Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Estruturas de Periodização Faculdade de Motricidade Humana Licenciatura em Ciências do Desporto – Teoria e Metodologia do Treino Desportivo 1 Periodização do processo de treino Nota: o presente texto deve ser lido em conjunto com os diapositivos da disciplina. As estruturas da periodização A periodização típica envolve três níveis fundamentais: a macro-estrutura, a meso-estrutura e a micro-estrutura. Nesta última considera-se o microciclo, de duração semanal típica, e as sessões que o constituem. Na meso-estrutura surge o mesociclo, estrutura intermédia que agrupa vários microciclos, orientando o processo de treino de acordo com os objectivos definidos, sistematizando a alteração das componentes da carga e dos conteúdos dos exercícios de treino. Por último, o macrociclo, que constitui um todo integrando as competições em que o atleta deverá participar e o período de preparação necessário para que essa intervenção seja bem sucedida. 1. A sessão de treino A sessão de treino será a unidade mais pequena nesta estruturação temporal em que consiste o processo de periodização do treino, e nela se organizarão, numa sequência lógica e respeitando os princípios biológicos e metodológicos do treino, os vários exercícios seleccionados para promover o desenvolvimento do atleta ou a sua preparação para a competição. Como unidade elementar onde qualquer programa de treino é colocado em interacção concreta com o atleta e as suas características, ela é o local da operacionalização e concretização da preparação com vista à participação em Estruturas de Periodização Faculdade de Motricidade Humana Licenciatura em Ciências do Desporto – Teoria e Metodologia do Treino Desportivo 2 competição. Neste sentido, é o bloco básico sobre o qual se constrói o treino desportivo, embora em termos de periodização deva estar subordinado a um plano do microciclo (plano corrente), normalmente de base semanal, onde se procederá ao nível fundamental de integração dos diversos factores do treino. Na sessão de treino, no fundo, os atletas adquirem novas destrezas técnicas e tácticas, melhoram a condição física e consolidam a autoconfiança, a motivação e a segurança necessárias para levar a bom termo os seus objectivos desportivos, individuais e colectivos. Caberá ao treinador apurar ao máximo a capacidade de retirar do tempo de uma sessão de treino o máximo de impacto na preparação do atleta e curto e médio prazo. A definição clara de prioridades e uma concepção correcta sobre as interacções entre elementos de nível de especificidade variada e suporte físico distinto asseguram a efectividade do processo de treino. Orientação da sessão de treino Existem dois tipos básicos de sessão de treino no que diz respeito à sua orientação: A sessão de treino de orientação selectiva – caracteriza-se por ter como objectivo o desenvolvimento preferencial de um determinado sistema de produção de energia ou de uma qualidade física. É uma forma de organização da sessão indicada para fases do treino de carácter muito específico. Assim, o plano da sessão será organizado de modo a que a maior parte dos exercícios vise o desenvolvimento da mesma capacidade. A sessão de treino de orientação complexa – tem uma estrutura que implica a combinação de meios de treino visando o desenvolvimento de diversas qualidades físicas. Podemos distinguir duas variantes deste tipo de sessões: Estruturas de Periodização Faculdade de Motricidade Humana Licenciatura em Ciências do Desporto – Teoria e Metodologia do Treino Desportivo 3 o A sessão de orientação complexa e influência sucessiva – as tarefas de treino correspondendo a objectivos diferentes são realizadas sequencialmente, mantendo o seu carácter específico bem delimitado. Constituem, assim, como que módulos independentes dentro de uma mesma sessão. o A sessão de orientação complexa e influência paralela – são seleccionados meios de treino que possibilitem trabalhar simultaneamente vários factores do treino ou várias expressões das qualidades físicas: a estimulação concomitante de duas zonas de intensidade: potência láctica/tolerância láctica; o trabalho conjunto para a velocidade e a resistência (potência láctica, por exemplo); a utilização de exercícios que solicitem a força máxima e a flexibilidade; a concepção de tarefas de treino que visem elementos técnico-tácticos em condições de preparação específica da resistência ou da força. As sessões de orientação complexa, e, de entre estas, as de influência sucessiva, são, de longe, as que mais habitualmente se utilizam no treino desportivo. Nos atletas mais jovens, assim como nos períodos iniciais de preparação da época, poderão ser mesmo as únicas a ser utilizadas. A sessão selectiva, quando de nível de carga importante ou elevado, é mais exigente em termos físicos e psicológicos, permitindo uma estimulação mais “profunda” numa só área de intervenção, o que também provoca níveis de fadiga mais acentuados e localizados. Por tudo isto, só surgirá mais próximo da fase final da época, e tornar-se-á mais frequente à medida que o atleta entrar em etapas mais especializadas da sua preparação. Estruturas de Periodização Faculdade de Motricidade Humana Licenciatura em Ciências do Desporto – Teoria e Metodologia do Treino Desportivo 4 Tipos de sessões de treino Sessão de treino de aprendizagem A intenção com que se concebem sessões de aprendizagem é a de promover a aquisição de acções motoras ou de encadeamentos específicos de acções motoras de carácter novo. A assimilação de novos elementos ao reportório técnico e táctico do atleta (e da equipa no seu conjunto: desenvolvimento e concretização do modelo de jogo), assim como a apresentação de exercícios com alguma complexidade no campo do desenvolvimento das qualidades físicas, de que o melhor exemplo é a introdução às técnicas específicas de realização de exercícios para o treino da força com pesos livres, serão objecto de sessões de aprendizagem. Decorre do exposto que as sessões de aprendizagem, se bem que mais comuns no atleta jovem, no início dos macrociclos e nos desportos de grande dominante técnica (actividades gímnicas, por exemplo) ou táctica (caracteristicamente, os JDC), é de utilização universal, podendo surgir no atleta de fundo para a correcção de elementos técnicos da corrida ou em pleno período competitivo, para trabalhar particularidades do modelo de jogo num JDC. A dinâmica da carga deste tipo de sessões aponta, por razões óbvias, para volumes relativamente baixos, pouca variedade dos exercícios utilizados, assim como para intensidade baixas ou moderadas, já que a dominante nestas sessões é claramente cognitiva e de apreensão perceptivo-motora. Uma parte final da sessão dedicada à veiculação de informação de retorno referente à execução conseguida, acompanhada de reforço positivo que perspectiva as sessões seguintes de âmbito semelhante, será de importância fundamental. Estruturas de Periodização Faculdade de Motricidade Humana Licenciatura em Ciências do Desporto – Teoria e Metodologia do Treino Desportivo 5 Sessão de treino de repetição Em contraste com as sessões de aprendizagem, as sessões de repetição surgem com o intuito de promover o aperfeiçoamento e a automatização das habilidades técnicas ou dos esquemas tácticos num contexto de domínio avançado, explorando a variabilidade e a replicação em situações de fadiga, perante oposição ou simulando as condições de competição. Por outro lado, o desenvolvimento e amanutenção das qualidades físicas será realizado com recurso a sessões deste tipo, que pouco conteúdo cognitivo terão, na medida em que se trata da realização de exercícios cuja execução se encontra bem dominada pelo atleta. As sessões de repetições caracterizam-se, assim, por volumes e intensidade elevados, constituindo a maior parte das sessões de treino em muitas modalidades. Tal como as sessões de aprendizagem, têm carácter universal, mas serão particularmente abundantes nas modalidades cujo desempenho assenta mais directamente na expressão directa das qualidades físicas (desportos cíclicos de resistência e velocidade, desportos de força explosiva), no atleta mais experiente e, em termos gerais, na segunda fase da preparação geral e durante os chamados períodos competitivos. Sessão de treino de controlo ou verificação Consoante o plano de preparação do macrociclo, deverão aparecer ciclicamente sessões dedicadas à avaliação e controlo da evolução do atleta. Estas sessões podem ser constituídas pela aplicação de provas de avaliação e baterias de testes visando a recolha objectiva de informação sobre a capacidade de desempenho em inúmeros factores de preparação considerados relevantes, assumindo uma dimensão analítica, ou, então, Estruturas de Periodização Faculdade de Motricidade Humana Licenciatura em Ciências do Desporto – Teoria e Metodologia do Treino Desportivo 6 podem consistir na realização de situações simuladas de competição ou mesmo na realização de competições preparatórias, surgindo com uma dimensão integrada. Neste último caso, em especial, podem surgir associadas a níveis muito elevados de intensidade da carga. Este tipo de sessões pode ter como objectivo a selecção de jogadores que vão constituir a equipa num próximo jogo, o escalonamento e escolha de atletas para diversas situações em competição, numa estafeta, em provas que só admitem um ou dois participantes por equipa, etc. Sessão de reconhecimento É um tipo muito particular de sessão, pouco frequente, que surge com o intuito de promover a avaliação inicial e o diagnóstico de capacidades em situações em que haja grande desconhecimento das características dos atletas. O treinador, que por razões diversas (início da época num novo clube, mudança de clube, estágio de nível regional/nacional com atletas não habituais, etc.) se vê perante a situação de ter que orientar um ciclo de preparação com atletas sobre os quais tem pouca informação, realizará uma ou mais sessões no sentido de apreciar qual o seu nível técnico e táctico. Será assim uma sessão de carácter especial, visando a avaliação dos atletas em aspectos específicos e dominantemente nos factores técnicos e tácticos. A estrutura da sessão de treino A eficácia da sessão de treino vai depender, em grande parte, da sua constituição como um todo funcional em que as partes se afigurem congruentes com os objectivos principais definidos. Estruturas de Periodização Faculdade de Motricidade Humana Licenciatura em Ciências do Desporto – Teoria e Metodologia do Treino Desportivo 7 Parte Introdutória A Parte Introdutória prepara cognitiva e animicamente o praticante para a realização da sessão e para o esforço físico e de concentração nela envolvidos. Pode ser muito curta mas a sua importância é grande porque condiciona o estado de espírito com que o atleta irá encarar a realização das tarefas do treino. Tem uma dimensão informativa: explicação dos objetivos da sessão, relação desses objectivos com o que se passou na última competição e com o que se pretende conseguir na próxima, como se desenrolará a sessão (sequência das tarefas e prioridades). Tem uma dimensão organizativa: preparação dos equipamentos, organização dos grupos, distribuição espacial e/ou por tarefas. Tem, ainda, uma dimensão psicológica: consciencialização para a importância do que vai ser feito e motivação do grupo. Esta última é de grande importância na condução do processo de treino e nunca deverá estar ausente, mesmo quando as outras dimensões, pelas características da sessão, sejam desnecessárias. Parte Preparatória Nesta parcela da sessão pretende-se preparar o atleta sistematicamente nos aspectos metabólicos, neuromusculares e controlo motor para as tarefas da secção principal. Terá que trabalhar a elasticidade muscular e a mobilidade articular óptimas, adaptando o organismo e ensaiando sequências motoras especiais (simulação da técnica de competição, mobilidade especial e tempo de reacção). É aquilo que vulgarmente se chama de aquecimento. Surge com uma fase geral: activar os grandes sistemas funcionais, cardiovascular e respiratório, aumentar a temperatura interna corporal, pôr em Estruturas de Periodização Faculdade de Motricidade Humana Licenciatura em Ciências do Desporto – Teoria e Metodologia do Treino Desportivo 8 acção os mecanismos não específicos de preparação para a acção motora, mentais, nervosos e hormonais; e com uma fase especial: deve aproximar ao máximo do conteúdo específico do desporto praticado e dos exercícios que vão ser realizados na Parte Principal, solicitando as áreas musculares que vão ser mais utilizados com suficiente intensidade para colocar em acção os efeitos agudos iniciais de adaptação ao esforço. O ideal é partir dos grupos musculares pequenos para os grandes, a duração dependerá do desporto, da idade e da temperatura. Parte Principal Tem esta designação por ser aqui que se concretizam, através de uma configuração metodológica precisa e da organização dos conteúdos seleccionados, os objectivos previstos para a sessão de treino. Estes devem ser correctamente escolhidos e colocados adequadamente na estrutura organizativa da parte fundamental da sessão de treino. As outras duas partes (aquecimento e retorno à calma) são condicionadas e determinadas pelo conteúdo desta. O carácter distinto das tarefas que aqui podem surgir dará origem à caracterização das sessões de acordo com os seus objectivos, como de treino técnico, de aprendizagem da flexibilidade, trabalho em condições próprias da competição, treino táctico, treino da resistência, força, velocidade, coordenação ou sessão complexa combinando quaisquer destes elementos. A eficácia de cada tipo de sessão depende, em qualquer caso, da sistematicidade com que se cumpram as seguintes condições (Martin et al., 2001): Determinar a sequência temporal, isto é, a regulação do curso segundo a qual se pretende que evolua o conjunto de exercícios a utilizar, como por exemplo, no treino da técnica ou da táctica; Determinar a sucessão dos conteúdos e dos procedimentos metodológicos; Planeamento dos locais e dos equipamentos necessários Estruturas de Periodização Faculdade de Motricidade Humana Licenciatura em Ciências do Desporto – Teoria e Metodologia do Treino Desportivo 9 Utilização de medidas de controlo (gravações vídeo no treino da técnica, tiragem de tempos no treina da velocidade ou da resistência, controlo da frequência cardíaca para aferição e confirmação das zonas de intensidade, medição da força produzidas em diferentes acções musculares, etc.) Manter um fluxo de informação constante entre os membros dos grupos de treino e o treinador. Recomendações práticas: - O aperfeiçoamento da técnica, da velocidade de deslocamento ou do tempo de reacção deverão ser trabalhados logo a seguir ao aquecimento, isto é, sem fadiga; - O treino da força pode ser realizado logo a seguir; - O treino da resistência, ao contrário da prática tradicional,deverá ser preferencialmente realizado no fim da sessão; - As anteriores indicações metodológicas pressupõem uma visão sectorial de cada capacidade motora, contudo, no jogo ou em qualquer outro tipo de competição, todas estão integradas, pelo que a sua rentabilização exige que, por vezes a técnica e a velocidade sejam também solicitadas em situações de fadiga, tal como sucede na realidade; - Se pretendermos melhorar a resistência específica, a duração desta fase deverá ser superior à da competição ou, caso seja menor, deverá ter uma intensidade superior e um menor número de pausas; - Se pretendermos melhorar a velocidade, a duração desta fase poderá ser inferior à da competição, mas com uma intensidade superior e um aumento de duração das pausas; - Muitas vezes confunde-se o treino das componentes da velocidade de dominante nervosa (máxima, capacidade de aceleração, de execução ou o tempo de reacção) com o treino da velocidade resistente. Esta última pode ser treinada com alguma fadiga residual e é ela que surge em muitas Estruturas de Periodização Faculdade de Motricidade Humana Licenciatura em Ciências do Desporto – Teoria e Metodologia do Treino Desportivo 10 situações de competição de carácter acíclico e complexo (JDC, desportos de combate), podendo aqui ser trabalhada a capacidade de o atleta executar repetidamente movimentos explosivos e rápidos num pano de fundo de instalação da fadiga, o que implica a utilização de tarefas de treino deste tipo no final da Parte principal da sessão de treino. - Não será conveniente planear para uma mesma sessão importantes cargas de velocidade e treino aquisitivo técnico ou táctico, pois qualquer um deles pode deixar traços de fadiga importantes no organismo. - Antes de treino de aptidões novas, técnicas ou tácticas (treino aquisitivo), poderão surgir pequenos segmentos de técnica ou táctica anteriormente trabalhados e com relação estrutural com os conteúdos a trabalhar na presente sessão, assim como alguns exercícios de força de carácter breve e intenso, que se saiba serem de regeneração contínua para os atletas alvo desta intervenção (ver mais à frente níveis de recuperação das cargas de treino no seio do microciclo); - Reforçando o anterior, frisemos que a noção de sessão de aprendizagem anteriormente definida coloca precisamente a questão de se isolar, quando necessário o treino aquisitivo técnico e táctico em sessões separadas de nível de carga baixo ou médio. Acresce a este facto a noção de que os engramas dinâmicos estimulados nas tarefas de aquisição técnica necessitam de uma fase de consolidação posterior (Martin et al, 2001) podendo haver interferência negativa caso este tipo de sessão tenha uma segunda parte de aplicação de grandes cargas físicas ou grande complexidade técnica ou táctica. - Em atletas de nível de treino elevado, considera-se que a aplicação de um conjunto de exercícios de força explosiva ou reactiva de pouco volume, não ultrapassando, portanto, o nível de regeneração contínua do atleta, pode ser favorável para o treina da velocidade, já que implica uma activação nervosa e neuromuscular prévia favorável. Este mesmo efeito cruzado pode Estruturas de Periodização Faculdade de Motricidade Humana Licenciatura em Ciências do Desporto – Teoria e Metodologia do Treino Desportivo 11 funcionar no sentido inverso, ou seja, colocar algumas tarefas de velocidade antes do treino da força rápida (explosiva ou reactiva). - Actividades de grande volume no âmbito da hipertrofia muscular ou da resistência (láctica, potência ou capacidade aeróbias) podem ser precedidas por tarefas de alongamento muscular de empenhamento elevado. No atleta jovem ou em praticantes acomodados a níveis de carga moderada, os planos da Parte Principal das sessões de treino não sofrerá grandes alterações, seguindo, nas modalidades de dominante técnica ou táctica, o esquema 1º - preparação técnica e/ou táctica, segundo lógicas internas aos próprios conteúdos incorporados, progressões, grau de complexidade crescente, etc.; 2º - Preparação física, nas combinações velocidade-força, velocidade-resistência ou força- resistência. Parte Final Na Parte Final procura-se introduzir processos de recuperação sempre que necessário. Em sessões de nível de carga fraco, normalmente sessões de aprendizagem, sejam de dimensão técnica ou táctica ou visando o domínio de procedimentos para o treino físico (exemplo: exercícios de força com pesos livres) pode-se prescindir da realização das tarefas típicas de “retorno à calma”. Sessões de grande impacto orgânico, sejam elas dirigidas para o treino das qualidades físicas, com grande utilização de exercícios gerais ou especiais, sejam elas orientadas para as cargas específicas, reproduzindo a situação de competição, exigem atenção redobrada para esta fase da sessão. Entre os procedimentos habituais a utilizar na Parte Final de uma sessão de treino de nível de empenho elevado para o atleta, contam-se as tarefas aeróbias cíclicas de baixa intensidade, que podem durar entre 3 a 20 minutos, alongamento muscular estático activo ou passivo submáximo, não procurando os Estruturas de Periodização Faculdade de Motricidade Humana Licenciatura em Ciências do Desporto – Teoria e Metodologia do Treino Desportivo 12 limites da mobilidade articular, e, principalmente (mas não unicamente) em atletas mais jovens, formas jogadas de impacto fisiológico moderado. Formas de intensificação dos processos de regeneração muscular são incluídas por alguns autores nesta fase da sessão de treino (massagem recuperadora, banhos quentes, sauna, etc.) embora as mais das vezes seja mais correcto considerá-las como integrando um período pós-sessão de treino, que não deixa de ser de importância crucial, e de estar integrado no processo de treino visto na globalidade, mas foge à lógica estrita que presidiu à concepção da sessão de treino e à influência directa do treinador. O que não pode deixar de ser realizado pelo treinador é o que diz respeito à interacção afectiva e comunicacional a realizar no fim de uma sessão de treino. Nenhuma sessão de treino deve terminar com os atletas a irem para casa sem terem recebido do treinador um reforço positivo sobre o trabalho realizado, uma apreciação sobre alguns detalhes mais significativos ou sobre o seu comportamento global ou uma visão perspectivando o futuro próximo a curto ou médio prazo, fazendo a ligação entre a dinâmica procurada na sessão e as competições vindouras. Esta interacção, de importância e duração variável, individualizada ou colectiva, terá sempre que ser realizada, constituindo parte de um dos mais fortes alicerces da efectividade do processo de treino: a confiança que o atleta deposita no treinador a o estatuto de liderança que lhe reconhece. Duração da sessão de treino A sessão de treino pode ter durações muitas variadas, digamos que entre 45 minutos e 4 horas. No atleta adulto, a duração média será de 2 horas, tempo suficiente para que as interacções pretendidas sejam consistentes e que não se ultrapasse o tempo habitual de capacidade de concentração e focalização do atleta ou que se corra o risco de atingir níveis de fadiga demasiado elevados. É a estrutura dos conteúdos e a capacidade individual de cada atleta (a sua fase de Estruturas de Periodização Faculdade de Motricidade Humana Licenciatura em Ciências do Desporto – Teoria e Metodologia do Treino Desportivo 13 desenvolvimento) que condicionarão a duração da sessão de treino. Num mesmo microciclo, podem surgir sessões com durações muito diferentes, consoanteos objectivos em presença. A duração relativa das partes da sessão indicada por Bompa (1999) é a seguinte: Parte Introdutória - até 5% Parte Preparatória - 15% a 20% Parte Principal - - 50% a 70% Parte Final - 5% a 10% 2. Microciclo O microciclo é a estrutura que organiza e assegura a coerência das cargas ao longo de uma sequência determinada de sessões de treino, entre 3 a 10 sessões, embora normalmente corresponda a 1 semana de preparação. No microciclo devem aparecer bem identificados os objectivos de preparação em vista num determinado momento da época e que constituem a base para a concepção das sessões de treino. No confronto da organização das estruturas de periodização com o calendário competitivo ocorre muitas vezes a necessidade de se proceder a modificações pontuais e temporárias da funcionalidade táctica básica do praticante ou da equipa, que se definem a partir da previsão das características de que se deverá revestir uma competição importante, a surgir num prazo de uma a três semanas. Este processo decorre no quadro da elaboração de um plano estratégico (Castelo, 1996) e a natureza da alteração nos conteúdos do treino e a elaboração de novos esquemas tácticos depende inteiramente das particularidades do Estruturas de Periodização Faculdade de Motricidade Humana Licenciatura em Ciências do Desporto – Teoria e Metodologia do Treino Desportivo 14 adversário que se vai enfrentar e das condições que rodeiam a competição em causa. A partir da identificação e caracterização do atleta ou da equipa opositores, do terreno de jogo, das circunstâncias que rodeiam a competição e de outros factores, pretende-se criar condições para uma actuação no quadro da competição que retire uma vantagem decisiva das carências detectadas e, ao mesmo tempo, procurar minimizar os atributos sobre os quais assenta a eficácia do desempenho competitivo do adversário. A intervenção determinante do plano estratégico será mais importante no período onde surgem as competições principais, embora, por vezes, possa ocorrer mais cedo. Sendo uma prática comum nos jogos desportivos colectivos e nos desportos de confronto directo (desportos de combate, desportos de raquete), pode surgir em outras modalidades, sempre que o confronto desportivo se revista de um carácter bastante “personalizado” – superação de um determinado adversário. De acordo com Castelo (1996), a realização de um plano estratégico tem como finalidade prever o comportamento da equipa oponente, delineando um conjunto de cenários possíveis caso os seus objectivos tácticos não estejam a ser cumpridos. A sua lógica está dependente do carácter circunstancial em que surge, ou seja, é pensado para uma competição contra um determinado adversário e perante condições que dificilmente se repetirão. Assim, é na elaboração do plano corrente, que define o conteúdo de um determinado microciclo que o treinador determinará quais as alterações no esquema táctico a contemplar, embora se possa dar o caso, especialmente se se tratar de competições de grande importância para o atleta ou a equipa, de um plano estratégico exigir a subordinação de mais de um microciclo, o que significa que a influência de um determinado plano estratégico poderá abranger o nível de um mesociclo de 2 a 3 semanas. Estruturas de Periodização Faculdade de Motricidade Humana Licenciatura em Ciências do Desporto – Teoria e Metodologia do Treino Desportivo 15 Parâmetros metodológicos para a construção dos microciclos No plano corrente devem surgir os programas detalhados de cada sessão de treino, discriminando níveis de solicitação da carga e conteúdos. Assim, as informações contidas no plano corrente descrevem: A distribuição das sessões de treino em cada dia da semana, marcando treinos matinais e vespertinos; A descrição detalhada da sequência dos procedimentos metodológicos e de conteúdo de cada sessão de treino O estabelecimento das exigências de carga associadas a cada sessão, com indicação do volume e da intensidade relativa pretendidos (a densidade poderá ser de alguma utilidade nalgumas modalidades), assim como uma apreciação, normalmente qualitativa sobre o nível de carga da sessão. Muitas vezes é útil ter uma representação esquemática ou gráfica do microciclo, de modo a melhor verificar a dinâmica das cargas, a sua alternância e os efeitos de recuperação cruzada pretendidos. Em especial nos casos onde surgem treinos bi-diários, é importante que os tempos de intervalo entre cada sessão sejam devidamente considerados. Classificação dos microciclos 1. Microciclo gradual Os microciclos graduais são caracterizados por um fraco nível de solicitação e têm por objectivo a preparação do organismo para um trabalho intenso. Constituem a etapa inicial da meso-estrutura. Estruturas de Periodização Faculdade de Motricidade Humana Licenciatura em Ciências do Desporto – Teoria e Metodologia do Treino Desportivo 16 2. Microciclo de desenvolvimento Os microciclos de desenvolvimento são caracterizados por um grande volume global de treino e um nível de solicitação elevada. Têm por objectivo estimular os processos de adaptação do organismo. Constituem uma parte importante do trabalho de preparação do praticante ou da equipa, mantendo-se na fase de trabalho próximo das competições mas com características de conteúdo muito próprias. 2.1 Microciclo de carga Trata-se do tipo mais habitual de microciclo de desenvolvimento, com uma constituição assente na utilização de sessões de repetição e com uma organização da carga claramente visando o desenvolvimento das qualidade físicas e das aptidões técnico-tácticas, surgindo, no que diz respeito à dinâmica da carga, como elo de uma cadeia de microciclos onde se procede à progressão gradual da solicitação de treino. 2.2 Microciclo de choque É um microciclo de desenvolvimento que surge com características de dinâmica da carga em abrupta diferenciação em relação aos microciclos precendentes, ou seja com um acréscimo ou do volume, ou da intensidade ou de ambos, significativo. Variações de 20-30% são aqui comuns. O microciclo de choque surge da necessidade de propor, em certas alturas da época e para atletas com um nível de treino bastante elevado, estímulos adicionais que promovam adaptação através de uma concentração de cargas físicas não habituais. Só surge 2 a 3 vezes por macrociclo, não fazendo parte dos programas de treino nas fases de formação desportiva inicial. A sua aplicação surge associada a processos contínuos e rigorosos de monitorização da carga e dos seus efeitos. Estruturas de Periodização Faculdade de Motricidade Humana Licenciatura em Ciências do Desporto – Teoria e Metodologia do Treino Desportivo 17 2.3 Microciclo de aproximação ou pré-competitivo É um microciclo de desenvolvimento dedicado à preparação especial e específica para a competição. O volume é relativamente baixo e corresponde, normalmente, aos momentos do macrociclo em que a intensidade surge com maior relevância, dando lugar aos picos máximos na curva de variação semanal desta característica. 3. Microciclo de recuperação Os microciclos de recuperação são utilizados basicamente no final de uma sequência de microciclos de desenvolvimento (terminando um mesociclo), antecedendo ou seguindo-se a um microciclo de competição. Têm por objectivo assegurar a eficácia dos processos de recuperação, doseando os efeitos das cargas e controlando o nível de fadiga acumulada do atleta. Naturalmenteque se procede nestes microciclos a uma redução significativa do volume dos exercícios utilizados, acompanhada de uma redução ou, pelo menos, estabilização da intensidade. Consoante a fase da época, poderá ocorrer igualmente uma alteração na composição percentual das preparações geral e especial/específica, com acréscimo da primeira, associada a procedimentos de recuperação activa e redução relativa da segunda. 4. Microciclo de competição O microciclo de competição ou competitivo é aquele onde surge a competição ou que a antecede imediatamente. Os microciclos de competição são constituídos em conformidade com o calendário competitivo, tendo em consideração o número de competições importante e principais e a duração do Estruturas de Periodização Faculdade de Motricidade Humana Licenciatura em Ciências do Desporto – Teoria e Metodologia do Treino Desportivo 18 tempo que medeia entre elas. Para conduzir o praticante ou a equipa às condições óptimas de desempenho competitivo, é necessário conjugar, nestes microciclos, a preparação específica final com a promoção da recuperação completa ou quase completa dos níveis fadiga acumulados anteriormente. São microciclos onde o volume da carga é baixo e decrescente. Doseamento da carga ao longo do microciclo A construção do microciclo visando a optimização do nível de carga que lhe está associado passa pela procura de sequências adequadas das actividades dominantes em cada sessão. As variáveis caracterizadoras de cada sessão a levar em conta serão, no fundamental: Os objectivos da sessão, ou seja, a natureza das cargas a utilizar, assim como os factores de treino predominantes (físico, técnico, táctico); Os parâmetros da carga (volume e intensidade) ou a visão mais global expressa pelo nível de carga de cada sessão; O carácter selectivo ou complexo das sessões, o que diz respeito, em especial, ao modo com é organizada a Parte Principal de cada sessão. Sessões de nível de carga importante ou elevado e de orientação selectiva são, habitualmente, indutoras de níveis de fadiga muito localizada exigindo cuidado na sua recuperação. As combinações possíveis levarão em linha de conta a noção de recuperação cruzada – certos conteúdos de treino, desde que aplicados com níveis de carga moderados, podem facilitar a aceleração da recuperação de cargas anteriores referentes a conteúdos diferentes (exemplo: sessão aeróbia após sessão de grande solicitação neuromuscular), a noção de irradiação dos efeitos por Estruturas de Periodização Faculdade de Motricidade Humana Licenciatura em Ciências do Desporto – Teoria e Metodologia do Treino Desportivo 19 proximidade de estimulação (uma sessão de força explosiva após uma sessão de velocidade reforçará basicamente a fadiga instalada, atrasando a recuperação) e, por último a estratégia que o treinador pretenda seguir no que diz respeito ao nível de acumulação da carga (e dos seus efeitos) no microciclo. Quanto a este aspecto, após uma sessão de treino com nível de carga importante ou elevado, pode ser escolhida uma de três opções: 1. Aumentar o impacto da carga anterior – para isso poderemos realizar sessão de objectivos idêntico mas reduzindo o nível de carga para médio ou importante. 2. Estabilizar o nível de fadiga – manter objectivo idêntico mas baixar significativamente o nível de carga fraco, em especial o volume referente à actividade principal da sessão. 3. Facilitar os processos de recuperação – alternar o objectivo da sessão seguinte, podendo aqui o nível de carga manter-se médio ou importante Naturalmente que a estratégia de sequenciação dos microciclo apresentada no ponto 3. é a mais habitual e aquela que deve predominar nas fases de formação desportiva e, em termos gerais, no treino de jovens. As opções 1. e 2. estarão relacionadas com a procura de sobrecarga no seio de microciclos de desenvolvimento onde a acumulação de fadiga é um efeito esperado, sendo lidado mais tarde, com a inclusão de microciclos de recuperação ou estabilização da carga. Assim, a construção racional dos microciclos permite propor cargas elevadas sem ultrapassar os índices de fadiga limite (em termos de preparação para a competição, não em termos biológicos totais, noção arredada da filosofia do que é o treino desportivo) dos sistemas funcionais do organismo. Estruturas de Periodização Faculdade de Motricidade Humana Licenciatura em Ciências do Desporto – Teoria e Metodologia do Treino Desportivo 20 3. O mesociclo É constituída por mesociclos, períodos de planeamento do treino mais curtos do que o macrociclo. Cada macrociclo comporta, no maior parte dos casos, de quatro a dez mesociclos, cada um focando aspectos diferenciados do treino, promovendo uma relação diferente entre esforço e recuperação, entre trabalho geral e trabalho especial/específico, entre os vários factores de treino considerados, o que faz com que surjam também, muito frequentemente, com durações variadas. Duração e constituição do mesociclo O mesociclo é um período de 2 a 6 semanas onde se processa a organização e sucessão óptimas de microciclos de características diferenciadas, definindo as etapas próprias de cada período da época de treino. Uma das suas funções fundamentais é a “ciclicização” da carga, fazendo surgir após uma ou mais semanas de sobrecarga uma semana de recuperação ou manutenção. Por outro lado, serão agrupados num mesociclo os microciclos de conteúdo idêntico (por exemplo, uma sequência de 4 semanas fortes e uma média para o desenvolvimento do limiar anaeróbio) ou que se completam na realização de um determinado objectivo de preparação (por exemplo, a preparação específica para uma dada prova, reunindo factores do treino físico, táctico e mental). Podem existir também mesociclos com uma prevalência de intervenção no treino técnico, ou na força, ou, por outro lado, um mesociclo dedicado à recuperação e estabilização das adaptações adquiridas, como momento de transição para um novo ciclo de trabalho exigente. Estruturas de Periodização Faculdade de Motricidade Humana Licenciatura em Ciências do Desporto – Teoria e Metodologia do Treino Desportivo 21 A duração e a constituição do mesociclo dependem directamente do calendário competitivo, sendo habitual fazer coincidir o seu termo com a ocorrência de competições de diversa índole, preparatórias na fase inicial do macrociclo, preparatórias e importantes mais tarde e, caracteristicamente, nas modalidades onde a estrutura do calendário competitivo o permite (calendário de estrutura cíclica ou distribuída), fazendo surgir as competições principais ao longo do período competitivo no final de mesociclos construídos para o efeito. Os mesociclos são assim duplamente demarcados no seu aparecimento ao longo do macrociclo: através da existência de competições com suficiente relevância e pela definição de objectivos de etapa, sejam estes de preparação ou de desempenho. Estrutura do mesociclo O princípio metodológico orientador da estruturação do mesociclo consiste no aumento progressivo da carga, sem prejudicar a ciclicização já referida, assim como a transição gradual dos conteúdos do treino para a utilização cada vez mais importante de exercícios de carácter especial e específico, reduzindo, em proporção a parcela do volume de treino consagrada à preparação geral. Quanto mais jovem for o atleta, mais longos e de composição uniforme (pouca variação nos parâmetros da carga de microciclo para microciclo) serão os mesociclos. Por outro lado, àmedida que se vai avançado no macrociclo, mais curtos tenderão a ser os mesociclos, propondo uma alternância de período menor entre cargas fortes e cargas de recuperação. Estruturas de Periodização Faculdade de Motricidade Humana Licenciatura em Ciências do Desporto – Teoria e Metodologia do Treino Desportivo 22 Classificação dos mesociclos Segundo a sua estrutura interna, os mesociclos podem ser classificados do seguinte modo: 3.1 Mesociclo introdutório (gradual) São os mesociclos iniciais de qualquer estrutura de treino. Constituem períodos de 2 a 6 semanas de preparação geral, conducentes à criação das bases da condição física necessárias para o trabalho posterior. São compostos, normalmente, por uma sequência de microciclos graduais, terminando com um de recuperação 3.2 Mesociclo de base ou de desenvolvimento São mesociclos cuja estrutura interna está concebida para optimizar a aplicação das cargas fundamentais que permitirão novas aquisições e adaptações no atleta. Podem ser de dois tipos: de activação e de estabilização. Nos primeiros, o praticante ganha as bases funcionais e técnicas específicas da sua modalidade desportiva, enquanto que nos segundos se trata de consolidar e automatizar as aquisições conseguidas. 3.3 Mesociclo pré-competitivo (controlo e preparação) Destinam-se a transformar os níveis condicionais e técnicos alcançados durante os mesociclos de base, em aptidão para o desempenho competitivo, promovendo procedimentos precisos e concretos de grande grau de especificidade. É habitual, no âmbito do trabalho desenvolvido no mesociclo pré-competitivo, a simulação das condições técnicas, tácticas, físicas e ambientais que irá encontrar em competição. Tal como vimos para o microciclo de aproximação (ou pré- competitivo), a sua estrutura deve favorecer os processos de integração dos vários factores do treino a médio prazo que conduzem a um estado de supercompensação durante a competição, após o adequado período de recuperação activa. Estruturas de Periodização Faculdade de Motricidade Humana Licenciatura em Ciências do Desporto – Teoria e Metodologia do Treino Desportivo 23 3.4 Mesociclo competitivo ou de preparação terminal São os mesociclos que incluem as principais competições desportivas, especialmente as estruturas que englobam o trabalho a realizar entre competições pouco espaçadas. A sua duração é de 2 a 3 semanas. 4. O macrociclo Os macrociclos são períodos de preparação nos quais se concretiza um efeito específico ou uma adaptação do treino de modo a realizar um desempenho competitivo de relevo. Tem uma duração habitual de 12 a 20 semanas, ou seja, poderá haver 1 a 3 macrociclos num ano de treino (alguns modelos de planeamento podem chegar aos 7 macrociclos anuais, mas não são, de forma nenhuma, os mais utilizados, e nunca com atletas jovens ou em formação) e culmina com uma competição ou com um período de competições que constitui o objectivo de desempenho fundamental para esse período. O número de macrociclos que surgem num ano de treino ou numa época desportiva dá lugar a uma classificação do tipo de periodização que se utiliza: Periodização Simples - 1 macrociclo por ano Periodização Dupla - 2 macrociclo por ano Periodização Tripla - 3 macrociclo por ano Periodização Múltipla – mais de 3 macrociclos por ano
Compartilhar