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1 UNIDADE 1 UM CONVITE À SOCIOLOGIA: CONCEITOS E APLICAÇÕES OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM PLANO DE ESTUDOS Esta unidade tem por objetivos: • compreender os antecedentes históricos da Sociologia; • entender as concepções sobre as finalidades da Sociologia; • conhecer o pensamento clássico da Sociologia; • compreender as relações entre a Sociologia clássica e a educação. Esta unidade está dividida em três tópicos, sendo que em cada um deles você encontrará atividades visando à compreensão dos conteúdos apresentados. TÓPICO 1 – SOCIOLOGIA: PRIMEIROS PASSOS TÓPICO 2 – KARL MARX E MAX WEBER: EDUCAÇÃO TÓPICO 3 – DURKHEIM, BOURDIEU E BAUMAN E A EDUCAÇÃO Assista ao vídeo desta unidade. 2 3 TÓPICO 1 UNIDADE 1 SOCIOLOGIA: OS PRIMEIROS PASSOS 1 INTRODUÇÃO Nas conversas do dia a dia é muito comum as pessoas opinarem sobre a sociedade, emitindo desde críticas ou até mesmo pareceres com sofisticação ou não, sobre determinados setores específicos. Podemos até dizer que algumas destas pessoas podem ter um parecer com maior consistência teórica, outras podem buscar fatos e dados estatísticos para comprovar a sua versão sobre a sociedade ou, ainda, alguns não conseguem sustentar com fundamento algum o seu parecer sobre propostas de mudanças ou anomalias no interior da sociedade. E nestas opiniões sobre a sociedade podem se fazer presentes elementos como: família, poder, política, educação, dentre outros, que retratam sobre o funcionamento, as anomalias e os possíveis impactos na sua área de atuação ou na educação. Na história da humanidade, você pode encontrar várias teorias sobre a sociedade ou até mesmo propostas para melhorar o funcionamento da mesma ou, inclusive, explicar as anomalias. Estas teorias dependem de época para época, de sociedade para sociedade e de pensador para pensador. Ou ainda, de área para área de estudo. E uma das áreas de estudo que tem se dedicado ao entendimento do funcionamento da sociedade, dentre outras finalidades, é a Sociologia. Neste tópico você estudará o contexto do surgimento da Sociologia e os antecedentes históricos, algumas concepções sobre a Sociologia e as suas finalidades e áreas de estudo. 2 SOCIOLOGIA: SUAS ORIGENS A Sociologia é uma das áreas de estudo que surgiu no início da modernidade com o propósito de compreender a sociedade de um modo geral (é claro, os primeiros sociólogos tinham cada qual o seu entendimento sobre a sociedade). A Sociologia surge no início da modernidade. Todavia, o período anterior à modernidade é conhecido como a Idade Média, historicamente está situada entre o século V ao século XV (para tal período é possível encontrar o termo pré- modernidade). UNIDADE 1 | UM CONVITE À SOCIOLOGIA: CONCEITOS E APLICAÇÕES 4 A Sociologia surge no início da modernidade, ou seja, num período de profundas transformações, como: o Renascimento cultural, a Reforma Protestante, até as grandes navegações que permitiram ao homem superar os obstáculos da natureza. Ou seja, em tal período a mentalidade do homem toma outros rumos, principalmente o de colocar em suas mãos o seu próprio destino. Entretanto, o período anterior à modernidade é conhecido como a Idade Média, quando a mentalidade predominante do homem era a salvação da alma, a fé e, principalmente, o homem deveria guiar-se pela vontade de Deus. Ou seja, o homem de mentalidade medieval ocidental preocupava-se muito com a salvação da alma, no sentido de fazer parte do paraíso celeste e não habitar no inferno, e para tanto deveria preparar-se para salvar a sua alma. FIGURA 1 – PINTURA MEDIEVAL REPRESENTANDO O INFERNO FONTE: Disponível em: <http://gratefultothedead.wordpress. com/2011/08/28/getting-medieval-on-the-doctrine-of-hell/>. Acesso em: 20 de dez. de 2011. Desta forma, podemos afirmar que na Idade Média, de um modo geral, a religião teve um papel relevante na vida das pessoas. Influenciava na política, na educação, na economia, na cultura, na organização da sociedade e até mesmo no entendimento sobre a mesma. A visão de certa forma predominante na Europa era a visão teocêntrica do mundo. Ou seja, do grego (théos: Deus), e neste sentido, o teocentrismo medieval significava que Deus era o centro das atenções e/ou ainda, Deus era a medida de todas as coisas. Inclusive, em tal cenário, as igrejas medievais, de certa forma, frente à sua imponência, tornavam o homem inferior frente a Deus. TÓPICO 1 | SOCIOLOGIA: OS PRIMEIROS PASSOS 5 FIGURA 2 – A IMPONÊNCIA DE UMA IGREJA MEDIEVAL FONTE: Disponível em: <cidademedieval.blogspot.com>. Acesso em: 20 out. 2011. No âmbito social, a sociedade medieval era composta pelo clero, a nobreza e os servos. Era assim porque era “a vontade de Deus”. Ou seja, a sociedade era desta forma porque Deus quis assim. Se a sociedade deveria ser organizada de outra maneira, Deus teria feito o mundo de outra maneira. Neste sentido, na mentalidade medieval tinha-se a percepção de que o mundo era como era porque Deus quisera assim, ou seja, era sua vontade. E se deveria ser de outra maneira o mundo, Deus o teria feito de outro modo. Pode-se dizer que a crença que se tinha no período medieval era de que a sociedade era imutável e para isso buscavam-se justificativas das mais variadas, mas tendo como o ponto de sustentação a vontade de Deus. Para efeito de entendimento da sociedade medieval, alguns homens dedicavam-se a servir a Deus, louvá-lo e pregar as palavras de Cristo no mundo (clero). Outros teriam a função de defender a cristandade com armas em mãos, bem como defender os fracos (nobreza). E, por fim, os que tinham a incumbência de trabalhar para que não faltasse pão para si e para os que defendiam (nobreza) e rezavam (clero). E neste sentido, o lugar que cada pessoa ocupava na sociedade medieval era vontade divina, por isso não deveria ser alterada a ordem social. Como mencionado anteriormente, as justificativas para a sociedade medieval ser da maneira como era estavam em Deus. No entanto, com o início da modernidade, novas ideias começam a se fazer presentes com maior força e UNIDADE 1 | UM CONVITE À SOCIOLOGIA: CONCEITOS E APLICAÇÕES 6 intensidade, e de certa forma contribuíram para outras maneiras de compreender a sociedade. E neste cenário, outras áreas de estudo, como a Sociologia, começam a dar os seus primeiros passos. Entretanto, caro(a) acadêmico(a), outras áreas do conhecimento começam também a estar em evidência e apresentar suas teorias, como a Física, a Química, entre outras. Nos séculos XV e XVI, período do surgimento conhecido como modernidade, há uma mudança significativa de mentalidade. O homem começa a valorizar com mais ênfase as suas capacidades racionais, com o propósito de desvendar com mais afinco a estrutura da natureza e o seu funcionamento. Entretanto, destaca-se que muitos homens e mulheres foram perseguidos devido à nova postura de pensar no período medieval, ou desejar pensar diferente. E a título de registro, cita-se: os aparelhos de tortura medievais, que de certa forma buscavam coibir o surgimento de novas ideias ou pessoas que tinham outra maneira de ver e pensar o mundo. FIGURA 3 – APARELHOS DE TORTURA MEDIEVAIS FONTE: Disponível em: <http://www.planetaeducacao.com.br/portal/impressao. asp?artigo=541>. Acesso em: 20 dez. de 2011. TÓPICO 1 | SOCIOLOGIA: OS PRIMEIROS PASSOS 7 Neste sentido, a cultura teocêntrica perde espaço para a cultura antropocêntrica (antropo: homem: medida de todas as coisas, ou homem sendo o centro das atenções). Pode-se dizer que uma nova forma de ver, agir e pensar aparece, lentamente, entre os homens daquele período e que de certa forma contribuiu para impulsionar diversas transformações que estavam se fazendo presentes naquela época e que tiveram consequências nas diversasáreas do saber. Veja, por exemplo, Leonardo da Vinci e as suas invenções, que é um retrato da nova postura do homem frente ao mundo. Ou seja, um homem que cria, inventa, transforma o mundo do qual faz parte. FIGURA 4 – UMA DAS INVENÇÕES DE LEONARDO DA VINCI – PARAFUSO VOADOR FONTE: Disponível em: <http://hypescience.com/leonardo-da-vinci-melhores-ideias/>. Acesso em: 20 out. 2011. De acordo com Andery et al. (1996, p. 175): na nova visão de mundo, que veio a substituir a medieval, o homem, no seu sentido mais genérico, era a preocupação central. As relações Deus-homem, que eram enfatizadas pelo teocentrismo medieval, foram substituídas pelas relações homem e a natureza. Isso significava, com relação ao conhecimento, a valorização da capacidade do homem conhecer e transformar a realidade. Alguns eventos que se fizerem presentes entre o final da Idade Média e início da modernidade, de certa forma, estão em consonância com a “nova” mentalidade que se faz presente (URBANESKI, 2008). UNIDADE 1 | UM CONVITE À SOCIOLOGIA: CONCEITOS E APLICAÇÕES 8 De forma breve, destacaremos a seguir: Renascimento comercial: o sistema vigente na Idade Média era o feudalismo, no qual a economia era basicamente agrária e autossuficiente. Contudo, a partir da segunda metade da Idade Média, o comércio começou a ser reativado, e dentre os fatores que contribuíram estão as cruzadas e a produção excedente. Além disso, outros fatores estiveram presentes neste período, como: ascensão do capitalismo, incremento do sistema bancário, o mercantilismo e o surgimento de uma nova classe social: a burguesia. Renascimento urbano: a vida no período medieval era predominantemente rural, viviam em torno dos castelos medievais. Contudo, com o renascimento comercial, surgem os burgos (pequenas vilas), onde as pessoas se encontravam para comercializar e trocar ideias, e lentamente começam a surgir as cidades, inicialmente chamadas de burgos. As grandes navegações: “a descoberta” da América (1494) por Cristóvão Colombo; Vasco da Gama chega às Índias (1498) e Pedro Álvares Cabral chega ao Brasil (1500). Foram fatos que contribuíram para ampliar o mundo conhecido e eliminar as ideias de que o mundo era plano, ou ainda, que houvesse monstros nos mares, dentre outras ideias. E, além disso, enalteceu a noção de que o homem era capaz de atravessar os mares e conquistar outros continentes e inclusive colonizá-los: como a África e a América (Novo Mundo). Renascimento científico: o racionalismo e a preocupação com o entendimento da natureza estimularam as pesquisas científicas. Pensadores como Pietro Pomponazzi, Galileu Galilei, Copérnico e Leonardo da Vinci se fazem presentes com novas ideias, experimentos ou inventos. Por exemplo: Pomponazzi pregou a supremacia da razão, negou a Criação, a imortalidade da alma e os milagres. Eram escritos avançados para a época e que questionavam a estrutura existente e até a forma do homem compreender o mundo. Reforma religiosa ou Reforma Protestante: que foi, a grosso modo, um movimento com características religiosas, políticas e econômicas e que iniciou com Lutero na Alemanha, no século XVI (vale destacar que outros pensadores já estavam criticando a Igreja anteriormente). Esta reforma provocou a separação de uma parte da comunidade católica da Europa, dando origem ao protestantismo. Renascimento cultural: que foi um movimento intelectual, artístico e literário ocorrido na Europa, especialmente na Itália, nos séculos XV e XVI, o qual teve entre as suas características: a inspiração nas obras da antiguidade greco- romana, a exaltação da vida, o sensualismo e o gosto artístico. Este movimento foi muito importante para a construção de uma nova mentalidade humana, pois as artes deram impulsos para mudar a forma de ver o mundo. Veja as figuras a seguir, sendo que a Figura 5 representa a mentalidade medieval e a Figura 6 a mentalidade renascentista. TÓPICO 1 | SOCIOLOGIA: OS PRIMEIROS PASSOS 9 FIGURA 5 – A MENTALIDADE MEDIEVAL FONTE: Disponível em: <http://www.snpcultura.org/tvb_giotto_e_fra_angelico_o_melhor_de_ dois_pintores.html>. Acesso em: 20 out. 2011. FIGURA 6 – MENTALIDADE RENASCENTISTA FONTE: Disponível em: <nospassosdahistoria.blogspot.com>. Acesso em: 20 out. 2011. UNIDADE 1 | UM CONVITE À SOCIOLOGIA: CONCEITOS E APLICAÇÕES 10 Caro(a) acadêmico(a), você pode se perguntar: como era a educação medieval? Você deve ter em mente que os aspectos religiosos tinham muita importância neste período, ou seja, a educação era objeto de reflexão, principalmente de pensadores que, de forma direta ou indireta, pensavam de acordo com as ideias vigentes naquele contexto. Neste sentido, para efeito de registro, diz Suchodolski (1992, p. 20): “a verdadeira educação cumpre ligar ao homem a sua verdadeira pátria, a pátria celeste, e destruir ao mesmo tempo tudo o que prende o homem à sua existência terrestre”. Ou ainda, Craver e Ozmon (2004, p. 65) apontam que para Santo Agostinho, um dos pensadores medievais: “o grande objetivo da educação [...], é a perfeição do ser humano e a derradeira reunião da alma com Deus. [...] uma educação adequada direciona o aprendiz para um conhecimento que conduz ao verdadeiro ser, progredindo de uma forma inferior para uma forma mais elevada”. Ou seja, é aceitável mencionar que os propósitos educacionais deste período não destoavam com a mentalidade então vigente. Caro(a) acadêmico(a), você percebeu que no início da Idade Moderna aconteceram fatos e eventos que possibilitaram a mudança do desenho da sociedade da época e, de certa maneira, impactaram sobre a forma dos pensadores teorizarem sobre o mundo ou mentalizarem propostas de organização social que também influenciaram o campo educacional. Neste sentido, até mesmo o entendimento sobre a sociedade começa a mudar, e a Sociologia aparece como uma das áreas de investigação que tem como objeto de estudo a sociedade, principalmente para entender, a princípio, a nova ordem social, econômica e política que estava emergindo naquele período, tendo como base os postulados científicos que estavam ganhando força na época. As primeiras tentativas de se introduzir a Sociologia no Brasil deram-se por meio de sua inserção nos currículos secundários. Antes de 1920 já haviam sido tomadas algumas iniciativas para introdução da Sociologia, na forma de Sociologia da Educação ou da sociologia associada à moral, nos cursos secundários, com forte orientação positivista, isto é, buscando- se análise objetiva para a compreensão da realidade, tendo por padrão o pensamento durkheimiano sobre a educação. Mas foi durante os anos 20, precisamente entre 1925-1928, que a Sociologia passou a integrar os currículos secundários (MAZZA, 2004, p. 97). UNI NOTA TÓPICO 1 | SOCIOLOGIA: OS PRIMEIROS PASSOS 11 Caro(a) acadêmico(a), frente ao exposto acima, você percebeu uma nova forma do homem pensar e entender o mundo no início da modernidade. Para este período, salientam Andery et al. (1996, p. 177): aliada ao rompimento do mundo medieval rompeu-se também a confiança nos velhos caminhos para a produção do conhecimento: a fé, a contemplação não eram mais consideradas vias satisfatórias para se chegar à verdade. Um novo caminho, um novo método, precisa ser encontrado, que permitisse superar as incertezas [...]. Neste sentido, o homem busca na razão e na ciência caminhos que possam assegurar mais confiança nos seus conhecimentos do que até então adotados, ou seja, abandona as explicações que tinham alicerce em Deus para buscar explicações que tenham a ciência como guia. E neste contexto, a Sociologia surge amparada nos conhecimentos científicos para as suas investigações. É importante ressaltar que, neste período, pensadorescomo Descartes, Galileu, Copérnico, dentre outros, debruçaram seus estudos sobre o conhecimento científico. E neste contexto, a busca do conhecimento não estava vinculada às tradições religiosas, à fé ou até mesmo à Bíblia. Comte primeiramente colocou o nome desta disciplina de Física Social. Mais tarde, em 1836, alterou o nome para Sociologia, que vem do latim “socius” e do grego “logos”, significando o estudo do social. Diante do cenário exposto, a Sociologia, de um modo geral, pode-se dizer que nasceu num ambiente de profundas mudanças sociais, políticas e econômicas. E esta Nova Ciência, que tem como objeto de estudo a sociedade, foi construída paulatinamente desde o século XVI e estabelecendo relações com diversas correntes de pensamento, dentre elas o racionalismo, o iluminismo, o marxismo, dentre outras. 3 CONCEPÇÕES DE SOCIOLOGIA Você pode se perguntar: o que faz a Sociologia? Ao se debruçar sobre tal temática, diversas concepções de Sociologia e sua finalidade, você poderá encontrar: A Sociologia, de modo bem simples, é o estudo sistemático do comportamento social e dos grupos humanos. Ela focaliza as relações sociais, como essas relações influenciam o comportamento das pessoas, e como as sociedades, a soma de tais relações, se desenvolvem e mudam (SCHAEFER, 2006, p. 3). UNI UNIDADE 1 | UM CONVITE À SOCIOLOGIA: CONCEITOS E APLICAÇÕES 12 A Sociologia é uma das formas de compreender o ser humano no aspecto social. Mas não enfoca na personalidade do indivíduo como causa do seu comportamento, mas sim, na interação social, nos padrões sociais, a exemplo: os papéis sociais, a classe social, o poder político, a cultura. A sociologia, neste sentido, tem como âncora a ideia de que o homem deve ser entendido no contexto da sua vida social e como somos influenciados pelos padrões sociais (CHARON, 1999). A sociologia não é a única ciência social envolvida com a compreensão da vida social moderna. Ao longo deste período, praticamente toda a reflexão sobre a ordem política, econômica e cultural procurou adaptar-se ao surgimento da ciência (SELL, 2006, p. 32). Na posição de Boneti (2008), a Sociologia é uma ciência que estuda a sociedade, especificamente o homem na sociedade, ou seja, o comportamento humano enquanto construção coletiva e os processos que interligam os indivíduos em ações, associações, grupos e instituições. Assim como toda ciência, a Sociologia pretende explicar a totalidade dos fenômenos que lhe cabem, embora isto não seja objetivamente possível, mas a partir de fenômenos micros busca construir generalizações teóricas,, assim como, ao contrário, a partir de enfoque teórico genérico, busca compreender os acontecimentos e fatos sociais numa dimensão micro. Assim, hoje os sociólogos pesquisam as estruturas referentes à organização da sociedade, como raça ou etnia, classe social ou gênero, além de instituições, como é o caso da família e da educação (BONETI, 2008, p. 1). Caro(a) acadêmico(a), além das concepções acima, você poderá encontrar outras, inclusive mencionando sobre as finalidades da sociologia e as suas áreas temáticas. Por isso, Charon (1999) menciona que os sociólogos diferem sobre as temáticas, o qual aponta, a saber: sociedade, organização social, instituições ou sistemas institucionais, interação face a face e problemas sociais. A explicação que o senso comum apresenta a respeito da sociedade não tem a objetividade que muitos, sem discussão, acreditam que elas possuam. Mas se é verdade que a Sociologia, como qualquer outra ciência, pode errar nas suas explicações, as teorias desta disciplina são demonstravelmente mais confiáveis do que as elaborações intelectuais espontâneas de qualquer povo sobre si mesmo, em razão dos cuidados de que o sociólogo procura se cercar para formular as suas teorias (VILA NOVA, 2000, p. 26). IMPORTANT E NOTA TÓPICO 1 | SOCIOLOGIA: OS PRIMEIROS PASSOS 13 Enfim, como já foi mencionado, a Sociologia, como ciência, teve a sua origem na modernidade, e desde o seu início até os dias atuais, diversas foram as concepções de Sociologia e suas finalidades. Portanto, será comum você encontrar diversos autores apresentando o seu parecer sobre a Sociologia e suas finalidades, objeto de estudo e que, para isso, buscam construir teorias das mais diversas ordens. Contudo, salienta-se que mesmo com a diversidade de concepções de Sociologia e seus propósitos, também são diversos os ramos da Sociologia, e um deles é a educação, como mencionada acima por Charon (1999). 4 SOCIOLOGIA E EDUCAÇÃO Ao pesquisar sobre os ramos da Sociologia, você poderá encontrar os mais diversos, como: Sociologia Urbana, Sociologia da Religião, Sociologia do Conhecimento, Sociologia do Esporte, Sociologia das Organizações, Sociologia Jurídica, Sociologia da Educação, entre outros ramos. No entanto, para Boneti (2008), a Sociologia como ciência que estuda a sociedade tem como um dos seus principais objetos de estudo a educação. A educação é uma instituição porque se constitui de uma necessidade e de uma atividade humana, refletindo frente ao conjunto de normas, regras, valores e atitudes. Tudo isso se constituindo de elementos passíveis de serem estudados pela Sociologia. Por outro lado, a Sociologia tem a educação como campo investigativo, considerando que qualquer atividade humana constrói e é construída por processos educativos. Isto é, a educação, mesmo aquela constituída de aprendizados construídos no mundo da vida, é um campo de investigação sociológica, isto é, o que a educação representa para a Sociologia (BONETI, 2008, p. 6). De acordo com Tura (2004), a Sociologia tem uma importante contribuição a dar para o entendimento da organização da educação. O entendimento da educação, a partir dos parâmetros sociológicos, envolve questionamentos amplos a respeito da natureza humana e da sociedade e, além disso, a compreensão das formas de justificação e legitimação de ações e políticas educacionais, e também envolve nestas discussões os mecanismos de transmissão e assimilação de conhecimentos e diferentes processos de socialização. Boneti (2008) destaca que a origem da Sociologia da Educação iniciou no século XIX com o sociólogo Émile Durkheim, com seu livro “Educação e Sociologia”, o qual considerou a educação como fato social e objeto primordial de investigação da Sociologia. É claro, caro(o) acadêmico(a), que desde o surgimento da sociologia esta se especializou em ramos distintos, sendo a educação uma área de estudo da mesma. É comum na atualidade encontrarmos livros, artigos científicos e pesquisas deste campo do saber. UNIDADE 1 | UM CONVITE À SOCIOLOGIA: CONCEITOS E APLICAÇÕES 14 *A visão predominante na mentalidade medieval era o Teocentrismo: “Deus é o centro de tudo”. As obras de artes e livros mais importantes tratam de temas religiosos e o prédio de maior destaque de uma cidade era a igreja. Na mentalidade renascentista predominava o Antropocentrismo: o ser humano no centro das atenções e valoriza-se a vida terrena. * Na mentalidade medieval, o ser humano era visto com certo desprezo, pois este era um pecador. E desta forma, o homem deveria aceitar o sofrimento, pois o homem merece sofrer porque é pecador. Já na mentalidade moderna, o homem é a mais perfeita das criaturas (feito à sua imagem e semelhança), porém, capaz de fazer coisas maravilhosas: máquinas, prédios, viagens de descobertas, pinturas, estudo sobre a natureza e mudar o seu próprio destino, mudar de classe social, por exemplo, e não aceitar as coisas como vontade divina. * Na mentalidade medieval, a vida terrena, bem como os bens materiais e o corpo, tinham pouca importância. O que era precioso era a salvação daalma. Fazer parte dos eleitos que habitariam o céu (Paraíso). Já a mentalidade renascentista continua cristã, porém considera que a vida material é muito importante, e, além disso, valoriza em muito o corpo. * Na mentalidade medieval, tudo o que acontece na natureza deve ser explicado pela vontade de Deus (a ordem social, castigos de Deus, pestes, terremotos). E devemos conhecer o mundo para admirar a obra de Deus e louvá-lo pela sua criação. Já para a mentalidade renascentista, os fenômenos da natureza LEITURA COMPLEMENTAR Você deve estar pensando: entre o século XV e o XVI, muitos fatos e eventos aconteceram. Isso deve ter contribuído para mudar a forma de pensar das pessoas. Sim, muitas pessoas começaram a pensar diferente, escrever outras ideias, buscar outras explicações para os fatos e eventos. Todavia, é salutar pensar sobre que ideias ainda fazem parte, nos dias atuais, tanto da mentalidade medieval como da mentalidade moderna, inclusive no campo educacional. Para efeitos de ilustração, lembre-se de que o conhecimento científico ganhou espaço no período moderno e, de certa forma, tem estado presente em boa parte dos conteúdos lecionados nas escolas. Leia atentamente e verifique as diferenças de mentalidade (SCHIMIT, 1999): a medieval e a renascentista (esta última foi um dos suportes para a mentalidade moderna em geral). Por isso, de forma didática, a seguir você terá duas formas diferentes de pensar. ATENCAO TÓPICO 1 | SOCIOLOGIA: OS PRIMEIROS PASSOS 15 devem ser explicados pelo homem, que, com o uso da razão e da ciência, consegue conhecer a natureza. *Na mentalidade medieval, as pessoas deveriam se conformar com o mundo tal como ele é porque foi Deus que o quis assim. Se o mundo deveria ser diferente, Deus o teria feito. E a única grande mudança possível seria o apocalipse. Entretanto, na mentalidade renascentista, o homem pode e deve ser o criador, aventureiro, sonhador e dominador da natureza. * Na mentalidade medieval, a natureza é fonte de pecado. Para a mentalidade renascentista, o homem faz parte da natureza e deve conhecê-la para conhecer a si próprio. * E finalmente, se na mentalidade medieval a razão (capacidade humana de pensar) deve estar subordinada à fé, na mentalidade renascentista a fé deve prevalecer no sentido religioso, mas a razão deve ter prioridade sobre a fé quando o assunto é o estudo da natureza. FONTE: URBANESKI, Vilmar. Filosofia da Religião. Indaial: Editora Uniasselvi, 2008, p. 50-51. 16 Caro(a) acadêmico(a), neste tópico você viu: • O contexto do surgimento da Sociologia. • As diferenças de mentalidade medieval e moderna. • Na Idade Média, Deus era o centro das atenções e, com o Renascimento, o Homem torna-se o centro. • Na mentalidade medieval, tudo o que acontece na natureza deve ser explicado pela vontade de Deus. Já para a mentalidade renascentista, os fenômenos da natureza devem ser explicados pelo homem, que com o uso da razão e da ciência consegue conhecer a natureza. • A Sociologia, dentre as suas diversas áreas de atuação, tem como propósito estudar os fenômenos sociais, da ação ou influência mútua e da organização social. • A Sociologia é uma área de estudo que surgiu no início da modernidade com o intuito de compreender a sociedade de um modo geral, ou até mesmo nas suas peculiaridades. • A Sociologia, ao estudar a sociedade, tem como um dos seus objetos de estudo a educação. RESUMO DO TÓPICO 1 17 1 A partir do estudo do Tópico 1 desta unidade, conceitue Sociologia. ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ _____________________________________________________________________ 2 Aponte as principais características da mentalidade medieval e da renascentista. AUTOATIVIDADE Mentalidade medieval Mentalidade renascentista 3 Analise as sentenças a seguir e classifique V para as sentenças verdadeiras e F as falsas: ( ) A visão predominante na mentalidade medieval é o Teocentrismo (Deus é o centro de tudo). ( ) Na mentalidade medieval, o homem é a mais perfeita das criaturas (feito à sua imagem e semelhança), e ainda é capaz de fazer coisas maravilhosas: máquinas, prédios, viagens de descobertas, pinturas, estudo sobre a natureza e mudar o seu próprio destino. ( ) Na mentalidade medieval, o ser humano era visto com certo desprezo, pois este era um pecador. Desta forma, o homem deveria aceitar o sofrimento, pois merece sofrer porque é pecador. ( ) Para a mentalidade medieval, tudo o que acontece na natureza deve ser explicado pela vontade de Deus (a ordem social, castigos de Deus, pestes, terremotos). Já na mentalidade moderna, os fenômenos da natureza devem ser explicados pelo homem, que, com o uso da razão e da ciência, consegue conhecer. Além disso, o homem pode e deve ser criador, aventureiro, sonhador e dominador da natureza. Agora, assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA: (0,5p). a) ( ) F – F – V – V. b) ( ) V – V – F – V. 18 c) ( ) F – F – V – F. d) ( ) F – F – F – V. e) ( ) V – F – V –V. 4 De um modo geral, pode-se dizer que Deus deixa de ser o centro do mundo medieval e, lentamente, o homem torna-se o centro, e este é valorizado como um ser individual e que busca descortinar as suas potencialidades humanas. Assim, o homem moderno deseja superar os obstáculos e desenvolver-se enquanto ser humano e também o mundo de que ele faz parte. De acordo com Andery et al. (1996, p. 175), “na nova visão de mundo, que veio a substituir a medieval, o homem, no seu sentido mais genérico, era a preocupação central”. Afirmação anterior refere-se à passagem. Assinale a alternativa CORRETA: a) ( ) Da pré-modernidade para a modernidade. b) ( ) Da modernidade para a pós-modernidade. c) ( ) Da pré-modernidade para a pós-modernidade. d) ( ) Do período medieval para a pós-modernidade. 5 Analise as sentenças a seguir e julgue: I- A Sociologia é uma ciência que surgiu no final do século XVI com o intuito de sanar os problemas de cunho social que envolviam a nobreza e o clero somente nos aspectos religiosos e econômicos. II- Estudar como as sociedades funcionavam e continuam funcionando ao longo do tempo e de como a interpretação da vida humana e dos grupos sociais é função da Sociologia. III- Uma das formas de definir a Sociologia é que esta é uma disciplina acadêmica que examina o ser humano como um ser social, resultado de interação, socialização e padrões sociais. Agora, assinale a alternativa CORRETA: a) ( ) As sentenças I, II e III estão corretas. b) ( ) As sentenças I e III estão corretas. c) ( ) Somente a sentença III está correta. d) ( ) As sentenças II e III estão corretas. Assista ao vídeo de resolução da questão 3 19 TÓPICO 2 KARL MARX E MAX WEBER: EDUCAÇÃO UNIDADE 1 1 INTRODUÇÃO Como você estudou no tópico anterior, a Sociologia surge com o intuito de compreender a sociedade. E os pensadores desta área buscam, cada qual, apresentar o seu parecer sobre o modo de ser da sociedade. Por isso, podemos afirmar que estes pensadores, ainda na atualidade, têm-se feito presentes nas discussões, principalmente no âmbito acadêmico. Porém, no âmbito da educação, cada qual tem as suas peculiaridades. Neste tópico você estudará sobre Karl Marx e Marx Weber. Cada qual com a sua forma de entender o mundo. Por isso, estude cada qual e depois faça as suas reflexões sobre como cada um pôde contribuir para a compreensão da sociedade e da educação. Leiao livro de Leandro Konder, “Em torno de Marx”, 2010, que aborda os pensamentos filosóficos de Karl Marx. 2 KARL MARX: PROPOSTA PARA UMA NOVA SOCIEDADE O pensador Karl Heinrich Marx nasceu em 5 de maio de 1818, em Trier, na Renânia, região que fazia parte da antiga Prússia, atualmente Alemanha. O pai de Marx era advogado e teve sucesso profissional. Marx cresceu com os confortos de uma família da pequena burguesia da época. Faleceu em 14 de março de 1883, dois anos após a morte de sua esposa Jenny. As suas ideias influenciaram várias áreas do conhecimento, a saber: Filosofia, Sociologia, Política, Economia, Religião, dentre outras. Foi um dos precursores intelectuais dos movimentos de cunho revolucionário no meio operário, pois entre as suas ideias estava a necessidade de acabar com a exploração sobre o trabalhador e a necessidade de uma sociedade mais justa e igualitária. Quanto às suas obras, destacam-se: “A Sagrada Família”, “O 18 Brumário”, “A Miséria da Filosofia” e “O Capital”. DICAS 20 UNIDADE 1 | UM CONVITE À SOCIOLOGIA: CONCEITOS E APLICAÇÕES A principal obra de Karl Marx, “O Capital”, é publicada em 1867, mas a continuidade da obra passa por intempéries devido a problemas de saúde que o autor enfrentava. FIGURA 7 – TÚMULO DE MARX EM HIGHGATE FONTE: Disponível em: <http://www.entrelinhasweb.com.br>. Acesso em: 20 ago. 2011. 2.1 ALGUMAS IDEIAS DE MARX Caro(a) acadêmico(a): Marx, ao pensar sobre a sociedade no sentido de compreender seu funcionamento, utiliza termos como proletários, materialismo dialético, mais-valia, infraestrutura e superestrutura, alienação, dentre outros. Para muitos, Marx foi um revolucionário, ou seja, as propostas de Marx tinham como propósito compreender a sociedade. Além disso, transformar o seu modo de ser, principalmente devido às desigualdades sociais existentes na época, em virtude da exploração burguesa sobre os operários. Já para outros, Marx era um inimigo a ser combatido, devido às suas ideias. Entretanto, há de se mencionar que as suas ideias se fizeram ou fazem presentes em diversos campos do saber, desde a economia até a educação. De acordo com Sell (2006, p. 55): Karl Marx foi um sociólogo de profissão. Toda a sua obra foi construída tendo em vista oferecer à classe operária um entendimento a respeito da possibilidade de supressão e transcendência dos mecanismos de exploração e alienação do modo de produção capitalista. Só assim, julgava Marx, seria possível construir uma forma superior de sociedade: 21 TÓPICO 2 | KARL MARX E MAX WEBER: EDUCAÇÃO o comunismo. [...]. A partir de Marx desenvolveu-se na sociologia uma vertente intitulada “teoria crítica”, cujo objetivo é vincular a compreensão da realidade com as potencialidades de emancipação social. Interpretar a obra de Marx é uma tarefa difícil. O seu pensamento era dinâmico e jamais foi sistematizado pelo autor, permanecendo, inclusive, inacabado. Frente ao exposto, algumas das ideias de Marx merecem destaque. É claro, caro(a) acadêmico(a), que a obra de Marx merece maior aprofundamento, devido à sua amplitude, porém, aqui você terá algumas ideias iniciais que podem contribuir para aprofundar-se no assunto. Vejamos algumas destas ideias. Para Marx, o trabalho foi o elemento essencial da sociedade humana no decorrer da história e que manteve a estrutura e o desenvolvimento da mesma. E, na história da humanidade, podemos observar que o trabalho foi executado pelos escravos, pelos servos e, na época de Marx, pelos proletários. E eram esses (proletários) que mantinham a estrutura econômica capitalista e enriqueciam os burgueses. Para Marx, o elemento fundamental da economia é o trabalho. O ser humano precisa produzir os bens necessários à sua sobrevivência. É através do trabalho que o homem transforma a natureza e reproduz sua existência. De acordo com o esquema dialético de Marx, através do trabalho o homem supera sua condição de ser apenas natural e cria uma nova realidade: a vida social. A sociedade é justamente a síntese do eterno processo dialético pelo qual o homem atua sobre a natureza (SELL, 2006, p. 78-79). Em termos gerais, a base para a sociedade, a sua formação, suas instituições e regras de funcionamento, suas ideias, seus valores, são derivados das condições materiais. Desta forma, a base da sociedade é o trabalho. Assim, para Marx, a base da sociedade, assim como a característica fundamental do homem, estão no trabalho. É do trabalho que o homem se faz homem, constrói a sociedade, é pelo trabalho que o homem transforma a sociedade e faz a história. O trabalho torna-se categoria essencial que permite não apenas explicar o mundo e a sociedade, o passado e a constituição do homem, como lhe permite antever o futuro e propor uma prática transformadora ao homem, propor-lhe como tarefa construir uma nova sociedade (ANDERY, 2006, p. 401). Enfim, o trabalho de Marx pode ser visto como uma interpretação de como o modo capitalista de produção mercantiliza as relações, as pessoas e as coisas, como ele transforma as próprias pessoas em mercadorias. Os modos de produção da história da humanidade estruturam-se da seguinte maneira: a) o modo de produção antigo, no qual a base estava na agricultura e na escravidão (relação: senhor/escravo); 22 UNIDADE 1 | UM CONVITE À SOCIOLOGIA: CONCEITOS E APLICAÇÕES b) o modo de produção feudal, tendo como base a agricultura e a servidão (relação: senhor feudal/servo); c) e o modo de produção liberal estrutura-se em torno da indústria e do trabalho assalariado e a propriedade privada (relação: burguesia/proletariado). O modo de produção, de um modo geral, pode ser entendido como a maneira como a sociedade tem se organizado no decorrer da história em torno da sua produção de bens que são necessários à sobrevivência do ser humano. "A história de todas as sociedades até hoje existentes é a história das lutas de classe" (Manifesto Comunista). Outras ideias são discutidas por Marx, como a infraestrutura e a superestrutura. Neste sentido, podemos dizer que a base da sociedade é modo de produção material, seja a economia ou a tecnologia que permitem a produção de bens (usando ferramentas, máquinas, terra, matéria- prima, dentre outros), e é entendido como infraestrutura. Já a superestrutura constitui-se das instituições jurídicas, aspectos políticos, normas, leis, que mantêm o ordenamento da sociedade, principalmente no funcionamento da infraestrutura. Quanto ao fetichismo, este representa uma contradição fundamental da produção de mercadorias: confusão de relações entre pessoas com relações entre coisas. O fetichismo é o exemplo mais simples do modo pelo qual as formas econômicas do capitalismo (valor, capital, lucro) ocultam as relações sociais subjacentes. A reificação significa a transformação dos seres humanos em seres semelhantes a coisas, que se comportam de acordo com as leis do mundo das coisas. Neste sentido, a reificação é um caso especial de alienação. Outro conceito de relevância em Marx é a mais-valia, a qual é produzida nas organizações pelo emprego da força de trabalho do proletário. No caso do capitalismo, a compra da força de trabalho do proletário é paga em troca de salário. Segundo Sell (2006, p. 98): [...] existem duas formas principais pelas quais é possível extrair o lucro: Mais-Valia Absoluta: o lucro obtido pelo aumento da jornada de trabalho, [...] Mais-Valia Relativa: o lucro é obtido pelo aumento da produtividade. Nesse processo o capitalista só precisa aumentar o tempo do trabalho. Basta fazer o trabalho do operário render mais. IMPORTANT E 23 TÓPICO 2 | KARL MARX E MAX WEBER: EDUCAÇÃO O lucro do burguês possibilita o seu enriquecimento, e ao proletário o empobrecimento.Esta dinâmica está assentada no capitalismo, o qual tem como propósito o lucro. Neste sentido, Sell afirma que: Podemos sintetizar a crítica de Marx ao capitalismo em duas teses principais: Tese da exploração: o capitalismo é um sistema econômico no qual a riqueza é produzida pela exploração de uma classe social sobre a outra. O conceito central que enuncia a tese da exploração é a categoria “Mais-valia”. Tese da alienação: o capitalismo é um sistema econômico no qual o conjunto dos indivíduos e da sociedade passa a ser determinado pelo poder impessoal do dinheiro (capital) e da própria esfera econômica que foge do controle social. [...] (2006, p. 89/90, grifos do autor). “Num certo estágio de sua evolução, as forças produtivas materiais da sociedade entram em choque com as relações de produção existentes. Inaugura-se, então, uma época de revolução social”. (Marx, na Crítica da Economia Política). As contribuições de Marx podem ser as mais variadas e para os diversos campos do saber, como: economia, política, filosofia, educação e sociologia. Entretanto, o historiador inglês Eric Hobsbawm, de acordo com Trevisan (1997, p. 2), analisa os benefícios e os limites da contribuição marxista: [...] o marxismo tem contribuído de algum modo para entender a História, mas, realmente, não o suficiente. Por exemplo, o marxismo vulgar diz que todas as coisas ocorrem em virtude de fatores econômicos e, obviamente, isso não é uma explicação adequada. Insisto que o importante é distinguir o marxismo vulgar de uma interpretação mais sofisticada do sentido da obra de Marx ou, em verdade, de Karl Marx por ele mesmo. Acho que o marxismo pode fazer isso. Hoje, podemos falar sobre isso, como estamos fazendo, porque hoje nós podemos distinguir aqueles trechos das análises marxistas que pareciam ser válidos, mas claramente não o são. Por exemplo, se você realmente lê o Manifesto Comunista de 1848, ficará surpreso com o fato de que o mundo, hoje, é muito mais parecido com aquele que Marx predisse em 1848. A ideia do poder capitalista dominando o mundo inteiro, como também uma sociedade burguesa, destruindo todos os velhos valores tradicionais, parece ser muito mais válida hoje do que quando Marx morreu. Por outro lado, por exemplo, a previsão de que a classe trabalhadora ficaria cada vez mais pauperizada não é verdade. Isso não quer dizer que a classe trabalhadora não tenha suficientes boas razões para protestos. Uma coisa interessante que faz a análise marxista bastante moderna é a análise das tendências de longa duração. IMPORTANT E 24 UNIDADE 1 | UM CONVITE À SOCIOLOGIA: CONCEITOS E APLICAÇÕES Caro(a) acadêmico(a), as ideias e os conceitos de Marx são os mais diversos. Mas é salutar mencionar que, para Karl Marx, o homem é parte da natureza, porém não se confunde com a mesma e, além disso, o homem é um ser social e histórico, que transforma a natureza e a si próprio neste processo. FILME: Edukators. Título original: (Die Fetten Jahre Sind Vorbei). Lançamento: 2004 (Alemanha). Direção: Hans Weingartner Atores: Julia Jentsch, Stipe Erceg, Burghart Klaubner, Claudio Caolo. Duração: 126 min. Gênero: drama. Sinopse Jan (Daniel Brühl) e Peter (Stipe Erceg) são dois jovens que acreditam que podem mudar o mundo. Eles se autodenominam "Os Educadores", rebeldes contemporâneos que expressam sua indignação de forma pacífica: eles invadem mansões, trocam móveis e objetos de lugar e espalham mensagens de protesto. Jule (Julia Jentsch) é a namorada de Peter, que está passando por problemas financeiros e, por causa deles, está saindo de seu apartamento alugado. Tempos atrás, Jule se envolveu em um acidente de carro, que destruiu o carro de um rico empresário. Condenada pela justiça, ela precisa pagar um novo carro no valor de 100 mil euros, o que praticamente faz com que trabalhe apenas para pagar a dívida que possui. Como Peter viaja para Barcelona, Jan vai ajudá-la na mudança. Eles se conhecem melhor e Jan termina por contar a ela a verdade sobre os Educadores. Empolgada com a notícia, Jule insiste que ela e Jan invadam a casa de Hardenberg (Burghart Klaubner), o empresário que a processou. Após uma certa resistência, Jan concorda. Na casa, eles agem como os Educadores, mudando os móveis de lugar, mas cometem um grave erro: Jule esquece no local seu celular. No dia seguinte, com Peter já tendo retornado da viagem, mas sem saber do ocorrido, Jan e Jule decidem invadir novamente a casa de Hardenberg, para recuperar o celular. No entanto, o que eles não esperavam era que o empresário os surpreendesse dentro da casa, o que os força a sequestrá-lo. FONTE: Disponível em: <pt.wikipedia.org/wiki/Os_Edukadores>. Acesso em: 15 out. 2011. Caro(a) acadêmico(a), a seguir apresentamos o texto da jornalista Sucena Shkrada Resk que retrata algumas ideias do pensamento marxista sobre a ecologia. Boa leitura! DICAS 25 TÓPICO 2 | KARL MARX E MAX WEBER: EDUCAÇÃO LEITURA COMPLEMENTAR 1 A ECOLOGIA DE MARX Antes mesmo da concepção de sustentabilidade e das preocupações ambientais modernas, Marx já escrevia sobre a necessidade de cuidados com a natureza. Para ele, o homem é parte integrante dela. Entretanto, esses conceitos dividem opiniões até hoje. Sucena Shkrada Resk Reduzir o pensamento do economista e filósofo alemão Karl Marx (1818-1883) ao materialismo dialético é um equívoco, na visão de estudiosos contemporâneos. A reflexão sobre questões ecológicas não pode ser desprezada em seus escritos - ao lado de Friedrich Engels (1820-1895) -, mas não é mais difundida e discutida por causa de interpretações enviesadas de muitos de seus discípulos e críticos e pela falta de contextualização dos seus estudos. Contudo, quando o mundo ainda não tratava de sustentabilidade, Marx já falava, em outras palavras, sobre a importância do consumo consciente e de uma economia equilibrada, da justiça social e da manutenção da qualidade do meio ambiente. Os conceitos expressos pelo filósofo remetem aos temas, hoje muito discutidos, de desenvolvimento sustentável, mudanças climáticas e aquecimento global, que surgiram principalmente a partir dos anos 1970. O mote do modelo de desenvolvimento proposto, desde os primórdios da Revolução Industrial, no século XVIII, é considerado como um elemento importante a ser revisto no mundo contemporâneo, desde aquela época. E é em O Capital (1867) que as reflexões de Marx sobre o tema se sobressaltam, aproximando-o de questões ambientais e ecológicas, diante das quais podemos concluir que as discussões que assolam nossos dias e que abordam consumo excessivo e poluição já eram uma preocupação para o filósofo, no século XIX. O termo ecossocialismo, segundo o cientista social brasileiro Michael Löwy, da Escola de Altos Estudos em Ciências Sociais da Universidade de Paris, tem seus fundamentos em alguns pensamentos de Marx sobre essa lógica do capital. Xangai, a maior cidade da China. Ambiente dos trabalhadores nas grandes cidades era visto por Marx como "poluição universal" 26 UNIDADE 1 | UM CONVITE À SOCIOLOGIA: CONCEITOS E APLICAÇÕES Para ele, é justamente em O Capital que o filósofo alemão afirmava que o sistema capitalista esgotava as forças do trabalhador e da Terra. Marx, nesta exposição, trata, de certa forma, do conceito conservacionista, que vigora nos dias de hoje, de que a natureza não é algo intocado, como por muito tempo os preservacionistas propuseram. Isso significa que o homem é parte integrante do meio ambiente e deve ter um papel de guardião. E o tema foi alvo de alguns estudos, como o do cientista político e professor de Sociologia da Universidade de Oregon, John Bellamy Foster, que escreveu o livro A Ecologia de Marx - Materialismoe Natureza. Foster analisa que Marx utilizou a ótica do ateniense Epicuro (341 a.C - 270 a.C.) para atribuir uma concepção materialista de que a natureza só é percebida através dos nossos sentidos pela cognição, em um processo ao longo de nossas vidas. Isso infere a prática da percepção unida à memória, ao raciocínio, juízo, imaginação e ao ato do pensamento e do discurso. Outra obra que aborda o assunto é História e Meio Ambiente, em que o mestre em Sociologia e doutor em História, Marcos Lobato Martins, diz que seria um equívoco colocar Marx entre os adeptos do paradigma de que os seres humanos estão imunes aos fatores ambientais, numa visão antropocêntrica. A mesma análise é também feita por Foster. Ambos ilustram o trecho escrito pelo filósofo alemão em Manuscritos econômico-filosóficos, de 1844: “O homem vive da natureza, isto é, a natureza é seu corpo, e tem que manter com ela um diálogo ininterrupto se não quiser morrer. Dizer que a vida física e mental do homem está ligada à natureza significa simplesmente que a natureza está ligada a si mesma, porque o homem é parte dela” (MARX). “O homem vive da natureza [...] e tem que manter com ela um diálogo ininterrupto se não quiser morrer” (MARX). Como base científica para explicar as relações sociais, Marx e Engels se debruçaram sobre as pesquisas do naturalista inglês Charles Darwin (1809-1882). Em uma de suas cartas a Engels, Marx escreve, em 1862, o seguinte, sobre a obra “Origem das Espécies”: “É notável como Darwin redescobre, no meio dos animais e plantas, a sociedade da Inglaterra com as suas divisões de trabalho, competição, abertura de novos mercados, invenções e a luta pela existência malthusiana. É a bellum omnium contra omnes de Hobbes”. Marx acreditava que o cientista oferecia uma perspectiva materialista compatível à sua, embora aplicada a outro conjunto de fenômenos, e fornecia uma base na ciência natural para a luta de classes (FOSTER, 2005, p. 274-275). FONTE: Disponível em: <portalcienciaevida.uol.com.br/ESFI/edicoes/41/artigo158665-2.asp>. Acesso em: 15 out. 2011. 27 TÓPICO 2 | KARL MARX E MAX WEBER: EDUCAÇÃO 2.2 MARX E BREVES CONSIDERAÇÕES SOBRE A EDUCAÇÃO As ideias de Marx também têm influenciado o campo educacional, de forma direta ou indireta, tanto nas teorias que norteiam a prática educativa, como nas pesquisas educacionais, a exemplo de programas de pós-graduação em Educação ou Sociologia da Educação. Podemos encontrar, no campo educacional, autores e pesquisadores que ancoram as suas ideias ou teses no pensamento de Marx. Entretanto, é necessário ressaltar que não necessariamente estas podem estar em consonância com os escritos originais de Marx. Por isso, devemos lembrar que Marx escreveu no período da Revolução Industrial e os trabalhadores viviam em condições precárias nas cidades, submetendo-se a salários irrelevantes, com jornadas de trabalho longas e sem amparo das leis trabalhistas. Neste cenário, quanto à educação, Rodrigues (2007, p. 43) diz: Marx conclui que a educação dada às crianças operárias era tão precária que só poderia servir para perpetuar as relações de opressão às quais essas crianças e seus pais estavam sujeitos. O descaso era tanto que qualquer um que tivesse uma casa e alegasse ser ali uma escola, poderia fornecer os “atestados de frequência a aulas” de que as fábricas precisavam para livrar-se da fiscalização. Marx não escreveu especificamente sobre a educação. Entretanto, algumas ideias podem ser concluídas sobre o assunto a partir do seu pensamento. A educação faz parte da superestrutura a qual era dirigida pelas classes dominantes – na época de Marx, a burguesia. Por isso, de certa forma, a educação não possibilitava à classe trabalhadora perceber os interesses de sua classe e, sim, a educação era um meio para perpetuar as condições sociais existentes. Desta forma, a educação é um dos instrumentos para a reprodução do conhecimento e da sociedade. Ou seja, a educação pode servir como meio (superestrutura) para reproduzir a sociedade tal como ela é (e no caso do sistema capitalista, reforçar a estrutura vigente). Mas, por outro lado, a educação pode ser um elemento que serve como meio para a transformação da sociedade e do mundo. Neste sentido, a educação deveria romper com os moldes propostos para a época, de uma educação que reproduzia esta divisão, incentivava o trabalho produtivo, o conformismo e uma pedagogia da obediência. No princípio do comunismo, Engels explicita de modo bastante claro o que esperava afinal da nova educação. Diz ele: a educação dará aos jovens a possibilidade de assimilar rapidamente na prática de produção e lhe permitirá passar sucessivamente de um ramo de produção a outro, segundo as necessidades da sociedade ou suas próprias inclinações. Por conseguinte, a educação nos libertará deste caráter unilateral que a divisão atual do trabalho impõe a cada indivíduo. Assim, a sociedade organizada sobre as bases comunistas dará a seus membros a possibilidade de empregar em todos os aspectos suas faculdades desenvolvidas universalmente (RODRIGUES, 2007, p. 48). 28 UNIDADE 1 | UM CONVITE À SOCIOLOGIA: CONCEITOS E APLICAÇÕES A educação deveria ser um instrumento que deveria mobilizar a população (no caso, a classe operária) para a transformação da sociedade e superar a exploração capitalista. E, além disso, a educação deveria ser um caminho que leve o respeito ao homem na sua totalidade, suas potencialidades, e não uma educação que tinha como propósito formar pessoas para o mercado de trabalho dos moldes capitalistas e com o fim último de exploração do trabalhador. Em termos gerais, a educação deveria ser um instrumento para aquisição de conhecimento e de transformação para a classe trabalhadora. Ou seja, a educação deveria ter um caráter revolucionário, pois a classe trabalhadora (o proletariado), por si, não consegue adquirir a consciência de classe social e consciência política. Por isso, o processo educativo poderia ser um instrumento propício para que o trabalhador tomasse consciência da sua situação e de classe social e buscasse uma sociedade alternativa. Em contrapartida, a educação era usada como um elemento essencial para a burguesia manter a hierarquia social e sua ideologia. Enfim, caro(a) acadêmico(a), a obra de Marx é vasta, e as interpretações das suas ideias são as mais diversas, tanto dos que são oponentes quanto dos que seguem as mesmas. Por isso, sugere-se, a modo de seu interesse, aprofundar as ideias que podem estar presentes na educação e fazer as suas devidas considerações, pois no âmbito educativo podemos encontrar discursos que postulam que a educação deve ser transformadora, crítica e emancipatória, que podem ter ou não fundamento em Marx. 3 MAX WEBER E ALGUMAS DAS SUAS IDEIAS Max Weber nasceu na cidade de Erfurt, na Turíngia, no dia 21 de abril de 1864. FIGURA 8 – MAX WEBER EM 1917 FONTE: Disponível em: <http://quotationsbook.com>. Acesso em: 15 out. 2011. 29 TÓPICO 2 | KARL MARX E MAX WEBER: EDUCAÇÃO Seu falecimento ocorre no dia 14 de junho de 1920, na cidade de Munique. FIGURA 9 – MAX WEBER, FALECIDO EM 14 DE JUNHO DE 1920 FONTE: Disponível em: <http://quotationsbook.com>. Acesso em: 20 ago. 2011. A análise sociológica deveria ser isenta de juízos de valor, ou seja, deveria ser objetiva e neutra em questões morais. De acordo com as ideias deste pensador, o objetivo da Sociologia é identificar e compreender como e por que as regras nascem na sociedade e como elas funcionam. Em termos gerais, a Sociologia deveria compreender os fenômenos “no nível do significado” dos atores; além disso, compreender como os atores veem e sentem as suas ações na sociedade. Neste sentido, análise de cunho sociológico deve ater-se a duas situações:sendo a primeira referente às experiências dos atores, e a segunda, referente aos sistemas culturais e sociais nos quais os atores estão inseridos. Ao se retratar sobre Weber, é comum a seguinte afirmação: “A sociedade e seus sistemas não pairam acima e não são superiores ao indivíduo”. Desta afirmação é correto dizer que as regras e normas sociais não são analisadas como sendo exteriores à vontade dos indivíduos. E sim, estas são resultado de um conjunto complexo de ações individuais, nas quais os indivíduos estariam escolhendo, a todo o momento, diferentes formas de conduta. Neste sentido, o Estado, o mercado, as religiões existem em virtude de que muitos indivíduos orientariam reciprocamente suas ações em determinado sentido comum. Para Durkheim (1973), a sociedade é superior ao indivíduo. Poderíamos dizer que para Weber o indivíduo é o fundamento da sociedade. Esta 30 UNIDADE 1 | UM CONVITE À SOCIOLOGIA: CONCEITOS E APLICAÇÕES afirmação vai muito além do fato de que uma sociedade não existe sem indivíduos. A existência da sociedade somente se realiza pela ação e interação recíprocas entre os agentes sociais (SELL, 2007, p. 197). Enfim, caro(a) acadêmico(a), podemos dizer que no pensamento de Weber a parte é privilegiada em relação ao todo. A ação dos indivíduos sobre a sociedade é que determina a relação indivíduo-sociedade. Outro aspecto no pensamento de Weber que deve ser mencionado são os três tipos de dominação, que são: o legal, o tradicional e o carismático. Dominação legal: obediência apoia-se na crença na legalidade da lei e dos direitos de mando das pessoas autorizadas a comandar pela lei. Dominação tradicional: sua legitimidade apoia-se na crença de que o poder de mando tem caráter sagrado, herdado dos tempos antigos. Dominação carismática: a legalidade da autoridade do líder carismático lhe é conferida pelo afeto e confiança que os indivíduos depositam nele (SELL, 2007, p. 211-212, grifos do autor). Quanto às ideias de Weber, há de se mencionar que o objeto de estudo da Sociologia é a ação social. Ação: é um comportamento [...] sempre que e na medida em que o agente ou os agentes se relacionem com sentido subjetivo. Ação social: significa uma ação que, quanto a seu sentido visado pelo agente ou pelos agentes, se refere ao comportamento de outros, orientando por este em curso (WEBER, 1994, p. 3 apud SELL, 2007, p. 181). Quanto a explicações das ações humanas, podemos encontrar as mais diversas, e neste sentido cabe à Sociologia explicar os motivos e a própria existência da ação social. Neste contexto, Sell (2007, p. 182) diz que “[...] a teoria sociológica de Weber é chamada de metodologia compreensiva: seu objetivo é compreender o significado da ação social”. Ao tratar sobre ação social, Weber estabeleceu quatro tipos. 1. Ação afetiva: aquela ação determinada de modo afetivo, ou seja, pelos afetos ou estados sentimentais atuais. 2. Ação tradicional: aquela ação determinada por um costume ou um hábito arraigado. 3. Ação social: é aquela referente aos valores. A ação é determinada pela crença de valor (ético, estético e religioso). 4. Ação social referente aos fins: a ação é determinada por expectativas quanto ao comportamento dos objetos do mundo exterior ou de outras pessoas (SELL, 2007). Ao contrário dos filósofos iluministas e mesmo do positivismo, que viam o progresso material e até da felicidade individual, Weber tinha 31 TÓPICO 2 | KARL MARX E MAX WEBER: EDUCAÇÃO uma posição crítica a respeito. O aumento do grau de racionalidade do mundo moderno não leva necessariamente a um estágio superior da vida social. Weber sabia que o processo de racionalização e desencantamento com o mundo, dos quais a organização capitalista e a organização burocrática do Estado eram as maiores expressões, tinha também o seu lado negativo. É neste sentido que ele nos apresenta o seu diagnóstico da modernidade: a perda de sentido e perda da liberdade (SELL, 2007, p. 202). Enfim, caro(a) acadêmico(a), você estudou algumas ideias de Weber, as quais podem contribuir ainda, nos dias atuais, para compreender o que está acontecendo na sociedade atual. A título de exemplo: pode contribuir para entender as forças motrizes da sociedade atual, o poder do Estado, o significado das leis nas relações sociais, o processo de urbanização de populações nas cidades e as suas consequências. Além disso, os sistemas de crenças e valores no cotidiano das pessoas. Neste sentido, pode-se dizer que: ao contrário de outras teorias, que hoje apresentam sinais de crise, o pensamento de Max Weber tem sido relido na atualidade, proporcionando à sociologia novos instrumentos de compreensão de seus próprios fundamentos e para interpretação do mundo moderno. Crítico do marxismo e positivismo, Weber realizou um cuidadoso estudo das religiões mundiais, mostrando que a marca fundamental da modernidade é a emergência de uma forma específica de racionalismo: o racionalismo da dominação do mundo. Para Weber, o racionalismo ocidental se encarna em instituições como a economia capitalista e a burocracia do Estado, é uma força que, por um lado, aumenta a eficiência e produtividade, mas, ao mesmo tempo, ”desencanta” o mundo, ocasionando a perda de liberdade e sentido da vida (SELL, 2006, p.167). 3.1 WEBER E A EDUCAÇÃO: CONSIDERAÇÕES INICIAIS Para Vilela (2002), Weber não produziu uma teoria do âmbito da Sociologia da Educação, ou seja, não considerou a organização social da escola ou a instituição como objeto de análise. Outrossim, há estudos significativos sobre Weber a respeito da educação, onde os sistemas escolares se desenvolvem como um processo de imposição dos caracteres dos grupos sociais e do poder estabelecido. Weber, nas suas reflexões, abordou sobre a racionalização e a burocratização, e estas alteraram radicalmente os modos de educar. Educar no sentido da racionalização passou a ser fundamental para o Estado, porque ele precisa de um direito racional e de uma burocracia montada em moldes racionais. Educar no sentido da racionalização também passou a ser fundamental para a empresa capitalista, pois ela se pauta pela lógica do lucro, do cálculo de custos e benefícios, precisando de profissionais treinados para isso (SELL, 2007, p. 65-66). 32 UNIDADE 1 | UM CONVITE À SOCIOLOGIA: CONCEITOS E APLICAÇÕES Neste cenário, a educação, para Weber, não é mais uma preparação para que o membro de todo orgânico aprenda sua parte no comportamento harmônico do organismo social, mas sim, tem como propósito despertar o carisma e preparar o aluno para uma conduta de vida social. Outrora, “a educação sistemática, analisa ele, passou a ser um pacote de conteúdos e de disposições voltadas para o treinamento de indivíduos que tivessem de fato condições de operar essas novas funções, de pilotar o Estado, as empresas e a própria política, de um modo racional” (RODRIGUES, 2007, p. 64). A educação esteve sob o prisma da racionalidade, da obediência à lei e do treinamento das pessoas para executar as tarefas burocráticas do Estado. Este modelo de educação tinha dentre os seus propósitos: o treinamento dos indivíduos que tivessem de fato condições de executar tarefas e atividades no aparato estatal. Neste sentido, a educação passou a ser primordial para o Estado, pois este precisa de pessoas para atuar numa burocracia montada em moldes racionais. E quanto a esta forma de educar, também era primordial para a empresa capitalista, pois esta estava assentada sobre o lucro, o cálculo de custos e os benefícios, por isso precisava de profissionais treinados para desempenhar tais funções. […] Mais que profissionais da empresa ou da administração pública, o capitalismo e oEstado capitalista forjaram um novo homem: um homem racional, tendencialmente livre de concepções mágicas, para o qual não existe mais lugar reservado à obediência, que não seja a obediência ao direito racional. Para este homem, o mundo perdeu o encantamento. Não é mais o mundo do sobrenatural e dos desígnios de Deus ou dos imperadores. É o mundo do império, da lei e da razão. Educar num mundo assim, certamente, não é o mesmo que educar antes dessa grande transformação, provocada pelo advento do capitalismo moderno (RODRIGUES, 2007, p. 65-66). Quanto à educação, vale destacar que os três tipos de dominação se configuram em três modelos particulares de sistemas de educação, os quais orientam para a formação de três tipos de sujeitos sociais. Uma educação carismática: orientada para despertar a capacidade considerada como um dom puramente pessoal. [...] o aluno tem que negar-se em seu estado atual e tratar de alcançar, ou recuperar, sua identidade. Como exemplos, a educação típica de guerreiros e dos sacerdotes [...] Uma educação formativa: orientada, sobretudo, para cultivar um determinado modo de vida, que admita atitudes e comportamentos particulares. [...]. Assume a finalidade de educar para determinadas atitudes frente à vida (pode até vir acompanhado por um carisma e por um saber ou conhecimento, mas não se exige). Esse segundo tipo de sistema educativo constitui a instância reprodutora de uma categoria estamental, isto é, de uma categoria social que define sua posição em termos de conduta de vida, o que se traduz em prestígio. Uma educação especializada: está orientada para instruir o aluno em conhecimentos, de saberes concretos, necessários, principalmente para o exercício de papéis sociais específicos das sociedades racionalizadas, como profissionais ou políticos (VILELA, 2002, p. 92-93, grifos nossos). 33 TÓPICO 2 | KARL MARX E MAX WEBER: EDUCAÇÃO As ideias de Weber exerceram influência no Brasil, e uma das formas foi na produção acadêmica discente dos programas de pós-graduação nacionais. Leia, na Leitura Complementar a seguir, uma parte do trabalho apresentado na ANPED (Associação Nacional dos Programas de Pós-Graduação em Educação). LEITURA COMPLEMENTAR 2 MAX WEBER NOS PROGRAMAS NACIONAIS DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO: UM BALANÇO DA PRODUÇÃO ACADÊMICA DISCENTE NOS ÚLTIMOS 20 ANOS Wânia R.C. Gonzalez Max Weber é um autor pouco citado na produção acadêmica discente dos programas de pós-graduação nacionais. Em levantamento feito em um período de 20 anos, encontrei apenas dez dissertações e uma tese que incorporaram as reflexões teóricas do autor. O presente trabalho tem por finalidade refletir sobre a apropriação da teoria sociológica weberiana nas pesquisas acadêmicas realizadas nos mestrados e doutorados em educação. As principais questões que nortearam a minha investigação foram as seguintes: Quais os temas pesquisados à luz da sociologia de Weber? Quais os aspectos da teoria sociológica weberiana que são valorizados nas dissertações e teses defendidas nos programas de pós-graduação em educação? Quais são as obras de Weber mais utilizadas? É frequente a leitura de comentadores da obra do sociólogo alemão em substituição à leitura da obra do próprio autor? Tal substituição, quando ocorre, acarreta uma compreensão equivocada da teoria sociológica de Weber? Fiz o levantamento das dissertações e teses defendidas recorrendo à consulta do CD-ROM da Associação Nacional de Pós-graduação e Pesquisa em Educação (ANPED), que, editado em 1997, contém um resumo da produção discente, concluída no período de 1981 a 1996, com o apoio do INEP. Complementei o levantamento mediante a consulta ao Banco de Teses e Dissertações da Coordenação e Aperfeiçoamento do Pessoal do Ensino de Nível Superior (CAPES), para localizar os trabalhos concluídos no período de 1997 a 2001. Os passos seguintes foram: leitura dos resumos e seleção dos trabalhos que se coadunavam com o objetivo de minha pesquisa. Posteriormente, busquei localizá-los na Biblioteca Nacional. Quando não obtive êxito, utilizei o sistema COMUT (Programa de Comutação Bibliográfica) e o contato direto com as bibliotecas das universidades às quais pertencem os programas de pós-graduação. Convém esclarecer que não foi possível obter a 34 UNIDADE 1 | UM CONVITE À SOCIOLOGIA: CONCEITOS E APLICAÇÕES cópia de três trabalhos1, cujos resumos informavam a adoção da teoria sociológica weberiana no desenvolvimento das pesquisas. Considero também oportuno mencionar a possibilidade de outros trabalhos não terem sido localizados em função de não constarem nas fontes de dados pesquisadas. Uma outra falha provável na busca dos trabalhos acadêmicos refere-se à falta de amplitude das palavras descritoras selecionadas para localizar a totalidade dos trabalhos que abordam Max Weber nos programas de pós-graduação nacionais. Ciente destas possíveis lacunas, acredito ter obtido uma boa amostra da produção acadêmica que incorpora as reflexões do sociólogo alemão nos últimos 20 anos: uma tese de doutorado e dez dissertações. Optei por apresentar os trabalhos de forma sucinta, em virtude de os resumos estarem disponíveis nos locais citados anteriormente. Também tive a preocupação de não me deter na descrição dos referidos trabalhos e, sim, buscar neles aspectos que pudessem fomentar discussões no âmbito da sociologia da educação. Informações gerais da produção discente Apesar de o CD-ROM da ANPED abranger um período de 15 anos da pós- graduação em educação, localizei apenas quatro dissertações de mestrado que citam Max Weber em seus resumos. Tais estudos provêm de cursos localizados em diferentes estados, tais como: Paraná (1), Rio Grande do Sul (1) e São Paulo (2). Na consulta ao Banco de Teses e Dissertações da Capes, encontrei seis dissertações de mestrado e uma tese dos seguintes estados: São Paulo (4); Rio de Janeiro (2), Brasília (1). Convém ressaltar que o mencionado Banco de Dados abrange um período de apenas cinco anos. Comparativamente aos resultados encontrados no CD-ROM da ANPED, verifiquei um aumento do número de trabalhos acadêmicos que incorporam algum aspecto da obra do sociólogo alemão. A busca dos referidos trabalhos teve como palavras descritoras: Max Weber, burocracia, dominação, racionalização e autoridade. No tocante à orientação, constatei a existência de apenas duas dissertações3 orientadas pelo mesmo professor, Bruno Pucci, da Universidade Metodista de Piracicaba. O mestrado em educação dessa universidade é o que possui o maior número de dissertações analisadas na pesquisa. Temas abordados nas dissertações analisadas Em onze 11 dissertações e um tese, constatei uma diversidade temática. Contudo, verifiquei que há uma concentração de quatro estudos que tratam do tema da burocracia, cujos títulos são: A burocracia no sistema escolar público do 1 A racionalidade das políticas educacionais: o projeto da universidade do Tocantins - UNITINS, de Verdana Medeiros de Barros, tese de mestrado em educação, defendida na Universidade de Brasília, em setembro de 1995; Concepções de mundo, ideologia e ensino de qualidade, de Maria Medeiros da Silva, tese de mestrado em educação, defendida na Universidade Federal de Pernambuco, em dezembro de 1995; Relações de poder na escola pública de ensino fundamental: uma radiografia à luz de Weber e Bourdieu, de Magali de Castro, tese de doutorado em Educação, defendida na Universidade de São Paulo, em 1994. 35 TÓPICO 2 | KARL MARX E MAX WEBER: EDUCAÇÃO Estado de São Paulo: A direção da escola; Estruturas de burocracia e poder na educação. Análise das relações entre diretor, professor e aluno; Burocracia na administração da escolapública brasileira e Desmistificando o tempo livre como tempo para práticas educativas nas sociedades administradas. O tema “Max Weber e a educação” é abordado em dois trabalhos, com os títulos de: Modernidade e ação pedagógica em Max Weber e Educação e Desencantamento do mundo: contribuições de Max Weber para a Sociologia da Educação. Os demais temas são: educação e religião, em A educação luterana no Brasil: um estudo sobre desenvolvimento histórico, filosófico e sociológico das escolas luteranas no Paraná (1853-1992); expectativas socioeducacionais dos alunos, em Expectativas socioeducacionais de um grupo de alfabetizandos, jovens e adultos no distrito federal; autoridade dos professores, em A autoridade do professor: um estudo das representações de autoridade em professores de 1º e 2º graus; representações das crianças e dos adolescentes, em Um estudo de caso: as representações das crianças e dos adolescentes pobres de rua atendidos pela linha emergencial da associação beneficente São Martinho da rua, da família, da escola e do trabalho; e educação e modernidade, em Educação e Emancipação: Da Revolução à Resistência. [...] Limites e potencialidades dos trabalhos acadêmicos em foco Fátima (1997), Nunes (1999), Porto (1986) e Santos (1990) apresentam uma abordagem da teoria sociológica weberiana de maneira superficial, não as vinculando às discussões originadas do referencial teórico de Weber com as conclusões da dissertação. Em contrapartida, Farias (2001) retoma conceitos de Weber nas conclusões, mas não incorpora as reflexões do autor para pensar a educação. Outro exemplo de uma leitura apressada das formulações do autor foi encontrado no estudo de Farenzena (1990), quando a autora responsabiliza Weber pelo crescimento da burocracia nos sistemas educacionais. A referida autora, conforme foi ressaltado anteriormente, utilizou conceitos de Weber e Marx sem dar maiores esclarecimentos ao leitor sobre as suas escolhas teóricas tão contraditórias. Lemke (1992) faz referências à teoria weberiana utilizando-se dos comentadores de sua obra – recurso frequente nos trabalhos analisados. No entanto, observa-se um certo exagero nessa apropriação: o autor da dissertação afirma que Weber ficou sem amigos por conta da neutralidade axiológica. Afirma, ainda, que "Weber passava por ateu, mas a sociologia religiosa é fundamental para a análise da sociedade" (Lemke, 1992, p. 5). Declara, sem citar a fonte, que "Weber tinha consciência das falhas de sua teoria. Muitos o condenaram. Ele respondeu: 'enquanto não tivermos algo melhor” (Lemke, 1992, p. 5). Nunes (1999), apesar de citar dois livros do sociólogo nas referências, se ampara em comentadores da obra de Weber para as suas conclusões a respeito de interpretações controvertidas da obra do autor. As avaliações imprecisas e superficiais da obra de Weber servem para reforçar o argumento de Costa; Silva (2002) sobre a dificuldade de relacionamento entre a sociologia e a educação, em função de muitos trabalhos basearem-se em leituras rápidas e acríticas das teorias sociológicas citadas. 36 UNIDADE 1 | UM CONVITE À SOCIOLOGIA: CONCEITOS E APLICAÇÕES Acrescento a esta constatação a seguinte advertência de Alves-Mazzotti (2002, p. 33): “Em qualquer circunstância, porém, a literatura revista deve formar com os dados um todo integrado: o referencial teórico servindo à interpretação e as pesquisas anteriores orientando a construção do objeto e fornecendo parâmetros para a comparação com os resultados e conclusões do estudo em questão”. Enfim, o problema detectado não é uma particularidade dos estudos focalizados no presente trabalho e, sim, uma deficiência a ser enfrentada nos programas de pós- graduação em educação. Convém ressaltar um outro aspecto problemático na análise dos trabalhos citados anteriormente, que consiste na falta de referências entre si de trabalhos que, muitas vezes, tratam do mesmo tema. Um exemplo: Gonzalez (2000), ao abordar o tema Max Weber e a educação, não menciona a dissertação de Carvalho (1997). Este aspecto também é observado nas dissertações que tratam do tema da burocracia. Observei o resgate da teoria sociológica de Weber tanto a partir de suas formulações sobre a sociologia compreensiva como em abordagens em temas focais, como nas dissertações que tratam da burocracia. Contudo, constatei, também, que as formulações teóricas do sociólogo, nas duas perspectivas, são timidamente articuladas à compreensão dos fenômenos educacionais. Em função deste aspecto, considero valiosas as contribuições dos estudos que tratam do tema Max Weber e a educação. FONTE: Disponível em: <www.anped.org.br/reunioes/26/.../waniareginacoutinhogonzalez.rtf>. Acesso em: 2 jan. 2012. 37 RESUMO DO TÓPICO 2 Caro (a) acadêmico(a), neste tópico você viu que: • Diferente de outros pensadores da Sociologia em épocas passadas, Karl Marx não foi apenas um pensador, mas também um revolucionário. • O fetichismo representa uma contradição fundamental da produção de mercadorias: confusão de relações entre pessoas com relações entre coisas. • O marxismo prevê que o proletariado se libertará dos vínculos com as forças opressoras e, com isso, dará origem a uma nova sociedade. • Em “O Capital”, Marx realiza uma investigação profunda sobre o modo de produção capitalista e as condições de superá-lo, rumo a uma sociedade sem classes e na qual a propriedade privada seja extinta. • Para Marx, o homem é parte da natureza. Ele afirma que Darwin redescobre, em meio a animais e plantas, o funcionamento da sociedade. • A educação, para Marx, participa do processo de transformação das condições sociais, mas, ao mesmo tempo, é condicionada pelo processo. • Max Weber afirmou que a Sociologia deve sempre buscar compreender os fenômenos “no nível do significado” dos atores, o que os atores veem e sentem durante suas ações na sociedade. Também é necessário examinar o contexto cultural criado quando os atores sociais interagem. • Weber considera que resta ao homem moderno enfrentar o destino com coragem frente às exigências do cotidiano e não ficar à espera de novos profetas e novos salvadores. • Weber inspira ainda uma autorreflexão contínua na academia sobre as tradições e a modernidade, não podendo de forma alguma ser desprezado por quem deseja compreender a nossa sociedade. • Para Weber, o objetivo fundamental do educador é proporcionar aos alunos um conteúdo que incentive a reflexão própria, porém para que isso aconteça não basta somente estar atento ao conteúdo, mas também à maneira como este é transmitido. • O tema da educação ou da pedagogia em Weber fica mais claro em sua análise da política, tanto como disciplina científica quanto como ação dos indivíduos. • As ideias de Weber ainda têm reflexo, principalmente no âmbito da educação. 38 1 Sintetize as principais ideias de Karl Marx no campo da Sociologia da Educação. _____________________________________________________________________ _____________________________________________________________________ _____________________________________________________________________ _____________________________________________________________________ _____________________________________________________________________ _____________________________________________________________________ _____________________________________________________________________ _____________________________________________________________________ _____________________________________________________________________ 2 Sintetize as principais ideias de Max Weber sobre a educação. _____________________________________________________________________ __________________________________________________________________________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________ _____________________________________________________________________ _____________________________________________________________________ 3 Escreva exemplos do cotidiano, onde podemos observar as ideias de Karl Marx e Max Weber. Apresente as ideias discutidas, que você acredita serem válidas, ou não, ainda hoje. Argumente em defesa da sua posição. _____________________________________________________________________ _____________________________________________________________________ _____________________________________________________________________ _____________________________________________________________________ _____________________________________________________________________ _____________________________________________________________________ _____________________________________________________________________ _____________________________________________________________________ _____________________________________________________________________ 4 Weber afirmava que a análise sociológica deveria ser isenta de juízos de valor, ou objetiva e neutra em questões morais. E, além disso, aponta que... Assinale a alternativa CORRETA: a) ( ) Que o objetivo da sociologia é criticar as desigualdades sociais. b) ( ) Que a sociologia nada pode contribuir para sanar as desigualdades sociais. c) ( ) Que o objetivo da existência da sociedade é para que alguns homens vivam para dominar os que não têm condições de guiar-se na sociedade. d) ( ) O objetivo da Sociologia é identificar e entender como e por que nascem as regras na sociedade e como elas funcionam. AUTOATIVIDADE 39 5 Assinale a alternativa CORRETA: Entre as ideias de Marx estão: a) ( ) A natureza da sociedade era contraditória, por isso os proletários deveriam unir-se na construção de uma sociedade mais justa. b) ( ) Cada homem é dono de uma propriedade (o corpo) e cada um ganha conforme o valor agregado à sua propriedade. Sendo assim, nada mais justo, aos que agregam mais valor à sua propriedade, ganharem mais. c) ( ) O capitalismo é sistema justo e beneficia os que trabalham com dedicação. d) ( ) Os proletários estavam em tal situação porque não souberam aproveitar as oportunidades que o capitalismo ofereceu. FONTE: Disponível em: <http://www.ebah.com.br/content/ABAAABsAcAA/sociologia-prova- online-unidade-1-uniasselvi>. Acesso em: 23 abr. 2012. 6 Assinale a alternativa CORRETA: De acordo com Marx, o modo de produção burguês estrutura-se em torno da: a) ( ) Agricultura e da escravidão. b) ( ) Indústria e o trabalho assalariado. c) ( ) Agricultura e indústria. d) ( ) Indústria e o trabalho escravo. 7 Assinale a alternativa CORRETA: Na análise do aspecto social, o indivíduo satisfaz suas necessidades de adquirir os produtos e Marx mostra formas bastante diversas de renda, que podem ser classificadas em três grupos: a) ( ) O capital: rende a cada ano ao capitalista um lucro; a terra: rende ao proprietário rural uma renda fundiária; e a força de trabalho em condições normais e enquanto permanece útil, rende ao operário um salário. b) ( ) O capital: não rende a cada ano ao capitalista um lucro; a terra: não rende ao proprietário rural uma renda fundiária. c) ( ) O capital: não rende a cada ano ao capitalista um lucro; e a força de trabalho em condições normais e enquanto permanece útil, rende ao operário um lucro. d) ( ) A terra: rende ao trabalhador rural uma renda fundiária; e a força de trabalho em condições normais e enquanto permanece útil, rende ao operário muito dinheiro. Assista ao vídeo de resolução da questão 6 40 8 Complete as lacunas da sentença a seguir. Marx mostra criticamente que a ________é produzida nas organizações pelo emprego da força de trabalho. O capital compra a força de trabalho e paga em troca o salário. Trabalhando, o operário produz um novo valor, que não lhe pertence e sim ao capitalista. É preciso que ele trabalhe um certo tempo para restituir unicamente o valor do salário. Mas isso feito, ele não para, trabalha ainda mais. O novo valor que ele vai produzir agora e que passa então ao montante do salário, se chama________. Agora, assinale a alternativa CORRETA: a) ( ) mais - valia - mais-valia. b) ( ) mais - valia - salário agregado. c) ( ) salário - mais-valia. d) ( ) salário - salário agregado. FONTE: Disponível em: <http://www.ebah.com.br/content/ABAAABsAcAA/sociologia-prova- online-unidade-1-uniasselvi>. Acesso em: 23 abr. 2012. 41 TÓPICO 3 DURKHEIM, BOURDIEU E BAUMAN E A EDUCACÃO UNIDADE 1 1 INTRODUÇÃO Caro(a) acadêmico(a), você já estudou sobre a origem da sociologia, as ideias iniciais de Marx e Weber. Porém, na Sociologia podemos encontrar outros pensadores, com maior ou menor destaque no campo acadêmico. Neste tópico você estudará sobre algumas ideias do pensamento de Durkheim, Bourdieu e Bauman e as possíveis implicações para o campo educativo. Vale ressaltar que há outros sociólogos, inclusive no cenário brasileiro, que contribuíram para a difusão da Sociologia no Brasil. Dentre eles podemos destacar: Oliveira Viana, Octávio Ianni, Betinho, Alberto Guerreiro Ramos, Ricardo Antunes, José Pastore, Fernando Henrique Cardoso, Francisco de Oliveira, entre outros. 2 ÉMILE DURKHEIM: CONSIDERAÇÕES INICIAIS Émile Durkheim nasceu em 1858 e faleceu em 1917. Durkheim vive num período da Revolução Industrial, iluminismo, Revolução Francesa, positivismo e, além disso, num contexto de intelectuais, se faziam presentes ideias de pensadores como: Marx, Weber, Comte, Montesquieu, Hegel, dentre outros, que, em termos intelectuais, produziram diversas teorias. Condizente com uma visão positivista da ciência, Durkheim (1973) defendia uma sociologia neutra e imparcial, que deveria estar distante das lutas sociais e dos conflitos políticos. O papel da sociologia deveria apenas analisar os fenômenos e descrever o funcionamento da sociedade. Ela poderia até detectar as causas dos problemas sociais e, neste caso, contribuir com a sua solução, mas não caberia envolver-se com objetivos políticos e com a busca de uma sociedade melhor (SELL, 2006, p. 154). Neste cenário, a Sociologia, no ponto de vista de Durkheim, deveria manter a “saúde” do corpo social (sociedade) e incentivar transformações políticas, como outros pensadores postulavam. Uma das suas ideias centrais era que os fatos sociais existem independentemente da vontade dos indivíduos, e atuam sobre estes. Os fatos sociais são independentes das escolhas ou vontades individuais, por exemplo: a moeda e idioma de um país e as leis. 42 UNIDADE 1 | UM CONVITE À SOCIOLOGIA: CONCEITOS E APLICAÇÕES Durkheim (1973) sustentava a tese de que a explicação da vida social tem seu fundamento na sociedade, e não no indivíduo. Esta afirmação não significa que uma sociedade possa existir sem indivíduos, o que seria totalmente ilógico. O que desejava ressaltar é que, uma vez criadas pelo homem, as estruturas sociais passam a funcionar de modo independente dos atores sociais, condicionando as sua ações. Para Durkheim, a sociedade é muito mais que a soma dos indivíduos que a compõem (SELL, 2006, p.129). Neste contexto de pensamento, o objeto de estudo da Sociologia será o fato social. E este deve ser entendido como toda a maneira de agir, fixa ou não, que é capaz de exercer sobre os indivíduos uma coerção exterior. E este fato social tem existência própria e é independente das manifestações individuais. A sociologia, enuncia Durkheim, é o estudo dos fatos sociais. E os fatos sociais são justamente aqueles modos de agir que exercem sobre o indivíduo uma coerção exterior eque apresentam uma existência própria, independente das manifestações individuais que possam ter. Os fatos sociais, em suma, devem ser considerados como coisas. Durkheim nota que na vida cotidiana temos uma ideia vaga e confusa dos fatos sociais, como: o Estado, a liberdade, ou o que quer que seja, justamente porque, sendo eles uma realidade vivida, temos a ilusão de conhecê-los (RODRIGUES, 2007, p.19 -20). A sociologia dever ter a finalidade de não só explicar a sociedade (seu funcionamento), como também de encontrar remédios para as patologias da vida social. A sociedade, sendo um organismo, apresenta tanto estado normal como patologias. Os fatos normais são aqueles fatos que não estão além dos limites dos acontecimentos que são gerais de uma sociedade, ou seja, são aqueles valores e condutas que a maioria da população aceita. Já o patológico são aqueles fatos que estão fora dos limites permitidos pela ordem social e pela moral de uma determinada sociedade. “Durkheim afirma tacitamente que o fato social normal representa um estado de saúde e que o fato social patológico um estado de doença. O argumento é que um fato social é geral (e, portanto, normal) quando contribui para a preservação da vida social” (SELL, 2006, p. 155). Para entender o raciocínio de Durkheim (1978), o seu método pode ser sintetizado em três ideias principais: 1. A sociedade é semelhante a um corpo vivo. 2. A sociedadee (como corpo) é composta de várias partes. 3. Cada parte (da sociedade) cumpre uma função em relação ao todo (SELL, 2006). 43 TÓPICO 3 | DURKHEIM, BOURDIEU E BAUMAN E A EDUCACÃO FILME RECOMENDADO: ENTRE OS MUROS DA ESCOLA Título original: (Entre Les Murs) Lançamento: 2007 (França) Direção: Laurent Cantet Atores: François Bégaudeau, Nassim Amrabt, Laura Baquela, Cherif Bounaïdja Rachedi. Duração: 128 min Gênero: Drama Sinopse François Marin (François Bégaudeau) trabalha como professor de Língua Francesa em uma escola de ensino médio, localizada na periferia de Paris. Ele e seus colegas de ensino buscam apoio mútuo na difícil tarefa de fazer com que os alunos aprendam algo ao longo do ano letivo. François busca estimular seus alunos, mas o descaso e a falta de educação são grandes complicadores. FONTE: Disponível em: <http://www.adorocinema.com/filmes/entre-os-muros-da-escola/>. Acesso em: 19 out. 2011. Quanto à educação, esta ocupa um lugar importante nas obras de Durkheim. De acordo com a sua visão, era especialmente na escola, através da educação moral e cívica, que as crianças deveriam ser socializadas e preparadas para o convívio social (SELL, 2006). Para Durkheim (1978), a sociedade teria benefícios através do processo educativo, e quanto mais eficiente este processo, melhor seria o desenvolvimento da comunidade em que a escola faz parte. Além disso, a “[...] a educação, para Émile Durkheim, é essencialmente o processo pelo qual aprendemos a ser membros da sociedade. Educação é socialização” (RODRIGUES, 2007, p. 27). Nas ideias de Durkheim (1973) sobre a Educação, podemos notar que o papel das atividades educativas é formar um cidadão que fará parte de um espaço público e não somente o desenvolvimento individual de cada aluno em específico. A educação é ação exercida pelas gerações adultas sobre as que ainda não estão maduras para a vida social. Tem por objetivo suscitar e desenvolver na criança determinados números de estados físicos, intelectuais e morais que dele reclamam, por um lado, a sociedade política em seu conjunto e, por outro, o meio específico ao qual está destinado (DURKHEIM, 1973, p. 44). Em termos gerais, a educação tem como objetivo suscitar e desenvolver, nos indivíduos, estados físicos, intelectuais e morais, neste sentido que fazem parte DICAS 44 UNIDADE 1 | UM CONVITE À SOCIOLOGIA: CONCEITOS E APLICAÇÕES da sociedade em que estes indivíduos fazem parte. Além disso, a ação educativa permite a integração do indivíduo e também desenvolverá uma forte identificação com a sociedade de que este faz parte. A criança só pode conhecer o dever através de seus pais e mestres. É preciso que estes sejam para ela a encarnação e a personificação do dever. Isto é, que a autoridade moral seja a qualidade fundamental do educador. A autoridade não violenta consiste em certa ascendência moral. Liberdade e autoridade não são termos excludentes, eles se implicam. A liberdade é filha da autoridade bem compreendida. Pois ser livre não consiste em fazer aquilo que se tem vontade e em ser dono de si próprio, e saber agir segundo a razão e cumprir com o dever. É justamente a autoridade de mestre que deve ser empregada em dotar a criança desse domínio sobre si mesma (DURKHEIM, 1973, p. 47). A educação nos permite viver em sociedade e é isso que permite que a sociedade viva em nós. É só a educação que é capaz de nos fazer assim, pois a mesma é um processo social (RODRIGUES, 2007). AUTORIDADE DO PROFESSOR Durkheim (1973) sugeria que a ação educativa funcionasse de forma normativa. A criança estaria pronta para assimilar conhecimentos - e o professor bem preparado, dominando as circunstâncias. "A criança deve exercitar-se a reconhecer [a autoridade] na palavra do educador e a submeter-se ao seu ascendente; é por meio dessa condição que saberá, mais tarde, encontrá-la na sua consciência e aí se conformar a ela", propôs ele. "Em Durkheim, a autonomia da vontade só existe como obediência consentida", diz Heloísa Fernandes, da Faculdade de Ciências Sociais da USP. O sociólogo francês foi criticado por Jean Piaget (1896-1980) e Pierre Bourdieu (1930-2002), defensores da ideia de que a criança determina seus juízos e relações apenas com estímulos de seus educadores, sem que estes exerçam, necessariamente, força autoritária sobre ela. “Émile Durkheim, o criador da sociologia da educação”, escrito pelo professor Márcio Ferrari (2011). FONTE: Disponível em:<http://educarparacrescer.abril.com.br/aprendizagem/emile- durkheim-307266.shtml>. Acesso em: 20 out. 2011. E quanto aos fins da educação, está relacionada com a manutenção do que é comum para a coletividade e a continuidade das estruturas sociais, com o intuito de garantir a existência da própria sociedade. Por isso, a ação educativa deve, além de aperfeiçoar dons inatos, buscar a integração dos alunos na organização social e que estes respondam às expectativas dos diferentes meios sociais com os quais irão conviver. Não podemos desconhecer os serviços que a pedagogia pode prestar à ciência do indivíduo e nos empenhamos em demonstrar a importância desta colaboração. No entanto, cremos ainda que, mesmo no círculo UNI 45 TÓPICO 3 | DURKHEIM, BOURDIEU E BAUMAN E A EDUCACÃO de problemas em que ela pode utilmente esclarecer o pedagogo, não deverá desprezar as luzes da sociologia. Por isso que os fins da educação são sociais. Os meios pelos quais esses fins podem ser plenamente atingidos devem ter, necessariamente, caráter social. E, na verdade, entre todas as instituições pedagógicas, não há uma só, talvez, que não seja análoga a uma instituição social de que ela reproduza, sob forma reduzida e como que condensada, os traços capitais. Há uma disciplina na escola, como na cidade. As regras que fixam os deveres aos escolares são comparáveis às que prescrevem ao homem feito a sua conduta. As penas e as recompensas que lhes estão ligadas como consequências não deixam de ter semelhança com as penas e recompensas de que dão sanção às leis dos adultos (DURKHEIM, 1978, p. 87-88). 3 PIERRE BOURDIEU EM FOCO Pierre Bourdieu nasceu em 1º de agosto de 1930. Em 1982 foi eleito para a cadeira de Sociologia no Collége de France. Crítico acérrimo do liberalismo econômico. Faleceu em 23 de janeiro de 2002, em Paris, com 71 anos. Bourdieué considerado uma das maiores referências das ciências sociais no mundo contemporâneo. FONTE: Adaptado de: <http://www.homme-moderne.org/societe/socio/bourdieu/mort/port0125. html>. Acesso em: 23 abr. 2012. Devido à complexidade das obras de Pierre Bourdieu, há possibilidade de se cometer equívocos, no sentido de interpretação inadequada do seu pensamento. A sociologia, de acordo com este autor, deve preocupar-se em revelar fatos e relações nem sempre explícitas, fazendo emergir questões onde se aparenta naturalidade. Todavia, algumas ideias do seu pensamento são relevantes: a) Uma das suas preocupações estava em analisar a desigualdade e a diferença de classes em um nível estrutural e não ideológico, mas sem sucumbir à ilusão “objetivista” do estruturalismo. b) Outra preocupação era permitir que a ciência fosse além dos clichês, estereótipos e classificações dos doxa universalmente inquestionáveis e, como consequência, explicar as relações de poder inscritas na realidade social, em um determinado campo social. Enquanto muitos pensadores postulavam que a sociologia estava em estado de crise, Bordieu aponta a importância da sociologia e que esta deve ser elevada a um alto grau de cientificidade e de objetividade. E em termos gerais, a sociologia deve ter uma função crítica e desvelar os processos de funcionamento social, especialmente os de dominação. Nas ideias de Bourdieu encontramos uma série de conceitos, entre eles: habitus, capital, legitimação, com os quais buscar compreender os mecanismos 46 UNIDADE 1 | UM CONVITE À SOCIOLOGIA: CONCEITOS E APLICAÇÕES de perpetuação da sociedade vigente nas suas variadas faces. Por isso, veremos a seguir alguns dos seus conceitos. ● Habitus: pode ser entendido como as disposições inculcadas no dia a dia das pessoas, através das práticas familiares e sociais, que agem como automatismos nas maneiras de agir e designam o comportamento regular sem ser conscientemente coordenado e regido por alguma regra. O habitus, de certa forma, traduz os estilos de vida, aspectos políticos, morais e estéticos do indivíduo, que são formados durante sua socialização. Desde o nascimento, relacionamento familiar, educação, religião, trabalho, ou seja, todos os meios que contribuíram para a formação do indivíduo e na sua forma de agir, pensar e ver o mundo. O habitus está enraizado no corpo de tal maneira que perdura no decorrer da vida da pessoa e opera de forma quase inconscientemente. Desta forma, podemos afirmar que as estruturas mentais dos indivíduos sofrem condicionamento social em virtude de que há uma dimensão do social inscrita nos indivíduos. De acordo com Bourdieu (1983b, p. 65 apud SETTON, 2002, p. 62), habitus é aqui compreendido como “[...] um sistema de disposições duráveis e transponíveis que, integrando todas as experiências passadas, funciona a cada momento como uma matriz de percepções, de apreciações e de ações – e torna possível a realização de tarefas infinitamente diferenciadas, graças às transferências analógicas de esquemas [...]”. Para aprofundar seu conhecimento sobre o Habitus em Bordieu, acesse o site:<http://www.anped.org.br/rbe/rbedigital/RBDE20/RBDE20_06_MARIA_DA_GRACA_ JACINTHO_SETTON.pdf>. Acesso: 10 de dez. 2011. ● Campo: podemos dizer que é o espaço social onde no seu interior ocorrem diferentes lutas, sejam profissionais ou partidárias. E cada campo define suas maneiras específicas de dominação e estabelece suas próprias regras. Ou seja, é espaço estruturado de posições, onde os dominantes e os dominados lutam para manter e obter determinados postos. Caro(a) acadêmico(a), para obter maior conhecimento, leia o texto a seguir: “A utilização do conceito de habitus em Pierre Bourdieu para a compreensão da formação docente”, de Maria Aparecida de Souza Silva. DICAS 47 TÓPICO 3 | DURKHEIM, BOURDIEU E BAUMAN E A EDUCACÃO A RELAÇÃO ENTRE OS SABERES ADVINDOS DA EXPERIÊNCIA E OS CONCEITOS DE HABITUS E CAMPO EM BOURDIEU Os saberes da experiência são saberes práticos e formam um conjunto de representações, a partir das quais os professores interpretam, compreendem e orientam sua formação e sua prática cotidiana. Na medida em que o professor enfrenta dificuldades e interage com o campo social, profissional e escolar, ele utiliza, amplia e modifica o seu habitus. O trabalho docente é uma atividade exercida em interação com outros sujeitos, no campo escolar, que é constituído por relações sociais hierárquicas. As experiências adquiridas nas interações vão sendo articuladas com o aprendizado passado e vão se constituindo numa nova matriz geradora de saberes, que orienta a prática docente, conforme pode ser constatado por Bourdieu, quando diz que “o conhecimento prático é uma operação de construção que aciona sistemas de classificação que organizam a percepção e a apreciação, e estruturam a prática” (BOURDIEU, 1998, p. 187). A prática profissional do professor está associada aos saberes construídos e incorporados ao longo da trajetória pessoal e profissional. Ao longo da trajetória, o professor vai incorporando os saberes sobre como ensinar, sobre as imagens e papéis de professor, sobre crenças e certezas sobre a prática. Na opinião de Tardif (2002), os saberes adquiridos durante a trajetória pessoal ou pré-profissional, sobretudo os adquiridos quando da socialização primária que ocorre junto à família e quando da socialização escolar, têm um peso significativo na compreensão da natureza dos saberes docentes que serão mobilizados no exercício da prática profissional. Cunha (1998) também compartilha com essa ideia, dizendo que o desempenho do professor está atrelado à sua experiência de vida, pois para ela “o conjunto de valores e crenças que dão origem à performance dos docentes é fruto de sua história e suas experiências de vida, dando contorno ao seu desempenho”. FONTE: Disponível em: <http://www.sinprominas.org.br/imagensDin/arquivos/483.pdf>. Acesso em: 20 dez. de 2011. ● Capital: existem diferentes espécies de capital e não apenas o capital econômico, mas também a riqueza material, dinheiro, bens, os quais são meios para a conversão em outros capitais, como: o social, cultural, linguístico e escolar. Por exemplo: a) Capital cultural: é constituído pelos saberes, competências e outras aquisições de cunho cultural. O capital cultural assinala as diferenças e remarca a distinção entre classes sociais, pois cada qual pode ter os seus próprios capitais culturais que diferem de outros. 48 UNIDADE 1 | UM CONVITE À SOCIOLOGIA: CONCEITOS E APLICAÇÕES b) Capital linguístico: que se refere à variedade linguística (palavras) de grupo dominante, se impõe como marca de prestígio, ou seja, a sua forma de falar e de se expressar. ● Poder simbólico: (poder invisível, conhecido como tal e reconhecido como legítimo): designa não uma única forma, mas numerosas formas de exercício do poder, presentes na vida social. Pressupõe como condição de seu sucesso que os indivíduos a ele submetidos acreditem na legitimidade do poder daqueles que o exercem. ● Violência simbólica: (designa a confiança, a obrigação, a fidelidade pessoal, a hospitalidade, o dom, a dívida, a recompensa, a piedade, a generosidade e todas as demais virtudes que honram a moral do honrado): opõe-se à violência declarada e está baseada nos efeitos da autoridade, geradora de disciplina. Sob o véu de uma relação encantada, as estratégias doces e serenas dissimulam a dominação. A violência simbólica estaria presente nos símbolos e signos culturais, ou ainda, no reconhecimento tácito de uma determinada autoridade. É claro, caro(a) acadêmico(a), devido à amplitude da obra de Bourdieu e à vasta produção acadêmica, a partir das suasideias sugere-se que você continue pesquisando sobre os outros conceitos e ideias que se fazem presentes na sua área de atuação. Para isso você deve buscar, principalmente, artigos de cunho científico em sites como: <www.scielo.org>. 3.1 BOURDIEU E EDUCAÇÃO: PROVOCAÇÕES INICIAIS Em termos educacionais, podemos encontrar diversos estudos que têm como aparato teórico as ideias de Bourdieu. Entretanto, dentre as ideias de Bourdieu destaca-se que a função da educação pode ser um instrumento de legitimação das desigualdades sociais e a perspectiva libertadora. A escola, sendo conservadora, manterá a dominação dos dominantes e será como um instrumento que reforça as desigualdades e, além disso, reproduz os aspectos culturais, segundo a origem cultural de cada classe. A escola pode ignorar as diferenças socioculturais existentes entre as classes sociais e selecionar conhecimentos que estão de acordo com os valores culturais das classes dominantes. Além disso, a escola pode reproduzir, através de uma violência simbólica, as relações de dominação existentes na sociedade e reproduzir a ideologia da classe dominante. Ação pedagógica, portanto, é uma violência simbólica porque impõe, por um poder arbitrário, um determinado arbitrário cultural. Dito de modo simplificado, esse arbitrário cultural nada mais é do que a concepção cultural dos grupos dominantes, que é imposta a toda a sociedade através do sistema de ensino. Esta imposição, porém, não aparece jamais em sua verdade inteira e a pedagogia nunca se realiza enquanto pedagogia, pois se limita à inculcação de valores e normas. 49 TÓPICO 3 | DURKHEIM, BOURDIEU E BAUMAN E A EDUCACÃO Daí ser preciso, para que a ação pedagógica se efetive, uma autoridade pedagógica, por parte das instituições de ensino. Ela é necessária para que a inculcação possa ocorrer, sob a fachada dissimulada de uma alegada pedagogia (RODRIGUES, 2007, p. 73-74). Quanto ao processo educativo, este pode ser uma ação coercitiva, em virtude de impor predisposições de um certo código de normas e valores que pertencem a um certo grupo ou uma classe dominante, desprivilegiando a classe dominada. Nos sistemas escolares, dentre as suas funções está a de perpetuar a “ordem social” e formar hábitos. No livro chamado Os Herdeiros, os autores (Bourdieu e colaboração com Passeron) atacam o discurso dominante, segundo o qual a conquista de uma “escola para todos”, de caráter igualitário, tornaria possível a realização das potencialidades humanas. E o fazem colocando em evidência o que a instituição escolar dissimula por trás de uma aparente neutralidade, ou seja, justamente a reprodução das relações sociais e de poder vigentes. Encobertos sob as aparências de critérios puramente escolares estão os critérios sociais de triagem e de seleção dos indivíduos para ocupar determinados postos na vida. [...]. O sistema de ensino filtra os alunos sem que eles se deem conta e, com isso, reproduz as relações vigentes (RODRIGUES, 2007, p. 72). Caro(a) acadêmico(a), como já foi mencionado, a produção acadêmica tendo como aporte Bourdieu é ampla e, por isso, fica a sugestão de que você continue os seus estudos deste autor pesquisando sobre o papel do professor e a escola, bem como outros assuntos ligados ao campo da educação, e até mesmo tomar posição frente ao pensamento de Bourdieu em educação. Para aprofundar os seus estudos, leia o texto “As apropriações da obra de Pierre Bourdieu no campo educacional brasileiro, através de periódicos da área”. FONTE: Disponível em:<http://www.anped.org.br/rbe/rbedigital/RBDE17/RBDE17_07_ AFRANIO_-_DENICE_E_GILSON.pdf>. 4 ZYGMUNT BAUMAN Na história contemporânea existem diversos sociólogos estudando diversas áreas do conhecimento e suas teorias podem ter impactos diretos ou não no campo educativo, a exemplo de: Durkheim, Marx, Weber e Bourdieu. Agora estudaremos Bauman, que nasceu na Polônia em 1925. Este sociólogo tem se feito presente nas discussões acadêmicas brasileiras somente nos últimos anos, e muitas das suas ideias são relevantes para o campo educacional, principalmente porque ele faz diversas análises sobre a sociedade. Bauman é DICAS 50 UNIDADE 1 | UM CONVITE À SOCIOLOGIA: CONCEITOS E APLICAÇÕES também conhecido por ser o profeta da pós-modernidade, sendo reconhecido pela sua expressão intelectual, por intermédio de suas diversas obras. A seguir, caro acadêmico(a), você verá algumas ideias de Bauman. E a título de sugestão, você pode aprofundar os seus estudos, verificando se suas ideias têm influenciado nas discussões ou pesquisas da sua área. Na obra “Mal-Estar da Pós-Modernidade (1997)”, Bauman retrata que o mundo vigente é de incertezas, inseguro, de medo, de ameaças constantes. Além disso, a tecnologia em constante evolução exclui vagas de empregos e ao mesmo tempo cria novas oportunidades. No entanto, exigindo do ser humano novas competências e habilidades. Este processo que a sociedade está passando tem trazido certo mal-estar para a sociedade, devido às incertezas quanto ao futuro. Outra obra de Bauman é “Modernidade líquida (2000)”, onde o sociólogo retrata que, em oposição à modernidade sólida temos a modernidade líquida, que é leve, fluida e dinâmica. A título de comparação, o sólido, via de regra, mantém- se em sua forma com facilidade, já o líquido está propenso a mudar e adaptar-se devido à sua flexibilidade. “A vida líquida é uma vida precária, vivida em condições de incerteza constante” (BAUMAN, 2005b, p. 8). Desta forma, a sociedade líquida é flexível, maleável, fluida e, frente a isso, tem a capacidade de moldar-se de acordo com as infinitas estruturas já existentes ou que poderão vir a existir. Os líquidos, diferentemente dos sólidos, não mantêm sua forma com facilidade [...] Enquanto os sólidos têm dimensões especiais claras, mas neutralizam o impacto e, portanto, diminuem a significação do tempo (resistem efetivamente a seu fluxo ou o tornam irrelevante), os fluidos não se atêm muito a qualquer forma e estão constantemente prontos (e propensos) a mudá-la (BAUMAN, 2005a, p. 8). Em termos de sociedade, esta foi transformada pelo mercado. Ou seja, na sociedade líquida tudo foi reduzido a mercadoria e tem valor de mercado. Inclusive valores da vida, tido como importantes, passam a ter valor na esfera econômica. 51 TÓPICO 3 | DURKHEIM, BOURDIEU E BAUMAN E A EDUCACÃO A violenta destruição da vida e da propriedade inerente à guerra, o esforço e o alarme contínuos resultantes de um estado de perigo constante, vão compelir as nações mais vinculadas à liberdade a recorrerem, para seu repouso e segurança, a instituições cuja tendência é destruir seus direitos civis e políticos. Para serem mais seguras, elas acabam se dispondo a correr o risco de serem menos livres. Agora essa profecia está se tornando realidade. Uma vez investido sobre o mundo humano, o medo adquire um ímpeto e uma lógica de desenvolvimento próprio e precisa de poucos cuidados e praticamente nenhum investimento adicional para crescer e se espalhar - irrefreavelmente. Nas palavras de David L. Altheide, o principal não é o medo do perigo, mas aquilo no qual esse medo pode se desdobrar o que ele se torna. A vida social se altera quando as pessoas vivem atrás de muros, contratam seguranças, dirigem veículos blindados, portam porretes e revólveres, e frequentam aulas de artes marciais. O problema é que essas atividades reafirmam e ajudam a produzir o senso de desordem que nossas ações buscam evitar. Os medos nos estimulam a assumir uma ação defensiva. Quando isso ocorre, a ação defensiva confere proximidade e tangibilidade ao medo. São nossas respostas que reclassificam as premonições sombrias como realidade diária, dando corpo à palavra. O medo agora se estabeleceu,saturando nossas rotinas cotidianas; praticamente não precisa de outros estímulos exteriores, já que as ações que estimula, dia após dia, fornecem toda a motivação e toda a energia de que ele necessita para se reproduzir. Entre os mecanismos que buscam aproximar-se do modelo de sonhos do moto-perpétuo, a autorreprodução do emaranhado do medo e das ações inspiradas por esse sentimento está perto de reclamar uma posição de destaque. É como se os nossos medos tivessem ganhado a capacidade de se autoperpetuar e se autofortalecer; como se tivessem adquirido um ímpeto próprio - e pudessem continuar crescendo com base unicamente nos seus próprios recursos. [...] FONTE: BAUMAN, Zygmunt. Tempos Líquidos. Trad. de Carlos Alberto Medeiros. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2007, p.15. Na obra “Amor líquido: sobre as fragilidades dos laços humanos (2003)”, Bauman aponta que a modernidade líquida tornou os laços humanos frágeis, tornando as relações humanas inseguras, incertas e duvidosas. Inclusive transformou o amor em uma espécie de relação líquida onde os laços de relações humanas são, via de regra, de curto prazo. Neste sentido, as relações amorosas, de acordo com Bauman, têm novos contornos e são designadas de relações líquidas e frouxas. Bauman publicou outras obras, como: - Ética pós-moderna (1993). - Medo Líquido (2006). - Modernidade e Ambivalência (1991). - Vida para o consumo (2008). - Tempo líquido (2006). - Vida Líquida (2005), dentre outras. IMPORTANT E 52 UNIDADE 1 | UM CONVITE À SOCIOLOGIA: CONCEITOS E APLICAÇÕES O Caderno de Pesquisa v. 39, nº 137 - São Paulo May/Aug. 2009 - apresenta Zygmunt Bauman: entrevista sobre a educação. Desafios pedagógicos e modernidade líquida. Por isso, caro(a) acadêmico(a), em virtude das suas ideias terem influência na educação, leia uma parte da entrevista, na Leitura Complementar a seguir. LEITURA COMPLEMENTAR Zygmunt Bauman (Polônia, 1925). Sociólogo, catedrático emérito de Sociologia nas Universidades de Leeds e Varsóvia, autor de diversos ensaios, entre os quais se encontram: Globalização: as consequências humanas (1999), Vida para consumo: a transformação das pessoas em mercadoria (2008), Em busca da política (2000), Modernidade líquida (2001), Vidas desperdiçadas (2005). Seus trabalhos contribuíram para a edificação de um complexo e completo instrumental conceitual em torno da sociedade moderna. Embora seja frequentemente mencionado como um pensador "pós-moderno", seus livros não representam uma visão entusiasmada do pós-modernismo; aliás, ele se distancia da separação dicotômica modernidade versus pós-modernidade, argumentando que ambas as configurações coexistem como os lados de uma mesma moeda. Para dar conta desse fenômeno, cunhou os conceitos de "modernidade sólida" e "modernidade líquida". Pergunta (P): A educação foi concebida desde o Iluminismo como um sistema fortemente estruturado; em tempos mais recentes, a Bildung tem sido interpretada, primeiro, como um processo, depois até como um "produto" para transmitir e conservar o conhecimento. No mutável mundo de hoje, onde "correr é melhor que caminhar", onde triunfam entre os jovens a obviedade e as ideologias, o senhor considera ainda plausível uma educação voltada para "fixar em uma forma" a personalidade dos jovens através de um percurso formativo determinado? Resposta (R): A história da pedagogia esteve repleta de períodos cruciais em que ficou evidente que os pressupostos e as estratégias experimentadas e aparentemente confiáveis estavam perdendo terreno em relação à realidade e precisavam, pois, ser revistos ou reformados. Todavia, parece que a crise atual é diversa daquelas do passado. Os desafios do nosso tempo infligem um duro golpe à verdadeira essência da ideia de pedagogia formada nos albores da longa história da civilização: problematizam-se as "invariantes" da ideia, as características constitutivas da própria pedagogia (que, incólumes, resistiram às mudanças do passado); convicções nunca antes criticadas são agora consideradas culpadas de ter seguido o seu curso e, portanto, precisam ser substituídas. No mundo líquido moderno, de fato, a solidez das coisas, tanto quanto a solidez das relações humanas, vem sendo interpretada como uma ameaça: qualquer UNI 53 TÓPICO 3 | DURKHEIM, BOURDIEU E BAUMAN E A EDUCACÃO juramento de fidelidade, compromissos a longo prazo, prenunciam um futuro sobrecarregado de vínculos que limitam a liberdade de movimento e reduzem a capacidade de agarrar no voo as novas e ainda desconhecidas oportunidades. A perspectiva de assumir uma coisa pelo resto da vida é absolutamente repugnante e assustadora. E dado que inclusive as coisas mais desejadas envelhecem rapidamente, não é de espantar se elas logo perdem o brilho e se transformam, em pouco tempo, de distintivo de honra em marca de vergonha. Os editores de revistas de amenidades percebem o impulso do tempo: informam regularmente os leitores sobre coisas "para fazer" e "ter" a todo custo, dão-lhes conselhos sobre aquilo que é out e, portanto, descartável. O nosso mundo lembra cada vez mais a "cidade invisível" de Leônia, descrita por Ítalo Calvino (1990), onde "mais do que as coisas que a cada dia são fabricadas, vendidas e compradas, a opulência de Leônia se mede pelas coisas que a cada dia são jogadas fora para dar lugar às novas". A alegria de livrar-se das coisas, de descartar e eliminar é a verdadeira paixão de nosso mundo. A capacidade de durar bastante não é mais uma qualidade a favor das coisas. Presume-se que as coisas e as relações são úteis apenas por um "tempo fixo" e são reduzidas a farrapos ou eliminadas uma vez que se tornam inúteis. Portanto é necessário evitar ter bens, sobretudo aqueles duráveis, dos quais é difícil se desprender. O consumismo de hoje não visa ao acúmulo de coisas, mas à sua máxima utilização. Por qual motivo, então, "a bagagem de conhecimentos" construída nos bancos da escola, na universidade, deveria ser excluída dessa lei universal? Este é o primeiro desafio que a pedagogia deve enfrentar, ou seja, um tipo de conhecimento pronto para utilização imediata e, sucessivamente, para sua imediata eliminação, como aquele oferecido pelos programas de software (atualizados cada vez mais rapidamente e, portanto, substituídos), que se mostra muito mais atraente do que aquele proposto por uma educação sólida e estruturada. Em consequência, a ideia de que a pedagogia também possa ser um "produto" destinado à apropriação e à conservação é uma ideia desagradável e contrária à pedagogia institucionalizada. Para convencer as crianças da importância do conhecimento e do uso da aprendizagem, os pais de antigamente lhes diziam que "ninguém nunca poderá roubar a sua cultura"; o que soava como uma promessa encorajadora para os filhos de então, seria uma horrenda perspectiva para os jovens de hoje. Os compromissos tendem a ser evitados, a menos que venham acompanhados de uma cláusula de "até nova ordem". [...] O segundo desafio para os pressupostos basilares da pedagogia deriva da natureza excêntrica e essencialmente imprevisível das mudanças contemporâneas, o que reforça o primeiro desafio. O conhecimento sempre foi valorizado por sua fiel representação do mundo, mas o que aconteceria se o mundo mudasse, recusando continuamente a verdade do conhecimento ainda existente e pegando de surpresa inclusive as pessoas "mais bem informadas"? Werner Jaeger, autor de estudos clássicos sobre as antigas origens dos conceitos de pedagogia e aprendizagem, acreditava que a ideia de pedagogia (Bildung, formação) tenha nascido de duas hipóteses idênticas: aquela da ordem imutável do mundo que está na base de toda 54 UNIDADE 1 | UM CONVITEÀ SOCIOLOGIA: CONCEITOS E APLICAÇÕES a variedade da experiência humana e aquela da natureza igualmente eterna das leis que regem a natureza humana. A primeira hipótese justificava a necessidade e as vantagens da transmissão do conhecimento dos professores aos alunos. A segunda incutia no professor a autossegurança necessária para esculpir a personalidade dos alunos e, como o escultor com o mármore, pressupunha que o modelo fosse sempre justo, belo e bom, portanto virtuoso e nobre. Se as ideias de Jaeger fossem corretas (e não foram refutadas), significaria que a pedagogia, como a entendemos, se encontraria em dificuldades, porque hoje é necessário um esforço enorme para sustentar essas hipóteses, e outro ainda maior para reconhecê-las como incontestáveis. [...] Segundo o que há muito observou Ralph Waldo, quando se patina sobre gelo fino a salvação está na velocidade. Seria bom aconselhar àqueles que buscam a salvação a se moverem bastante rápido, de modo a não arriscar pôr à prova a resistência do "problema". No mundo mutável da modernidade líquida, onde dificilmente as figuras conseguem manter a sua forma por tempo suficiente para dar confiança e solidificar-se de modo a oferecer garantia a longo prazo (em cada caso, não é possível dizer quando e se solidificarão e com que pequena probabilidade, no caso de isso ocorrer), caminhar é melhor do que ficar sentado, correr é melhor que caminhar e surfar é melhor que correr. As vantagens do surf estão na rapidez e vivacidade do surfista; por outro lado, o surfista não deve ser exigente ao escolher as marés e deve estar sempre pronto a deixar de lado suas habituais preferências. Tudo isto não corresponde àquilo que a aprendizagem e a pedagogia superaram na maior parte do seu curso histórico. Afinal, foram criadas na medida de um mundo duradouro, na esperança de que este permanecesse assim e fosse ainda mais durável do que havia sido até então. Em um mundo desse tipo, a memória era um elemento precioso e seu valor aumentava quanto mais conseguisse recuar e durar. Hoje esse tipo de memória firmemente consolidada demonstra- se, em muitos casos, potencialmente incapacitante, em muitos outros enganosa e quase sempre inútil. É surpreendente pensar até que ponto a rápida e espetacular carreira dos servidores e das redes eletrônicas tem a ver com os problemas de memorização, de eliminação e reciclagem dos descartes que os próprios servidores prometiam resolver; com uma memorização que procurava mais descartes que produtos utilizáveis e sem ter um modo confiável para decidir de antemão quais, entre os produtos aparentemente úteis, se tornariam logo fora de moda e quais, entre aqueles aparentemente inúteis, haveriam de gozar de um súbito crescimento de demanda. A possibilidade de armazenar todas as informações dentro de recipientes mantidos a uma devida distância dos cérebros (onde as informações armazenadas poderiam subrepticiamente controlar o comportamento) parecia uma proposta providencial e atraente. O problema é que apenas a reforma das estratégias educativas, apesar de engenhosa e completa, pode fazer pouco ou nada. O ritual agressivo e repetitivo da corte do spinarello ou o repentino chamado da estratégia de vida de Don Giovanni não podem ser atribuídos aos educadores como culpas e negligências. O 55 TÓPICO 3 | DURKHEIM, BOURDIEU E BAUMAN E A EDUCACÃO tipo de mundo para o qual a escola preparava os jovens, como descrito por Myers ou Jaeger, era diverso daquele que os esperava fora da escola. No mundo de hoje se espera que os seres humanos busquem soluções privadas para os problemas derivados da sociedade, e não soluções derivadas da sociedade para problemas privados. Durante a fase "sólida" da história moderna, o cenário das ações humanas era criado para emular, o quanto possível, o modelo do labirinto dos comportamentistas, no qual a diferença entre os caminhos certos e errados era clara e fixa, de modo que aqueles que erravam ou recusavam os caminhos certos eram constante e imediatamente punidos, enquanto aqueles que os seguiam obediente e velozmente eram recompensados. Na época moderna as grandes fábricas "fordistas" e o recrutamento de massas para os exércitos, os dois braços mais longos do poder panótico, eram a personificação completa da tendência à rotina dos estímulos e da reação aos estímulos. O "domínio" consistia no direito de estabelecer leis infringíveis, vigiar o seu cumprimento, determinar obrigações para se seguir sob vigilância, realinhar os desviantes ou excluí-los, no caso do fracasso do esforço de reformá-los. Esse modelo de dominação exigia um compromisso recíproco e constante dos administradores e dos administrados. [...] A modernidade "sólida" era verdadeiramente a era dos princípios duradouros e concernia, sobretudo, aos princípios duráveis que eram conduzidos e vigiados com grande atenção. Na fase "líquida" da modernidade, a demanda por funções de gestão convencionais se exaure rapidamente. A dominação pode ser obtida e garantida com um dispêndio de energia, tempo e dinheiro muito menor: com a ameaça do descompromisso, ou da recusa do compromisso, mais do que com um controle ou uma vigilância inoportunos. A ameaça do descompromisso arrasta o onus probandi para o outro lado dominado. Agora, cabe aos subordinados comportar-se de modo a obter consensos perante os chefes e levá-los a "adquirir" seus serviços e seus produtos criados individualmente (assim como os outros produtores e comerciantes procuram persuadir os prováveis clientes a desejar as mercadorias à venda). "Seguir a rotina" não seria suficiente para alcançar esse objetivo. Como descobriu Luc Boltanski e Ève Chiapelo (1999), quem quiser obter sucesso na organização que substituiu o modelo dos princípios da ocupação que podemos definir como "labirinto para ratos", deve demonstrar jovialidade e capacidade comunicativa, abertura e curiosidade, pondo à venda a própria pessoa, no seu todo, como valor único e insubstituível para aumentar a qualidade da equipe. Agora é tarefa dos empregados, atuais ou futuros, se "autocontrolarem" para garantir serviços convincentes e provavelmente aprovados, mesmo nos casos de mudança do gosto dos observadores; ao contrário, os chefes não são obrigados a reprimir as idiossincrasias de seus subordinados, a homogeneizar os seus comportamentos, nem encerrar suas ações no interior da rígida estrutura da rotina. No passado, a pedagogia assumiu diversas formas e se mostrou capaz de adaptar-se às mudanças, de fixar novos objetivos e criar novas estratégias. Todavia, deixe-me repetir que as mudanças de hoje são diferentes daquelas ocorridas no 56 UNIDADE 1 | UM CONVITE À SOCIOLOGIA: CONCEITOS E APLICAÇÕES passado. Nenhuma reviravolta da história humana pôs os educadores diante de desafios comparáveis a esses decisivos de nossos dias. Simplesmente, não havíamos estado até agora em situação semelhante. A arte de viver em um mundo ultrassaturado de informações ainda deve ser aprendida, assim como a arte ainda mais difícil de educar o ser humano neste novo modo de viver. [...]. FONTE: Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0100- 15742009000200016&script=sci_arttext>. Acesso em: 20 de dez. 2011. 57 RESUMO DO TÓPICO 3 Neste tópico você viu que: • Para Durkheim (1978), a Sociologia deveria ser neutra e imparcial, e além disso, deveria estar distante das lutas sociais e conflitos políticos. O papel da sociologia deveria apenas analisar os fenômenos e descrever o funcionamento da sociedade. • Bourdieu reafirma a importância da sociologia e esta deveria ser elevada a um alto grau de cientificidade e de objetividade. • Para Bourdieu (2001),a educação é um dos instrumentos de legitimação das desigualdades sociais. • Para Bourdieu (2001), a escola, sendo conservadora, manterá a dominação dos dominantes e será como um instrumento que reforça as desigualdades e, além disso, reproduz os aspectos culturais, segundo a origem cultural de cada classe. • Bauman (2005) é também conhecido por ser o profeta da pós-modernidade, sendo reconhecido pela sua expressão intelectual, por intermédio de suas diversas obras. • Ação pedagógica, portanto, é uma violência simbólica porque impõe, por um poder arbitrário, um determinado arbitrário cultural. Dito de modo simplificado, esse arbitrário cultural nada mais é do que a concepção cultural dos grupos dominantes, que é imposta a toda a sociedade através do sistema de ensino. • O poder simbólico surge como todo o poder que consegue impor significações, e impô-Ias como legítimas. • O sociólogo Bauman (2005) retrata que a modernidade líquida é leve, fluida e dinâmica, a qual está em oposição ao que a modernidade sólida suplantou. • Na sociedade líquida tudo é fluidez, maleabilidade, flexibilidade e tem a capacidade de moldar-se de acordo com as infinitas estruturas já existentes, ou que poderão vir a existir. 58 1 Assinale a alternativa CORRETA: Segundo Bauman (2005), as relações humanas na pós-modernidade são frágeis, duvidosas, frouxas, livres e inseguras. Em sua fragilidade os vínculos humanos são misteriosos, conflitantes e inseguros, na medida em que o homem contemporâneo está abandonado ao seu próprio aparelho de sentido, de modo que tal aparelho tem, ao mesmo tempo, grande facilidade de conceder e descartar sentido nas relações amorosas. As ideias anteriores de Bauman referem-se: a) ( ) A sociedade brasileira, nos dias atuais, é frouxa em termos de relações amorosas, em virtude destas terem iniciado no período colonial devido à miscigenação étnica do povo brasileiro. b) ( ) Ao surgimento da Revolução Industrial, quando as pessoas deixaram o campo para viver e trabalhar na cidade e, devido ao excesso de trabalho nas indústrias, as relações humanas tornaram-se frágeis, tendo como consequência direta, provada pela ciência e a estatística, o afrouxamento das relações amorosas. c) ( ) Ao início da modernidade, quando a mentalidade medieval começa a ser questionada e inclusive as relações amorosas, anteriormente tidas como eternas, passam a ser livres e frouxas e que, em virtude disso, afetou diretamente a sociedade atual. d) ( ) Na vida contemporânea, de um modo geral, as relações amorosas têm novos contornos e são designadas de relações líquidas e frouxas. 2 Assinale a alternativa CORRETA: Segundo Bauman (2005), as relações humanas na pós-modernidade são frágeis, duvidosas, frouxas, livres e inseguras. Em sua fragilidade os vínculos humanos são misteriosos, conflitantes e inseguros, na medida em que o homem contemporâneo está abandonado ao seu próprio aparelho de sentido, de modo que tal aparelho tem, ao mesmo tempo, grande facilidade de conceder e descartar sentido nas relações amorosas. Frente às lições desse Caderno de Estudos, a afirmação anterior está em consonância com: a) ( ) A pré-modernidade. b) ( ) A pós-modernidade. c) ( ) O positivismo. d) ( ) A modernidade. AUTOATIVIDADE Assista ao vídeo de resolução da questão 1 59 3 Escreva as principais ideias de Durkheim (1978) quanto ao aspecto educacional. ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ _____________________________________________________________________ 4 Escreva algumas ideias de Bourdieu e Bauman que você considera relevantes para o campo da Educação. ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ ____________________________________________________________________ _____________________________________________________________________