Buscar

Resenha Anthropology in the Margins of the State (1)

Prévia do material em texto

Resenha: O Estado na Margem da Sociedade: para pensar as fronteiras na cidade
Marianna Olinger�
Das, Veena; Poole, Deborah (Eds.) Anthropology in the Margins of the State. 330 p.,Santa Fé, Oxford: School of American Research Press/ James Currey, 2004.
O livro organizado por Veena Das e Deborah Poole, ainda não publicado no Brasil, é um conjunto de ensaios apresentados em um Seminário realizado pela School of American Research, reunindo vários antropólogos. Em sua preparação, foi solicitado que os participantes refletissem sobre o que constituiria “a etnografia do Estado enquanto práticas, lugares e linguagens consideradas à margem do Estado-nação.” (p.3) Apesar de os antropólogos convidados focarem seus trabalhos em países impactados por reformas políticas e econômicas recentes, o objetivo do estudo era distanciar-se da idéia de que tais reformas teriam produzido o enfraquecimento ou encolhimento das formas de regulação e pertencimento que supostamente constituem o moderno Estado-Nação. 
Nesse sentido, a estratégia descritiva e analítica utilizada pelos autores foi a de distanciar-se da imagem do Estado como “uma forma de organização política administrativa racionalizada enfraquecida ou menos articulada” (p.3) em suas margens sociais ou territoriais. Ao invés disso, os pesquisadores 	. A idéia central do conjunto de trabalhos é repensar as fronteiras entre centro e periferia, público e privado, legal e ilegal, questionando a idéia amplamente difundida de que as margens espaciais e sociais de um Estado – pensado enquanto função organizadora/ordenadora - são lugares de desordem, onde o Estado não conseguiu impor sua ordem. 
Das e Poole, no capítulo introdutório, ressaltam que as margens exploradas nos ensaios, localizadas sempre nas margens do que é aceito como território de controle “inquestionável” do Estado, são ao mesmo tempo lugares onde a natureza pode ser imaginada como selvagem e incontrolada, e onde o Estado é constantemente re-fundado em suas formas de ordenar e fazer leis, sugerindo que as margens são “decorrência e implicação necessária do Estado, assim como a exceção é um componente necessário da regra”� (pag. 4). 
Apesar de o livro focar no estudo do Estado através da Antropologia, a filosofia e a ciência política também foram mobilizadas durante as discussões, levando o leitor a confrontar as realidades observadas através das etnografias apresentadas nos ensaios com as teorias da filosofia e da ciência política sobre a formação e manutenção do Estado moderno. Ainda na introdução, Das e Poole propõem um diálogo com Weber, sugerindo que para entender o “problema” das margens é preciso discutir o monopólio do uso legítimo da força física para manutenção da ordem do Estado, concebido como um projeto incompleto, que deve ser sempre reafirmado através da invocação da ameaça da falta de leis e desordem, que viria tanto de fora como de sua própria jurisdição.
As investigações apresentadas no livro foram realizadas em regiões consideradas, em teorias políticas comparadas, como “novas nações” com Estados “falidos” ou “fracos” (na África, América Latina e Sul da Ásia). Através do mapeamento do impacto da presença do Estado na vida cotidiana de locais considerados marginais, nessas regiões, os pesquisadores buscaram sinais de racionalidades administrativas e hierárquicas que provessem ligações aparentemente coordenadas com o aparato político e regulatório de um Estado central e burocrático. Os autores sugerem que as ações dos governos eleitos e do aparato legal são, em grande medida, determinadas pela reconstituição do Estado e sua infra-estrutura nas margens através do uso da vigilância e da violência sancionada pelo Estado. Os trabalhos apresentados ainda sugerem que, ao exercer o poder em áreas marginais, onde diz ter pouco controle, o Estado mantém e/ou fortalece sua base centralizada de poder através do uso da violência e vigilância – pelo menos temporariamente - a um alto custo para seus habitantes. 
Os autores vão então propor ir além do modelo espacial “centro-periferia” para discutir a idéia de margens, e ao longo dos onze capítulos vão analisar as margens sob três perspectivas distintas. A primeira deu ênfase à idéia de margens como periferias formadoras de “enclaves naturais” para pessoas insuficientemente socializadas na e pela lei. Os pesquisadores buscaram entender o que eles chamaram de “tecnologias” de poder através das quais Estados tentam “administrar” ou “pacificar” tais populações, seja através da força como também de uma pedagogia de conversão – com o objetivo de transformar “sujeitos fora da lei” (unruly) em sujeitos “dentro da lei” (lawfull). 
A segunda focou nos conceitos de legibilidade e ilegibilidade (legibility and illegibility) do Estado (suas leis e regulamentos). Tais conceitos são utilizados para explicar como as leis e regulamentos do Estado são apreendidos ou entendidos pelas pessoas. Os autores reconhecem que práticas documentárias e de produção de estatísticas do Estado objetivam, de alguma maneira, o controle sobre seus sujeitos e territórios e concluem que a noção de que o Estado é, ou se constrói, em função de sua legibilidade não procede. Ao contrário, as pesquisas apresentadas sugerem que os vários espaços, formas e práticas diferentes, através das quais o Estado é continuamente vivido e desfeito através da ilegibilidade de suas próprias práticas, documentos e palavras, é o que o define ou constrói. 
Por fim, a terceira abordagem focou nas margens como espaços entre corpos, lei e disciplina, já que o poder soberano não é exercido somente sobre territórios, mas também sobre corpos. Alguns autores utilizam o conceito de biopolítica e biopoder, argumentando que a produção de um corpo biopolítico é uma atividade originária de poder soberano. Por biopoder os autores entendem a forma como o poder penetra nas ramificações do social, campo onde a vida é colocada em questão, trazendo aí o papel crescente da medicina em definir o que é “normal”, e portanto, criando categorias “anormais”. Nesta abordagem, as margens são observadas a partir do que os autores chamam de “colonização” da lei pelas disciplinas, da produção de categorias “patologizantes”. As três noções de margens utilizadas pelos autores sugerem diferentes modos de “ocupação” das margens, ao invés de encerrar a discussão em histórias de exclusão. 
Outra idéia importante que os autores vão discutir ao longo dos ensaios é a idéia de exceção, com base no trabalho de Agamben (2003), que defende a exceção é necessária para a construção e manutenção da soberania, construindo uma discussão na qual a lei e a sua ausência são parte de um sistema no qual é permitido ao soberano (Estado) suspendê-las em nome de um Estado “excepcional”, ou “emergencial”. Logo no capítulo introdutório Das e Poole argumentam que apesar de a “exceção” tender a ser tratada como uma forma de poder emergencial, compreendida como um aspecto aberrante dos Estados modernos, neste trabalho o conceito de exceção usado pelos pesquisadores vai além do sentido de um evento que pode ser confinado a um tipo de espaço ou períodos no tempo, ou ainda como condição que está oposta, de alguma forma, a formas “normais” de poder do Estado. Os autores argumentam que as práticas do Estado em zonas de emergência, ou Estados de exceção, não podem ser entendidas em termos de lei e transgressão, mas sim em termos de práticas que repousam simultaneamente fora e dentro da lei. Além disso, o que os trabalhos vão mostrar é que nos contextos identificados como margens, as práticas consideradas excepcionais são parte da vida cotidiana, a regra. 
Através da análise das práticas do Estado como práticas de exceção em contextos marginais, que os trabalhos apresentados os autores fazem uma discussão instigante sobre a constituição, manutenção e re-constituição das leis como fundamentalmente atreladas à atuação do Estado nas margens. Nos ensaios apresentados as margens são vistas como o centro das práticas que, na visão dos autores, parecem mantere/ou re-fundar continuamente a lei, através de formas de violência e autoridade - que podem ser tanto extrajudiciais como percebidas anteriores ao Estado. Os ensaios apresentados por Poole e Sanford, sobre contextos marginais no Perú e Colombia respectivamente, vão sustentar a idéia de que as origens da lei podem ser traçadas a formas fundadoras ou privadas que precedem o Estado. Nesse sentido, as origens das leis emergem não como “mito” do Estado, mas nas práticas de indivíduos cujas habilidades de representar o Estado, ou de aplicar as leis, se valem em sua habilidade reconhecida de atuar simultaneamente - e impunemente - dentro da lei e fora da lei. Para ilustrar esse argumento, as autoras apresentam figuras como os Gamonais no Peru e os Paramilitares na Colômbia, figuras de autoridade local que representam ao mesmo tempo formas altamente personalizadas de poder privado e a supostamente “impessoal” autoridade do Estado. Tais figuras representam ao mesmo tempo o esfacelamento da jurisdição do Estado e sua contínua re-fundação através de sua apropriação da justiça privada e violência. Exemplos como esses revelam a forma na qual pessoas que representam a lei, a burocracia e a violência que constituem o Estado, se movem além do domínio do mito do Estado “legal, justo e impessoal” para se juntarem a realidade da vida cotidiana. Nesse sentido, as autoras contribuem para entender como a fronteira entre o legal e o “extra” legal se move dentro dos escritórios e instituições que representam o próprio Estado. 
No ensaio sobre a experiência de pesquisa em comunidades com altos níveis de pobreza, consideradas marginais, no Estado-nação Peruano, Poole propõe pensar sobre o lugar da “incerteza” como se constituinte de uma espécie de margem ao longo da qual pode se ver a legitimidade do poder do Estado se revelar, descrevendo contextos onde a justiça, apesar de um direito em si mesma, raramente se efetiva. Como uma linguagem da disputa – e da contenção - a justiça (nos Estados liberais) envolve a luta entre discernir e fazer cumprir a margem escorregadia que distingue o interesse público do privado. No Peru, a autora descreve essa luta como simultaneamente a divisão entre o peru real e o peru legal. 
Essa popular expressão, também muito conhecida do contexto brasileiro, evoca duas formas de divisão: entre o procedimento jurídico razoável/racional e a aplicação (ou não aplicação) das leis, separando muitas vezes a justiça “oficial” e o individuo que representa o Estado. Como imagem de nação, essa imagem de dois Estados separados (o legal e o real) constrói no senso comum uma idéia de que coisas como a justiça e o serviço publico “a serviço do bem comum” são inerentemente ficcionais, e ao mesmo tempo partes muito reais do que é ser o Estado. Poole argumenta que apesar de na teoria democrática presumir-se que para o alcance da sociedade democrática “ideal” é necessário banir os serviços de regulação privados (corrupção e outras formas de regulação fora da lei), o que o estudo de caso peruano sugere é que “é precisamente a tensão entre esses entendimentos contraditórios do projeto do Estado moral que explica porque, apesar da experiência das mãos pesadas da repressão do estado, as práticas marginalizadas das agencias governamentais e da devastação inacreditável das economias de mercado, os camponeses – talvez mais do que qualquer outro setor da sociedade peruana – continua a acreditar e lutar pela justiça e pela reforma democrática” (p. 61). 
Nesse sentido, os ensaios de Jeganathan e Nelson dão continuidade ao proposto por Poole, sugerindo que uma visão diferente da justiça anima atividades que acontecem nas margens do Estado. Para esses autores, o que está em jogo nesses locais é construído através de experiências dos “mundos” locais, e que, apesar de esses mundos não estarem em posições opostas ao Estado, eles estão presos em relações desiguais, mas onde se influenciam mutuamente. Isso fica bastante evidente no quinto capítulo, onde Nelson, descrevendo a relação entre populações indígenas e o Estado no período pós-guerra na Guatemala, descreve como posições que poderiam ser fixas, como vítimas e perpetradores, acabaram por ser altamente móveis, chamando atenção a complexidade da vivencia naquele contexto e de como essa vivência molda as noções de justiça e lei de formas diferentes da que se tem nos imaginários dos espaços oficiais de representações da justiça e da lei. 
Fica evidenciado ao longo dos ensaios que a distinção do que é legal e ilegal na vida cotidiana das pessoas é nebulosa. A ilegibilidade do Estado, apresentada por Das como a dificuldade de leitura e compreensão de suas regras e regulações, permite que a oscilação entre o racional e o mágico seja a característica definidora da sua presença nessas margens. A ilegibilidade das regras, e as ações humanas que incorporam essas regras, parecem ser parte da forma como as regras são implementadas. Ou seja, não é que o modelo de sociabilidade encontrado nas instituições do Estado seja baseado na clareza das regras e regulações e que esse se tornam ilegíveis para os pobres ou analfabetos, mas sim que as mesmas pessoas encarregadas pela implementação das regras talvez tenham que fazer um esforço para entender as regras e regulações. 
No nono capítulo, Das, em seu ensaio sobre políticas de emergência na Índia, faz questão de ressaltar as relações dúbias e mutantes entre governados e o Estado nas margens. Ao discutir a mobilidade fluidez entre as relações população/ Estado, ela descreve como vítimas de massacres após a morte de Indhira Gandhi na Índia, nos quais representantes do Estado – especialmente a policia – estiveram diretamente envolvidos, ficaram presos em uma relação controversa com o Estado, já que o mesmo Estado responsável pelos massacres era também responsável pela produção de documentos dos quais eles dependiam para buscar compensação. No mesmo capítulo, ao descrever o plano nacional emergencial implementado na Índia de 1975, quando medidas que Das denominou draconianas foram utilizadas para reduzir a população e limpar as cidades, a autora mostra como o que ela chama de “ecologia cotidiana do medo e da cobiça” fazia com que os pobres terminassem sendo parceiros do Estado na implementação de políticas perversas. No contexto apresentado, a autora descreve como dois esquemas administrativos que eram parte da política normal de habitação e de planejamento familiar do estado acabaram sendo implementados no plano nacional de emergência de forma absolutamente arbitrária, onde populações pobres eram removidas forçadamente de suas casas em áreas centrais da cidade e seus requerimentos de habitação na periferia eram condicionados a apresentação de certificados de esterilização.
Das finaliza seu ensaio mostrando como as colônias periféricas, onde os pobres foram reassentados após o plano nacional emergencial, são exemplos de como a regulação do Estado tem uma natureza arbitraria, já que a vida cotidiana é marcada por todo tipo de negociações “extra” legais entre funcionários locais e os moradores. A análise da autora vai centrar em como essa ecologia cotidiana do medo e da cobiça foi traduzida no nível local em uma estrutura de co-vitimização, onde as pessoas passaram a procurar parentes ou vizinhos ainda mais pobres, que pudessem ser induzidos a passar por uma esterilização por dinheiro, “comprando” os certificados de esterilização que iriam garantir suas novas casas. Assim, imigrantes pobres, mendigos, e outras pessoas sem teto também foram induzidos a passar por esterilização, e um mercado informal de certificados de esterilização se desenvolveu.
Nesse ensaio Das nos mostra que, visto a partir da perspectiva das “margens”, ou do “oprimido” o Estado de emergência não é exceção, mas sim a regra e que as negociações em torno da linha tênue que divide o legal e o ilegal são parte da vida cotidiana nessas comunidades. É precisamente porque os documentos podem ser falsificados e usados fora de contexto, e porque os processos burocráticose legais não são legíveis mesmo para aqueles responsáveis pela sua implementação, ela argumenta, que o Estado pode penetrar na vida da comunidade e ainda assim permanecer elusivo. Por sua vez, a racionalidade burocrática pode sempre evocar os fatos de sua ilegibilidade aos pobres como sua principal forma de defesa. A autora mostra como a lógica burocrática do Estado desloca a noção de irracionalidade e pânico ao publico crédulo e, portanto, constrói a si mesmo como racional, em sua deliberada ausência de transparência. 
Outra questão que importante que emerge das discussões propostas no livro é a da idéia de homogeneidade das populações nas margens. Os autores sugerem que no imaginário do Estado existe uma idéia de populações marginais como “entidades” homogêneas e estáveis, a serem administradas por esse Estado. No entanto eles apontam que os habitantes das margens não são “um grupo” homogêneo, nem tampouco objetos inertes, mas que formas de governança, relações sociais em torno de diferentes experiências e gêneros culturais, produzem linguagens e formas diferentes de se relação com o Estado. Nesse sentido, o ensaio anterior ao capítulo conclusivo, da autora Victoria Sanford, problematiza a questão do poder do Estado versus agencia das populações marginais. Através da descrição da dinâmica de deslocamento das comunidades vítimas da guerra na Colômbia e suas estratégias de sobrevivência e retorno a seus territórios de origem, a autora argumenta que essas comunidades não são apenas objetos do controle do estado, mas também estão ativamente envolvidas em delinear seus futuros em relação ao estado. 
O livro finaliza com um capítulo no qual Talal Assad faz uma reflexão teórica sobre alguns dos temas discutidos nos estudos apresentados ao longo do livro. Ele discute a evolução da idéia de Estado desde sua origem, na autoridade soberana, até o conceito moderno de Estado, no qual se criou uma abstração onde Estado é uma entidade com vida própria, distinto dos governados e dos governantes. Assad afirma que essa abstração é condição essencial para o exercício de tipos específicos de poder legal - não importando se eles são requeridos pelo governo ou pelos cidadãos. Partindo da idéia de “abstração” do Estado, Assad faz uma discussão interessante sobre a “imparcialidade” ou “neutralidade” do Estado na relação com a população. Ele lembra que apesar de a teoria política liberal alegar que o Estado deve tratar seus cidadãos com igual preocupação e respeito, o principio da igualdade legal não depende de “preocupação e respeito”. Ao contrario, a aplicação estrita do princípio de igualdade legal requer que todos os cidadãos sejam tratados com absoluta indiferença. Ele então chama atenção para o fato de que a aplicação do principio da igualdade legal permitir que diferentes sejam tratados de forma igual, aprofundando assim as desigualdades existentes na sociedade. 
 
Se por um lado, o conjunto de trabalhos organizados por Das e Poole trazem uma contribuição importante para a antropologia do Estado como um todo, ao apresentar formas alternativas de compreender as margens, que ultrapassam o modelo espacial centro-periferia, o trabalho também se revela útil para ajudar a repensar práticas do Estado em outros contextos marginais nas cidades brasileiras. 
A discussão instigante sobre a característica “quase permanente” do Estado de Exceção em contextos marginais, nos remete ao debate proposto por Francisco de Oliveira (2003), no qual apresenta a problemática do estado de exceção (que reproduz diferença e marginalidade) sugerindo a existência do que ele chamou de apartheid como condição necessária e naturalizada de um estado de exceção, que convive perfeitamente com as instituições democráticas e vai reproduzindo como regra. Em outro trabalho, Ribeiro (2007) utilizando o conceito de Oliveira, ao discutir o modelo de desenvolvimento nas regiões metropolitanas brasileiras, sugere que atravessamos um quadro institucional onde se governa pela exceção, onde “multiplicam-se os projetos municipais de urbanização de favelas, ao mesmo tempo que não existem políticas metropolitanas que aumentem a oferta de moradia, a mobilidade urbana e que regulem a especulação imobiliária, submetendo-a a função social do uso e ocupação do solo e aos imperativos da justiça distributiva na alocação territorial dos bens e serviços urbanos” (p. 52-53) 
Finalmente, se o conjunto de ensaios por um lado mostram a relação intima entre lei e estados de exceção, ele também aponta que esses espaços de exceção são também aqueles nos quais a criatividade das margens é visível, como formas alternativas de ação política e econômica são instituídas. O trabalho nos alerta para o fato de apesar de certas populações serem “patologizadas” através de vários tipos de práticas de conhecimento e poder, elas não se submetem a essa condição passivamente. Nesse sentido, vale destacar os ensaios de Cohen, Das, Ashforth e Stanford, que mostram de forma brilhante como as populações objeto de políticas “ilegais” e predatórias do Estado, também utilizam das brechas entre a lei, sua aplicação e o Estado, para mover-se e desenvolver suas estratégias de sobrevivência. Desta maneira, populações “administradas” desenvolvem suas próprias estratégias em relação às, e determinadas pelas, políticas do Estado para requerer sua cidadania. E é neste ponto que o trabalho nos aponta um espaço não preenchido, de onde podemos partir para pensar alternativas possíveis de fortalecimento das populações em contextos marginais. 
Referências bibliográficas:
AGAMBEN, Giorgio. Estado de exceção. São Paulo: Bointempo, 2003.
OLIVEIRA, Francisco (2003). Crítica à razão dualista e o ornitorrinco. S. Paulo: Boitempo.
RIBEIRO, Luis César Queiroz e JUNIOR, Orlando Alves dos Santos (2007). As Metrópoles e a questão social Brasileira. Editora Revan.
 
� Marianna é mestre em Políticas Sociais e Planejamento pela London School of Economics and Political Science, e bacharel em Administração pela Universidade do Estado de Santa Catarina. 
� Tradução livre do autor.

Continue navegando