Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
5 A ECONOMIA BRASILEIRA NA DÉCADA DE 80 (a 2ª metade dos anos 1980) 5.4 Os Planos de Estabilização: Cruzado, Bresser e Verão FIGURA 16 - Tancredo Neves e José Sarney FONTE: GALERIA, (2004) 5.4.1 Plano Cruzado - 1986: governo civil: José Sarney - Plano de Estabilização Econômica ou Plano Cruzado Objetivos: - reduzir a inflação; - desestimular a especulação financeira; - desinchar o sistema bancário; - incentivar os investimentos produtivos. Medidas: - congelamento dos preços, contratos, hipotecas, tarifas públicas e aluguéis por 1 ano; - reforma monetária: Cz$ 1,00 = Cr$ 1.000,00; - desindexação da economia: sai a ORTN e entra a OTN e é extinta a correção monetária, exceto para a caderneta de poupança; - congelamento dos salários pela média dos últimos 6 meses mais abono de 15%; - congelamento do salário mínimo em Cz$ 804,00; - reajustes eram feitos com base no „gatilho salarial‟ sempre que a inflação alcançasse 20%; Choque Heterodoxo: - é uma política de congelamento de preços em todos os níveis num determinado período de tempo, de forma a liberar a política monetária e fiscal; - é a decisão de política econômica que elimina a correção monetária, cria uma nova moeda (reforma monetária) e congela os preços da economia. Notas de aula de Economia Brasileira Contemporânea – Prof. Dr. RDC 2 Choque Ortodoxo: é a recessão, ou seja, parte-se de uma outra interpretação da inflação, associada ao excesso de demanda. Inflação inercial: na medida em que é divulgada a taxa de inflação os agentes econômicos automaticamente geram expectativas da inflação futura e reajustam seus preços o que acaba aumentando e perpetuando a inflação. Consequências: - o congelamento forçou a queda nos preços nos 6 primeiros meses; - o salário teve aumento real o que acentuou o consumo interno; - o excesso de consumo levou a inflação de demanda; - para conter o aumento de preços o governo tabelou e fiscalizou; - para conter a inflação o governo teve que conter o consumo criando o FND (Fundo Nacional de Desenvolvimento) ou empréstimo compulsório. Pressão sobre os preços: ágio e maquiagem dos produtos. Índices inflacionários: ficaram comprometidos uma vez que não era considerado o ágio. Mercado externo: devido ao forte poder de compra dos brasileiros e a taxa fixa de câmbio, as exportações forem reduzidas e as importações aumentadas, ocasionando queda na receita comercial e desajuste do balanço de pagamento. Déficit público: o déficit público comprometeu o Plano Cruzado pois o dispêndio fora bem maior do que a receita e para cobrir o „rombo‟, emissões de moeda e títulos públicos foram autorizadas (o que gera inflação e aumenta a taxa de juros). Dívida externa: suspensão em 1987 do pagamento dos juros e do principal para forçar uma renegociação e ganhar tempo para recompor as reservas internacionais. Plano Cruzado II: após 8 meses o Plano teve que ser reformulado e a OTN foi extinta. Sabotagem: o Plano foi almejado por setores e agentes econômicos (especuladores, oligarquia bancária nacional, grupos econômicos oligopolizados, o latifúndio e o conservadorismo rural). Conclusão: O 1º choque falhou. Notas de aula de Economia Brasileira Contemporânea – Prof. Dr. RDC 3 FIGURA 17 – Manchete no jornal de grande circulação nacional FONTE: Teixeira e Totini, (1993) Notas de aula de Economia Brasileira Contemporânea – Prof. Dr. RDC 4 FIGURA 18 - Fiscais do Sarney FONTE: Rego e Marques et all, (2006) 5.4.2 Plano Bresser - 1º semestre de 1987: Plano de Controle Macroeconômico ou Plano Bresser - Plano heterodoxo mais com incorporação de elementos ortodoxos. Medidas: - congelamento geral dos preços e salários por 90 dias; - criada a URP (Unidade Referencial de preços) para reajuste de preços; - adoção de uma política monetária e fiscal rigorosa para reduzir o déficit público e a demanda; - desvalorização da moeda em 10,5%; - redução dos salários através do atraso do disparo do „gatilho salarial‟; - manutenção de níveis elevados das taxas de juros. Consequências: - O Plano Bresser teve uma transição passageira e por isso não obteve o sucesso desejado Conclusão: O 2º choque falhou. 5.4.3 Plano Verão - 15 de janeiro de 1989: Plano Verão Medidas: - congelamento dos preços, agora com prazo indeterminado; - extinção da URP; - reforma monetária: NCz$ 1,00 = Cz$ 1.000,00; Notas de aula de Economia Brasileira Contemporânea – Prof. Dr. RDC 5 - desvalorização inicial do câmbio em 16,38%; - manutenção da política de juros altos para incentivar as aplicações financeiras e desestimular a formação de estoques para conter o consumo; - em setembro de 1989, houve suspensão do pagamento dos juros e da dívida externa, em razão da deterioração do saldo comercial; - redução do déficit público - redução do quadro de funcionários contratados sem concurso; - execução judicial dos devedores da União; - venda dos bens das empresas estatais deficitárias; - extinção dos cinco ministérios. Outras: - realinhamento das tarifas públicas; - reajuste dos salários pela extinta URP e pelo INPC (Índice Nacional de Preços ao Consumidor); - criação da BTN (Bônus do Tesouro Nacional); - volta a indexação através da BTNf (fiscal). Conclusão: O 3º choque falhou. TABELA 9 – Inflação brasileira – 1979/90 Ano Inflação 1979 77,20 1980 110,20 1981 95,20 1982 99,70 1983 211,80 1984 238,80 1985 235,10 1986 65,00 1987 415,80 1988 1037,60 1989 1782,90 1990 1476,60 FONTE: COSTA, (2005). Notas de aula de Economia Brasileira Contemporânea – Prof. Dr. RDC 6 GRÁFICO 5 – Inflação brasileira – 1979/90 5.5 Leituras básicas ABREU, Marcelo de Paiva (org) et al. A Ordem do Progresso: dois séculos de política econômica no Brasil. 2ª ed. atual./rev./3ª tir. Rio de Janeiro: Elsevier/Campus, 2014. GIAMBIAGI, F. et al. Economia Brasileira Contemporânea [1945-2010]. 3ª ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2016. GREMAUD, Amaury P.; VASCONCELLOS, Marco A. S. de.; TONETO JUNIOR, Rudinei. Economia Brasileira Contemporânea. 7ª ed. São Paulo: Atlas, 2011. 5.6 Leituras para aprofundamento BRESSER PEREIRA, Luiz. C. Desenvolvimento e Crise No Brasil. São Paulo: Editora 34, 2003. BRUM, Argemiro J. O Desenvolvimento Econômico Brasileiro. 2ª ed. Petrópolis: Vozes, 1982. CASTRO, Antonio. Barros de; SOUZA, Francisco Eduardo Pires de. A Economia Brasileira em Marcha Forçada. 2ª ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1985. COSTA, Ricardo D. Economia Brasileira: de 1930 aos dias de hoje. Cornélio Procópio:[s.n.], 2007. FURTADO, Milton B. Síntese da Economia Brasileira. 7º ed. Rio de Janeiro: LTC, 2000. 0,00 200,00 400,00 600,00 800,00 1000,00 1200,00 1400,00 1600,00 1800,00 2000,00 1979 1980 1981 1982 1983 1984 1985 1986 1987 1988 1989 1990 (% ) a .a. Notas de aula de Economia Brasileira Contemporânea – Prof. Dr. RDC 7 REGO, José. M.; MARQUES, Rosa. M. (orgs.) et al. Economia Brasileira. 4ª ed. São Paulo: Saraiva, 2010. LANZANA, Antonio E. T. Economia Brasileira: fundamentos e atualidade. 4ª ed. São Paulo: Atlas, 2012. SOUZA, Nilson A. de. Economia BrasileiraContemporânea: de Getúlio a Lula. 2ª ed. São Paulo: Atlas, 2008. TEIXEIRA, Francisco M. P.; TOTINI, Maria E. História Econômica e Administrativa do Brasil. 3ª ed. São Paulo: Ática, 1993. 5.7 TEXTO & ANÁLISE 1 Novo padrão de negociação da dívida 1 A decisão do governo de suspender temporariamente o pagamento de juros dos empréstimos de médio e longo prazos, contratados junto aos bancos comerciais estrangeiros, significa muito mais que um mero expediente para ganhar tempo, em face dos resultados sofríveis da balança comercial e da queda abrupta das reservas internacionais. Tudo indica que as autoridades optaram por uma mudança sensível no padrão de relacionamento que o Brasil vinha mantendo com a comunidade financeira internacional desde 1982-1983. Os sinais dessa nova postura governamental são evidentes. Basta contrastar o atual processo de renegociação dos débitos externos com o que ocorreu durante a crise cambial de 1982-1983. As diferenças nos dois casos são marcantes. Para começar, deve-se reconhecer que, apesar de não contarmos hoje com um nível confortável de reservas cambiais, não iniciamos o processo de negociação em situação desesperadora, como aquela verificada em fins de 1982 quando as reservas líquidas eram até negativas. A atual posição financeira do Brasil permitiu, inclusive, que o governo decidisse a suspensão dos pagamentos por prazo indeterminado, outra diferença em relação a 1982. Além disso, as autoridades vêm buscando ampliar os horizontes da negociação da dívida externa mediante a introdução de considerações políticas ao lado dos aspectos técnicos levantados usualmente nesses casos. A estratégia de procurar reforçar os contatos com os representantes dos governos credores e de instituições financeiras multilaterais, bem como a ênfase na manutenção do crescimento econômico como condicionante básica do processo de negociação são indicativos dessa nova orientação. Ainda nessa linha, um aspecto sumamente positivo é o fato de que a responsabilidade recíproca pela crise da dívida externa foi pela primeira vez invocada como argumento. De fato, houve imprevidência de parte a parte, isto é, tanto dos países devedores quanto dos bancos e países credores. A responsabilidade do devedor se origina na demora para adotar programas de ajustamento interno e externo em suas economias, levando-os ao superendividamento externo. Aos bancos, cabe a responsabilidade pela aplicação às vezes pouco criteriosa do excesso de liquidez internacional resultante das crises do petróleo. Já os governos credores são, eles mesmos, os responsáveis pela explosão das taxas de juros em fins da década de 70. A 1 TEIXEIRA e TOTINI, (1993, p. 244-245). Notas de aula de Economia Brasileira Contemporânea – Prof. Dr. RDC 8 conjugação desses elementos negativos escreveu a triste crônica do atual descompasso financeiro que envolve os países em desenvolvimento, notadamente os da América Latina, as nações ricas e os bancos comerciais. O excesso de pagamentos de juros acima do que seria razoável pode ser observado na tabela 1 que compra a prime-rate efetivamente verificada com aquela que seria provável tendo em vista a sua evolução entre 1947 e 1971. Conforme se depreende dos dados, entre o valor real e o esperado, houve enormes divergências, mormente entre 1980 e 1982. Em 1981, por exemplo, a taxa real ultrapassou o dobro da esperada. Nessa mesma linha de raciocínio, pode-se calcular um pagamento adicional de juros externos a partir de 1978 de US$ 17,45 bilhões, ou seja, 27% da dívida média de US$ 64,91 bilhões (tabela 2), sem contar o efeito devastador desses juros quando capitalizados sobre o principal. Essa vem sendo a contribuição do Brasil à saúde do sistema financeiro internacional em prejuízo de nossas próprias perspectivas econômicas. Nada mais justo, justo portanto, que exijamos agora dos governos e bancos credores a sua quota de contribuição. Os que se recusam a aceitar essas responsabilidades recíprocas, martelando a tecla única do contrato assinado mas não honrado pelos devedores, deveriam entender que a concentração dos ônus do ajustamento sobre os devedores implicará, em contrapartida, um prêmio injusto concedido aos bancos e governos dos países credores e, portanto, a manutenção de práticas bancárias e de políticas econômicas inadequadas, que levaram à situação constrangedora atual. Neste sentido, as autoridades brasileiras estão corretas: entre países soberanos, a negociação da dívida é, e sempre será, uma troca de interesses políticos. (Uma nova fórmula de crescer. Carta do IBRE citada na revista Conjuntura Econômica, 15/3/87, p. 9-10). 5.8 TEXTO & ANÁLISE 2 Subdesenvolvimento industrializado maduro 2 A presente crise da economia brasileira faz parte de uma crise econômica mundial, que teve início em torno de 1970. Tudo indica que começa então a fase de desaceleração de um ciclo longo, cuja duração e de aproximadamente 50 anos (25 de expansão e 25 de desaceleração). Depois da grande expansão do após-guerra, provavelmente a economia brasileira e mundial permanecerão em desaceleração relativa até a década de 90. Esta desaceleração relativa não implica em taxas negativas de crescimento. Através dos ciclos normais (de aproximadamente dez anos), a economia deverá continuar a se expandir, mas a taxas menores, ao mesmo tempo em que se prepara um novo ciclo longo de expansão. Uma crise dessa natureza, porém, é também uma crise de transição não apenas econômica mas também política. No plano econômico tudo indica que sairemos da crise quando, através de uma política tecnológica e industrial de exportações, o Brasil for capaz de realizar saldos crescentes em sua balança comercial através de exportação de manufaturados tecnologicamente sofisticados. Dado, de um lado, o grande endividamento externo do país, e de outro, o alto nível de integração e sofisticação que sua indústria já alcançou (por exemplo: 30% de suas exportações de manufaturados já são máquinas e equipamentos), provavelmente esta e a condição essencial para a continuidade do desenvolvimento brasileiro. E claro que uma política agrícola 2 TEIXEIRA e TOTINI, (1993, p. 258-259). Notas de aula de Economia Brasileira Contemporânea – Prof. Dr. RDC 9 e uma política energética são também importantes ao nível da produção. Ao nível da repartição é essencial uma política de rendas, que conduza a uma progressiva desconcentração da renda ao mesmo tempo em que se mantém em níveis aceitáveis a taxa de lucro das empresas. Isto e possível através da política salarial, do aumento das despesas de consumo social, e de uma reforma tributária que penalize as pessoas físicas, especialmente os rentistas, e dificulte a sonegação fiscal. Mas o desafio fundamental que a economia brasileira hoje enfrenta consiste em competir em pé de igualdade com os países centrais na exportação de manufaturados tecnologicamente sofisticados. A economia brasileira vem tendo êxito em sua política de exportação de manufaturados, inclusive produtos tecnologicamente sofisticados. É razoável, portanto, prever que continue a aumentar suas exportações nesta área, sem, nesse processo, se tornar vitima de uma nova divisão internacional do trabalho, segundo a qual exportaríamos manufaturados tecnologicamente simples, que não valorizariam nossa mão-de-obra. Chamo Modelo de Subdesenvolvimento Industrializado Maduro esse novo estágio para o qual caminha a economia brasileira. Continuaremos ainda subdesenvolvidos, na medida em que o setorcapitalista altamente produtivo não consegue absorver toda a mão-de-obra disponível, de forma que o sistema social permanece desintegrado. Mas os índices de desintegração estrutural diminuirão, e nos tornaremos grandes exportadores de manufaturados, em competição direta com as economias plenamente desenvolvidas. Através desse processo crescerá o mercado interno. A idéia de que há uma contradição entre política de exportações e crescimento de mercado interno é um resquício de nossa experiência primário-exportadora, que não faz o menor sentido na economia brasileira atual. O mercado interno aumenta na medida em que cresce o PIB - e o crescimento deste depende hoje de exportações crescentes. Quanto à melhor distribuição da renda e a integração do proletariado urbano e rural na economia moderna, é claro que não há qualquer automatismo a ser esperado. Estes fenômenos só ocorrerão na medida em que a luta de classes for permanente, na medida em que os movimentos populares, os sindicatos e os partidos de esquerda continuarem a se desenvolver e a reivindicar. (L. C. Bresser Pereira, Desenvolvimento e crise no Brasil, 1930-1983, p. 284- 285). 5.9 Exercícios 1) Descreva os três setores que foram importantes no início da década de 80. 2) Descreva a prática do protecionismo praticado pelo Brasil no início dos anos 80. 3) Quais os efeitos da recessão sobre o conjunto da economia no início dos anos 80? 4) No início dos anos 80 o Brasil iniciou um programa de combustível alternativo. Qual foi? Comente. 5) Descreva três diretrizes do programa de reajuste do FMI a partir de 1982. 6) O que foram as cartas de intenção assinadas com o FMI? 7) Como foi à moratória no governo Sarney? Notas de aula de Economia Brasileira Contemporânea – Prof. Dr. RDC 10 8) Com a queda das reservas internacionais (de US$ 7,507 bilhões em 1981 para US$ 1,0 bilhão no último quadrimestre de 1982), a vulnerabilidade brasileira aumentou em seu saldo corrente de caixa. Diante deste perfil, o que aconteceu com o pagamento do serviço da dívida externa? 9) Com relação ao período de 1981 a 1982 a Guerra das Malvinas afetou o superávit brasileiro. Descreva o setor que foi comprometido. 10) Por que muitos estudiosos consideram os anos oitenta como a “década perdida”? 11) O significa choque ortodoxo? 12) O significa choque heterodoxo? 13) Quais países, além do Brasil já passaram por um choque heterodoxo? 14) O significa inflação inercial? 15) Quais os objetivos adotados no Plano Cruzado? 16) Quais as medidas adotadas no Plano Cruzado? 17) Como foi a reforma monetária no Plano Cruzado? 18) Cite as medidas do Plano Bresser. 19) Cite as medidas do Plano Verão. 20) Como foi a reforma monetária no Plano Verão? 21) A que se atribui o fracasso do Plano Cruzado, do Plano Bresser e do Plano Verão?
Compartilhar