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Oreste Nestor de Souza Laspro 
Advogado. Professor de Direito Processual Civil 
da Faculdade de Direito da USP.
Da expressa proibição à “decisão- 
-surpresa” no Novo CPC.
Sumário
1. Introdução
2. A disciplina do Novo CPC relacionada à veda-
ção da “decisão-surpresa”
3. Alcance do art. 10 do Novo CPC às questões 
cognoscíveis de ofício
4. Consagração da visão contemporânea do princí-
pio do contraditório 
5. Previsões semelhantes no Direito estrangeiro
6. Repercussões da expressa vedação à “decisão- 
-surpresa” 
7. Considerações finais
 Bibliografia
1 Introdução
Era mesmo de se esperar que o Novo Código 
de Processo Civil (NCPC) brasileiro expressa-
mente contemplasse o direito de os litigantes não 
serem surpreendidos, na decisão judicial, por fun-
damento que não foi por eles anteriormente venti-
lado, ou, ainda, de que não lhes foi dado conheci-
mento prévio para se manifestarem. 
Além de se tratar de uma orientação alinhada 
a avançados ordenamentos estrangeiros, é con-
sentânea com o princípio do contraditório (um 
dos pilares do processo civil brasileiro). Ademais, 
numa época em que ainda muito se preconiza a 
efetividade do processo, a previsibilidade da deci-
são judicial assume destaque, inclusive, pelo seu 
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entrelaçamento com a segurança jurídica e pelo seu 
fundamental papel quanto à própria credibilidade do 
Poder Judiciário (OLIVEIRA, 2003, p. 194).
É nesse contexto que o presente ensaio se de-
bruça: com o escopo de elucidar a sistemática do 
assunto pelo NCPC, quer-se avaliar o alcance e 
a conveniência da disciplina ali contemplada, 
além de apontar algumas de suas repercussões no 
cenário jurídico atual – mas tudo sem pretensão 
exaustiva, diante dos estreitos limites propostos 
para este trabalho.
2 A disciplina do Novo CPC relacionada 
à vedação da “decisão-surpresa”
O art. 10 do NCPC1 estabelece: 
“O juiz não pode decidir, em grau algum de 
jurisdição, com base em fundamento a respeito 
do qual não se tenha dado às partes oportunidade 
de se manifestar, ainda que se trate de matéria sobre 
a qual deva decidir de ofício”.
A regra em comento veda o que doutrinaria-
mente se chama de “decisão-surpresa”2 ou “decisão 
de terceira via” – como mais usualmente se refere 
a processualística italiana (GRADI, 2010, p. 827).
Não se tolera um pronunciamento judicial que 
adota premissas não alvitradas no processo e a res-
peito das quais os litigantes não tomaram conhe-
cimento para viabilizar o debate. A regra, que se 
aplica também em âmbito recursal (a lei fala em 
“grau algum de jurisdição”), alcança as hipóteses 
em que a decisão se alicerça sobre questões cog-
noscíveis de ofício pelo julgador.
Com efeito, os fundamentos sobre os quais a 
“decisão-surpresa” se ampara podem correspon-
der a questões de fato ou de direito (SOUZA, 
2014, p. 136), envolvendo matéria de direito pro-
cessual ou de direito material. Ilustram isso: a 
declaração incidental de inconstitucionalidade 
de uma norma,3 o reconhecimento de ofício da 
prescrição, o reconhecimento de matérias relati-
vas a ausência das condições da ação, nulidades 
ou de pressupostos processuais. Desse modo, vis-
lumbrando qualquer uma dessas hipóteses antes 
de prolatar sua decisão, o juiz deve propiciar a 
oportunidade para as partes se manifestarem.
À proibição de uma “decisão-surpresa” se har-
monizam, ainda, outras disposições do NCPC, 
tais como: o art. 9º, caput (“Não se proferirá deci-
são contra uma das partes sem que esta seja previa-
mente ouvida”); o parágrafo único do art. 484 (“a 
prescrição e a decadência não serão reconhecidas 
sem que antes seja dada às partes oportunidade 
de manifestar-se”, ressalvada a hipótese do § 1º do 
art. 3304); o parágrafo único do art. 490 (“Se cons-
tatar de ofício o fato novo, o juiz ouvirá as partes 
sobre ele antes de decidir”); o § 4º do art. 919 (que 
condiciona extinção da execução pela pronúncia 
da prescrição intercorrente à prévia oitiva das par-
tes).5 Além disso, o art. 7º assegura aos litigantes a 
A regra em comento veda o que 
doutrinariamente se chama de 
“decisão-surpresa”.
1. Ao longo deste trabalho, as referências aos dispositivos do NCPC 
levam em conta a numeração do texto consolidado com os ajustes 
promovidos pela Comissão Temporária do Código de Processo Ci-
vil e aprovada pelo Senado Federal em 17/12/2014. Disponível em: 
<http://www.senado.gov.br/atividade/materia/detalhes.asp?p_cod_
mate=116731>. Acesso em: 23 jan. 2015.
2. Em obra específica sobre o tema, conceitua-se: “decisão-surpresa 
é uma decisão fundada em premissas que não foram objeto de prévio 
debate ou a respeito das quais não se tomou prévio conhecimento 
no processo em que é proferida” (SOUZA, 2014, p. 136). Ademais, 
“Tudo o que o juiz decidir fora do debate ensejado pelas partes 
corresponde a surpreendê-las” (THEODORO JÚNIOR; NUNES, 
2009, p. 125).
3. Reconhecendo que a declaração incidental de inconstitucionali-
dade pode se dar ex officio, no controle concreto, vide: SILVA, 2004, 
p. 15-16.
4. Tal dispositivo prevê expressamente a possibilidade de o magis-
trado julgar liminarmente improcedente o pedido se verificar, desde 
logo, a ocorrência de decadência ou de prescrição.
5. A exemplo do teor do art. 40, § 4º, da Lei de Execuções Fiscais, 
pelo qual o juiz poderá reconhecer de ofício a prescrição intercor-
rente somente após ouvir a Fazenda Pública.
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paridade de tratamento no processo, “competindo 
ao juiz zelar pelo efetivo contraditório”.
Advirta-se, ainda, que a vedação constante do 
art. 10 não é absoluta. Nada obstante tal dispo-
sitivo não contemple expressa exceção, uma in-
terpretação sistemática orientada pelas garantias 
constitucionais do processo (como a do art. 5º, 
inciso XXXV) autoriza a conclusão de que situa-
ções de urgência com risco de dano irreparável 
ou de difícil reparação excepcionam a vedação 
à decisão judicial baseada em fundamento não 
submetido ao debate das partes (ALMEIDA; 
GOMES JUNIOR, 2012, p. 163); não há aí qual-
quer vulneração ao contraditório e à ampla defe-
sa até mesmo porque não se exclui do litigante a 
possibilidade de se alterar posteriormente aquela 
decisão (o exercício do contraditório é postergado 
ou diferido).
Ademais, a própria sistemática do NCPC re-
força a ideia de que a proibição da decisão-sur-
presa tem ressalvas, eis que, no art. 9º, parágrafo 
único, incisos I a III, se estabelece que nenhuma 
decisão judicial será proferida contra uma das par-
tes sem que esta seja previamente ouvida, exceto 
nas hipóteses de tutela de urgência e de tutela de 
evidência ali previstas. 
3 Alcance do art. 10 do Novo CPC às 
questões cognoscíveis de ofício
A vedação contida no art. 10 do NCPC se tra-
duz na necessidade de oitiva prévia dos litigantes 
sobre aquelas questões inferidas pelo julgador 
como possíveis argumentos da decisão, ainda que 
sejam apreciáveis de ofício ou ainda que se trate 
de matéria deordem pública.
Apesar de a prática forense revelar que as ques-
tões de ordem pública são usualmente decididas 
sem a prévia oitiva das partes, a pretexto de serem 
matérias apreciáveis de ofício (e, por isso, prescin-
direm da manifestação dos litigantes), tal orien-
tação – já repudiada pela doutrina antes mesmo 
do advento do novo Código6 – efetivamente não 
se sustenta à luz do mencionado art. 10. Com 
efeito, o exercício do contraditório e a cognição 
oficiosa do magistrado não se excluem: o juiz age 
sem o prévio requerimento da parte, mas o con-
traditório prévio não pode ser desprezado,7 seja 
por se tratar de inafastável garantia constitucional 
(Constituição Federal – CF, art. 5º, inciso LV), 
seja porque a coleta de informações pelo juiz ou 
tribunal pode ser proveitosa, convencendo-o – por 
exemplo – da desnecessidade, inadequação ou im-
procedência da decisão que iria tomar (OLIVEIRA, 
1993, p. 35).
Somente após efetivo contraditório, portanto, 
a matéria de ordem pública (ou a questão apreciá-
vel sem o requerimento da parte) pode ser adotada 
como motivo da decisão judicial. Essa providên-
cia deve ser observada pelo magistrado, inclusive, 
na hipótese de embargos de declaração recebidos 
excepcionalmente com efeito modificativo 
(BEDAQUE, 2011).
4 Consagração da visão contemporânea 
do princípio do contraditório
A concepção moderna que a ciência processual 
tem do princípio do contraditório vai além do bi-
nômio “informação e reação” – explorado por La 
China (1970, p. 394); agrega-se também a ideia de 
que a participação dos litigantes deve ser incenti-
vada pelo juiz, o qual, de sua vez, deve zelar para 
que haja um diálogo entre ele e as partes, a influir 
no resultado do julgamento (e a culminar, inclusi-
ve, no que parte da doutrina processual referencia 
como um modelo de “cooperação” ou “colabora-
ção” no processo) (BUENO, 2008, p. 55). 
6. Cf. NERY JUNIOR, 2009, p. 227; OLIVEIRA, 1993, p. 35, entre 
outros.
7. A propósito, a Exposição de Motivos da comissão de juristas encar-
regada da redação do Anteprojeto do Novo Código já explicitava tal 
ordem de ideias: “Está expressamente formulada a regra no sentido 
de que o fato de o juiz estar diante de matéria de ordem pública não 
dispensa a obediência ao princípio do contraditório”.
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Nessa perspectiva, desdobra-se a ideia de que 
os litigantes têm o direito de influenciar na pre-
paração da decisão que será prolatada e o juiz tem 
o dever de consultar as partes, chamando-as para 
se manifestarem sobre pontos que ele vislumbra 
como relevantes para a decisão a ser tomada. O 
contraditório, nesses termos, coloca-se para o liti-
gante como uma garantia de influência e também 
uma garantia de “não surpresa” (já que o julgador 
não decidirá fora do que foi submetido ao debate).
É acertado concluir, nesse contexto, que o art. 
10 do NCPC dá concretude ao princípio do contra-
ditório e consagra a perspectiva atual que se tem do 
postulado, já que aquela norma, ao fomentar um de-
bate prévio sobre os fundamentos da futura decisão, 
impõe o “dever de consulta” ao magistrado, além de 
assegurar à parte a garantia de influência (na livre 
convicção do juiz) e a garantia de “não surpresa”.
Conquanto autorizada doutrina afirme que 
a orientação do art. 10 tenha sabor de novidade 
(MARINONI; MITIDIERO, 2010, p. 74; WAMBIER, 
2013), deve ser lembrado que outras prestigiosas 
vozes (THEODORO JÚNIOR; NUNES, 2009, 
p. 125; NERY JUNIOR, 2009, p. 227) já susten-
tavam existir a vedação à “decisão-surpresa” em 
nosso sistema, mesmo sem uma lei específica, 
pois se trata de uma decorrência direta do prin-
cípio do contraditório (como garantia constitu-
cional prevista no art. 5º, inciso LV, combinado 
com o art. 5, § 1º, da CF), cuja concepção mais 
moderna não tolera que o litigante seja surpreen-
dido por decisão embasada em dados estranhos 
à dialética travada no processo. Entendimentos 
do Superior Tribunal de Justiça (STJ) também 
acompanham tal linha de pensamento.8 Nesse 
contexto, a regra contida no art. 10 do NCPC 
não seria exatamente uma inovação.9
De qualquer maneira, temos que o art. 10 do 
NCPC consolida um avanço em nosso ordena-
mento, seja por se harmonizar com a moderna 
ótica que a ciência processual tem do contraditó-
rio, seja por reforçar no plano infraconstitucional 
a existência de direitos e deveres dos participantes 
do contraditório (no que se inclui o juiz), a ponto 
de espancar dúvidas existentes quanto à delicada 
questão de se fomentar o debate prévio sobre ma-
téria apreciável de ofício pelo julgador.
5 Previsões semelhantes no Direito 
estrangeiro
O teor do art. 10 do NCPC segue o que orde-
namentos processuais de vanguarda contemplam 
sobre a proteção contra a “decisão-surpresa”. Des-
taque-se:
i) no sistema francês, o art. 16 do Noveau Code 
de Procédure Civile estabelece que o juiz não 
pode fundamentar sua decisão sobre uma ques-
tão de direito que ele próprio suscitou de ofício, 
sem conceder oportunidade de manifestação às 
8. A título exemplificativo, vide caso em que o STJ repudiou a decisão 
ex officio tomada no âmbito de expropriatória indireta sem suporte 
em pedido expresso da parte interessada e sem assegurar ao interes-
sado o contraditório e a ampla defesa “apanhando-o de surpresa” 
(REsp nº 153828-SP, Rel. Min. Demócrito Reinaldo, DJ de 1º/3/1999). 
Em outro julgado, deparou-se o STJ com sentença fundamentada 
com base na impossibilidade legal de o Inmetro impor multa; todavia, 
tal premissa não foi previamente debatida entre os litigantes, o que 
levou o STJ a reconhecer que o juiz impôs surpresa às partes, anu-
lando o decisum (REsp nº 496348-PR, Rel. Min. Castro Meira, DJe de 
10/12/2010). Registre-se, todavia, em sentido divergente, situação em 
que o STJ já permitiu que o magistrado tomasse decisão ex officio sem 
a necessidade de propiciar o prévio debate ou sem qualquer prévia 
advertência às partes: “Inexiste surpresa na inversão do ônus da prova 
apenas no julgamento da ação consumerista. Essa possibilidade está 
presente desde o ajuizamento da ação e nenhuma das partes pode ale-
gar desconhecimento quanto à sua existência” (REsp nº 1125621-MG, 
Rel. Min. Nancy Andrighi, DJe de 7/2/2011).
9. Didier Jr. (2014, p. 236) trata o art. 10 do NCPC como uma “pseu-
donovidade normativa”, por se incluir no rol de enunciados que 
“reforçam, ratificam, confirmam, corroboram etc. a compreensão 
atual do direito processual civil brasileiro, construída antes da vigên-
cia do novo CPC”. 
Os litigantes têm o direito de 
influenciar na preparação da 
decisão que será prolatada.
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partes;10 trata-se de disposição aplaudida já há um 
certo tempo pela doutrina brasileira, rotulando-a 
como “sábia” e “inspiradora” (DINAMARCO, 
2000, p. 135);
ii) o art. 3º, n. 3, do CPC português dispõe que 
não é lícito ao magistrado, “salvo caso de manifes-
ta desnecessidade, decidir questões de direito ou 
de facto, mesmo que de conhecimento oficioso, 
sem que as partes tenham tido a possibilidade de 
sobre elas se pronunciarem”. Com tom crítico, a 
doutrina lusitana aponta que, à míngua de umcritério legal objetivo, a jurisprudência acaba deli-
berando as situações que se enquadram como de 
“manifesta desnecessidade” (FREITAS; REDINHA; 
PINTO, 2008, p. 10);
iii) o § 139 do CPC alemão (ZPO) proíbe 
qualquer decisão que se apresente como surpre-
sa aos litigantes, sob pena de nulidade (CRUZ 
E TUCCI, 2005, p. 12-22); há registro de que o 
legislador alemão, ao instituir a regra, tinha o ob-
jetivo da redução do número de recursos, na linha 
de que a previsibilidade sobre o provável desfecho 
do processo poderia propiciar satisfação às partes 
com a sentença proferida (BARBOSA MOREIRA, 
2004, p. 201);
iv) o art. 183, § 4º, do CPC italiano prevê o 
dever de o magistrado indicar às partes as ques-
tões cognoscíveis de ofício que pretende utilizar 
como fundamento da decisão; no mesmo senti-
do, o art. 384, § 4º, disciplina o tema no juízo de 
cassação; mais recentemente, a reforma italiana 
levada a efeito pela Lei nº 69/2009 alterou o art. 
101 do CPC, autorizando o juiz a utilizar uma 
questão conhecida de ofício como fundamento 
de sua decisão, desde que ouça as partes previa-
mente – e tudo sob pena de nulidade; ao fixar 
tal sanção (ou consequência) para a decisão-
surpresa, o teor do art. 101 eliminou boa parte 
de inflamadas discussões doutrinárias e jurispru-
denciais até então existentes (sobre ser nulo – ou 
não – tal pronunciamento judicial) (GRADI, 
2010, p. 828-833).
Embora não seja o caso, nos limites deste tra-
balho, de tecer comparações, registre-se que o ca-
minho já trilhado por legislações estrangeiras (so-
bre o tema aqui tratado) anuncia a possível vinda 
de dúvidas sobre o que pode ou não ser considera-
do “surpreendente”, bem como a constatação de 
eventuais imperfeições da sistemática do NCPC, 
traduzindo-se em discussões a serem pacificadas 
pela jurisprudência. De outra parte, a experiên-
cia estrangeira também nos mostra que a direção 
adotada pelo novo Código brasileiro (consolidan-
do o princípio do contraditório em sua moderna 
acepção e a confirmar que o reconhecimento de 
questões de ordem pública deve ser precedido de 
consulta às partes) não nos afasta da busca do pro-
cesso justo e efetivo.
6 Repercussões da expressa vedação à 
“decisão-surpresa”
Dentre outras repercussões que o teor do art. 
10 do NCPC pode trazer, cabe mencionar em 
apertadíssimas linhas:
i) a releitura da aplicação do aforismo iura novit 
curia: o brocardo, que confere ao magistrado a 
possibilidade de se valer de norma não invoca-
da pelas partes para aplicá-la ao caso concreto, 
deve ser redimensionado, a ele se acrescentando 
a noção de que tal possibilidade não dispensa 
a prévia manifestação das partes sobre a qua-
lificação jurídica que pretende dar aos fatos e 
fundamentos do pedido – e tudo como forma de 
concretizar o contraditório e evitar surpresas ao 
jurisdicionado;11
ii) há críticas no sentido de que o NCPC 
deveria especificar qual a consequência ou sanção 
para a prolação da decisão desconforme com o 
art. 10: a ineficácia (MARINONI; MITIDIERO, 
10. Cf. GRADI, 2010, p. 827; LEONEL, 2010, p. 126-127.
11. O entendimento endossado por Oliveira (1993, p. 135) e Trocker 
(1974, p. 369), que trataram do princípio do contraditório pelo prisma 
da cooperação, é também hoje confirmado por Souza (2014, p. 173).
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2010, p. 76). Em nosso sentir, todavia, a prolação 
da decisão-surpresa conduz ao decreto de nulida-
de, por violar o princípio do contraditório e pro-
piciar cerceamento de defesa (o grave vício dessa 
decisão consiste justamente no afastamento de 
um modelo previsto na CF). De toda maneira, a 
crítica ora em comento prenuncia o que ocorreu 
no sistema italiano: o surgimento de variadas dis-
cussões sobre ser nula – ou não – a “decisão de 
terceira via” (o que culminou com a alteração do 
CPC daquele país, com o acréscimo, no art. 101, 
da sanção da nulidade para a “decisão-surpresa”); 
iii) alegação de “prejulgamento” e de impar-
cialidade do juiz: não se sustenta a ideia de que a 
intimação prévia das partes – para falarem sobre 
matéria de ofício – seria indicativo de prejulga-
mento da causa, pois aí se vislumbra a oportunida-
de para o juiz verificar se a decisão que iria tomar 
é acertada – ou não; tampouco existe parcialidade 
nesta postura, já que o juiz age sem armadilhas ou 
surpresas para com todos os litigantes do processo. 
Ad argumentandum, um magistrado que detecta 
uma decisão de ofício e não previne os litigantes a 
tal respeito também correria o risco de beneficiar 
uma parte em detrimento da outra; e se ele corre 
o risco de ser parcial viabilizando o debate prévio 
ou sendo omisso, é preferível aquela primeira op-
ção, mais alinhada à segurança jurídica (SOUZA, 
2014, p. 166);
iv) a celeridade e o princípio da duração razoá-
vel do processo podem ceder espaço para o princí-
pio do contraditório: forçoso reconhecer que retar-
damentos podem acontecer quando o juiz viabiliza 
o debate prévio sobre questões ainda não ventiladas 
no processo; mas tal situação não se traduz em ine-
fetividade e nem pode autorizar o sacrifício do con-
traditório, pilar do processo civil brasileiro. 
7 Considerações finais
Sem prejuízo das reflexões pontuais trazidas a 
este ensaio, cumpre finalizar com o destaque de 
que o art. 10 do NCPC regulou o exercício do con-
traditório, encampando o que já preconizava pres-
tigiosa doutrina, alinhando-se, ainda, com julgados 
do STJ e com a vanguarda da legislação processual 
civil estrangeira. A despeito de críticas e aspectos 
negativos, maiores são os benefícios com a postura 
de sempre ouvir todos aqueles que, de algum modo, 
podem contribuir para uma melhor decisão. 
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Manoel. Um Novo Código de Processo Civil para o Brasil: 
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