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TEORIA GERAL DO DIREITO AGRÁRIO AULA 5 – CONTRATO DE INTEGRAÇÃO AGROINDUSTRIAL 1. INTRODUÇÃO Na economia contemporânea, não se pode mais conceber a empresa de forma isolada. A empresa atua principalmente por meio de contratos, que representam sua abertura para o ambiente institucional em que se encontra. Os modernos complexos produtivos são as redes contratuais. A empresa concentra a atividade de interagir, ela é agente econômico. É preciso adquirir insumos, distribuir produtos, viabilizar novas tecnologias, acessar distribuidores e consumidores. A relação entre a empresa e seus agentes interessa ao direito na medida em que gera contratos e, consequentemente, constantes relações jurídicas. Assim, o mercado corresponde a um emaranhado de relações contratuais, tecido pelos agentes econômicos. A aproximação do moderno agronegócio com a Nova Economia das Instituições, em especial, considerando suas vertentes de custos de transação e contratos, como fronte referencial teórica é uma tendência que se observa nos principais centros de estudo de agribusiness. 1.1 Evolução da agricultura brasileira: até meados do século XX Além das atividades de produção, quase sempre bastante diversificadas, eram também criados animais de tração; produzidos e adaptados os implementos, ferramentas, equipamentos de transporte e insumos básicos, tais como fertilizantes, sementes. O armazenamento e a comercialização também estavam incorporados às fazendas. As famílias formavam unidades de produção, nas antigas “colônias”. Quando se referia ao termo “agricultura”, todas essas atividades estavam inclusas, sendo um termo abrangente o suficiente para todo o setor. Os produtores, por sua vez, não eram especializados, executavam todo o processo, em nível de especificidade e desenvolvimento tecnológicos padrões da época. 1.2 Evolução da agricultura brasileira: visão sistêmica Visão sistêmica: significa que os produtores e todos os demais integrantes do sistema, ou seja, os tomadores de decisão de empresas de insumos, processamento ou distribuição passam a contemplar não só seus clientes/consumidores próximos, mas também os consumidores finais, com suas novas tendências, dentro de um mercado em evolução. IDEIA BÁSICA: o todo é maior que a soma das partes individualizadas. Não adianta ser extremamente eficiente em sua atividade dentro do sistema se ele como um todo não está sendo eficiente, mostrando falhas dentro do enfrentamento de certas externalidades. O setor “antes da porteira”: fornecedores de insumos (ex.: máquinas, implementos, defensivos, fertilizantes, sementes, tecnologia) O setor “dentro da porteira”: atividades agropecuárias propriamente ditas O setor “pós-porteira”: armazenamento beneficiamento, industrialização, embalagem, distribuição, consumo de produtos alimentares, fibras e produtos energéticos provenientes da biomassa) O setor de produção agrícola deverá se voltar para o mercado final, rompendo sua tradição de preocupação única em produzir. Já o setor de processamento deve continuar a ser o elo forte da cadeia que liga a produção ao consumidor final. A economia mundial caminha hoje para a globalização, o rompimento de fronteiras e formação dos grandes blocos econômicos. A ideia é de que as formas organizacionais mais eficientes são as redutoras não só de custos de produção, mas também de custos de transação, além da flexibilidade e rapidez para promover ajustes às mudanças ambientais. Em síntese, a economia dos custos de transação analisa as características das transações (especificidade dos ativos envolvidos, incerteza e frequência), aspectos dos contratos (flexibilidade, padrões, incentivos e garantias), dentro de um ambiente institucional organizado. HOJE: com o processo de modernização da tecnologia, a agricultura brasileira se tornou mais específica, como se vê em atividades de produção de fertilizantes, defensivos, máquinas e implementos, rações, vacinas, operações de financiamento, de pesquisa. Ou seja, saindo do âmbito interno das propriedades rurais e passando para terceiros, empresas especializadas em seus segmentos, dentro do chamado “antes da porteira”. No mundo do agronegócio, surgem modelos contratuais que colocam em relação de cooperação setores diversos da produção, formando verdadeiras cadeias contratuais agroindustriais. Trata-se do contrato agroindustrial ou contrato de integração agroindustrial que tem como sujeitos o produtor rural, a indústria e/ou o setor de distribuição e comercialização. Previsão legal: Lei nº 13.288/2016 e CC. 2 SISTEMA DE INTEGRAÇÃO Representa várias modalidades, mas recebe a denominação de integração vertical de modo genérico. O setor agrícola se apresenta caracterizado pela existência de um processo de relações entre diferentes setores, que são interdependentes. 2.1 Características da integração Relação de múltiplas obrigações recíprocas. Partes: produtor agrícola (INTEGRADO) e agroindústria/empresário comercial (INTEGRADOR). Ocorre interferência do integrador na produção agrícola, ou seja, o integrado deve seguir as técnicas de cultivo determinadas no contrato pelo integrador durante o desenvolvimento da própria atividade. A submissão do integrado a uma série de obrigações estipuladas pela agroindústria não pode ser confundida com os contratos trabalhistas, porque o que existe é uma cooperação interempresarial e as partes mantêm sua autonomia empresarial. 2.2 Modalidades de integração Integração horizontal: ocorre quando a mesma transação se dá na mesma fase do ciclo produtivo, ou seja, é a coordenação de um grupo de empresários dedicados à mesma atividade. Ex.: associações entre produtores agrícolas que se unem com o objetivo de criar ou melhorar uma rede de venda comum. Integração vertical: caracteriza os processos que são tecnologicamente distintos e integram dois ou mais setores de diferentes fases do mesmo ciclo produtivo. Conserva a autonomia das empresas envolvidas na relação, mas que são independentes de modo hierárquico (art. 2º, I, Lei nº 13.288/2016) o Integração vertical ascendente: ocorre quando a iniciativa para realizar a coordenação da atividade é assumida pelo produtor agrícola. o Integração vertical descendente: ocorre quando a agroindústria é que determina a coordenação da atividade. A determinação do sistema de integração é realizada pela parte economicamente mais forte, prevalecendo a integração vertical descendente (a agroindústria coordena o ciclo de produção). Integração circular: quando compreende ao mesmo tempo as modalidades anteriores. 3 CONTRATO DE INTEGRAÇÃO VERTICAL 3.1 Conceito É o contrato firmado entre o produtor agrícola (integrado) e a agroindústria ou empresário comercial (integrador), que estabelece a sua finalidade, as respectivas atribuições no processo produtivo, os compromissos financeiros, os deveres sociais, os requisitos sanitários, as responsabilidades ambientais, entre outros que regulem o relacionamento entre os sujeitos do contrato. 3.2 Sujeitos Produtor agrícola/integrado: produtor agrossilvipastoril; pessoa física ou jurídica, que, individualmente ou de forma associativa, com/sem a cooperação laboral de empregados, se vincula ao integrador por meio de contrato de integração vertical, recebendo bens ou serviços para a produção e para o fornecimento de matéria-prima, bens intermediários ou bens de consumo final. Agroindústria/empresário comercial: pessoa física ou jurídica que se vincula ao produtor integrado por meio de contrato de integração vertical, fornecendobens, insumos e serviços e recebendo matéria-prima, bens intermediários ou bens de consumo final, utilizados no processo industrial ou comercial. 3.3 Elementos obrigatórios do contrato (previsão expressa na Lei nº13.288/2016) Art. 4º. O contrato de integração, sob pena de nulidade, deve ser escrito com clareza, precisão e ordem lógica, e deve dispor sobre as seguintes questões, sem prejuízo de outras que as partes contratantes considerem mutuamente aceitáveis: I - as características gerais do sistema de integração e as exigências técnicas e legais para os contratantes; II - as responsabilidades e as obrigações do integrador e do produtor integrado no sistema de produção; III - os parâmetros técnicos e econômicos indicados ou anuídos pelo integrador com base no estudo de viabilidade econômica e financeira do projeto; IV - os padrões de qualidade dos insumos fornecidos pelo integrador para a produção animal e dos produtos a serem entregues pelo integrado; V - as fórmulas para o cálculo da eficiência da produção, com explicação detalhada dos parâmetros e da metodologia empregados na obtenção dos resultados; VI - as formas e os prazos de distribuição dos resultados entre os contratantes; VII - visando a assegurar a viabilidade econômica, o equilíbrio dos contratos e a continuidade do processo produtivo, será cumprido pelo integrador o valor de referência para a remuneração do integrado, definido pela Cadec na forma do art. 12 desta Lei, desde que atendidas as obrigações contidas no contrato; VIII - os custos financeiros dos insumos fornecidos em adiantamento pelo integrador, não podendo ser superiores às taxas de juros captadas, devendo ser comprovadas pela Cadec; IX - as condições para o acesso às áreas de produção por preposto ou empregado do integrador e às instalações industriais ou comerciais diretamente afetas ao objeto do contrato de integração pelo produtor integrado, seu preposto ou empregado; X - as responsabilidades do integrador e do produtor integrado quanto ao recolhimento de tributos incidentes no sistema de integração; XI - as obrigações do integrador e do produtor integrado no cumprimento da legislação de defesa agropecuária e sanitária; XII - as obrigações do integrador e do produtor integrado no cumprimento da legislação ambiental; XIII - os custos e a extensão de sua cobertura, em caso de obrigatoriedade de contratação de seguro de produção e do empreendimento, devendo eventual subsídio sobre o prêmio concedido pelo poder público ser direcionado proporcionalmente a quem arcar com os custos; XIV - o prazo para aviso prévio, no caso de rescisão unilateral e antecipada do contrato de integração, deve levar em consideração o ciclo produtivo da atividade e o montante dos investimentos realizados, devidamente pactuado entre as partes; XV - a instituição de Comissão de Acompanhamento, Desenvolvimento e Conciliação da Integração - CADEC, a quem as partes poderão recorrer para a interpretação de cláusulas contratuais ou outras questões inerentes ao contrato de integração; XVI - as sanções para os casos de inadimplemento e rescisão unilateral do contrato de integração. Parágrafo único. O fórum do lugar onde se situa o empreendimento do produtor integrado é competente para ações fundadas no contrato de integração, devendo ser indicado no contrato. 3.4 Vantagens para as partes Para o produtor agrícola/integrado: o Mercado certo para o produto: caracteriza a redução dos riscos econômicos de mercado com escoamento da produção garantido a um preço predeterminado; o Assistência técnica que permite elevar o padrão de produtividade e qualidade, possibilitando a incorporação de novas tecnologias de produção e de gestão; o Incorporação de produtos de maior valor comercial, podendo operar em nível de produção maior e com elevada especialização; o Maior aproveitamento da mão-de-obra familiar importante nas atividades de pequenos produtores, pois, geralmente, trata-se de produtos com uso mais intensivo de mão-de- obra por hectare e, assim, contribui para a fiação do homem no campo e seu desenvolvimento econômico; o Maior estabilidade de renda, livrando o empresário das consequências das oscilações de preços dos produtos agrícolas, caracterizados pela demanda instável e imprevisível, de forma que os contratos de integração se mostram bastante profícuos para os produtos cuja capacidade de conservação é menor, como frutas, legumes, carne, etc. o Poucas decisões a tomar e menores incertezas na aplicação e aquisição de insumos; o Menor necessidade de capital operacional, pois a aquisição dos fatores de produção é financiada normalmente pela empresa integradora, sem que o empresário agrário tenha que recorrer aos instrumentos de crédito convencionais, sendo o pagamento postergado para o momento da entrega dos produtos obtidos. Para a agroindústria/empresário comercial: o Redução de custos através de suprimento contínuo para manter a economia de escala. O fornecimento contínuo é fator fundamental para a eficiência da indústria agroalimentar, sobretudo, aquela que trabalha com matéria-prima agrícola altamente perecível. o Garantia de qualidade, homogeneidade e quantidade requerida pela demanda. Essa estreita relação de complementaridade técnica entre a fase agrícola e a fase industrial, permite ainda a redução dos custos produtivos, pois transfere aos produtores os riscos inerentes à produção agrícola, diminui os custos trabalhistas e previdenciários ligados à mão-de-obra, evita a imobilização de capital em terras e reduz custos quando a produção própria for onerosa ou quando as empresas agrícolas maiores demandam preços mais altos, fazendo acordos com pequenos agricultores.
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