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UNIVERSIDADE COMUNITÁRIA DA REGIÃO DE CHAPECÓ UNOCHAPECÓ RESENHA CRÍTICA DO LIVRO: O CASO DOS EXPLORADORES DE CAVERNAS Ricardo Metz Weitz Chapecó - SC, 01 de setembro de 2018 Lon Luvois Fuller, autor do livro, foi um prestigiado jurista americano. Nascido em em 1902. Formou-se em Direito e Economia em Stanford. Lecionou por mais de 30 anos Teoria do Direito em três importantes universidades norte-americanas. Em paralelo à vida acadêmica publicou diversos estudos sobre teoria do direito, filosofia e direito civil. Um dos seus estudos mais notáveis é o presente livro, O Caso dos Exploradores de Cavernas, de 1949. Podemos também citar a obra The Morality of Law (1964) como principal contribuição do autor para o Direito ocidental. Faleceu em 1978, porém deixou seu legado, indispensável à estudantes e professores de direito. Em O Caso dos Exploradores de Cavernas, de Lon L. Fuller, conhecemos o fictício, porém intrigante julgamento por assassinato de três exploradores que ficaram presos em uma caverna. Conta-se que um grupo de quatro espeólogos decide explorar a caverna e após um deslizamento de terra ficam presos embaixo da terra. São enviadas equipes de resgate, porém a grande quantidade de terra e os frequentes deslizamentos acabam dificultando o procedimento, e pior, matando dez resgatistas. Após alguns dias o resgate consegue comunicação com o grupo através de um rádio e os informa que a permanência deles sob o solo irá perdurar por mais dez dias, no mínimo. Um membro do grupo, o qual até então tinha quatro pessoas, chamado Whetmore, propõe um sorteio para que um deles seja morto para que sua carne sirva de alimento ao demais. Depois de alguns debates a ideia é aceita pelos colegas, porém o próprio Whetmore se arrepende e desiste do plano. O restante do grupo, já conformado com a ideia, decide levar o plano a cabo e realiza o sorteio. O próprio idealizador da proposta foi sorteado e morto pelos companheiros. Após o resgate ser realizado, os três sobreviventes foram acusados e denunciados pelo homicídio de Roger Whetmore. Após longo processo de recolhimento de provas e julgamento eles foram considerados culpados em primeira instância e condenados à forca. Sem haver nada na legislação do país que pudesse os inocentar ou diminuir a pena, a única saída dos acusados seria conseguir um perdão do Poder Executivo, porém este ainda não havia se pronunciado sobre o caso. Dessa forma os condenados recorreram ao Superior Tribunal de Newgarth e cada juiz pode dar seu voto e explicitar as razões que o motivou. O primeiro a discorrer sobre os fatos foi o Juiz Truepenny, o qual explicou os motivos que levaram os jurados à decidir pela condenação. Alegou que seus colegas, juízes de primeira instância, apenas cumpriram sua obrigação cumprindo a legislação. Ainda cita um trecho da lei que diz “Quem quer que prive intencionalmente a outrem da vida será punido com a morte”. Como é uma regra sem exceção acredita-se que a decisão deva ser mantida pelo Poder Judiciário. Apela-se para que o Executivo solidariza-se e conceda o perdão para os acusados, pois somente dessa forma a justiça será feita, tanto para os acusados, quanto com a legislação. Em seguida se apresenta o discurso do Juiz Foster. Este desde o começo de sua fala já deixa claro sua convicção pela absolvição dos indiciados. Apresenta dois argumentos. No primeiro deles alega que só se pode aplicar o direito positivista para quem está em condições de viver em sociedade. Dado que o grupo estava isolado geograficamente e em situação de extrema fragilidade física e moral, o que rege as relações é o estado natural. As leis empregues na caverna não são aquelas do Estado, mas sim as leis criadas por eles, na situação em que se encontravam. No segundo argumento, Foster diz que cada lei deve ter um propósito, o qual na legislação penal, seria obstar o cidadão de cometer crimes. Para exemplificar como tal propósito pode ser falho, o juiz discorre sobre o excludente de legítima defesa. Uma pessoa ao ser agredida automaticamente irá se defender, não se importando no que diz a legislação a respeito. O presente caso se enquadraria na mesma justificativa. O objetivo do grupo era sobreviver, não havia para eles legislação penal à frente das próprias vidas. Foster não acredita que a legislação do país esteja incompleta e que absolvendo os acusados estará desrespeitando as leis. Ele acredita que a lei deva ser interpretada de maneira inteligente, permitindo assim corrigir o primeiro julgamento. Portanto declara que não há crime de homicídio e vota por reformar a condenação. O próximo voto é do Juiz Tatting. Este se apresenta como profundamente envolvido emocionalmente com o caso. De um lado apresenta simpatia pelos condenados e por outro repulsa por burlar as leis. Faz várias perguntas no seu voto e discorre sobre algumas incoerências do voto do Juiz Foster. Tatting não crê que pode-se colocar aqueles homens em um estado natural e nem que é válido o argumento de Foster utilizando o princípio da legítima defesa. O juiz alega estar impossibilitado de decidir, devido a ambiguidade de suas justificativas e a estar emocionalmente abalado com o caso. Dessa forma pede para se retirar do julgamento. Já o juiz Keen argumenta que seus colegas estão ultrapassando os limites de suas competências. Algo como o perdão do Executivo ser concedido, ou negado, não deve pesar na decisão dos juízes, pois não é de sua alçada. Um juiz não deve decidir se a norma é boa ou ruim, justa ou injusta, deve somente obedecê-la e aplicá-la conforme foi escrita. Argumenta que como cidadão considera os réus inocentes a absolvidos de qualquer crime. Conquanto na condição de juiz, sua função é de fazer cumprir a legislação, a qual jurou lealdade. Rebate as justificativas dos votantes anteriores e cita a lei à respeito do crime de homicídio como fundamento para manter a condenação. O magistrado crê que as consequências negativas de tal precedente à longo prazo seriam muito piores do que o efeito negativo imediato de não abri-lo. Keen alega que seus colegas, comovidos pela dramática situação do caso, tendidos já previamente a inocentar os acusados, procuram, encontram e justificam brechas inexistentes na lei. Contrário à tudo isso, o juiz confirma a condenação. O último jurado é o Juiz Handy, o qual se diz perplexo com os “tormentosos” argumentos dos colegas anteriores. Segundo o juiz, o simples motivo que legitimiza a absolvição é a vontade popular. É deveras perigoso um governo, ou qualquer instituição pertencente a este, se afastar da vontade dos governados. O magistrado mostra-se estarrecido com a recusa dos outros juízes em aplicar o senso comum, quando este deveria ser o principal motivador para tal julgamento. Handy ainda cita uma pesquisa feita por um jornal, a qualrevela que noventa por cento da opinião pública são contrários à morte na forca nesse caso. De modo a respeitar a vontade da sociedade submetida ao Poder Judiciário e acreditando na razão da aplicação do senso comum, o juiz declara a decisão revogada. Com empate de votos, a decisão em primeira instância foi mantida e os condenados foram mortos na forca. Concluo expressando que considero a decisão dos juízes injusta e ilógica. Os magistrados nos levam a crer que no momento que a equipe de resgate descobriu que a operação levaria mais dez dias, o ideal seria cancelar o resgate e deixar que o grupo morresse por si só. Explico. Dez homens morreram no salvamento e milhares de recursos foram gastos, para somente mudar a causa da morte dos exploradores. Sim, pois a morte deles de qualquer forma aconteceria. Se não fosse celebrado o acordo, e um deles não servisse de alimento aos outros, todos pereceriam por fome. Já com o trato celebrado, os três sobreviventes foram condenados à morte. Desse modo tornam-se inúteis todos os esforços gastos e as vidas ceifadas para um resultado ambíguo e desprezível. Há de se considerar a excepcionalidade na situação encontrada. Não havia outra forma de sobrevivência. Nem os legisladores e nem os juristas passaram por situação no mínimo semelhante com a vivenciada por esse grupo de homens. Em situações extremas a objetivo básico e primário de qualquer ser é a sobrevivência. A repulsa pelo ato, com toda certeza foi imensamente maior por parte dos que praticaram do que por nós ou pelos jurados. Não há quem considera que a decisão de matar um amigo foi fácil e a degustação da carne saborosa. Pelo contrário, sabe-se que a decisão foi penosa e somente tomada por extrema necessidade. Por conseguinte não há como exigir conduta legal em uma realidade com tamanha adulteração. A justiça dessa vez não foi aplicada, nem para quem morreu no resgate, tão pouco para os que morreram na forca.
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