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1 Licenciatura em Letras Língua Portuguesa modalidade a distância Disciplina Sociolinguística Licenciatura em Letras Língua Portuguesa modalidade a distância2 MATERIAL DIDÁTICO ELABORAÇÃO DO CONTEÚDO Abdelhak Razky Marilucia Barros de Oliveira REVISÃO Abdelhak Razky Marilucia Barros de Oliveira COORDENAÇÃO DE EDIÇÃO Maria Cristina Ataide Lobato CAPA, PROJETO GRÁFICO E EDITORAÇÃO ELETRÔNICA Ana Petruccelli Káyra Matos Badarane IMPRESSÃO Grá� ca Universitária - UFPA 2a. edição 2014 Dados Internacionais de Catalogação na publicação (CIP) – Biblioteca do ILC/ UFPA, Belém – PA Fairchild, � omas Massao. Ensino-Aprendizagem da Língua Portuguesa I/ � omas Massao Fairchild. – Belém: EditAedi, 2014. v.12. Textos didáticos do Curso de Licenciatura em Letras – Habilitação em Língua Portuguesa – Modalidade a Distância. ISBN: 1. Ensino-Aprendizagem. 2. Língua Portuguesa. 3. Linguística. I. � omas Massao Fairchild. II. Título. 3 Licenciatura em Letras Língua Portuguesa modalidade a distância Belém-Pa 2014 volume 13 Disciplina Sociolinguística Abdelhak Razky Marilucia Barros de Oliveira Licenciatura em Letras Língua Portuguesa modalidade a distância4 MINISTRO DA EDUCAÇÃO Aloizio Mercadante Oliva SECRETÁRIO EXECUTIVO DO MEC José Henrique Paim Fernandes DIRETOR DA UNIVERSIDADE ABERTA DO BRASIL João Carlos Teatini de Souza Clímaco REITOR DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ Carlos Edilson de Almeida Maneschy VICE-REITOR Horácio Schneider PRÓ-REITORA DE ENSINO DE GRADUAÇÃO (UFPA) Marlene Rodrigues Medeiros Freitas ASSESSOR ESPECIAL DE EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA (AEDI) José Miguel Martins Veloso DIRETOR DO INSTITUTO DE LETRAS E COMUNICAÇÃO (ILC) Otacílio Amaral Filho DIRETOR DA FACULDADE DE LETRAS (FALE) Elizabeth Ferreira Vasconcelos de Andrade COORDENADORA DO CURSO DE LICENCIATURA EM LETRAS HABILITAÇÃO EM LÍNGUA PORTUGUESA – MODALIDADE A DISTÂNCIA Maria de Fátima do Nascimento 5 Licenciatura em Letras Língua Portuguesa modalidade a distância SUMÁRIO Unidade 1 – Relação entre Língua e Sociedade ..... 13 Atividade 1 – Diversidade e diversidade linguística no Brasil ..... 15 Atividade 2 – Um breve histórico do tratamento dado à variação e à mudança linguística ..... 23 Unidade 2 – Teoria da Variação ..... 31 Atividade 3 – Teoria da Variação: de� nindo termos ..... 33 Atividade 4 – Aspectos teórico-metodológicos da Teoria da Variação ..... 45 Unidade 3 – A Pesquisa Variacionista no Português Brasileiro (PB) ..... 55 Atividade 5 – Exempli� cando a variação no Português Brasileiro ..... 57 Atividade 6 – Procedimentos da Pesquisa Variacionista ..... 67 Unidade 4 – Variação Linguística e Ensino de Língua Portuguesa ..... 75 Atividade 7 – Dialetologia e Sociolinguística como ferramentas para a Formação de Docentes ..... 77 Licenciatura em Letras Língua Portuguesa modalidade a distância6 7 Licenciatura em Letras Língua Portuguesa modalidade a distância APRESENTAÇÃO Caros alunos, A disciplina Sociolinguística está voltada ao estudo da variação e mudança lin- guísticas e se destina a formar professores para identi� car, descrever, reconhecer e re� e- tir sobre fenômenos variacionistas. Mas além desse objetivo de natureza investigativa, a disciplina tem como meta, como deveria ser num curso de licenciatura, levar vocês, futuros professores de língua materna, a re� etirem sobre a postura que se deve adotar diante desses fenômenos – e que se deve incentivar os alunos a adotarem – valorizando as diferentes identidades, aqui entendidas como conjunto de diferenças e peculiaridades dos indivíduos e dos agrupamentos de indivíduos. Iniciaremos essa disciplina com a leitura de um texto que aborda praticamente tudo o que iremos tratar durante o curso, mas de forma bem sucinta. Na verdade, o texto só tangencia pontos que serão explicitados, discutidos, nas sete Atividades que iremos estudar. Desejamos que esse texto fomente em cada um de vocês maior “amplitude do olhar”, no sentido de lhes possibilitar enxergar aspectos de língua e de linguagem vincu- lados ao “uso”, à manifestação efetiva desses em contextos socioculturais diferenciados. É com esse “olhar” diferenciado, cada vez mais próximo dos usos efetivos de lin- guagem, e, concomitantemente, mais distanciado de preconceitos, que pretendemos tratar a variação linguística, objeto dessa disciplina. Na primeira unidade, estudaremos a relação entre língua e sociedade, focalizando a diferença e a identidade. Na segunda, abordaremos a teoria da variação, apresentando conceitos e de� nições úteis à compreensão do suporte teórico-metodológico da Sociolin- guística Variacionista. Iniciaremos as orientações para a realização de pesquisa de campo, a � m de que sejam identi� cados e descritos fenômenos variacionistas. Na terceira unidade, apresentaremos diferentes resultados oriundos de realização de pesquisa variacionista no Brasil. Na quarta unidade, concluindo nossos estudos, a discussão será em torno da Dialetologia e Sociolinguística na perspectiva do ensino-aprendizagem. Focalizaremos como essas duas disciplinas podem trazer contribuições para a formação do professor e para o conhecimento da realidade linguística com a qual ele se depara diariamente. Licenciatura em Letras Língua Portuguesa modalidade a distância8 Agora, para que você possa iniciar os estudos e discussões sobre esses temas, cabe se perguntar: como eu devo me portar diante de um aluno quando esse diz [kã´nu] em vez de [kã´no] ? Ou [ſ´na], em vez de [ſ´naw]? E o que fazer quando os alunos riem dessas pronúncias? Talvez, neste momento, você ainda não tenha segurança em relação à maneira mais adequada de se portar diante dessas situações, principalmente na condição de professor de língua portuguesa, já que as pessoas exigem que esse pro� ssional use e ensine o português dito correto, mas, com certeza, ao � nal da disciplina, você vai poder responder de forma habilitada essas questões. 9 Licenciatura em Letras Língua Portuguesa modalidade a distância objetivos objetivo geral Propiciar o conhecimento de teorias e modelos variacionistas no sentido de de- senvolver competências relativas à análise de fenômenos variacionistas e a re� exão so- bre a postura do professor diante de variação linguística no ensino-aprendizagem de língua materna. objetivos específicos • Conhecer teorias e modelos variacionistas; • utilizar adequadamente os procedimentos investigativos relativos ao estudo da variação e da mudança linguística; • conhecer diferentes modelos de análise da variação linguística; • distinguir variação de mudança linguística; • organizar dados coletados de acordo com a orientação sociolinguística; • reconhecer frequências e probabilidades de fenômenos variacionistas; • identifi car e descrever fenômenos de variação linguística encontrados na vida cotidiana e refl etir sobre suas implicações no ensino de língua portuguesa; • distinguir erro de variação linguística; • refl etir sobre o preconceito linguístico. procedimentos metodológicos A disciplina Sociolinguística apresenta carga horária de 68 horas. Será desenvol- vida na modalidade a distância, com encontros presenciais nos � ns de semana. O curso atenderá alunos de diferentes pólos. Os trabalhos serão orientados pelo professor-coor- denador da disciplina e por tutores presenciais e a distância. A concepção pedagógica do curso pauta-se no conhecimento dos modelos de aná- lise da variação linguística e na re� exão sobre seu impacto no ensino-aprendizagem de língua materna, dando-se especial relevo à postura de respeito às diferenças. Sendo as- sim, privilegiaremos atividades que impliquem re� exão e interação dos alunos não só com os tutores, com o professor, mas com o próprio material didático que visa ao acesso à informação e à produção de conhecimentos. Durante a leitura deste texto-base você encontrará alguns itens sobre os quais deve se ater. São eles: dicas, saiba mais, para refletir, resumindo,exercitando, anote. Eles podem auxiliá-lo a avançar na compreensão do texto, propiciando melhor entendimento do conteúdo tratado. Licenciatura em Letras Língua Portuguesa modalidade a distância10 Durante o curso serão desenvolvidas as seguintes atividades: • leitura do texto-base; • leitura de textos teóricos e de descrição sociolinguística; • estudo e análise de fenômenos variacionistas a partir de discussão de textos escritos e/ou de vídeos; • apresentação de pontos de vista no fórum; • postagem de atividades que correspondam às “tarefas”; • resolução de exercícios; • pesquisa de campo; • apresentação de seminários. programa avaliação A avaliação será realizada com base nos seguintes critérios: • relevância da contribuição nas postagens do fórum, inclusive em relação aos questionamentos dos colegas; • relevância da contribuição nos encontros presenciais, inclusive em relação aos questionamentos dos colegas; Etapas CH Data Unidade I - relação entre língua e sociedade Atividade 01: Diversidade e diversidade linguística no Brasil Atividade 02: Um breve histórico do tratamento dado à variação e à mudança linguística. 15h Unidade II- teoria da variação Atividade 03: Teoria e Variação: de� nindo termos Atividade 04: Aspectos teórico-metodológicos da Teoria da Variação. 20h Unidade III: a pesquisa variacionista no português brasileiro Atividade 05: Exempli� cando a variação no Português Brasileiro. Atividade 06: Procedimentos da Pesquisa Variacionista. 20h Unidade IV: variação linguística e ensino de língua portuguesa Atividade 07: Dialetologia e Sociolinguística como ferramentas para a Formação de Docentes. 13h 11 Licenciatura em Letras Língua Portuguesa modalidade a distância • resolução e entrega das atividades no prazo estipulado; • qualidade da produção escrita quanto à pertinência em relação à adequação da linguagem e à refl exão sobre o conteúdo tratado; • adequação dos registros dos dados coletados; • apresentação de seminário. É importante lembrar que a frequência do aluno será avaliada a partir da parti- cipação no fórum e das informações fornecidas pelos tutores nos encontros presenciais. Não é demais chamar a atenção para a importância de seu envolvimento na disciplina, demonstrado por meio de perguntas, re� exões, discussões desenvolvidas tanto presen- cialmente quanto via Plataforma Moodle. Licenciatura em Letras Língua Portuguesa modalidade a distância12 13 Unidade 1 Relação entre Língua e Sociedade RELAÇÃO ENTRE LÍNGUA E SOCIEDADE u n i d a d e 1 Licenciatura em Letras Língua Portuguesa modalidade a distância14 15 Unidade 1 Relação entre Língua e Sociedade a t i v i d a d e 1 DIVERSIDADE E DIVERSIDADE LINGUÍSTICA NO BRASIL Licenciatura em Letras Língua Portuguesa modalidade a distância16 objetivos Ao � nal desta atividade, você deverá: - compreender a relação entre língua e sociedade; - identifi car fenômenos de variação linguística; - discutir conceitos de diferença e identidade; - refl etir sobre a postura de cada um da turma diante de fenômenos de variação linguística; - apontar possíveis fatores condicionadores da variação linguística. A variação linguística não é um fenômeno recente nas línguas. Antes mesmo de se propor o estudo sistemático da variação, ela acontecia abundantemente em vários momentos da história, em diferentes línguas. Os estudos sobre o fenômeno con� rmam que a variação é inerente a todas as línguas. A relação entre língua e sociedade tem sido tema de vários estudos na atualidade, mas nem sempre foi assim. Quando se iniciaram os estudos sobre a língua ou sobre a linguagem, não se deu espaço adequado à in� uência de fatores sociais sobre essas “ações” humanas. Atribuía-se a outros condicionadores a variação ou a mudança linguística. Na verdade, a variação teve espaço nos estudos da linguagem bem depois do estudo sobre a mudança linguística. Entretanto, cabe dizer que o estudo sobre a mudança linguística praticado há sé- culos não era o mesmo praticado pela sociolinguística variacionista, corrente que vamos estudar mais detalhadamente aqui. Essa corrente pressupõe que os condicionadores so- ciais sejam levados em consideração quando do estudo da língua, pois para seus adeptos é clara a relação entre língua e sociedade. Por isso, no sentido de esclarecer os diferentes aspectos destacados no estudo da variação e da mudança linguísticas, vamos fazer um breve histórico sobre os diferentes estudos a respeito da variação linguística, a � m de que você perceba as diferenças entre as abordagens. Em seguida, trataremos do estudo sociolinguístico que prevê o estudo da língua em contexto social, já que concebe que as forças sociais condicionam, assim como os fatores estruturais, a variação nas línguas. Mas antes de fazermos todo esse trajeto que corresponde à próxima Atividade, va- mos desenvolver algumas práticas relativas à Atividade 01 que tratam do tema Diversidade e diversidade linguística. Essa Atividade apresenta um caráter diferente das demais. Isso porque é você quem vai desenvolvê-la. Quem sabe, escrevê-la. Essa Unidade vai iniciar 17 Unidade 1 Relação entre Língua e Sociedade com sua perspectiva sobre o conceito de diferença e identidade, e diversidade linguística (cf. vídeos e fotos para discutir diferença e identidade). Ao � nal da disciplina, retomaremos essa discussão inicial no sentido de saber se você alteraria ou ampliaria, ou mesmo manteria, as impressões apresentadas nesse primeiro momento. Para falarmos da relação entre língua e sociedade, precisamos entender que além da língua, outros hábitos, modos, maneira de vestir, costumes estão ligados à interferência de fatores sociais. É importante que você saiba que os valores, assim como as diferenças que existem numa língua, não levam em consideração exatamente fatores linguísticos, mas sociais. É por isso que a língua ou variedade linguística de uma classe econômica favorecida na sociedade é considerada “boa” ou “correta”. Não é difícil entender como essa “valoração” se dá. Basta que observemos outros fenômenos como os relativos à moda, por exemplo. Em termos gerais, o “valor” atribuído à roupa, ao acessório, ao tipo de cabelo, ao feitio do calçado etc. – como “elegantes”, “atuais”, “bonitos” – também provêm de um grupo privilegiado economicamente. A língua é, como os demais fenômenos sociais, impregnada de “valor social”, fruto de “jogos de poder”. Aspectos relacionados à diversidade e diversidade linguística, bem como à diferença e à identidade serão discutidos durante o curso. Antes, no entanto, de continuar lendo este texto base, convidamos você a fazer a leitura do texto “Fale que te direi quem és”, disponível, também, na Plataforma Modlle. A partir dessa leitura, você poderá despertar para questões que vão enriquecer nosso estudo e discussão. Use o conhecimento de mundo de que dispõe para avaliar cuidadosamente o texto. Re� ita, faça comentários, indique que outros aspectos você considera relevantes no texto e que vale a pena discutir, identi� que intertextualidades; faça relações com outros textos e discursos. Vamos à leitura? Fale que te direi quem és! Josué Machado publicou instigante artigo sobre a in� uência "nefasta" que os tropeços gramaticais do novo presidente da República, Luís Inácio Lula da Silva, são suscetíveis de ter nas salas de aula do país – "Lula e a língua do povo" [educação, São Paulo, 3.2003] Os "escorregões" de Lula da Silva no exercício do português padrão – seus "menas", "percas", "acho de que"; a avidez com que "devora os 's' do plural" etc. – constituem um pretexto para o autor debater a variedade linguística com a qual a escola deveria operar. No Brasil, nos últimos tempos, a variação linguística na escola tem sido objeto de complexos debates linguístico-pedagógicos, ensejando profunda insegurança sobretudo entre os professores e futuros professores que atuam em escolas populares. Licenciatura em LetrasLíngua Portuguesa modalidade a distância18 Há alguns anos, para a grande maioria dos professores de português, essa questão não existia, predominando a visão de que a principal função da escola era enquadrar os alunos à variedade culta da língua nacional. Com esse pressuposto inquestionável, professores bem intencionados con- fundiam comumente a educação com a caça às formas sintáticas, lexicais e fonéticas desviantes, transformando as aulas de português em ensino da gramática normativa. A grande função do professor era corrigir o "português errado". A ciência ajuda Novas investigações sobre os fenômenos psico e sócio-linguísticos, a psi- cogênese da escrita e os processos de aprendizagem, etc. determinaram mudanças profundas na visão do que deve ser a prática de professores de português nos diversos níveis de escolaridade. No citado artigo, Josué Machado alude negativamente ao que considera uma "sobrecarga de informações teóricas e nomenclaturas linguísticescas" que resultariam "num formidável caos teórico, capaz de confundir o professor comum". Para ele, dentre as teorias linguísticas, apenas a desenvolvida por Noam Chomsky contribuiria realmente a uma maior e� ciência escolar. Para essa última, todo "falante sabe instintivamente sua língua e só precisa ser ajudado a desenvolver- -se nela por meio de prática e de exercícios agradáveis". As grandes questões postas pelo artigo, a exclusividade dada pela escola à variedade culta do português e a discriminação das formas linguísticas populares, não envolvem apenas os processos de aprendizagem da sintaxe estudados por Chomsky. Também englobam múltiplos outros componentes de ordem linguística, sociológica, histórica, pedagógica, etc. Língua para uso De um ponto de vista psicolinguístico, Josué Machado tem razão. Foi essencial o reconhecimento que todo ser social possui competência linguístico- -comunicativa e gramática intuitiva, interior, mesmo sem jamais ter frequentado a escola. Por si só, esse reconhecimento põe � m à ideia que a escola deve "ensinar" a língua materna. Mas, contrariamente à opinião do autor, a Linguística pode e deve contri- buir muito mais à prática dos professores de português. Sobretudo, deve ensejar a compreensão de que a língua constitui um instrumento de comunicação destinado a cobrir uma grande diversidade de necessidades humanas – comunicação racional, afetiva, argumentativa, informativa, etc. Essa compreensão permitirá que o professor de português não caia na tentação de transformar as aulas de expressão linguística em lições de ortogra� a, de gramática normativa ou, o que é pior, de nomenclatura linguística e enfatize, ao contrário, o desenvolvimento da competência textual dos alunos, para o maior número possível de necessidades comunicativas e discursivas. Os avanços alcançados nos estudos de Linguística Social podem igualmente contribuir – e já contribuem em larga medida – para a resolução da questão da 19 Unidade 1 Relação entre Língua e Sociedade variação linguística na sala de aula. Apesar da tendência da escola e da sociedade de apresentarem a língua como organismo monolítico e natural, ela é uma construção social e histórica, com vínculos essenciais com a formação social de seus locutores. O essencial e o acessório O fato que as divisões e con� itos de toda ordem – socioeconômicos, socio- culturais, de gerações, de gênero, etc. – materializam-se e manifestam-se plenamente na língua, de forma explícita ou implícita, comprova o seu caráter social e histórico. É também preciso enfatizar que todos os elementos que compõem a estru- tura das línguas, fazendo delas e� cientes instrumentos de comunicação social, não têm a mesma importância. Alguns de seus componentes, como os fonemas, têm papel secundário nos processos de signi� cação, essência da linguagem e das línguas naturais nas quais se manifesta. O mesmo pode ser dito das unidades de nível imediatamente superior, os morfemas, cuja função é indicar modi� cações de número, de gênero, de pessoa ou diferenciar palavras pertencentes a categorias gramaticais diversas – um verbo de um substantivo, por exemplo. É através de unidades maiores – os enunciados e as palavras que os compõem – que se dá a signi� cação dos intercâmbios verbais. Portanto, compreende-se que as manifestações mais visíveis da variação linguística apareçam precisamente nos fonemas e morfemas, elementos da língua que interferem menos nos processos de construção do sentido, não interferindo, assim, no processo de intercompreensão. Onde se xa o estigma Não atrapalha a comunicação a confusão entre a lateral [l] e a vibrante [r] em palavras como garfo – galfo; solvente - sorvente; voltar – vortar; etc. Não difi culta o entendimento a substituição da fricativa [v] pela oclusiva [b] em vassoura – bas- sora. O mesmo pode ser dito da troca do morfema de primeira pessoa do plural no presente e passado dos verbos de primeira conjugação: amos – emo, etc. A repressão, discriminação e correção sistemáticas dessas variantes justi� - cam-se apenas do ponto de vista – estético – da variante dominante, e não a partir de critérios linguístico-comunicativos. Portanto, não são práticas necessárias nem, o que é mais grave, inocentes e sem consequências. Em teoria, qualquer criança, locutora de uma variedade de português não padrão, é perfeitamente capaz de aprender as variantes fonológicas e morfológicas padrão, como aprenderia uma língua estrangeira, próxima de sua língua-mãe. O problema está no enaltecimento das variantes cultas pela escola, atribuin- do-lhes uma natureza que não possuem: comunicar melhor do que as variantes não padrão; possuir valores estéticos, identitários e patrióticos, etc. superiores – como se a troca do [lh] de "� lho" por um [i] diminuísse a brasilidade do locutor. O consenso em relação à necessidade para a escola de eleger como língua de ensino apenas a variedade linguística praticada sobretudo pelas camadas econô- mica, política e culturalmente dominantes, é também alimentado por julgamentos preconceituosos e depreciativos emitidos por indivíduos que gozam de prestígio social, muitas vezes desprovidos de más intenções. Licenciatura em Letras Língua Portuguesa modalidade a distância20 O papel da escola Ao estigmatizar variantes linguísticas não prejudiciais à comunicação, valorizadas e utilizadas majoritariamente por comunidades populares, a escola enseja di� culdades de aprendizagem e contribui para a perda da auto-estima e a insegurança linguística dos alunos. A repressão linguística é igualmente caminho para a repressão social e cidadã. Ela contribui para a reprodução das desigualdades sociais. Um locutor que é levado a desprezar o falar seu e de sua comunidade, tende a desprezar-se e a sua comunidade. A essência da linguagem verbal não está nos elementos fônicos e mór� cos, mas na possibilidade de construção do sentido, realizada sobretudo através da palavra, do enunciado, do texto, do discurso, elementos também embutidos das concepções de mundo dos locutores. Ao defender a legitimidade e superioridade da variedade linguística padrão e rejeitar a prática de um "multilinguismo nacional", muitos professores, em geral desconhecedores das consequências de suas práticas, contribuem para o estabele- cimento da hegemonia das visões de mundo das elites, participando aos processos de uni� cação e uniformização ideológica, política e cultural da sociedade. A prática do xibolete Não se trata de deixar simplesmente os alunos das classes populares utili- zarem suas variedades linguísticas, sem introduzi-los ao uso da chamada norma culta. A função da escola é sobretudo ajudar a criança a compreender a realidade material, social e espiritual, com suas contradições e sua variedade, para que possa atingir sua emancipação individual e coletiva. Com sua diversidade e suas potencialidades, a língua faz parte da realidade social, construída pelos seres humanos para os seres humanos. Oensino da língua materna deve sobretudo ensejar que as crianças compreendam a estrutura, o fun- cionamento, as funções da língua – instrumento de comunicação –, com todas as suas variedades, sociais, regionais e situacionais. A escola deve ser espaço emancipatório. Portanto, não pode utilizar-se de práticas de dominação. Para não fortalecer interpretações apologéticas sobre a língua e perpetuar a discriminação social, deve mostrar que todo preconceito linguístico apoia-se num preconceito social. No Antigo Testamento, o livro dos Juízes relata um episódio da história de duas tribos de Israel, os guileaditas e os efraditas, que praticavam línguas muito próximas. Em ocasião de uma guerra, para impedir que seus então inimigos, os efraditas, atravessassem o rio Jordão, os guileaditas os obrigavam a pronunciarem a palavra "Xibolet" ('espiga'). Incapazes de expressar-se com perfeição no padrão superior da língua de Guilead, os efraditas diziam 'Sibolet', pois tinham uma fricativa sibilante [s] no lugar da fricativa chiada [ch]. Devido a essa variante fonética, "morreram quarenta e dois mil dos de Efraim" [Bíblia sagrada. Lisboa: Sociedade Bíblica de Portugal, 2001: p. 262]. No Brasil de hoje, simples variantes fonéticas servem também para justi� car 21 Unidade 1 Relação entre Língua e Sociedade a discriminação social, e portanto, a dominação política e econômica, pelas elites, da imensa maioria das classes trabalhadoras. Por florence carboni Ítalo-belga, é doutora em Liguística pela Université Catholique de Louvain, Bélgica, e professora do Curso de Letras da UPF, RS, Brasil. Disponível em: http://www.espacoacademico.com.br/023/23ccarboni.htm PARA REFLETIR • Você concorda com o ponto de vista defendido no texto “Fale que te direi quem és”? Por quê? • O que você entende por prática do xibolete? • Qual a sua avaliação sobre os escorregões que o Presidente Lula apresentou em alguns discursos? • Você acha que o modo de falar do Presidente o envergonha, afeta sua credibi- lidade ou lhe subtrai respeito? • Você ri quando uma pessoa usa uma variante linguística diferente da sua? Em caso positivo, por que o faz? Considera isso preconceito? Essas questões não esgotam as possibilidades de re� exão sobre o texto. Pense em outras questões que poderiam ser exploradas e as apresente à turma para discussão. Fizemos a leitura e discussão do texto “Fale que te direi quem és”? Agora, passe- mos ao vídeo sobre a diversidade linguística no Paraná. Depois da assistência, poste suas impressões e opiniões no fórum. bibliografia básica tarallo, Fernando. Tempos Linguísticos: Itinerário histórico da língua portuguesa. 2 ed., São Paulo: Editora: Ática, 1994. labov, William. On the use of the present to explain the pas. In: L. Heilmann (ed.). Proceedings of the 11th International Congress of Linguistic, Bologna: II Mulino, 1982. labov, William . Sociolinguistique. Paris: Édition de Minuit.1976. complementar aguilera, Vanderci. Atlas Linguístico do Paraná. Universidade Federal do Paraná, 1994. camara jr., j. Matoso. Dicionário de Linguística e Gramática: referente à língua portuguesa. 13 ed., Petrópolis: Vozes, 1996. hora, Dermeval. (Org.) Diversidade Linguística no Brasil. João Pessoa: Ideia, 1997. p. 131-140. Licenciatura em Letras Língua Portuguesa modalidade a distância22 resumo da atividade 1 Nesta Atividade, iniciamos o estudo da relação entre língua e sociedade. Apresentamos um conjunto de materiais que focalizam a diversidade e a diversidade linguística. Vimos que as pessoas não falam de forma uniforme e que as diferenças encontradas nos diferen- tes falares do Brasil estão diretamente ligadas à relação que há entre língua e sociedade. Concluímos que as diferenças estão relacionadas à identidade e que a maneira como as pessoas falam identi� cam-nas como pertencentes a determinados grupos. Isso revela também que a diversidade linguística é uma forma de identi� car não apenas o indivíduo que fala, mas o grupo que esse indivíduo representa quando fala. 23 Unidade 1 Relação entre Língua e Sociedade UM BREVE HISTÓRICO DO TRATAMENTO DADO À VARIAÇÃO E À MUDANÇA LINGUÍSTICA a t i v i d a d e 2 Licenciatura em Letras Língua Portuguesa modalidade a distância24 objetivos Ao � nal desta atividade, você deverá: - compreender as diferentes abordagens dadas ao estudo da variação e da mudança linguísticas; - apontar as diferenças entre as diferentes abordagens da variação e da mudança lin- guísticas; - apontar pontos fortes e fracos das diferentes abordagens dadas à variação e à mudança linguísticas. Como dissemos anteriormente, a mudança linguística não se constitui objeto recente de investigação. Há muito, diversos estudiosos da língua se interessaram em es- tudar esse fenômeno utilizando-se de olhares diferentes sobre a língua com a � nalidade de saber o que causava a mudança. Entretanto, a pergunta direta Por que mudam as línguas? – de resposta fácil, poder-se-ia pensar – é, na verdade, uma pergunta que exige, como diz Katz (1982), ao discutir o que é signi� cado, não uma resposta direta, simples, mas uma teoria a respeito da variação e da mudança linguísticas. ANOTE na Unidade ii, estudaremos detalhadamente os pressupostos teóricos metodológicos da Teoria da Variação. Esse empreendimento teve como precursor, na década de 60, William Labov (cf. calvet, 2002). Entretanto, muitos outros autores que escreveram antes de Labov (1966) levantaram questões pertinentes que ajudam a re� etir sobre esse fenômeno linguístico e a relação entre língua e sociedade. Antes, vamos ver como outros abordaram o estudo da variação e da mudança linguísticas. método histórico-comparativo Conforme foi dito anteriormente, foram diversas as perspectivas adotadas para o estudo da mudança linguística. Os primeiros investimentos nesse estudo tinham como objetivo saber como uma dada língua se desdobrava em outras línguas, os fenômenos comuns às línguas no sentido de se conhecer os motivos que faziam com que as línguas variassem. Assim, a evolução e a mudança das línguas, nos termos dos estudos históricos, foram durante muito tempo objeto de estudo dos historiadores das línguas. Nesse período, 25 Unidade 1 Relação entre Língua e Sociedade priorizou-se o estudo diacrônico – ou a descrição de uma língua ao longo de sua história, especi� cando-se as mudanças que sofreu – cujos seguidores se voltavam sobre dados de línguas antigas. Esses historiadores comparavam dados, a � m de reconstruir a língua-mãe. a posição neogramática No século xviii, a teoria de Darwin veio trazer status cientí� co ao estudo da mudança linguística. Para os adeptos dessa perspectiva, “as línguas não evoluíam pela aplicação aleatória das regras; mudavam em virtude da ‘lei da selva’; no fi nal de cada mudança triunfava a con� guração linguística que fosse mais apta e natural” (marqui- lhas, 1996, p. 566). Trata-se das regularidades fonéticas. Assim, surgem, na Alemanha, as leis fonéticas paralelas às ciências naturais. Os neogramáticos acreditavam que essas leis não apresentavam exceção. Ora, não se podia admiti-las sob pena de que a língua se constituísse um objeto que não poderia ser estudado cienti� camente. Na perspectiva dos neogramáticos, as mudanças deveriam ser explicadas levando-se em consideração o aspecto � siológico e o psicológico. Para eles, a mudança sonora era mecânica e não admitia exceções. Porém, a analogia poderia se constituir a causa da mu- dança; a tendência a associações realizadas pelas pessoas seria responsável pelas exceções. A analogia, grosso modo, seria um processo no qual as formas modi� cadas ou criadas tinham como base padrões preexistentes no sistema. Assim, constituía-se um processo gramatical, mas não fonológico, pois o princípio da regularidade fonológica não admitia exceções. Por outro lado, a mudança poderia ser re� exo de desvios constantes, quando da articulação de um som. Muito timidamente, esses estudiosos tambémlançaram mão do contato entre línguas para explicar algumas exceções. Os neogramáticos levaram às últimas consequências a defesa à analogia, utilizando-a abusivamente para explicar as exceções, o que lhes rendeu muitas críticas. abordagem estruturalista Segundo os estruturalistas, a mudança é necessária. Para eles, a mudança na ma- téria fônica não altera a oposição das unidades distintivas, o que não se constitui de todo verdade, pois é sabido que algumas formas sofrem transformações e usos que alteram, inclusive, seu signi� cado. O desequilíbrio é visto como causa da mudança e essa como busca do equilíbrio. Essa oscilação no sistema, por sua vez, não deveria ser atribuída a condicionamentos de ordem social. Estruturalistas como Bloom� eld (1933), Hjelmeslev (1971) e Chomsky (1965), por exemplo, diferenciavam-se em relação às descrições que propunham para a estrutura Licenciatura em Letras Língua Portuguesa modalidade a distância26 linguística, mas eram unânimes no que se referia a conceber seu objeto de estudo como uma estrutura abstrata. Para os estruturalistas, a interpretação linguística tinha de se pautar sobre relações internas, fatores estruturais internos. Isso exclui o estudo do comportamento social, em outras palavras, o estudo da fala. Hjelmeslev (1971, p. 30-31) assinalava que a preocupação da linguística estrutural devia ser pautada nas relações internas da língua: La linguistique structurale étudie le langage pour en dégager la partie essentielle, qui est, selon l’ hypothèse, une entité autonome de dependences internes (...) La linguistique structurale n’approche pas du langage du dehors, mas du dedans. Elle y reste, tout en tenant compte de ses rapports extérieurs. ANOTE Isso não signi� ca dizer que a linguística estrutural não teve seu lugar dentro da linguística variacionista, pois Labov (1976) recorre à linguística estruturalista de Praga e, posteriormente, à Gramática Gerativa, quando de suas descrições linguísticas. geografia linguística e difusão lexical A visão da Geogra� a Linguística opunha-se ao pressuposto neogramático de que as leis fonéticas não apresentam exceções, assim como ao seu caráter gradual. Enquanto os neogramáticos defendiam o pressuposto de que a mudança fonológica era foneticamente gradual e lexicalmente abrupta, os defensores da difusão lexical, baseados na ideia de que cada palavra tem sua história, acreditavam que a mudança era lexicalmente gradual e foneticamente abrupta. Para eles, o fato de as palavras terem histórias diferentes justi� cava as irregularidades. Assim, um caso de irregularidade poderia ser explicado pela ocorrência de duas mudanças fonológicas regulares e não pela ação da analogia. Os estudos de Dialetologia, o� cialmente divulgados na França, a partir de Julles Guilliéron (1918), tiveram por objetivo identi� car as formas lexicais sobreviventes em cada dialeto. Nessas formas encontraram-se motivos para se acreditar que não só as regularidades fonéticas eram responsáveis pela coexistência de algumas formas num mesmo dialeto, mas que essa coexistência poderia estar ligada a fatores de ordem social. Surge, anos depois, por volta da década de 60, a Sociolinguística, tendo como um dos precursores William Labov, para quem a mudança num determinado sistema linguístico resulta sempre de um período de variação no qual coexistiam formas que “lutavam entre si”. Como vimos, as diferentes abordagens da variação e da mudança linguísticas não admitiam a interferência de fatores externos, sociais, sobre esses fenômenos. Ou se 27 Unidade 1 Relação entre Língua e Sociedade admitiam, faziam-no muito timidamente. Não era considerada a relação entre língua e sociedade. Entretanto, com o advento dos estudos variacionistas, a abordagem do fenô- meno mudou, inclusive a natureza dos dados sobre os quais se pautava a análise, como veremos mais adiante. Agora que estudamos diferentes abordagens dadas ao estudo da variação e das mudanças linguísticas, passemos ao estudo mais detalhado da abordagem que considera, impreterivelmente, a relação entre o linguístico e o social. Iniciaremos, focalizando a complexidade que envolve esse estudo. mudança linguística e sua complexidade A mudança linguística, diga-se, foi desde muito tempo concebida como uma transgressão à forma considerada padrão. Marquilhas (1996) faz referência a um mito brahmana no qual se dizia que o povo usura era privado de linguagem correta, pois apre- sentava língua bárbara que não se devia imitar. Usavam as he lavo e he lavar, variantes das formas sânscritas consideradas padrão he rayo, he rayah, respectivamente. A mesma autora (op. cit.) atribui a Sócrates um enunciado em que a evolução dos sons é considerada como afastamento condenável da língua padrão. Esse olhar estigma- tizante sobre a língua pode ser encontrado mesmo em um dos nossos grandes � lólogos, a saber, Melo (1981), que avalia a variação linguística como própria dos incultos que descaracterizam a língua pura. Como se apenas esses fossem os responsáveis pela variação e pela mudança na língua. ANOTE estudos realizados no Brasil com falantes de língua culta revelam que esses usuários apresentam em sua fala muitas variações linguísticas. Não há quem use variações na língua. Mesmo o falante mais conhecedor da norma culta usa variantes ditas não cultas em seu falar. Muitos dos estudos realizados a partir das mudanças que ocorreram no latim ajudam a compreender melhor as regularidades fonológicas. Entretanto, há que se fazer referência a outros fatores que contribuem para que a mudança linguística aconteça, pois mesmo as mudanças mais regulares deixam espaço para as exceções. Nem sempre a con� guração que parece mais simples e natural é adotada pelos falantes de uma língua. De outra parte, parafraseando Labov (1976), não há nada que comprove que as formas estigmatizadas, as quais se opõem ao padrão culto, sejam mais fáceis de ser pronunciadas do que as formas consideradas de prestígio. Isso enfraquece a hipótese segundo a qual a variação e a mudança linguísticas estariam diretamente relacionadas ao menor esforço. Licenciatura em Letras Língua Portuguesa modalidade a distância28 A constante oscilação nos sistemas linguísticos e a mudança que neles se veri� ca levam a inferir que a língua não é homogênea. As mudanças fonológicas e fonéticas não são de todo regulares, o que convoca a interferência de outros fatores que justi� quem tais mudanças. Em alguns casos, há mudanças que se proliferam em uma determinada forma lexical, podendo-se estender a outras formas muito frequentes e, posteriormen- te, mesmo àquelas menos frequentes, afetando, depois de algum tempo, praticamente todas as formas lexicais nas quais se encontre contexto. Esse princípio foi formulado por Guilliéron (1918). Para ele, cada palavra tem uma história. Tudo isso aponta para a complexidade da mudança linguística. SAIBA MAIS para mais detalhes a respeito de estudos sobre língua culta, consulte Projeto nurc, http://www.� ch.usp.br/dlcv/nurc/index.html. sociolinguística variacionista Segundo Labov (1976), as irregularidades linguísticas devem ser estudadas levando- -se em conta as oscilações da estrutura social, dada a relação direta que há entre língua e sociedade. Esse tipo de procedimento já pode ser encontrado no trabalho desse autor, publicado em 1966. Trata-se de um estudo em que utilizou os dados de fala de lojas de departamento nova-iorquinas para descrever a estrati� cação social do (r), mostrando, por meio de dados retirados de situações concretas, a relação entre a estrutura linguís- tica e a estrutura social. Outro estudo que teve grande signi� cado para o fortalecimento da Sociolinguística foi Sociolinguistics Patterns, cuja primeira publicação aconteceu em 1972. A partir daí, foram inúmeros os trabalhos que levaram em consideração a estrutura interna e a externa no estudo da língua. Um dos pressupostos básicos da Sociolinguística é que toda variaçãoe mudança linguísticas são motivadas por fatores de natureza linguística e social. Não se pode, assim, atribuir uma dada variação só à in� uência de um ou de outro fator. Deve-se considerar a atuação concomitante de fatores internos e externos sobre a língua. DICA há alguns fenômenos cuja variação, inicialmente, parece estar diretamente ligada à estrutura interna, fato que poderá levar a que se pense que essa estrutura seria su� ciente para explicar a variação. Mas, como se verá adiante, há uma correlação de forças internas e externas que motivam e estruturam os diferentes processos de variação. Segundo Labov (1972), as forças internas e externas alternam sua pressão sobre os diferentes fenômenos de variação e de mudança linguísticas. 29 Unidade 1 Relação entre Língua e Sociedade Para Labov (1976), é apenas aparente a desorganização que resulta da variação linguística, pois as variações e mudanças na língua são sistemáticas, previsíveis e regulares. Para o autor (op. cit.), o tipo de convivência entre as diferentes variantes pode indicar em que sentido caminha a mudança, a partir da avaliação da probabilidade correspondente a diferentes grupos sociais. A renda � nanceira, o gênero, a idade são alguns dos indica- dores da direção da mudança linguística, do seu caráter estável ou de progressão. Labov (1976) apresenta duas possibilidades por meio das quais se pode medir o estágio de uma mudança. O autor propõe o estudo em tempo aparente e em tempo real. SAIBA MAIS para mais informações sobre pesquisa em tempo real e em tempo aparente, consulte texto disponível em http://www.vertentes.u� a.br/ a-teoria-da-variacao-linguistica A Sociolinguística guarda, sem dúvida, relação com a Gramática Histórica e com a Dialetologia, pois está interessada na mudança linguística. Cabe, entretanto, ressaltar que, como diz Wetzels (2002), ela não se interessa pelo produto da mudança, mas pelo próprio processo de variação, que pode resultar em mudança linguística. É possível, a partir dessa perspectiva, apontar as tendências, ou seja, a direção que segue a mudança linguística. Essa problemática amplamente discutida pelos sociolinguistas pode ser, ainda que timidamente, encontrada no trabalho de Sapir (1921). Esse autor explica que a mudança linguística pode caminhar em diferentes direções, mas obedece a uma deriva linguística, ou seja, a variação e a mudança em uma determinada língua não se dão aleatoriamente, mas seguem determinadas tendências. Essas, do ponto de vista sociolinguístico, são motivadas linguística e socialmente. Sapir (1921) não chega a tratar diretamente de fatores de ordem social, mas tan- gencia outro ponto importante que é a diversidade motivada pelo espaço geográ� co. Não se pode esquecer que o espaço é também um fator de ordem social, sendo, por sua vez, um condicionador social. A unidade e diversidade dentro de um determinado espaço geográ� co estão ligadas a relações sociais. Outro autor merece ser citado quando se trata de considerar a língua como fato social: Meillet (1921). Nas palavras de Calvet (2002), diferentemente de Sausssure (1921), que também a� rmava ser a língua um fato social, Meillet (op. cit.) considerava que se devia levar em consideração, quando do estudo linguístico, a parte externa dos fatos da língua. Entretanto, sua argumentação, ao defender esse ponto de vista em termos práticos, não foi muito convincente. Apesar de reconhecer que o estudo da linguagem deveria levar em consideração o contexto social, ateve seus estudos principalmente à investigação de línguas mortas para � ns de comparação. Isso o fez distanciar do pressuposto sociolinguístico que Licenciatura em Letras Língua Portuguesa modalidade a distância30 prevê o estudo da língua a partir de dados colhidos de situações concretas. Porém, sua discussão a respeito de se considerar o contexto social na abordagem linguística foi de suma importância para discussões posteriores da sociolinguística. Vamos parar por aqui, pois o detalhamento sobre a Teoria da Variação e sobre a Sociolinguística será realizado na Unidade ii. Antes, porém, precisamos entender o que é uma teoria. É por esse tema que iniciaremos a Atividade 03. bibliografia básica tarallo, Fernando. Tempos Linguísticos: Itinerário histórico da língua portuguesa. 2 ed., São Paulo: Editora: Ática, 1994. labov, William. Sociolinguistique. Paris: Édition de Minuit.1976. marquilhas, Rita. Mudança Linguística. In: Introdução à Linguística Geral e Portuguesa. farias, Isabel Hub et al. (Org.). Lisboa: Editora Caminho, 1996, p. 563-588. Série Linguística. complementar aragão, Maria do Socorro & menezes, Cleusa P. Bezerra. Atlas Linguístico da Paraíba: cartas léxicas e fonéticas. Brasília: ufpb/cnpq - Coordenação Editorial, 1985. labov, William . Principles of Linguistc Change. Oxford: Blackwell Publishers, 1994. labov, William. � e social strati� cation of English in New York city. Washington: Center of Applied Linguistics, 1966. resumo da atividade 2 Nesta Atividade, apresentamos um breve histórico do tratamento dado à variação e à mu- dança linguísticas. Estudamos a abordagem dada aos fenômenos pelo Método Histórico- -Comparativo, pelos Neogramáticos, pelo Estruturalismo, pela Geogra� a Linguística, pela Difusão Lexical e pela Sociolinguística Variacionista. Estudamos também a mudança lin- guística e sua complexidade, mostrando que o estudo desse fenômeno não é recente, mas antigo e muito complexo. Concluímos que a variação e a mudança não são concebidas de maneira uniforme. A depender da abordagem, elas são entendidas de forma diferente. No entanto, há de comum entre as diferentes abordagens apresentadas o fato de que o objeto da linguística sempre foi a estrutura interna da língua, excetuando-se a sociolinguística. 31 Unidade 2 Teoria da Variação TEORIA DA VARIAÇÃO u n i d a d e 2 Licenciatura em Letras Língua Portuguesa modalidade a distância32 33 Unidade 2 Teoria da Variação TEORIA E VARIAÇÃO: DEFININDO CONCEITOS a t i v i d a d e 3 Licenciatura em Letras Língua Portuguesa modalidade a distância34 objetivos Ao � nal desta unidade, você vai poder: - entender o conceito de teoria e da teoria linguística; - compreender o conceito de variação em geral e de variação na/da língua; - identifi car os mecanismos que regem a variação linguística; - compreender os métodos científi cos de uma descrição sociolinguística; - compreender como a Teoria da Variação reavaliou alguns princípios da teoria estruturalista e gerativista. teoria e variação: generalidades Antes de abordarmos a questão da teoria da variação, temos que estudar esses dois termos: “teoria” e “variação”. O que é teoria A palavra “teoria” signi� ca um número de coisas diferentes, dependendo do contex- to. Em matemática e ciências, por exemplo, uma teoria é um conceito usado para explicar um fato. Para estudantes das artes, “a teoria” refere-se ao aspecto não-prático do seu tra- balho, enquanto os leigos a tratam como ideias não comprovadas, frutos de especulação. As diferentes interpretações desta palavra podem levar a con� itos, mas o seu ob- jetivo é geralmente claro dentro de seu contexto. O termo “teoria” data de 1592 e foi usado para se referir a ideia de um conceito ou esquema. Na década de 1630, os cientistas usaram o termo para descrever uma explicação ou um pensamento baseado em observação e comprovação. O termo “teorizar” também emergiu nessa época. Nas artes, muitos se referem a um trabalho não-prático como um trabalho teórico. Por exemplo, um músico que toca a tuba (instrumento musical) consideraria o estudo da história da música, a matemática da música, e outros, como teoria. A crítica da arte é também um campo da teoria pelo fato de os críticos discutirem a obra de arte, em vez de produzi-la ativamente. Em decorrência das discussões na crítica da arte, compõe-se a teoria da arte. Para leigos, uma teoria é simplesmente uma ideia. Algumas pessoas usam “teoria”no sentido de “hipótese”, ou seja, uma ideia a ser testada. Em outros momentos, uma ideia pode ser descartada por constituir “somente uma teoria”, tomando-se “teoria” como algo que não pode ser comprovado, como uma “ideia vaga”, não um fato � rme ou uma opinião. 35 Unidade 2 Teoria da Variação ANOTE Num sentido geral, então, o termo “teoria” é uma explicação bem substanciada de algum aspecto do mundo natural; um sistema organizado do conhecimento que se aplica em várias circunstâncias para explicar fenômenos especí� cos. É importante destacar que toda teoria pode incorporar fatos, hipóteses e leis. Princípios, axiomas e leis O desenvolvimento de uma teoria baseia-se em proposições ou princípios. Existem dois tipos de princípios aqui: princípios teóricos, necessários ao desenvolvimento de um raciocínio dedutivo, e princípios de ação, essenciais à implementação de uma prática. Um princípio é uma primeira proposição sobre o que é ou o que fazer. É a regra inicial para uma descrição, uma explicação de uma lei ou norma. Se, por exemplo, tomarmos como base a linguística, podemos dizer que um dos seus princípios fundamentais pode ser formulado assim: toda língua humana tem uma gramática (fonética, sintaxe e semântica), única, diferente de qualquer outra lingua. Ou ao contrário: todas as línguas humanas são regidas pelas mesmas regras básicas. Ao considerar o primeiro desses princípios, o linguista descreve e analisa as parti- cularidades de uma língua ou línguas, estabelecendo, quando possível, comparações. Foi assim na linguística histórica ou na linguística puramente descritiva. Adotando o segundo princípio, o linguista procura descobrir operações universais em cada língua para mostrar como elas se manifestam. Nesse caso, estaríamos diante de uma linguística explicativa. O princípio não deixa de ser um tipo de hipótese a ser validada. Em algumas áre- as, como a matemática, prefere-se o termo axioma (veremos adiante alguns axiomas da sociolinguística). SAIBA MAIS para mais detalhes sobre o tema, consulte http://www.biblioconcept.com/textes/principe.htm. variação Antes de falarmos da Teoria da Variação em linguística, ou variação linguística, precisamos entender o conceito de variação e, em particular, as causas comuns e especiais da variação. A variação tem sua origem em causas comuns e especiais. Imagine quanto tempo você leva para chegar ao trabalho, pela manhã, de carro. Digamos que você leva 30 minutos Licenciatura em Letras Língua Portuguesa modalidade a distância36 em média. Às vezes, esse tempo pode ser mais longo ou mais curto. Mas enquanto você está dentro de certa variabilidade desse tempo, você não � ca preocupado, pois ela está praticamente dentro do esperado. Por exemplo, esse tempo pode variar entre 25 e 35 minutos para mais ou para menos. Essa variação é chamada de variação de causa comum. É a variação que está sempre presente no processo. Esse tipo da variação é consistente e previsível. Você não sabe quanto tempo leva até o trabalho, mas você sabe que estará entre 25 e 35 minutos enquanto o processo permanece o mesmo. Agora, suponha que o pneu do seu carro furasse no caminho, quanto tempo levaria até seu trabalho? De� nitivamente, mais do que os 25 ou 35 minutos usados na sua variação “normal”. Poderia gastar, talvez, uma hora a mais. A variação dessa natureza é chamada de variação de causa especial, ou seja, algo aconteceu; não era previsto; não fazia parte do processo normal. As causas especiais não são previsíveis e são esporádicas na natureza. Mas você pode estar se perguntando: por que é importante saber o tipo de variação presente no processo? Pelo simples fato de que a ação que você toma para melhorar o processo depende do tipo de variação que você tem1. Essa discussão vai nos ser útil, mais a diante, quando nos reportarmos aos fatos da língua, tipos de variações linguísticas que foram descritas e analisadas e as usarmos para � ns educacionais. Vamos agora nos debruçar sobre a questão da variação e sua relação com a língua e a sociedade. A investigação dessa relação resultou numa disciplina chamada de socio- liguística (termo que apareceu primeiro em 1939 segundo Hodson(2004)2 que retomou os princípios subjacentes à teoria linguística e desenvolveu uma teoria da variação – ou teoria da mudança – linguística. SAIBA MAIS para mais detalhes sobre a discussão de teoria, consulte http://www.wisegeek.com/topics/theory.htm exercício 1 Em dupla ou individualmente, responda as seguintes questões, tomando por base as disciplinas que já cursou ou fazendo uma pesquisa bibliográ� ca. 1) Quais são as teorias linguísticas que você conhece? 1 http://www.spcforexcel.com/variation 2 T. C. Hodson and the Origins of British Socio-linguistics by John E. Joseph Sociolinguistics Symposium 15, Newcastle-upon-Tyne, April 2004 37 Unidade 2 Teoria da Variação 2) Faça uma pesquisa rápida na internet ou na sua biblioteca e cite alguns exemplos de teorias linguísticas. 3) Quais critérios conferem o título de teoria à linguística? 4) É possível teorizar sobre algo que varia? Por quê? variação na língua: a relação entre língua e sociedade Nessa secção, abordaremos a questão da variabilidade na língua. Veremos que para uma teoria da língua obter tal título, precisa levar em consideração a estrutura externa complexa do falante (fatores sociais, por exemplo) e a estrutura complexa do produto verbal e não verbal desse falante. Sendo assim, se queremos ter uma teoria da variação é preciso, antes de tudo, situar o falante nos seus vários ambientes de interação; acompanhá- -lo por meio de vários mecanismos de observação (técnicas de observação, de pesquisa de campo etc.); situá-lo em relação ao espaço geográfi co, sociológico, psicológico, político etc; analisar seu produto linguístico nesse contínuo externo para poder descrever cienti� ca- mente a sua fala, a fala do seu grupo e/ou grupos (comunidade/s) dentro de um formato em que o conceito de variação é visto como uma riqueza que ultrapassa os conceitos de norma para atingir o conceito de variabilidade. Vamos acompanhar esse percurso para alcançarmos o conceito da variação linguística? A variação na língua que só foi estudada cienti� camente no � nal do século 19 e mais intensamente nos meados do século 20 já era objeto de estudo da biologia (natureza dos seres vivos), da antropologia (cultura do homem e suas variações). Os biólogos, por exemplo, já estudaram e estudam na natureza as variações dos insetos, dos animais, das plantas etc. Também estudaram a variação do homem (homem mulher, jovem/adulto etc.). Os sociolinguistas estendem essa variação para o estudo da fala humana e seus efeitos sobre os processos de interação. Os antropólogos, além de estudar a variação na cultura do homem, estudaram as variações em relação às diferentes maneiras de se vestir, de andar, de cantar, de falar, de se relacionar com o tempo e o espaço. Os sociolinguistas e os � lósofos da língua especializaram-se no estudo da língua em contexto. Essa perspectiva de integração do contexto nos estudos da língua mostrou o quanto é complexo o fenômenos que a língua engloba. Veja por exemplo, a de� nição de língua segundo Davidson (1992)3: 3 Davidos, D. � e Second Person. Midwest Studies In Philosophy Volume 17, Issue 1, pages 255–267, September 1992 Licenciatura em Letras Língua Portuguesa modalidade a distância38 “Todos falamos tão livremente de língua, ou línguas que tendemos a esquecer que es- sas coisas não existem no mundo real; o que existe são apenas pessoas e seus diversos produtos acústicos e escritos. Esse ponto de vista, óbvio em si mesmo, é, no entanto, fácil de esquecer.” Essa citação já nos alerta para o conceito “língua” cujo de� nição é considerada tão óbvia, mas que se torna um conceito mais complexo quando é estudado levando em consideração fatores como o espaço temporal, espacial, social, geográ� co, psicológico, econômico e político. PARA REFLETIRoutro termo bastante discutido na literatura que tem como tema o estudo da língua é o conceito de “língua materna” uma vez que as situações de bilinguismo tornam difícil de� nir o grau de natividade numa criança que fala duas línguas ao mesmo tempo. Por que esses e outros conceitos foram questionados no início e, sobretudo, nos meados do século 20? Antes do século 20 havia uma visão do mundo considerada totalitária ou prescriti- va. Ela foi seguida por uma visão binária (preto vs branco, padrão vs não padrão, direita vs esquerda) que, posteriormente, evoluiu para uma visão multidimensional (global, contínuo, cidadão do mundo, variação e diversidade). Destacam-se entre os resultados dessa última visão, a multidimensional, os concei- tos de desenvolvimento sustentável e biodiversidade, ecolinguística e direitos linguísticos, etc. Atualmente, na Sociolinguística, podemos falar, por exemplo, de ecologia da língua que vai além do conceito da variação linguística. variação e mudança nas línguas Não há consenso entre os especialistas sobre o número de línguas faladas no mun- do. Esse número oscila entre 4.000 a 7.000 línguas. Mas você pode se perguntar: por que não há consenso? Voltemos, de novo, à de� nição de língua que, como dissemos, não é um cons- truto simples de de� nir e que, fundamentalmente, baseia-se sobre critérios externos ao sistema linguístico. O fato é que qualquer comunidade pode decidir sobre sua língua e denominá-la. Assim, os linguistas, apesar de tentarem aplicar critérios de comparação entre os sistemas que compõem essas línguas, não conseguem impor suas análises sobre os falantes dessas línguas. Isso monstra os fatores sociais, políticos e econômicos que têm mais 39 Unidade 2 Teoria da Variação impacto sobre as tomadas de decisões a respeito das línguas do que fatores meramente mecânicos de descrição pura dos sistemas dessas línguas. Assim, podemos dizer que a variação está por toda parte ao redor de uma língua ou grupos de línguas. ANOTE é possível de um ponto de vista puramente descritivo, por exemplo, instituir dialetos falados por várias comunidades linguísticas como integrantes de uma mesma língua. Mas os falantes desses “dialetos” não necessariamente aceitarão generalizações dessa natureza pois podem a� rmar que falam diferente de uma outra comunidades e por consequência decidir que tem uma língua diferente de uma outra comunidade não muito distante. Esse tipo de decisão se deve a fatores externos à língua como o fator étnico, religioso, geográ� co, social e político etc. Hoje, estima-se que as línguas mais faladas do mundo não ultrapassam o número de 20. Dentre essas línguas estão, por exemplo, o inglês, o chinês, o árabe, o francês, o português. Elas só conseguem impor-se por motivos, principalmente, políticos, econômicos e sociais (por exemplo, o desenvolvimento cientí� co e econômico, o número de faltantes nativos, o grau de presença na imprensa etc.) variação nas famílias de línguas Vimos que existe uma variação no número de línguas faladas no mundo e o peso de algumas delas no cenário internacional. Podemos também falar de variação que existe dentro do que passou a ser chamado na literatura linguística de família de línguas. Podemos, ao consultar livros sobre a história das línguas, observar o quanto o latim ainda é presente em todas as línguas ditas românicas e como ele é presente em línguas germânicas também (inglês, alemão etc.). Existe uma variação entre as línguas latinas como o português, o francês, o italiano, o espanhol etc. Essa variação diz respeito, primeiro, ao léxico, organização gramatical e fonologia. Podemos observar essa variação também na família de línguas germânicas (alemão, inglês...), ou na família de línguas semíticas (árabe, hebraico). Variação dentro de uma língua Na própria evolução de uma língua podemos ter variações: • o inglês de Shakespeare em relação ao inglês moderno; • o árabe clássico em relação ao árabe moderno; COMUNIDADE LINGUÍSTICA Uma comunidade linguística é vista não como um conjunto de indivíduos que falam uma mesma lingua, mas sim como um grupo de indivíduos que compartilham um conjunto de atitudes em relação ao uso e às funções que essa língua preenche na comunidade. Licenciatura em Letras Língua Portuguesa modalidade a distância40 • o inglês britânico, australiano, nigeriano, sul-africano; • o inglês como língua estrangeira (o inglês falado por um francês, brasileiro, japonês, etc.); • o português do século 16 e o português moderno; • o português do Portugal, Cabo verde, São Tome e Príncipe, Angola. Variação dentro de um território nacional • Canadá: duas línguas (inglês e francês) co-existem ofi cialmente gerando variações dentro de cada uma dessas línguas; • Suécia: 3 línguas ofi ciais (italiano, o alemão e o francês); • Bélgica: 3 línguas ofi ciais (o neerlandês, o francês e o alemão); • Espanha: o castelhano, o catalã, o galego e o basco. Esses e outros exemplos não mencionados aqui demonstram o quanto é variável a situação das línguas dentro do mesmo território político. As perguntas que seguem são validas para pesquisas sobre essa variabilidade: Quais são as consequências de contato entre essas línguas do ponto de vista de uso de mais de uma língua por mais de um falante? Quais são as in� uências mútuas que cada sistema linguístico importa e/ou exporta? Quais in� uências políticas uma língua pode exercer sobre outras línguas por razões econômicas, políticas e/ou sociais? Essas e outras perguntas estão dentro da chamada variação macro-sociolinguística que remete à disciplina sociologia da língua que, por sua vez, compartilha com a socio- linguística objetivos semelhantes quando se trata de estudar a variação linguística, as variações sociais e suas consequências sobre a língua e a sociedade. Variação no Brasil O português brasileiro convive com outras línguas que fazem parte da paisagem linguística do Brasil (línguas indígenas e línguas de imigrantes e suas diversidades). Estima- -se que no Brasil existem 180 línguas além do português e das línguas de outros países (veri� que, por exemplo, na internet, quais são as populações que compõem o Brasil e quais são as línguas que eles falam). Os linguistas, no Brasil, vêm mapeando a diversidade linguística do país e mostrando o quanto o território brasileiro é rico em sonoridades de famílias de línguas próximas ou distantes. Os especialistas da variação linguística vêm demonstrando essa diversidade e suas possíveis repercussões sobre o sistema de ensino de língua materna e de línguas estrangeiras. Se considerarmos o português falado no Brasil, podemos rapidamente distinguir os chamados dialetos regionais (nordestino, mineiro, baiano, sulista etc.) que compõem o mosaico dos falares brasileiros. Foram primeiramente os dialetólogos e, depois, os sociolinguístas que trouxeram a maior parte da contribuição sobre a diversidade do português falado no Brasil. VARIÁVEL Conjunto de fatores linguísticos e não linguísticos 41 Unidade 2 Teoria da Variação SAIBA MAIS consulte na página do Atlas Linguístico do Brasil (ALiB) quantos atlas linguísticos já foram publicados no Brasil e selecione alguns livros ou artigos sobre o assunto para leitura, acessando http://twiki.u� a.br/ twiki/bin/view/Alib/WebHome exercício 2 1) Qual é a atual situação das línguas indígenas faladas no Brasil? 2) Você saberia apontar as variações fonéticas que caracterizam algumas áreas brasileiras? Cite exemplos. 3) Quais são as famílias de línguas indígenas faladas no Brasil? Ver o site: http://pib.socio- ambiental.org/pt/c/no-brasil-atual/linguas/troncos-e-familias 4) Cita alguns exemplos do léxico que caracteriza algumas cidades brasileiras. variedade e variação Utilizamos o termo língua e dialeto tão naturalmente no nosso quotidiano que achamos que esses conceitos são bem delimitados. De fato, não temos mecanismos cien- tí� cos para de� nir o que é uma língua e o que é um dialeto porqueesses conceitos não estão dentro do sistema linguístico, mas fora dele. Eles só podem ser abordados do ponto de vista de fatores políticos, sociais e geográ� cos. Uma língua adquire o status de língua apenas se ela tem uma política que a sustenta e a defende, senão ela perde esse status, sobretudo num território onde duas variedades próximas coexistem e onde apenas uma deve permanecer para o controle de todas as instituições e os sistemas desse território. Por essa razão, quando falamos de variação no sentido da presença de mais de um falar num dado território geográ� co, utilizamos o termo variedade. Assim, podemos falar de uma tipologia da variedade linguística: • variedade de origem individual (idioleto: caraterísticas individuais na fala das pessoas); • variedade de origem social (socioleto: o falar dos jovens, de uma categoria social); • variedade de origem geográfi ca (dialeto: o falar de determinada região dentro do mesmo território nacional; ex.: O dialeto baiano, mineiro etc.); • variedade de origem religiosa/étnica (etnoleto: o falar de um dado grupo religioso ou étnico); • variedade “padrão” que possui uma dimensão simbólica, intelectual, ofi cial e que é politicamente chamada de “língua”. Licenciatura em Letras Língua Portuguesa modalidade a distância42 Percebemos, então, que dentro de cada variedade existe variação. A variação está presente no tempo (história da língua), no espaço � sico (geogra� a), no espaço social (classe social), no espaço psicológico (as atitudes sobre as variedades) e no espaço político (decisões políticas sobre uma dada variedade). Depois de tudo isso, você pode ainda se perguntar: por que existe variação? Ora, diferentemente do que alguns podem pensam, a língua não é lógica, ela é apenas regular. Se fosse lógica, ela seria arti� cial (linguagem do computador, por exemplo). Se fosse lógica, não inventaríamos as línguas lógicas. Por que a língua varia? Ela é viva (mas não é um organismo vivo, ela é produto dos falantes). Por ser viva, precisa crescer, entrar em con� ito, vencer e ser vencida. Pode morrer e, às vezes, depois de morta, ressuscitar, a exemplo do hebraico moderno. Outros questionamentos podem surgir em meio a toda essa discussão: quem é responsável pela mudança? Os indivíduos de uma comunidade, no tempo e no espaço físico e social. Dito isso, passemos ao estudo da tipologia da variação. Temos vários tipos de varia- ção linguística. Dentre eles as variações extralinguísticas e as variações intralinguísticas. São exemplos de variação extralinguística: • variação histórica (diacrônica, há evolução do português até hoje, por exemplo); • variação geográfi ca (diatópica – regional, o português mineiro e baiano); • variação sociocultural (diastrática, variação de acordo com a classe social); • variação de idade (diageracional, variação dos jovem e adultos); • variação de sexo (diagenérica, diferenças entre homens e mulheres); • variação de situação (variação de uso, ligada ao fato de se estar numa sala de aula ou num mercado popular); • variação de estilo (diafásica: variação relacionada ao uso formal e informal, por exemplo, o oral e o escrito); • variação de indivíduo (ou grupo) (variação de indivíduo para indivíduo); • variação de escolarização (escolarizados, não escolarizados ou pouco escolari- zados); • variação de profi ssão ou jargão (jargão do médico, do advogado etc.); • variação de bairro residencial (bairro nobre e bairro de periferia, ou entre um bairro de periferia e um outro bairro de periferia). Alguns agrupamentos, no entanto, são possíveis aqui. Por exemplo, a variação de situação inclui a variação de pro� ssão. 43 Unidade 2 Teoria da Variação São exemplos de variação intralinguística: • variação fonética: a diferença na pronúncia de ditongos (caixa, caxa) no portu- guês brasileiro; • variação morfossintática: a presença ou ausência da marca do plural (duas caixa, duas caixas), • variação lexical (aipim, macaxeira). exercício 3 1) A variação de idade é importante para o futuro professor de língua. Observe, em grupo, o léxico dos jovens do seu bairro ou de sua escola e faça uma lista do vocabulário que mais caracteriza esse grupo. 2) Entreviste um professor ou uma professora sobre o tipo de variação que ela observa na sua sala de aula e veri� que até que ponto o professor tem consciência da diversidade que caracteriza seu ambiente de trabalho. Socialize seus resultados no encontro presencial com o tutor e os colegas. bibliografia básica calvet, Louis-Jean. Sociolinguística: uma introdução crítica. Tradução de Marcos Marcionilo. São Paulo: Parábola, 2002. labov, William. Sociolinguistique. Paris: Édition de Minuit.1976. labov, William. Principles of Linguistc Change. Oxford: Blackwell Publishers, 1994. complementar labov, William. � e social strati� cation of English in New York city. Washington: Center of Applied Linguistics, 1966. bourdieux, p. Ce que parler veut dire. Paris: Fayard, 1975. heye, Jürgen. Sociolingüística. In: Manual de Linguística. São Paulo: Editora global, 1986, pp.203-238. resumo da atividade 3 Nesta Atividade, apresentamos, primeiramente, o conceito de teoria e de� nimos alguns ter- mos atrelados à teoria e à variação. Vimos alguns princípios e leis necessários à existência de uma teoria. Tratamos da relação entre língua e sociedade e dos diferentes tipos de variação que podemos encontrar nas línguas. Mostramos, também, que pode haver variação e mu- dança nas línguas e que essa variação pode se dar entre famílias de línguas, como aconteceu Licenciatura em Letras Língua Portuguesa modalidade a distância44 no latim. Concluímos que pode ocorrer variação dentro de uma determinada língua e que pode haver, ainda, variação dentro de um dado território nacional quando há coexistência de várias línguas num mesmo território. Por � m, abordamos a variação que ocorre no Brasil, focalizando a diferença entre variação, diversidade e a variação extralinguística. 45 Unidade 2 Teoria da Variação ASPECTOS TEÓRICO-METODOLÓGICOS DA TEORIA DA VARIAÇÃO a t i v i d a d e 4 Licenciatura em Letras Língua Portuguesa modalidade a distância46 objetivos Ao � nal dessa unidade, você deverá: • estabelecer diferença entre a abordagem das diferentes teorias sobre o objeto da lin- guística; • compreender a diferença entre variação e mudança; • apontar a diferença entre variável e variantes (linguísticas e sociais); • compreender como a teoria da variação reavaliou alguns princípios da teoria estrutu- ralista e gerativista; • entender os procedimentos práticos de um trabalho de campo; • distinguir estudo em tempo real de estudo em tempo aparente; O estudo da variação possibilita a investigação da estrutura e da mudança linguística e permite fazer uma ponte entre as duas. A Sociolinguística Variacionista demonstrou que existe uma cor- relação entre a estrutura da língua e a estrutura social. A socio- linguística busca o que não varia dentro da variação, o invariante dentro da variação. A sociolinguística investiga: • o uso quotidiano da língua nas comunidades urbanas; • os pidgins e os crioulos; • a geografi a dialetal (estudo dos dialetos urbanos ou geogra- fi camente distribuídos); • as comunidades minoritárias (línguas indígenas, línguas em perigo), • a política linguística; • as situações de contato de línguas; • a variação linguística, a mudança social e políticas de ensino. ANOTE Pidgin é o nome dado a qualquer língua que é criada, normalmente de forma espontânea, de uma mistura de outras línguas, e serve de meio de comunicação entre os falantes de idiomas diferentes. Os pidgins têm, normalmente, gramáticas rudimentares e um vocabulário restrito, servindo como línguas de contacto auxiliares. São improvisadas e não são aprendidas de forma nativa. O crioulo é uma designação comum a várias línguas mistas surgidas a partir do contato entre línguas europeias e línguas nativas da África, Ásia ou Américas. MUDANÇA De acordocom a teoria da variação, toda mudança é acompanhada necessariamente de variação: a mudança implica a variação. Há mudança quando uma dada variante vence a batalha entre variantes, assumindo o lugar de outra variante. 47 Unidade 2 Teoria da Variação modelos de descrição na teoria da variação A sociolinguística, como toda ciência, procura validar seu campo de investigação por meio de modelos de descrição cientí� cos, como apresentamos a seguir. Descrições indutivas A sociolinguística integrou a abordagem indutiva e dedutiva. A Sociolinguística, quando de sua investigação indutiva sobre a heterogeneidade na língua, segue essas etapas: a) Observação: observação objetiva da fala cotidiana, coleta de dados (corpus) e realização de classi� cação para identi� car os princípios gerais que regem a relação dentro da língua e fora dela. b) Hipóteses: elaboração de hipóteses a serem testadas a partir dos dados coletados. c) Experimentação: condução de experimentos ou exercícios que permitam testar as hipóteses levantadas. d) Formulação de regras: uma vez que o resultado do experimento é consistente com as hipóteses, o sociolinguista formula regras ou leis; essas regras são cha- madas de regras variáveis, pois tratam de dar conta de uma realidade que não pode ser vista em termos do errado/certo, mas em termos do que é aceitável pela comunidade e pelo contexto de comunicação. Nessa abordagem indutiva, o sociolinguista vai do especí� co para o geral (em linguística geral, partia-se do componente fonético para o sintático, passando-se pelo fonológico e morfológico). Descrições dedutivas A descrição dedutiva é uma descrição oposta à indutiva. Parte do geral para o especi� co (gerativistas como Chomsky utilizaram essa descrição, pois partiam de com- ponentes intuitivos presentes na gramática interna, no cérebro de cada falante). Para a sociolinguística, esse componente é válido também quando se trata, por exemplo, de pedir o ponto de vista de um falante sobre sua maneira de falar e sobre a maneira de falar dos outros. A teoria da variação integrou essa descrição para poder quanti� car as atitudes linguísticas da comunidade linguística a respeito do seu modo de ver a língua. O respeito à diversidade passa por uma atitude descritiva dos pontos de vista, concepções, preconceitos, aspirações, dentre outros, dos próprios falantes autores dos seus discursos e membros ativos dentro de seus respectivos grupos sociais. Essa descrição é acoplada na sociolinguística a outra descrição que veremos a seguir. Descrições probabilísticas Além de seguir as dimensões de descrição indutiva e dedutiva, a sociolinguística incorporou os métodos de trabalho da estatística para validar o seu modelo de descrição e análise. Aqui, estamos no centro dos métodos de investigação da atualidade, pois tudo Licenciatura em Letras Língua Portuguesa modalidade a distância48 o que fazemos hoje é mensurado por agências que usam cálculo de frequências, cálculo de pesos dos fenômenos estudados. Podemos ver que, ao nosso redor, tudo é número; todas as projeções e decisões econômicas e políticas são baseadas em cálculos estatísticos (exemplo: eleições, políticas de ensino etc.). Todas as ciências sociais já utilizavam proce- dimentos estatísticos que, inicialmente, eram do domínio das ciências naturais e de outras ciências exatas. A maior contribuição da teoria da variação para os estudos das ciências da linguagem foi demonstrar que o fato linguístico não é um fato puro, homogêneo, mas um fato heterogêneo, contrariando o Estruturalismo. O Estruturalismo europeu e o americano não aceitavam a variação como compo- nente natural da descrição linguística, pois seu formato de descrição (do Estruturalismo) era baseado em um corpus fabricado e não num corpus autêntico da fala autêntica não apenas de um informante isolado ou ideal (Chomsky), mas de um grupo de indivíduos que formam uma comunidade. Para descrever a variação, fenômeno natural de uma comunidade linguística, a sociolinguística foi a primeira a desenvolver o conceito de regra variável. A regra variável, nesse sentido, é um dado fenômeno linguístico que apresenta duas ou três formas diferentes para o mesmo fenômeno sem mudar o sentido (exemplo: a regra de concordância nominal diz respeito ao uso da marca de plural ou ausência dessa marca na fala dos brasileiros. Um outro exemplo é a variação no uso do pronome tu e você). Na teoria da variação, apresentamos a presença/ausência da marca do plural, res- pectivamente, –s ou ø (as casas e as casaø), dentro de uma regra que demonstra quais são os fatores linguísticos e não linguísticos que in� uenciam a realização de uma ou outra variante. Para se chegar a elaborar um modelo de análise dessa regra variável, é preciso incorporar um modelo estatístico que mos- tre não apenas as frequências de presença ou ausência desse fenômeno em função de fatores como natureza da sílaba, natureza da palavra que precede o substantivo etc. (fatores internos ou linguísticos), in� uência da escolaridade, idade, sexo etc. (fatores externos ou sociais) que in� uenciam essa regra variável, mas que aponte probabilidades. Podemos ver, assim, que o uso do método estatístico dá ao modelo da teoria de variação um caráter robusto, pois indica o peso de cada fator interno ou externo sobre a realização da regra variável. No Brasil, um dos programas que mais se destacaram para efetuar essa análise é o pacote de programas varbrul (Variable Rule Analysis), o pro- grama de análise de regra variável. Descrição funcionalista Além dessas abordagens, a teoria da variação integrou ao seu processo descritivo- -analítico o componente funcional. Por exemplo, a tarefa de uma gramática funcional é, VARIANTE Diferentes maneiras de se dizer a mesma coisa. 49 Unidade 2 Teoria da Variação como enfatiza Beaugrande (1993, cap. iii. apud. Neves, 2004, p. 03), “fazer correlações ricas entre forma e signi� cado dentro do contexto global do discurso”. Como enfatiza Neves (2004), “uma teoria da organização gramatical das línguas naturais procura se integrar a uma teoria global da interação social” (Neves, 2004, p. 15). Nesse sentido, uma teoria da variação integra o componente funcional, pois ele se ocupa da estrutura interna da língua, mas, também, da análise da situação comunicativa. Descrições genéticas A sociolinguística incorporou ainda descrições sobre as análises históricas e as aproximações entre famílias de línguas ou in� uências de línguas majoritárias sobre outras minoritárias, para estudar as diversas situações de contato de línguas. Por exemplo, muitos trabalhos mostram resultados curiosos sobre o per� l linguístico das chamadas línguas pidgin e crioulo. A sociolinguística tem estudado essas situações de contato em vários lugares do mundo e tem contribuído para a teoria da variação e mudança linguística. Os estudos sobre a história das línguas têm também lugar importante na descrição socio- linguística. O estudo da variação não rompeu com a tradição da dialetologia (o estudo comparativo dos dialetos) e geolinguística (o método da dialetologia para a elaboração de mapas linguísticos denominados de atlas linguísticos). exercício 1 1) Procure um artigo sobre a variação linguística no português brasileiro que tome por base uma análise estatística que utiliza o pacote Varbrul. Tente entender as tabelas e procure tirar as dúvidas no fórum e no encontro com o tutor. 2) Procure saber o que é um peso relativo e como interpretá-lo. Poste sua resposta ou dúvida no fórum. A resposta pode estar atrelada à questão 1. a teoria da variação e os axiomas da linguística descritiva Agora que já estudamos aspectos relacionados à sociolinguística, vamos elencar alguns princípios da linguística moderna e como a sociolinguística se posicionou em relação a eles. Língua/fala (langue-parole) e competência/desempenho Saussure, apesar de suas novas ideias, estava procurando um sistema homogêneo que existia
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