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resumo empresarial

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Teoria Ultra Vires
Vamos avaliar a validade dos atos praticados pela pessoa jurídica com excesso de poderes. De uma maneira geral, são os administradores que na maioria dos casos praticam os atos pela sociedade. Todavia, nem sempre esses administradores agem dentro de seus poderes, surgindo à discussão se, nesse caso, o ato poderá ser imputado à sociedade ou apenas aos administradores.
Com o Código Civil de 2002, foi acolhida a teoria “ultra vires”, que afirma que a sociedade não se vincula se os atos foram evidentemente estranhos ao objeto social. Dessa forma, de acordo com a interpretação literal do artigo 1.015, III do Código Civil, qualquer ato praticado em nome da pessoa jurídica, por seus sócios ou administradores, que ultrapassasse seus poderes, é nulo. Ao terceiro, caberia apenas mover ação contra aquele que extrapolou os limites sociais.
Nesses casos, há um conflito entre o interesse da sociedade e dos terceiros. Há uma corrente que defende que a sociedade deveria estar vinculada perante terceiros de boa-fé, pelos atos praticados pelo administrador, proibidos pelo contrato social, ou mesmo estranhos a este. A sociedade responderia perante terceiros e, posteriormente, faria um acerto de contas com o administrador que extrapolou seus poderes. Apenas a má fé do terceiro deveria excluir a responsabilidade da sociedade.
Em contraposição à teoria ultra vires, temos a teoria da aparência, mais modernamente, com caráter mais protetivo ao terceiro de boa-fé que contrata com a sociedade.
Nessa linha, o terceiro de boa-fé que justificadamente desconhecia as limitações do objeto da sociedade e com esta contrata, tem o direito de exigir o cumprimento do negócio jurídico, ensejando à sociedade ação regressiva contra quem praticou o ato.
Diante do exposto, para a teoria ultra vires, o ato praticado fora dos poderes delimitados é nulo e, ao contrário, na teoria da aparência, o ato é válido e obriga a pessoa jurídica.
Da interpretação sistemática dos artigos 47 e 1.015 do Código Civil concluímos que há liberdade para a prática de todos os atos pertinentes à gestão da sociedade. O terceiro, todavia, deve ter o cuidado de buscar no órgão específico os atos constitutivos da sociedade para se certificar da existência de alguma limitação (inciso I do art. 1.015).
Por outro lado, o inciso II do art. 1.015 do mesmo Código dá ensejo à aplicação da teoria da aparência invertendo-se à empresa o ônus da prova da ciência da limitação pelo terceiro. Além disso, o inciso III do mesmo artigo impõe ao terceiro o ônus da prova da regularidade do negócio.
Em resumo, concluímos que a teoria ultra vires veio consagrada pelo Código Civil, mas não é aplicada de forma absoluta, de acordo com o nosso STJ e o Conselho da Justiça Federal, que inclusive já criou enunciado nesse sentido como veremos em seguida.
O Enunciado 219, criado na III Jornada de Direito Civil, promovida pelo Conselho da Justiça Federal determina que: “Está positivada a Teoria Ultra Vires no Direito brasileiro, com as seguintes ressalvas: (a) o ato ultra vires não produz efeitos apenas em relação à sociedade; (b) sem embargo, a sociedade poderá, por meio de seu órgão deliberativo, ratificá-lo; (c) o Código Civil amenizou o rigor da Teoria Ultra Vires, admitindo os poderes implícitos dos administradores para realizar negócios acessórios ou conexos ao objeto social, os quais não constituem operações evidentemente estranhas aos negócios da sociedade (...)”.
Assim, o STJ e demais Tribunais brasileiros tem buscado um equilíbrio entre a teoria ultra vires e a da aparência, levando em consideração a dinâmica das relações, a segurança dos atos jurídicos e a proteção equilibrada ao terceiro de boa-fé.
TEORIA DA DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA
    
As sociedades empresariais podem ser utilizadas como instrumento para a realização de fraude contra credores ou mesmo abuso de direito, tendo em vista o princípio de autonomia patrimonial. Sendo a sociedade, e não os sócios, titulares de direitos e deveres das obrigações, muitas vezes os interesses dos credores são frustrados por manipulações na constituição de pessoas jurídicas, celebração de contratos empresariais ou operações societárias. Nesses casos a consideração de autonomia da pessoa jurídica importa a impossibilidade de correção de fraude ou de abuso, permanecendo oculto o ilícito perpetrado pelo sócio, resguardado pela licitude da conduta da sociedade empresária. Somente se revela a irregularidade se o juiz, nessas situações não respeitar esse princípio, desconsiderá-lo, justificando assim, a desconsideração da personalidade jurídica da sociedade empresária.
O objetivo da teoria da desconsideração da pessoa jurídica é exatamente possibilitar a proibição de fraude, sem comprometer o próprio instituto da pessoa jurídica, isto é, sem questionar a regra da separação de sua personalidade e patrimônio em relação aos de seus membros. Em outros termos, a teoria tem o instituto de preservar a pessoa jurídica e sua autonomia, enquanto instrumentos jurídicos indispensáveis à organização da atividade econômica sem deixar ao desabrigo terceiros vítimas de fraude.
No Direito brasileiro existem duas teorias da desconsideração: 1º) A maior, pela qual o juiz é autorizado a ignorar a autonomia patrimonial das pessoas jurídicas, como forma de coibir fraudes e abusos praticados através dela, sendo esta teoria mais bem elaborada. 2º) Teoria menor, em que o simples prejuízo do credor já possibilita afastar a autonomia patrimonial.
A distância entre as duas teorias é tamanha que no presente curso, quando se menciona a teoria da desconsideração da personalidade jurídica, sem qualquer especificação, está se referindo à sua versão maior.
A Teoria é uma elaboração doutrinária recente. Ralf Serick é o seu principal sistematizador, na tese de doutorado defendida perante a Universidade de Tubigem, em 1953. Na doutrina brasileira, ingressa no final dos anos 60, numa conferência de Rubens Requião, sendo seu argumento básico o de que as fraudes e os abusos perpetrados através da pessoa jurídica não poderiam ser corrigidos caso não adotada a disregara doctrine pelo direito brasileiro.
De qualquer forma, é pacífico na doutrina e na jurisprudência que a desconsideração não depende de qualquer alteração legislativa para ser aplicada, na medida em que se trata de instrumentos de repressão a atos fraudulentos.
A teoria da desconsideração visa preservar a sociedade empresária, em seus contornos fundamentais, diante da possibilidade de o desvirtuamento vir a comprometê-los, contribuindo para o aprimoramento da disciplina jurídica.
A preocupação dos estudiosos do assunto diz respeito à reafirmação do princípio da autonomia. Os pressupostos da desconsideração são a pertinência, a validade e a importância das regras que limitam ao montante investido, a responsabilidade dos sócios por eventuais perdas nos insucessos da empresa, regras que, derivadas do princípio da autonomia patrimonial, servem de estimuladoras da exploração de atividades econômicas, com o cálculo de risco.
O princípio da autonomia patrimonial das pessoas jurídicas, observado em relação as sociedades empresarias, não pode ser descartado na disciplina da atividade econômica. Em conseqüência, a desconsideração deve ter necessariamente natureza excepcional e não pode servir ao questionamento da subjetividade própria da sociedade.
Pela teoria da desconsideração, o juiz pode deixar de aplicar as regras de separação patrimonial entre a sociedade e sócios, ignorando a existência da pessoa jurídica num caso concreto, porque é necessário coibir a fraude perpetrada graças à manipulação de tais regras. Não seria possível a coibição se respeitada a autonomia da sociedade. Note-se, a decisão judicial que desconsidera a personalidade jurídica da sociedade não desfaz o seu ato constitutivo, não o invalida, nem importa a sua dissolução. Trata apenas e rigorosamente, de suspensão episódica da eficácia desse ato. Quer dizer, a constituição da pessoa
jurídica não produz efeitos apenas no caso em julgamento, permanecendo válida e inteiramente eficaz para todos os outros fins.
Em suma, a aplicação da teoria da desconsideração não importa a dissolução ou anulação da sociedade. Apenas no caso específico em que a autonomia patrimonial foi fraudulentamente utilizada, ela não é levada em conta, é desconsiderada, o que significa a suspensão episódica da eficácia do ato de constituição da sociedade, e não o desfazimento e invalidação desse ato. Preserva-se, em decorrência, a autonomia patrimonial da sociedade empresária para todos os demais efeitos de direito.
Admite-se a desconsideração da personalidade jurídica da sociedade empresária para coibir atos aparentemente lícitos. A ilicitude somente se configura quando o ato deixa de ser imputado à pessoa física responsável pela manipulação fraudulenta ou abusiva do princípio da autonomia patrimonial.
A teoria da desconsideração dá ensejo à duas formulações, subjetiva e objetiva. Na primeira seus elementos principais são a fraude e o abuso de direito, já na segunda é a confusão patrimonial.
A formulação subjetiva deve ser adotada como critério para circunscrever a moldura de situações em que cabe aplicá-las, ou seja, ela é a mais ajustada a teoria da desconsideração e a formulação objetiva deve auxiliar na facilitação da prova pelo demandante
Quanto a teoria da desconsideração, visa coibir fraudes perpetradas através do uso da autonomia patrimonial da pessoa jurídica, sendo utilizada como instrumento para responsabilizar sócio por dívida formalmente imputada à sociedade. Também é possível o inverso: desconsiderar a autonomia patrimonial da pessoa jurídica para responsabilizá-la por obrigação do sócio. A fraude que a desconsideração invertida coíbe é o desvio de bens.
A teoria menor da desconsideração reflete a crise do princípio da autonomia patrimonial, quando referente a sociedades empresárias, o seu pressuposto é simplesmente o desatendimento do crédito titularizado perante a sociedade, em razão da insolvabilidade ou falência desta. De acordo com esta teoria, a sociedade não possui patrimônio, mas o sócio é solvente, isso basta para responsabilizá-lo por obrigações daquela.
Uma das alternativas mais empregadas pelos devedores para ocultar bens de credores, dificultando a execução de suas obrigações, consiste na utilização de uma offshore company, que são sociedades empresarias constituídas e estabelecidas em países estrangeiros. Não são necessariamente fraudulentas, mas podem servir, como todas as demais sociedades, de instrumentos para fraudes ou abusos. Nesse caso, a exemplo das demais, podem ser a sua autonomia patrimonial desconsiderada.
No direito brasileiro, o primeiro dispositivo legal a se referir à desconsideração da personalidade jurídica é o Código de Defesa do Consumidor, no art.28.
São fundamentos legais para a desconsideração em favor do consumidor: a) abuso do direito; b) Excesso de poder, infração da lei, fato ou ato ilícito, violação dos estatutos ou contrato social; c) Falência, estado de insolvência, encerramento ou inatividade provocados por má administração.
O segundo dispositivo do direito brasileiro a fazer menção a desconsideração é o art. 18 da Lei nº. 8.884/94 (Lei Antitruste). Em duas oportunidades poderá verificar-se a desconsideração da personalidade jurídica na tutela das estruturas de livre mercado: na configuração de infração de ordem econômica e na aplicação da sanção.
A terceira referência encontra-se no art.4º da Lei nº. 9.605/98 que dispõe sobre a responsabilidade por lesões ao meio ambiente.
O Código Civil não contempla nenhum dispositivo com específica referência à desconsideração da personalidade jurídica e contempla, porém, uma norma destinada a atender às mesmas preocupações que nortearam a elaboração da disregard doctrine, é o art.50.
A aplicação da teoria da desconsideração da personalidade jurídica independe da previsão legal. Em qualquer hipótese, mesmo naqueles não abrangidos pelos dispositivos das leis que se reportam ao tema, está o juiz autorizado a ignorar a autonomia patrimonial da pessoa jurídica sempre que ela for fraudulentamente manipulada para frustrar interesse legítimo de credor.
A desconsideração não pode ser decidida pelo juiz por simples despacho em processo de execução; é indispensável a dilação probatória através do meio processual adequado.
As teorias menor e maior da desconsideração da personalidade jurídica
O Código Civil, Lei 10.406/2002, combinando os artigos 52 e 985, define que é aplicada às pessoas jurídicas a proteção de sua personalidade, que é adquirida no evento da inscrição dos seus atos constitutivos no registro pertinente. Contudo, o Código Civil também reconhece a possibilidade de desconsideração da personalidade jurídica em seu artigo 50, determinando que, em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade ou pela confusão patrimonial, poderá ser desconsiderada a personalidade jurídica.
Diante do reconhecimento de uma personalidade às sociedades e, também, na hipótese da mesma ser desconsiderada, a doutrina brasileira delimitou duas "subteorias" acerca da Teoria da Desconsideração da Personalidade Jurídica, chamadas teorias maior e menor da desconsideração da personalidade jurídica, que se diferenciam pela forma e momento da sua aplicação.
Na Teoria Maior, há a autorização da autonomia patrimonial das pessoas jurídicas ser ignorada, como forma de coibir fraudes e abusos praticados através delas. Ocorre que, nesta modalidade, deverão ser atendidos alguns requisitos estabelecidos legalmente e, por isso, considera-se como uma teoria de maior consistência, que oferece maior segurança aos sócios.
A teoria maior da desconsideração foi a opção adotada pelo Código Civil de 2002, através do já citado artigo 50, pois carece de abuso da personalidade jurídica, desvio de finalidade ou ainda a confusão patrimonial.
Entretanto, referente à Teoria Menor, existem legislações com situações específicas, em que não há necessidade de atender nenhum dos requisitos descritos na Teoria Maior e, por isso, chama-se de teoria menor da desconsideração. A falta de bens ou direitos na sociedade que sirvam aos credores é o suficiente para atribuir ao sócio a obrigação da sociedade.
A Doutrina considera-a como menos elaborada, pois a desconsideração poderá ocorrer em quaisquer hipóteses em que for necessária a execução do patrimônio do sócio, uma vez a sociedade não tendo como arcar com o débito executado. Fábio Ulhoa Coelho, ícone no Direito comercial brasileiro e referência para a Doutrina nacional, cita:
“Ela reflete, na verdade, a crise do princípio da autonomia patrimonial, quando referente às sociedades empresárias. O seu pressuposto é simplesmente o desatendimento de crédito titularizado perante a sociedade, em razão da insolvabilidade ou falência desta. De acordo com a teoria menor da desconsideração, se a sociedade não possui patrimônio, mas o sócio é solvente, isso basta para responsabilizá-lo por obrigações daquela. A formulação menor não se preocupa em distinguir a utilização fraudulenta da regular do instituto, nem indaga se houve ou não abuso na forma. Por outro lado, é-lhe todo irrelevante a natureza negocial do direito creditício oponível a sociedade. Equivale, em outros termos, a simples eliminação do princípio da separação entre a pessoa jurídica e seus integrantes. Se a formulação maior pode ser considerada um aprimoramento da pessoa jurídica, a menor deve ser vista como o questionamento de sua pertinência, enquanto instituto jurídico.”
A Teoria menor só será aplicada nas hipóteses vinculadas a nichos sociais que merecem uma maior atenção do Estado, tais como consumidores, empregados e meio ambiente, por exemplo.
Não atender aos requisitos estipulados pela Teoria Maior é incorrer em uma insegurança enorme no campo do empreendedorismo e da iniciativa empresária, uma vez que a personalidade jurídica pode não se sustentar, mesmo que a intenção da Teoria Menor seja proteger
os setores que possuem maiores cuidados oferecidos pela nossa Constituição Federal. Resta claro, após a explanação sobre a desconsideração da personalidade jurídica, que toda sociedade deve ser constituída e operar sob a assessoria de contadores e advogados preparados para organizar os negócios jurídicos de forma segura para a sociedade, os sócios, os credores e a comunidade em geral.
Segundo a teoria maior, adotada pelo art. 50, do CC, para efeito de desconsideração, exige-se o requisito específico do abuso caracterizado pelo desvio de finalidade ou confusão patrimonial. Já a teoria menor, mais fácil de ser aplicada, adotada pelo CDC e pela legislação ambiental, não exige a demonstração de tal requisito (Confira: REsp. 279273 SP).
Art. 50. Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão patrimonial, pode o juiz decidir, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares dos administradores ou sócios da pessoa jurídica.
O artigo supra transcrito consagra a regra geral adotada no direito brasileiro, da teoria maior da desconsideração da personalidade jurídica, exigindo como critério para sua aplicação que no caso concreto esteja configurado o abuso da personalidade, desvio de sua finalidade ou a confusão patrimonial entre os bens da pessoa jurídica e dos seus integrantes.
Dessa forma, quando o ato praticado em nome sociedade não deve ser a ela imputado por configurar fraude, abuso de direito ou confusão patrimonial promovida por seu integrante e, diante da impossibilidade da responsabilização pessoal deste, afasta-se a eficácia da personalidade jurídica da sociedade, obrigando o patrimônio particular daquele que cometeu o ato, ou o patrimônio que foi transferido à sociedade pelo sócio, no caso de desconsideração inversa.
A Teoria da Aparência
1.- Introdução 
A evolução da matéria ventilada, não é somente dentro do ordenamento jurídico pátrio, mas sim em termos mundial, sendo que em alguns países não há ainda o seu devido reconhecimento dentro do mundo jurídico, entretanto, somente se atendo a orientação e evolução pátria, temos que em nosso ordenamento ainda não há previsão expressa regulando a quaestio, sendo certo que já não está tão distante seu reconhecimento.
Desde o seu surgimento no mundo jurídico, a teoria da aparência tem provocado acesas polêmicas na doutrina e na jurisprudência, não só no Brasil. Contribuiu em muito para o acirramento dessa polêmica entre nós o fato de que o direito civil pátrio não instituiu entre seus preceitos uma regra geral prevendo a validade da aparência de direito. As normas referentes à tutela da aparência de direito existentes no ordenamento civil, elaboradas numa época onde ainda predominava uma concepção eminentemente individualista e tradicional do Direito.
2. - Noção jurídica de aparência de direito 
Nessa definição resumem-se os aspectos mais importantes da ideia de aparência de direito. Primeiro o fato da predominância da segurança sobre a certeza do direito: uma das razões fundamentais da importância atribuída ao fenômeno da aparência está no fato de que à realidade jurídica escapa normalmente a possibilidade de uma averiguação segura do direito que requer, comumente, indagações longas e complexas. Por isso o princípio é chamado a socorrer e disciplinar, justamente, aqueles casos nos quais essa averiguação e essa busca apresentem maiores dificuldades e mesmo impossibilidade. 
São esses casos aqueles de exteriorização material nos quais não existe a correspondência entre a atividade do indivíduo e a realidade dos atos que pratica. Por isso, terceiros de boa fé podem ter em conta a exteriorização e ignorar a realidade oculta.
A aparência de direito se caracteriza e produz os efeitos que a lei lhe atribui, somente quando realiza determinados requisitos objetivos e subjetivos. São estes, no magistério de Vicente Ráo: 
"São seus requisitos essenciais objetivos: a) uma situação de fato cercada de circunstâncias tais que manifestamente a apresentem como se fora uma situação de direito; b) situação de fato que assim possa ser considerada segundo a ordem geral e normal das coisas; c) e que, nas mesmas condições acima, apresente o titular aparente como se fora titular legítimo, ou o direito como se realmente existisse. 
São seus requisitos subjetivos essenciais: a) a incidência em erro de quem, de boa fé, a mencionada situação de fato como situação de direito considera; b) a escusabilidade desse erro apreciada segundo a situação pessoal de quem nele incorreu. 
Como se vê, não é apenas a boa fé que caracteriza a proteção dispensada à aparência de direito. Não é, tampouco, o erro escusável, tão somente. São esses dois requisitos subjetivos inseparavelmente conjugados com os objetivos referidos acima, - requisitos sem os quais ou sem algum dos quais a aparência não produz os efeitos que pelo ordenamento lhes são atribuídos". 
2.1- Aparência e boa-fé 
A evolução do direito privado vem cada vez mais firmando posição no sentido de se reconhecer a eficácia de determinados atos fundados na aparência, tendo pedra filosofal a boa fé, que cada vez mais vem se confirmando como o sustentáculo de tal princípio.
Abrilhanta essa monografia, o parecer do ilustre jurista Dr. Arnaldo Rizzado do Direito no Rio Grande do Sul, o qual nos esclarece que: 
“As relações sociais se baseiam na confiança legítima das pessoas e na regularidade do direito de cada um. A todos incumbe a obrigação de não iludir os outros, de sorte que, se por sua atividade ou inatividade violarem esta obrigação, deverão suportar as consequências de sua atitude. A presença da boa-fé é requisito indispensável nas relações estabelecidas pelas pessoas para revestir de segurança os compromissos assumidos”.
Na formação do nexo obrigatório, reclamam-se respeito mútuo e intenção séria. O direito aperfeiçoa-se na medida em que sobressai a importância dada à boa-fé, Nas legislações recentes, a noção deste princípio teve grande relevância, a ponto de ser consagrado expressamente. É o que sucede no CC Suíço, arts. 2º e 3º, onde consta que todos os direitos e todas as obrigações hão de se exercer a executar dentro de condutas determinadas pela boa-fé. O art. 1.135, do CC Francês, por seu turno, exprime que as convenções devem ser travadas de boa-fé. O CC Alemão, no art. 157, estatui que os contratos interpretar-se-ão como exigem a boa-fé e a intenção das partes, determinadas segundo os usos. Nos arts. 1.366 e 1375, do Estatuto Civil Italiano, igualmente vêm disseminadas regras sobre a interpretação do contrato. O nosso Cód. Com. No art. 131, 1, prevê o seguinte: "A inteligência simples e adequada, que for mais conforme a boa-fé, e ao verdadeiro espírito e natureza do contrato, deverá sempre prevalecer à rigorosa e restrita significação das palavras. Noantigo CC inúmeras foi às referências ao princípio, criador de direitos e gerador de vários efeitos, como se percebia nos arts. 155, 221, e parágrafo único 490, 510, 516, 550, 551, 618, 619, 622, 968, 1.272, entre outros dispositivos que com o Novo CC foram transformados nos arts. 180, 1.561, e parágrafo único do art. 1.201,1. 214, 1.219, 1.238. 1.242,1. 260, 1.261, 1.268, 879, 637. 
Vicente Ráo, citando vários autores, explica ser a boa-fé exigida na formação dos contratos e protegida quando conduz à aquisição de um direito. Ela exerce função de adaptação quando os atos jurídicos se formam ou executam, e função criadora em matéria de posse..., fixa as condições da responsabilidade e obsta ou restringe os efeitos das nulidades (Ato Jurídico, Saraiva, São Paulo, 2ª ed. 1979, p. 226). Nesta mesma linha de pensamento segue Georges Rippert (A Regra Moral nas Obrigações Civis, tradução ao português de Osório Oliveira, Saraiva, 1937, São Paulo, p. 296).
Procura-se fazer reinar a justiça impondo-se a existência de certo grau de credibilidade mútua
nos relacionamentos sinalagmáticos, para tornar possível a vida social dentro de um padrão médio de honestidade e moralidade. A partir destas ideias, veremos o que é a aparência do direito.
Uma pessoa é tida, não raras vezes, como titular de um direito, quando não o é, na verdade. Aparece portadora de um valor ou um bem, agindo como se fosse proprietária, por sua própria conta e sob sua responsabilidade. Não está na posição de quem representa o verdadeiro titular, ou de quem se encontra gerindo os negócios alheios.
Em outras palavras, produzem-se declarações de vontade que não correspondem à realidade. Firma-se, v.g., a cedência de um direito como seu, levando o cessionário à convicção honesta da aquisição de direitos. Dá-se de fato cercada de circunstâncias tais que as pessoas de boa-fé são levadas a acreditar, realmente, como válidos os atos desse modo praticados.
É o que se denomina teoria da aparência, pela qual uma pessoa, considerada por todos como titular de um direito, embora não seja, leva a efeito um ato jurídico como terceiro de boa-fé. Ela se apresenta quando os atos são realizados por una persona engañada por una situación jurídica, que es contraria a la realidad, pero que presenta exteriormente las características de una situación jurídica verdadeira (José Puig Brutau, Estudos de Derecho Comparado, La Doctrina de los Actos Propios, Ediciones Ariel, Barcelona, 1951, p. 103). Na Lição de Ângelo Falsea (Enciclopédia de Diritto, verbete apparenza' 1958), constitui uma situação de fato que manifesta como real uma situação jurídica irreal. 
Em síntese, na aparência apresenta-se como verdadeiro um fenômeno que não é real. O contratante ou o obrigado assente no adimplemento de um dever em relação à outra parte porque as circunstâncias causaram a convicção de ser ela o real titular de um direito.
Certos casos práticos ilustram melhor a figura em exame. Nas hipóteses de um gestor, um mandatário ou representante atuarem com poder ou capacidades aparentes, ou excederem o limite das faculdades recebidas, tendo o terceiro contratado confiando na capacidade de representação em vista da aparência que revelavam convalesce o ato jurídico, surtindo efeitos e obrigando o verdadeiro titular a respeitar o convencionado. Resta-lhe acionar os fictícios representantes. Sustenta a firmeza do negócio a necessidade de se emprestar proteção à boa-fé, manifestada através da confiança depositada na aparência.
3. – O surgimento da aparência na doutrina nacional
A partir da década de 1950, vários estudos nacionais salientaram a importância da teoria da aparência, que foi analisada por PONTES DE MIRANDA e ORLANDO GOMES, merecendo, mais recentemente, ser examinada, em profundidade, pelos eminentes Juristas SEMY GLANZ e ARNALDO RIZZARDO, sem prejuízo de livros e de numerosos outros artigos que trataram do assunto de modo genérico ou específico.
Por sua vez, ORLANDO GOMES afirma que:
“Manifesta-se, a aparência em relação ao próprio mandato e em relação a um ato praticado pelo mandatário”.
A teoria da aparência encontra na prática de atos excessivos por parte de representantes afoitos ou inescrupulosos largos e importante campo de aplicação, merecendo ser aperfeiçoada sua construção.
Uma das mais importantes questões que podem receber solução adequada pela aplicação dos princípios sistematizados na teoria da aparência é a que resulta da prática, por parte dos administradores de sociedades mercantis, de atos para os quais não lhes conferem poderes os estatutos, ou o contrato social.
E concluí o saudoso mestre
“Entende-se, em suma, que em todas essas situações aparentes devem os terceiros merecer proteção, exigindo-se, apenas, que seu erro, corno frisa Calaís-Auloy, provenha de circunstâncias tais que teriam podido enganar o indivíduo medido”. A aparência, em tais casos, substitui a realidade, e o mecanismo de defesa dos interesses de terceiros move-se sob o impulso de uma noção que, nos dias correntes, se torna indispensável à solução de importantes questões, sobretudo no campo do Direito Comercial. ’
Por sua vez, o eminente Jurista e Desembargador aposentado SEMY GLANZ teve o ensejo de publicar sobre a teoria da aparência um estudo pioneiro, há cerca de um quarto de século, tendo reexaminado a matéria na excelente e oportuna atualização que fez do CC lnterpretado de CARVALHO SANTOS.
Escreve o brilhante magistrado carioca que:
“A evolução do direito privado vem-se afirmando cada vez mais, no sentido de aceitar a eficácia de atos fundados na aparência”.
O Direito Comercial, porém, é campo fértil para aplicação da teoria, pois a rapidez dos negócios não permite geral, uma análise detida das situações jurídicas Assim, a situação de mandatário, sócio, preposta e representante de pessoas jurídicas é frequentes campos de aplicação da teoria. A respeito, Jeari Calais-Auloy escreveu alentada e premiada monografia (Essai sur lla Notion d `Apparence en Droit Commercial – Paris 1961) dizendo que a rapidez dos negócios direito comercial exige a proteção dos terceiros que, agindo de boa fé, são iludidos pela aparência.
Com efeito, qualquer pessoa que entra num estabelecimento comercial presume que ao ser atendido por alguém legitimado para o ato. Ninguém vai pedir a carteira de trabalho ao empregado, nem a certidão da Junta Comercial para sabe; quem é o verdadeiro titular da empresa. Igualmente o funcionário de fato, no campo do direito administrativo. ’
Por sua vez. o Desembargador aposentado ARNALDO RIZZARDO elimina artigo que dedicou ao assunto nos seguintes termos:
“Quem procedeu de boa fé, levado pela aparência de uma situação de estado, deve ter assegurada a proteção de sua aquisição”.
Concluindo, em todas as hipóteses importa se dê proteção aos terceiros. Exigindo-se, somente, que seu erro provenha de circunstâncias aptas para enganar o indivíduo médio. A aparência substitui a realidade em favor do que agiu levado por bons princípios e honestamente. 
4. - A Introdução da aparência na jurisprudência brasileira
(A) Jurisprudência do STF
Em 02 de abril de 1974, a Primeira Turma do STF teve o ensejo de aplicar a teoria da aparência, ao julgar o RE n 77 814-SP que tratava da responsabilidade da empresa, por ato de antigo dirigente que, embora tendo ficado impedido de continuar a presidir a empresa, pelo fato de ter sido nomeado corretor dos fundos públicos continuou a operar de fato em nome e por conta da mesma.
O acórdão, do qual foi relator o eminente Ministro Luiz GALLOTTI, não conheceu do recurso contra a decisão de segunda estância que aplicou, no caso, a teoria da aparência, considerando o STF que era caso de incidência da mesma com essa decisão, a nossa mais alta Corte incorporou definitivamente a teoria da aparência ao nosso direito.
B) Jurisprudência do STJ
Por sua vez, o STJ, em julgado da sua 4ª Turma, no RESP. n 12.811, tendo corno relator o ilustre Ministro SÁLVIO DE FIGUEIREDO, decidiu, por unanimidade, que:
A teoria da aparência mostra-se aplicável nos casos em que vendedor, gerente ou pessoa equiparada, por expressa ou tácita permissão do comerciante, vende mercadorias, salvo se comprovado erro inescusável ou má fé de adquirente.
5. - Fundamentos que justifiquem a teoria da aparência.
Razões contrárias são aventadas, com insistência, à admissão da teoria. Argumenta-se que ela atenta contra a liberdade do consentimento, forçando o verdadeiro titular a respeitar uma operação realizada em seu prejuízo e sem o concurso de sua vontade.
No entanto, a necessidade de ordem social de se conferir segurança às operações jurídicas, amparando-se, ao mesmo tempo, os interessados legítimos dos que corretamente procedem, impõe prevaleça à aparência do direito. A complexidade cada vez maior das relações jurídicas e das formas de vida dificulta o caminho para se chegar ao fundo das coisas e dos problemas condicionando-nos a acreditar na feição externa da realidade com a qual nos defrontamos. A rapidez e a segurança do comércio, a quantidade de negócios comuns quase impõe diariamente, os compromissos
que se avolumam constantemente, o condicionamento da vida a uma dependência de relações contratuais inevitável, entre outros fatores, formam as causas que levam o homem a não dar tanta importância ao conteúdo dos atos que realiza, pretendendo-o ao aspecto exterior dos eventos que se apresentam.
O princípio da proteção aos terceiros de boa-fé e a necessidade de imprimir segurança às relações jurídicas justificam a aparência. Orlando Gomes aponta três razões principais, que servem, igualmente, de fundamento: 1 – para não criar surpresas à boa-fé nas transações do comércio jurídico; 2 – para não obrigar os terceiros a uma verificação preventiva da realidade do que evidencia a aparência; 3 – para não tornar mais lenta, fatigante e custosa a atividade jurídica. A boa-fé nos contratos, a lealdade nas relações sociais, à confiança que devem inspirar as declarações de vontade e os comportamentos exigem a proteção dos interesses jurisformizados em razão da crença em uma situação aparente, que tomam todos como verdadeira (Transformações Gerais do Direito das Obrigações, Ver. Dos Tribs. São Paulo, 1967, p.96).
Na vida dos negócios, não se pode imputar ao contratante a obrigação de reclamar a prova da qualidade da pessoa com a qual contrata. Não é costume impor-se a uma caixa de um estabelecimento comercial a exibição de seu contrato de trabalho, nem, em uma repartição pública, o ato de nomeação do funcionário que atende e assina um documento. Há uma grande quantidade de situações comuns com as quais convivemos diariamente e nos forçam a um comportamento de confiança e crença franca diante delas. Não duvidamos que um vendedor não esteja autorizado a acertar preços e entregar mercadorias. Estamos habituados a efetuar pagamentos a representantes de credores, advogados e mandatários, não nos preocupando, em examinar ou solicitar a autorização em receber. Em resumo, a vida nos coloca diante de eventos cotidianos que a necessidade determina a crença naquilo que os outros representam. Criar-se-ia um estado de coisas caótico, de verdadeiro tumulto, se, a cada passo, reclamarmos a comprovação da qualidade da pessoa com a qual nos relacionamos.
6. - AUSÊNCIA E APARÊNCIA DE DIREITO (OU APARÊNCIA DO DIREITO)
O Direito brasileiro, tanto no aspecto doutrinário como na esfera jurisprudencial de certa forma aceita a teoria, mas não a condensa numa disposição geral, ora fundamentando-a na teoria da proteção à boa-fé de terceiros, ora na do erro comum e invencível ou escusável), ora exteriorização da publicidade, como nos casos de herdeiro aparente, cônjuge aparente, filhos aparentes, mandatário aparente, títulos cambiais, sociedades comerciais, irregulares ou “fantasmas”etc. 
Daí deve conter a aparência de direito alguns elementos essenciais: a) situação fática, que a apresenta como de direito, segundo a ordem geral e normal das coisas, sugerindo o titular aparente como titular legítimo (elemento objetivo); b) a incidência em erro de alguém de boa-fé que considerasse a situação fática como situação de direito; c) erro esse escusável, ao menos, dependendo das condições pessoais de quem no erro incidisse (elementos subjetivos) segundo Ráo.
Ressalta-se, também, que em algumas das situações exemplificadas, os sucessores do ausente poderão ser responsabilizados pelos prejuízos sofridos tanto por terceiros de boa-fé-crença, como por mandatários, ou por representantes, no caso de não terem dado a devida publicidade da ausência do titular do direito antes, ou principalmente, após a publicação da sentença declaratória da ausência. Nos casos de mandatários e representantes caberia notificação, ainda que extrajudicial, alertando-os da ausência do mandante, ou do representado, e que contratara os préstimos daqueles, gratuita ou onerosamente.
7. - Conclusão 
A ideia de aparência se dá quando um fenômeno manifestante faz aparecer como real aquilo que é irreal, ou seja, quando há uma descoincidência absoluta entre o fenômeno manifestante e a realidade manifestada. Na aparência de direito ocorre à predominância da segurança jurídica sobre a certeza do direito, por isso, os terceiros de boa fé, com base na aparência, podem ter em conta a exteriorização e ignorar a realidade oculta. 
Outro aspecto relevante da aparência de direito é o de que ela se restringe tão-somente aos casos para os quais só se possa aplicar o princípio geral da aparência: sempre que estivermos diante de situações para as quais o direito já tenha assegurado tutela específica, não estaremos diante de situações regidas pelos cânones da aparência de direito. 
Da análise do direito comparado, de sua doutrina e jurisprudência, reluz a ideia de que a proteção mais efetiva e assecuratória da aplicação da aparência de direito é aquela proporcionada pelo princípio geral da aparência de direito, abarcando todo o ordenamento jurídico, cuja aplicação às diversas situações fáticas a lei condiciona ao prudente arbítrio do juiz, sopesados a boa fé de terceiros, a legitimidade do seu erro e as demais circunstâncias de cada caso. 
Em resumo, aplicando-se as ideias desenvolvidas em outros ordenamentos jurídicos e fundamentando-se a eficácia da aparência de direito na noção de erro legítimo, chega-se à conclusão de que o único critério capaz de efetivamente cumprir o escopo ontológico da teoria da aparência é o da sua equiparação a um princípio geral de direito, extensível a todo o ordenamento, mas sujeita sua aplicação ao prudente arbítrio judicial, atentando-se para as circunstâncias do caso, a boa fé dos terceiros, a legitimidade do erro e as condições peculiares em que se encontram os agentes da relação jurídica.

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