Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
DANIEL RODRIGUES HERNANDEZ 20 ANOS DE MEMÓRIA DE PAULO FREIRE 20 POEMAS DE ESPERANÇA E UTOPIA SÃO BERNARDO DO CAMPO 2017 GÊNESE Nasci no Recife Na casa linda e bela Do bairro da Casa Amarela Saudades da infância que tive Paulo Freire é meu nome Filho de Temístocles e dona “Tudinha” Irmão de Armado, Stela e Temístocles iguais em sobrenome Família singela que abençoava tudo que tinha Para que eu pudesse estudar Meus irmãos foram trabalhar Meu pai morreu quando tinha 13 anos De acalantos superamos todos os prantos Fui alfabetizado pela minha mãe Debaixo das mangueiras com as letras riscadas por gravetos Na escolinha tive Eunice querida professora, uma segunda mãe Assim comecei a me “letrar” e a conhecer mais segredos 1929 Depressão nos Estados Unidos Mudança para Jaboatão Lá começou a faltar o pão Mas, nós em família, permanecemos reunidos Escola Particular Em que por gramática começo a me interessar Fome e futebol com os trabalhadores Vida difícil, mas na luta superávamos as dores Vida vai seguindo Medo de fantasmas no escuro Adolescência emergindo Educação Sexual na moitinha ainda inseguro O mundo vai se abrindo E eu como gente me descobrindo Desde a mais tenra idade Lendo o mundo e nossa realidade ELZA O amor descoberto O casamento acontecido Elza, o amor conhecido Companheirismo e cumplicidade em aberto Cinco filhos nascidos Madalena, Maria de Fátima, Maria Cristina, Lutgardes e Joaquim Família repleta em bons tempos vividos Casei e ao lado dela lutei sendo sempre assim Ela também professora Com carinho e amorosidade Mulher sonhadora Com quem sempre me senti à vontade Quantas lições aprendi Muitas histórias vivemos Carinho e respeito com a mulher que escolhi Eternamente marcada a convivência pelos frutos que colhemos DIREITO E não é que fiz Direito? Mas, com todo respeito Não dei para advogado E o porquê quero deixar justificado Meu primeiro caso depois de formado assim aconteceu Tomar de um dentista aquilo que Deus lhe proveu Seu consultório o credor queria Mas, para mim ali a justiça não havia Desenganado, segui o coração E vi que meu destino era a Educação Cabia agora entrar na peleja E pedi: – Deus me proteja Com meu caso resolvido Apareceu a direção Professor, Educador era essa a profissão Agora sim estava “direito” pois me fazia sentido SESI Diretor de Educação e Cultura Mas que alta formosura Serviço Social da Indústria Estava engajado na nova minúcia Palestrei, ensinei e aprendi Certo dia até ouvi Falando de Piaget pedi para em criança pai operário não tocar Mas que ironia, a fábrica tocava de madrugada e sem palmada não podia descansar Perguntado como era minha casa Tive que concordar que era de fato um lar Se eu batesse nos meus filhos não era de se esperar Perderia a razão, afinal não me faltava nada e o fogo do amor aquecia como brasa O SESI me ensinou muito Me engajei Educador Fiz tudo com muito amor E a transformação social pela Educação se tornou meu intuito ANGICOS Angicos, cidade do Rio Grande do Norte Lá fui tentar a sorte Alfabetizar adultos 40 horas ficou famoso como tempo dos tributos Pela Universidade do Recife Com Educadores universitários Os Círculos de Cultura formados com cacife Até de carro de som foram chamados os trabalhadores deixando de ser precários Alfabetizar com projeção de slides Quadros de Francisco Brennand Cada um com sua cultura, palavras geradoras e insights Lembrando que quem espera em pura espera vive espera vã Com Ministro da Educação na formatura O sonho de Círculos de Cultura se espalhar pela nação A Educação como Direito transformando a estrutura E com alfabetização de adultos fazendo revolução LIBERDADE Educação como Prática da Liberdade Livro realizando o sonho de igualdade Se educar para ser livre Libertando e instaurando a democracia em transição para gente que vive Relatos, histórias Tantas trajetórias marcadas por memórias Liberdade de educandos em alfabetização O indivíduo se tornando multidão Palavras Geradoras, Leitura do Mundo O pensamento crítico ficando mais profundo Com asas da liberdade Ressoando na raiz da diversidade Sociedade em trânsito caminhando A passos largos se educando Democracia acontecendo E a justipaz se escrevendo DITADURA O Brasil de 64 Tiraram Goulart Entrou o golpe militar Eis aqui o retrato Fui preso por ser considerado subversivo Na cadeia não podia alfabetizar um companheiro de cela O Direito a Educação nas prisões já naquela época era querela Eu que só queria educar era tratado como invasivo No regime militar não cabia Círculo de Cultura O único sistema era a ditadura Até criaram para alfabetizar os adultos o MOBRAL Mas o tijolo agora era de apostila e não mais concreto material Prenderam a esperança E calaram a voz da utopia Começou uma andança E as saudades do Brasil que se partia OPRIMIDO A Pedagogia do Oprimido Desatei a escrever o que retratava o momento Escrevi com tamanho sentimento Que nunca mais fui esquecido A Educação supera a opressão Instaurando o diálogo como forma de ação Era a resposta à educação bancária Aquela que tanto fez a ditadura ordinária Revolução Cultural que se fez A voz do oprimido teve sua vez Homens e mulheres aprendendo juntos Afinal não se aprender mais sozinho, mas sim compartilhando assuntos O Tema Gerador aqui se faz Libertando também o opressor que se subjaz Pedagogia do Oprimido entrou para a História e ganhou o mundo Afinal, a opressão foi derrotada e venceu o conjunto EXÍLIO Não deu para ficar Subversivo tinha que embarcar Ficar longe da pátria e do Nordeste Aguentar a solidão agreste Ver o Brasil só pelo jornal Aguentar a saudade Longe de mim a felicidade E a intolerância cada vez mais brutal Vivenciar a malvadez Esperar a minha vez Voltar com o irmão do Henfil Se reunir com tanta gente que partiu Um sonho à distância Por causa da ganância A intolerância e o ódio instaurado Só nisso podia dar o golpe implantado COMUNICAÇÃO Comunicação ou Extensão? Eis a questão Do que foi escrito Era comunicado ou estendido? Assim como a Ação Cultural para a Liberdade Tínhamos que nos comunicar para conhecer a realidade Do Chile Rural Para a nossa Aldeia Global Extensão não leva em conta o saber popular Já comunicação quer sempre entender e interpretar Um hermético e o outro dialógico Afinal somos seres inconclusos, culturais, sociais e históricos em um aparato biológico E essa história está sendo narrada Aquela que por nós é comunicada Hoje temos até Educomunicação E cada vez mais distante está a Extensão LATINO Minha latinidade foi vivida Chile de Allende Lembranças que só quem viveu entende Mas, depois veio Pinochet e a utopia foi destruída Entretanto a América Latina me acolheu Fui um latino-americano que reviveu Educando, aprendendo e me encontrando Longe da pátria amada com o coração chorando Outra língua com espanhol e castelhano Mas, com a esperança se espalhando América Latina que Caetano cantou Soy loco por ti Continente que em época de resistência eu vivi As lembranças a Martí, Mercedes Sosa, Violeta Parra, Neruda e Guevara E todos aqueles que enfrentaram a ditadura e o imperialismo cara a cara A opressão que foi tanto sofrida E com quantos gritos contidos de despedida HARVARD E até para os States eu fui Dei aula em Harvard Mas a América do Norte com seu american way of life não me possui Viver lá do meu exílio fez parte Universidade, cidade Conhecimento em disputa Honoris Causa virando constante novidade Mas, o que importava era a família em escuta Nos Estados Unidos minha Pedagogia contemplada Quem diria que em Harvard minhas ideias fariam morada? Foi um grande enfrentamento Mais um aprendizado do exílio que era o momento Daraulas, falar do Brasil Quem viu, viu Saudades de Martirn Luther King e Malcon X de quem passei perto Assim ficou o sentimento do oprimido se libertando desperto ÁFRICA Começo em Genebra Conselho Mundial das Igrejas Ir para África era a meta Alfabetizar antigas colônias se descolonizando o que sejas Cartas de Guiné-Bissau Sérgio Guimarães companheiro O aprendizado foi inesquecível e sensacional E o Círculo de Cultura até no entorno da sombra das árvores foi parceiro Abraços a Mandela Resistente como nosso Mariguela A África se libertando E nós alfabetizando Saudades do Brasil Mas, ali foi nossa pátria africana Ficou a dor do dia que partiu Mas, a Independência estava feita e agora soberana REDESCOBRINDO Redescobri o Brasil Eu voltei Para reaprender de onde o país partiu Viver a terra que no exílio deixei Andarilhar por suas regiões Ouvir, cantar e viver emoções Na Unicamp, Rubem Alves me “apresentou” Disseram que era necessário, afinal o subversivo voltou Dei aulas na minha terra Na PUC de São Paulo Teatro TUCA palestrei nessa nova era O mesmo que com o companheiro Moacir Gadotti dinheiro doamos em saldo Reconstruído o TUCA com o dinheiro de nosso livro reaprendi meu território A Ecopedagogia de Gutiérrez e Cruz Prado começou a aflorar na alma E o sofrimento vivido pela distância se tornou irrisório Meu coração se encheu de esperança e o pranto virou calma ESPERANÇA Pedagogia da Esperança Um reencontro com a Pedagogia do Oprimido Memórias da andança Revisitando o que havia conhecido Elza foi para o céu Minha companheira não estava mais ao meu lado Um dia teremos novo encontro marcado A Esperança se tornou paradigma de um mundo cruel O que a Pedagogia do Oprimido havia me ensinado Agora com a Esperança me via consolidado Melhor que norteado seria suleado sendo dito Afinal, do sul e latinos somos com resistência de outrora colonos por nós vividos Pedagogia da Esperança é a minha herança Para que termine as guerras e os extremismos O mesmo legado que o paradigma do oprimido alcança Que terminem as rivalidades e os semânticos “ismos” NITA Ana Maria Araújo que se tornou Freire também Orientanda da PUC de Doutorado De repente o amor mais uma vez brotado Fazendo a barba um dia vi que ela era o meu bem Uma nova companheira A esperança derradeira De novo o coração bateu E nessa hora a emoção valeu Até do meu cachorro tinha triste me despedido E nessa hora me encontrei com Nita Eu que antes estava perdido Vi a vida ainda mais bonita Minha alegria e felicidade O coração revigorado Nita, muito obrigado Revivendo o amor no Brasil, uma nova realidade SAMPA Luísa Erundina, Secretaria da Educação Partido dos Trabalhadores, uma nova missão Assumir a Educação em Sampa das Onze Escola Pública Popular, um novo horizonte Movimento de Alfabetização, Rap..ensando a Educação Reorganização Curricular, Leitura do Mundo no chão Conselho de Escola Participativo, Gestão Democrática Reinventar a Educação era a nossa tática Quem quiser ver os resultados leiam A Educação na Cidade Escrevi o que vivi na realidade De tantos parceiros e parceiras lembro com carinho de Lisete Arelaro Mulher de fibra que batalhou lado a lado Deixei o legado com o carinhoso e amoroso companheiro Mário Sérgio Cortella Era hora de voltar a escrever e militar superando as mazelas Deixamos a semente brotada E como tantos e tantas dizem uma saudade danada AUTONOMIA Pedagogia da Autonomia O encontro da do-discência com o nefasto neoliberalismo Pouco depois que criamos o Instituto Paulo Freire que para me recriar assim surgia Com Ângela, Gadotti, Padilha, Salete, Sônia e outros e outras companheiros e companheiras que negavam o imobilismo Saberes necessários à prática docente Por uma Educação mais decente Professores e Professoras valorizados Uma sociedade com nossos direitos respeitados Gente mais gente O mundo não é. O mundo está sendo Na boniteza da vida a autonomia acontecendo Ser autônomo na Educação exige uma docência socializada e ascendente De conversas no lixão A Pedagogia em Ação Último livro em vida publicado Ficou vivo o legado e foi dado o recado MEMÓRIAS Queria ser lembrado como alguém que amou a vida e o mundo Alguém que se não fosse professor seria cantor Amou os animais e a natureza com amor profundo E encarou a vida sem temer ou temor O coração um dia parou Também por causa do cigarro A chama desse opressor meu corpo apagou Mas, dessa vida tirei mesmo é sarro Como na tantas vezes contada piada do pescador Que apesar de não ser leitor das letras Lia a sabedoria da natureza e nisso era Honoris Causa Doutor Assim como eu também fui, um Educador pela Paz, sempre pronto a surpresas Meu corpo se foi em 1997 Já faz 20 anos O nosso País e Planeta Terra vivem ainda muitos desenganos Que um legado de esperança e utopia brote novas pedagogias também em 2017
Compartilhar