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1 C E N T R O U N I V E R S I T Á R I O A R A R A Q U A R A P S I C O P A T O L O G I A Curso de Graduação em Psicologia Prof. Fábio de Carvalho Mastroianni 2 PARTE I - CONCEITOS BÁSICOS 3 Psicopatologia e Semiologia dos Transtornos Mentais 3 Doença Mental x Normalidade 4 O Diagnóstico em Psicopatologia 4 A Avaliação em Psicopatologia 5 A Entrevista com o Paciente 5 As Funções Psíquicas 6 PARTE II - AS FUNÇÕES PSÍQUICAS E SUAS ALTERAÇÕES 7 A Consciência e Suas Alterações 7 A Atenção e Suas Alterações 9 A Orientação e suas Alterações 11 A Sensopercepção e suas Alterações 12 A Memória e suas Alterações 16 O Pensamento e suas Alterações 20 O Juízo e suas Alterações 24 A Afetividade e suas Alterações 27 A Vontade, a Psicomotricidade e suas Alterações 30 A Linguagem e suas Alterações 33 Funções Psíquicas Compostas 36 Consciência do Eu 36 PARTE III – AS GRANDES SÍNDROMES PSIQUIÁTRICAS 39 Esquizofrenia e outros Transtornos Psicóticos 39 Transtornos do Humor (Afetivos) 48 Transtornos de Ansiedade 54 Transtornos Relacionados À Substâncias 63 Transtornos Alimentares 68 Transtornos Não–Orgânicos Do Sono 75 Transtornos Sexuais, de Identidade de Gênero e Parafilias 82 Transtornos de Personalidade 91 Transtornos Somatoformes 100 Transtorno Factício 102 Transtornos Orgânicos 103 BIBLIOGRAFIA: 106 3 PARTE I - CONCEITOS BÁSICOS Psicopatologia e Semiologia dos Transtornos Mentais - Semiologia médica – estudo dos sinais e sintomas das doenças, que permite ao profissional ordenar os fenômenos observados, formular diagnósticos e empre- ender terapêuticas Semiologia – ciência dos signos - seu elemento nuclear é o signo Signo – é um tipo de sinal, qualquer estímulo emitido pelo objeto estudado, p.ex.: febre signo/sinal de uma infecção (reação orgânica) fala rápida e fluente signo/sinal síndrome maníaca (reação biopsicossocial) Em psicopatologia, sinais são os comportamentos objetivos, verificáveis pela observação direta do paciente (objeto do estudo) Signos - sinais comportamentais objetivos Sintomas - vivências subjetivas relatadas, comunicadas pelo paciente, ou então: (sintomas objetivos) aquilo que é observado pelo examinador (sintomas subjetivos) aquilo que é percebido apenas pelo pa- ciente - relatado Semiotécnica – processo específico (procedimento) de observação e co- leta de sinais e sintomas e sua correspondente interpretação Síndromes – conjunto, agrupamentos relativamente constantes e estáveis de determinados sinais e sintomas – descrição momentânea ≠ doença específica - Psicopatologia – conjunto de conhecimentos referentes ao adoecimento mental do ser humano, é a ciência que trata da natureza essencial do transtorno mental - A psicopatologia tem parte de suas raízes na tradição médica e outra na tradição humanística (filosofia, artes, psicanálise, psicologia) contudo, - é uma ciência autônoma, não é um prolongamento da Neuro- logia nem da Psicologia - é uma ciência básica que serve de auxilio a outras práticas – psiquiatria - sendo ciência, é diferente de dogma, pois não julga moralmen- te o objeto - e por ser ciência, possui seus limites, pois não se pode com- preender ou explicar tudo o que existe em um homem por meio de conceitos psicopatológicos - A psicopatologia é tida, portanto, como: uma das abordagens possíveis de se compreender o homem mentalmente doente, mas não a única e exclusiva - Forma e conteúdo dos sintomas – os sintomas possuem dois aspectos básicos: Forma estrutura básica, semelhante a todos os indivíduos / p.ex: delírio / ansi- edade 4 Conteúdo aquilo que preenche essa estrutura (pessoal) / p.ex: conteúdo de culpa, perseguição - está ligada a história de vida do paciente, sua cultura e personalidade p.ex: delírio de ciúmes, de perseguição Transtorno Mental x Normalidade - O conceito de normalidade em psicopatologia impõe a análise do contexto soci- ocultural - Existem diversos critérios de normalidade e anormalidade em psicopato- logia, dependendo para a adoção destes a opção filosófica, ideológica e pragmática de cada profissional Critérios de normalidade - ausência de doença definição negativa - normal é não ser - ideal utópico – depende dos critérios socioculturais - estatística frequência – curva de Gauss - bem-estar definição subjetiva – utópica - funcionalidade x disfuncionalidade - egossintônico x egodistônico - provoca sofrimento para o indivíduo e para o seu grupo social - como processo de acordo com determinadas etapas do de- senvolvimento - subjetiva – percepção do próprio indivíduo sobre si mesmo - normalidade operacional definida a priori O Diagnóstico em Psicopatologia - Qual é o valor ou a importância de um diagnóstico psicopatológico ? Sem valor, serve apenas para “rotu- lar” as pessoas “diferentes”, “excêntricas” X Auxilia a prática, a compreensão e à definição de estratégias terapêuticas - O psicodiagnóstico: são construtos/idéias que servem para conhecer o obje- to/paciente - diferente da realidade do paciente - O psicodiagnóstico se baseia nos dados clínicos – sinais e sintomas avaliados no momento da entrevista - constitui-se em: - dados clínicos momentâneos (exame psíquico) - dados clínicos evolutivos (anamnese, história pregressa do transtorno) - deve-se, portanto, ser pluridimensional 5 O DSM-IV / DSM-IV R utiliza o diagnóstico pluridimensional baseado num siste- ma multiaxial: Eixo 1 Diagnóstico do Transtorno Mental Eixo 2 Diagnóstico de personalidade e do nível de inteligência Eixo 3 Diagnóstico de transtornos somáticos associados Eixo 4 Problemas psicossociais e eventos da vida desencadeantes ou associados Eixo 5 Avaliação Global do Nível de funcionamento Psicossocial (AGF) Exemplo clínico: Eixo 1 – Síndrome de dependência de álcool Eixo 2 – Personalidade histriônica Eixo 3 – Cirrose hepática alcoólica Eixo 4 – estressores psicossociais – desemprego contí- nuo, dependência financeira, abandono familiar Eixo 5 – Funcionamento adaptativo atual avaliado em 25, grave dependência dos serviços clínico e social A Avaliação em Psicopatologia - A entrevista e a observação são os principais instrumentos de conhecimento - A entrevista permite a avaliação de 2 aspectos: Anamnese – aspecto evolutivo, histórico dos sintomas e sinais, antece- dentes pessoais, familiares e do meio social Exame psíquico – aspectos momentâneos ou atuais – exame do estado mental atual Componentes da avaliação psicopatológica - avaliação física (psiquiatra x clínico geral) - avaliação neurológica – visa identificar topograficamente uma possível lesão ou disfunção no sistema nervoso central e/ou periférico - psicodiagnóstico – testes de personalidade, screening, entre outros - Exames complementares (exames laboratoriais, neuroimagem, SPECT) A Entrevista com o Paciente - a habilidade está no “como” perguntar, no “quando” falar e no “evitar” falas ou comportamentos - relação empática - dependendo da situação o profissional vai falar muito ou pouco 6 - De modo geral, deve-se evitar: - posturas rígidas, estereotipadas - atitude neutra ou fria excessivas - reações exageradamente emotivas – falsas intimidades - comentários valorativos ou julgamentos morais - pena/ compaixão - hostilidade - fala prolixa ou demasiadamente complexa – saber interromper - anotações – observar se estas incomodam o paciente A primeira entrevista - o primeiro contato deve produzir no paciente uma sensação de confian- ça e alívio do sofrimento - deve-se facilitar a fala do paciente (desabafar) - garantir sigilo e colaboração mútua - evitar pausas e silêncios prolongados - Informações de parentes e terceiros podem ajudar a compreender melhor o quadro; assim como outros profissionais que já tiveram contato com o paciente - Dissimulação x simulação As Funções Psíquicas - O estudo das funções psíquicas, embora realizado de forma isolada, é apenas uma forma didática e útil para um estudo aprofundado e detalhado - dessa forma, a separação das funções deve ser considerada apenas em termos práticos e não como modo de se compreender um indivíduo em sua totalidade - não existem funções psíquicas isoladas - é a pessoa inteira que adoece e não uma função - São consideradas as funções psíquicas: - Consciência - Atenção - Orientação - Memória - Sensopercepção - Pensamento - Juízo - Vontade e psicomotricidade - Afetividade - Linguagem - Funções compostas: - consciência e valoração do eu - personalidade - inteligência 7 PARTE II - AS FUNÇÕES PSÍQUICAS E SUAS ALTERAÇÕES A Consciência e suas Alterações - Consciência significa com conhecimento / com ciência - Do ponto de vista neuropsicológico, a consciência é o estado de estar desperto, acordado, vigil, lúcido - Do ponto de vista psicológico, a consciência é: - a dimensão subjetiva da atividade psíquica do sujeito que se volta para a realidade - a capacidade do indivíduo de entrar em contato com a realida- de, perceber e conhecer seus objetos - Dentro desse processo, destacam-se duas formas de orientação da consciência: - consciência do eu – conhecimento que temos de existirmos co- mo individualidade distinta das demais coisas do mundo - consciência dos objetos – conhecimento dos objetos que ocu- pam o campo da consciência - A consciência não constitui algo imóvel, estático, mas sim em constante movi- mento, que ao se voltar para a realidade demarca um campo – campo da consciência Alterações normais da consciência – processos fisiológicos - Complementar ao estado de “plena consciência”, ou seja, o estado vigil, existe o sono que juntos formam o ciclo sono-vigília O SONO - O sono é um estado de consciência que pode ser dividido em 5 estágios: - Sono REM (movimento rápido dos olhos) ou sono paradoxal - ocupa de 20-25% do sono total, nele ocorre a maior par- te dos sonhos em forma de histórias - Sono não-REM (movimento não-rápido dos olhos) que pode ser divido em 4 estágios Estágio 1 - representa uma transição da vigília para o so- no e ocupa cerca de 5% do tempo gasto dormindo, em adultos saudáveis Estágio 2 - caracterizado por formatos de ondas de EEG específicos (fusos de sono e complexos K), ocupa cerca de 50% do tempo de sono CS Sistema psíquico Realidade ICS 8 Estágio 3 e 4 - também conhecidos coletivamente como sono de ondas lentas, são os níveis mais profundos de sono e ocupam cerca de 10-20% do tempo de sono - O sono REM ocorre ciclicamente durante a noite, alternando-se com sono NREM a cada 80-100 minutos, aproximadamente Alterações “anormais” da consciência – processos psicopatológicos - As alterações podem ocorrer de forma quantitativa, ou seja, há um rebaixamen- to do nível de consciência do estado vigil (consciência) ao estado de não- consciência Obnubilação da Consciência – há uma turvação da consciência, um re- baixamento de leve a moderado do nível de consciência: - há dificuldade de integrar as informações oriundas do ambiente, certa confusão - diminuição do grau de clareza do sensório, com lentidão da compreensão e dificuldade de concentração Sopor – é um estado marcante de turvação da consciência, o paciente pode ser apenas despertado por estímulo energético, sobretudo de natu- reza dolorosa - há um rebaixamento de moderado a grave do nível de consciência - paciente apresenta-se evidentemente sonolento, com reações de defesa, mas sem ação espontânea Coma – é o grau mais profundo de rebaixamento da consciência, não é possível qualquer atividade voluntária consciente – ausência de qualquer indício de atividade consciente O rebaixamento do nível de consciência pode ser observado em quadros tais como o Delirium (enquadram-se aqui as alterações tais como o estado onírico como a amência ou confusão mental) - As alterações podem ocorrer também de forma qualitativa, contudo, há quase sempre um rebaixamento do nível de consciência nessas alterações, ainda que mínimo, entre elas: 9 Estados Crepusculares – ocorre estreitamento transitório da consciên- cia, com a conservação da atividade motora mais ou menos organizada - O paciente pode executar uma série de atos coordenados e com certa finalidade, embora inconscientes - andar sem destino, enfrentar situações complexas como o sistema de transportes de uma grande cidade, fazer longas viagens - surgem e desaparecem de forma abrupta e tem uma duração variável de poucas horas a algumas semanas, acompanhado de amnésia em relação às vivências - podem ocorrer atos explosivos, violência e descontrole emocional Dissociação da Consciência (estados segundos) – há uma fragmenta- ção ou divisão no campo da consciência, ocorrendo perda da unidade psíquica comum do ser humano - ocorre em situações de grande ansiedade, como forma de lidar, de se defender da ansiedade - uma forma de se desligar da realidade - as crises normalmente duram de minutos a horas - ocorrem com certa frequência nos quadros de histeria, sua ma- nifestação mais frequente é o sonambulismo Transe – dissociação da consciência que se assemelha a um sonho acordado, mas dele difere pela presença motora automática e estereoti- pada acompanhada de suspensão parcial dos movimentos voluntários - ocorrem em contextos religioso-culturais, porém, não se deve confundir o transe religioso com o transe histérico. Estado hipnótico – é um estado de consciência semelhante ao transe, no qual a sugestionabilidade do indivíduo está aumentada – atenção no hipnotizador A Atenção e suas Alterações - A atenção é a direção da consciência, o estado de concentração da atividade mental sobre determinado objeto: Tipos de atenção Voluntária – que exprime concentração ativa e intencional sobre um objeto; Espontânea – atenção suscitada pelo interesse momentâneo, incidental que o objeto desperta. CS Objeto ICS 10 Direção da atenção Externa – projetada para fora do mundo subjetivo do sujeito. Interna – que se volta para os processos mentais, introspectiva, reflexiva. Amplitude da atenção Focal – que se mantém concentrada sobre um determinado campo. Dispersa – que não se concentra em um determinado campo, espalhando-se. Propriedades da atenção Tenacidade – capacidade de fixar a atenção sobre determinada área ou objeto Atenção sustentada – capacidade de manter a atenção sobre determinado objeto Vigilância – capacidade que permite o indivíduo mudar o seu foco de um objeto para outro Atenção seletiva – capacidade de selecionar estímulos e objetos específicos Atenção flutuante – consiste em deixar fluir livremente a ativida- de mental,consciente e inconsciente, suspendendo ao máximo as motivações, desejos e memórias Alterações da atenção Hipoprosexia - há uma perda básica da capacidade de concentração e da atenção em todos os seus aspectos, com fadigabilidade aumentada, dificultando a percepção e a compreensão dos estímulos ambientais Hiperprosexia - é um estado de atenção exacerbada, há aumento quantitativo da aten- ção, uma superatividade da atenção espontânea Distração - não se trata de um déficit de atenção, mas sim a uma superconcentra- ção sobre determinados conteúdos e inibição dos demais tenacidade vigilância Distraibilidade - é o contrário da distração, é a dificuldade ou incapacidade de se fixar ou se manter em qualquer coisa que implique esforço produtivo, a atenção é muito facilmente desviada tenacidade vigilância 11 A Orientação e suas Alterações - A consciência é a 1ª função psíquica a ser avaliada e a orientação é a melhor forma de avaliá-la - É a capacidade de se situar quanto a si mesmo e ao ambiente - Obviamente a orientação não é uma função autônoma e depende de outras funções, principalmente a memória e a sensopercepção. - A orientação em relação a si próprio, denomina-se autopsíquica - À capacidade de se orientar em relação ao mundo, ou seja, quanto ao tempo e ao espaço, denomina-se alopsíquica - O processo de desorientação ocorre primeiramente em relação ao tem- po, apenas com o agravamento da desorientação é que esta se dá em re- lação ao espaço e por último em relação a si mesmo: Tempo Espaço Si mesmo Alterações da orientação a) Desorientação por redução do nível de consciência - também conhecida como desorientação toporosa ou confusa – é aquela em que o indivíduo está desorientado por turvação da consciência, per- dendo a capacidade de integrar os estímulos ambientais b) Desorientação por déficit de memória - também conhecida como desorientação amnéstica – é quando o indiví- duo perde a capacidade de fixar as informações, perdendo a noção do fluir do tempo e do deslocamento do espaço c) Desorientação Demencial - ocorre não apenas pela perda da memória de fixação, mas pela perda e desorganização global das funções cognitivas – ocorre em quadros de- menciais d) Desorientação Oligofrênica - ocorre em indivíduos com graves déficits intelectuais, por dificuldade em compreender o ambiente, de reconhecer e interpretar as normas sociais (calendário, horas, datas) e) Desorientação Apática ou abúlica - ocorrem devido a uma marcante alteração do humor e da volição – em indivíduos gravemente deprimidos, a falta de interesse e motivação de in- vestir energia no mundo e se ater aos estímulos ambientais os tornam desorientados f) Desorientação Delirante - ocorre em indivíduos que estão imersos em um profundo estado deliran- te – é comum a dupla orientação, na qual a orientação delirante (falsa) coexiste com a correta (real) 12 g) Desorientação Histérica - ocorre em quadros histéricos graves, geralmente acompanhados de al- terações da identidade pessoal h) Desorientação por desagregação - ocorre em pacientes psicóticos, geralmente esquizofrênicos em estado crônico A Sensopercepção e suas Alterações - É uma função importante na relação do indivíduo com o mundo interno e exter- no (ambiente) - Sensação – é o fenômeno gerado por estímulos físicos (luz, som, calor, pres- são), químicos (substâncias com sabor ou odor) ou biológicos variados, origina- dos fora ou dentro do organismo, que produzem alterações nos órgãos recepto- res, estimulando-os - Percepção – é um processo neuropsicológico de transformação de estímulos puramente sensoriais em fenômenos perceptivos conscientes – é a tomada de conhecimento sensorial de objetos ou de fatos exteriores mais ou menos complexos - enquanto a sensação é um fenômeno passivo, a percepção é ativa - a percepção é a construção de um percepto pelo sistema nervoso e pe- la mente do sujeito que dá significado a uma experiência a partir da sín- tese dos estímulos sensoriais, confrontados com experiências passadas registradas na memória associadas ao contexto sociocultural em que o indivíduo se insere - a percepção, portanto, não é o resultado passivo do conjunto de estímu- los sensoriais, mas sim recriações da mente de quem as percebe Imagem X Representação - O elemento básico da sensopercepção é a imagem perceptiva real ou imagem apenas - a imagem se caracteriza por: nitidez, corporeidade, estabilidade, extro- jeção, ininfluenciabilidade voluntária e completude - Representação (imagem representativa ou mnêmica) é a re-apresentação da imagem na consciência, sem a presença real, externa do objeto - a representação se caracteriza por: pouca nitidez, pouca corporeidade, instabilidade, introjeção, e incompletude - Quando a evocação da representação é feita de forma bastante precisa e muito semelhante à percepção real, denominamos de imagem eidética (eidetismo) - Denominamos de pareidolias o fenômeno de perceber imagens visuais volunta- riamente a partir de estímulos imprecisos – p.ex.: ver objetos formados pelas nuvens - A imaginação, portanto, seria uma atividade psíquica voluntária que consiste na evocação de imagens mnêmicas (percebidas no passado) ou na criação de no- vas imagens (imagem criada) - a fantasia é um produto minimamente organizado da imaginação 13 Alterações da sensopercepção - podemos dividir as alterações em quantitativas e qualitativas Quantitativas a) hiperestesia - é a condição na qual as percepções se encontram anormalmente au- mentadas em sua intensidade ou duração - ocorre principalmente em intoxicações por LSD ou após inges- tão de maconha, cocaína, entre outras - já a hiperpatia é o aumento de uma sensação desagradável, como a sensação de uma queimação dolorosa provocada por um leve estímulo da pele b) hipoestesia - é a condição na qual as percepções se encontram anormalmente dimi- nuídas em sua intensidade ou duração - ocorrem principalmente em indivíduo depressivos que podem perceber o mundo circundante como mais escuro, sem brilho, com cores pálidas, coisas sem sabores ou sem odores c) anestesias táteis e analgesias - as anestesias táteis implicam na perda da sensação tátil em determina- da área da pele - já a analgesia se refere à perda das sensações dolorosas de áreas da pele e partes do corpo - são denominadas de parestesias sensações táteis desagradá- veis, embora não sentidas como dor, descritas como “formiga- mentos, adormecimentos, picadas, agulhadas ou queimação” Qualitativas a) Ilusões - é a percepção deformada de um objeto real e presente - sempre há um objeto externo real, mas a percepção é adulterada por fatores diversos - basicamente ocorrem nas seguintes condições - estado de rebaixamento do nível de consciência - estado de fadiga grave ou inatenção marcante - em alguns estados afetivos devido a sua intensidade – ilusões catatímicas - as ilusões mais comuns são as visuais e as auditivas b) Alucinações - é a percepção clara e definida de um objeto, sem que este esteja pre- sente, sem o estímulo sensorial respectivo - são mais comuns em pessoas com transtornos mentais graves, mas podem ocorrer em pessoas que não os apresente 14 Tipos de alucinação I - Auditivas - são as mais comuns nos transtornos mentais - Dividem-se em simples e complexas-simples são ouvidos apenas ruídos primários (cliques, burbu- rinhos, zumbidos) - complexas as mais comuns são as audioverbais, na qual o indivíduo escuta vozes sem qualquer estímulo real - geralmente as vozes o insultam ou o ameaçam - Sonorização do pensamento – vivência sensorial de ouvir o pensamento - eco do pensamento – o paciente reconhece claramen- te que está ouvindo os próprios pensamentos - sonorização de pensamentos como vivência aluci- natório-delirante – o paciente ouve pensamentos que fo- ram introduzidos em sua cabeça por alguém estranho, sendo agora ouvidos por ele - publicação do pensamento – paciente tem a nítida sensação de que as pessoas ouvem o que ela pensa no exato momento em que está pensando II - Visuais - Dividem-se em simples e complexas -simples também denominadas de fotopsias, onde o indivíduo vê cores, bolas e pontos brilhantes - complexas incluem figuras de pessoas, partes do corpo, enti- dades, objetos inanimados, animais entre outros - podem incluir a visão de uma cena completa – alucina- ções cenográficas - estas podem aparecer com personagens minúsculos en- tre objetos reais – alucinações liliputianas - sempre que as alucinações ocorrerem em pessoas idosas, es- tado físico geral ruim, em intoxicações/abstinência de álcool ou drogas deve-se aventar a possibilidade de causa orgânica III - Táteis - o paciente sente espetadas, insetos ou pequenos animais cor- rendo sobre sua pele - são frequentes alucinações táteis sentidas nos genitais IV – Olfativas e Gustativas - geralmente são raras, acompanhadas de forte conteúdo emoci- onal, podendo estar relacionadas a interpretações delirantes - sinto cheiro de veneno de rato na comida, pois estão tentando me envenenar - sinto gosto de ácido na comida, pois estão tentando me matar 15 V – Alucinações cenestésicas e cinestésicas - cenestésicas – sensações incomuns e claramente anormais em diferentes partes do corpo – p.ex.: sentir o cérebro diminuir, o fí- gado despedaçar, uma víbora dentro do abdômen - cinestésicas – sensações alteradas de movimento do corpo – p.ex.: sentir o corpo afundando, o braço se elevando VI – Alucinações funcionais (em função de) - diferentes da ilusão em que apenas há a deformação de um ob- jeto real e presente, nestas o objeto real e presente (estímulo re- al) apenas desencadeiam a alucinação – p.ex.: o paciente começa a ouvir vozes assim que o chuveiro ou a torneira da pia são abertos VII – Alucinações combinadas (sinestesias) - são experiências alucinatórias com várias modalidades sensori- ais (visão, tato, audição...) – p.ex.: o paciente vê uma pessoa que fala com ele e que o toca VIII – Alucinações extracampinas - são alucinações experimentadas fora do campo senso- perceptivo usual – p.ex.: o paciente vê um objeto atrás de suas costas ou atrás de uma parede IX – Alucinação autoscópica - nessas o indivíduo vê a si mesmo, fora do próprio corpo con- templando a si mesmo – fenômeno do duplo X – Alucinações hipnagógicas e hipnopômpicas - hipnagógicas – se manifestam no momento em que o indivíduo está adormecendo - hipnopômpicas – ocorrem na fase em que o indivíduo está despertando c) Alucinose - é o fenômeno pelo qual o indivíduo percebe tal alucinação como estra- nha à sua pessoa - são acompanhadas de críticas pelo sujeito, reconhecendo seu caráter patológico - diferente da alucinação, falta a crença nessa alucinação - é egodistônica, enquanto a alucinação é egossintônica d) Pseudo-alucinação - embora se pareça com a alucinação, dela se difere por não apresentar aspectos vivos e corpóreos de uma imagem perceptiva real - parece uma voz .... é como se fosse uma imagem .... - diferente da alucinação, falta a crença nessa alucinação 16 - é egodistônica, enquanto a alucinação é egossintônica A Memória e suas Alterações - É a capacidade de registrar, manter e evocar os fatos já ocorridos, relaciona-se intimamente com a consciência, atenção e o interesse afetivo - é uma atividade altamente diferenciada do sistema nervoso, que permite ao indivíduo registrar, conservar e evocar a qualquer momento os dados aprendidos de uma experiência - A memória é composta de 3 fases ou elementos básicos - fase de percepção, registro e fixação - fase de retenção e conservação - fase de reprodução e evocação - Para a formação das unidades de memória a região do hipocampo (sistema límbico) é fundamental - O processo de memorização está relacionado a diversos fatores psicológicos Fixação - do nível de consciência e do estado geral do organismo - da capacidade de manutenção da atenção (tenacidade) - da senso percepção preservada - do interesse e colorido emocional relacionado ao conteúdo (afe- tividade) - do empenho e interesse do indivíduo em aprender (vontade) - do conhecimento anterior e da capacidade de compreensão do conteúdo - da disposição temporal das repetições - dos canais sensoperceptivos envolvidos (multicanais) Conservação - da repetição e da associação com outros elementos Evocação - é a capacidade de recuperar e atualizar os dados fixados, o es- quecimento seria a incapacidade de realizar essa função, poden- do se dar por: - fatores fisiológicos – por desinteresse ou desuso - fatores psicológicos - por repressão – ficam estocados no sistema pré-consciente - por recalque – ficam estocados no sistema in- consciente - O processo de memorização se divide em 3 fases: a) memória imediata ou de curtíssimo prazo: capacidade de reter o material imediatamente após ser percebido. Depende de fatores como a concentração, a fadigabilidade e de certo treino – capacidade limitada 17 b) memória recente ou de curto prazo: capacidade de reter a informa- ção por um período curto de tempo – de poucos minutos até meia ou uma hora – capacidade limitada c) memória remota ou de longo prazo: é a capacidade de evocação de informações e acontecimentos ocorridos no passado, meses ou anos – sua capacidade é bem mais ampla que as anteriores - Em caso de esquecimentos ou perda de memória, a regressão mnêmica costu- ma seguir uma lei, conhecida como lei de Ribot: “a perda dos conteúdos mnêmicos tende a ocorrer na ordem e no sentido inverso em que foram adquiridos” - do mais recente para o mais antigo - do mais complexo para o mais simples - dos mais estranhos para os mais familiares Tipos de memória A) Memória Explícita ou Declarativa - há um processo consciente e voluntário, p. ex.: evocar fatos ocorridos ou conhecimentos adquiridos Memória episódica – recordação consciente de fatos reais p. ex.: Ontem almocei com o meu amigo em um restaurante chinês Memória semântica – recordação dos significados, inclui o conhecimento dos objetos Ontem = dia anterior a hoje Amigo = pessoa que gostamos e que confidenciamos intimidade Restaurante chinês = local especializado na culinária chinesa B) Memória Implícita ou Não-declarativa - é uma memória automática ou reflexa, não depende de fatores consci- entes e voluntários - manifesta-se em ações motoras e em atividades que não podem ser expressas por palavras p. ex.: caminhar, andar de bicicleta, datilografar C) Memória de trabalho (operante ou executiva) - refere-se a um conjunto amplo de habilidades cognitivas que permitem que informações novas e antigas sejam mantidas ativas a fim de serem manipuladas- é utilizada no exercício de tarefas específicas p. ex.: seguir a orientação de um endereço, memorizar o número de um telefone e depois discar 18 Alterações patológicas da memória - as alterações podem ser divididas em quantitativas e qualitativas Quantitativas a) Hipermnésia - mais do que uma alteração, é a aceleração do processo de evocação - diferente de hipertrofia da memória - ocorrem em episódios de visão panorâmica da vida - ecmnésia b) Hipomnésia ou amnésias - é a perda da capacidade de fixar ou manter ou evocar antigos conteú- dos mnêmicos - as amnésias podem ter dois tipos de origem: Amnésia psicogênica: há perdas de elementos mnêmicos que tem um va- lor psicológico específico (valor simbólico, afetivo) - tal conteúdo pode ser recuperado por um estado hipnótico Amnésia orgânica: há perdas de elementos mnêmicos relacionados há acidentes e doenças - de maneira geral segue a lei de Ribot Tipos de Amnésia Amnésia anterógrada: o indivíduo não consegue mais fixar elementos mnêmicos a partir o momento em que ocorreu o dano/trauma (psicológico ou orgânico) Amnésia retrógrada: o indivíduo perde a memória para fatos ocorridos an- tes dano/trauma Amnésia retroanterógrada: há déficits para o que ocorreu antes e depois do dano/trauma Amnésia retroanterógrada: há déficits para o que ocorreu antes e depois do dano/trauma Qualitativas - nesses tipos de alteração há uma deformação do processo de evocação a) Ilusões mnêmicas - há um acréscimo de elementos falsos há um núcleo verdadeiro de memória - a lembrança adquire um caráter fictício Dano/Trauma retrógrada anterógrada retroanterógrada 19 b) Alucinações mnêmicas - são verdadeiras criações imaginativas, o conteúdo não corresponde a nenhum acontecimento de fato ocorrido - as alucinações, junto com as ilusões mnêmicas constituem ma- terial básico para a formação dos delírios c) Fabulações - as fabulações ou confabulações, são invenções, produtos da imagina- ção utilizados para cobrir vazios de memória - não intenção de mentir ou de enganar - podem ser induzidas, direcionadas pelo examinador, diferentes, portanto, das anteriores, onde o indivíduo está “convencido” de sua existência d) Criptomnésia - é o falseamento da memória, onde determinados conteúdos surgem como fatos novos - o indivíduo vivencia e conta histórias fortemente conhecidas como se fossem suas - é um processo que pode ocorrer em alguns episódios de plágio e) Ecmnésia - é a revivescência intensa, abreviada e panorâmica de uma recordação - o indivíduo revive uma lembrança de forma intensa e condensada - fenômeno da visão panorâmica da vida f) Lembrança obsessiva - é o surgimento espontâneo de imagens mnêmicas passadas, que não podem ser repelidas conscientemente - ocorre nitidamente em pacientes com transtorno obsessivo compulsivo Transtornos do Reconhecimento - Reconhecimento é a capacidade de identificar o conteúdo mnêmico co- mo lembrança e diferenciá-la da imaginação e de representações atuais - algumas alterações do reconhecimento podem ocorrer em estado de fa- diga e não são patológicas, como: Fenômeno do já visto (Déjàvu): o indivíduo tem a nítida impressão de que está vendo, ouvindo, pensando ou vivenciando no momento algo que já foi experimentado no passado Fenômeno do jamais visto: o indivíduo apesar de já ter passado por de- terminada experiência, tem a nítida sensação de que nunca a viu, ouviu, pensou ou viveu - Contudo, tais alterações podem estar associadas a alguns transtornos mentais 20 - Os transtornos do reconhecimento dividem-se em dois grandes grupos: - agnosias - de origem essencialmente cerebral - transtornos do reconhecimento associados aos transtornos mentais – sem base orgânica definida Agnosias - são déficits do reconhecimento de estímulos sensoriais, objetos e fenômenos - não podem ser explicados por déficits sensoriais, transtornos da lingua- gem ou perdas cognitivas globais Agnosias táteis: ocorrem uma incapacidade de reconhecer as formas do objeto colocado nas mãos (astereognosia) ou há capacidade de reconhe- cer formas, mas incapacidade de reconhecimento global de tal objeto - na primeira não há reconhecimento das formas, na segunda o paciente consegue descrever como o objeto é, mas não sabe qual objeto é apresentado Agnosias visuais: incapacidade de reconhecer os objetos visualmente, o paciente os vê, descreve como são, mas não sabe o que são Agnosias auditivas: incapacidade de reconhecer sons: não linguísticos (agnosia auditiva seletiva) ou sons linguísticos (agnosia verbal) Transtornos do reconhecimento associados aos transtornos mentais - As síndromes descritas a seguir podem ser consideradas tanto como transtor- nos do reconhecimento como quadros delirantes ou transtornos da consciência do eu Falso desconhecimento: o paciente não reconhece pessoas familiares ou muito próximas, dizendo jamais tê-los visto anteriormente Falso reconhecimento: também conhecida como síndrome de Frégoli, onde o indivíduo identifica falsamente uma pessoa estranha como se fos- se alguém de seu círculo pessoal Síndrome de Capgras: o paciente diz que a pessoa que o visitou dizen- do ser seu familiar é na verdade um sósia dessa pessoa, uma falsa cópia Síndrome do duplo subjetivo: o paciente acredita que outra pessoa transformou-se fisicamente a ponto de tornar-se idêntica a ela própria O Pensamento e suas Alterações - Tem como função selecionar e orientar os dados do conhecimento, tendo como objetivo alcançar uma integração significativa - O pensamento é um tipo de comportamento encoberto, mas que pode ser ex- presso e, portanto, observado através da linguagem - O pensamento se constitui através de elementos sensoriais, que oferecem substrato para o processo de pensar: imagens perceptivas e as representações 21 - Os elementos que constituem o pensamento são: o conceito, o juízo e o raci- ocínio Conceitos: - se formam a partir das representações, porém, não apresentam elemen- tos de sensorial idade, não sendo possível contemplá-lo, nem imaginá-lo - trata-se de um elemento cognitivo, intelectivo – não é possível ouvi-lo ou senti-lo - é o elemento estrutural básico, nele se exprimem apenas os caracteres essenciais dos objetos e dos fenômenos - eliminação dos caracteres de sensorialidade - generalização – é válido para todos - p.ex: tente descrever qual é a função, significado e como é um determi- nado objeto, sem representá-lo Juízos: - é o processo que conduz ao estabelecimento de relações significativas entre os conceitos básicos – relação entre dois conceitos Conceito (1) = cadeira; Conceito (2) = utilidade Juízo = a cadeira é útil - linguisticamente, conceitos se expressam por palavras e juízos por fra- ses ou proposições Conceito (1) = mãe; Conceito (2) = bebê Juízo (1) = a mãe cuida do bebê Conceito (3) = cuidar de; Conceito (2) = bebê Juízo (2) = os cuidados favorecem o desenvolvimento do bebê Raciocínio: - é o processo que conduz ao estabelecimento de relações significativas entre os conceitos e entre juízos – conceitos formam juízos, juízos con- duzem a formação de novos juízos que formam o raciocínio Conceito (1) = mãe; Conceito (2) = bebê Juízo (1) = a mãe cuida do bebê Conceito (3) = cuidar de; Conceito (2)= bebê Juízo (2) = os cuidados favorecem o desenvolvimento do bebê Raciocínio = Os cuidados maternos favorecem o desenvolvimento do bebê Alterações dos Elementos do Pensar - Em relação aos conceitos podemos ter: Desintegração dos conceitos: quando os conceitos perdem seu signifi- cado original – a idéia de determinado objeto e a palavra que normalmen- te a designa passam a não mais coincidir Ateu = a teu comando = comandado de Deus 22 Condensação dos conceitos: ocorre quando dois ou mais conceitos são fundidos em uma só idéia – formação de neologismos - Em relação aos juízos podemos ter: Juízo de realidade ou delírio: serão posteriormente estudados de forma detalhada devido a sua importância no estudo das psicopatologias - Em relação ao raciocínio / pensamento podemos ter: Pensamento mágico: fere frontalmente os princípios da lógica formal e da realidade – segue os desígnios dos desejos, das fantasias adequando a realidade ao pensamento, ou seja, faz uma associação puramente sub- jetiva de fatos objetivos Pensamento dereístico: uma forma de pensamento mágico que se opõe marcadamente ao pensamento realista – o pensamento obedece a lógica e a realidade naquilo em que interessa ao sujeito, distorcendo a realidade para adaptá-la aos seus anseios - mitomania Pensamento concreto (concretismo): não ocorre a distinção entre a dimensão abstrata e simbólica e a dimensão concreta imediata dos fatos – não se consegue utilizar metáforas – leva-se ao pé da letra sem enten- der o que essa metáfora significa Pensamento inibido: ocorre a inibição do raciocínio, com diminuição da velocidade, tornando o pensamento lento e pouco produtivo Pensamento vago: a concatenação de conceitos e juízos em raciocínio é feita de forma imprecisa – há falta de clareza e precisão do raciocínio Pensamento prolixo: dá-se longas voltas ao redor do tema, com dificul- dade em obter uma construção direta, clara e acabada, falta capacidade de síntese – nunca se chega ao ponto central / roda-se em cima do mesmo tema – eventualmente conclui o raciocínio Pensamento deficitário (oligofrênico): é um pensamento de estrutura pobre e rudimentar, os conceitos são escassos e utilizados de forma mais concreta do que abstrata Pensamento confusional: devido a turvação da consciência, apresenta- se um pensamento incoerente, que impede o indivíduo de apreender de forma clara e precisa os estímulos ambientais e processar o seu raciocínio Pensamento desagregado: pensamento radicalmente incoerente, os conceitos e os juízos não se articulam – mistura aleatória de palavras sem sentido – salada de palavras (jargonofasia – esquizofazia) Pensamento obsessivo: predominam idéias ou representações que apesar de absurdas ou repulsivas se impõem à consciência do indivíduo de modo persistente e incontrolável 23 O Processo do pensar - No processo do pensar distinguem-se três aspectos: o curso, a forma e o con- teúdo Curso – é o modo como o pensamento flui, a sua velocidade e o seu rit- mo ao longo do tempo Forma – é a estrutura básica, sua “arquitetura”, preenchida pelos mais diversos conteúdos – é o modo como o pensamento se “mostra” – formato Conteúdo – é aquilo que dá substância ao pensamento, os seus temas predominantes, o assunto em si Alterações do curso Aceleração do pensamento: o pensamento flui de forma muito acelera- da, uma idéia se sucedendo à outra rapidamente Lentificação do pensamento: o pensamento progride lentamente de forma dificultosa – há certa latência entre as perguntas e as respostas Bloqueio ou interceptação do pensamento: quando ao relatar algo, o paciente de forma brusca e repentina interrompe seu pensamento ao relatar algo Roubo do pensamento: frequentemente associado ao bloqueio do pen- samento, porém o paciente tem a nítida sensação de que seu pensamen- to foi roubado de sua mente por uma força ou ente estranho, ou objeto (antena, máquina) – é uma vivência de influência Alterações da forma Fuga de idéias: é secundária a aceleração do pensamento, onde as idéias se seguem de forma extremamente rápida perturbando as associ- ações lógicas Dissociação do pensamento: os pensamentos passam a não seguir uma sequência lógica e bem organizada – os juízos não se articulam de forma coerente uns com os outros – há uma desorganização do pensamento Afrouxamento das associações – Descarrilamento do pensamento e Desagregação do pensamento: em ordem crescente de gravidade constituem-se em perdas dos enlaces associativos e da coerência do pensamento – o sujeito vai se perdendo em sua forma de pensar até chegar a uma desagregação Conteúdo do pensamento - Não se fala em alterações, mas existem temas que preenchem os sin- tomas psicopatológicos: - persecutórios - depreciativos - religiosos - sexuais 24 - de poder, riqueza, prestígio ou grandeza - de ruína ou culpa - conteúdos hipocondríacos O Juízo e suas Alterações - Trata-se de um elemento do pensamento - Ajuizar quer dizer julgar, portanto todo juízo implica em um julgamento - Os juízos podem ser falseados por inúmeras formas, sendo ou não patológico - entre os não patológicos destacam-se os erros simples - entre os patológicos destacam-se as idéias prevalentes e os delírios Erros simples (não-patológico) - se origina da ignorância, do julgar apressado e com base em premissas falsas - p.ex.: pensar que o sol gira em torno da terra, se me cair um dente, um conhecido meu irá morrer - os erros são passíveis de serem corrigidos pela experiência, pelas pro- vas e pelos dados que a realidade oferece - são psicologicamente compreensíveis devido à ignorância ou por situa- ções afetivas intensas Preconceitos: são juízos a priori, baseados em falsas premissas e que geralmente visam atender os interesses de determinados grupos sociais em relação a um grupo - p.ex.: racismo, classismo, sexismo Crenças culturais e superstições: são juízos compartilhados por determinado grupo cultural (religioso, político, étnico). As supers- tições geralmente são motivadas por fatores afetivos (desejos, temores) - p.ex.: não comer determinados alimentos em algumas religiões / não passar em baixo de escadas, trevo de qua- tro folhas etc... A) Idéias prevalentes ou sobrevaloradas (alteração patológica) - por conta da importância afetiva (catatimia) adquirem predominância enorme sobre os demais pensamentos, conservando-se obstinadamente em sua mente - diferem das idéias obsessivas, pois são egossintônica – aceitas pelo in- divíduo que se identifica com elas Idéias obsessivas (muito insight) idéias prevalentes delírios (pouco insight) - p.ex.: uma mãe que se preocupa excessivamente com um filho quando este sai, acreditando que ele sempre está em perigo 25 - p.ex.: um amante inseguro que não pára de pensar se sua ama- da realmente o ama , buscando em cada detalhe provas contra esse amor - as idéias prevalentes possuem algumas características importantes: - são sustentadas com grande convicção, porém menos que no delírio - é compreensível a partir das experiências passadas de um indi- víduo e de sua personalidade - causa sofrimento ou disfunção no sujeito e naqueles com quem ele convive - pode eventualmente progredir para um delírio verdadeiro - o paciente não busca ajuda por conta dessas idéias - assemelha-se a convicções religiosas oupolíticas apaixonadas B) O Delírio (alteração patológica) - as idéias delirantes ou delírio são juízos patologicamente falsos – é um erro do ajuizar que tem origem na doença mental - Não é a falsidade do conteúdo da crença que caracteriza o delírio, mas sobretudo a justificativa para a crença e o tipo de evidência que lhe asse- gura que as coisas são assim - os delírios possuem 4 (quatro) características importantes: I – convicção extraordinária – uma certeza subjetiva pratica- mente absoluta II – impossível modificação pela experiência – o delírio é irre- movível III – o seu conteúdo é impossível – aspecto mas frágil para ava- liação IV – é associal – geralmente se trata da produção de um ó ho- mem, ao delirar, o sujeito se desgarra de seu universo cultural, social - Contudo, os delírios podem ocorrer em mais de uma pessoa – delírios compartilhados ou loucura a dois - isso ode ocorrer através do contato entre um sujeito re- almente psicótico ou com transtorno delirante, que ao in- teragir intimamente com uma pessoa influenciável ou com personalidade dependente acaba por gerar o delírio nes- sa ou nessas pessoas Delírio primário (idéias delirantes) x Delírio secundário (idéias deliróides) - é psicologicamente incompre- ensível, impenetrável - Deriva de condições psicologi- camente compreensíveis - origina-se de uma alteração primária do pensamento - estão ligados a alterações de outras funções - A temática delirante está relacionada a um tipo de alteração do humor, denominado humor delirante – período pré-delirante - nesse período o paciente experimenta aflição e ansiedade in- tensas, como se algo terrível fosse acontecer, mas ele não sabe muito bem o que é 26 - o humor delirante cessa quando o sujeito configura o delírio, ou seja, o delírio surge como uma revelação inexplicável do que está acontecendo - p.ex.: Ah, agora eu sei, entendi tudo, aquelas pessoas estão querendo me matar, estão fazendo um complô con- tra mim - muitas vezes o indivíduo se acalma – dúvida x certeza / ansie- dade x delírio - Deve-se pensar no delírio como uma construção, um processo de ten- tativa de reorganização do funcionamento mental – um esforço para li- dar com a desorganização que a doença de fundo lhe traz C) Percepção Delirante (alteração patológica) - Neste tipo, o delírio surge a partir de uma percepção normal, que imedi- atamente recebe significação delirante - p.ex.: um sujeito entra em um recinto com pessoas vestidas com trajes de cor preta (uma percepção real) e imediatamente enten- de que aquilo significa que estão tramando contra a sua pessoa - é vivenciada como uma revelação, uma descoberta abrupta que o leva a entender tudo o que se passa Alguns tipos de Delírios De perseguição (persecutório): o sujeito acredita que é vítima de um complô e está sendo perseguido por pessoas conhecidas ou desconheci- das – é o tema mais frequente De referência (auto-referência): o sujeito apresenta a tendência domi- nante a experimentar fatos cotidianos, fortuitos como referentes à sua pessoa – se alvo frequente e constante de referências depreciativas, ca- luniosas – geralmente ocorre associado à perseguição De influência ou controle: o sujeito vivencia intensamente o fato de es- tar sendo controlado, comandado ou influenciado por pessoa ou entidade externa – algo/alguém controla seus sentimentos, suas funções corporais – também contém um conteúdo persecutório De grandeza, poder: o sujeito acredita ser extremamente especial, dota- do de capacidades e poderes, ter um destino espetacular – pensa que pode tudo, tem poderes e conhecimentos superiores ou especiais – qua- dros maníacos Místico ou religioso: o sujeito afirma ser ou receber mensagens de que é o novo messias, um Deus, um Jesus, um santo poderoso ou até um demônio - não se deve confundir esse tipo de delírio com fanatismo religio- so, fé religiosa De ciúmes, de infidelidade: o sujeito percebe-se traído pelo cônjuge de forma vil e cruel, que o outro tem centenas de amantes – normalmente o indivíduo é extremamente dependente do ser amado – é difícil diferenciar de idéia prevalente 27 Erótico ou Erotomania: o sujeito afirma que uma pessoa de destaque social ou de grande importância para o paciente está totalmente apaixo- nada por ele De conteúdo depressivo: intimamente relacionados a estados depressivos De ruína: o sujeito vive um repleto de desgraças, está condenado à misé- ria, o futuro lhe reserva a ele e a sua família apenas sofrimentos e fracas- sos – pode chegar a creditar que está morto ou que todos estão mortos De culpa e de auto-acusação: o sujeito afirma sem base real, ser culpa- do por tudo de ruim que acontece no mundo e na vida das pessoas que o cercam – ser pessoa indigna, pecaminosa e que deve ser punida Negação de órgãos: relata que o seu corpo está destruído ou morto DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL Idéias prevalentes x idéias delirantes: as idéias delirantes são marcadas por: - convicção extraordinária, certeza subjetiva praticamente absoluta - impossibilidade de modificação da idéia pela experiência - caráter associal, não compartilhado pelo grupo cultural do sujeito Idéias obsessivas x idéias delirantes: - nas idéias obsessivas, o sujeito sofre com elas, tem crítica em relação a seu caráter absurdo - egodistônica - na idéias delirantes falta de modo geral a crítica ao caráter ab- surdo - egossintônica A Afetividade e suas Alterações - A vida afetiva é a dimensão psíquica que dá cor, brilho e calor a todas as vivên- cias humanas - sem a afetividade a vida mental se torna vazia, sem sabor - Define-se afeto como a qualidade e o tônus emocional que acompanha uma idéia ou uma representação – Afetividade é um termo genérico que compreende várias modalidades de vivências afetivas – humor, emoções e os sentimentos Humor ou estado de ânimo - é a disposição afetiva de fundo que penetra toda a experiência psí- quica, a lente afetiva que dá às vivências do sujeito, a cada momento, uma cor particular - esse estado amplia ou reduz o impacto das experiências reais e muitas vezes modifica o seu sentido e a sua natureza - o humor é vivido corporalmente e se relaciona com as funções vegetativas – é somático e psicológico 28 - p.ex.: humor irritado, humor depressivo, humor maníaco ou elevado Emoções - são reações afetivas agudas, momentâneas, desencadeadas por estí- mulos significativos - é um estado afetivo intenso de curta duração, originado como reação do indivíduo a certas excitações internas ou externas, conscientes ou não - é um movimento emergente, uma tempestade anímica que des- concerta, comove e perturba o instável equilíbrio existencial - assim como o humor é uma experiência somática e psíquica - p.ex.: alegria, raiva, susto Sentimento - são estados e configurações afetivas estáveis, são mais atenuados que às emoções em sua intensidade e menos reativos a estímulos passageiros - geralmente estão relacionados a representações, valores e con- teúdos intelectuais - é um estado mais mental que somático – são as idéias que re- presentam os afetos, mas energizadas por esses afetos - p.ex.: tristeza, tesão, amor, culpa ... Paixões - é um estado afetivo extremamente intenso, que domina a atividade psí- quica como um todo - dirige a atenção e o interesse do indivíduo em uma só direção, inibindo os demais interesses - A afetividadepode influenciar as demais funções através do humor, das emo- ções e sentimentos - Catatimia – influência da vida afetiva sobre as demais funções – aten- ção, memória, etc.. - A vida afetiva ocorre sempre num contexto de relações do Eu com o mundo e com as pessoas - denomina-se sintonização afetiva a capacidade do indivíduo ser influ- enciado afetivamente por estímulos externos - denomina-se irradiação afetiva a capacidade do indivíduo em transmi- tir, irradiar ou contaminar os outros com o seu estado afetivo – entrar em sintonia com ele - a impossibilidade ou dificuldade tanto de sintonização quanto de irradia- ção afetiva denomina-se rigidez afetiva - não produz reações afetivas nos outros nem reage diante de uma situação afetiva específica A n s i e d a d e x A n g ú s t i a x M e d o - Ansiedade - é um estado desconfortável, de apreensão negativa em relação ao futuro, uma inquietação interna desagradável 29 - Angústia – assemelha-se a ansiedade, mas tem conotação mais corporal e mais relacionada ao passado – relaciona-se a sensação de aperto no peito e na garganta, de compressão, sufocamento - Medo – diferente da angústia e da ansiedade, o medo se volta a objetos mais ou menos precisos – o medo, quase sempre é medo de algo Alterações Patológicas da Afetividade Alterações do humor Distimia: é o termo que designa alteração básica do humor, tanto no sen- tido da exaltação quanto da inibição – distimia hipotímica e distimia hipertímica Disforia: é a distimia acompanhada de uma tonalidade afetiva desagra- dável, mal-humorada – acompanhada fortemente pela irritação, amargura ou agressividade - irritabilidade patológica – hiper-reatividade desagradável, hostil Puerilidade: alteração do humor que se caracteriza por um aspecto in- fantil, regredido – o sujeito ri ou chora por motivos banais, sua vida afeti- va é superficial, sem afetos profundos Alterações das emoções e dos sentimentos Apatia: é a diminuição da excitabilidade emotiva e afetiva – o paciente não pode sentir alegria, tristeza, raiva nem nada – o indivíduo sabe a im- portância afetiva que determinada experiência deveria ter, mas não con- segue sentir nada (afetos) Anedonia: é um fenômeno muito próximo da apatia e pode ocorrer de forma simultânea – significa a perda da capacidade de sentir prazer Hipomodulação do afeto: incapacidade de modular a resposta afetiva de acordo com a situação existencial – indica rigidez na sua relação com o mundo Inadequação do afeto ou paratimia: reação completamente incongruen- te a situações existenciais – contradição profunda entre a esfera ideativa e a afetiva Embotamento afetivo e devastação afetiva: perda profunda de todo ti- po de vivência afetiva – ao contrário da apatia que basicamente é subjeti- Humor normal Humor hipomaníaco Humor distímico Humor depressivo Humor maníaco / euforia 30 va, o embotamento é observável por meio da postura e da atitude do paciente Labilidade afetiva e incontinência afetiva: são estados nos quais ocor- rem mudanças súbitas e imotivadas de humor, sentimentos ou emoções – não consegue conter de forma alguma suas reações afetivas - geral- mente são bastante desproporcionais, exageradas Fobias: são medos desproporcionais e incompatíveis com as possibilida- des de perigo real oferecidas por desencadeantes chamados situações fobígenas - agorafobia – é o medo de espaços amplos e de aglomerações como estádios, cinemas, congestionamentos, supermercados - fobia social – é o medo de contato com interações sociais, principalmente pessoas pouco familiares e em situações onde se possa sentir examinado ou criticado Pânico: é uma situação de medo intenso, de pavor relacionado geral- mente ao perigo imaginário de morte iminente, descontrole ou desintegração - manifesta-se através de ataques e crise agudas de extrema an- siedade, medo de morte, de perder o controle e de acentuada descarga autonômica - Existem alguns sentimentos que embora considerados normais, em de- terminadas ocasiões e em certo grau podem ter implicações patológicas: - ciúme e inveja A Vontade, a Psicomotricidade e suas Alterações - A vontade é uma dimensão complexa da vida mental, relacionada intimamente com as esferas instintivas, afetiva e intelectiva Instinto: - modo relativamente organizado e complexo de resposta comportamen- tal de uma dada espécie para melhor sobreviver em seu ambiente natural - p.ex.: as reações e os comportamentos associados à fome, ins- tintos de sobrevivência Desejo: - é um querer, um anseio, um apetite de natureza consciente ou não que busca sempre satisfação, é diferente de: - necessidade – são fixas e inatas, independem da cultura e da história individual, não são móveis como os desejos – que dependem da cultura e da história individual Ato volitivo ou ato de vontade: - é traduzido pelas expressões típicas do “eu quero” ou “eu não quero” - como é influenciada pela razão e pelos afetos, distinguem-se em motivos (razões intelectuais) e móveis (influências afetivas) Processo Volitivo: - é dividido em 4 fases distintas: 31 I – Intenção ou propósito – se esboçam as tendências básicas do indivíduo, suas inclinações e interesses – impulsos, desejos e temores inconscientes exercem influência decisiva sobre o ato volitivo – podem ser imperceptíveis para o indivíduo II – Deliberação – ponderação consciente, o indivíduo faz uma análise básica do que seria positivo ou negativo, favorável ou desfavorável III – Decisão propriamente dita – momento culminante do pro- cesso volitivo, instante que demarca o começo da ação, no qual os móveis e os motivos vencidos dão lugar aos vencedores – pré – para a ação – (preparação) IV – Execução – etapa final do processo volitivo – conjunto de atos psicomotores simples e complexos decorrentes da decisão, colocados em funcionamento Atos Impulsivos x Atos Compulsivos - abole as 3 primeiras fases do ato voluntário em função da intensidade do desejo ou dos temores - São egossintônicos, não se tenta evitá-los ou adiá-los - geralmente são associados a im- pulsos patológicos de natureza inconsciente ou à incapacidade de tolerância a frustração - há tentativa de adiá-lo, refrear o ato - são egodistônicos, experenciados como indesejáveis e estranhos ao indivíduo - há sensação de alívio ao se reali- zar o ato - são associados a idéias obsessivas - O ato de vontade pautado por essas quatro etapas é denominado de ação voluntária - O oposto a ação voluntária são os atos impulsivos – espécie de curto circuito do ato voluntário – são as três primeiras fases são abruptamen- te abolidas - Os atos impulsivos diferem-se dos atos compulsivos (quadro anterior) Impulsos e compulsões patológicas Automutilação: impulso ou compulsão seguido de comportamento de autolesão voluntária - a tricotilomania é uma forma de automutilação Frangofilia: impulso patológico de destruir os objetos que circundam o indivíduo Piromania: impulso de atear fogo a objetos, prédios e lugares Impulso ou ato suicida: deve-se sempre investigar em pacientes depri- midos, cronicamente ansiosos, que se apresentam desesperançados ou desmoralizados, entre outros Bulimia: (fome de boi) impulso irresistível de ingerir rapidamente grande quantidade de alimento – após a ingestão há o sentimento de culpa, me- do de engordar e consequente indução de vômito ou uso de laxantesDipsomania: impulso ou compulsão periódica de ingerir grandes quanti- dades de álcool até ficar inconsciente Cleptomania: impulso ou compulsão de roubar, precedido geralmente de intensa ansiedade e apreensão que apenas se alivia quando o indivíduo realiza o roubo – o valor do objeto não é o fator mais importante 32 Jogo patológico: é a compulsão por jogos de azar, fazer apostas, espe- cular com dinheiro, apesar de prejuízos financeiros e sociais percebidos pelo sujeito Compulsão por comprar: o indivíduo sente necessidade premente de comprar objetos sem observar a utilidade, sem ter necessidade ou poder utilizar tais objetos Impulsos ou compulsões da esfera Sexual: são diversos os atos im- pulso ou compulsivos relacionados a essa esfera: - fetichismo, exibicionismo, voyeurismo, froterismo, pedofilia, pe- derastia, gerontofilia, ninfomania, satiríase, zoofilia, necrofilia e coprofilia - compulsão à masturbação, utilização de roupas íntimas do sexo oposto, introdução de objetos na vagina e no ânus Alterações da Vontade Hipobulia / Abulia: é a diminuição ou até abolição da atividade volitiva – o indivíduo não tem vontade para nada, sente-se desanimado, sem “pique” - geralmente está associada a apatia, são típicas em quadros depressivos Negativismo: oposição às solicitações do meio – nega-se a colaborar, opõem-se ao contato interpessoal – sitiofobia, mutismo - geralmente em quadros de esquizofrenia (catatônica) e quadros depressivos graves Obediência automática: oposto ao negativismo, perde-se a autonomia e a capacidade de conduzir seus atos volitivos Fenômenos em eco (ecopraxia, ecolalia, ecomimia e ecografia): o in- divíduo repete de forma automática o entrevistador ou pessoa do meio Alterações da Psicomotricidade - A psicomotricidade são as alterações finais do ato volitivo Agitação psicomotora: é a aceleração e exaltação de toda a atividade motora do indivíduo – é uma das mais comuns e está ligada a um taqui- psiquismo geral - geralmente está associada quadros maníacos, episódios esqui- zofrênicos agudos, quadros paranóides e em síndromes demen- ciais e orgânicas Lentificação psicomotora: reflete a lentificação de toda a atividade psí- quica (bradpsiquismo), toda a atividade voluntária torna-se lenta, difícil, “pesada” Estupor: é a perda de toda a atividade espontânea, que atinge o indiví- duo globalmente em um estado de consciência aparentemente preserva- do e de capacidade sensório motora para reagir ao ambiente - o indivíduo geralmente fica restrito ao leito e pode chegar a de- fecar e a urinar no local, não se alimenta e se lá deixado, fatal- mente irá falecer 33 - estupor melancólico – em quadros depressivos, geralmente hipotônico - estupor histriônico – relacionado a fatores psicogênicos com- preensíveis – reação emocional e fisionômica de perplexidade - estupor catatônico – o enfermo permanece imóvel, não reage aos estímulos mais intensos nem manifesta movimentos de defesa Estereotipias motoras: são repetições automáticas e uniformes de de- terminados ato motor complexo, indicando marcante perda do controle voluntário - o indivíduo repete o mesmo gesto com as mãos dezenas ou centenas de vezes em um mesmo dia - maneirismo – tipo de estereotipia motora caracterizada por mo- vimentos bizarros repetitivos, geralmente complexos e esdrúxulos Tiques: são atos coordenados, repetitivos, breves e intermitentes, em ge- ral envolvendo um grupo de músculos - acentuam-se muito com a ansiedade - a maioria é reflexo condicionado que surgiu associado a deter- minados estímulos emocionais ou físicos - são comuns em crianças ansiosas e podem ocorrer em pessoas sem qualquer alteração mental Conversão: são sintomas físicos de origem psicogênica (podendo haver paralisias, anestesias, parestesia, cegueira) - ocorre geralmente em situação estressante, de ameaça ou con- flito intrapsíquico ou interpessoal significativo para o indivíduo – geralmente ocorre na histeria Apragmatismo ou hipopragmatismo: é a dificuldade ou incapacidade de realizar condutas volitivas e psicomotoras minimamente complexas como cuidados higiênicos ou outras tarefas produtivas básicas em seu meio – não há incapacidade neurológica para a realização - já na apraxia a incapacidade decorre sempre de lesões neuro- nais - corticais A Linguagem e suas Alterações - A linguagem é o principal instrumento de comunicação dos seres humanos – fundamental na elaboração e na expressão do pensamento Funções da linguagem: - função comunicativa – garante a socialização do indivíduo - suporte do pensamento – função auxiliar ao pensamento - instrumento de expressão das emoções – das vivências internas, subjetivas - dimensão artística e lúdica – poesia, literatura 34 Alterações da Linguagem Alterações secundárias a lesão neuronal identificável Afasia: é a perda da linguagem falada e escrita, por incapacidade de compreender e utilizar os símbolos verbais - é sempre a perda de habilidade linguística que foi previamente adquirida no desenvolvimento cognitivo – deve-se a lesão neuro- nal no SNC a) Afasia de expressão ou de Broca – apesar do órgão fonador preservado, o indivíduo não consegue falar ou fala com dificuldades - a compreensão da linguagem está relativamente preservada; b) Afasia de compreensão ou de Wernicke – o indivíduo conti- nua podendo falar, mas sua fala é muito defeituosa e às vezes in- compreensível – o paciente não consegue compreender a lingua- gem (falada e escrita) c) Global – tipo grave de afasia – lesões amplas Parafasias: são formas mais discretas de déficits de linguagem, nas quais o indivíduo deforma determinadas palavras (ocorre no início das síndromes demenciais) - p.ex.: designar cadeira de “cameila”, livro de “ibro” Agrafia: é a perda, por lesão orgânica, da linguagem escrita, sem que haja qualquer déficit motor ou perda cognitiva global Alexia: é a perda, de origem neurológica, da capacidade previamente adquirida para a leitura Disartria: é a incapacidade de articular corretamente as palavras, devido a alterações neuronais referentes ao aparelho fonador - a fala é pastosa, aparentemente “embriagada”, de difícil compreensão Disfonia e Disfemia: são alterações da linguagem, da fala produzida pela mu- dança na sonoridade das palavras - Afonia (disfonia): o indivíduo não consegue emitir qualquer pa- lavra, som ou palavra – é causada por uma disfunção do apare- lho fonador ou um defeito na respiração – é de causa orgânica - Afemia (disfemia): é como a afonia, mas está relacionada a conflitos e fatores psicogênicos – geralmente associada a esta- dos emocionais intensos - Gagueira (disfemia): trata-se da dificuldade ou da impossibili- dade de pronunciar certas sílabas no começo ou ao longo de uma frase, com repetição ou intercalação de fonemas, ou apenas trepidação na elocução - pode ocorrer tanto devido a defeitos mecânicos da fo- nação (excessiva rapidez de emissão da voz, uso de tons inadequados, respiração viciosa) como devido a fatores emocionais – timidez, ansiedade 35 Dislalia: é uma alteração da linguagem falada que resulta da deforma- ção, da omissão ou da substituição dos fonemas, podendo ser: - orgânicas – resultam de defeitos na língua, dos lábios, da abó- bada palatina ou de qualquer outro componente do aparelho fonador - funcionais – não se observam alterações orgânicas do apare- lho fonador, sendo asua origem geralmente psicogênica – por conflitos interpessoais ou por imitação Alterações da linguagem associadas a transtornos psiquiátricos primários Logorréia, taquifasia e loquacidade: existe produção aumentada (logor- réia) e acelerada (taquifasia) da linguagem verbal, um fluxo incessante de palavras e frases, podendo haver perda da lógica do discurso - na loquacidade o aumento não sofre qualquer prejuízo da lógica do discurso Bradifasia: é uma alteração da linguagem oposta à taquifasia – o pacien- te fala muito vagarosamente, as palavras seguem-se umas às outras de forma lenta e difícil Mutismo: ausência de resposta verbal oral por parte do paciente, embora ele pudesse fazê-lo – os fatores podem ser de natureza neurobiológica, psicótica ou psicogênica - é uma forma de negativismo verbal, de se opor à solicitações do ambiente Ecolalia: é a repetição da última ou das últimas palavras que o entrevis- tador, ou alguém do ambiente, falou ou dirigiu ao paciente Palialia: é a repetição automática e estereotipada pelo paciente, da últi- ma ou últimas palavras que ele mesmo emitiu em seu discurso Logoclonia – repetição automática e voluntária das últimas síla- bas que pronunciou - ocorrem principalmente em quadros demenciais Tiques Verbais ou fonéticos: são produções de fonemas ou palavras de forma recorrente, imprópria e irresistível – geralmente sons guturais, ab- ruptos e espasmódicos coprolalia – é a emissão de palavras obscenas, vulgares ou rela- tivas a excrementos - são observadas na síndrome de Giles De La Tourrete Verbigeração: é a repetição, de forma monótona e sem sentido comuni- cativo aparente, de palavras, sílabas ou trechos de frases Mussitação - é a produção repetitiva de uma voz muito baixa, murmurada, em tom monocórdico, sem significado comunicativo – o paciente fala “para si”, apenas movendo discretamente os lábios 36 Funções Psíquicas Compostas - São funções que resultam de uma somatória de atividades e capacidades men- tais, entre elas destacam-se: - Consciência do Eu - Personalidade (será estudada junto com transtornos de personalidade) - Inteligência (não será estudada) Consciência do Eu - Estão relacionadas à origem e o desenvolvimento do eu, ou seja, relacionadas ao processo de diferenciação entre Eu e o não-EU - A criança forma gradativamente o seu eu através: - do contato contínuo com a realidade e a consequente submis- são à suas vicissitudes - do investimento amoroso e narcísico dos pais sobre ela - projeção dos desejos inconscientes dos pais sobre ela e a sua consequente assimilação desses desejos - identificação da criança com os pais, estes são tomados como modelo e introjetados - A consciência do Eu surge do sentimento de oposição entre o Eu e o mundo, pressupõe a tomada de consciência do próprio corpo, do “Eu físi- co” – esquema de imagem corporal Características do Eu segundo Jasper (1979) - Consciência de atividade do Eu - Consciência de unidade do Eu - Consciência da identidade do Eu no tempo - Consciência da oposição do Eu em relação ao mundo Consciência de atividade do Eu - trata-se da consciência íntima de que, em todas as atividades psíquicas que ocorrem, é o próprio Eu que as realiza e a presencia - personalização - fenômeno no qual se percebe em todas as atividades psíquicas um tom especial de “meu”, de “pessoal”, daquilo que é feito e vi- venciado por mim mesmo Alteração da consciência da existência - consiste na suspensão da sensação normal do próprio Eu, corporal e psíquico – é a condição na qual o homem existindo já não pode mais sentir a sua existência - p.ex.: Sou apenas uma máquina, um autômato / sinto-me como um nada, um morto Alteração da consciência de execução - nessa condição, o paciente ao pensar ou desejar alguma coisa, sente, porém que de fato foi outro que pensou ou desejou tais pensamentos ou desejos e os impôs de certa maneira 37 - os pensamentos podem ser vivenciados como feitos e impostos por alguém ou algo externo – roubo de pensamento – vivência de influência Despersonalização - é o sentimento de perda ou de transformação do Eu – vivência de es- tranhamento e infamiliaridade consigo mesmo - há uma sensação intensa de estranhamento com o seu próprio corpo – despersonalização corporal - pode haver perda de relação de familiaridade com o mundo co- mum, pessoas e lugares parecem estranhos – desrealização – as coisas, tudo parece estranho Consciência de unidade do Eu - trata-se da consciência de que o Eu é sentido como algo uno e indivisí- vel, ainda que haja ambivalência de sentimentos ou conflitos internos - na alteração desse tipo de consciência, o indivíduo se sente radicalmen- te dividido, sente-se anjo e demônio ao mesmo tempo, ou homem e mu- lher simultaneamente - difere da dissociação psíquica porque o indivíduo não alterna entre duas possibilidades, ele é as duas possibilidades distintas ao mesmo tempo Consciência de identidade do Eu no tempo - alguns pacientes relatam que atualmente em comparação à sua vida anterior (em especial antes do início da psicose) já não são a mesma pessoa - ao descrever a minha história, tenho consciência de que apenas uma parte do meu Eu atual vivenciou tudo isso que aconteceu no passado Consciência da oposição do eu em relação ao mundo - é a consciência da clara oposição do Eu ao mundo externo – separação entre o Eu subjetivo e o espaço externo - na alteração desse tipo de consciência, o indivíduo sente que o seu eu se expande para o mundo exterior e não mais se diferencia desse - isso leva os enfermos a buscarem identificações em objetos e coisas do mundo inanimado – ele pode “sentir”, situar objetos ex- ternos dentro dele – não existe barreira entre o eu e o mundo ex- terno, há certa permeabilidade – transitivismo - é possível observar esse tipo de alteração da consciência do eu em alterações tais como: eco do pensamento, publicação do pensamento, sonorização do pensamento - Pode ser observado também em fenômenos culturais como o êxtase religioso, meditação profunda e no fenômeno da possessão 38 Ilustração de Caso – Exame psíquico A paciente é do sexo feminino, nasceu no interior do Mato Grosso, possui atualmente 23 anos de idade e aos 20 começou a apresentar os primeiros sinto- mas psicóticos quando cursava o primeiro ano de Direito. A partir de então, pas- sou a se isolar progressivamente da família e dos amigos, queixando-se de se sentir triste. Havia perdido o apetite e o estado da paciente foi piorando progres- sivamente, passando também a ter insônia. Foi levada para a consulta com um médico clínico que lhe prescreveu Diazepam® para ser tomado no período notur- no. A paciente teve melhora do sono, mas começou a dizer que seus amigos de faculdade haviam se unido aos seus vizinhos para humilhá-la e que o tom de voz dos professores estava esquisito. Passava pelos corredores da universidade e percebia que seus colegas “faziam-lhe sinais obscenos”. Em casa passou a ficar cada vez mais isolada e deixou de assistir TV, pois achava que estavam divul- gando notícias sobre ela. Começou a se queixar de que não podia tomar banho, pois os vizinhos a estavam observando através de uma câmera. Passou a procu- rar microfones ocultos pela casa porque sentia que estava recebendo algum tipo de transmissão de rádio que afetava o seu raciocínio, além disso, dizia que ouvia vozes comentando as transmissões. Decidiu então
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