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ISSN 1519-1834 , SINTESE TRABALHISTA Ano XIII - N° 155 - Maio de 2002 Repositório Autorizado de Jurisprudência • Supremo Tribunal Federal- N° 21/91 • Superior Tribunal de Justiça- N° 19/91 • Tribunal Superior do Trabalho - N° 01/94 • Tribunal Regional Federa11e Região- N° 06/92 • Tribunal Regional Federal 58 Região - N° 09/98 Diretores Luiz Antonio Coutinho Paixão Francisco leocádio AratMo Pinto Editor-Chefe Walter Oiab Conselho Editorial Alice Monteiro de Barros - Annibal Fernandes - Arion Sayão Romita - Arnaldo Süssekind - Cristiano Paixão Araujo Pinto- Floriceno Paixão- José Otávio Patricia Carvalho- Tarso Genro- Wagner O. Giglio Colaboradores Adhemar Ferreira Maciel- Águeda Maria lavorato Pereira - Aguimar Martins Peixoto - Airton Rocha Nóbrega - Alan Milrtins - Albarto Luiz Bresciani de FOlllan Pereira Alexandra Alliprandioo Madl!iros - Almir Goulart da Silveira -Almir Pazzianotto Pinto - Aloizio Sinuê da Cunha Medeiros - Amauri Mascaro Nascimento Ana Paula ~olpato- Ancelmo César Uns de Góis- André Ctrdoso Vasques- André Cremonesi -André Jobim de Azev!ldo- André Luiz Amorim Franco Antonio Alvares da Silva -Antonio Carlos Maineri- Antonio de Pádua Muniz Corrêa- Ant6nio F. Nmaira de Carvalho- Antônio GlaliCius de Morais Antônio Rodrigues de Freitas Jr. - Benedito Calheiros Bomfim - Bruno luiz Weiler Siqueira - Cêndido Bortolini - Carlos Augusto Junqueira Henrique Carlos Dias da Silva Corradi GuerTa - Ca~os Fernando Mathias de Souza - Carlos Henrique BezerTll Leite - Cánnine Antônio Savino Filho - Cássio Mesquita Barros Jt Célio HOI'St Waldraff- Cel:oemy Manoel Andrade - Cirlene Alexandre Cizes1i - Cláudia Fernanda de O. Peraira - Cláudio Armando Couce de Menezes Cliudio Feitosa Poona femondez- Cláudio Mescerenltas Brandão -Claudio Roberto Finati - Clito fomaciori Jr. - Cristino Mario Nevarro Zomig - Oaisson Portaoova Daniela MuradiLS Antunes - Dlircio Guiman!ies de Andrade- Denise Maria Schellenberger- Diana Costa - Domingos Sávio Zainaghi - Edésio Passos - Edilton Meirales ~dson Silva Trindade - Eduardo Carvalho Caiuby- Eduardo Henrique Raymundo von Adamovich - Eduardo Luiz Safe Carneiro - Eduardo Marchetto Edll8rdO Silva Costa - Eliana dos Santos Alves Nogueira - Ernesto Lippmann - Eurlpedes Brito Cunha - Fabio Empke Vian1111- Fetipe Augusto de Magalhães Calvl!l Fernando Belfort - Fernando GalviiD MOW'll - Flévio Antonello Benites- Flávio AniÕilio Camargo de Lael- Floriano vaz da Silve Francisco Alberto da Motta Peixoto Giordani - Francisco Antonio de Oliveira - Francisço da$ C. Uma Filho - Francisco Ferreira Jorge Neto- Francisco Gonçalves Dias françisco Clsani de Lavor- Francisco Rossal de Araajo -Geraldo Bezerra de Menezes {Filhol- Gibran Moysés Filho -Gilberto StOrml!f- Glam:e de Oliwira Barros Gualdo Amaury Fannica - Guilherme Augusto Caputo Bastos - Guilherme Guiman!ies Feliciano - Gustavo Filipe Barbosa Garcia- Oustavo Gouvêa VHiar Hélio Antonio Bittencourt Santos- Hélio do Valle Pereira- Hélio Mário de Amlda - Hilário Bocchi Jr. - Hwnberto Theodoro Janior -lanl AlvN Cordeiro l'lu:heco Use Marceline Bernardi lora -lona Salim Gonçalves- lviiD Alemão -lves Gandra da Silva Martins Filho - Joiio Batista da Silva - Joao Dreste Dalazen - Jorga FontoUfll Jorge Luiz Braga - Jorge Luiz SoU1o Maior- Jorge Marcos Souza- José Affonso Oallegrave Neto- José Alberto Couto Maciel- José Batista da Andrade José Ca~os Arouca- José Felipe Ledur -José Henrique Pierangeli- José ldemar Ribtliro- José Luciano de Castilho Pereira- José Luiz de Vasconcellos- José Pastare José Roberto Dantas Oliva - José S. F. de Faria Fernandes - Jotlberto de Quadros Pessoa Cavalçante - Juliana Bracks Duarte - Jalio Cé$ar Bebber Jalio Ricardo de Paula Amaral- Leonardo Dias Borges - Libíinio Cardoso - Lidia Elizabetb Pefialoza Jaramillo Gama -ligia Maria Teixeira Gouvh Usia 8. Moniz de Alilgiio -Luís fanlilndc Matte Pasin - Luiz A. de Vargas- Luiz Ca~os Amorim Robortella - Luiz Cláudio Portinllo Dias- Luiz de Pinllo Pedreira da Silva Luiz Edual'do GU11ther- Lui1 Manuel Gomes Júnior- Luiz Salvador- Lutiana Nacur Lorentz - Magda BiiMischi - Manoel CariDs Tafedo Filho Manoel Lopes VeiDSo Sobrinho- Marcelo C. Mascaro Nascimento - Man:elo Freire Sampaio Costa - Marcelo Gonçalves Campos - Marcelo PessOa Marcelo Pimentel Marcelo Ribeiro Dia;- Marcello Ribeiro Silve- Marco Antonio Aparecido da lima- Marco Antonio Miranda Mendes- Marco Aurélio de F. Mello Marcos Neves Fava - Maria Celia Ferreira de Rezende - Maria Cristina lrigoyen Peduzzi Maria de Assis Calsing - Maria Goratti OaiBosco - Maria Lacia Luz Leiria Mario Antônio Lobato de Paiva - Mário Chaves - Marli Aparecida da Silva Siqueira- Mauricio Godinho Delgado - Mauricio Undenmeyer lklrbieri - Mauricio Mawr Mauro Cesar Martins de Souza - Mauro Roberto Gomes de Mattos - Messias Pereira Oo1111to - Miguel Angel Sardegna - Miguel Real& - Milton M. Camargo M4nica Amazonas Duarte de Avelar- Nacif Alcure Ne10- Nelnlil de Souza Melo - Nilza Maria Vicenle- Nytson Paim de Abreu - Ortando de Melo - Osiris Rocha Olívio Auguslo Xavier - Palharas Moreilil Reis - Palricia Soraia de Souza EstiMim - Pat~cia Helena de Avila Jacyntho - Paulo Afonso Brum Vaz- Paulo Casar Piva Pedro Luiz Fegundes Ruas - Raimar Machado - Raimundo Simão de Melo - Raul f'ortanO)!B - Renato O. Gonçalves- Ricardo Araújo Cozer- Ricardo Carvalho Fraga Ricardo Sampaio- Ricardo Tadeu Marques da Fonseca- Rivan Duarte- Roberto Luis Luchi Demo- Roberto Parahyba de Afruda Pinto- Rodrigo de Lacerda Caralli Rodrigo Garcia Scbwaa- Rogério Kubn Rodrigues - Rogério Neiva Pinheiro- Rogério Rodriguez Fen111ndez Filho - Rogério Viola Coelho - Ronaldo Curado flaury Ronaldo Leal- Rubens Soaras Vallinho- Ruy J Caldas Pereira - Silvio de Figueiredo Teixeira -Sandra Ua Simón - Saulo Ramos - Sérgio Panlal Frelldoothal Sérgio Paulo Gerim- Silvia Helena de Freitas Annbrust Figueiredo- Silvia lsabelle Ribeiro Teixeira- So1111ra Alexandra David- Ulisses Riedel de Rasende Vera Regina Loureiro Winter- Viclcr Humberto Maizman- Vilson Antonio Rodrigues Bilhalva - Vol!aire Marensi - Wagller Balera - Walmir Oliveira de Costa Wanderley Marcelino - Zélia Luiza Pierckmi -léu Palrm!ira Sobrinho ASSUNTO ESPECIAL A GREVE NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO Mauricio Godinho Delgado SUMÁRIO: I - Introdução; 11 - Locaute; m - o instituto da greve. I - INTRODUÇÃO negociação coletiva, ao cumprir seus objetivos erais e específicos, alcança uma situação e pacificação no meio econômico-profissional em que atua. Entretanto, no transcorrer de seu desenvolvimento ou como condição para fomentar seu início, podem os trabalhadores veicular instrumento direto de pressão e força. a greve, aparentemente contraditório à própria idéia de pacificação. A greve é, de fato, mecanismo de autotutela de interesses; de certo modo, é exercício direto das próprias razões, acolhido pela ordem jurídica. É, até mesmo, em certa medida,direitodecausarprejuízo, como indica o jurista WASHINGTON DA TRINDADE.' Os conflitos coletivos trabalhistas, regra geral, podem passar por três modalidades de encaminha- mento para sua solução: autocomposição, em que situa- se a negociação coletiva; heterocomposição, em que situam-se o processo judicial (dissídio coletivo), a arbitragem e a mediação (há certo debate sobre o correto enquadramento destas duas últimas figuras); por fim, autotutela, em que se encontram a greve e o lockout. A autotute!a traduz, inegavelmente, modo de exercício direto de coerção pelos particulares. Por isso rem sido restringida, de maneira geral, nos últimos séculos pela ordem jurídica, que vem transferindo ao Estado as diversas (e principais) modalidades de uso coercitivo existentes na vida social. O Direito Civil, nesse quadro, preservou, como esporádicas exceções, poucas situações de veiculação coercitiva por particulares,tais como a legítima defesa (art. 160, I, CC), o desforço imediato, no esbulho possessório (art. 502, CC), a apreensão pessoal do bem, no penhor legal (art. 779, CC). 1. Citado por RIBEIRO, Lélia Guimarães Catvalho. "A Greve como Legítimo Direito de Prejudicar". In FRANCO FILHO, Georgenor de Souza. Cursotk Direito Coktivodo Traballzo-estudos em homenagem ao Min. Orlando Teixeira da Costa, São Paulo: LTr, 1998, p. 502-509. Segundo a autora, a afirmação constaria de notastkau/a do Prof. WASHINGTON. Sintese Trabalhista- N° 155- MaV2002- ASSUNTO ESPECIAL 133 O Direito do Trabalho apresenta, porém, essa notável exceção à tendência restritiva da autotutela: a greve. Embora proibida nos primeiros tempos do sindicalismo e do Direito do Trabalho, assim como nas distimas experiências autoritárias vivenciadas ao longo dos últimos dois séculos, a greve afirmou-se nas sociedades democráticas como inquestionável direito dos trabalhadores. Essa sua afirmação, em um quadro de restrição geral à autotutela, justifica-se do ponto de vista histórico e lógico. É que se trata de um dos principais mecanismos de pressão e convencimento possuído pelos obreiros, coletivamente considerados, em seu eventual enfrentamento à força empresarial, no contexto da negociação coletiva trabalhista. Destituir os trabalhadores das potencialidades de tal instrumento é tornar falacioso o princípio juscoletivo da equivalência entre os contratantes coletivos, em vista da magnitude dos instrumentos de pressão coletiva naturalmente detidos pelos empregadores. 2 No Direito Coletivo do Trabalho há, na verdade, um segundo instrumento de aurotutela, porém situado no pólo empresarial: olockout (ou locaute). Este instrumento, entretanto, ao contrário da greve, te~ sido genericamence repelido pelas ordens jurídicas democráticas ocidentais.3 11- LOCAUTE Locaute é a paralisação provis6ria das atividades da empresa, estabelecimento ou seu setor, realizada por determinação empresarial, com o objetivo de exercer pressões sobre os trabalhadores ,frustrando negociação coletiva ou difzcultando o atendimento a reivindicações coletivas obreiras. • Trata-se, como se vê, de fechamento provis6rio, pelo empregador, da empresa, estabelecimento ou simplesmente de algum de seus setores, efetuado com objetivo de provocar pressão arrefecedora de reivindicações operárias. 1 Caracterização A tipicidade do locaute envolve quatro elementos combinados: paralisação empresarial; ato de vontade do empregador; tempo de paralisação; objetivos por ela visados. Efetivamente, trata-se de uma paralisação das atividades empresariais. Esta ocorre seja no âmbito amplo de roda a empresa, seja no plano mais restrito de um de seus estabelecimentos ou, até mesmo, de uma simples subdivisão intra-empresarial. A paralisação envolvida há de resultar de decisão do próprio empresário, sob pena de escapar à tipicidade do locautc. De maneira geral, a paralisação que se enquadra na figura do locaute é temporária. É que, sendo instrumenco de pressão sobre os respectivos empregados, visando frustrar ou enfraquecer reivindicações coletivas, há de ter, em princípio, duração limitada no tempo. Contudo, não é inviável imaginar-se a possibilidade de uma falsa paralisação definitiva do estabelecimento, como meio de estabelecer pressão ainda mais eficaz sobre os crabalhadores. Por fim, a paralisação intentada rem o objetivo de produzir pressões sobre os trabalhadores, visando enfraquecer ou frustrar suas reivindicações grupais ou a própria negociação coletiva. Na 2. WOLFGANG DAUBLER informa- que na Alemanha, a partir de 1984, tomou.se cada vez mais raro o recurso à greve, em vista de ser uma realidade a parceria soda/ exigida pela kgis/affÜJ t pela jurisprudência. Aponta que, nesse quadro, a forma predominante de paredismo é a "greve de advertência durante as negociações coletivas; ela dura, via de regra, umas poucas horas e fica restrita a diversas empresas". Completao autor que o uso parrimoniosododireitodegn:veéfaci/itado pelos grandes progressos atingidos nos últimos anos tanto na dr&J tk salários quanto nas jornadas dt trabalho. Direito do Trabalho e Sociedade na Alemanha. São Paulo: Fundação Friedrich Ebert/ILDES/LTr: 1997, p. 58. 3. Uma das exceções nesse conjunto é a Alemanha, que o autoriza. A respeito, VIANA, Márcio Túlio. "Conflitos Coletivos do Trabalho". In Revistado TST.Vol. 66, n" 01, Brasília/Porto Alegre: Síntese,jan.-mar./2000, p. 140. 134 Sintese Trabalhista- N° 155- Mai/ZOOZ- ASSUNTO ESPECIAL verdade, 0 objetivo específico de estabelecer especial pressão sob_r~ os t~b~lhadores é que será a principal diferença entre 0 tocaute e outras paralisações empresanats dectdtdas pelo empregador. Pode-se dizer que a causa e os objetivos anticoletivos da atitude do e~ pregador s~o que demarc~m o ponto distintivo dessa paralisação em contraponto a outras ocorndas no ambiente empresanal. A razão de ser dessa paralisação, sua causa e objetivo anti-sociais, permitem, porinterpre!O(ÕO extensiva, enquadrar-se na figura do locaute certo tipo de paralisação_empresar~a~ voltad~ ~produzir uma pressão social ou política ainda mais ampla: trata-se d~ sust~~ao temporana d~ ~tlvtdad~s do estabelecimento ou da empresa com fins de provocar pressao pohuca no plano mumctpal, regiOnal ou, até mesmo, federal. Desse modo, o locaute político (ou por razões políticas) recebe o mesmo tratamento conferido à figura padrão regulada pela ordem constitucional e jus trabalhista. 2 Distinções O !ocaute não se confunde com outros tipos de paralisações empresariais. Não se confunde, por exemplo, com o fechamento da empresa por falência (art. 449, CLT) ou ex:n _virtude de fac~ principis (art. 486, CLT). Nestes casos, a paralisação tende. a ser .d~fimttva (embora .nao necessariamente)- o que a distancia, regra geral, do locaute. Porem, mats tmportante do qu~ tsso, a paralisação deriva de causa própria, muito diversa daquela inerente ao locaute: el~ .nã~ é, ~m síntese, atada ao intuito malicioso do empregador de provocar pressão arrefecedora de retvmdtcaçoes operárias. É claro que no contexto da falência, principalmente, podem ter se apresentado reivindicações obreiras em Coo.floal:o com a vontade empresarial. ~ntretanto, as c~us_as falime~tares, regra geral, são muito mais amplas do que as estritamente Vinculadas ao Dtretto Coleuvo do Trabalho. Em princípio, também não caracteriza locaute o fechamento def~nitivo de certo estabelecimento ou empresa, por decisão interna de seus controladores. Esta dectsão (fec~amento de agências ou filiais, por exemplo) tem sido considerado inerente ao poder empregatício. Neste caso, apenas se ficar comprovado de que se trata de artifício malicioso para provocar incabíveis pressões sociais (pressões intra ou extra-empresariais), é q~e.s~ poderia, por interpretaç~o extensiva, excepcionalmente, falar na prática de locaute. Esta posstbthdade, contudo, é rara, pms demandaria evidenciar que o intuito de encerrar. definitivamente, a atividade empresarial, não foi verdadeiro, sendo mero simulacro para propiciar indevida pressão. O locaute também não se confunde, é óbvio, com a paralisação empresarial temporária resultante de causas acidentais ou de/orça maior (art. 61, § 3°, CLT). Muito menos confunde-se com paralisações por férias ou licenças remuneradas coletivas, determinadas pelo empregador em vista de situações adversas do mercado econômico ou outro fator re~evante ~art. 133, 11, c.LT). ~o~as estas situações ora enfocadas são meras interrupções contratuatS, que nao trazem efeuvo preJUtzo contratual ao empregado. Por isso, englobam-se, em princípio, nojusvariandi do empregador.4 Conforme se percebe, a diferença específica do locaute em face de outras paC:Iis~ções lícitas da empresa ou do estabelecimento, ou de parte destes, encontra-se, em sua essencta, no objetivosocialmente malicioso da paralisação: arrefecer piei tos coletivos dos empregados. A causa anti- social da atitude do empregador é que demarca o ponto distintivo do locaute em contraponto a outras paralisações ocorridas no ambiente empresarial. Pode-se indicar, é claro, regra geral, uma segunda distinção: o caráter provisório da paralisação caracterizadora do locaute. Contudo, a presente diferença não é absoluta, uma vez que existem 4. A respeito das potencialidades e restrições dojusvariandi empresarial, consultar DELGADO, Mauricio Godinho. AlkrOflies contratuais rraballtistas. São Paulo: LTr, 2000, em seu capitulo Ill, item 11, "Princípios Aplicáveis às Alterações Objeth'as do ContrataM. 1 \, ' ' Síntese Trabalhista- Na 155- Mai/2002- ASSUNTO ESPECIAL 135 paralisações também temporárias que são francamente lícitas (como as resultantes de causas acidentais ou força maior, já citadas). 3 Regência jurídica O locaure tende a ser genericamente proibido, mesmo em se tratando de ordens jurídicas democráticas.5 É que este mecanismo de autotutela empresarial é considerado uma maximiuiçãode poder, um instrumento desmesurado, desproporcional a uma razoável defesa dos interesses empresariais. Afinal, os empregadores já têm a seu favor, cotidianamente, inúmeras prerrogativas de caráter coletivo asseguradas pela ordem jurídica (poder empregatício, poder resilitório contratual, etc.), o que os coloca, do ponto de vista de potência e pressão, em perspectiva de franca vantagem perante os empregados. Além disso, eles contam, ainda, com poderoso instrumento de pressão ofertado pelo próprio mercado de trabalho, com sua concorrência acirrada e crises de emprego e de empregabilidade. Por tudo isso, o locaute é considerado um instrumento de autotutela de interesses empresariais socialmente injusto. Não há contradição na ordem jurídica ao acatar o instrumento de autotutela coletiva dos trabalhadores (a greve), negando validade a esse instrumento de autotutela coletiva dos empresários (o locaute). Conforme já exposto, há uma magnitude de instrumentos de pressão coletiva naturalmente já detidos pelos empregadores, muito além do libcaute, em face da natureza coletiva dos seres empresariais. Em contraponto a isso, a greve é um dos poucos- e, sem dúvida, o principal -mecanismos de pressão e convencimento possuído pelos obreiros, coletivamente considerados, em seu eventual enfrentamento à força empresarial, no contexto da negociação coletiva trabalhista. Por tais razões, destituir os trabalhadores das potencialidades do instrumento paredista é tornar falacioso o princípio juscoletivo da equivalincia entre os contratantes coletivos, ao passo que ofertar ·ao empregador o mecanismo do locaute será criar distanciamento de poder incomparável na ordem sociodemocrática contemporânea. A Lei de Greve brasileira proíbe, expressamente, o locaute (art. 17, L. 7.783/89). Ainda que o texto legal fosse omisso, tal proibição derivaria, indubitavelmente, de vasto e harmônico conjunto de regras e princípios constitucionais. De fato, o locaute conspira contra oexercfciodosdireitos sociais, contra as noções de segurança, bem-estar, desenvolvimento, igualdade e justiÇa, eleitas como valores supremos da sociedade brasileira. Conspira contra a intenção normativa de se fazer fraterna essa sociedade, fundada na harmonia social e comprometida com a solli{Õo padfu:a das controvérsias (Preâmbulo da Carta Magna- excertos). A idéia de segurança, a propósito, já enfatizada no Preâmbulo, é retomada, logo a seguir, como direito inviolável, pela mesma CF (art. 5°, caput). O loCaute, enquanto poder máximo do empregador, conspira contra a dignidade da pessoa humana e o valor social do trabalho, ungidos pela Constituição como alguns dos fundamentos da República do Brasil (art. 1°,111 e IV). Enquanto poder incontrastável, conspira também contra os objetivos fundamentais da República de construir uma sociedade livre, jUsta e solidária, garantir o desenvolvimento nacional, erradicara pobreza e a marginali.zoção,promovero bem de todos, sem discriminações (are. 3', I, 11, 111 e IY, CF/88). S. MÁRCIO TÚLIO VIANA informa que, hoje, na Europa, regra geral, o locaute é vedado, somem e sendo permitido na Alemanha. "Conflitos Coletivos do Trabalho"./n Revistado TSTVol. 66, n° 01, Brasília/Porto Alegre: Síntese,jan.-mar./ 2000, p. 140. 136 Síntese Trabalhista- N° 155- MaV2002- ASSUNTO ESPECIAL Em sua dimensão de poder empresarial máximo, o locaute entra em choque ainda com certos fundamentos da ordem econômica do país, em especial a valorização do trabalho humano (art. 170, CF/88), o qual é também pninado da ordem social (art. 193, CF/88). A par disso, agride a finalidade das ordens econômica e social, que éasseguraratodosexistênciadi'gnaebem-estar, conforme ditames da justiça social (caput do art. 170, c/c art. 193, CF). Tudo isso inviabiliza a prática lícita do locaute na ordem jurídica brasileira. Pode-se argumentar que a mesma Constituição valoriza a livre iniciativa (art. 1°, rv, in fine), colocando-a também como fundamento da ordem econômica (art. 170, caput). Além disso, confere status de princípio à propriedade privada (are. 170, li}, reconhecendo-a também como direito subjetivo (art. 5°, XXII). Nesta linha, o locaute seria simples exercício da livre iniciativa e das prerrogativas inerentes à propriedade privada. O equívoco argumentativo chega a ser grosseiro. É que todos os demais princípios, fundamentos, noções e idéias incorporados, expressamente, pela CF, com força normativa, acima especificados, e que se colocam em contraposição frontal ao locaute, conferem, sem dúvida, atenuações e restrições aos demais valores, fundamentos, princípios e direitos assegurados pela mesma CF, relativos à livre iniciativa e à propriedade privada. Se isso já não fosse claro, a própria CF preferiu cometer certa redundância a correr o risco de permitir sua interpretação errônea, dissociada de seu direcionamento social e humano: assim, no art. 5°, XXIII, posicionado logo em seguida ao preceito que garante o direito de propriedade (art. 5°, XXII), estabelece, com ênfase, que a propriedade atenderá a sua função social. 4 Efeitos juridicos O locaute, como visto, é prática proibida na ordem jurídica do país. Sua realização concreta, em descumprimento à CF e à Lei de Greve, provoca, assim, inevitáveis conseqüências no âmbito do contrato de trabalho. Em primeiro lugar, o respectivo período de afastamento obreiro será considerado como mera interrupção da prestação de serviços (interrupção contratual). Desse modo, todas as parcelas contratuais laborativas serão devidas ao empregado no lapso temporal de desenvolvimento do locaute. É o que deriva da lógica daordemjurfdica e também do texto expresso do parágrafo único do art. 17 da L. 7.783/89. Em segundo lugar, o locaute constitui falta empresarial (art. 17, L. 7.783/89), por descumprimento do contrato e da ordem jurídica (art. 483, d, CLT). Sendo grave a falta, em consonância com as circunstâncias do caso concreto, poderá, ainda, ensejar a ruptura contratual por justa causa do empregador. É claro que a resolução contratual por falta de qualquer das partes supõe a observância de certos requisitos conjugados, os quais também se aplicam ao empregador, com certas adequações. Trata-se, por exemplo, da autoria do fato, sua tipicidade e gravidade, a imediaticidade da insurgência obreira, e outros requisitos correlatos, a serem, em sua complexidade, considerados em face da situação concreta. 111 -O INSTITUTO DA GREVE Greve, segundo o texto da L. 7. 783/89, é a suspensão coletiva, temporária e pacífica, total ou parcial, de prestação pessoal de serviços a empregador (art. 2"). Pode-se definir também a figura, à luz da amplitude a ela conferida pela CF (art. 9°) e em vista da prática históriCa do Direitodo Trabalho, de modo mais abrangente. Seria a paralisação coletiva provisória,parcial ou total, das atividades dos trabalhadores em face de seus empregadores ou tomadores de serviços, com o objetivo de exercer-lhes pressão, visando a defesa ou conquista de interesses coletivos, ou com objetivos sociais mais amplos. Síntese Trabalhista- N° 155- MaV2002- ASSUNTO ESPECIAL 137 1 Caracterização Afigura paredista tem traços característicos destacados. Trata-se, essencialmente, do caráter coletivo do movimento; da susração provi's6ria de atividades Jaborarivas como núdc;o desse movimento, embora, às vezes, associada a atos positivos concertados; do exercíciodiretodecoerção, que representa; dos objetivos profiSsionais ou extraprofzssionais a que serve; do enquadramento variável de seu prazo de duração (regra geral, suspensão contratual, podendo, entretanto, convolar-se em interrupção). A) Caráter coletivo do movimento O primeiro traço é claro: a greve diz respeito a movimento necessariamente coletivo, e não de caráter apenas individual. Sustações individualizadas de atividades laborativas, ainda que formalmente comunicadas ao empregador como protesto em face de condições ambientais desfavoráveis na empresa, mesmo repercutindo entre os trabalhadores e respectivo empregador, não constituem, tecnicamente, movimento paredista. Este é, por definição, conduta de natureza grupal, coletiva. Contudo, mesmo sendo coletiva, a greve pode ser total ou meramente parcial. Pode englobar todo o conjunto da empresa ou apenas um ou alguns de seus estabelecimentos; pode atingir até mesmo setor ou setores integrantes de determinado estabelecimento empresarial. Tais diferenciações são inábeis para descaracterizar o instituto sociojurídico paredista. 8) Sustação de atividades contratuais O segundo traço é também claro. A greve tem svu núcleo situado erri torno da sustação provisória de atividades laborativas pelos trabalhadores, em face de seu respectivo empregador ou tomador de serviços. Este é o núcleo do movimento: uma omissão coletiva quanto ao cumprimento das respectivas obrigações contratuais pelos trabalhadores. É óbvio que não se pode falar apenas em greve de empregados contra os respectivos empregadores; mas também trabalhadores contra os respectivos tomadores de serviços. É que, desde o século passado, a categoria avulsa (formada, basicamente, por não empregados) já era organizada o bastante para realizar significativos movimentos paredistas contra seus tomadores de serviços. E, hoje, mais ainda, com a terceirização generalizada, os movimentos grevistas não teriam mesmo como limitarwse à equação dual dos arts. zo e 3° da CLT (empregados X empregadores). Conforme exposto, o núcleo da greve constitui-se de uma grande omissão, uma paralisação, uma sustação de atividades contratuais pelos trabalhadores. Entretanto, ainda assim, a greve é antecedida de atos preparatórios e, logo a seguir, de atos de ampliação, preservação e administração do movimento, além de atos de divulgação intra-empresarial e social da parede deflagrada. Consta, desse modo, também de atos positivos a ela conexos, que não descaracterizam, evidentemente, o instituto. Há uma situação paredista, entretanto, controvertida, por englobar no núcleo da greve, tanto a abstenção como a ação de caráter coletivos. A greve passa a ser, ao mesmo tempo, omissão e ação. Trata-se do movimento paredista com ocupação dos locais de trabalho (também chamada de lock-in, em anteposição ao lockout). A anterior Lei de Greve (4.330/64, art. 17), de indissimulável matiz autoritário, rejeitava essa combinação de circunstâncias, considerando inerente à greve a desocupação dos locais de trabalho. A nova ordem jurídica constitucional (art. 9°, CF/88) e mesmo a nova Lei de Greve (7. 783/89) não estabelecem, porém, tal requisito. E, rigorosamente, não há comprometimento do instituto paredista em vista da adoção da estratégia oéupacional, uma vez que esta mantém-se subordinada à função primária da figura sociojurídica, que é a abstenção coletiva de atividades contratuais pelos trabalhadores. 138 Síntese Trabalhista- ND 155- Mai/2002- ASSUNTO ESPECIAL Reconheça-se, porém, que o movimento paredista, no desenrolar dessa estratégia ocupacional, corre maiores riscos de provocar atos ilícitos individualizados ou grupais de danificação do patrimônio empresarial- atos que são passíveis de apenação, conforme expresso na própria CF (art. 9', § 2', CF/88). C) Exercício coercitivo coletivo e direto A greve, conforme visto, é meio de auto tutela, é instrumemo direto de pressão coletiva, aproximando-se do exercício direto das próprias razões efetivado por um grupo social. Em certa medida, édirei'todecausarprejuízo, como exposto pelo jurista WASHINGTON DA TRINDADE.6 O inegável caráter coercitivo da figura entra em choque, aparentemente, com o objetivo central com que tende a ser deflagrada a negociação coletiva trabalhista. Entra em choque, também, aparentemente, com a tendência universal do Direito contemporâneo de restringir as modalidades de exercício coercitivo privado, concentrando a coerção nas instituições do Estado. Entretanto, a contradição aparente que a greve cria no.Direito desaparece quando se compreende o tipo de relação social, econômica e jurídica em meio a qual ela atua: a relação de emprego. De fato, o Direito do Trabalho, em face da diferenciação socioeconômica e de poder às vezes lancinante entre empregador e empregado, reconheceu na greve um instrumento politicamente legítimo e juridicamente válido para permitir, ao menos potencialmente, a busca de um relativo equilíbrio entre esses seres, quando atuando coletivamente, em torno de seus problemas trabalhisi'às, ri\ai'S graves, de natureza coletiva. É que os movimentos paredistas constituem-se nos mais notáveis instrumentos de convencimento e pressão detidos pelos obreiros, se considerados coletivamente, quando de seu eventual enfrentamento da força empresarial, no contexto da negociação coletiva trabalhista. Por essa razão lógica, confirmada ao longo de dois séculos de História contemporânea, suprimir aos trabalhadores as potencialidades desse instrumento é tornar falacioso o princípio juscoletivo da equivalência entre os contratantes coletivos, em vista da magnitude dos instrumentos de pressão coletiva naturalmente detidos pelo empresariado. O fato, porém, de ter a greve esse caráter- exercício coercitivo coletivo e direto - não autoriza, porém, atos de violência contra o empregador, seu patrimônio e contra colegas empregados. Embora seja evidente essa ressalva, podendo ser inferida do próprio instituto jurídico, mesmo assim ela foi enfatizada pela regra constitucional que assegurou, amplamente, o direito paredista aos trabalhadores: os abusos cometidos sujeitam os responsáveis às penas da lei (§ zo do art. 9°, CF/88). Na mesma direção, a L. 7.783/99, dispondo que a responsabilidade pelos atos praticados, ilícitos ou crimes cometidos, no curso da greve, será apurada, conforme o caso, segundo a legislação trabalhista, civil ou penal (art. 15, caput). Registre-se que se está falando em atos que, individualmente, enquadrem-se como tipos ilícitos; não se está falando em pacífica e simples adesão ao movimenco paredista, mesmo que considerado inválido, oportunamente. No caso de simples participação pacífica em greve, tal fato não tipifica ato ilícito, de nenhuma natureza, nem seqÚer meramente trabalhista - esta a jurisprudência da Corte Máxima do país: a simples adesão à greve não constitui falta grave (Súm. 316, STF). 6. Citado por RIBEIRO, Lélia Guimarães Carvalho. "A Greve como Legítimo Direiw de Prejudicarn. In FRANCO FILHO, Gcorgenor de Souza. Curso d~ Di~ Co/etioo do Trahalho- wudos em ltommagtm ao Min. Orlando Teixeira da Costa. São Paulo: LTr, 1998, p. 502-509. 1 Sintese Trabalhista-N° 155- Mai/2002- ASSUNTO ESPECIAL 139 O) Obietivos da greve A greve é mero instrumento de pressão, que visa propiciar o alcance de certo resultado concreto, em decorrência do convencimento da parte confrontada. É movimento concertado para objetivos definidos, em geral, de natureza econômico-profissional ou contratual trabalhista. A maior ou menor amplitude dos objetivos dos movimentos paredisras passa pelos critérios adotados pelas ordens jurídicas nacionais específicas. O padrão geral das greves é circunscreverem- se às fronteiras do contrato de trabalho, ao âmbito dos interesses econômicos e profissionais dos empregados, que possam ser, de um modo ou de outro, atendidos pelo empregador. Os interesses contemplados em movimentos dessa ordem são, assim, regra geral, meramente econômico- profissionais (isto é, interesses típicos ao contrato de trabalho). Contudo, há, como se sabe, na História, movimentos grevistas que se dirigiram a interesses estranhos aos estritameme contratuais. Trata-se, por exemplo, das greves de solidariedade e das greves políticas. A resistência dos tratadistas c das ordens jurídicas a greves, não estritamente econômico- profissionais, é, sem dúvida, grande. AMAURI MASCARO NASCIMENTO, porém, encontrou na Corre Constitucional italiana decisão favorável à greve de solidariedade, desde que presente indubitável comunicação de interesses entre as categorias, a que reivindica e a que lhe dá, com a greve, apoio. 7 O mesmo autor encontrou também na Corte Constitucional da Itália, em 1974, decisão que declarou inaplicáveis dispositivos da legislação penal que incriminam greves não contratuais, portanto, aquelas que, como a greve política, não visavam fins econômico~lllabalhistas. 8 Aquela C orce Máxima teria então sustentado que a greve constituía, sempre, uma manifestação de liberdade constitucionalmente reconhecida e, como tal, não suscetível de constrangimentos juridicos, salvo em se tratando de casos de subversão do ordenamento constituciona/.9 A CF brasileira, em contraponto a todas as constituições anteriores do país, conferiu, efetivamente, amplitude ao direito de greve. É que determinou competir aos trabalhadores a decisão sobre a oportunidade de exercer o direito, assim como decidir a respeito dos interesses que devam por meio dele defender (caput do art. 9°, CF/88). Oportunidade de exercício da greve e interesses a serem nela defendidos, ambos sob decisão dos respectivos trabalhadores, diz a CR E) Enquadramento variável de seu prazo de duração O enquadramento jurídico do prazo de duração do movimento paredista é variável, segundo regras específicas de cada ordenamento jurídico. Regra geral, o mencionado pra .. zo é tratado como suspensão do contrato de trabalho (art. 7°, L. 7.783/89). Isso significa que os dias parados, em princípio, não são pagos, não·se computando para fins contratuais o mesmo período. 10 Em contraponto, o empregador não pode dispensar o trabalhador durante o período de afastamento (e nem alegar justa causa pela adesão à greve, após o retorno do obreiro, conforme já estudado: Súm. 316, STF). Entretanto, caso se trate de greve em função de não-cumprimento de cláusulas contratuais relevantes e regras legais pela empresa (não-pagamento ou atrasos reiterados de salários, más condições 7. NASCIMENTO, A. M., Comp&tdiod~direitosindical 2. ed., São Paulo: LTr, 2000, p. 373. 8. NASCIMENTO, A. M.,/oc.cit. 9. NASCIMENTO, A. M., ob. cit., p. 3 73. Sobre a resistência a grcv~s políticas c de solidariedade, ver também a pcsqui~a de VIANA, Márcio Túlio. Dir~ifo tk resisthtcia. São Paulo: LTr, 1996, p. 303-305. 10. WOLFGANG DÂUBLER informa que na Alemanha e, regra geral, nos países membros da Comunidade Européia, o período de greve também corresponde à suspensão dos direitos e deveres do conuato. Direito do troóa/lto e sociedod~ na Alnnanka. São Paulo: Fundação Friedrich Eberr/ILDES/LTr, 1997, p. 136-137. 140 Síntese Trabalhista- N° 155- MaV2002- ASSUNTO ESPECIAL ambientais com risco à higidez dos obreiros, etc.), pode-se falar na aplicação da regra genérica da exceção do contrato não cumprido. Neste caso, seria cabível enquadrar-se como mera interrupção o período de duração do movimento paredista- a teor do sugerido pelo jurista MÁRCIO TÚLIO VIANA. II O enquadramento suspensivo da greve não é, contudo, rigoroso, podendo ser modificado. A própria L. 7.783, a propósito, deixa antever essa possibilidade (que é comum, na prática juslaboral). Assim, o instrumento normativo regente do final do movimento pode convolar em simples interrupção da prestação laborativa- ou vantagem próxima- o lapso temporal inicialmente enquadrado como suspensão (art. 7°, L. 7.783/89). 2 Distinções A greve, como analisado, é instrumento de pressão, ou mesmo coerção, dirigido pela coletividade dos trabalhadores sobre o patronato. A seu lado, entretanto- e, às vezes, conjugadamente a ela- existem outras condutas coletivas seguidas pelos obreiros, no âmbito das relações trabalhistas, que também configuram modalidades de exercício de coerção ou, pelo menos, de pressão sobre o empregador ou tomador de serviços. Tais diversificadas condutas coletivas podem ser acolhidas ou não pelo Direito do Trabalho. Um grupo de tais condutas aproxima-se da figura da greve, com ela envolvendo-se: trata- se dos piquetes, da ofi"erqçlioJartaruga e/ou excesso de zelo e da ocupação do estabelecimento. Outras condutas podem ou não associarem-se a determinado movimento paredista concreto, mas com ele não se confundem, do ponto de vista sociojurídico. É o caso do boicote, por exemplo. Finalmente, há condutas de coerção e/ou pressão claramente ilícitas, quer se trate de um contexto de greve ou não. É o que se passa com a sabotagem. A) Figuras próximas ou associadas Há condutas coletivas que são instrumentos para a própria realização do movimento paredista. Os piquetes são um exemplo significativo. Pela ordem jurídica são válidos, embora não tendo ilimitados poderes. Enquanto meios padftcos tendentes a persuadir ou aliciar os trabalhadores a aderirem à greve (art. 6°, I, L. 7.783), os piquetes podem ser montados e geridos pelos grevistas. Entretanto, não podem usar de violência, de formas de agressão física ou moralmente ofensivas, constrangendodireitosegarantiasfundamentais deouJrem (art. 6", §§I" e 3", L. 7.783). As condutas de operação tartaruga e/ou excesso de zelo configuram modalidades coletivas de redução da produção, utilizadas como pressão para reivindicação in:tediata ou ameaça para futuro movimento mais amplo. Do ponto de vista de uma rigorosa interpretação do instituto, poderiam não se enquadrar no conceito de greve, já que não propiciam sustação plena das atividades laborativas. Contudo, essa interpretação muito rigorosa do tipo legal da greve não atende à riqueza da dinâmica social, 11. VIANA, M. T., "Conflitos Coletivos do Trabalho". In Rtvi.;ta do TST Vol. 66, n° 1, Brasil ia/Porto Alegre: Síntese, jan.- mar./2000, p. 131 (item 9.B,obinitio). Tratando-se, porém, de descumprimento de dispositivo de convenção ou acordo coletivo de trabalho, a jurisprudência não tem considerado válida a greve, em face da ação de cumprimento existente (0} 01, SDC{fST; L. 8.984/95). l Sintese Trabalhista- N° 155- MaV2002- ASSUNTO ESPECIAL 141 deixando de aplicar o Direito a fatos sociais que não guardam diferenciação efetivamente substantiva em comparação a outros. Por isso, tem sido criticada por importan .. tes doutrinadores, como JEAN-CLAUDE JAVILLIER, MANOEL CARLOS PALOMEQUE LOPES e, no Brasil LUIZ DE PINHO PEDREIRA e MÁRCIO TÚLIO VIANA" De todo modo, desde que se entend~ que o Direito do Trabalho exige, para configurar o movimento paredista, paralisação total ou meramente parcial, porém coletiva, das atividades connatuais dos obreiros, as condutas grupais, acima especificadas,de redução concertada do labor, atenderiam à noção jurídica de movimento paredista. Relembre-se, a esse respeito, ql..le a própria Lei de Greve brasileira, em seu art. zo. conceitua a figura como suspensão coletiva de prestação pessoal de serviços, total ou parcial. A ocupação de estabelecimento é, essencialmente, um método de realização do movimento paredista. Por isso, enquadra-se no conceito legal dessa figura do Direito Coletivo. Conforme já debatido, a precedente Lei de Greve (4.330/64), oriunda de período autoritário da vida política do país, explicitamente, subordinava o tipo legal da greve à desocupação dos locais de trabalho- exigência que desapareceu com a nova ordem jurídica constitucional (art. 9°, CF/ 88) e legal (L. 7.783/89). O silêncio da nova ordem jurídica resulta do fato de não haver real compromedmento do instituto paredista em face da adoção da estratégia ocupacional, uma vez que esta mantém-se subordinada à função primária da figura grevista, que é a abstenção coletiva de atividades contratuais pelos trabalhadores. 13 Reconheça-se, porém, que o movimento paredista, no desenrolar dessa estratégia ocupacional, dependendo do tipo de estabelecimento ou local de trabalho, corre maiores riscos de provocar atos ilícitos individualizados ou grupais de danificação ~ patrimônio empresarial. E tais atos, como se sabe, são passíveis de apenação (art. 9°, § zo, CF/88). Por isso é que se pode afirmar não ser ideal esse método para a consumação de grande parte dos movimentos grevistas. B) Formas de pressão social A greve é uma forma de pressão social que se particulariza em função do ambiente laborativo. Entretanto, podem existir outras modalidades de pressão dirigidas por grupos sociais, inclusive trabalhadores, que não se circunscrevem ao espaço delimitado do estabelecimento ou da empresa. É o que ocorre com o boicote. A boicotagem é a conduta de convencimento da comunidade para que restrinja ou elimine a aquisição de bens ou serviços de determinada(s) empresa(s). Não necessariamente vincula-se a movimentos trabalhistas, uma vez que pode ser utilizada por outros grupos sociais, com propósitos próprios. Ilustrativamente, boicotes propostos por movimentos ambiencalistas ou movimentos sociais de consumidores. Pode, entretanto, associar-se a certo movimento paredista. Neste caso, a associação será meramente socioeconômica, não produzindo efeitos jurídicos no âmbito contratual trabalhista- desde que se trate, é claro, de conduta coletiva pacífica. C) Condutas ilícitas de pressão Finalmente, há con?utas de coerção e/ou pressão claramente ilícitas, quer se trate de um contexto de greve ou não. E o que se passa com a sabotagem. 12. Conforme VIANA, Márcio Túlio. "Conflitos Cole[ivos do Trabàlho". In &visto do TST Vol. 66, n° 1, Brasflia/Porto Alegre: Síntese, jan.-mar./2000, p. 125. 13. Há autores, porém, que entendem que a ocupação de estabelecimento é aw coletivo que não se enquadra no conceiw jurídico de greve. Nesta linha, NASCIMENTO, A. M., Complndio tÚ direito sindical, dt., p. 392. 142 Síntese Trabalhista- N° 155- Mai/2002- ASSUNTO ESPECIAL Trata-se da conduta intencionalmente predatória do patrimônio empresarial, como mecanismo de pressão para alcance de pleitos trabalhistas ou reforço de greve. São seus exe'mplos a quebra de máquinas, a dolosa produção de peças imprestáveis, o desvio de material do estabelecimento e atos da mesma natureza e gravidade. GOMES e GO'ITSCHALK, segundo VIANNA, já teriam considerado tal conduta válida, em face de ser omissa a lei trabalhista a seu respeito. 14 Entretanto, tal entendimento não pode prevalecer, ainda que houvesse omissão normativa: é que o Direito rejeita o exercício abusivo de qualquer prerrogativa jurídica, mesmo as colecivas. De todo modo, não há sequer omissão no presente caso. Ao contrário, os atos abusivos censurados pela própria CF nos movimentos paredistas (art. 9°, § 2°) englobam, sem dúvida, a destruição dolosa de equipamentos empresariais e atitudes similares. 3 Extensão e limites O instituto da greve, ao ser incorporado pela ordem jurídica como um direito, acaba por encontrar nela suas próprias potencialidades e limitações. É evidente que nas experiências autoritárias o Direito tende a aprofundar as limitações aos movimentos paredistas, quando simplesmente não os proíbe. Nos regimes democráticos, ao reverso, há a tendência à ampliação das potencialidades do instrumento grevista, embora acolhendo-se algum tipo de contingenciamento a esse direito. A) Extensâo db Jireito O texto constitucional de 1988 firma, sem dúvida, extensão bastante larga para o direito de greve no segmento privado. Diz a Constituição que compete aos trabalhadores decidir sobre a oportunidadedeexercerodireito e sobre os interesses que devam por meio dele defender (art. 9°, caput). Trata- se, sem dúvida, da mais ampla potencialidade reconhecida ao instituto em sua vivência no país. No que diz respeito aos interesses contemplados, é claro que a grande maioria das greves dirige-se a temas contratuais, reivindicações trabalhistas, sendo esse o conduto essencial de desenvolvimento do instituto ao longo da história do capitalismo. • Entretanto, sob o ponto de vista constitucional, as greves não necessitam circunscrever- se a interesses estritamente contratuais trabalhistas (embora tal restrição seja recomendável, do ponto de vista político-prático, em vista do risco da banalização do instituto- aspecto a ser avaliado pelos trabalhadores). Isso significa que, a teor do comando constitucional, não são, em princípio, inválidos movimentos paredistas que defendam interesses que não sejam rigorosamente contratuais- como as greves de solidariedade e as chamadas políticos. A validade desses movimentos será inquestionável, em especial se a solidariedade ou a motivação política vincularem-se a fatores de significativa repercussão na vida e trabalho dos grevistas. Já se mencionou, neste artigo (item 111. l.D), a grande resistência que, regra geral, tratadistas e distintas ordens jurídicas têm com respeito a greves não estritamente econômico-profissionais. lbrém, nas democracias, havendo significativa aproximação de interesses, apta a gerar instrÚmenta/So/idaridode, ou havendo signifiCOiiva oproximogio de problemas, apta a gerar instrumental insurgincia paredista, o exercício da greve não se qualifica comoabusododireito. Esta é a linha matriz apontada pelo art. 9° da CF. No que diz respeito à regra constitucional de que cabe aos trabalhadores decidir sobre a oportunidade de exercer o direito, também não há dúvida de que se trata de comando nitidamente amplo. 14. VIANA, M. T., ob. cit., p. 133. Sfntese Trabalhista- N° 155- Mai/2002- ASSUNTO ESPECIAL 143 Porém, o próprio Direito Coletivo de Trabalho apresenta princípio que atenua a amplitude da regra constitucional. Trata-se da direuiz da lealdade e transparênc.:ia nas negociações coletivas. Em face de tal princípio, deixa de ser válida, por exemplo, a deflagração de movimento paredista em período de cumprimento de instrumento negociai coletivo, em decorrência da pacificação alcançada pela negociação recém concluída.15 É evidente que a ocorrência de modificações substantivas e inesperadas na situação de fato vivenciada por empregador e empregados pode ensejar o recurso à regra implícita rebus sic stantibus, viabilizando a greve. Contudo, para a jurisprudência, o simples inadimplemento pelo empregador do respectivo pacto coletivo não autoriza a conduta paredista, em virtude de haver ação de cumprimento eficaz, disponível na ordem jurídica, mediante substituição processual.16 8) Limitações ao direito A própria CF apresenta limitações ao direito que acabara de assegurar com incomparável amplitude. A primeira dessas limitações diz respeito à noção de serviços ou atividades essenciais, queé destacada pela CR Neste segmento destacado, cujo rol compete à lei definir, cabc;rá a c;sta também dispor sobre o atendimento dos necessidades inadiáveis da comunidade (art. 9°, § 1°, CF/88). Com isso a CF firma qualificativo circunstandal importante na realização dos movimentoS paredistas: os serviços ou atividades essenciais. Concretizado o movimento nesse âmbitO diferenciado, seus condutores deverão atentar para o atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade. Ou seja: a CF não proíbe a greve em tais sdkmento.s (ao contrário do que já ocorreu em tempos anteriores da história do país); mas cria para o movimento paredista imperiosos condicionamentos, em vista das necessidades inadiáveis da comunidade. A L. 7.783, de 1989, em resposta à determinação da CF, definiu os serviços ou atividades essenciais {art. 10): "tratamento e abastecimento de água, produção e distribuição de energia elétrica, gás e combustíveis; assistência médica e hospitalar; distribuição e comercialização de medicamentos e alimentos; funerários; transporte coletivo; captação e tratamento de esgoto e lixo; telecomunicações; guarda, uso e controle de substâncias radioativas, equipamentos e materiais nucleares; processamento de dados ligados a serviços essenciais; controle de tráfego aéreo; compensação bancária". Note-se que não estão nesse rol, ilustrativamente, serviços bancários, exceto compensação, com o processamento de dados a ela vinculado; serviços de comunicação, exceto telecomunicações (e respectivo processamento de dados); serviços de carga e descarga, exceto transporte coletivo; escolas; serviços de correios. Ainda com respeito a esses serviços ou atividades essenciais, em que caberá o atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade (CF/88, art. 9°, § 1°), a Lei de Greve dispôs que os sindicatos, os empregadores e os trabalhadores [tCtl1ll obrigados de comum acordo, a garantir, durante a greve, a prestação dos serviços indispensáveis ao atendimento dos necessidades inadiáveis da comunidade (art. 11, L. 7. 783/89). Completa a lei que, no caso de inobservância da regra anterior, o Poder Público assegurará a prestação dos serviços indispensdveis (art. 12). O mesmo diploma esclareceu serem necessidades inadiáveis da comunidade aquelas que, não atendidas, coloquem em pen"go iminente a sobrevivência, a saúde ouasegurançadapopulação (parágrafo único do art. 11, L. 7.783). 15. OJ OI, SDC{rST; L. 8.998/95. A respeito dosprindpWsespetiais do Direito Coletivo do Trabalho, consultar UELGADO, M. G., Direito coktivo do trabalho. São Paulo: LTr, 2001, Capitulo 11. Do mesmo autor, Curso d~direito do trabalho, São Paulo: LTr, 2002, Capítulo XXXIY. 16. OJ 01, SDC/TST,com suporte na L. 8.984/95. 144 Síntese Trabalhista- N° 155- MaV2002- ASSUNTO ESPECIAL Ajurisprudência tem invalidado o movimento paredista que, ocorrendo em se !Viços e atividades essenciais, não tenha a aptidão de assegurar o atendimento às necessidades inadiáveis da comunidade.17 A segunda limitação constitucional ao direito de greve é, na verdade, redundante, porque derivaria, necessariamente, do conjunto da lógica jurídica. De fato, dispõe a Constituição que os abusoscometidossujeitamosresponsáveisàspenasdaki (art. 9°, § zo, CF/88). Quer dizer o texto magno que a conduta coletiva paredista, embora amplamente franqueada, não traduz permissão normativa para atos abusivos, violentos ou similares, pelos grevistas. Na esteira da ressalva constitucional, a Lei de Greve dispôs que o sindicato obreiro ou a comissão de negociação, durante o movimento paredista, deverá manter, em ajuste com o empregador ou seu sindicato, equipes de empregados com o propósito de assegurar os serviços cuja paralisação resulte em prejuízo irreparável, pela deterioração irreversível de bens, máquinas e equipamentos, bem como a manutenção daqueles essenciais à retomada das atividades da empresa quando da cessação do movimento (art. 9°, caput). Completao diploma legal que, à falta de acordo nessa linha, assegura-se ao empregador, enquanto perdurar a greve, o direito de contratar diretamente a realização dos correspondentes serviços de manutenção (parágrafo único do art. 9°, L. 7.783). Este último dispositivo mencionado confere, porém, certa ampliação à noção de abuso acobertada pela CF; por essa razão, sua interpretação tem de :;:er rt::;:tritiva, :;:ob pt:na dt: in viabilizar qualquer movimento paredista. Há outra limitação trazida pela Lei de Greve, que se mostra de duvidosa constituciona- lidade: trata-se da proteção especial conferida ao trabalhador que insista em trabalhar. De fato, dispõe a lei que as mànifelta{ões e atos de persuasão utilizados pelos grevistas não poderão impedir o acesso aotrabalko ... (art. 6°, § 3°); completa o diploma legal que, em nenhuma hipótese, também poderão ser violados ou constrangidos os direitos e garantias fundamentais de outrem (art. 6°, § 1 °). Ora, a lei tem de ser interpretada em harmonia com a CF: direitos e garantias, em nenhuma hipótese, poderão, efetivamente, ser violados ou constrangidos, exceto o acesso ao trabalho, desde que, aqui, a restrição se faça sem violência física ou moral às pessoas. É que a CF assegura, enfaticamente, como direito fundamental, a greve, o movimento de sustação coletiva do trabalho; neste caso, o aw individual de insistir no cumprimento isolado do contrato choca-se com o direiw coletivo garantido. Inexistindo violência física e moral nos piquetes, estes são lícitos, por força do direito garantido na CF, podendo, desse modo, inviabilizar, fisicamente, o acesso ao trabalho- repita-se, desde que sem violência física ou moral ao trabalhador. 4 Requisitos A ordem jurídica infraconstitucional estabelece alguns requisitos para a validade do movimento grevista. Em seu conjunto não se chocam com o sentido da garantia magna; apenas civilizam o exercício de direito coletivo de tamanho impacto social. Nessa linha, o primeiro requisito é a ocorrência de real tentativa de negociação, antes de se deflagrar o movimenw grevista: desde que frustrada a negociação coletiva ou verificada a impossibilidade de recurso à via arbitral, abre-se o caminho ao movimento de paralisação coletiva (art. 3°, caput, L. 7.783). A jurisprudência, a propósito, tem exigido demonstrações satisfatórias de que houve real desenvolvimento ou, pelo menos, efetivo intento de estabelecer-se uma etapa negociai prévia, que se fnustrou, entretanto.18 O segundo requisito é a aprovação da respectiva assembléia de trabalhadores. Aqui, a lei respeita os critérios e formalidades de convocação e quórum assembleares fixados no correspondente estatuto sindical (art. 4°, L. 7.783). 17. O] 38, SDCffST. 18. O] 11, SDCffST. 1 Sfntese Trabalhista- N° 155- Mai/2002- ASSUNTO ESPECIAL 145 O terceiro requisiw é o aviso prévio à parte adversa (empregadores envolvidos ou seu respectivo sindicato). O aviso será dado, regra geral, com antecedência mínima de 48 horas da paralisação (art. 4°, Lei de Greve). Em se tratando de serviços ou atividades essenciais, o prazo será de 72horas da paralisação (art. 13, Lei de Greve). Neste caso, a comunicação deverá contemplar não apenas os empregadores, como também o público interessado (a lei fala em IJSUÓn'os). O quarto requisito é o respeito ao atendimento às necessidades inadiáveis da comunidade, no contexto de greve em serviços ou atividades essenciais (art. 9°, § 1°, CF/88, c/c arts. 10, 11 e 12, Lei de Greve). O rol de tais atividades e serviços e os critérios de cumprimento das necessidades comunitárias destacadas pela Constituição foram examinados no item 111.3.8 deste capítulo, logo atrás. 5 Direitos e deveres dos grevistas A ordem jurídica estabelece direitos e deveres para os grevistas, que repercutem, naturalmente, em suas relações com a comunidade e, em especial, com seus empregadores. Nessa linha,as prerrogativas e proteções que os trabalhadores recebem do Direito deságuam, por coerência, na formação de correspondentes deveres para os empregadores. Em contraponto a isso, os deveres impostos aos grevistas pela ordem jurídica podem implicar, sem dúvida, na formação de certas prerrogativas e proteções compatíveis às empresas submetidas à greve. A) Direitos dos grevistas • São direitos dos trabalhadores paredistas, entre outros: utilização de meios pacíficos de persuasão (art. 6°, Lei de Greve); arrecadação de fundos por meios lícitos (idem); livre divulgação do movimento (idem); proteção contra a dispensa por parte do empregador (o contrato de trabalho encontra-se suspenso, juridicamente- art. 7°, Ld de Greve). É também direito dos grevistas a proteção contra a contratação de substitutos pelo empregador (art. 7°, parágrafo único, L. 7.783). Neste caso, a Lei de Greve introduziu exceção- que tem de receber interpretação restritiva, sob pena de frustrar, grosseirameme, o direito fundamental assegurado pela CF. Trata-se da não- formação, pelos obreiros ou seu sindicato, de equipes de manutenção de bens e serviços cuja paralisação, na empresa, possa causar prejuízo irreparável, ou que sejam essenciais à futura retomada das atividades empresariais (art. 9°, Lei de Greve). Conforme já exposto no item 111.3.8 deste artigo, a regra legal confere certa ampliação à noção de abuso acobertada pela CF, devendo, em conseqüência, receber interpretação restritiva, sob pena de inviabilizar a efetiva realização de movimentos paredistas. A segunda exceção à contratação de substitutos encontra-se no art. 14 da Lei de Greve. Ela abrange os movimentos considerados ilegais, seja por desrespeitarem a ordem jurídica, seja por se manterem após a celebração de acordo, convenção ou decisão judicial trabalhista a respeito. B) Deveres dos grevistas Os deveres dos trabalhadores grevistas já podem ser inferidos pelas próprias limitações que a ordem jurídica fixou para os movimentos paredistas. Sinteticamente, seriam eles: assegurar a pr~stação de serviços indispensáveis às necessidades inadiáveis da comunidade, quando realillando greve em serviços ou atividades essenciais (acrescendo-se que o Poder Público poderá suprir tal atendimento); organizar equipes para manutenção de serviços cuja paralisação provoque prejuízos irreparáveis ou que sejam essenciais à posterior retomada de atividades pela empresa; não fazer greve após celebração de 146 Sfntese Trabalhista- N° 155- Mai/2002- ASSUNTO ESPECIAL convenção ou acordo coletivos ou decisão judicial relar_iva ao _moviment? (re~pe_itada a ocorrênc~a de fatores que se englobem na chamada cláusularebus susttmtibus); respettar dtreHos fundamen.tats de outrem; não produzir atos de violência, quer se trate de depredação de bens, quer seJam ofensas fisicas ou morais a alguém. 6 Uma especificidade: greve e serviço público O conceito de greve, como visto, construiu-se, emprindpio, enfocando as relações de caráter privado, situadas no âmbito do contrato de emprego ou de outras relações de prestação laborativa subordinada características da vida socioeconôrnica (como os avulsos, nos portos marítimos ao longo do globo). Esse sempre foi o campo principal dos movimentos paredistas, como direito social ampliado, construído no âmbito da sociedade civil e assim incorporado pelas ordens juridicas.19 No campo das relações estritamente públicas, em que o Estado age com as qualidades e poderes distintivos de imperium, há uma tendência geral das ordens jurídicas, mesmo efetivamente democráticas, de não realizarem a pura e simples imporcação dos princípios e regras que regem o instituto paredista no âmbito da sociedade civil. Encontram-se, desse modo, situações de restrição, em alguma medida, dos movimentos paredistas, até um clímax jurídico de negativa de incorporação a certas searas públicas dos princípios e regras clássicos elaborados em tomo do instituto da greve. Assim é que, mesmo sendo indubitável o caráter democrático da Carta de 1988, ela não contemplou o direito de greve para os .servidores militares, aos quais não estendeu sequer o direito de sindicalização (art. 37, VI e VII e art. 42, § 5°, CF/88). Note-se que não se Cstft,':'afil{li, no quadro das carreiras militares, falando-se em relação de emprego, porém em vínculo de caráter estatutário, regido por normas especialíssimas, em que a noção de hierarquia tem sido considerada importante à própria estrutura e dinâmica operacional da instituição. Tratando-se, porém, de servidores civis, tem-se percebido nítida tendência à extensão de principias e regras clássicos relativos à greve. A CF/88, de fato, pioneiramente no Brasil, garantiu ao servidor público civil o direito à livre associação sindical (art. 37, VI). Em coerência, também referiu-se ao movimento paredista no âmbito da administração pública, observada a seguinte regra: o direito de greve será exercido nos termos e nos limites defmidos em lei complementar (art. 3 7, VII). Posteriormente, a EC 19/98, alterou a expressão lei complementar do inciso VII para lei espedfica. O STF, examinando a matéria, por distintas vezes, entendeu tratar-se o art. 37, VII, de norma de eficácia limitada, absolutamente dependente de legislação ulterior, porque a CF deixa claro que o direito será exercido "nos termos e limites definidos em lei complementar"(. .. ) Não se tem, etjl tal caso, norma de eftcácia contida ou restringível, mas, na verdade, nof7110 de eftcácia limitada ou reduzida. 20 E o que prevaleceu na ADin 339/RJ, de 17.07.1990, no Ml 20/DF, de 01.05.1994 e também no Ml 438/GO, de 11.11.1994.21 Com tais decisões, o direito de greve dos servidores públicos ainda não seria válido no país, uma vez que não editada até a presente data a respectiva lei regulatória. Curiosamente, entretanto, ao longo dos últimos anos, desde 1988, têm ocorrido, com alguma freqüência, greves no segmento dos servidores públicos, sendo que o Poder Executivo, grande parte das vezes, não tem apelado para sua ilegalidade. Isso traduz certo pensar cultural de 19. llustrativamente, no Brasil, hoje, o direito de greve, com a amplitude constitucional que lhe é conferlda, encontra-se no art. 9° da CF/88, inserindo-se Capítulo 11 da Cana Magna, que trata dos Dirtitos Sociais. 20. VELLOSO, Carlos Mário da Silva. "A Greve no Serviço Público"./n FRANCO FILHO, Georgenor de Souza (coord.), Cursodt Direito Coktiw do Traóallw- estudos em homenagem ao Min. Orlando Teixeira .da Costa, São Paulo: LTr, 1998, p. 563. 21. Conforme VELLOSO, Carlos Mário da Silva. Ob. cit., p. 563-566. Sfntne Trabalhista- N° 155- Mai/2002- ASSUNTO ESPECIAL 147 que o direito teria efetiva validade, mesmo hoje, compatível com os quadros da democracia implantada no país. O único sustentáculo teórico-técnico para tal pensar seria considerar-se, respeitada a magna posição contrária, o dispositivo do art. 37, VII, como regra de efzcáda contida, isto é, preceito constitucional que assegura direito com eficácia imediata, embora autorizando à normatividade infraconstitucional que fixe condições e regras para seu exercício. Eficácia de Regra Constitucional: permanência de um debate? Como contribuição ao debate- se possível, após as decisões da Corte Máxima do país- tratamos em antiga obra, Introdução ao Direito do Trabalho, desse problema fundamental, relativo à eftcáda juridica das normas constitucionais.22 Ali assim dissertávamos: "Por eficácia jurídica deve-se compreender a aptidão formal de uma norma jurídica para incidir sobre a vida material, regendo relações concretas. O exame da eficácia das regras jurídicas constitucionais é dimensão de notável relevância no Direito Constitucional, notadameme em sociedades, como a brasileira, caracterizaQas por recorrentes alterações políticas e constitucionais. É fundamental à Ciência do Direitoelaborar claros e objetivos critérios informadores da eficácia das regras constitucionais, na proporção em que estas se qualificam como os preceitos diretores mais relevantes do conjunto da ordem jurídica. A esse propósito, duas teorizações principais têm se confrontado, elegendo critérios distintos- com efeitos também distintos- sobre a eficácia das regras jurídicas constitucionais. Há a vertente tradicional, inspirada na obra de antigos constitucionalistas, como THO:tvlAS COOLEY e RUI BARBOSA, e a que se filiam ainda autores contemporâneos, como MANOEL GONÇALVES FERREIRA FILHO. Há, por outro lado, a vertente jlloderna, inspirada em juristas do pós-li Guerra Mundial, como o italiano VEZIO CRISAFULLI, e desenvolvida no Brasil por autores como JOSÉ AFONSO DA SILVA, MICHEL TEMER e MARIA HELENA DINIZ". A) Vertente tradicional A teor da leitura proposta pela vertente tradicional, existiriam dois tipos de normas constitucionais, considerada a sua eficácia jurídica: normas auto-executáveis e normas não auto- executáveis. Auto-executáveis seriam aquelas regras que têm aplicabilidade imediata. Completas e definidas quamo à hipótese de incidência e seu conteúdo normativo (e no tocante à forma de se concretizarem), tais regras bastam-se a si mesmas, tendo, desse modo, aptidão formal para incidir e reger imediatamente situações fáticas com.:retas. Não auto-executáveis, por sua vez, são aquelas regras insuscetíveis de incidência e aplicação imediata, por dependerem de regra infraconstitucional ulterior que as complemente ou especifique. Pairam em certo limbo jurídico, sem aptidão para reger situações da vida concreta. Tecnicamente, sequer poderiam ser tidas como fontes do Direito, dado não criarem, enquanto não completadas por lei, direito subjetivo ou pretensão material em favor de qualquer titular. Tais normas não auto-executáveis englobam três tipos de preceitos: a) normas incompletas: não suficientemente definidas, seja quanto à hipótese de incidência, seja quanto à sua efetiva disposição de conteúdo. Ex.: criação de institutos processuais sem indicação do procedimento aplicável (art. 5°, XXI, CF/88- "mandado de injunção"); b) normas condicionadas: embora pareçam suficientemente definidas quanto à hipótese e no aspecto dispositivo, foram condicionadas, pelo texto magno, a uma lei posterior, que deverá precisar seus elementos integrantes (art. 7°, XXI, CF/88- "aviso prévio proporcional"); c) normas programáticas: indicam planos ou programas de atuação societária ou governamental, direcionando o futuro desenvolvimento jurídico. 22. DELGADO, M. G., Introdução ao dirtitodo troóa/lto. 3. ed., São Paulo: LTr, em seu capítulo IY, "Fontes do Direito do Trabalho", item II.IAb, intitulado "Eficácia jurídica da Carta Consdtucional". A primeira edição da obra é de 1995; contudo, adotamos, neste instante, o texto atualizado de 2001. 148 Síntese Trabalhista- N° 155- Mai,/2002- ASSUNTO ESPECIAL Tanto supõem lei subseqüente para sua complementação ou regulamentação, como também exigem medidas administrativas para que possam se tornar efetivas. A diferenciação acima não afasta a conclusão de que a cipologia tradicional retira qualquer aptidão para incidência e aplicação concretas (qualquer eficácia, portanto) a qualquer dos três tipos classificados de normas não auto-executáveis. Mais que isso, tal diferenciação evidencia, claramente, que a tipologia examinada alarga ao máximo a noção de impotência das normas constitucionais, conduzindo à curiosa situação de ineficácia de grande parte de uma novel CF promulgada. Como se vê, a conhecida afirmação de BIELSA, de que as normas programáticas não teriam virtual idade jurídica, acaba por ser extensiva a todo tipo de norma constitucional não auto- executável, como aventado pela tipologia tradicional. B) Vertente moderna "O enfoque de construção do critério de análise da eficácia das normas constitucionais privilegiado pela vertente moderna é sumamente diverso do enfoque tradicional. A vertente moderna parte do suposto (na verdade, inquestionável axioma) de que a Constituição resulta de pacto político fundamental da sociedade envolvida, direcionando a estrutura nuclear das relações essenciais existentes naquela sociedade. É documento político e jurídico que deriva, em geral, de momentos decisivos da história política dos povos civilizados contemporâneos. Tais qualidades inerentes à idéia de Carta Constitucional não permitem que se negue às regras contidas nessa Carta imediata aptidão para incidir e reger situações e relações fático-jurídicas concr&tas.§ep Ciência do Direito construiu tipologia e critério inábeis a apreender e conferir conseqüência' ao c'onceito e sentido básico de uma Constituição, como diploma máximo de uma realidade sociopolítica, cabe se suplantar tal tipologia e critério em favor de outra sistemática teórica que consiga conferir efetiva prevalência e utilidade jurídicas às normas constitucionais historicamente pactuadas em certa sociedade. Nessa linha, a vertente moderna tende a classificar as normas componentes de uma Constituição, no tocante à sua eficácia jurídica, em preceitos de três tipos principais: a) normas de eficácia plena; b) normas de eficácia contida; c) normas de eficácia limitada. O enfoque aqui adotado, como visto, é antitético ao incorporado pela vertente tradicional: a presente tipologia compreende que a norma constitucional, como preceito maior e politicamente legitimador da própria ordem jurídica global, é, antes de tudo, válida, eficaz e aplicável, incidindo imediatamente sobre situações fático-jurídicas concretas. A diferenciação constrói-se agora não em torno da negativa à eficácia da norma, mas em torno da maior ou menor intensidade da eficácia imediata característica da norma constitucional examinada. De eficácia plena são as regras que têm aplicação imediata e Integral, independendo de legislação posterior para o alcance de sua cabal operatividade. São preceitos que não necessitam da intermediação do legislador infraconstitucional para que alcancem imediata aptidão para regência de situações concretas. Inúmeros são seus exemplos no texto de 1988: arts. 1° e zo, CF/88 ('Federação', 'Poderes da União'); art. 7°, III, XIII e XVII, CF/88 ('FGfS', 'duração semanal do trabalho de 44 horas', '1/3 sobre férias'). De eficácia contida são aquelas regras constitucionais cuja eficácia seja redutível ou restringível por diploma infraconstitucional, conforme autorizado pela própria Constituição. Essas regras jurídicas têm aplicabilidade imediata, mas podem ter seu alcance reduzido (por isso fala-se em eficácia contida) pelo legislador infraconstitu- cional, segundo comando oriundo da própria CR São, em geral, as normas que enunciam direitos com o preceito suplementar' ... na forma que a lei estabelecer'. Observe-se: não sendo editada a Sintese Trabalhista- ND 155- Mai/2002- ASSUNTO ESPECIAL 149 legi~lação complementar ~cgulan~c::n.tadora (e restritiva), a norma constitucional (e seu princípio s~,!JJ~cente) fir~~-se em vtgor. O JUnsta TE~ER lança significativo exemplo: are. 5°, XIII, CF/88 ( E hvre? exerctcto de qualquer trabalho, ofíciO ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a_ l~t estabelecer'). ~ c~nclui: não editada legislação regulamentadora, o principio do livre exerctciO é pleno -e não mextstente (como resultaria da leitura proposta pela matriz tradicional).Z3 .. Ressalte-se, ~nalmente, que a norma de eficácia contida possui, ainda, importante efeito ~stenhza,nt~ nega~tvo sobre as normas infraconstitucionais que lhe sejam antitéticas ou mcom~attvets- efetto não percebido pelo critério teórico tradicional. A simples circunstância de ~sse ttpo_ d~ ~?rma invalidar a continuidade ou emergência de preceitos antagônicos ou mcompattvets Ja lhe confere substantiva eficácia no contexto da ordem jurídica global envolvida.Normas .d~ eficácia limitada são aquelas regras constitucionais que dependem da emissão ~e u~a normauvt~ad~ f~tura_ para alca~ç~r plena eficácia. Tais normas têm eficácia jurídica Imedt~t~, embo~ seJa SJgntficattv~mente ~Imttada essa eficácia. Cabe ao legislador ordinário integrar a eficacta de tats normas, mediante lei que lhes confira aptidão de execução em termos da regulamentação dos interesses constitucionalmente visados. Embora sua eficácia seja menos intensa d~ que~ carac~erística aos dois tipos anteriores de normas constitucionais, tais preceitos também nao estao d~stituídos_de uma relativa eficácia jurídica: é que eles têm aptidão para obstar a edição de no~ma~ tnfra~onsutuc~onai~ de sentido antitético ou incompatível ao incorporado no preceito consmuc10nal :t~orante, mvahdando tais normas antagônicas.24 Esse efeito esterilizante negativo sobre a normattvtdade antagônica ou incompatível traduz-se, portanto, na mínima eficácia de que se reveste qualquer preceito constitucional vigorante. • Os preceitos de eficácia limitada dividem-se em normas de princípio institutivo e normas ~e princíp.io p:ogramático._25 J?~ pri?cíp.io ~n~titutivo são aquelas normas que dependem de regra mfraconstttucwnal para vtabthzar mstttuiçoes ou órgãos previstos na CR Ilustra esse tipo de n~rma o art. 18 da ?F~8~, que trata -d~ sub_divisão e incorporação de estados na Federação brasileira. Ja as normas de pnnc1p1o programattco sao aquelas que firmam um programa constitucional a ser desenv~lvid~ ~ediante legislação integrativa da vontade constitucional. Ex.: art. 205, CF/88 (~ educaçao, dtretto de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada ... ').26 O contra~~n~o das_ dua:' vertentes teóricas enfocadas demonstra que a regra geral da vertente moderna é a efic~c~a tmedtata mconteste das normas contidas em uma CF, ao passo que a regra geral da vertente tradiCIOnal é a ausência de virtualidade e eficácia jurídicas imediatas dessas mesmas normas. Trazido esse contraponto à CF/88- em que há extenso número de normas inovadoras em face do quadro constitucional anterior- percebe-se a gravidade da opção teórica tradicional. O fato é que a .vertente tradicional não supera o impasse técnico-jurídico dé não absorver, adequadamente, a ?rectsa observância do princípio de hierarquia interna da ordem jurídica, tendo na CF s~u ~ont? mats elevado. Afinal, como podem prevalecer regras jurídicas contrárias a regras consmuciOnats emergentes, apenas pelo fato de esse último não ter ainda reunido os elementos comp~etos a s~u f~ncionamento operacional? Ainda que não seja absoluta e completa a eficácia do prec~t~o con.stt~U~tonal surgido, ela existe pelo menos na proporção em que o novo preceito revoga ou estenhza pnnctptos e normas frontalmente antitéticos ou incompatíveis! Sem tal efeito mínimo, 23. :EMER, Michel. Elcmentosd~direitoconstitucional. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1989, p. 27. 24. E o que e_xpõe MICHEL !EMER, ao sustentar que as normas de eficácia limitada têm 0 efeito de impedirqueokgis/ador co~ ~8 normas~ Jentido oposr~ ao ~mdo pelo wtMituinte, antes mesmo da possivel kgishfãO inttgrativa que lflr di pkna ap/icabilidadr. Ob. Clt., p. 28. Por ISSO e que esse autor consid~ra aplicáveis todas as normas wnstitucionais. pois todas são dotadas dr ifhiciajurldico. Ob. cit., p. 26. ' ' 25. SILVA, José Af~nso da. Ap/icobifidadtda.rnormasconstitudonai.s. São Paulo: Revista dos Tribunais, s.d., citado por MICHEL TEMER, ob. c1t., p. 26-27. 26. Conforme MICHEL TEMER, ob. cit., p. 27. 150 Sfntese Trabalhista- N° 155- Mai/2002- ASSUNTO ESPECIAL produz-se uma sistemática de injustificável prevalência de universo normacivo adverso à CF, suprimindo efeito formal e prático à escala hierárquica de regras que distingue e demarca qualquer ordem jurídica. nz7 Nesse quadro, caso se considere o dispositivo do art. 37, VII, em sua nova versão (que se refere à lei específica e não mais lei complementar),28 regra constitucional de ejicdcia contida, isso significaria que os servidores civis teriam direito à greve. É claro que o instituto, logicamente, não poderia ser absoluto, inteiramente desregulamentado, porémsubmetidoaoscritériosdaordemjuridica existente sobre a matéria, isto é, L. 7. 783/89, no que esta for compatível, é claro. É evidente também que não se pode falar na aplicação do art. 9° da mesma CF aos servidores, uma vez que este dispositivo dirige-se a trabalhadores e empregadores; ainda que assim não fosse, a circunstância de haver regra especial tratando da matéria quanto aos servidores civis na mesma CF (art. 3 7, VI) traduz a intenção da Constitucional de fixar normatização algo distinta a respeito do tema. Nesta mesma linha de reflexão, as restrições de constitucionalidade que se apresentam à L. 7.783, quando regendo movimentos paredistas do âmbito da sociedade civil, em função do comando amplo do an. 9° da CF (restrições mencionadas no item 3.8, deste artigo), desaparecerão no tocante à regência dos movimentos paredistas dos servidores públicos. É que, neste último caso, a referência constitucional existente será o art. 37, VI, e não mais o art. 9° do texto magno. 7 Greve: natureza jurídica e fundamentos A) Natureza jurídica A natureza jU:ríçiiCaJia greve, hoje, é de um direito fundamental de caráter coletivo, resultante da autonomia privada coktiva inerente às sociedades democráticas. É exatamente nesta qualidade e com esta dimensão que a CF/88 reconhece esse direito (art. 9°). É direito que resulta da liberdade de trabalho, mas também, na mesma medida, da liberdade assrxiatioaesindiaJI e daoutonontiadossindicotos, configurando-se como manifestação relevante da chamada autonomia privada coletiva, própria às democracias. Todos esses fundamentos, que se agregam no fenômeno grevista, embora preservando suas particularidades, conferem a esse direito um status de essencialidade nas ordens jurídicas contemporâneas. Fbr isso é direito fundamental nas democracias. Não há dúvida quanto a greve ser, originalmente, uma modalidade de autotutela, de coerção coletiva. Contudo, sua consagração nas ordens jurídicas democráticas, como direito fundamental, conferiu-lhe não somente força, mas também civilidade. Nesta última medida, a figura ultrapassou o caráter de mera dominação da vontade de um sujeito sobre outro, como inerente à autotutela. A consagração do instituto como direito tem levado ao surgimento de interessantes variantes conceituais, tais corno, direito de igualdade, direito instrumental, direito potestativo e super-direito. Não se pode afirmar serem exatamente incorretas tais variantes conceituais; porém são incompletas, dotadas de visão algo parcial relativamente ao fenômeno da greve. A idéia de direito de igualdade sustenta que o movimento paredista é o grande mecanismo viabilizador da efetiva aproximação de poderes, de igualização, entre trabalhadores, coletivamente considerados, e empregador. É o mecanismo que potencialmente estabelece equivalência entre os contratantes coletivos, pois concentra o grande momento em que os poderes empresariais são, de fato, postos em questão. 27. DELGADO, M. G., lntrodUfÕO ao direito do traóa/lzo. 3. ed., São Paulo: LTr, capitulo IV, item II.IA.b, sob o titulo, "Eficácia Juridica da Carta Constitucional". 28. A jurisprudência citada do STF foi construida ainda quando o texto do dispositivo constitucional referia-se à In complemmtar. Sfntese Trabalhista- N° 155- MaV2002- ASSUNTO ESPECIAL 151 Esta noção é válida, consistindo, aliás, em um dos fundamentos de afirmação da greve nas sociedades democráticas. Mas não esgota o instituto, em face da amplitude que o caracteriza. A idéia de direito i'mtrumental também é correta, pois a greve é, de fato, mecanismo de pressão para o alcance de reivindicações coletivas dos trabalhadores. Porém, a noção é insuficiente,até mesmo tímida, para traduzir o conjunto complexo de atos, condutas e efeitos concentrados em um movimento paredista. O caráter instrumental da greve é inegável (assim como instrumentais são o processo judicial, o trabalho e inúmeros atos praticados pelos indivíduos na vida pessoal e social, sem que isso explique toda a natureza de tais institutos e condutas). Assim, reconhecer-se o caráter instrumental da greve não significa que se deva reduzir sua natureza jurídica a esse exclusivo aspecto. A idéia de direito potestativo resulta, em certa medida, da noção de autotutela inerente à greve. Porém, não pode mais ser acolhida nas ordens jurídicas civilizadas. Há traços de pocestividade, é claro, nos movimentos paredistas; contudo, o Direito não mais permite que tal relevante conduta coletiva mantenha-se na dimensão incomrastável que é própria aos direitos potestativos. Conforme já exposto, a consagração da greve nas ordensjuridicas democráticas, como direito fundamental, conferiu-lhe não somente força, mas também civilidade. Nesta última medida, a figura ultrapassou o Caráter de mero exercício potestativo da vontade coletiva, incontrastável em face de regras ou princípios contrapostos. Há limites, afinal, ainda que atenuados, às greves, mesmo em ordens constitucionais firmemente democráticas (como expresso pelo art. 9° da CF/88). A idéia de super-direito tem importantes elementos de verdade: a greve, corno direito coletivo, traduz, de fato, exercício privado e grupal de coerção, prevalecendo, em certa medida, sobre outros direitos tradicionais do empregador e, até mesmo, da pr~ria comunidade. Além disso, é movimento social que, muitas vezes, intenta ultrapassar o Direito construído, alterá-lo, reconstruí-lo. Contudo, a expressão pode ensejar o enganoso sentimento de que não há limites a essa prevalência, o que seria um erro. Na linha do que já foi exaustivamente exposto, a consagração das greves nas democracias conferiu ao instituto não somente grande força, como também inquestionáveis limitações, que respondem por sua civilidade na ordem social. Outras concepções Ao lado da concepção da naturezajurfdica da greve como direito fundamental, hoje prevalecente, existem outras que já contaram com certo prestígio na doutrina justrabalhista. Trata-se das concepções que enquadravam o instituto ora corno fato social, ora como liberdade, ora como poder. Registre-se que nenhuma dessas três concepções é inteiramente equivocada, já que todas tocam em aspeccos verdadeiros e relevantes da figura sociojurídica da greve. Entretanto, são, hoje, insuficientes para explicar o correto enquadramento jurídico de tal fenômeno. As três têm em comum a circunstância de procurarem, de certo modo, excluir, com suporte em distintas fundamentações, a possibilidade de regência normativa do fenômeno grevista pela ordem jurídica. Curiosamente, seus resultados tendem a ser antitéticos a seus aparentes objetivos, já que mais facilmente justificam urna política repressiva à greve no meio social. A concepção de greve comofatosodalsustenta que, considerada essa natureza do fenômeno, não cabçria ao Direito incorporá-lo e, principalmente, regulá-lo ou restringi-lo. A explicação tem relativa correção, à medida que os movimentos grevistas são, efetivamente, fatos sociais; além disso, muitas vezes tais fatos impõem-se aos empregadores e às próprias autoridades públicas, que com eles rem de lidar, mediame cuidadosa sensibilidade em busca do melhor caminho à pacificação do conflito coletivo. :Não há dúvida, portanto, de ~ue a História demonstra a presença de diversas situações grevistas que suplantaram os quadros legais e, ainda assim, impuseram-se no plano social. As ditaduras são repletas de exemplos dessa ordem, sendo que eles ocorrem mesmo nas democracias. 152 Sintese Trabalhista- N° 155- Mai/2002- ASSUNTO ESPECIAL Entretanto, a explicação deixa de ter em conta a circunstância de que cabe ao Direito, exatamente, captar no meio social os fatos que se tornaram correntes e relevantes, conferindo a eles reconhecimento jurídico, de modo a assegurar-lhes, no mínimo, nas democracias, maior transparência, em beneficio da convivência social mais harmônica e justa. Além disso, a concepção de mero fato social coloca os movimentos paredistas, de imediato e automaticamente, fora da ordem jurídica, autorizando, com maior facilidade, a prática autoritária e repressiva sobre sua deflagração e dinâmica. Registre-se que AMAURI MASCARO NASCIMENTO, reportando-se ao jurista uruguaio DE FERRAR!, noticia a existência de uma variante da concepção de greve como fato social. Para esta variante, seria a greve nada mais do que um fato jurídico, ou seja, apenas um evenw do qual resultam efeitos que se projetam nas relações jurídicas envolvidas ou, ainda, um modo de criar condições para obterougarantirdireitos.19 Tal concepção, entretanto, é, na verdade, um empobrecimenw da-própria concepção maior, a que se reporta (faw social), além de bastante insuficiente para explicar fenômeno tão complexo quanw a greve. A concepção de greve como liberdade é mui co próxima à relativa a fato social. Para tal entendimento, a figura grevista seria manifestação inerente à liberdade humana, ainda que encarada sob perspectiva coletiva; nessa qualidade, não poderia ser regulada e restringida pelo Direi co. A presente concepção seria corretíssima, caso se restringisse a seu primeiro enunciado, não se estendendo à conclusão antijurídica subseqüente. De fato, os movimentos paredistas são manifestações inerentes à liberdade humana, a qual projeta-se no plano coletivo. Aliás, nessa direção, já entendeu a Corte C~nsdtal:ional da Itália, ao tratar, em 1974, de situação envolvendo greve política. A este respeito, AMAURI MASCARO NASCIMENTO lembra que, em decisão excludente da aplicação de preceitos penais incriminatórios de greve sem fim estritamente trabalhista, mas político, aquela Corte Máxima teria então sustenta do que a greve constituia, sempre, uma manifestação de liberdade constitucionalmente reconhecida e, como tal, não suscetfvel de constrangimentos jurídicos, salvo em se tratando de casos de subversão do ordenamento constitucional 30 É óbvio, entretanto, que a circunstância relevante de tais movimentos serem manifestações coletivas da liberdade humana não significa que não possam e não devam ser democraticamente regulados pelo Direito. Não há na vida social liberdade absoluta- o que já fundamentaria a necessidade da regulação jurídica dessa liberdade. Mais do que isso, tal regulação pode (e deve) ocorrer também com o objetivo de tornar viável e eficaz o instituto, e não somente com a meta de restringir ou dificultar sua existência e desenvolvimento. A regulação jurídica democrática do direito coletivo de greve civiliza o movimento, mas sem o inibir ou desestimulá-lo. A concepção de greve como poder, finalmente, toca nos mesmos pontos centrais de argumentação das duas vertentes anteriores, padecendo das mesmas limitações teóricas e práticas. 8) Fundamentos Os fundamentos da greve, conforme já exposto, são distintos, todos qualificados pelo mesmo nível de relevância. Trata-se de um lado, da liberdade de trabalho. De outro, da liberdade associativa e sindical. Ao lado deste, o princípio da autonomia dos sindicatos. Finalmente, como resultado de todos esses fundamentos agregados, a denominada autonomia privada coletiva, que é inerente às democracias. Em síntese, esses fundamentos, em seu conjunto, reunidos no fenômeno grevista, ainda que mantendo cada um deles sua especificidade, todos conferem ao direito paredista status de 29. NASCIMENTO, A. M., Direito do trabalho na constituição de 1988. São Paulo: Saraiva, 1989, p. 292. 30. NASCIMENTO, A. M., Comp;,diodedireitosindical, cit., p. 373. Sintese Trabalhista- N° 155- MaV2002- ASSUNTO ESPECIAL 153 essencialidade nasordens jurídicas contemporâneas. Por tudo isso, a greve é, efetivamente, direito fundamental nas democracias. 8 Greve: retrospectiva histórico-jurídica O Direito do Trabalho brasileiro, seu movimento sindical e o instituto da greve estão atados, hiswricamente, a um marco fundamental: a tifirmação da relação de emprego como vínculo sociojuridico importante no sistema econômiCo-social do país. É que, sem relação empregatícia como instrumento relevante de conexão do trabalhador livre ao sistema produtivo, não se pode falar na emergência das condições para o próprio surgimento do ramo jus trabalhista, assim como, de resto, de quaisquer de seus instituws específicos, corno os sindicatos e as greves, por exemplo. Esse marco é dado pela extinção da escravatura, em 1888, que tornou a relação empregatícia a modalidade central de vinculação do trabalho ao sistema socioeconôrnico. Em torno desse período surge o primeiro diploma legal que se refere à greve. Trata-se do antigo Código Penal, de 11 de outubro de 1890 (D. 847), que tipificava o paredismo c seus atos corno ilícitos criminais. 31 A fase da criminalização da greve foi, contudo, brevíssima. Logo depois, pelo D. 1.162, de 12.12.1890, a conduta grevista deixou de ser ilícito penal, punindo a ordem jurídica apenas os atos de ameaça, constrangimento ou violência verificados em seu meio.32 Ainda que não se tratasse de regulação da greve como direito, esta poderia ser considerada, no novo contexto normativo (D. 1.162, de 1890), crAno fato social ou, ainda, liberdade, de certo modo. Com isso, remetia-se ao exame das situações concretas grevistas a pesquisa sobre ocorrência de atos de violência, constrangimento ou ameaça. O período de 1930 a 1945, de implantação do modelo trabalhista brasileiro, de caráter corporativo-autoritário, foi, como é óbvio, adverso às manifestações livres dos movimentos paredistas. Logo em seguida à implantação do Governo Provisório (outubro de 1930), seguiu-se fase de centralização política, que naturalmente restringe a liberdade para manifestações paredistas. Contudo, ainda não surgira diploma proibindo ou criminalizando esse instituto trabalhista. A Carta Constitucional de 1934 não se referiu à greve,33 embora fosse diploma de índole relativamente democrática. De todo modo, esta Constituição intermediária entre períodos ditatoriais teve sua eficácia jurídica rapidamente sustada, com o estado-de-sítio de 1935 (que duraria até o golpe de estado de novembro de 1937). Portanto, desde a época do estado-de-sítio, a greve foi afastada do campo dos institutos válidos do Direito do Trabalho. A Carta de 1937 conferiu expressão normativa à tendência autoritária manifestada tempos atrás pelo Governo Provisório, colocando a greve na ilegalidade. Em seguida, outros diplomas infraconstitucionais repetiriam a mesma orientação normativa de proibição e, até mesmo, criminalização dos movimentos paredistas. Ilustrativarnente, LSN DL 431, de 1938), D. 1.23 7, de 1939, CP de 1940; finalmente, a própria CLT, de 1943, em seu art. 722." Com o processo de redemocratização do país, em 1945/1946, em conseqüência dos impactos da Segunda Guerra Mundial no mundo e no Brasil, o novo Presidente da República editou o DL 31. A ordem jurídica anterior a 1890 não tratava do instituto da .ç;reve. No campo constitucional, esse silêncio apresentou- se tanto na Carta do Império (1824) como na primeira republicana (1891). 32. A respeito, NASCIMENTO, A. M., Direito do trabalho na constituição de /988, cit., p. 301-302. 33. A respeito, PINTO, j. A. R, oh. cit., p. 306. 34. Sobre tais diplomas, consultar NASCIMENTO, A. M., Compênt/W de direito sindical, cit., p. 425-426. 154 Sfntese Trabalhista- N11 155- Mai/2002- ASSUNTO ESPECIAL 9.070, de 15.03.1946. Esta seria, portanto, a "primeira lei ordinária que disciplinou a matéria, definiu a greve, permitindo-a nas atividades acessórias".35 O mencionado texto legal era, entretanto, bastante restritivo do instituto paredista, embora já o reconhecesse, em certas circunstâncias, como direito dos trabalhadores. --~---- A nova Constituição Republicana, logo a seguir, viria, por fim, confirmar a greve como direito trabalhista (art. 158, CF/1946). Porém, curiosamente, conviveu este texto magno, mais amplo, com o acanhado e restritivo texto do DL 9.070/46, por cerca de 20 anos. Em meados da década de 60, o DL 9.070 seria revogado pelo novo regime autoritário que recém se implantara no país. ALei de Greve do regime militar (4.330/64) restringia, severamente, o instituto: não só proibia movimentos que não tivessem fins estritamente trabalhistas, como vedava a estratégia ocupacional do estabelecimc::nw nas greves. A par disso, instituía riw cujo cumprimento era considerado inviável pelos sindicalistas. Transformado o direito em mero simulacro, o diploma foi apelidado de Lei Antigreve. Logo a seguir, pela CF/67, acentuou-se a restrição aos movimentos paredistas, proibindo-os nos serviços públicos e nas denominadas atividades essenciais (art. 162). Nesse meio tempo, agravou-se o caráter autoritário do regime político, com.~ AJ,..S, de dezembro de 1968, inviabilizando qualquer tentativa de paralisaçãO> tia~~lhista na sociedade brasileira. Anos depois, com o renascimento do movimento grevista, em torno de 1977/1978, ainda nos quadros do autoritarismo militar, novas proibições foram sendo incluídas na ordem jurídica. Citem-se, ilustrativamente: L. 6.128/ 78 (proibição de greve estendida a empregados de sociedades de economia mista); L. 6.158/78 (estendia a proibição grevista ao pessoal celetista de autarquias e órgãos da Administração Direta); L. 6.620/78 (LSN, com várias apenações relativas à prática grevista); DL 1.632/78 (enumerava as atividades essenciais, em que eram vedadas greves).36 ACF/88, ao final dessa breve retrospectiva histórica, surge, claramente, como o momento mais elevado de reconhecimento do direito paredista na ordem jurídica do país. Mesmo consideradas as fases de não-regulação ou proibição desse tipo de movimento social, de pré-1930, e de regulação restritiva vivenciada entre 1946-1964, e sempre tomando-se em consideração as longas fases obscurantistas sofridas no Brasil ao longo do século passado, a CF/88 demarca-se como o momento mais notável de afirmação do direito de greve na História brasileira. 35. NASCIMENTO, A. M., Compêndio de dirdm JiwdiaJ, cit., p. 427. 36. A respeito, consultar NASCIMENTO, A. M., ob. cit., p. 430. Professor de Direito do ThWalho (Graduação, EspecialiZAfõo, Mestrado e DouiM'aM) da Faculdade de Direito da PUC-MINAS, desde fewrti~ de 2000, Professor (Gr~,P6. graduafão) na Área de Ciência Poiltica da UFMG (1978- 1992) e na Área de Direito 00 Traballw da Faculdade de DireikJ da UFMG (1993-2000), Doutor em Filosofo 00 Direito (UFMG), Mestre em Ciincia Política (UFMG) e JuiZ 00 Trobalho em Belo HonZonte. LEGISLAÇÃO LEI N° 10.431, DE 24 DE ABRIL DE 2002 Dispõe solrre a tributação dos plarws de berwftcios de caráter vrevide=iário, Faço saber que o Presidente da República adotou a Medida Provisória n° 25 de 2002, que o Congresso Nacional aprovou, e eu, Ramez Thbet, Presidente da Mes; do Congresso Nacional, para os efeitos do disposto no art. 62 da Constituição Federal, com a redação dada pela Emenda Constitucional n° 32, de 2001, promulgo a seguinte Lei: Art. lo A opção, pelo regime especial de tributação instituído pela Medida Provisória D 0 2.222, de 4 de setembro de 2001, por entidade aberta ou fechada de previdência complementar, sociedade seguradora ou administrador do Fundo de Aposentadoria Programada Individual- FAPI, instituídos a partir de 1° de janeiro de 2002, quando efetivada no próprio ano-calendário de sua instituição, produzirá efeitos a partir do trimestre- calendário da opção até31 de dezembro do referido ano-calendário. Parágrafo único. O disposto neste artigo aplica-se, inclusive, às hipóteses de instituições resultantes de cisão, total ou parcial, incorporação e fusão. Art. 2° O regime especial de tributação de que trata o art. 2° da Medida Provisória n" 2.222, de 4 de setembro de 2001: I ·relativamente aos planos assistenciais, alcança, exclusivamente, os vinculados às entidades fechadas de previdência complementar submetidos às normas estabelecidas no art. 76 da Lei Complementar n° 109, de 29 de maio de 2001; 11 ·terá o imposto ali referido imputado às pr~visões, reservas técnicas e fundos dos respectivos planos. Parágrafo único. Os prazos de opção a que se referem o caput e o § 1 o do art. ,3° da Medida Provisória no 2.222, de 4 de setembro de 2001, ficam prorrogados, relativamente ao último quadrimestre de 2001 e ao ano-calendário de 2002, para o último dia útil do mês de janeiro de 2002, produzindo efeitos, na hipótese do: I · caput, para todo o ano-calendário de 2002; 11 - § 1 ", para o período de 1° de setembro de 2001 a 31 de dezembro de 2002 observado o disposto no § 2° daquele artigo. ' Art. 3° O resultado negativo apurado em um trimestre-calendário, na forma do art. zo da Medida Provisória n° 2.222, de 4 de setembro de 2001, poderá ser compensado nos trimestres-calendário seguintes, enquanto o optante estiver submetido ao regime especial de tributação. Art. 4° Para efeito do disposto no§ 3° do art. 2° da Medida ProVisória n° 2.222, de 4 de setembro de 2001, quando houver transferência de participante de plano de benefícios de caráter previdenciário para outro plano da mesma espécie, operado pela mesma ou outra entidade, manter-se-á, para o participante transferido, como data de ingresso, aquela de sua admissão no plano original. Parágrafo único. Para efeito do disposto neste artigo: I · não poderá haver qualquer disponibilidade de recursos para a pessoa jurídica patrocinadora ou instituidora, bem como para o participante, nem mudança na titularidade do plano; 11 ·a transferência terá obrigatoriamente de ser efetuada entre planos operados por entidade aberta de previdência complementar 04 por sociedade seguradora. Art. so O disposto no art. 4° da Medida Provisória n° 16, de 27 de dezembro de 2001, aplica-se às entidades abertas de previdência complementar, na hipótese de migração ou transferência de planos oriundos de entidades fechadas de previdência complementar.