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10Rev. Educ., v.18, n.24, p.10-15, 2015 SIQUEIRA, V.R. Vinicius Reis de Siqueiraa* Resumo Dado as limitações e repercussões negativas causadas pelo medo de dirigir, novas formas de tratamento contra este medo especifico são constantemente buscadas. Este artigo apresenta dados preliminares do tratamento desta fobia utilizando-se da Terapia de Aceitação e Comprometimento (ACT), visto que tal abordagem tem alcançado resultados positivos no tratamento de ansiedades. A população deste estudo se constituiu de oito mulheres de idades entre 21 a 66 anos da cidade de Cascavel/PR. Foram realizados cinco encontros de uma hora de duração, utilizado-se do AAQ (Acceptance and Action Questionnaire) para verificar a flexibilidade psicológica antes e depois dos encontros. Os resultados demonstraram um aumento de 34,2 para 41,4 da flexibilidade psicológica dos participantes bem como feedbacks positivos no engajamento no comportamento de dirigir por parte de todas as participantes. Sugere-se a realização de outras pesquisas, com um maior número de participantes a fim corroborar os resultados obtidos por este estudo. Palavras-chave: Terapia de Aceitação e Comprometimento. Medo de Dirigir. Mindfulness. Abstract Given the limitations and negative repercussions caused by the fear of driving, new forms of treatment against this specific fear are searched constantly. This article presents preliminary data on the treatment of this phobia utilizing Acceptance and Commitment Therapy (ACT), since this approach has reached positive results in the treatment of anxieties. The population of this study was comprised of eight women aged 21 to 66 years old from the city of Cascavel/PR. It was performed five sessions, one hour each, using the Acceptance and Action Questionnaire (AAQ) to verify the psychological flexibility before and after the sessions. The results showed an increase of psychological flexibility from 34.2 to 41.4 from the participants, as well as positive feedbacks regarding the active involvement in driving behaviors by all participants. It is suggested that further research be conducted, with a greater number of participants searching for corroborating with the results obtained. Keywords: Acceptance and Commitment Therapy. Driving Fear. Mindfulness. Agindo Sobre o Medo de Dirigir: um Tratamento ao Medo de Dirigir Acting on the Driving Fear: a Treatment for the Driving Fear aFaculdade de Ciências Aplicadas de Cascavel, PR, Brasil *E-mail: vinicius.r.siqueira@anhanguera.com 1 Introdução O medo de dirigir atinge um número considerável de pessoas, sendo que muitas destas não procuram tratamento e acabam por levar uma vida de dependência e privações relacionadas à sua locomoção (CORASSA, 2006). Tais indivíduos podem sofrer de algum grau de ansiedade e/ou fobia de dirigir, o que pode vir a interferir em sua qualidade de vida. Deve-se notar ainda, que tal problemática pode atingir pessoas de ambos os sexos (não sendo este medo restrito a mulheres, como é preconceituosamente propagado) de todas as camadas sociais, econômicas e culturais, demonstrando assim sua relevância e abrangência (BELLINA, 2003). Observando-se a perda na qualidade de vida de tantas pessoas, a presente pesquisa buscou obter dados preliminares a respeito da utilização da Terapia de Aceitação e Comprometimento ACT (Acceptance and Commitment Therapy) uma abordagem pertencente à chamada “terceira onda do behaviorismo” no tratamento específico do medo de dirigir (CULLEN, 2008). Diversas abordagens são utilizadas no tratamento do medo de dirigir, tais como psicanálise (GURFINKEL, 2001), terapia cognitivo-comportamental (BECK; EMERY; GREENBERG, 1985), entre outras. Na contínua busca por métodos e técnicas mais eficazes e eficientes para lidar com o medo de dirigir, nota-se que a ACT tem demonstrado resultados iniciais promissores no tratamento de diversos transtornos de ansiedade (EIFERT; FORSYTH, 2005; HAYES, 1987; ORSILLO et al., 2005), notando-se que a diferença entre fobia e ansiedade é basicamente quantitativa (FALCONE, 1995). 2 Material e Métodos 2.1 Amostra Oito mulheres (idades entre 21 a 66 anos) foram recrutadas na cidade de Cascavel, PR. Não houve restrição quanto à situação, origem ou forma do medo de dirigir. Desta forma, existiam no grupo, mulheres que não tinham a Carteira Nacional de Habilitação - CNH, mas buscavam ultrapassar tal medo para conseguir a CNH, enquanto outras já tinham a CNH a mais de dez anos, porém não dirigiam. Os motivos que trouxe as mulheres ao grupo também eram bem diversificados. Algumas participaram de algum tipo de acidente automobilístico, outras presenciaram algum acidente, 11 Rev. Educ., v.18, n.24, p.10-15, 2015 Agindo Sobre o Medo de Dirigir: um Tratamento ao Medo de Dirigir enquanto outras tinham “medo de errar”. 2.2 Instrumentos Hayes et al. (2004) desenvolveram o Questionário de Ação e Aceitação - AAQ como forma de avaliar a esquiva experiencial e a aceitação psicológica, dois importantes constructos que estão no cerne da ACT. Este instrumento tem se mostrado eficaz na observação destes dois fenômenos psicológicos. As versões em sueco, holandês, espanhol e japonês foram validadas. Também tem sido usado como base para medidas mais especificas de aceitação e desfusão, como os desenvolvidos na área do tabagismo e dor. A consistência interna para o AAQ é α=81. O AAQ está associado com variáveis às quais é teoricamente vinculado, e não está associada com variáveis às quais é teoricamente desconectado. Por exemplo, maiores níveis de flexibilidade psicológica, como medido pelo AAQ, estão associados com menores índices de depressão, ansiedade, estresse e sofrimento psíquico em geral. Além da mera associação, no entanto, os resultados indicam que níveis baixos de flexibilidade psicológica podem servir como fator de risco para doenças mentais (HAYES et al., 2004). 2.3 Procedimentos Foram postados anúncios do grupo em todas as autoescolas da cidade de Cascavel, PR, nos jornais e televisão locais, bem como internamente na Faculdade de Ciências Aplicadas de Cascavel. Os participantes se inscreveram pelo telefone da Clínica de Psicologia Aplicada - CPA da Faculdade de Ciências Aplicadas de Cascavel, onde foram realizados os encontros. Nestes telefonemas foi explicada aos participantes a natureza do grupo, dia, local e horário em que seria realizado, sendo que foram realizados no total cinco sessões de uma hora, nos sábados dos meses de setembro a outubro de 2011. O primeiro encontro foi focado na apresentação dos membros do grupo, bem como no estabelecimento das regras (como “privacidade” do que é dito no grupo; não julgar outros membros ou fala dos mesmos; entre outras questões). A sessão também introduziu os clientes para a forma ativa e participativa do tratamento com a utilização de exercícios/ metáforas1, e sua ênfase em viver uma vida significativa ao invés de se focar na ansiedade – já se discutindo a noção de comportamentos baseados em “valores” como uma alternativa à ansiedade. Nesta primeira sessão também foi discutido o que é ansiedade, a concepção da ACT sobre psicopatologias e a origem da ansiedade. No final do encontro, foi pedido a todos os participantes que respondessem ao AAQ, sendo que este mesmo teste foi novamente respondido no último encontro a fim de alcançar uma linha de base para verificar a flexibilidade psicológica antes e depois do projeto de pesquisa. Junto à apresentação do teste no primeiro encontro, foi pedido aos participantes que assinassem um termo de consentimento livre e esclarecido que clarificava o que o teste medira e sua forma de aplicação, constando neste os nomes dos pesquisadores e alguma forma de entrar em contato com este caso surgisse alguma necessidade. Neste termo, foram tratadas questões de confidencialidadee voluntariedade, esclarecendo que os dados teriam fins de publicação. A segunda sessão buscou rever e avaliar as estratégias que os clientes usaram no passado a fim de lidar com a ansiedade. O objetivo deste encontro foi o de acabar com a “agenda” de controlar a ansiedade e criar um tratamento baseado em valores, deixando os clientes experienciarem a baixa funcionalidade de tentar evitar e controlar a ansiedade, bem como demonstrar que para ocorrer à mudança, é necessário que se faça algo diferente e haja uma real modificação em seu comportamento – continuando a ofertar uma forma de se comportar baseado em valores. A fim de alcançar os objetivos traçados no segundo encontro, foram-se utilizadas as metáforas: do fogão; homem no buraco; e passageiros em um ônibus. A terceira sessão se focou em aceitação e mindfulness como meios de aprender a observar respostas corporais relacionadas à ansiedade de forma total (sem julgamentos). O objetivo foi prover aos clientes opções para lidarem com a ansiedade ao invés de tentar escapar, evitar, etc., tornando as respostas frente à ansiedade mais flexíveis, e fazendo com que os participantes notem o que eles podem e o que não podem controlar. A fim de alcançar os objetivos traçados no terceiro encontro, foram-se utilizadas as metáforas: cabo de guerra; e duas escalas; bem como um exercício de mindfulness enquanto sentado. A quarta sessão empregou exercícios de mindfulness, desfusão, ação baseada em valores pessoais, e comprometimento a agir de acordo com as direções baseadas nestes valores. O objetivo do encontro era demonstrar uma possibilidade de lidar com as reações psicológicas à ansiedade baseadas em ações valorizadas, não pregando que tal perspectiva levasse a diminuição da ansiedade, mas que, no entanto, tal resultado pudesse ocorrer. Para se alcançar os objetivos do quarto encontro, foram realizados exercícios de mindfulness como: rodovia cheia de carros; e observador self-como-contexto; a fim de demonstrar aos participantes uma prática de observação mindfully, aceitação e desfusão cognitiva na presença de reações psicológicas à ansiedade. Em seguida foram realizadas técnicas de desfusão, como: metáfora do tabuleiro de xadrez; metáfora das relações enlameadas; e deliteração2 de pensamentos e sentimentos – que não buscam modificar o conteúdo ou validade das avaliações negativas, somente o processo de 1 Todos os exercícios e metáforas que serão mencionados poderão ser encontrados no site ACBS em maiores detalhes. 2 Rotulação de pensamentos como pensamentos e sentimentos como sentimentos. 12Rev. Educ., v.18, n.24, p.10-15, 2015 SIQUEIRA, V.R. avaliar em si. Finalmente utilizou-se da metáfora: “não há caminhos sem pedras” para instigar o comprometimento que pode surgir ao agir de acordo com direções baseadas em valores. Na última sessão realizou-se um procedimento de exposição imaginária da situação de dirigir, utilizando-se de todas as habilidades e práticas aprendidas nos encontros anteriores. Por fim, ouve uma discussão sobre a ativação comportamental de tais habilidades e práticas na vida dos participantes. Neste último encontro, novamente foi requisitado que os participantes respondessem ao AAQ e algumas orientações para o fechamento do projeto de pesquisa foram realizadas: expondo a estes que o que foi aprendido no grupo foi somente um começo, que cada um deles deveria continuar por si próprio; relembrando-os que “lapsos” são normais; que deveriam continuar a praticar mindfullness mesmo depois de se sentirem “curados”, pois tais sintomas podem voltar a ocorrer; notando aos participantes que o que foi aprendido ali pode ser generalizado para todas as partes da vida dos participantes, não somente ao medo de dirigir. 3 Resultados e Discussão 3.1 Terapia de aceitação e comprometimento A ACT tem uma sólida base empírica construída a partir de uma concepção da natureza da cognição e linguagem humana (HAYES; BARNES-HOLMES; ROCHE, 2001) e uma coerente concepção filosófica (HAYES, 1987). Ambas estas perspectivas (RFT e Contextualismo Funcional) são altamente integradas, e têm demonstrado resultado em uma tecnologia aplicável. Pesquisas com resultados a respeito dos processos de ACT têm se desenvolvido rapidamente, alcançando avanços tanto em aspectos teóricos como práticos, demonstrando se tratar de uma perspectiva de modificação de comportamento que traz bons resultados, não somente para focos ansiolíticos, mas podendo-se generalizar tais resultados em vários aspectos da vida (HAYES et al., 2006). Segundo Hayes et al. (2004), a terceira onda do behaviorismo pode ser caracterizada por ser particularmente sensível ao contexto e funções do fenômeno psicológico, não se limitando à forma deste fenômeno, e, portanto, tende a enfatizar estratégias de mudança contextuais e experimentais de formas mais diretas e didáticas. Estes tratamentos tendem a buscar a construção de repertórios comportamentais mais amplos, flexíveis e eficazes ao invés de tentar eliminar problemas bem definidos. A terceira onda da terapia comportamental busca assim reformular e sintetizar as gerações anteriores (radical e cognitiva) e as levar adiante para questões, assuntos, e domínios previamente lidados por outras tradições (BROWN; RYAN, 2003), na esperança de melhorar tanto a compreensão como os resultados destes. A ACT utiliza-se de mindfulness3 e ativação comportamental4 a fim de aumentar a flexibilidade psicológica5 de seus clientes, pois considera que o sofrimento psicológico normalmente é causado pela interface entre linguagem/cognição, e o controle do comportamento pela experiência direta (HAYES; STROSAHL; WILSON, 1999). A ACT toma a perspectiva de que a tentativa de modificar pensamentos e sentimentos difíceis é uma forma contraprodutiva de lidar com estes estados, focando-se então em seis processos, descritos por Hayes, Strosahl e Wilson (1999), que são envolvidos com psicopatologias e sua melhora: 9 Aceitação de experiências internas (i.e., aceitar experimentar pensamentos, sentimentos ou sensações físicas desconfortáveis a fim de alcançar uma resposta mais flexível). 9 Desfusão cognitiva ou separação/distanciamento emocional (i.e., observar pensamentos desconfortáveis sem automaticamente tomá-los literalmente ou anexando qualquer valor particular a eles). 9 Estar presente (i.e., ser capaz de direcionar a atenção de forma flexível e voluntariamente para eventos externos e internos presentes ao invés de automaticamente se focar no passado ou futuro). 9 Uma perspectiva/senso de self como contexto (i.e., estar em contato com um sentido de continua conscientização). 9 Identificação de valores que são importantes para o indivíduo. 9 Comprometimento em ações dirigidas a valores identificados. A ACT lida com varias formas de transtorno de ansiedade (ORSILLO et al., 2005), entre elas, fobias especificas, como é o caso do medo de dirigir. Rafailov (2003) define a fobia como um medo específico intenso mórbido e/ou irracional perante certa situação, idéia, coisa (animadas ou inanimadas), algum tipo de comportamento, pessoa ou grupo, que frequentemente provoca uma fuga através do pânico. O medo de dirigir é uma forma de fobia especifica também conhecida por amaxofobia, isto é, o medo de: 1) dirigir carro ou outro meio de transporte; 2) causar acidentes; e 3) viajar no assento dianteiro; que leva a uma inquietação permanente e desproporcional que surge antes, durante e após o ato de dirigir (RAFAILOV, 2003). 3 Forma especifica de atenção plena – concentração no momento, intencionalmente, e sem julgamento. 4 Ativação comportamental é uma forma de terapia estruturada que tem um objetivo claro: promover a ativação de atividades positivas e recompensadoras, frequentementereduzindo padrões de evitação (MARTELL; ADDIS; JACOBSON, 2001). 5 Flexibilidade psicológica é a habilidade de se engajar em comportamentos positivos baseado em valores enquanto experienciam pensamentos, emoções ou sensações difíceis (HAYES; STROSAHL; WILSON, 1999). 13 Rev. Educ., v.18, n.24, p.10-15, 2015 Agindo Sobre o Medo de Dirigir: um Tratamento ao Medo de Dirigir Ross (1995) descreve que muitas vezes a própria pessoa poderia ter capacidade de constatar que seus medos, no caso, em relação à direção, são irracionais e que realmente não influenciam em nada para uma ameaça efetiva ou perigo real. Corassa (2006) sobressalta ainda que o medo nada mais seja do que uma emoção, e que sua função seria de um sinalizador que nos faria precatar contra perigos de fato reais. A fobia, no entanto, “é uma espécie de medo acentuado, excessivo, desmedido, de tal forma que, na presença ou previsão de encontro com o objeto ou situação que causa o medo, surge à ansiedade, num grau elevadíssimo” (CORASSA, 2006, p.16). O medo, segundo Bellina (2003), é muito útil para a sobrevivência das espécies, pois sem ele, organismos poderiam se engajar em comportamentos que poderiam ir contra sua autoproteção e autopreservação, diminuindo assim as chances de sobrevivência e propagação da espécie. Para Hayes, Strosahl e Wilson (1999), o ser humano é o único organismo que tem “fobia”, pois só ele tem a capacidade de utilizar suas habilidades cognitivas para remoer os erros e infortúnios do passado, julgar exageradamente o presente, e temer incertezas do futuro, enquanto que outros organismos simplesmente vivem no presente, reagindo a seu ambiente. Essa descrição é corroborada pelo perfil das pessoas que apresentam medo de dirigir, pois são indivíduos que têm medo de errar, ressentem-se com as críticas e exigem de si e dos outros, observaram sempre as falhas do outro, sofrem antecipadamente pelo erro que podem cometer ou ainda não cometeram, e frequentemente possuem alguma comorbidade, como um nível elevado de ansiedade generalizada, fobia social, transtorno do pânico, TEPT, TOC entre outros (CORASSA, 2006; BELLINA, 2003; EIFERT; FORSYTH, 2005). Outro termo conhecido ao se falar sobre medo de dirigir, é a conhecida Síndrome do Carro na Garagem - SCG, o qual se justifica por se tratar de indivíduos que tem veículo próprio e carteira de habilitação, porém, evitam de todas as formas o ato de dirigir, ficando assim, o carro estacionado em sua garagem (MESTRE; CORASSA, 2001). As autoras relatam que essas pessoas quando pensam em fazê-lo, passam a sentir tremores nas pernas e mãos, perdem o fôlego, ficam com placas vermelhas pelo corpo, suas mãos ficam geladas e pegajosas de suor, dormem mal na noite anterior a dirigir e, mesmo sendo pessoas muito honestas, se obrigam a ‘inventar’ desculpas que justifiquem o não dirigir, sofrem por não fazê-lo e sofrem mais ainda se tentam fazê-lo (MESTRE; CORASSA, 2001, p.5). Fonseca (1998) comenta que existem vários níveis e situações quando se trata do medo de dirigir. Há pessoas que não conseguem sequer aprender a dirigir, e que, mesmo sem ao menos ter tentado aprender, já criam uma sugestão do medo, devida talvez a noticiários de jornais, rádios, televisão, ou de algum acidente conhecido. Essas sugestões podem ser tão fortes, a ponto de o indivíduo só pensar no ato de se assentar no banco do motorista leva-o a passar mal. Outras ainda quando estão viajando de carro, ficam exageradamente tensas, entre várias outras possibilidades. O medo de dirigir acarreta numa importante limitação no desenvolvimento do dia-a-dia das pessoas, bem como pode ter repercussões negativas nos âmbitos pessoal e social, como baixa autoestima, dependência de outras pessoas e dificuldades de enfrentamento de situações no cotidiano (CARVALHO et al. 2011). Pensando nos malefícios mencionados acima devido a medos específicos, diversos tratamentos a ansiedade foram desenvolvidos, sendo um deles a ACT. A teoria de ACT sobre psicopatologias sugere que a evitação experiencial6 e fusão cognitiva7 contribuem e mantém várias formas de psicopatologias, incluindo desordens de ansiedade (HAYES et al., 1996). Deve-se notar, no entanto, que estes processos não são em si nocivos, mas que podem se tornar destrutivos quando se tornam uma forma rígida de operar na vida, e estão relacionados à evitação de atividades importantes e significativas (HAYES; STROSAHL; WILSON, 1999). Um procedimento que tem produzido resultados clínicos significantes no tratamento de transtornos de ansiedade, em especial nos medos específicos, é o tratamento por exposição (OST, 1989). Segundo Orsillo et al. (2005), a ACT é uma terapia que de muitas maneiras é consistente com esta forma de tratamento, e que, além disso, lida diretamente com as questões de comorbidade, medo e evitação relacionado à exposição, bem como qualidade de vida. Diferentemente de outras formas de tratamento, ACT não se foca na luta pela diminuição de sintomas, como aqueles descritos pelo DSM-IV, pois considera que este processo de luta é muitas vezes contra produtivo. A ACT é uma terapia baseada em aceitação8, se focando nos valores e qualidade de vida de seus clientes, notando-se que a utilização conjunta de aceitação e técnicas de exposição tem demonstrado um menor risco de abandono de tratamento (EIFERT; FORSYTH, 2005). De acordo com Orsillo et al. (2005), indivíduos que tem medo especifico não estão dispostos a experienciar sintomas de ansiedade que surgem quando são expostas as situações ou objetos que temem. Apesar de não ser difícil para algumas pessoas evitar situações ou objetos que temem, muitas vezes, as vidas destas pessoas são limitadas por estes medos, o 6 Evitação experiencial pode ser definida como um fenômeno que ocorre quando uma pessoa não está disposta a manter contato com experiências privadas e toma ações a fim de alterar a forma ou frequência destes eventos e os contextos que ocasionam eles (HAYES et al., 1996). 7 Fusão cognitiva se refere a fundir com ou ligar um conteúdo literal de experiências privadas nas quais nós respondemos a um pensamento ou sentimento não como um pensamento ou sentimento, mas como um evento real que o pensamento ou sentimento descreve (HAYES et al., 1996). 8 Aceitação não deve ser visto como tolerância passiva ou resignação, mas como uma capacidade de abraçar ativamente experiências internas na medida em que ocorrem (HAYES et al.,1996). 14Rev. Educ., v.18, n.24, p.10-15, 2015 SIQUEIRA, V.R. que pode preveni-los de viver uma vida de acordo com seus valores. Deve-se notar que o terapeuta dentro de uma perspectiva da ACT se preocupa muito com a relação terapêutica que constrói, colocando-se numa posição de igualdade e se mostrando de forma genuína, até mesmo vulnerável, buscando não criticar, julgar ou “pregar” a forma mindful de viver, considerando o objetivo final da terapia como uma oportunidade do cliente aprender e praticar novas formas mais flexíveis de responder frente à ansiedade, não a considerando como um obstáculo para fazer o que consideram como importante para alcançar uma vida rica e significativa (EIFERT; FORSYTH, 2005). 3.2 Discussão Os participantes tiveram um resultado em média de 34,2 no AAQ na primeira testagem – o que representa baixo nível de flexibilidade psicológica. Na segunda testagem os resultados alcançados foram em média de 41,4 - representa nível médio de flexibilidade psicológica. Por meio destes resultados pode ser observada melhora no nível de aceitação psicológica e consequentemente diminuição da evitação experiencial, que pode ser possivelmente atribuída aos encontros realizados. Como mencionado sobre o AAQ (HAYES et al., 2004), o aumento na capacidade de flexibilidade psicológica está relacionado a menores índicesde sofrimento psíquico em geral, assim resultando na melhora da qualidade de vida dos participantes envolvidos. Além dos resultados empíricos alcançados pelo teste e reteste do AAQ, três participantes relataram estarem ativamente dirigindo, enquanto que o restante disse ter conseguido dirigir em algumas situações (ex.: em ‘estradas de chão’, sem outros carros; em situações na qual o marido ou familiares não estavam vendo; com o apoio da filha; etc.), e que estavam se sentindo progressivamente mais relaxadas com o ato de dirigir. Nas primeiras sessões, no entanto, todas as participantes demonstravam ansiedade no simples ato de falar a respeito do medo de dirigir, muitas vezes tentando “racionalizar” a origem de tais medos. O mediador das sessões abriu espaço durante os encontros para que as participantes falassem sobre seus sentimentos. No entanto, tentou diminuir a frequência das “racionalizações”, pois foi colocado a estas que o importante não era como a ansiedade surgiu, mas sim que todas compartilhavam um medo em comum, mesmo tendo historias de vidas diferentes, direcionando o foco para além da ansiedade, mas sim para uma vida valorosa. Por se tratar de uma terapia em grupo, este formato trouxe outros benefícios (YALOM; LESZCZ, 2005) a seus participantes, como: 1) muitas expuseram se sentirem sozinhas, isoladas e diferentes, mas no grupo puderam perceber que não são as únicas passando por aquela situação; 2) os membros do grupo também relataram aprender muito com a fala das outras participantes; 3) aqueles membros que (segundo elas mesmas) não tinham tanto medo de dirigir, disseram se sentir bem ao servir de modelo para outros participantes do grupo; e 4) as participantes ao observarem a melhora rápida de alguns membros expressaram sentir esperança quanto a agir em relação a seu medo de dirigir. Um dos maiores benefícios que o grupo relatou ter alcançado por meio do projeto foi à aplicação de mindfulness em suas vidas. Segundo elas, o maior problema que tinham (apesar de não terem consciência até participarem do grupo) em relação ao medo específico de dirigir, era que elas “pensavam demais” antes, durante e após o ato de dirigir, sendo que no projeto puderam então lidar melhor com as contingências reais/atuais de suas vidas (ao invés das passadas - muitas vezes traumáticas; o presente repleto de julgamentos; ou as futuras - onde poderiam ocorrer erros e/ou acidentes). Um comportamento considerado digno de nota foi que as participantes fizeram grandes esforços para participar dos encontros, pois no período de três das sessões (do total de cinco) a cidade de Cascavel, PR estava passando por uma estação de ventos e chuvas fortes (bem como alagamentos) que não as impediu de participarem. A hipótese levanta para tal comportamento, e confirmada verbalmente no ultimo encontro, foi que um tratamento que se foca na qualidade e valores de vida de seus participantes, motiva estes em seu tratamento. No ultimo encontro, além das participantes relatarem seu interesse e gratidão pelo projeto, expressaram pretensões de utilizar as técnicas e práticas aprendidas nos encontros, com outros medos e situações de vida (pois notaram seus resultados positivos), observando-se assim um processo de generalização das habilidades aprendidas para outras áreas da vida das participantes, demonstrando o potencial da ACT de não somente tratar sintomas ansiolíticos específicos, mas possivelmente servindo para várias áreas da vida das participantes, podendo ter efeitos mesmo após o fim do tratamento formal. 4 Conclusão É importante notar que este é um trabalho exploratório, e que apesar de demonstrar o potencial positivo da ACT no tratamento do medo de dirigir, não é representativo o bastante (devido ao número de participantes) para generalizar indiscriminadamente seus resultados a uma população maior. Desta forma, é recomendado que outras pesquisas, utilizando- se de grupos maiores, randômicos, sejam realizados a fim verificar e/ou validar os benefícios de um tratamento ACT junto ao medo de dirigir. Referências BECK, A.T.; EMERY, G.; GREENBERG, R.L. Anxiety disorders and phobias: a cognitive perspective. New York: Basic Books, 1985. BELLINA, C. Fobia de dirigir. Rev. Assoc. Bras. Med. Tráfego, v.42, p.30-32, 2003. BROWN, K.W.; RYAN, R.M. The benefits of being present: mindfulness and its role in psychological well-being. J. Personal. 15 Rev. Educ., v.18, n.24, p.10-15, 2015 Agindo Sobre o Medo de Dirigir: um Tratamento ao Medo de Dirigir Soc. Psychol., v.84, p.822-848, 2003. CARVALHO, M.R. et al. Driving cognitions questionnaire: estudo de equivalência semântica. Rev. Psiquiat., v.33, n.1, p.35- 47, 2011. CORASSA, N. Vença o medo de dirigir: como superar-se e conduzir o volante da própria vida. São Paulo: Gente, 2006. CULLEN, C. 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