteriormente, 
em muitas outras, formulou e desenvolveu sua teoria do delinquente nato. Uma espécie de 
ser atávico, degenerado, marcado por uma série de estigmas corporais perfeitamente 
identificáveis anatomicamente, como anomalias de crânio (enorme fossa occipital e uma 
hipertrofia do lóbulo, análoga à encontrada nos vertebrados inferiores), fronte esquiva e 
baixa, grande desenvolvimento dos arcos supraciliais, assimetrias cranianas, fusão dos 
ossos atlas occipital, orelhas em forma de asa, maçãs do rosto proeminentes, braçada 
superior à estatura etc. 
 
Lombroso acreditava que crime era uma espécie de doença – como ciências naturais do 
ser, e não do dever ser –, havendo assim uma barreira impermeável entre ciências naturais versus 
ciências culturais. 
 
Shecaira (2012, p. 88) afirma: 
 
Lombroso afirmava ser o crime um fenômeno biológico e não um ente jurídico (como 
sustentavam os clássicos), razão pela qual o método que deve ser utilizado para o seu 
estudo havia de ser o experimental (indutivo). Nunca é demais lembrar que suas 
pesquisas foram em grande parte feitas em hospitais, manicômios e penitenciárias. 
Lombroso afirmava ser o criminoso um ser atávico que representa a regressão do 
homem ao primitivismo. É um selvagem que já nasce delinquente. A causa da 
degeneração que conduz o nascimento do criminoso é a epilepsia, que ataca os centros 
nervosos dele. 
 
Crime e criminosos, então, encontravam-se dentro do mundo do ser, dentro do mundo 
da natureza, que constantemente eram dissecados anatomicamente dentro das faculdades de 
medicina, estas que foram a matriz de pensamento lombrosiano, a qual firmou seu pensamento 
baseado no paradigma etiológico, ideia de criminoso nato, e que crime seria uma doença, 
realidade inerente à forma física do indivíduo criminoso. 
17 
 
 
 
Baratta (2002, p. 40) expõe em seus apontamentos: 
 
De qualquer modo, os autores da Escola positiva, seja privilegiando um enfoque 
bioantropológico, seja acentuando a importância dos fatores sociológicos, partiam de 
uma concepção do fenômeno criminal segundo a qual este se colocava como um dado 
ontológico preconstituído à reação social e ao direito penal; a criminalidade, portanto, 
podia tornar-se objeto de estudo nas suas “causas”, independentemente do estudo das 
reações sociais e do direito penal. 
 
Nesse viés, vale ressaltar que Ferri, de modo diverso de Lombroso, defendia o 
posicionamento de que a escola positivista não consiste unicamente no estudo antropológico do 
criminoso, e afirma, ainda, integrar a Escola Positivista estudos na área da Psicologia e Estatística 
Criminal, bem como no Direito Penal o estudo das penas. Atribui-se então o nome de Sociologia 
Criminal à ciência produzida pela referida escola. 
 
Rodríguez Manzanera (1982, p. 239) apud Antonio García-Pablos de Molina e Luiz Flávio 
Gomes (2002, p. 186) reiteram o acima proposto com mais clareza: 
 
O próprio Ferri destacaria a mudança que realizou o positivismo no âmbito 
metodológico. [...] E conclui: “A Escola Criminal Positivista não consiste unicamente 
no estudo antropológico do criminoso, pois constitui uma renovação completa, uma 
mudança radical de método científico no estudo da patologia social criminal e do que 
há de mais eficaz entre os remédios sociais e jurídicos que nos oferecem. A ciência dos 
delitos e das penas era uma exposição doutrinal de silogismos, trazidos à luz por força 
exclusiva da fantasia lógica; nossa escola tem feito dela uma ciência de observação 
positiva, que funda-se na Antropologia, Psicologia e Estatística Criminal, assim como 
no Direito Penal e nos estudos penitenciários, chega a ser a ciência sintética que eu 
mesmo chamo de Sociologia Criminal, e, assim, esta ciência, aplicando o método 
positivo ao estudo do delito, do delinquente e do meio, não faz outra coisa que levar à 
Ciência Criminal Clássica o sopro vivido das últimas e irrefreáveis conquistas feitas pela 
consciência do homem e da sua sociedade, renovada pelas doutrinas evolucionistas. 
 
Observa-se então que pela Escola Clássica se buscou, através do direito penal, penalizar os 
indivíduos pautando-se na humanização das penas, tendo em vista os suplícios medievais que não 
poderiam ser mais tolerados, ao passo que, pela Escola Positivista, se tratou de penalizar 
18 
 
 
delinquentes analisando os fatores internos e externos dos autores de delitos, bem como o meio em 
que surgiram, buscando explicações na biologia, antropologia, sociologia e psicologia. 
 
Assim, a teoria do contrato social e da função preventiva da pena idealizada pela Escola 
Clássica não era mais suficiente para garantir a ordem social burguesa industrial. Exatamente 
buscando a defesa social, eis que surge a teoria da pena, esta para fundamentar positivamente o 
sistema punitivo da época. 
 
Antonio García-Pablos de Molina e Luiz Flávio Gomes (2012, p. 185), de forma 
brilhante, apontam com mais preciosismo o surgimento da teoria da pena: 
 
Esta função legitimadora – ideológica – que assume o positivismo explica, 
provavelmente, sua teoria da pena; isto é, a prioridade que concede à proteção eficaz da 
ordem social – em contraste com a abordagem ilustrada, atenta mais a metas 
retribucionistas, dissuasivas ou, inclusive,à reforma do delinquente –; explica, também, 
o chamativo rigor defendido pelo positivismo, que põe especial ênfase, como afirma 
Jeffery, nas colônias ultramar e na pena de morte, evocando, inclusive, a cruel “lei da 
seleção natural das espécies” para justificar esta última; e explica, finalmente, o princípio 
da diversidade do homem delinquente, quer dizer, a hipótese de que o criminoso, sob 
um ponto de vista qualitativo, é um indivíduo distinto (patológico) do cidadão 
“normal”; hipótese diametralmente oposta à sustentada pelos teóricos do Iluminismo, o 
qual, em definitivo, não pretende senão salvar a ordem social atribuindo o crime e as 
preocupantes taxas de criminalidade ao indivíduo. 
 
Nesse deslinde, Ferri atribui à criminologia da época uma visão com relação ao delito 
não lombrosiana. Para o referido autor, o crime seria resultado de fatores individuais, físicos e 
sociais. 
 
Antonio García-Pablos de Molina e Luiz Flávio Gomes (2012, p. 189) enfatizam o que 
seria delito para Ferri: 
 
O delito, para Ferri, não é produto exclusivo de nenhuma patologia individual (o que 
contraria a tese antropológica de Lombroso), senão – como qualquer outro 
acontecimento natural ou social – resultado da contribuição de diversos fatores: 
individuais, físicos e sociais. Distinguiu, assim, fatores antropológicos ou individuais 
(constituição orgânica do indivíduo, sua constituição psíquica, características pessoais 
como raça, idade, sexo, estado civil etc.), fatores físicos ou telúricos (clima, estações, 
19 
 
 
temperatura etc.) e fatores sociais (densidade da população, opinião pública, família, 
moral, religião, educação, alcoolismo etc.). Entende, pois, que a criminalidade é um 
fenômeno social como outros, que se rege por sua própria dinâmica, de modo que o 
cientista poderia antecipar o número exato de delitos e a classe deles, em uma 
determinada sociedade e em um momento concreto, se contasse com todos os fatores 
individuais, físicos e sociais antes citados e fosse capaz de quantificar a incidência de 
cada um deles. Porque, sob tais premissas, não se comete um delito mais nem menos 
(lei da “saturação criminal”). 
 
Nesse vislumbre, tem-se que postulados inferidos por Lombroso partem do criminoso 
nato, enquanto Ferri abarca uma visão mais ampliada, voltada à constituição orgânica do 
indivíduo, bem como a fatores psíquicos e aos outros supracitados. 
 
Passa-se a verificar então qual era a visão de Garófalo, que trazia a ideia de que o 
criminoso não era portador de uma anomalia física, mas sim de uma enfermidade mental. 
 
Garófalo, jurista de renome, defendia a medida de segurança tendo em vista o potencial 
perigo que determinado criminoso poderia oferecer para a sociedade. 
 
Shecaira (2012, p. 93) explica mais acerca da medida de segurança: 
 
Rafaele Garofalo (1851–1934) foi o terceiro grande nome do positivismo italiano. 
Jurista de renome, afirma que o crime sempre está no indivíduo, e que é a revelação de 
uma natureza degenerada, quaisquer que sejam as causas dessa degeneração, antigas ou 
recentes. Introduz o conceito de temibilidade que sustenta ser a perversidade constante e 
ativa do delinquente. Tal conceito foi decisivo para as formulações posteriores 
concernentes à intervenção penal, propostas pelos positivistas: a medida de segurança. 
[grifo do autor] 
 
Infere-se que postulados da Ideologia da Defesa Social, advindos das Escolas Clássica e 
Positivista, para o Direito Penal, servem para aplicações de sanções aos desviantes visando a 
manter a ordem social baseada num modelo criminológico retributivo. 
 
Vera Regina Pereira de Andrade apud Salo de Carvalho (1996, p. 133) expõe: 
 
[...] a criminalidade constitui uma propriedade da pessoa que a distingue por completo 
dos indivíduos normais e contra a qual se deve dirigir uma adequada Defesa Social. O 
20 
 
 
pressuposto, pois, é o de que a criminalidade é uma realidade intrínseca do 
comportamento (realidade ontológica) que é desviante em si (delitos naturais) e 
preexistente ao controle social e penal que reage contra ela especialmente através da 
instituição da prisão. 
 
Logo, esquece-se de que o instituto do direito penal tem o caráter de estabelecer 
garantias individuais em face do exercício ius puniendi arbitrário do Estado daquela época, como 
propagava a Escola Clássica. Assim, surge a ideia de legitimidade estatal para punir. 
 
Carvalho (1996, p. 137) afirma: 
 
A estrutura principiológica da ideologia da Defesa Social permitiria, assim, função 
legitimadora do establishment. Legitimaria o Sistema Penal – racionalizado pelo discurso 
oficial das instituições – induzindo o consenso no qual o Estado, através do legislativo, 
tutelaria bens jurídicos universais e monolíticos, compartilhados por toda a sociedade 
de determinado local, em determinada época; e instrumentalizaria os aparelhos 
repressivos, determinando atuação letal que visa à manutenção da estrutura 
hierarquizada e seletiva, a partir da atuação do modelo repressivo. 
 
Ainda, como outro pressuposto básico da Ideologia da Defesa Social, tem-se a ideia de 
bem e mal, cidadão e criminoso. 
 
Por último postulado, derivado do que foi acima exposto, entende-se o princípio da 
culpabilidade do indivíduo e a reprovação da sua conduta perante a moral da sociedade e os 
integrantes que a compõem. 
 
Diante dos mais diversos estudos difundidos pelas Escolas Positivistas, tendo em vista 
as áreas da biologia, antropologia, psicologia, sociologia, eis que tudo começa caminhar para o 
surgimento das mais diversas Escolas Sociológicas, estas que acabaram por aniquilar de forma 
brilhante os princípios da Ideologia da Defesa Social. 
 
Tais Escolas Sociológicas tratam de mudar o enfoque a respeito do delito. As referidas 
escolas passam a adotar uma visão menos parecida com as Escolas Positivistas, cujo enfoque era 
no criminoso, e passam então a analisar o sistema penal, bem como os processos de 
criminalização, tendo como premissa o sistema da reação social ao desvio. 
 
21 
 
 
 
2.2.3 Escola psicanalítica 
 
A partir das décadas de 20 e 30 do século passado, o crime passa a ser visto sob novo 
ângulo. Sigmund Freud (1856-1939), autor que compõe a Escola Psicanalítica, desenvolve duas 
teorias de relevância. 
 
A primeira é baseada no complexo de Édipo; a segunda, numa falha de refreamento das 
pulsões do id por parte do superego. 
 
Para Freud, com relação à primeira teoria que envolve o complexo de Édipo, o ato 
delitivo pode ocorrer por algum trauma que acomete o indivíduo na infância, caracterizado por 
estigmas próprios da fase em que ocorreu, assim estando o indivíduo propenso a cometer delitos, 
observadas as circunstâncias peculiares de cada caso. 
 
Antonio García-Pablos de Molina e Luiz Flávio Gomes (2012, p. 245) esclarecem com 
perfeição o acima exposto: 
 
O complexo de Édipo tem particular interesse na teoria freudiana, pois muitos atos 
delitivos, conforme este autor, têm sua explicação naquele complexo que, longe de 
suceder, precede e impulsiona o cometimento do delito e teria sua origem na vivência 
inconsciente da criança. Freud conecta a evolução do instinto sexual com outras tantas 
etapas da evolução da personalidade e, por sua vez, estas e as diversas manifestações 
delitivas, de sorte que o sujeito que sofreu o trauma (que detém sua normal evolução 
pessoal) revela os estigmas próprios da fase (ou fases) na qual aquele ocorreu, estando, 
em consequência, inclinado ao cometimento, em cada caso, de determinados fatos 
criminais (as pessoas “traumatizadas” na fase “oral”, por exemplo, cometeriam delito 
de expressão verbal eseriam propensas a hábitos como alcoolismo); [...] 
 
A segunda teoria de Freud parte do pressuposto que o aparelho psíquico das pessoas é 
formado por três grandes elementos: Ego, Id e Superego. Dessa forma, sendo o Id as pulsões, e o 
Superego o refreador dessas pulsões, afirma o autor, o delito surge da incorreta interiorização das 
normas e valores pelo Superego, passando a haver conflito íntimo da personalidade quando 
ocorre a tentativa de refrear os impulsos (Id). 
 
22 
 
 
Antonio García-Pablos de Molina e Luiz Flávio Gomes (2012, p. 245), ainda em seus 
ensinamentos, elucidam: 
 
[...] por último, a potenciação do mundo subconsciente e a divisão dinâmica da 
personalidade em três esferas (Ego, Id e Superego) caracterizam um dos postulados da 
psicanálise ortodoxa: todos os atos do homem têm uma explicação oculta que só a 
introspecção pode revelar e, em concreto, o delito tem suas raízes em desequilíbrios e 
conflitos íntimos na estrutura da personalidade (com frequência, a ausência ou 
debilidade do Superego, que é a instância que cuida da correta interiorização das 
normas e valores). O conceito freudiano de neurose, como disfunção da personalidade 
e regressão patológica defensiva para o passado quando um acontecimento traumático 
reprime certas tendências instintivas e as fixa no subconsciente, completa a tese do 
autor. 
 
Posteriormente surge então a teoria psicanalítica finalista, esta baseada na segunda teoria 
de Freud, cujos patronos são Franz Alexander e Hugo Staub. Tal teoria evidencia que o crime 
muitas vezes tem algo de sedutor, de aliciante, capaz de fazer com que o indivíduo sinta-se 
momentaneamente estremecido quando vê um crime acontecer. 
 
Franz Alexander e Hugo Staub (1979, p. 388) elucidam o pensamento acima em 
comento: 
 
O ego pretende expiação toda vez que se verifica uma violação do direito, para 
aumentar, no momento em que ele é pressionado pelos impulsos, a força do próprio 
superego. O mau exemplo do delinquente age de modo sedutor sobre os próprios 
impulsos reprimidos e aumenta sua pressão. Por isso, o ego tem necessidade de reforçar 
o próprio superego, e somente pode obter este reforço das pessoas reais que 
incorporam autoridade, as quais são o modelo do superego. Se o ego pode demonstrar 
aos impulsos que também as autoridades mundanas dão razão ao superego, então ele 
pode se defender do assalto dos impulsos. Mas se as autoridades mundanas 
desautorizam o superego, deixando fugir o delinquente, então não existe mais nenhuma 
ajuda contra o assalto das tendências antissociais. O impulso para punição é, pois, uma 
reação defensiva do ego contra os próprios impulsos, com a finalidade da sua repressão, 
para conservar o equilíbrio espiritual entre forças repressivas e forças reprimidas. A 
exigência de punir o delinquente é, simultaneamente, uma demonstração dirigida para 
dentro, para desencorajar os impulsos: o que nós proibimos ao delinquente vós 
também podeis renunciar. 
 
23 
 
 
Segundo os teóricos acima citados, a necessidade da sociedade de punir o crime advém 
justamente da luta do superego em refrear as pulsões liberadas pelo id, que são seduzidas pelo 
fenômeno crime. 
 
Quando um criminoso é visto praticando um crime – não raro – o cidadão comum tem 
uma sedução, um aliciamento para praticar o ato. Para justificar isso, tal aliciamento, pune-se o 
indivíduo criminoso transferindo para ele uma culpa que não é dele, e sim da sociedade. 
 
Surge então o autor Theodor Reik, assumindo reflexivamente a outra teoria de Freud, 
acerca do complexo de Édipo, que por muitas vezes o indivíduo que comete o crime não o 
executando com absoluta perfeição, sentindo-se impelido posteriormente a voltar ao local e 
confessar sua autoria. Seguindo essa linha de raciocínio, Reik rechaça a pena como mecanismo 
preventivo e dissuasório, uma vez que não é capaz de atingir o inconsciente e neutralizar o 
complexo de culpa. 
 
Antonio García-Pablos de Molina e Luiz Flávio Gomes (2012, p. 245-246) precisamente 
pontuam o acima elucidado: 
 
Reik segue também a teoria freudiana do complexo de Édipo como causa – não como 
consequência – do delito; a esta reação autopunitiva atribui Reik um fato muito comum 
que consiste em o delinquente não executar o crime com absoluta perfeição e que se 
veja impelido, depois, a regressar ao local do delito e a confessar sua autoria. O autor 
rechaça de forma absoluta e indiscriminada toda política criminal baseada na pena 
como mecanismo supostamente preventivo ou dissuasório, já que a seu juízo ela é 
inadequada para aceder ao mundo do inconsciente e neutralizar o complexo de culpa. 
 
Nessa esteira, Reik passa a mudar o paradigma da função da pena, sendo que a primeira 
função, para o referido autor, deve ser para reforçar o inconsciente do indivíduo de que tal ato é 
criminoso, e a segunda, a fim de satisfazer a necessidade de punição da sociedade, essa que se 
identifica inconscientemente com o porquê da sanção aplicada para o indivíduo que cometeu o 
ato tido como criminoso. 
 
Dessa forma, Reik formaliza seu posicionamento de que as funções retributiva e 
preventiva da pena, advindas do postulado da Ideologia da Defesa Social (Escola Positivista), não 
são ontológicas da psique humana. 
24 
 
 
 
Baratta (2002, p. 51) colaciona o seguinte: 
 
Sobre a mencionada teoria freudiana do “delito por sentimento de culpa”, Theodor 
Reik funda uma teoria psicanalítica do direito penal, baseada sobre a dupla função da 
pena: a) a pena serve à satisfação da necessidade inconsciente de punição que impele a 
uma ação proibida; b) a pena satisfaz também a necessidade de punição da sociedade, 
através de sua inconsciente identificação com o delinquente. O efeito catártico da pena 
e o processo de identificação da sociedade com o delinquente são os dois aspectos de 
uma teoria psicológica do direito penal segundo a qual as duas concepções 
fundamentais da pena, a concepção retributiva e a concepção preventiva, não são mais 
que racionalizações de fenômenos que fundam suas raízes no inconsciente da psique 
humana. 
 
A partir do acima exposto, observou-se como se desenvolveu a Escola Psicanalítica, esta 
que, influenciada pelos ideais da Escola Positivista, tratou de dar novas perspectivas do porquê da 
existência de delitos, num enfoque aprofundado no campo da Psicanálise, através de teorias 
desenvolvidas por Freud e modificadas por Franz Alexander, Hugo Staub e Reik. 
 
2.2.4 As escolas sociológicas e a criminologia do consenso e do conflito 
 
A partir das reflexões a seguir, trazidas pelas escolas criminológicas sociológicas, 
verificar-se-á que os autores protagonistas nesse momento tratarão o crime como um fenômeno 
social. Assim, posteriormente se passará à criminologia do conflito ou crítica. 
 
Pois bem, numa análise comparativa entre as escolas clássica, positivista, psicanalítica e 
sociológica, tem-se que as escolas sociológicas partem do pressuposto de que a sociedade cria 
meios favoráveis para a propagação do crime, mudando o antigo foco de que o criminoso era 
portador de livre arbítrio de Beccaria, que defendia o contratualismo de Rousseau, ou então do 
conceito lombrosiano positivista de que há a existência de um criminoso nato, ou então como as 
diversas raízes das escolas psicanalíticas que tratavam do complexo de Édipo, e das pulsões 
liberadas pelo id e refreadas pelo superego, estas que Freud propagava. 
 
Antonio García-Pablos de Molina e Luiz Flávio Gomes (2012, p. 297) destacam a 
crucial diferença entre o modelo sociológico e os anteriores a este, senão vejamos: 
 
25 
 
 
Diversas origens dos modelos de cunho sociológico(sociologicistas). A moderna 
Sociologia Criminal não se limita, diferentemente das concepções sociológicas até aqui 
examinadas, a ressaltar a importância do “meio” ou “entorno” na gênese da 
criminalidade, senão que contempla o fato delitivo como “fenômeno social” e pretende 
explicá-lo em função de um determinado marco teórico. 
 
O modelo sociológico tem suas raízes tanto na Europa quanto nos Estados Unidos da 
América. 
 
Na Europa, quem propaga tal enfoque sociológico é Durkheim com a teoria da anomia, 
estritamente de cunho acadêmico. 
 
Pelo lado norte-americano, a Escola de Chicago é a precursora de modificações, 
voltando-se para a observação reativa não do indivíduo, como os demais modelos antes do 
sociológico propagavam, e sim da sociedade a partir de sua natureza prática, como será exposto a 
partir dos desdobramentos da teoria da Ecologia. 
 
Dessa forma, contempla-se que a Escola de Chicago foi quem começou a disseminar a 
ideia de uma política criminal a partir do mapeamento dos grandes centros urbanos. 
 
Antonio García-Pablos de Molina e Luiz Flávio Gomes (2012, p. 297) apontam as raízes 
da moderna Sociologia Criminal afirmando o seguinte: 
 
A Sociologia Criminal contemporânea tem um duplo entroncamento, o europeu e o 
norte-americano. O europeu está vinculado a Durkheim e é de tipo academicista (teoria 
da “anomia”). O norte-americano identifica-se com a célebre escola: a Escola de 
Chicago, a partir da qual nasceram, progressivamente, os diversos esquemas teóricos 
(teorias ecológicas, subculturais, da aprendizagem, da reação social ou do etiquetamento 
etc.). A denominada Escola de Chicago caracterizou-se, desde o princípio, por um 
particular “empirismo” e por sua finalidade pragmática, concentrando suas 
investigações nos “problemas sociais” do momento. 
 
Antes de expor as demais escolas que compõem a criminologia, convém diferenciar a 
criminologia do consenso e do conflito. 
Shecaira (2012, p. 123-124) aponta as duas visões que compõem o conceito da 
macrossociologia que influenciaram o saber criminológico: 
26 
 
 
 
Podemos agrupar duas visões principais da macrossociologia que influenciaram o 
pensamento criminológico. À primeira visão, de corte funcionalista, mas também 
denominada de teorias da integração, daremos o nome mais amplo de teorias do consenso. A 
segunda visão, argumentativa, pode-se intitular, genericamente, de teorias do conflito. A 
escola de Chicago, a teoria da associação diferencial, a teoria da anomia e a teoria da 
subcultura delinquente podem ser consideradas teorias do consenso. Já as teorias do 
labelling (interacionista) e crítica partem de visões conflitivas da realidade. [grifos do 
autor] 
 
A criminologia do consenso parte do pressuposto de que a sociedade cumpre sua 
finalidade a partir do momento em que suas instituições integram os cidadãos, estes que se veem 
participativos e compartilham objetivos com outros, ainda aceitando e compartilhando as regras 
sociais dominantes. 
 
Shecaira (2012, p. 124) aponta o seguinte: 
 
Para perspectiva das teorias consensuais a finalidade da sociedade é atingida quando há 
um perfeito funcionamento das suas instituições de forma com que os indivíduos 
compartilham os objetivos comuns a todos os cidadãos, aceitando as regras vigentes e 
compartilhando as regras sociais dominantes. 
 
Ainda na perspectiva da criminologia do consenso, cabe apontar as diversas premissas 
bases que fornecem a sua sustentação e direção, conforme Ralf Dahrendorf (1982, p. 148) apud 
Shecaira (2012, p. 125): 
 
As teorias do consenso têm como base um certo número de premissas: “toda sociedade 
é uma estrutura de elementos relativamente persistente e estável; toda sociedade é uma 
estrutura de elementos bem integrada; todo elemento em uma sociedade tem uma 
função, isto é, contribui para sua manutenção como sistema; toda estrutura social em 
funcionamento é baseada em um consenso entre seus membros sobre valores. Sob 
várias formas, os mesmos elementos de estabilidade, integração, coordenação funcional 
e consenso reaparecem em todos os enfoques funcionalistas-estruturalistas do estudo 
da estrutura social. Estes elementos são, naturalmente, em geral, acompanhados de 
afirmações no sentido de que a estabilidade, integração, coordenação funcional e 
consenso são apenas ‘relativamente’ “generalizados”. 
 
27 
 
 
Assim, tem-se que as teorias do consenso partem de diversas premissas, mas que a ideia 
geral é a da funcionalidade entre os indivíduos, estes que compartilham dos mesmos valores em 
busca de objetivos em comum. 
 
Partindo do acima dito, extrai-se sentido de que na teoria do consenso existam unidades 
de análise social, estas que são instituições criadas por associações voluntárias de indivíduos que 
partilham de mesmos valores e com objetivo de cristalizar a cooperação. 
 
Shecaira (2012, p. 124) deflagra o seguinte acerca da teoria consensual: 
 
Do ponto de vista da teoria consensual, as unidades de análise social (os chamados 
sistemas sociais) são essencialmente associações voluntárias de pessoas que partilham 
certos valores e criam instituições, com vistas a assegurar que a cooperação funcione 
regularmente. 
 
Em contrapartida, passa-se a analisar a do conflito. Esta se pauta na afirmação marxista 
de que a sociedade está fundada no pressuposto coercitivo da ordem social. 
 
A ordem social, de acordo com Karl Marx, um dos teóricos da escola citada no 
parágrafo anterior, está pautada na luta de classes, em que sempre haverá opressores e oprimidos. 
 
Karl Marx (s.d., p. 22) apud Shecaira (2012, p. 124) aponta o seguinte: 
 
Um dos principais autores na defesa da ideia, segundo a qual a sociedade está fundada 
no conflito, foi Marx. Em suas famosas palavras: “Até hoje, a história de todas as 
sociedades que existiram até nossos dias tem sido a história da luta de classes. Homem 
livre e escravo, patrício e plebeu, barão e servo, mestre de corporação e companheiro, 
numa palavra, opressores e oprimidos, em constante oposição, têm vivido numa guerra 
ininterrupta, ora franca, ora disfarçada; uma guerra que terminou sempre, ou por uma 
transformação revolucionária da sociedade inteira, ou pela destruição das suas classes 
em luta”. 
 
À luz da criminologia do conflito, em que haverá sempre opressores e oprimidos, tece-
se a ideia de que as unidades de análise social só funcionam efetivamente face ao sistema 
coercitivo, este que dá sentido às organizações sociais. 
 
28 
 
 
Shecaira (2012, p. 124) retrata: 
 
Do ponto de vista da teoria do conflito, por outro lado, tais unidades de análise social 
configuram uma situação bastante diferente. Para ela, não é a cooperação voluntária ou 
o consenso geral, mas a coerção imposta que faz com que as organizações sociais 
tenham coesão. 
 
Tendo em vista a abordagem acima realizada quanto às Escolas Sociológicas, bem como 
da distinção acerca da criminologia consensual da conflitual, surge a necessidade de revelar, 
brevemente, de que forma foi construído o raciocínio sobre delito pela criminologia do consenso, 
para depois deflagrar, por sua vez, a mudança paradigmática ocorrida em virtude da criminologia 
do conflito. 
 
2.2.4.1 Criminologia do consenso 
 
2.2.4.1.1 Escola de Chicago e a teoria ecológica 
 
No século XX ocorreu um deslocamento do estudo criminológico da Europa para a 
América do Norte, especialmente na área da sociologia criminal. 
 
Com isso, surgiram teorias norte-americanas a respeito do delito. Senão vejamos o que 
Shecaira (2012, p. 129) aponta em seus ensinamentos: 
 
Diferentemente de nós, influenciados quefomos pelas ideias europeias, os norte-
americanos tiveram uma preocupação diferenciada e até original, marcada por um certo 
pragmatismo haurido do pensamento de Spencer e Comte. Não criaram eles a 
sociologia, mas deram-lhe feições e abordagens peculiares. Na segunda metade do 
século XIX ocorrem mudanças sociais importantes nos Estados Unidos, com a 
consolidação da burguesia industrial, financeira e comercial. A expansão da classe média 
e trabalhadora, com a vinda de grandes levas de imigrantes e migrantes para as cidades, 
que se transformam em centros industriais dinâmicos, cria um diversificado ambiente 
intelectual dentro do qual evoluíram as ciências sociais. 
 
A grande percepção norte-americana foi organizar geograficamente, especificamente a 
cidade de Chicago, em zonas. Estas que, por estudos empíricos, detinham aproximação relevante 
acerca da região com maior índice de violência, problemas relacionados à saúde, família. 
29 
 
 
Confirmando o que acima se transcreve, no mesmo sentido, insurge-se o postulado de Hassemer 
e Muñoz Conde (2011, p. 52): 
 
A importância da Escola de Chicago radica, sobretudo, em ter destacado o contexto 
urbano em que surgia a delinquência, principalmente juvenil, indicando-a 
geograficamente em determinadas zonas da cidade, o que naturalmente permite uma 
melhor observação e investigação empírica, aplicando uma metodologia muito parecida 
com a do positivismo biológico, concebendo a cidade como um organismo em que, 
junto às zonas organizadas e sem criminalidade, existem partes patológicas que de 
algum modo se contrapõem e equilibram as outras. Desta forma, delimita-se facilmente 
o objeto de investigação, possibilitando uma investigação de campo, e, ao mesmo 
tempo, mostra-se à polícia onde deve imprimir maior controle e vigilância. 
 
Dessa forma, por meio das investigações empíricas, tece-se um grande passo na 
criminologia que até os dias de hoje, com algumas modificações, segue influenciando a 
criminologia norte-americana. 
 
Nessa esteira, a observação geográfica do centro urbano, partindo da premissa de zonas, 
torna-se importante instrumento para a efetivação de políticas públicas, como apontam Hassemer 
e Muñoz Conde (2011, p. 54-55): 
 
Não obstante, as teorias ecológicas da Escola de Chicago tiveram grande impacto no 
desenvolvimento da criminologia, até o ponto de ainda hoje, mas com muitas 
modificações, seguirem dominando a Criminologia norte-americana, provocando 
grandes investigações empíricas de determinadas formas de criminalidade de grande 
relevância social (como são, por exemplo, os maus-tratos a mulheres no âmbito 
familiar) que apresentam dados muito significativos e reveladores da importância do 
fenômeno [...]. O conhecimento da distribuição geográfica de determinadas formas de 
delinquência (ainda que não seja de todas, e, às vezes, nem sequer das mais relevantes) é 
muito importante para desenhar programas preventivos e de divulgação sanitária e 
cultural nos bairros mais deteriorados e marginais, ainda que dificilmente possam alterar 
a situação se não melhorar radicalmente as condições de vida e o nível econômico e 
social de seu povo. 
 
A partir dos estudos com a Escola de Chicago, precisamente com a teoria Ecológica, as 
escolas a seguir começam a surgir. Dessa vez munidas de mais empirismo, tais escolas passaram a 
observar o delito como fator tanto endógeno quanto exógeno. 
 
30 
 
 
2.2.4.1.2 Escola da socialização defeituosa 
 
A Escola da Socialização Defeituosa promove um grande passo no avanço 
historiográfico. Muda-se o foco. Até então a criminologia estudava o crime a partir de fatores 
puramente endógenos, intrínsecos à anatomia do indivíduo. O criminoso era assim concebido 
porque o crime estava dentro do indivíduo. 
 
A partir do primeiro desdobramento da teoria Ecológica, a chamada Escola da 
Socialização Defeituosa, passou-se a observar que existem também fatores exógenos (extrínsecos 
ao indivíduo), que são determinantes para a inclusão no crime. 
 
Hassemer e Muñoz Conde (2011, p. 47) ressaltam o posicionamento da Escola da 
Socialização Defeituosa, desmistificando a necessidade de se analisar fatores exógenos dos 
indivíduos para a criminalização, senão vejamos: 
 
Desde sempre se sabe que a conduta humana é, além de resultado de condicionantes 
físicos, biológicos e psicológicos com os quais o ser humano vem ao mundo, sobretudo 
e antes de tudo, consequência de um processo de socialização que começa desde o 
nascimento e continua com a educação no seio familiar e com outros processos de 
socialização e aprendizagem cultural através de distintas instâncias e contatos sociais, 
que vão configurando a personalidade do indivíduo durante toda a vida até o momento 
da morte. Portanto, na análise empírica das causas da criminalidade, devem-se levar em 
consideração também fatores de caráter social, externos ao indivíduo, que fazem 
compreensível sua conduta e permitem sua valoração num contexto mais amplo do que 
sua própria individualidade. 
 
Logo, tem-se que, primeiro, de três desdobramentos dos estudos da Escola da 
Socialização Defeituosa, é a Teoria do Broken Home, em que o criminoso, não raro, vem de uma 
família desestruturada, a qual faz com que o crime nasça como reflexo e consequência de um lar 
destruído. 
 
Hassemer e Muñoz Conde (2011, p. 59) ressaltam o posicionamento acima descrito: 
 
Apesar de todas as críticas que podem ser feitas à tese dos “brokenhomes”, devemos ter 
em conta que as investigações sobre as condições familiares da delinquência levaram a 
criminologia a ver as coisas de um modo distinto do que tinha visto até aquele 
momento. A delinquência não pode seguir sendo vista somente como resultado de 
31 
 
 
fatos e processos no interior do indivíduo desviado concreto, mas como resultado de 
uma interação, de uma relação de influências recíprocas das pessoas entre si. 
 
Nesse âmbito, percebe-se que a teoria do Broken Home acredita ser adquirida a conduta 
delitiva no curso do processo de socialização. Hassemer e Muñoz Conde (2011, p. 60) descrevem 
isso com perfeição: 
 
A insuficiência das investigações desenvolvidas pelos GLUECK foi, de certa forma, 
superada pelas denominadas teorias criminológicas do aprendizado. Estas teorias partem, da 
mesma forma que as investigações sobre o “broken homes”, do entendimento de que a 
conduta delitiva é adquirida no curso do processo de socialização; todavia, não se 
limitam a mostrar a família como única instância social em ação, mas apontam outras 
possibilidades e hipóteses que passamos a expor. [grifos do autor] 
 
Pelo acima exposto, percebe-se que houve uma mudança de foco no saber 
criminológico. A princípio, pela Escola Positivista estudava-se apenas o crime como inerente às 
características próprias do ser humano. A partir da teoria da Socialização Deficiente (defeituosa), 
o crime passa a ser analisado como fator propiciado pela má formação de conceitos importantes 
advindos do seio familiar, com a teoria do Broken Home, sendo que a partir desse ponto de vista 
foi possível fundamentar que o delito pode ser aprendido pelos indivíduos que compõem a 
sociedade. 
 
2.2.4.1.3 Teoria do contato diferenciado 
 
O segundo desdobramento da Escola da Socialização Defeituosa recai na teoria do 
Contato Diferenciado. Esta apregoa que o crime seria fruto de um processo de aprendizagem, ou 
seja, o sujeito que aprende a praticar condutas modelares, exemplares, ele também aprende a 
praticar o crime. 
 
Nesse raciocínio, crime seria fruto de um processo de aprendizagem que é introjetado 
da sociedade (de fora), para o indivíduo (para dentro), e não maisde dentro para fora. Ocorre 
aqui uma mudança de paradigma, ou seja, o crime não é proveniente da anatomia, ou da biologia 
do criminoso, mas sim da sociedade que ensina delito ao indivíduo. 
 
Hassemer e Muñoz Conde (2011, p. 60) ressaltam o posicionamento da Escola da 
Socialização Defeituosa, no tocante à teoria dos contatos diferenciais: 
32 
 
 
 
As teorias criminológicas do aprendizado foram formuladas em termos clássicos por 
Edwin H. SUTHERLAND, desde os anos 30, em sua obra Principles of Criminology [...] e 
desenvolvidas, posteriormente, em diferentes trabalhos. Uma de suas principais 
contribuições é a teoria dos contatos diferenciais desenvolvida, sobretudo, para explicar a 
delinquência juvenil. Segundo essa teoria, na sociedade existem grupos fiéis às normas 
jurídicas e grupos transgressores das mesmas, e a inclinação do jovem à criminalidade 
dependeria de com qual destes grupos chegue a ter principais contatos (daí a expressão 
“Contatos” ou “Associações” diferenciais). Com ela se expressa a ideia de que a 
oportunidade para um indivíduo se transformar em delinquente depende do modo, da 
intensidade e da duração dos contatos do indivíduo com outras pessoas. [grifos do 
autor] 
 
A teoria dos Contatos Diferenciados explica o fenômeno criminoso a partir dessa 
realidade, como se indivíduo pudesse aprender o crime, isso por meio dos contatos que ele tem 
na sociedade. Contatos que, dependendo da intensidade, da duração, da frequência ou da 
antiguidade, podem levar ao delito. 
 
Portanto, para tal teoria, se o indivíduo tiver desde criança contatos diferenciais muito 
intensos, frequentes, duradouros com pessoas que conhecem da prática de crimes, para os 
teóricos da escola, provavelmente tal indivíduo será criminoso. 
 
2.2.4.1.4 Teoria das subculturas 
 
Para a teoria das Subculturas, esta que é o terceiro desdobramento da teoria da 
Socialização Defeituosa, não haveria na sociedade uma única pauta de valores a ser perseguida 
pelos membros da coletividade. Pelo contrário, a teoria das Subculturas de Grupo mostra que a 
sociedade é feita por um feixe plural de pauta de valores. 
 
Baratta (2002, p. 73-74) pontua: 
 
O quadro de teorias das subculturas criminais aqui apresentado não pode ser senão 
sumário. Contudo, interessa sublinhar o núcleo teórico contido nessas teorias, que se 
opõe ao princípio da ideologia da defesa social acima denominado princípio da 
culpabilidade. Sob este ponto de vista, a teoria das subculturas criminais nega que o delito 
possa ser considerado como expressão de uma atitude contrária aos valores e às normas 
sociais gerais, e afirma que existem valores e normas específicos dos diversos grupos 
33 
 
 
sociais (subcultura). Estes, através de mecanismos de interação e de aprendizagem no 
interior dos grupos, são interiorizados pelos indivíduos pertencentes aos mesmos e 
determinam, portanto, o comportamento, em concurso com os valores e as normas 
institucionalizadas pelo direito ou pela moral “oficial”. [grifos do autor] 
 
Para tal teoria, muitas vezes a pauta de valores escolhida pela sociedade não é aquela 
mesma estabelecida por diversos grupos que a compõem. 
 
Muitas vezes, o crime pode ser explicado não por um desvio do criminoso, mas 
simplesmente porque ele elege para si pautas de valores distintos da oficial. 
 
Baratta (2002, p. 74) precisamente destaca: 
 
Ao contrário, não só a estratificação e o pluralismo dos grupos sociais, mas também as 
reações típicas de grupos socialmente impedidos do pleno acesso aos meios legítimos 
para a consecução dos fins institucionais, dão lugar a um pluralismo de subgrupos 
culturais, alguns dos quais rigidamente fechados em face do sistema institucional de 
valores e de normas, e caracterizados por valores, normas e modelos de 
comportamento alternativos àquele. 
 
Assim, tal teoria explica o fenômeno do crime, não como sendo um desvio, mas como 
uma conduta pautada de acordo com uma axiologia paralela àquela que o legislador escolheu. 
 
Partindo do acima dito, passa-se a análise então da Teoria da Anomia, desenvolvida pela 
Escola Estrutural Funcionalista, que parte da criminologia do consenso, outra escola Sociológica, 
entretanto de cunho europeu. 
 
2.2.5 Escola estrutural funcionalista 
 
Desenvolvida por dois criminólogos: Emile Durkheim (1858-1917) e Robert Merton 
(1910-2003). 
 
 
 
 
 
34 
 
 
2.2.5.1 Visão de Émile Durkheim 
 
Até o presente momento, as demais escolas criminológicas trataram de considerar as 
concepções sociais criminológicas como preponderante fator para indução ao crime, mas tão 
somente no que se refere ao meio, ao entorno, em que o indivíduo está inserido. 
 
Importante ressaltar, antes de adentrar ao funcionamento da teoria, que a fase histórica 
vivida nesse momento europeu é a de economias em crescimento, em que a sociedade já era 
industrializada e em que antagonismos sociais passaram a modificar o contexto social, o qual 
enfraqueceu e tratou de colocar em crise modelos, normas, pautas de valores das sociedades que 
percorriam esse período na história. 
 
Os postulados abarcados pela Teoria da Anomia são dois, quais sejam: a normalidade do 
crime, bem como a funcionalidade deste. 
 
Pela normalidade, os referidos teóricos da anomia conduzem à ideia de que crime não é 
algo anormal, mas sim normal e presente em todas as sociedades em qualquer momento 
histórico, bem como a ação delituosa não é inerente a uma característica etiológica, anatômica, 
biológica, psíquica, aprendida, mas sim um fato normal regulador da sociedade. 
 
Baratta (2002, p. 60) reitera o acima proposto escrevendo o seguinte: 
 
[...] encontramos o fenômeno criminal em todo tipo de sociedade: “não existe nenhuma 
na qual não exista uma criminalidade” [DURKHEIM, 1968, p. 65]. Ainda que suas 
características qualitativas variem, o delito “aparece estreitamente ligado às condições 
de toda vida coletiva” [Ibid., p. 66]. Por tal razão, considerar o crime como uma doença 
social “significaria admitir que a doença não é algo acidental, mas, ao contrário, deriva, 
em certos casos, da constituição fundamental do ser vivente” [Ibid., p. 66]. Mas isto 
reconduziria a confundir a fisiologia da vida social com a sua patologia. O delito faz 
parte, enquanto elemento funcional, da fisiologia e não da patologia da vida social. 
Somente as suas formas anormais, por exemplo, no caso de crescimento excessivo, 
podem ser consideradas como patológicas. Portanto, nos limites qualitativos e 
quantitativos da sua função psicossocial, o delito é não só “um fenômeno inevitável, 
embora repugnante, devido à irredutível maldade humana”, mas também “uma parte 
integrante de toda sociedade sã” [Ibid., p. 66]. 
 
35 
 
 
Já pela funcionalidade, Durkheim defende o posicionamento de que é funcional que 
haja crimes, isso para que haja a mudança social. 
 
Para Durkheim, o crime não pode ser analisado a partir das supostas anomalias que o 
sujeito carrega, nem mesmo considerar o delito como algo proveniente de uma desorganização 
social. 
 
O autor referido no parágrafo acima defende que se é normal esperar das pessoas o 
cumprimento de uma conduta regrada, é normal também que haja o descumprimento, como se 
fosse uma conduta contraposta. 
 
Shecaira (2012, p. 191-192) explica de modo mais preciso: 
 
O crime, por sua vez, é um fenômeno normal de toda estrutura social. Só deixa de sê-
lo, tornando-se preocupante, quando são ultrapassados determinados limites, quando o 
fenômeno do desvio passa a ser negativo para a existência e o desenvolvimento da 
estrutura social, seguindo-se um estadode desorganização, no qual todo o sistema de 
regras de conduta perde valor, enquanto um novo sistema ainda não se firmou (esta é a 
definição de anomia). Ao contrário dos pensadores com perfil biologicista do crime, 
dentro de seus limites funcionais, o comportamento desviante é um fator necessário e 
útil para o equilíbrio e o desenvolvimento sociocultural [BARATTA, 2002, p. 59-60]. 
No entanto, quando o ato criminoso ofende os estados fortes e definidos da 
consciência coletiva, tem-se uma preocupação. 
 
Ainda, Durkheim acredita no lado funcional do delito, este capaz de regular a vida social 
por cumprir uma visão integradora e inovadora. Nessa mesma linha de raciocínio, justifica-se o 
porquê de o indivíduo criminoso não ser portador de uma anomalia, de uma patologia, mas ser 
apenas algo normal inerente à vida social. 
 
O autor desenvolve então o conceito de anomia, simples, que abarca o termo da 
“consciência coletiva”. Durkheim passa a se utilizar da palavra anomia ao referir-se à sociedade 
que, em virtude da alta e acelerada velocidade do desenvolvimento econômico, passa a perder 
efetividade de suas normas, e assim enfraquece aquela pauta de valores antes firmada em comum 
pelos seus cidadãos, consagrando profundas transformações sociais que promovem a debilidade 
da consciência coletiva. 
 
36 
 
 
Luiz Flávio Gomes e Antonio García-Pablos de Molina (2012, p. 304) explicam de 
modo mais preciso: 
 
Particular interesse no pensamento de Durkheim possui o conceito de “anomia”, que 
pretende expressar a crise, a perda de efetividade ou o desmoronamento das normas e 
valores vigentes em uma sociedade, precisamente como consequência do rápido e 
acelerado desenvolvimento econômico da mesma e de suas profundas alterações sociais 
que debilitam a consciência coletiva. 
 
Ainda, o criador da Teoria da Anomia afirma que a soma das consciências individuais, 
quando associadas e combinadas, produzem uma consciência coletiva. 
 
Durkheim apud Shecaira (2012, p. 191) explica a formação do consciente coletivo: 
 
A sociedade não é, segundo Durkheim, uma simples soma de indivíduos; o sistema 
formado por sua associação representa uma realidade específica que tem suas próprias 
características. Sem dúvida, nada poderia se produzir de coletivo se as consequências 
individuais não existissem, mas essa condição, apesar de necessária, não é suficiente. É 
preciso, ainda, que essas consciências estejam associadas e combinadas de certa forma; 
é dessa combinação que resulta a vida social e, por conseguinte, é ela que a explica. 
Agregando-se, penetrando-se e fugindo-se, as almas individuais dão origem a um ser, 
psíquico se quisermos, mas que constitui uma individualidade psíquica de um novo 
gênero. 
 
Uma sociedade sem crime seria, para o fundador da Teoria da Anomia, uma sociedade 
em que o Direito Penal seria estático, sem a possibilidade de disciplinar as mudanças sociais para 
que haja desenvolvimento. Para Émile Durkheim, a sociedade muitas vezes precisa sim do crime 
como alternativa à mudança. 
 
Shecaira (2012, p. 192) traz então o argumento final, que consagra a teoria desenvolvida 
por Durkheim: 
 
Nesse contexto, a simples existência da criminalidade reveste-se de normalidade e 
também de funcionalidade. Isto é, não é o crime um fato necessariamente nocivo, uma 
vez que pode ter inúmeros aspectos favoráveis à estabilidade e mudança social, pelo 
reforço que pode trazer à solidariedade dos homens. O anormal não é a existência do 
delito, senão um súbito incremento ou decréscimo dos números médios ou das taxas de 
criminalidade. Uma sociedade sem crimes é pouco desenvolvida, monolítica, imóvel e 
37 
 
 
primitiva. Esse súbito incremento da criminalidade decorre da anomia, que é um 
desmoronamento das normas vigentes em dada sociedade. 
 
 Pelo acima exposto, contempla-se que para o sociólogo Durkheim a sociedade é a 
associação, bem como a combinação dos inconscientes individuais de cada integrante, 
denominando-se, numa visão macro, de consciente coletivo. 
 
 Ainda, o autor tira força da ideia patológica da análise do indivíduo tido como 
delinquente, firmando o entendimento de que se trata de uma fisiologia social, sendo que, pelo 
delito ser revestido de normalidade, somente em casos constatados de seu excesso é que se 
observa uma anomalia. 
 
Baratta (2002, p. 59) reitera o acima proposto escrevendo o seguinte: 
 
A teoria estrutura-funcionalista da anomia e da criminalidade afirma: 
1) As causas do desvio não devem ser pesquisadas nem em fatores bioantropológicos 
e naturais (crima, raça), nem em uma situação patológica da estrutura social. 
2) O desvio é um fenômeno normal de toda estrutura social. 
3) Somente quando são ultrapassados determinados limites, o fenômeno do desvio é 
negativo para a existência e o desenvolvimento da estrutura social, seguindo-se um 
estado de desorganização no qual todo o sistema de regras de conduta perde o valor, 
enquanto um novo sistema ainda não se afirmou (esta é a situação de “anomia”). Ao 
contrário, dentro de seus limites funcionais, o comportamento desviante é um fator 
necessário e útil para o equilíbrio e o desenvolvimento sociocultural. 
 
Portanto, Durkheim considera o crime normal a todas as sociedades, apesar de 
continuar sendo repugnante, sendo que no delito há até um aspecto positivo, qual seja: a sua 
capacidade de desengessar a sociedade, de forma a realizar novas transformações sociais e 
culturais. 
 
2.2.5.2 Visão de Robert Merton e a teoria da criminalidade 
 
 Robert Merton converte a “Teoria da Anomia” em “Teoria da Criminalidade”, isso a fim 
de explicar de forma geral o comportamento do desviado. 
 
38 
 
 
 Para Robert Merton, este integrante da Sociologia norte-americana, a “anomia” não é 
somente fundada na razão entre a crise ou o enfraquecimento da pauta de valores, de normas, 
pelo fato do desenvolvimento econômico em velocidade alta e acelerada do meio social, mas, 
sobretudo, algo anterior a essa concepção. 
 
A anomia é vista como o “vazio” que é produzido quando os meios socioculturais 
existentes não suprem expectativas culturais de determinada sociedade. 
 
Luiz Flávio Gomes e Antonio García-Pablos de Molina (2012, p. 304) trazem então o 
argumento final, que consagra a teoria da anomia reelaborada por Merton: 
 
A teoria da “anomia” de Durkheim (delineada especialmente em sua obra El suicídio) 
seria assumida e reelaborada pela Sociologia norte-americana. Em primeiro lugar, por 
R. Merton, que a converte em teoria da criminalidade, para dar explicação geral do 
comportamento desviado. Para o referido autor, “anomia” não é só 
“desmoronamento” ou “crise” de alguns valores ou normas em razão de determinadas 
circunstâncias sociais (o desenvolvimento econômico avassalador, o processo 
industrializador com todas as suas implicações), senão, antes de tudo, o sintoma ou 
expressão do vazio que se produz quando os meios socioestruturais existentes não 
servem para satisfazer as expectativas culturais de uma sociedade. Conforme o próprio 
Merton, a “conduta irregular pode ser considerada sociologicamente como o sintoma 
da discordância entre as expectativas culturais preexistentes e os caminhos ou vias 
oferecidas pela estrutura social para satisfação daquelas”. 
 
A reflexão de Merton acima retrata o estabelecimento, pelas instâncias de controle, de 
metas culturais, estas que somente podem ser alcançáveis pelos indivíduos que compõem tal 
sociedade pelos meios legítimos, legais, sob pena de sofrer as sanções por escolher o 
cumprimento por atos tidos como desviantes. 
 
Dessa forma, com a não acessibilidade de todos

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