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Psicopatologia O QUE É A PSICOPATOLOGIA? É o estudo dos fenómenos psicopatológicos. Um fenómeno é sempre biológico na sua raiz e social. Na sua extensão final. Mas não nos devemos esquecer, também, de que, entre esses dois, ele é mental. O conceito de saúde mental segundo a OMS: Modelo biopsicossocial Saúde é um estado de completo bem-estar físico, mental e social e não apenas a ausência da doença ou de enfermidade. CONCEITOS BÁSICOS PARA ENTENDER A PSICOPATOLOGIA: PSIQUIATRIA: É o ramo da medicina que se ocupa com os transtornos mentais e da conduta explícitos, com o propósito de estudá-los, classificá-los, trata-los e preveni-los. Lida com a prevenção, atendimento, diagnostico tratamento e reabilitação das doenças mentais em humanos, sejam elas de carater orgânico ou funcional. A meta principal é o alívio do sofrimento psíquico e o bem-estar psíquico. PSICOLOGIA: É o ramo da ciência que estuda de modo sistemático a vida psíquica (normal)- os processos mentais (pensamentos, perceções, sensações, emoções, representações mentais) e que habitualmente adota/”abraça” intervenções em casos de desvio de normalidade. Estuda também o comportamento humano e animal, nos sus aspetos e condutas observáveis, que podem ser medidos, testados, compreendidos, controlado, descritos e preditos objetivamente. PSICOPATOLOGIA: É o ramo da ciência que trata da natureza essencial da doença mental: as mudanças estruturais e funcionais associadas a ela e ás suas formas de manifestação. Conhecimento semiológico da psiquiatria (semiologia é a parte da medicina que trata dos sintomas ou sinais das doenças permitindo ao profissional de saúde identificar alterações físicas e mentais, ordenar os fenómenos observados, formular diagnósticos e estabelecer métodos de tratamento). Parte da psicologia que estuda as variações mórbidas do psiquismo. Estuda-se a patologia do psíquico, as alterações metais. UMA VISÃO PSICOPATOLÓGICA DOS PROBLEMAS DEVERÁ INTERESSAR-SE POR QUATRO ASPETOS CENTRAIS: o Os comportamentos enquanto componente externalizável da conduta, dizendo respeito à presença do ser-no-mundo; o As vivências, enquanto experiências vividas pelo próprio, dotadas de singularidade e dinamismo irrepetíveis; o Os estados de perturbação do funcionamento psicológico, nas suas vertentes afectiva, cognitiva e relacional; o O encontro, no sentido existencial, do Homem perturbado consigo mesmo e com os outros, visando «compreender-se», isto é, situar-se em relação às suas próprias condutas e evidenciar em cada uma delas a intencionalidade com que as orienta e subentende (como é que o doente se relaciona consigo e com os outros?). Ela tenta, especialmente, estabelecer a diferença entre o normal e o patológico (NORMALIDADE VS. DESVIO). Dicionário: Sintoma: é toda a informação descrita pelo paciente, a partir das suas vivências, sensações e impressões. Não é passível de confirmação pelo examinador, já que é uma sensação do paciente ex: mau-estar. Anamnese: é a via através da qual a semiologia visa elucidar, investigar e analisar os sintomas. Constrói-se assim a história clínica do paciente. No caso específico da psicopatologia refere-se à entrevista conduzida pelo profissional de saúde com o seu paciente. Esta entrevista pode ter diversos objetivos, dentre eles ser um ponto de partida para o estabelecimento de um diagnóstico (ou seja, a demarcação de um quadro clínico). Sinal: refere-se a toda a alteração objetiva que é passível de ser percebida pelo examinador (ex. um tique, um gesto repetitivo) Nosologia: é o ramo da medicina que estuda, trata das doenças em geral e ainda as classifica do ponto de vista explicativo, isto é, em função dos seus mecanismos ou da sua etologia) NORMALIDADE E DESVIO Conceito de normalidade Conceito complexo Pode ser perspetivado em função de diferentes dimensões: patológica, estatística e social. DIMENSÃO PATOLOGICA: Normalidade ou saúde é entendida como ausência de disfunção, incapacidade ou doença. Desvio é entendido como disfunção, incapacidade ou doença. Dicotomia: a saúde ou normalidade está presente ou ausente. DIMENSÃO ESTATISTICA: A normalidade em relação a uma determinada condição, por exemplo, deficiência mental, hipertensão, obesidade, é definida em função da sua distribuição numa população. Desvio será tudo o que se afasta da distribuição considerada normal para essa população. DIMENSÃO SOCIAL: Normalidade é definida em função dos valores que determinam normas para um determinado grupo social. Nesta dimensão é possível analisar duas conceções do conceito de desvio: uma conceção tradicional ou positivista e uma conceção moderna. Na conceção tradicional enquadram-se definições como: a) A violação de normas ou expectativas sociais, desde que inclua qualquer comportamento que suscite reprovação ou indignação dos outros (por ex: crime) b) Um comportamento que é fortemente desvalorizado pela sociedade (por ex: é possível enquadrar como desviante, problemas como a doença mental, a deficiência visual ou a deficiência auditiva) Na conceção moderna: O comportamento desviante não representa já uma qualidade do ato do indivíduo que o pratica, mas é antes uma consequência da aplicação da designação desviante aqueles que alegadamente violaram determinadas normas legais, éticas ou morais PRESPETIVA TRADICIONAL: O comportamento desviante é algo concreto O comportamento pode ser analisado em termos objetivos permitindo uma distinção clara entre o comportamento desviante e o comportamento não desviante ou de conformidade com as normas em causa. PERSPETIVA MODERNA: Não se centra nas causas do comportamento desviante, mas sim no significado deste comportamento e na interação entre o sujeito ao qual é atribuído o comportamento desviante e os outros, aos quais são atribuídos comportamentos de conformidade. Deslocamento do enfoque no indivíduo para a sociedade, ou seja, a caracterização do comportamento desviante depende dos valores, normas, princípios éticos ou legais válidos na sociedade e na cultura na qual o indivíduo se insere. Em suma: A avaliação da normalidade/ saúde vs psicopatologia segue os seguintes critérios: − Universalidade − Intensidade dos sintomas − Frequencia dos sintomas − Impacto social e ocupacional FENÓMENOS PSICOPATOLÓGICOS O Funcionamento Psicológico assenta em variadas funções Psicológicas: Em cada uma delas pode surgir a perturbação. Objectivo: Observar, Identificar, Descrever, Caracterizar as principais perturbações do funcionamento psicológico, sempre do ponto de vista da vivência do sujeito. PERTURBAÇÕES AO NÍVEL DAS FUNÇÕES PSICOLÓGICAS: Consciência Orientação Memória Atenção Perceção Pensamento Linguagem Comunicação não verbal Competência Social Inteligência Inteligência Emocional Afetos e emoções Comportamento Aberto: o Movimento o Alimentação o Sexualidade o Sono Moderadores (influencia a força de uma relação ): Idade, género, estatuto socioeconómico, etnia, características Biológicas Mediadores (identifica e explica uma relação entre duas variáveis ): Competência pessoais e sociais, coping, resiliência, traços de personalidade, contextos, eventos de vida... PERTURBAÇÕES DA CONSCIÊNCIA: Consciência: Conjunto de memórias psicológicas que num determinado momento permitem o conhecimento do próprio eu e da vida exterior. 2 dimensões fundamentais: − Consciência da realidade externa/Consciência do mundo − Consciência da realidade interna/ Consciência de si PERTURBAÇÕES QUANTITATIVAS: Alterações da função, da forma ou da estrutura da Consciência que resultam de perturbações ao nível do ritmo de Vigília /Sono, nomeadamente em termos deduração/intensidade: Hipervigilidade: O Sujeito dorme pouco, está excessivamente desperto (Situações de medo e ansiedade, perturbações afetivas, consumo de substâncias estimuladoras do SNC como a cocaína) Hipovigilidade: Nível de vigília diminuída (“embotamento”) (fatores orgânicos cerebrais - Distúrbios mentais resultantes de disfunção transitória ou permanente de tecido cerebral, os quais são atribuíveis a fatores orgânicos, perturbações afetivas como a perturbação bipolar e a depressão) PERTURBAÇÕES QUALITATIVAS Em termos de conteúdo o sujeito consciente: A) Capta os seus próprios processos corporais B) Capta os seus próprios processos psicológicos C) Capta o mundo externo EXISTE, PORTANTO, A POSSIBILIDADE DE PERTURBAÇÃO A 3 NÍVEIS: a) Perturbações da consciencia do corpo: O corpo é objeto de várias preocupações que podem degenerar em patologia: - Dismorfofobias (preocupações com o corpo ligadas à estética) - Hipocondria (preocupações com o corpo ligadas à saúde) b) Perturbações da consciência do eu mental - Despersonalização: perda de sentido da realidade interna (sentimentos de irrealidade, de rutura com a personalidade, processos amnésicos e apatia; transtorno bipolar, transtorno de personalidade borderline, depressão, esquizofrenia, stresse pós-traumático e ataques de pânico) c) Perturbações da consciência do mundo exterior - Desrealização: Perda de sentido da realidade externa (Na desrealização, o paciente descreve a sensação de que existe uma neblina ou parede de vidro que o separa dos seus arredores e do seu ambiente.) PERTURBAÇÕES DA ORIENTAÇÃO Orientação: Capacidade individual de situar-se quanto a si mesmo (o que inclui as relações de proximidade e diferença em relação ao outro) e ao ambiente (espaço e tempo). Está relacionada com o funcionamento da consciência. 2 DIMENSÕES FUNDAMENTAIS DA ORIENTAÇÃO OBJETIVA: • Temporal (hora, dia, mês, ano) • Espacial (Lugar, cidade) • Pessoal/ Autopsíquica (Orientação do indivíduo em relação a si mesmo; Identidade própria: o sujeito sabe quem é, idade, data de nascimento, profissão, estado civil e etc.) • Situacional /Alopsíquica (situacional: Capacidade de orientar-se em relação ao mundo, isto é, quanto ao espaço (orientação espacial) e quanto ao tempo (orientação temporal). SUBJETIVA: • Vivência do tempo (interior, pessoal) vs tempo objetivo (exterior, cronológico, mensurável). • Vivência do espaço (espaço subjetivo- a minha vivência pessoal) vs características físicas do espaço. PERTURBAÇÕES DA ORIENTAÇÃO OBJETIVA: DESORIENTAÇÃO: Perda de capacidade para se situar corretamente em termos de tempo e lugar por: CONFUSIONAL OU AMENSIAL (turvação da consciência: redução do estado de alerta e confusão mental) AMNÉSIA (Turvação da memória: devido a prejuízo da memória) DELIRANTE (Turvação do juízo: secundária a pensamento delirante) APÁTICA (Turvação da vontade: desinteresse extremo pelo mundo exterior) PERTURBAÇÕES DA ORIENTAÇÃO SUBJETIVA: ALTERAÇÕES DA VIVÊNCIA DO TEMPO - PERDA DA REALIDADE DO TEMPO/ PERDA DA CONSCIÊNCIA DO TEMPO (falta a consciencia de um contínuo temporal) - TEMPO IDENTIFICADO (estados depressivos) ou ACELERADO (estados maníacos ou de ansiedade) - PERDA DO FUTURO (impossibilidade de considerar o futuro) - IMOBILIZAÇÃO DO TEMPO (paragem do tempo; “o tempo parou”) - DESCONTINUIDADE DO TEMPO (o tempo acelera- se ou então para podendo inclusivamente retroceder ou então falhar de forma intervalada). ALTERAÇÕES DA VIVENCIA DO ESPAÇO - ALTERAÇÕES DA AMPLITUDE DO ESPAÇO VIVIDO (como o paciente vive o mundo- o espaço vivido pode ser deformado, inibido e constrito diante um horizonte de possibilidades; no estado depressivo tende a haver um estreitamento da vivência espacial) - ALTERAÇÕES DO ESPAÇO AFETIVO (como me relaciono com o espaço; a tonalidade do espaço vivido é função do humor; estados fobicos há um estranhamento- perda de intimidade- com certas regiões do espaço) PERTURBAÇÕES DA ATENÇÃO/ CONCENTRAÇÃO A ATENÇÃO tem a ver com a orientação (ativa ou passiva) da consciencia para algo que se experimenta. A CONCENTRAÇÃO é a persistência concentrada da atenção. INTENCIONALIDADE: ATENÇÃO ATIVA: Controlo cognitivo direto, voluntario (esforço de concentração) ex: estudar, vamos fazer um esforço para nos concentrarmos. ATENÇÃO PASSIVA: Involuntária, suscitada por estímulos significativos. Ex: movimento reflexo. PROCESSOS: - Alerta: Resposta comportamental fisiológica à entrada de estímulos. - Focalização: Ter a capacidade de focar num elemento relativamente aos restantes. - Ativação: Preparação, intenção comportamental. PERTURBAÇÕES: INATENÇÃO: Dificuldade ou incapacidade para prestar atenção a estímulos externos. Origem orgânica (estados agudos orgânicos- lesão cerebral difusa). Origem psiquiátrica (concomitante com psicopatologia: esquizofrenia- impossibilidade de atenção ativa pela fixação nas vivências interiores) DISTRATIBILIDADE: Dificuldade em manter a atenção focalizada num estímulo: o sujeito irá distrair-se com facilidade, ou seja, a atenção foca-se por pouco tempo, em múltiplos estímulos. Origem orgânica ( intoxicação por álcool e drogas: fadiga e influencia de sedativos) origem psicológica ( estados maníacos- um maníaco cheio de ocorrências, ideias e impulsos tem dificuldade em fixar e manter a sua atenção sobre determinada coisa.) HIPERPROSEXIA/FIAXAÇÃO: A atenção concentra-se num determinado estímulo e fica nesse estímulo, ou seja, foca-se demasiado tempo nesse estímulo. EX: depressão grave e hipocondria. PERTURBAÇÕES DA MEMÓRIA A memória é um conjunto de processos psicológicos que consiste na nossa capacidade de fixar e reter os factos com a possibilidade subsequente quer do seu esquecimento, quer da sua evocação. PROCESSOS FUNDAMENTAIS: Fixação: relacionada com a memória a curto prazo. Evocação: relacionado com a memória a longo prazo. Dimensão temporal: Aquilo que ouvimos no momento Memória imediata Memoria a curto prazo Memoria a longo prazo Lembrarmo-nos daqui a 3/4 meses Lembramo-nos durante muito tempo Diferentes níveis de perturbação: o Patologia da fixação o Patologia da evocação o Patologia da conservação PRETURBAÇÕES QUALITATIVAS: Paramnésias: Alterações em termos do memorizado. Ex: Distorções da memória- recordações deficitárias ou distorcidas; Ocorrência de uma ideia memorizada como inteiramente original.; Evocação súbita de imagens com tal intensidade que parecem vividas no presente. PERTURBAÇÕES QUANTITATIVAS HIPERMNÉSIAS: Capacidade invulgar de evocar um determinado acontecimento. Demasiada informação dita. Incremento anormal da capacidade de evocação (estados febris, indução por drogas, vivências relativas a acidentes que põem em perigo a vida- quedas de lugares altos, vivências de morte eminente). HIPOMNESIAS: Diminuição parcial da memoria ao nível da fixação. no que diz respeito ao tempo e ao conteúdo (lacunas de memória limitadas em relação ao conteúdo ou ao tempo). As causas podem ser orgânicas (ex. um acidente que causa uma lesão cerebral; embriaguez patológica) ou psicogénicas ( situações afetivas excecionais tais como estados intensos de terror, medo, pânico, furor ou desesperação- há quase sempre um estreitamento da consciência e depois uma amnésia parcial ) AMNÉSIAS: Perda total de recordações referentes a um determinado acontecimento ou período de tempo. (analisar: origem, intensidade, natureza, extensão, causas) A amnésia pode acontecer na síndrome psicorgânica ou mnéstica., nas lesões cerebrais difusas (que atingem todo o cérebro), de etiologia vária, é primeiramente afetada a memória recente, enquanto a memória remota se conserva durante mais algum tempo. Nesta síndrome podemosdiferenciar 3 fases: 1) modificações negativas do caráter 2) degradação intelectual e alterações dos afetos 3) destruição muito grave das funções intelectuais, cognitivas, mnésticas, afetivas até um estado meramente vegetativo. Síndrome de Korsakoff preenchem-se as lacunas da memória mediante confabulações. Estas formam-se compulsivamente preenchendo os vazios da memória. Pensa-se que servem para o restabelecimento da continuidade mnésica. O próprio paciente considera-se como recordações. A “diminuição da memória” é uma queixa muito frequente em estados depressivos de todo o tipo. Não se deve “atribuir” esta má memória aos sentimentos de insuficiência depressiva, mas o facto é que é efetivamente difícil aos depressivos recordarem-se. O depressivo grave já não dispõe plenamente do seu potencial intelectual (pseudodemência). PERTURBAÇÕES DA PERCEÇÃO A perceção é a tomada de consciencia de dados sensoriais concretos do mundo interno e exterior. A ter em conta: Elemento sensorial/ significado psicológico. As perturbações da perceção estão fortemente ligadas às perturbações do pensamento. A PERCEÇÃO É UM PROCESSO QUE ENVOLVE 3 FASES: 1. EXISTÊNCIA DE UM EVENTO SENSORIAL (por exemplo, um objeto, uma música, um aroma) 2. PERCEÇÃO SENSORIAL, em que os órgãos sensoriais captam o evento (por exemplo, ao ver um objeto, ao ouvir uma música ou ao cheirar um aroma); esta fase depende do bom funcionamento dos órgãos sensoriais 3. PERCEÇÃO COM SIGNIFICADO em que à perceção sensorial é atribuído um significado (por exemplo, quando se tem a noção de que se está a ouvir uma música ou a ver determinado objeto). QUANDO HÁ PATOLOGIA DA PERCEÇÃO AS PRINCIPAIS ÁREAS A SEREM AFETADAS SÃO: - Consciência do objetivo (ao termos consciente um dado estamos conscientes da perceção; o dado surge-nos com caráter de objeto- ou seja, com carater de corporalidade e de objetividade). - Juízo da realidade (a nossa consciência estabelece um juízo de realidade sobre tudo o que apreendemos, classificando-o em verdadeiro ou não). CONSCIENCIA DE OBJETO VS JUÍZO DE REALIDADE A diferença entre consciência de objeto e juízo de realidade surge claramente no exemplo dados pelas miragens: vê-se fisicamente um lago (como objeto e, portanto, como se fosse realmente um lago); no entanto, imediatamente se considera que o referido lago não é real (juízo de realidade). QUANDO HÁ PATOLOGIA DA PERCEÇÃO AS PRINCIPAIS ÁREAS A SEREM AFETADAS SÃO: - Configuração: percecionar o todo e as partes - Conteúdo interpretativo/consciencia do significado (a configuração do que é percecionado possui para nós um determinado significado situacional e biográfico e por isso também uma ressonância afetiva; temos perante nós o que é percecionado, com um determinado significado – consciência de significado) - Experiência do mundo/relação da perceção com a realidade (real é o que é percetível e sobre o qual estão livremente de acordo os indivíduos sãos e sem preconceitos; a perceção é um compromisso entre uma função fáctica (objetiva) e uma visão subjetiva (própria da personalidade; para o Homem não existe uma visão “pura” da realidade; o extremo é representado por uma conceção autística-desreal do mundo no delírio e nas alucinações) As perturbações da perceção dividem-se em dois grupos: 1) Distorções das perceções ou distorções sensoriais (existe um objeto real cuja perceção é distorcida) - Quantitativas: hiperpercepção/hiperestesia; hipopercepção/hipostesia - Qualitativas: deformações espaciais; estranheza do percebido 2) Falsas perceções (correspondem a falsas perceções que podem surgir na ausência de estímulo (fenómenos alucinatórios), ou em resposta a um estímulo (ilusões)) - Ilusões - Alucinações PERTURBAÇÕES QUANTITATIVAS DA PERCEÇÃO: MUDANÇA DOS NÍVEIS DE PERCEÇÃO HIPERPERCEÇÃO/ HIPERESTESIA: Estado psicológico em que as perceções que o sujeito tem são mais numerosas e intensas que o habitual. (estados de hipervirilidade, intoxicação por substâncias, estados ansiosos) A intensidade da perceção está aumentada. Significa que as vivências percetivas são mais ricas, vivas e coloridas, do que o habitual. Ocorre na mania e sob a ação de alucinogénios. → Hiperestesia auditiva: pode ocorrer em situações como a enxaqueca ou a depressão em que, embora não haja uma real melhoria da acuidade auditiva, há uma redução do limiar a partir do qual o som passa a ser incomodativo. → Hiperestesia Visual: pode ocorrer na intoxicação por determinadas drogas ou na mania. HIPOPERCEÇÃO/HIPOSTESIA: Estado psicológico em que as perceções que o sujeito tem são menos numerosas e intensas que o habitual. Causas orgânicas: deterioração das capacidades cognitivas; Causas psíquicas: estados depressivos, estados confusionais. A intensidade da perceção está reduzida. O caráter da perceção é menos vivo e nítido do que habitualmente, que tudo se apresenta insipido e cinzento e pálido, incolor, coberto, como que envolto em nevoeiro. Pode ocorrer no delirium em que existe um aumento do limiar para todas as sensações, mas também nos depressivos (depressões graves de natureza diversa), num esgotamento geral grave e sob doses elevadas de neurolépticos. Está ligada à despersonalização. PERTURBAÇÕES QUALITATIVAS DA PERCEÇÃO: MUDANÇA DA QUALIDADE DA PERCEPÇAO DO OBJETO. ESTRANHEZA DO PERCEBIDO: O sujeito perceciona o mundo, as coisas ou até a ele próprio como estranhos, irreais, insólitos (está relacionado com a despersonalização e a desrealização) Esta relacionada com a perturbação da consciencia. → Desrealização: (o meio envolvente surge como irreal, nebuloso, estranho e insólito; esquizofrenia, ocasionalmente em depressivos e em determinadas perturbações da personalidade como o estado-limite) → Sensação de distância ou proximidade insólitas: sensação de um hiato ou vazio insólito entre o objeto percecionado e o sujeito que o perceciona; existem relações com a despersonalização – não apenas o meio envolvente aparece como estranho e afastado como igualmente o doente se sente a si próprio como estranho, distanciado e sem se conseguir aproximar dos objetos; surge nas psicoses por alucinógenos e na esquizofrenia) → Sinestesia: Associação de perceções em várias áreas sensoriais; perceção acústico-visual e a contemplação de cores (sinestesia auditivo-visual); são frequentes nas psicoses psicadélicas. → Falso reconhecimento/”deja vu”: Impressão de familiaridade de uma experiência de perceção, em si nova. Com frequência surgem associadas à desrealização e à despersonalização; não são um sinal especificamente patológico (surgem também em indivíduos sãos). DEFORMAÇÕES ESPACIAIS: São alterações das características dos objetos percecionados, nomeadamente na esfera visual: o sujeito perceciona o objeto aumentado, diminuído (predominantemente causa orgânica). Perceção alterada da cor, da dimensão e da forma dos objetos (também perceção alterada sobre o próprio - distorção da imagem corporal) → Alterações da cor: geralmente são distorções visuais secundárias ao consumo de substâncias tóxicas, em que o todo o campo visual fica mais intenso e com cores alteradas, podendo ocorrer xantopsia (amarelo), cloropsia (verde), eritropsia (vermelho) → Alterações da dimensão ou dismegalopsia: Ocorrem sobretudo em doentes com lesões temporais e parietais, na epilepsia, ou raramente na esquizofrenia; pode haver aumento (macropsia ou megalopsia) ou redução (micropsia) dos objetos do campo visual → Alterações da forma ou dismorfopsias: perceção deformada da forma ou figura de um objeto – pode ocorrer na esquizofrenia. → Alterações Relativas ao próprio corpo o Autometamorfopsia: percepção alterada sobre o próprio corpo ou membros isolados do mesmo (ex. os pés parecem estar auma distância de quilómetros e, contudo, serem gigantescos (podem ocorrer durante o adormecer, em estados de cansaço e frequentemente em intoxicações com drogas, como LSD) o Autoscopia: vê-se alucinatoriamente a própria figura, como se se tratasse de um “duplo” (pode ocorrer em indivíduos sãos durante estados excessivos de cansaço, durante o adormecer bem como em epiléticos e em certos doentes com tumores cerebrais o Dismorfofobia ou perturbação dismórfica corporal: distorção da imagem corporal com avaliação negativa do próprio corpo; pode ser classificada aqui a distorção da imagem corporal em que há uma perceção do corpo como estando exageradamente gordo ou hiperbolizando pequenos defeitos físicos; pode surgir na anorexia nervosa ou na perturbação dimórfica corporal FALSAS PERCEÇÕES ILUSÕES: Transformação subjetiva de um objeto realmente presente, sendo mantido o juízo crítico. Vários processos psicológicos podem conduzir à ilusão: Estado emocional (e.g., cansaço), deficiências na atenção/circunstâncias (e.g., entardecer) Ex: um arbusto é tomado por um homem que espreita; ao despertar da anestesia, a enfermeira é tomada por um familiar; soldados excessivamente cansados julgam que as árvores são inimigos. Podem ocorrer em indivíduos com ou sem patologia psiquiátrica; as ilusões quase sempre visuais ocorrem em estados de fadiga grave ou inatenção e em casos de privação sensorial, de abaixamento do nível de consciência, em que os estímulos são percebidos de forma deformada. → Pareidolia: refere-se à criação de formas imaginárias a partir de perceções resultantes de objectos de forma mal definida; resultam sobretudo da capacidade imaginativa e ao contrário das restantes ilusões não são extintas pelo aumento da atenção (ex. ver rostos nas nuvens) → Imagem eidética: fenómenos sensoriais que surgem quando imagens de objetos são sobrepostas num fundo escuro e depois removidas e os indivíduos continuam a ver estas imagens com todo o pormenor. → Ilusão de preenchimento: quando se completa um padrão familiar, mas não terminado. Ex: estar a ler um texto em que falta uma letra ou uma palavra e nem sequer se repara que algo falta, pois mentalmente completamos a frase ou a palavra; este tipo de fenómeno ocorre quando se está mais desatento) → Ilusão de afeto: em que uma perceção pode ser alterada de acordo com o estado de humor, por exemplo, um doente maníaco poderá ler num anúncio de emprego “precisa-se de pessoa inteligente” em vez de “precisa-se de pessoa fluente em...” ALUCINAÇÕES: Ocorrência de uma perceção sem estímulo externo que lhe corresponda, estando o sujeito absolutamente convicto da sua realidade. Pode dizer respeito a qualquer esfera sensorial operativa: Auditivo- verbal, Visual, táctil, Olfativo-Gustativa, Somática. As alucinações ocorrem sobretudo em casos psicóticos funcionais (esquizofrenia, mania psicótica, depressão psicótica) ou em casos de privação sensorial. → Alucinações auditivas: o Tipo elementar-ouvir barulhos, gritos, murmúrios. o Parcialmente organizadas: ouvir uma música que não existe. o Completamente organizadas ou auditivo- verbais: ouvir vozes, palavras. → Alucinações auditivo-verbais: podem ser caracterizadas quanto: o Qualidade: claras ou vagas o Conteúdo: imperativas- dar ordens; interpelativas- comentários sobre atos o Impacto: agressivas, amigáveis o Dirigidas diretamente ao doente ou não: Vozes que se dirigem ao doente diretamente na segunda pessoa (tu) ou um conjunto de vozes que falam entre si, comentando indiretamente o comportamento do doente na terceira pessoa (ele); quando as vozes que falam entre si se contradizem denominam-se alucinações antagonistas. As alucinações auditivo-verbais são muito características da esquizofrenia. Podem ocorrer também em perturbações do humor (depressão ou mania psicóticas), no alcoolismo cronico. Nas perturbações dissociativas e em personalidade borderline, esquizoide, esquizotípica ou histriónica → Alucinações visuais: Tipo elementar: clarões, chamas ou sombras. Parcialmente organizadas: padrões, figuras geométricas. Completamente organizadas: pessoas, objetos, animais, cenas o Alucinações cénicas: semelhantes ao desenvolvimento do sonho com dramática participação do doente (visões de fogo, cenas de crucificação, grande multidões) o Alucinações liliputianas (cenas com personagens minúsculas) ou gulliverianas (gigantes) ou ainda representações de animais (zoópsias) repugnantes, ou perigoso, monstruosos e fantásticos. → Alucinações olfativas: O doente queixa-se de cheiro a gás ou a borracha queimada ou que ele próprio emite mau cheiro. → Alucinações gustativas: O doente poderá sentir gostos estranhos na comida (com a respetiva interpretação delirante de assumir tratar-se de comida envenenada, recusando-se a comer – sitiofobia). É diferente do delírio secundário em que o doente esquizofrénico se sente fisicamente alterado, o que o leva a pensar que foi envenenamento. → Alucinações motoras: o Tipo elementar: movimentos indeterminados. (sente que está a fazer movimentos, mas na verdade não está a fazer nada) o Complexas: com sensação de voar, sentir o corpo a afundar-se, um braço a elevar-se, levitar, andar, etc. → Alucinações táteis ou de sensibilidade superficial: Tipo elementar: movimentos indeterminados o Sensação de toque – em que os doentes sentem que tocam em objetos que não existem (alucinações tácteis ativas) ou que são tocados por alguém, pessoa ou objeto (alucinações tácteis passivas) - Sensações de calor, frio, choques elétricos, sopros, picadas ou de insetos a rastejar na pele ou logo abaixo dela (formicação). o Alucinações sexuais: toques sexuais, reações forçadas, violação (podem ocorrer em quadros de esquizofrenia e nas demências) → Alucinações cenestésicas ou de sensibilidade profunda: Todas as sensações corporais para além das tácteis, ex. dor profunda, sensações musculares ou articulares. o Alucinações viscerais: ex. achar que os órgãos se estão a deslocar pelo corpo, ou ter animais que se movem no interior do corpo. o Parasitoses alucinatórias: ter a sensação do corpo estar infestado de animais/parasitas, associando-se nestas circunstâncias ao delírio zoomórfico ou zoopático. Associação entre fenómenos psicopatológicos: Os temas das alucinações podem ser comuns com os do delírio (não cedendo à argumentação crítica nem ao juízo da realidade) PERTURBAÇÃO DO PENSAMENTO Pensar significa manter-se aberto a questões, escutar, compreender, ter presente, perceber significados, relacionar entre si e dotar de sentido; Implica também a explicação de causas e uma reflexão antecipada, planeadora de atividades bem como a tomada de decisões e a formação de juízos. Em resumo: organizar as realidades (materiais e imateriais) relativas a nós mesmos e ao nosso mundo. ALTERAÇÕES DO PENSAMENTO DIVIDEM -SE EM QUATRO GRANDES GRUPOS: 1. Alterações do curso do pensamento (ritmo e continuidade) 2. Alterações da forma do pensamento (Goldstein; Cameron; e Schneider) 3. Alterações da posse do pensamento (ideias obsessivas e alineação do pensamento/alterações do pensamento relacionadas com a vivência do eu) 4. Alterações do conteúdo do pensamento (ideias sobrevalorizadas; ideias delirantes/delírios; ideias de suicídio) ALTERAÇÕES DO CURSO DO PENSAMENTO: → RITMO: o Pensamento acelerado ou taquipsiquismo: Aumento da velocidade do fluxo do pensamento, refletindo-se no discurso por aumento do débito verbal (a velocidade do pensamento e da linguagem está acelerada). Pode associar- se ou não a fuga de ideias. O examinador consegue ainda quase sempre seguir a associação de ideias (contrariamente ao que acontece com o pensamento incoerente) ainda quede modo fugaz e superficial. (ex. estados de hipomania, mania, intoxicação alcoólica inicial e nas psicoses tóxicas) o Pensamento ideofugitivo ou digressivo e fuga de ideias: Uma ideia segue imediatamente a outra e o pensamento muda constantemente de objetivo, em função das associações e perde a sua finalidade (não há um regresso ao pensamento principal) - Ocorre sempre na presença de pensamento acelerado - As associações da cadeia do pensamento são determinadas por associações casuais sonoras, verbais (ex.. assonâncias - figura de linguagem ou recurso sonoro que consiste em repetir sons de vogais num verso ou numa frase, especialmente as sílabas tónicas, aliterações - repetição das mesmas letras, sílabas ou sons numa frase (ex.: passo a passo se anda espaço), ou pela presença de estímulos exteriores. - Ocorre tipicamente na mania. O fim não é igual ao pensamento inicial. Ex de esquizofrenia: O jovem doente queixa-se desesperadamente: “O meu pensamento está perturbado, as ideias fogem-me...já não consigo pensar...sinto-me em desagregação” Os pensamentos seguem-se uns aos outros sem aparente direção, com fácil distração por estímulos externos e dominados por exacerbação das associações, havendo um afastamento do pensamento principal inicial. o Pensamento circunstanciado: Pensamento prolixo (difuso, que usa demasiadas palavras) que se perde em entediantes detalhes desnecessários, mostrando uma incapacidade para distinguir o essencial do acessório. Porém, o pensamento não perde a sua finalidade (há um regresso ao pensamento principal). Não é possível deixar de lado o que é secundário. Ocorre tipicamente em perturbações da personalidade (e.g., personalidades obsessivas). Perde-se em coisas desnecessárias, mas consegue voltarão pensamento. O pensamento procede lentamente, com muitos detalhes não relevantes antes de chegar ao objetivo, regressando, no entanto, ao pensamento principal inicial. o Pensamento lentificado ou bradipsiquismo: O pensamento progride lentamente, com diminuição do poder de associação de ideias e dificuldade de passar de um tema para outro; - Observa-se o aumento da latência das respostas, lentidão de discurso e capacidade de decisão reduzida (torpidez na forma como o doente fala e reage) - O pensamento inibido (vem a seguir) está frequentemente lentificado - Típico de estados depressivos, inicio de processos confusionais, e na doença de Parkinson (também perturbações da consciência, na sonolência, nos esquizofrénicos fortemente pressionados e oprimidos). Consigo ver, consigo perceber que existe/está presente no doente. o Pensamento inibido: Há inibição do raciocínio (“custa a pensar”) e o doente sente resistências ao fluxo do pensamento que é lento, hesitante e irregular. - Esta hesitação é vivida subjetivamente (experienciada) como dificuldade em pensar e tomar decisões, perda da clareza do pensamento - Ocorre na depressão, esquizofrenia catatónica inibida, quadros demenciais e fadiga. - Enquanto o pensamento lentificado é um fenómeno observado (objetivo), o pensamento inibido é experienciado pelo sujeito (subjetivo). Não consigo observar esta patologia no doente, o doente é que consegue sentir. Ex de esquizofrenia: “Eu já não conseguia tratar de mais nada. Os pensamentos andavam sempre à roda, logo a seguir interrompiam-se bruscamente, para recomeçar de novo desde o princípio. Como tal nunca conseguia concluir os pensamentos.” “O pior é o que se passa com o meu pensamento: não posso, de todo, fazer avançar os meus pensamentos. As ideias não fazem mais do que andar às voltas e, às vezes, tenho a impressão de que já não tenho pensamentos...nem sequer memória...e já não consigo concentrar- me em nada”. → CONTINUIDADE: o Bloqueio do pensamento: Súbita suspensão do curso do pensamento. O doente detém-se a meio de uma conversa, cala-se, “perde o fio” do discurso, ocasionalmente retoma a conversa com outro tema. Os bloqueios ocorrem em clara consciência e não devem ser confundidos com a interrupção do curso do pensamento provocada por uma ausência. Descontinuidade da progressão do pensamento com suspensão brusca e aparentemente imotivada do pensamento (observada e/ou experienciada), manifestada por uma interrupção súbita da fala, no meio de uma frase em plena clareza de consciência. - Quando o doente consegue retomar o discurso, fá-lo com outro assunto, sem conexão com a ideação anterior, com sentimento de embaraço ou como experiencia aterradora devido ao vazio completo no curso do pensamento. - Típico da esquizofrenia ou quadros ansiosos o Perseveração ideativa ou perseveração de conteúdo: O pensamento repete-se; uma ideia persiste além do ponto em que é relevante. Uma mesma ideia “dá continuamente voltas à cabeça” (ou então, alguns pensamentos), impõe-se constantemente, sem que consiga ser elaborada ou concluída.. O doente não pode abandonar uma ideia para passar para outra, sentindo-se incapaz de se adaptar a questões sucessivas, repete voluntariamente a mesma resposta a uma variedade de questões, mostrando uma incapacidade de se adaptar a uma mudança de tópico (perseveração temática). É também escrito como pensamento circular, ruminação depressiva, “estado” incómodo, “cisma”. Frequente durante o adormecer, na insónia, em período de preocupações - Ocorre na depressão grave e na esquizofrenia crónica - As ideias obsessivas são também, quase sempre, perseverantes. o Perseveração verbal: Repetição involuntária de palavras ou frases das últimas palavras ou frases num diálogo que interfere com a fluidez das ideias. Esta situação difere da ecolalia e da estereotipia verbal (veremos mais à frente nas alterações da linguagem). ALTERAÇÕES DA FORMA DO PENSAMENTO Nas alterações da forma do pensamento estão alterados a organização e o processo associativo do pensamento, sobretudo no que se refere à sua componente abstrata e de conceptualização. Manifestam-se através da comunicação e da produção do discurso, podendo a linguagem apresentar apenas alterações semânticas ou também sintáticas. CARL SCHNEIDER: → Descarrilamento: O pensamento flui para um pensamento subsidiário sem relação com o primeiro, ex. “Vou apanhar o autocarro, vou a casa dos meus pais, o presidente da república controla-me as ideias, as camaras estão na minha sala”. O pensamento flui para um pensamento subsidiário sem relação com o primeiro, havendo um afastamento do pensamento principal inicial. → Fusão: Existe a justaposição e entrelaçamento de conteúdos heterogéneos e incompreensíveis. Ou seja, várias ideias a,b,c, são interligadas. Ex.: “Eu sei que os marcianos me andam a perseguir desde aquele dia na praia. A forma do meu quarto mudou desde que eu tenho estes poderes sobrenaturais e a minha mãe sabe disso. Assim os marcianos vão voltar para me apanhar e aquela praia continua azul, mas os poderes que eu tenho a minha mãe nunca os negou”. Existe uma justaposição de conteúdos heterogéneos e incompreensíveis, várias ideias a,b,c são interligadas, havendo também geralmente um afastamento do pensamento principal inicial. → Suspensão ou omissão: Súbita interrupção de uma cadeia de pensamentos e da intenção contida num determinado pensamento ou parte dele, ex.: “Vou apanhar o autocarro para...hoje almocei peixe e estava bom” (semelhante ao bloqueio do pensamento). → Pensamento desagregado: Miscelânea de fragmentos de pensamentos heterogéneos; existe perda das associações e o pensamento não faz sentido (de acordo com Sims (2006), este ocorre quando existe um grau dedescarrilamento e fusão elevado) ALTERAÇÕES DA POSSE DO PENSAMENTO → Ideias obsessivas: Ideias persistentes que ocorrem contra a vontade do doente(que as sente como intrusivas, parasitas e inaceitáveis, resistindo contra elas – egodistónicas) e que se associam a uma elevada carga ansiogénica. Geralmente a temática destas ideias é repugnante para o doente, ex. Um doente que seja muito religioso poderá ter pensamentos blasfémicos. Alguém sensível às questões morais, pensamentos relacionados com a tortura dos outros. Alguém sensível às questões da sexualidade, pensamentos relacionados com esta área Existe também manutenção da autocrítica relativamente ao carácter patológico deste problema. Embora se fale geralmente de ideias obsessivas, as obsessões podem também tomar a forma de: o - Imagens (e.g., o doente vê imagens dele a esfaquear alguém) o - Impulsos (e.g., de tocar, de cometer atos sociais reprováveis) o - Medos (e.g., de contaminação) o – Dúvidas Quanto aos temas obsessivos, destacam-se: - Ideias relacionadas com contaminação - Preocupação com possíveis doenças - Dúvidas (existenciais, filosóficas) - Necessidade de simetria - Ideias com teor agressivo, sexual ou religioso, etc As obsessões levam muitas vezes às compulsões- atos motores ou mentais, que são irresistíveis e reduzem a ansiedade provocada pelas obsessões. • Atos motores: verificação (e.g., verificar várias vezes a fechadura ou se as janelas estão fechadas); limpeza (ex. lavar persistentemente as mãos) • Atos mentais (ex. recitar orações) As obsessões são típicas de perturbações ansiosas (sobretudo da perturbação obsessiva compulsiva), mas também podem star presentes em perturbações depressivas, e na esquizofrenia. → Alienação do pensamento (também designada por perturbações do pensamento relacionadas com perturbações da vivência do eu) - perturbação do pensamento relacionadas com perturbação da vivencia do eu: O doente pensa que os seus pensamentos são controlados por uma entidade extrínseca (externa) ou que os outros participam no seu pensamento. Ocorre tipicamente na esquizofrenia e é de 3 tipos: o Influenciamento do pensamento ou imposição do pensamento: convicção de que as suas ideias ou representações são influenciadas ou impostas pelo exterior; o doente sente que os seus pensamentos são induzidos por entidades extrínsecas (e.g., através de radares, laser) o Roubo do pensamento ou interseção do pensamento: o doente tem a convicção de que as ideias desapareceram porque se apoderaram dos seus pensamentos, lhos roubaram através de procedimentos distintos e com intenções variadas; os doentes têm a sensação de que lhes roubam e lhes escondem os pensamentos. o Difusão do pensamento: o doente sente que o seu pensamento não lhe pertence, que outros participam no pensamento (pensamento compartilhado) ou que leem os seus pensamentos (leitura de pensamento), que os seus pensamentos são conhecidos dos outros (divulgação ou difusão do pensamento), que ouve os seus pensamentos em voz alta (sonorização do pensamento) ou que há repetição imediata (eco do pensamento). ALTERAÇÕES DO CONTEÚDO DO PENSAMENTO a) Ideias sobrevalorizadas ou prevalentes b) Delírios c) Ideias de suicídio IDEIAS SOBREVALORIZADAS: Ideias erróneas por superestimação afetiva. O conteúdo do pensamento centraliza-se em torno de uma ideia particular, que assume uma tonalidade afetiva acentuada; é irracional e aceite pelo indivíduo que não resiste contra ela (egossintonia; ao contrário das ideias obsessivas, onde há ideias persistentes que ocorrem contra a vontade do doente que as sente como intrusivas resistindo contra elas). Porém, sustentada com menos intensidade que uma ideia delirante (irredutibilidade e convicção plena ausentes ou pouco prevalentes). É compreensível com contexto da personalidade e/ou história do doente. Em suma: Convicções acentuadas por um estado afetivo muito forte, compreensível tendo em conta a personalidade do doente. Causa perturbação no funcionamento da pessoa ou sofrimento (ex. ideias de ciúme no ciúme mórbido, ideias de ter uma parte do corpo disforme na dismorfofobia, achar que se está doente na hipocondria ou achar-se com excesso de peso na anorexia nervosa. Irredutibilidade convicção plena- tem a ver com o juízo de realidade. (quando está presente não há juízo de realidade). DELÍRIOS (como as alucinações presentes na perceção) Uma crença falsa, inabalável, provinda de processos mórbidos e que contrasta com o contexto cultural e social do doente. Segundo Jaspers (1913), trata-se de um falso juízo que comunga das seguintes características: - Irredutibilidade – perante argumentação lógica ou opinião coletiva, não sendo passível de ser influenciada externamente - Convicção plena – certeza subjetiva absoluta, evidência a priori, independente da experiência - Conteúdo impossível – este último fator é controverso podendo surgir alguns delírios muito próximos da plausibilidade, nomeadamente, na perturbação delirante, sendo esta característica substituída por outros autores por incompreensibilidade psicológica (em rutura com o contexto sociocultural do doente). O delírio pode ser subdividido em delírio primário ou delírio secundário. DELÍRIOS PRIMÁRIOS: ideias ou vivencias que não estão associadas a outros processos psicológicos e não derivam deles (aparecem sem causa aparente a partir de vivências delirantes primárias) Tem um carácter de evidência, em que surge, como algo inteiramente novo, um novo significado, súbito e revelador, associado a perceções ou acontecimentos psicológicos num determinado instante da vida do sujeito, e representa uma quebra radical na sua biografia e uma transformação qualitativa de toda a existência. Associa-se à esquizofrenia aguda (sobretudo nas fases iniciais) ao contrário do delírio secundário associado a outro fenómeno psicológico (ex. perturbação do humor) As vivências delirantes primárias podem ser classificadas em: HUMOR DELIRANTE: O doente tem um pressentimento (estado afectivo difuso) de que algo está a acontecer à sua volta, que o inquieta e que tem um carácter ameaçador, estranho e misterioso, mas o doente não sabe exactamente o que é. Ao pressentir uma mudança incompreensível no que o rodeia pode ocorrer perplexidade, despersonalização ou desrealização, com uma estranheza radical que pode ir até à sensação de fim do mundo. Pode cessar sem qualquer desenvolvimento delirante, mas a maior parte das vezes ele sobrevém. PERCEÇÃO DELIRANTE: Atribuição de um novo significado anormal, geralmente autorreferenciado, a um objecto normalmente percebido [estrutura com dupla vertente: percepção final ligada, por um lado à percepção verdadeira do objecto real (pelo indivíduo) e por outro, sem motivação compreensível, a um novo significado]. Exemplo: um doente esquizofrénico diz que descobriu que era perseguido pela máfia porque reparou que tinha uma nódoa na camisa. Não se trata de uma perturbação do percebido mas do seu significado (pelo que se considera uma perturbação do pensamento) que é vivenciada como uma revelação uma descoberta abrupta Recordação delirante do tipo perceção delirante- histórias do passado reais que são ligadas a outro significado. OCORRÊNCIA OU INTUIÇÃO DELIRANTE: O delírio surge completamente formado na mente do doente, como uma ideia ou certeza súbita, um significado anormal, sem suporte perceptivo e a partir de uma revelação quase “pura”, fenomenologicamente indistinguível de uma ideia normal. Exemplo: O mesmo doente após perceber que o avião é dos serviços secretos desenvolve uma ideia delirante súbita em que acha que está a ser perseguido pelo governo. RECORDAÇÃO DELIRANTE: o Recordação delirante do tipo perceção delirante: Histórias do passado reais que são ligadas a outro significado. Por exemplo: O doente afirma ser de ascendênciareal porque em criança se lembra que as colheres com que comia tinham uma coroa desenhada (facto que tudo leva a crer que seja verdadeiro). Aqui a perceção final está ligada, por um lado, à perceção do objeto real e, por outro, a um novo significado (ver figura da estrutura de dupla vertente da perceção delirante). o Recordação delirante do tipo ocorrência delirante: Esta presente numa memória falsa/inventada. Por exemplo: O doente afirma ser de ascendência real porque o rei saudou-o de forma especial quando era criança (tal acontecimento não é real). Aqui o delírio está contido na memória (falsa), não apresenta a estrutura de dupla vertente. Diferenças entre delírios; alucinações e ilusões Delírios secundários: São derivados de outras perturbações, existe uma perturbação maior(major) e dentro dela os delírios, ou seja, são secundários aquilo que é o palco principal (perturbação principal). Pode ser compreendido em termos de história psiquiátrica e pessoal. São derivados ou vinculados a outros processos psicológicos (por exemplo, esquizofrenia crónica, mania ou depressão). São exemplos de delírios secundários as ideias de grandeza na mania, decorrentes de um humor eufórico, e as ideias de perseguição no delirium, decorrentes do rebaixamento do nível de consciência. O delírio pode classificar-se de acordo com a temática: 1. DELÍRIO PERSECUTÓRIO OU PARANOIDE: É a forma mais comum, com ideias delirantes de prejuízo e a vivência de que existe uma agressividade contra o doente. Ele sente-se ameaçado, atacado, incomodado, prejudicado, perseguido ou vítima de uma conspiração, envenenamento ou tentativa de morte. “Os meus pais quiseram matar-me ontem”. Frequente na esquizofrenia ou na perturbação delirante 2. AUTORRELACIONAÇÃO, AUTORREFERÊNCIA DELIRANTE: Refere a si mesmo as suas experiências delirantes, convencido que os acontecimentos fortuitos lhe dizem respeito Por exemplo: Ao passar diante de um grupo de pessoas que conversam, diz-se alvo de constantes referências depreciativas. Falam dele, riem dele, dizem que é desonesto. Muitas vezes existe uma personalidade prévia com traços sensitivos. Frequente na esquizofrenia. 3. DELÍRIO DE GRANDEZA: O conteúdo envolve sentimento físico e mental de poder, conhecimento ou importância exagerados, em contraste com a realidade. Convicção de possuir algum grau de parentesco ou ligação com personalidades importantes (delírio de filiação), de possuir algum grande talento (inteligência, cultura, beleza), poder ou destino especial, algum dom magistral ou ser possuidor de grande fortuna. Característico da esquizofrenia ou da mania delirante onde pode assumir a forma de delírio megalómano. 4. DELIRIO MISTICO OU RELIGIOSO: pessoa que caredita numa relegião e que desenvolve uma nova historia sobre essa religião, acreditando plenamente nela. Relacionado com ideias religiosas ou espirituais, mas fora do que é culturalmente aceite, às vezes suportado por vozes ou visões alucinatórias. Pode tornar-se messiânico quando está convicto de ter um papel de salvador/redentor. Pode ocorrer na esquizofrenia ou na mania (quando o delírio místico está associado a uma valorização pessoal extrema – “sou o messias, o salvador do mundo”). 5. DELIRIO SOMÁTICO OU HIPOCONDRÍACO: O conteúdo envolve uma mudança ou perturbação no funcionamento corporal e crê inabalavelmente que tem uma doença incurável. O doente queixa- se de preocupações e sintomas somáticos sem nenhuma causa orgânica. Presente na esquizofrenia e em depressões graves 6. DELIRIO DE INFESTAÇÃO: Preocupação com micróbios, piolhos ou vermes que invadiram o corpo. Pode associar-se a alucinações da sensibilidade superficial (formicação, por exemplo) ou profunda. Ocorre na esquizofrenia, na depressão grave, no delirium tremens e na intoxicação por cocaína e alucinogénios. 7. DELIRIO NIILISTA (muito importante): Delírio de negação, nega a existência do corpo, da sua mente e do mundo à sua volta, que está destruído e estão todos mortos. Pode estar presente, por exemplo, na depressão grave psicótica. Muitas vezes o delírio de negação da pessoa no seu todo é conhecido por delírio de Cotard, embora as ideias delirantes de não existência da pessoa no seu todo ou de partes dela sejam apenas um dos constituintes da Síndrome de Cotard original (síndrome do cadáver ambulante). 8. DELÍRIO DE NEGAÇÃO DE ÓRGÃOS: Considera que o corpo está destruído, as veias estão secas, não tem órgãos. Frequente nas depressões graves psicóticas. Muitas vezes conhecido por delírio de Cotard, embora as ideias delirantes de não existência da pessoa no seu todo ou de partes dela sejam apenas um dos constituintes da Síndrome de Cotard original. 9. DELÍRIO DE CULPA: O doente acredita ter cometido uma falta ou pecado imperdoável, ser uma pessoa indigna, pecaminosa, suja, irresponsável, que deve ser punida pelos seus pecados. Característica de depressão psicótica e de esquizofrenia 10. DELÍRIO DE RUÍNA: Acredita que está arruinado, condenado à miséria, sem capacidades para sobreviver, bem como a sua família, com a certeza de que irão passar fome, apesar da documentação e a realidade evidenciar o contrário. Característico da depressão psicótica. 11. DELÍRIOS PASSIONAIS: a. Delírio de ciúme ou de infidelidade: Convicção de ser traído pelo parceiro. Pode ocorrer em todas as psicoses, mas mais caracteristicamente no alcoolismo crónico. b. Erotomania: Convicção que certa pessoa, geralmente com destaque social (artista, médico, professor) está apaixonado/a por ela/e e de que irá abandonar tudo para que se possa casar com ele/a. Ver síndrome de Clérambault 12. IDENTIFICAÇÃO DELIRANTE: a. Síndrome de Capgras ou deliriio de sosias: Descrita por Capgras e Reboul-Lachaux, em 1923. O doente acredita que alguém próximo dele (por exemplo, familiar) foi substituído por um duplo, que os seus conhecidos foram substituídos por sósias (são quase idênticos, mas no fundo são impostores, falsários quase perfeitos) – iguais fisicamente, mas diferentes psicologicamente (Uma mulher que foi substituída pela minha mãe e é fisicamente igual mas eu sei q não é ela.) b. Síndrome de fregoli: Descrita por Courbon e Fail, em 1927. Nesta situação existe um falso reconhecimento delirante dos outros, o doente acha que pessoas desconhecidas são suas conhecidas, mas que estão disfarçadas (diferente fisicamente, mas igual psicologicamente) As pessoas são diferentes fisicamente, mas iguais psicologicamente. c. Síndrome das intermetamorfoses: Descrita por Courbon e Tusques, em 1932. O doente acredita que alguém se transformou noutra pessoa adquirindo as suas características físicas e psíquicas. Por exemplo, que uma pessoa estranha (perseguidor) adquiriu as características físicas e psicológicas de um seu familiar. d. Síndrome dos duplos subjetivos: Descrita por Christodolou, em 1978. O doente acredita que outra pessoa se transformou fisicamente nele próprio RELATIVAMENTE AO GRAU DE ORGANIZAÇÃO OU ESTRUTURA DOS DELÍRIOS, ELES PODEM SER: → SISTEMATIZADOS: Quando existe um delírio principal e todo o restante sistema delirante é ordenado e coerentemente construído à volta desse erro. Por manter uma lógica interna podem adquirir uma maior credibilidade. Estes doentes muitas vezes como que constroem um argumento, podendo os delírios ser sistematizados em sector ou em rede. O aspeto fundamental é a presença de uma única ideia delirante fixa, elaborada, que pode assumir vários contornos: delírio de reivindicação ou querelante, delírios passionais (ciúme, erotomania), delírio imaginativo (características da parafrenia tardia, privilegiando temas de grandeza) e delírios interpretativos monotemáticos (típico da perturbação delirante crónica). Nos delíriossistematizados, os doentes nãos e prestam a impedir o desenvolvimento ou criticar o delírio, mas a buscar mais elementos para o justificar e sistematizar. Este tipo de delírios é frequente em estádios avançados da esquizofrenia ou na perturbação delirante → NÃO SISTEMATIZADOS: Quando envolvem ideias delirantes dispersas referidas a vários temas. Os doentes são mais desorganizados e pouco convincentes, não formam um argumento e não tentam explicar as suas ideias (“as coisas são “porque sim”, “eu sei”, “todo o mundo sabe”). Típico da esquizofrenia desorganizada → SIMPLES (MONOTEMÁTICOS): Em torno de um só conteúdo. → COMPLEXOS (PLURITEMÁTICOS): Englobando vários temas ao mesmo tempo, com múltiplos focos. → COMPARTILHADOS OU LOUCURA A DOIS (FOLIE À DEUX): Em que o convivente, habitualmente com personalidade sugestionável, dependente ou frágil socioculturalmente ou com limitação física ou psicossocial, passa a delirar (sobre o mesmo tema do doente). Podem ocorrer delírios grupais. (Basicamente é quando uma pessoa com um delírio influencia uma segunda pessoa.) IDEIAS DE SUICÍDIO As ideias de suicídio podem adquirir um carácter sobrevalorizado e poderão ser classificadas na secção das alterações do conteúdo do pensamento. Podem ir desde os pensamentos de morte até à intenção suicida estruturada (com ou sem planificação suicida). HUMOR, EMOÇÃO E AFETOS Os vários autores são unânimes em afirmar que o desenvolvimento da psicopatologia da afetividade não foi paralelo ao das outras áreas, tendo ocupado um papel acessório. Isto pode explicar a multiplicidade de conceitos, sua ambiguidade e dificuldade em unificar e classificá-los. Para a compreensão da psicopatologia do humor, emoção e afetos, é importante definir os termos utilizados com a máxima clareza: emoção, sentimentos, afeto, humor e temperamento. EMOÇÃO: Resposta a curto prazo, desencadeada por uma perceção (interna ou externa) e que evoca mudanças fisiológicas. PODE DIVIDIR-SE EM 3 COMPONENTES: COMPONENTE COMPORTAMENTAL: Expressão física da emoção. Expressões verbais ou não verbais- sorrir, chorar ou fugir. COMPONENTE SOMÁTICA OU FISIOLÓGICA: excitação corporal- frequência cardíaca, temperatura e mudanças respiratórias. (sistema nervoso autônomo (luta ou fuga). Sistema endócrino (hormônios). COMPONENTE COGNITIVA: avaliação e interpretação subjetiva dos sentimentos e ambiente. António Damásio: “Eu vejo a essência da emoção como a coleção de mudanças no estado corporal que são induzidos em órgãos por terminais de células nervosas, sob o controle de um cérebro dedicado sistema, que está respondendo ao conteúdo de pensamentos relativos a uma determinada entidade ou evento. Muitas das mudanças no estado corporal – aquelas na cor da pele, corpo postura e expressão facial – são na verdade percetíveis para um observador externo. (Na verdade, a etimologia da palavra sugere bem uma direção externa, a partir do corpo: emoção significa literalmente "movimento para fora"). Outras mudanças no estado do corpo são percetíveis apenas ao dono do corpo em que eles ocorrem". (Segundo António Damásio, a emoção é um conjunto de reações corporais, automáticas e inconscientes, face a determinados estímulos provenientes do meio onde estamos inseridos) 2 PERSPETIVAS: PERSPETIVAS DAS EMOÇÕES BÁSICAS: Perspetivas que situam as emoções em termos de emoções básicas- estudo das emoções nos seus componentes mais básicos, tentaram encontras as emoções mais universais. Ekman propôs a presença de seis emoções básicas: raiva, medo, nojo, surpresa, felicidade e tristeza. Mais tarde Brown propõe um conjunto de emoções universais, incluindo expressões faciais universais. PRESPETIVA DAS DIMENSÕES DAS EMOÇÕES- ESTUDO DAS EMOÇÕES ENQUANTO CONSTRUÇÕES PSICOLOGIAS- procuramos emoções Reações emocionais a estímulos e eventos podem ser caracterizados por dois fatores: Valência (agradável- desagradável) e excitação/arousal (alto- baixo) (maior ativação emocional/ menor ativação emocional). Os fatores valência e arousal refletem-se nas nossas ações futuras (aproximar ou evitar) e estão relacionados com o nível de antecipação do evento associado à emoção (antecipado ou inesperado). Uma valência positiva vai causar aproximação, se for negativa causa um evitamento. A ativação tem a ver com o evento ser esperado ou não, um invento inesperado causa maior ativação/excitação. Num contínuo entre gostava e não gostava - valência (abordagem ou retirada). Diferentes reações emocionais ou estados podem nos motivar ou a abordar ou a retirar. Ex. felicidade e surpresa pode excitar uma tendência de abordagem ou engajamento nas situações de provocação, enquanto o medo e o nojo podem nos motivar a retirar-se das situações de provocação. Além disso, de acordo com o nível de antecipação (num contínuo entre eventos antecipados e inesperados) – excitação (agitado ou calmo). O MODELO CIRCUNPLEXO DE AFETO: UMA ABORDAGEM INTEGRATIVA AO AFETIVO NEUROCIÊNCIA, DESENVOLVIMENTO COGNITIVO E PSICOPATOLOGIA O modelo circunplexo de afeto propõe que todos os estados afetivos decorrem de interpretações cognitivas de sensações neurais do núcleo que são produto de dois sistemas neuropsicológicos independentes. Este modelo está em contraste com teorias de emoções básicas, que afirmam que um discreto sistema neural independente serve todas as emoções. Propomos que teorias básicas da emoção não expliquem adequadamente o vasto número de observações empíricas de estudos em neurociência afetiva, e sugerimos que é necessária uma mudança conceptual nas abordagens empíricas levadas para o estudo da emoção e psicopatologias afetivas. O modelo cincunplexo de afeto é mais consistente com muitas descobertas recentes do comportamento, consciencia cognitiva, neuroimagem e estudos desenvolvimentais dos afetos. Além disso, o modelo oferece novas abordagens teóricas e empíricas para estudar o desenvolvimento de transtornos afetivos bem como os fundamentos genéticos e cognitivos de processamento afetivo dentro do sistema nervoso central. Os autores distinguem quatro “zonas”: emoções básicas; apparaisal(avaliação); construção psicológica e construção social. Apparaisal: Começa a haver um desfoque das fronteiras entre a geração de emoção e regulação da emoção. Não há mais a suposição de uma separação acentuada entre geradores de emoções subcuticais e sistemas de controle cortical. Construção social: as emoções são vistas como artefactos ou performances culturalmente prescritas que são constituídas por fatores socioculturais e constrangidas pelo contexto social. EMOÇÕES E AFETIVIDADE: PERSPETIVA PSICODINÂMICA CONCEÇÃO DE FREUD Uma das contribuições mais fundamentais da psicanálise à psicopatologia tem sido na área da afetividade. A angústia tem importância central na teoria freudiana dos afetos. De modo geral, Freud concebe a angústia como um afeto básico que emerge do eterno conflito entre o indivíduo, os seus impulsos ins1n1vos primários, os seus desejos e as suas necessidades, por um lado, e, por outro, as exigências de comportamento civilizado, restrições (p. ex., não desejar a mulher do próximo, não matar, respeitar o tabu do incesto, etc.) que a cultura impõe ao indivíduo. Devido a tais restrições, a pessoa experimenta irremediável “mal-estar na cultura”. Numa primeira teorização, Freud [1895] (1986) postulou que a angústia seria uma transformação da libido não- descarregada. Ou seja, a energia sexual que, por algum motivo, não fosse adequadamente descarregada (p. ex., por meio do ato sexual) ficaria re1da, presa no aparelho psíquico, gerando a angústia como subproduto. Numa teoria posterior, Freud [1926] (1986) postulou que a angús1a seria não um subproduto da libidoretida, mas um sinal de perigo, enviado pelo Eu, no sentido de evitar o surgimento de algo muito mais ameaçador ao indivíduo, algo que poderia gerar angústia muito mais intensa. A angústia funcionaria então como sinal de desprazer que suscitaria da parte do Eu uma reação de defesa passiva ou ativa, ativando o recalque ou outros mecanismos de defesa, a fim de evitar uma situação de perigo mais importante e, consequentemente, uma angústia muito maior. A depressão ou melancolia (termo mais utilizado em psicanálise) relaciona-se com o modo particular de elaboração inconsciente de perdas reais ou simbólicas. Para Freud, quando perde um objeto significativo (pessoa próxima, um ideal, um certo status, o emprego, etc.), o sujeito tende, para não perdê-lo totalmente, a identificar- se narcisicamente com ele e a introjetá-lo ao próprio Eu. Caso tal objeto de alguma forma fosse muito amado, mas também inconscientemente muito odiado (investimento libidinal ambivalente) pelo sujeito, o rancor e o ódio inconsciente que guardava por tal objeto tenderiam a ser vertidos sobre o próprio Eu. Surgem, então, as auto-acusações, os sentimentos de culpa e de fracasso, a autopunição em forma de descuido consigo próprio, perda do apetite e ideias e atos suicidas. CONCEÇÃO DE MELANIE KLEIN A psicanalista Melanie Klein (1974), da escola inglesa de psicanálise, deu importante ênfase à vida afetiva nas suas concepções sobre o funcionamento mental humano. Os afetos, na sua teoria, seriam centrais para toda a psicopatologia e estariam intimamente associados às fantasias primitivas e às chamadas relações de objeto (objeto aqui é conceitualizado como representações mentais, na maior parte das vezes inconscientes, de pessoas ou personagens reais ou fantasiadas, completas ou parciais). Nessa concepção, haveria afetos primários, primitivos, como o ódio, a inveja, o medo de ser retaliado, etc., e outros, que indicariam maior maturidade psíquica do indivíduo, como a gratidão, a reparação e o amor. Os afetos resultariam, em grande parte, do tipo e da qualidade das relações do sujeito com os seus objetos internos (conscientes e, sobretudo, inconscientes). Assim, as fantasias de ataque invejoso e destrutivo a objetos internos gerariam sentimentos de medo ou ansiedade paranoide e temor de retaliação. Já o reconhecimento dos objetos internos, como seres inteiros, protetores e vivos, geraria afetos como os sentimentos de reparação e de gratidão. EMOÇÃO: FUNDAMENTOS NEUROFISIOLÓGICOS SISTEMA NERVOSO CENTRAL Um cérebro totalmente intacto é condição prévia para um desenvolvimento normal da afetividade. Cérebro emocional é constituído por tronco cerebral anterior, o tálamo, e o sistema límbico (muito importante + amígdala), bem como as vias fronto-talâmicas e revestem-se de especial importância para estas vivências. Sabe-se que alterações (tumores ou focos de inflamação) ou lesões deliberadamente provocadas (leucotomia) nas referidas regiões, provocam modificações da vida emocional: ausência de emoções, embotamento, redução da resposta afetiva à dor física, etc. SISTEMA NERVOSO AUTÓNOMO (VEGETATIVO)- EM PARTICULAR, O SISTEMA SIMPÁTICO É o sistema cujos centros se encontram estritamente relacionados com as referidas regiões cerebrais (em especial, com o hipotálamo) e é responsável por preparar o organismo para responder a situações de stress e emergência (aumentar a a1vidade cardíaca e a pressão arterial, libertar adrenalina, contrair e relaxar músculos). Todas as emoções são acompanhadas, ainda que em diferente medida – consoante a intensidade, a acuidade e a capacidade individual de reação – por excitação vegetativa (sobretudo, de origem simpática), que determina as manifestações somáticas concomitantes às emoções: sudação, rubor, aumento da irrigação sanguínea cutânea, palpitações, aumento ou descida da tensão arterial, hiperventilação, necessidade de urinar, diarreia, etc. Nas emoções extremas, medo intenso, pânico, ira, etc., podem despoletar-se os chamados padrões motores, que cons1tuem padrões de comportamento filogene1camente gravadas, como, por exemplo, desmaio, reflexo de “fazer- se de morto”, estado de furor com fuga ou ataque violento. SISTEMA ENDÓCRINO: tem a ver com as hormonas. Produzem-se, igualmente, modificações hormonais, intimamente relacionadas com os processos do sistema nervoso central: o sistema endócrino desempenha um papel essencial, sobretudo nas situações de urgência associadas a medo e ansiedade (relação entre a hormona adrenocorticotrófica -ACTH- e a hipófise) Quando existe stresse/situação de emergência cria-se o cortisol para se ter energia para responder a essa situação. (Cortisol- hormona do stress). A hormona libertadora de cor/cotrofina (CRH) atua sobre a hipófise provocando a libertação da hormona adrenocor/cotrófica (ACTH). A hormona adrenocor/cotrófica (ACTH) induz a libertação, pelo córtex adrenal, de cor/sol. O cor/sol e outros cor/coides circulantes – essenciais para o aumento do metabolismo e a disponibilização de energia - inibem a libertação de CRH e ACTH. O eixo CRH-ACTH-cor/sol é um componente central da resposta ao stress. Sem a hormona ACTH, ocorre atrofia do córtex adrenal e a libertação de cor/sol virtualmente cessa – não temos energia para lidar com situações de medo e ansiedade. O SISTEMA LÍMBICO: um dos objetivos da pesquisa sobre a neurociência cognitiva é identificar e entender os sistemas neurais subjacentes diferentes estados emocionais e processos. AMÍGDALA Pequena estrutura em forma de amêndoa no lobo temporal medial adjacente á porção anterior do hipocampo. A amígdala foi primeiramente descrita como importante para a aprendizagem emocional e memória. Dano na amígdala normalmente não prejudica repostas emocionais para estímulos inaptamente aversivos ou gratificantes, mas sim um subconjunto de respostas emocionais aprendidas. Este papel da amígdala na aprendizagem emocional afeta um número de comportamentos emocionais relacionados com a aprendizagem implícita, a memória explicita, as respostas sociais e a vigilância. AMIGDALA: APRENDIZAGEM EMOCIONAL E MEMÓRIA- ESTUDOS INICIAIS COM ANIMAIS E “EMOTIONAL BLINDNESS” As estruturas do lobo temporal medial forma primeiro propostas como importantes para as emoções quando Kluver e Bucy (em 1939) documentaram respostas emocionais inusuais em macacos com danos nesta região. Déficit observado: “psychic blindness” (cegueira psíquica) ou “emotional blindness” (cegueira emocional”) -Tendência aproximam-se de objetos que são indutores de medo 1950: a amígdala foi identificada como uma estrutura primária do lobo temporal medial subjacente aos déficits observado com o que ficou conhecido como “síndrome de Kluver-Bucy”. Desde então, a amígdala tem sido um foco de pesquisa sobre o processamento emocional no cérebro. Embora os humanos com danos na amígdala não apresentam os sinais clássicos da síndrome de Kluver- Bucy, mostram vários deficits mais sutis no processamento emocional. O síndrome de Kluver-Bucy descreve uma variedade de sintomas associados ao dano na amígdala. Kluver-bucy pode ser causado por acidente vacular cerebral, encefalopatias, tumores e até uma lobotomia. Normalmente, Kluver-bucy é expressado quando uma ou ambas as amígdalas, e muitas vezes partes do lobo temporal foram danificadas. Em 1939, Kluver e Bucy descreveram pela primeira vez os sintomas apos a condução bilateral de lobotomias nos macacos rhesus. Após a lobotomia os macacos apresentaram comportamentos orais estranhos como meter objetos nas suas bocas que normalmente não metem. Os macacos mostraram comportamentos hipersexuais, como esforços para acasalar com objetos inanimados. Um sintoma final foi que os macacos medrosose agressivos se tornaram tranquilos quando expostos a objetos temerosos como as cobras. A remoção da amígdala pareceu mudar experiências emocionais como reduzir desgosto provocado pela colocação de objetos prejudiciais na boca, e falta de medo ou agressão quando apresentados com situação de perigo. Condicionamento do medo: Paradigma primário usado para investigar o papel da amígdala na aprendizagem emocional. A lesão na amígdala impede o aprendizado. Duas vias para o processamento das emoções no cérebro: Low road: via mais direta, temos a informação sensorial que é projetada para o tálamo e do tálamo para a amígdala. São respostas de tipo mais automático. Tálamo amígdala High road: Informação projetada para o tálamo, é enviada para o córtex sensorial (analisa mais fina á emoção) e só depois é que vai para a amígdala. Permite avaliação- envolve o pensamento que me vai ajudar a decidir a melhor resposta. Tálamo córtex sensorial amígdala Associada á amígdala temos as memórias emocionais. Ex: Quando um caminhante se depara com uma cobra, a informação visual ativa memórias afetivas através de projeções para a amígdala. Essas memórias não só produzem alterações autónomas, como influenciam o aumento da frequência cardíaca e da pressão sanguínea, mas também pode influenciar ações subsequentes através de projeções para o córtex pré- frontal. O caminhante usará esta informação carregada de emoções na escolha da sua próxima ação. EMOÇÃO E DECISÃO LeDoux’s model (1999) Caminho curto (do tálamo para a amígdala) - rápida “luta ou voa” Caminho longo (passa pelo neocórtex e hipotálamo) - Envolve o “pensar” ou avaliação cognitiva”. “É realmente perigoso? Amigo ou inimigo?” permite flexibilidade de resposta. A amígdala transforma informação em sinais emocionais e inicia e controla as respostas emocionais. Danos na amígdala prejudicam o reconhecimento emocional da música O papel da amígdala no reconhecimento do perigo (medo) está bem estabelecido para estímulos visuais como caras. Um papel similar numa outra classe de estímulos emocionalmente potentes- música- foi recentemente sugerido pelo estudo de pacientes epiléticos com resseção unilateral da parte anteromedial do lobo temporal. Reconhecimento prejudicado de música assustadora após uma excisão unilateral do lobo temporal. Objetivo: avaliar o papel específico da amígdala no reconhecimento do medo da música. Sujeito: SM (lesão bilateral completa relativamente restrita á amígdala) Tarefa 1: SM e os controles combinados foram solicitados a avaliar a intensidade do medo, tranquilidade, felicidade e tristeza da música instrumental gerada por um computador e criada propositadamente para expressar aquelas emoções. Tarefa 2: Os sujeitos avaliaram também a excitação e a valência de cada estímulo musical. Tarefa 3: Uma tarefa de detenção de erro avaliou a função preceptiva auditiva básica. Resultados: SM teve um desempenho normal na tarefa preceptiva, mas foi seletivamente prejudicado no reconhecimento de música assustadora e música triste. Em contraste, o seu reconhecimento da música feliz era normal. Além disso, SM julgou a musica assustadora menos excitante e a musica pacifica menos relaxante do que os controles. No geral, o padrão de comportamento na SM é semelhante ao relatado em pacientes com uma lesão no lobo temporal anteromedial. Os julgamentos emocionais de SM ocorrem face ao processamento intacto das características da música que são emocionalmente predominantes. O uso de dicas de tempo e modo para distinguir músicas alegres de músicas tristes também foi poupado por SM. Assim, a amígdala parece ser mais necessária para o processamento emocional da música do que o processamento percetual em si. EMOÇÃO VS RAZÃO? Emoção e tomada de decisão: António Damásio Emoção: Sinais fisiológicos como uma reação aos estímulos. Sentimentos: Interpretações conscientes das emoções que vem após a interpretação dos estímulos pelo cérebro. Medo: Uma emoção útil- o stress ativa adrenalina e cortisol. A memória ou experiências temerosas estão alocadas no córtex. Os humanos podem controlar usualmente o medo irracional, mas nem sempre. (ansiedade, fobias, transtornos de pânico, transtorno de stress pós traumático) PHINEAS GAGE Trabalhador mineiro que após uma explosão uma barra de ferro atravessou-lhe o crânio e este continuou vivo, embora apresentasse alterações emocionais. ANTÓNIO DAMÁSIO: O ERRO DE DESCARTES UM PHINEAS GAGE MODERNO: ELLIOT → Meningioma, empurrando contra o tecido cerebral. → Tumor removido cirurgicamente assim como o tecido do lobo frontal que foi danificado. → Habilidades cognitivas intactas → Mudança total da personalidade: tornou-se terrível na função executiva (tomada de decisão) e não conseguiu manter empregos, tomou decisões que o levaram á falência e causaram/provocaram dois divórcios. → Por fim, os pagamentos da segurança social foram negados devido à recusa do governo em aceitar a sua deficiência. O QUE A NEUROBIOLOGIA NOS DIZ SOBRE AS EMOÇÕES E A RASÃO A razão aparentemente normal pode ser perturbada por preconceitos enraizados na emoção. Uma redução da emoção pode constituir uma fonte igualmente importante de comportamento irracional. HIPÓTESE DE UM MARCADOR SOMÁTICO (ANTÓNIO DAMÁSIO) O marcador somático é um sinal automatizado que “reduz drasticamente as suas opções”. Perspetiva reação intestinal Resposta à imagem de um mau resultado que vem à mente Resumindo, os marcadores somáticos são uma instancia especial de sentimentos gerados a partir de segundas emoções. Estas emoções e sentimentos foram conectados, pela aprendizagem em prever resultados futuros de certos cenários. A HIPÓTESE DO MARCADOR SOMÁTICO É TESTÁVEL À medida que o marcador acontece no corpo, a resposta de condução da pele pode ser usada para deteta-lo de forma confiável. A tarefa de jogo Lowa: Resultados: Os pacientes normais aprenderam a mudar para os decks mais seguros ao longo do tempo; Os pacientes VMPFC não. Eles sempre escolheram miopicamente. Ambos os pacientes VMPFC e os normais registaram SCR ao receberem recompensas ou penalidades. Os pacientes de VMPFC apenas não conseguiam usar essa informação para aprendizagem. Os pacientes da amígdala realmente não SCR quando recebiam recompensas ou penalidades. Lesão no córtex ventro medial frontal (VMPFC)- não sabem o que é vantajoso a longo prazo. Resultado final: As emoções são o aparelho para aprender. Elas ajudam nos a desenvolver um modelo preditivo interno. Duas possibilidades: o A estimativa cognitiva conecta-se automaticamente com o estado somático. o Estimativa secreta e não consciente precede qualquer processo cognitivo sobre o tema. SENTIMENTOS: Constituem a experiência subjetiva da emoção. Apresentam uma maior duração e estabilidade e não apresentam correlação somática DIFERENÇA ENTRE EMOÇÃO E SENTIMENTO. (ANTÓNIO DAMASIO) A emoção é um conjunto de reações corporais, automáticas e inconscientes, face a determinados estímulos provenientes do meio onde estamos inseridos. As emoções estão na vida inconsciente- são apenas alterações corporais. Os sentimentos estão a nível da consciencia core. Experiências mentais que partem de alterações corporais, é a medida que o cérebro interpreta as alterações corporais. O insight essencial de Damasio é que os sentimentos são “experiências mentais de estados corporais” que surgem à medida que o cérebro interpreta as emoções, elas próprias são estados físicos decorrentes das respostas do corpo a estímulos externos. A ordem de tais eventos é: 1. Estou ameaçado (estímulo ameaçador) 2. Eu sinto medo (emoção) 3. Sinto horror (sentimento) Inconsciente ConscientesEstímulo externo→ alterações do corpo→ interpretação Emoções Sentimentos Consciência cor (core self) HUMOR Estado afetivo basal do sujeito, sendo o sinónimo de estado de ânimo Corresponde a uma disposição emocional a longo termo, prevalente, que dá a tonalidade à forma subjetiva de perceção do mundo. A aparição de um estado de ânimo pode ser espontânea ou ser precedida por estímulos concretos, internos ou externos. TEMPERAMENTO Remete para a personalidade. Características estáveis de natureza emocional do individuo. Traços característicos estáveis de natureza emocional de um indivíduo, a qualidade e labilidade preponderantes no seu humor, a prontidão e intensidade das suas reações emocionais. Trata-se de uma predisposição com possível base genética. PODERÁ FALAR-SE DE 5 TIPOS PRINCIPAIS DE TEMPERAMENTO: 1. Temperamento hipertímico: Pessoa tendencialmente otimista, com alto nível de energia 2. Temperamento distímico: Pessoa tendencialmente pessimista, com baixo nível de energia 3. Temperamento ciclotímico: Pessoa com tendência a variações bruscas do estado de ânimo 4. Temperamento irritável: Pessoa predominantemente impaciente, com baixo nível de tolerância 5. Temperamento ansioso: Pessoa tendencialmente preocupada, com maior sensibilidade ao ambiente externo ALTERAÇÕES QUANTITATIVAS DO HUMOR: EUTIMICO: estado “normal”, sem predomínio de nenhum tipo particular de emoção. HIPERTIMIAS: DENTRO DA NORMALIDADE: Alegria-sentimento positivo de bem-estar. PATOLÓGICAS (Apresentadas de forma crescente em termos de intensidade): Euforia: Aqui está presente uma alegria patológica desproporcionada à circunstância e que se traduz por um estado de completa satisfação e felicidade; ocorre principalmente na mania/hipomania. O termo euforia, ou alegria patológica, define o humor morbidamente exagerado, no qual predomina um estado de alegria intensa e desproporcional às circunstâncias. Expansão: Corresponde a um estado de marcada boa disposição associada a dificuldade de controlo das próprias emoções, o que leva a uma elevada desinibição; ocorre principalmente na mania/hipomania Exaltação: Não está apenas presente euforia, mas também aumento da convicção do próprio valor e das aspirações (o que pode originar, nos casos mais graves, ideias delirantes megalómanas/de grandiosidade); associada geralmente a grande agitação psicomotora; ocorre principalmente na mania. Na exaltação há, além da alegria patológica, a expansão do Eu, uma sensação subjetiva de grandeza e de poder. O Eu vai além dos seus limites, ganhando o mundo. Êxtase: Trata-se de um estado de alegria intensa, experiência de beatitude (felicidade completa), com sensação de dissolução do EU e tendência a compartilhar estados afetivos interiores; como os anteriores, poderá ocorrer na mania, mas também é possível acontecer nos êxtases místicos, no transe histérico, na epilepsia, estados crepusculares, e na esquizofrenia. No estado de êxtase, há perda das fronteiras entre o eu e o mundo exterior. Nesse caso (que também pode ser classificado como transtorno da consciência do eu), o sujeito sente como se estivesse fundido ao mundo exterior. Nota: Estados crepusculares (perturbação qualitativa da consciência): Estreitamento do campo da consciência, com atenção exclusiva para determinada vivência interior e suspensão (ou diminuição) da capacidade de resposta a estímulos vindos do meio externo; Diminuição, também, das respostas a estímulos exteriores; O pensamento está, em diferentes graus, enevoado (até à confusão); habitualmente sobrevém uma amnésia total em relação ao período crepuscular). Todos estes estados elevados de humor podem acompanhar-se de: a) Alterações de motricidade (nos casos menos graves estão alterados os movimentos expressivos – vivacidade da mímica facial, aumento da gesticulação – nos mais graves está presente a agitação psicomotora generalizada b) Alterações do pensamento – nos casos menos graves está alterado o curso do mesmo com aceleração do mesmo e fuga de ideias –, nos mais graves pode haver alterações do conteúdo do pensamento com ideias delirantes, geralmente de grandiosidade. (Vinheta 14) HIPOTIMICAS: DENTRO DA NORMALIDADE: Tristeza normal- adequada às circunstâncias que a provocam, em termos de intensidade e duração PATOLÓGICOS: Humor depressivo: é o sintoma de base das perturbações depressivas, embora não seja sinónimo da mesma, uma vez que nos quadros depressivos, além do humor depressivo estão normalmente presentes outros sintomas como a anedonia (caracteriza se por uma perda da satisfação e interesse em realizar atividades que anteriormente eram consideradas agradáveis), alterações da energia vital (alterações da líbido, do sono, redução da energia vital), da atividade motora (hipocinesia), entre outros. No humor depressivo predomina a tristeza patológica sem desencadeante ou, perante um estímulo apresentado, com uma intensidade e duração desproporcionadas. Estão presentes a tríade cognitiva (consiste nos 3 padrões cognitivos major, típicos dos doentes deprimidos): visão negativa de si mesmo (vê-se a si próprio como inadequado ou defeituoso), visão negativa das suas interações com o meio ambiente (assumindo-se como derrotado nas situações de interação com o meio ambiente) e visão negativa do futuro (antecipa que o seu sofrimento permanecerá indefinidamente). E vários pensamentos automáticos (estes pensamentos correspondem a erros sistemáticos no pensamento da pessoa deprimida e que, em conjunto, caracterizam os esquemas cognitivos característicos), tais como: - Inferência arbitrária (extrair uma conclusão específica na ausência de evidências que suportem essa conclusão) - Abstração seletiva (focalizar um detalhe extraído do contexto, ignorando outros factos) - Hipergeneralização (extrair uma regra geral ou conclusão com base num ou mais incidentes isolados e plicá-la indiscriminadamente) - Magnificação/minimização (erros de avaliação da importância ou magnitude de um evento) - Personalização (propensão a relacionar eventos externos a si próprio, sem base para tal conexão) - Pensamento dicotómico (tendência a colocar todas as experiências em uma entre duas categorias opostas). O humor depressivo pode associar-se a sintomas somáticos marcados, falando-se aqui de tristeza vitalizada - “sentida no corpo” (qualitativamente diferente da tristeza normal) Um doente deprimido pode referir, por exemplo: “Esta tristeza vem de dentro do meu corpo...Sinto uma dor no peito que me impede de respirar, uma pressão que me comprime a cabeça e não me deixa pensar” l O humor depressivo pode, em casos graves, associar-se à presença de ideação suicida e de sintomas psicóticos (alucinações e delírios) geralmente catatímicos (consistentes com a tonalidade afetiva) – alterações da perceção e do conteúdo do pensamento Integram-se aqui os estados de humor que não correspondem a uma elevação ou a uma depressão do humor, mas podem traduzir uma patologia mista do humor. HUMOR DISFÓRICO - É um sintoma de difícil definição acompanhado de uma tonalidade afetiva mal-humorada, predominando uma sensação de mal-estar - Estão presentes ansiedade, irritação e agressividade HUMOR IRRITÁVEL - Difícil de distinguir do anterior - Predomina uma hiperactividade desagradável, hostilidade e eventualmente agressividade a estímulos externos (cônjuge, TV, casa, trabalho) - É facilmente perturbado e reativo Ambos estes tipos de estados de ânimo podem ocorrer em quadros orgânicos, depressivos e ansiosos, na perturbação bipolar (sendo muito típico dos episódios mistos, mas também ocorrendo na mania), ou na esquizofrenia O humor irritável tem sido incluído também nas característicaspsicológicas dos doentes epiléticos. É importante considerar que, dentro dos episódios de humor, é frequente a coexistência dos vários tipos de humor descritos. Por exemplo, não é raro num episódio de mania a presença simultânea de euforia e irritabilidade. Segue-se a descrição de algumas PERTURBAÇÕES DA EXPRESSÃO AFETIVA E EMOCIONAL que poderão ser observadas no exame psicopatológico. → ANEDONIA: Incapacidade para experimentar prazer, sintoma comum na depressão major. O doente refere não ter prazer em atividades que habitualmente lhe proporcionavam este sentimento. Por exemplo: poderá dizer que ler um livro ou ver um programa não lhe dá o prazer que sentia habitualmente. “Estou completamente morto por dentro, já não posso sentir absolutamente nada, tudo está morto e vazio dentro de mim, já não me alegro com nada e também já nada me põe triste. Já nada me comove, tudo secou e endureceu no meu íntimo”. Ocorre frequentemente na depressão → ANESTESIA AFETIVA: Definida como ausência de sentimentos, incapacidade de sentir prazer, mas também de sentir outros afetos. O doente queixa-se de “não ser capaz de sentir”. Ocorre na depressão e em estados de choque emocional, prisioneiros de guerra, deportados. → DISSOCIAÇÃO AFETIVA: Há uma falha na manifestação de emoções em situações em que era esperável que isso ocorresse. Pode surgir em situações que motivem o aparecimento de ansiedade extrema (por exemplo, situações de guerra, alegando-se que poderá aqui funcionar como um mecanismo de defesa que evite a perda de controlo) ou acompanhar sintomas de conversão [Atualmente, define-se conversão como a presença de um ou mais sintomas ou défices que afetam a função motora voluntária ou sensorial, sugerindo a presença de uma doença neurológica ou de outra condição médica que não pode ser comprovada objetivamente] que ocorrem sobretudo em pacientes com personalidades histriónicas (tomando aqui a designação de belle indifférence). O termo “la belle indifference” é um termo Francês, que se traduz para “ bonita ignorância”. La belle indifference é definida como uma ausência paradoxal de angustia apesar de ter uma doença médica grave ou sintomas relacionados a uma condição de saúde. Esta condição é mais associada ao transtorno da conversão (CD). → EMBOTAMENTO AFETIVO: Redução da expressão emocional (geralmente existe uma incapacidade para se estar consciente das emoções). Entorpecimento ou perda global do afeto. Manifesta-se pela diminuição ou ausência observada para os outros da expressão não verbal (e.g., expressão facial, postura) que à partida seria esperada por exemplo numa interação social. Presente frequentemente na esquizofrenia → LABILIDADE AFETIVA: Mudanças rápidas e imotivadas no estado emocional geralmente independentes dos estímulos externos. Pode ocorrer na perturbação bipolar. Exemplo: “um doente comove-se muito durante o diálogo e manifesta tristeza e nostalgia quando lhe perguntam pela sua casa, pelos seus familiares e eventualmente pelo seu cão. No entanto, anima- se rapidamente de novo ao recordar algo de belo ou agradável, manifestando então um estado de humor totalmente contrário ao anterior. → AMBIVALÊNCIA AFETIVA: Sentimentos positivos e negativos direcionados para um mesmo objeto. Presente frequentemente nos doentes esquizofrénicos, mas também em perturbações de personalidade “estado-limite” Exemplo: “Eu adoro o meu pai; é a coisa melhor do mundo para mim, mas às vezes apetece-me matá-lo, odeio-o de ta forma...” → INCONTINÊNCIA AFETIVA: Falta de controlo na expressão dos afetos, estados afetivos que surgem rapidamente e atingem uma intensidade excessiva que não pode ser dominada. Pode surgir, por exemplo, na mania e nas demências. Exemplo: Um demente senil ao qual se pergunta o nome da sua mulher, começa a chorar amargamente. → RIGIDEZ AFETIVA: Perda da capacidade de modulação dos afetos. - Ao contrário do que acontece com a pobreza de sentimentos, o doente dispõe ainda de determinados afetos, mas fica bloqueado nos seus estados de humor ou afetos, independentemente da situação externa ou do objeto de diálogo. Deste modo, por exemplo, durante um diálogo prolongado no qual são aflorados diversos assuntos, o doente persiste no mesmo irritado mau humor ou numa atitude de desconfiança e rejeição. Presente nalguns tipos de personalidade (e.g., obsessiva) → APATIA: Termo que foi tendo vários significados ao longo da história da psicopatologia, tendo sido sinónimo do que se entende atualmente por embotamento (pessoa sem habilidade de se expressar emocionalmente). Considera-se aqui como perda de interesse. → INDIFERENÇA OU FRIEZA AFETIVA: Perda de reatividade/ressonância emocional com fisionomia e aspetos exteriores inexpressivos. Enquanto na rigidez estão presentes respostas emocionais, mas ausente a capacidade de as modular, aqui elas estão ausentes. - Pode ocorrer nalguns tipos de personalidade, na esquizofrenia, em traumatismos cranianos ou em demências. O termo indiferença tem sido usado por alguns autores como sinónimo de embotamento. → PARATIMIA, INCONGRUÊNCIA OU INADEQUAÇÃO AFETIVA: As emoções não correspondem ao contexto das vivências. O doente poderá, por exemplo, rir-se e mostrar-se alegre ao falar da morte de um familiar. Pode ocorrer na esquizofrenia. Exemplo: “Ao mesmo tempo que se ri, um doente informa que, durante toda a noite anterior, foi de novo torturado da forma mais horrível”. → PERPLEXIDADE: Estado de desnorteamento, sentimento relacionado com o questionar de si próprio, da sua situação, do seu futuro e do que o rodeia. Muito característico do humor delirante mas também na ansiedade e depressão. → NEOTIMIA: Experiência afectiva inteiramente nova; é a designação para sentimentos e experiências afetivas inteiramente novos, estranhos e bizarros; difícil de reconhecer porque nunca havia sido experimentado antes; sentimentos novos que podem estar ligados a objetos que não tinham valor especial; pode ser vivenciada em estados de êxtase, nos estados crepusculares mas é típica da psicose aguda (tomando o nome aqui de esquizoforia - em que a experiência afectiva tem uma tonalidade estranha, bizarra, ameaçadora. Vivenciada por doentes em estado psicótico no período que antecede o surgimento da revelação delirante) → ALEXITIMIA OU “EMOTIONAL BLINDNESS”: A definição mais encontrada na literatura é a de que se trata de um constructo multidimensional, integrado pelos seguintes fatores: A. Dificuldades em identificar e descrever sentimentos subjetivos B. Dificuldades em fazer distinção entre emoções e sensações físicas C. Escassez de sonho e incapacidade de simbolizar ou fazer relação entre afeto e fantasia D. Um estilo de raciocínio concreto e objetivo, voltado para a realidade externa. Este sintoma pode estar presente nalguns tipos de personalidade → PUERILIDADE: Alteração do humor com aspetos infantis. Ri e chora por motivos banais. A puerilidade é uma alteração do humor que se caracteriza pelo especto infantil, simplório, regredido. O indivíduo ri ou chora por motivos banais; sua vida afetiva é superficial, sem afetos profundos, consistentes e duradouros. Verifica-se a puerilidade especialmente em indivíduos com déficit intelectual, em alguns quadros histéricos e personalidades histriónicas e em personalidades imaturas de modo geral. → MORIA: Assemelhando-se à puerilidade, a moria é uma forma de alegria muito pueril, ingénua, insípida, sem conteúdo afectivo. Ocorre principalmente em pacientes com lesões extensas dos lobos frontais, em indivíduos com deficiência mental e em indivíduos com quadros demenciais acentuados. → Desmoralização: Consciência de se ser incapaz de lidar com um problema ou de se ficar à quem das suasexpectativas/ou dos outros. Muito próximo do termo desesperança (helplessness). SINDROMES AFETIVAS ISOLADAS (NÃO É NECESSÁRIO SABER) Síndrome depressiva Síndrome maníaca Síndrome esquizoafetiva Síndrome de ansiedade (+ alguns fenómenos psicopatológicos associados à ansiedade) Disforia, síndrome disfórica Síndrome hipocondríaca Reações afetivas suprapessoais (reações primitivas) Distimias crónicas pós-traumáticas ANSIEDADE Dada a controvérsia entre as várias fontes, em relação ao posicionamento da ansiedade no que se refere às classificações dos sintomas, opta-se por descrever a ansiedade separada das outras perturbações de humor, afetos e emoções. Os termos ansiedade e angústia são usados quase indistintamente. No entanto, enquanto a primeira está mais relacionada com um componente psíquico, a segunda associa-se mais com um componente somático. ANTÓNIO DAMÁSIO: UMA ABORDAGEM DA CONSCIÊNCIA António Damásio: “Sempre me intrigou o momento do penetrar na luz, o momento preciso em que, sentados no meio do público, vemos abrir a porta do palco e um intérprete entra na zona da luz; ou, observando este acontecimento na perspetiva do intérprete, o momento preciso em que aguarda na obscuridade vê a mesma porta abrir-se e avança para dentro da luz que ilumina o palco e público”- este momento de penetrar a luz é uma poderosa metáfora para a consciência, para o nascimento do conhecimento, para o advento ao mesmo tempo simples e esmagador da entrada do SI no mundo da mente. SI/SELF: Embora não haja palavra em português que corresponda exatamente ao inglês self, a palavra SI traduz a ideia de forma inequívoca. Mesmo quando recorremos à definição mais simples – a perceção do organismo do seu próprio ser e do seu ambiente – conseguimos facilmente imaginar como a consciência deve ter permitido à evolução humana uma nova ordem de criações que não seriam possíveis sem ela: a consciência moral, a religião, a organização social e a política, as artes, as ciências e a tecnologia A consciência é a função biológica critica que nos permite conhecer a tristeza ou a alegria, sentir a dor ou o prazer, sentir a vergonha ou o orgulho, chorar a morte ou o amor que se perdeu. Tanto o pathos (= sofrimento) como o desejo são produtos da consciência. Sem ela, nenhum desses estados poderia ser conhecido por cada um de nós. A consciência é: 1) Uma mente, que é um fluxo de imagens mentais (estas imagens podem ser padrões sensoriais visuais, por exemplo). Este fluxo de imagens mentais é a mente. 2) O self, nos somos donos das nossas mentes. E temos a perceção de que é cada um de nós que esta a experiência um certo evento Por isso, para termos uma mente consciente, temos um self(eu) dentro da mente consciente. O self introduz na mente a perspetiva subjetiva, e só estamos plenamente conscientes quando a consciência ganha um self. O que necessitamos de saber para abordar este mistério é: 1. Como é que as nossas mentes se reúnem no cérebro 2. Como é que os selfs são construídos Para construirmos mentes precisamos de mapas neuronais. Mapa visual: Retina – Córtex visual (atividade dos neurónios na retina – parte do cérebro localizada no globo ocular ou numa camada do córtex visual - constroem mapas que permitem a experiência mental; ou seja, da retina partimos para o córtex visual – o cérebro acrescenta informação aos sinais que provêm da retina mas também mapas auditivos relativos a sons com diferentes frequências; mapas de tato pelo contacto da nossa pele com um objeto...) Regiões mentais que permitem a construção dos mapas Verde: Informação tátil Azul: Informação auditiva Essas regiões que formam imagens onde temos a formação de todos esses mapas neuronais, podem então fornecer sinais para este oceano de roxo que vêm em redor quer é o córtex de associação, onde podemos registar o que se passou nessas áreas de formação de imagens. O mais incrível é que podemos partir da memória: fora desses córtices de associação e criar as mesmas imagens nas mesmas regiões que têm perceção – como é maravilhosamente conveniente e “preguiçoso” o cérebro.: O cérebro capacita certas áreas para a perceção e formação de imagens e estas são exatamente as mesmas que vão ser usadas para a formação de imagens quando recordamos informação. Mente consciente – segundo Damásio, aqui o mistério é menor porque sabemos como formamos estas imagens. Mas e em relação ao self; ao SI? Como é que podemos ter este ponto e referência, esta estabilidade que é necessária para manter a continuidade do self, dia após dia? A solução para este problema é nós gerarmos mapas cerebrais do interior do corpo e usamo-los como a referência para todos os outros mapas. Se vamos ter uma referência que conhecemos enquanto SELF - O “EU”, O “MIM” – no nosso próprio processamento precisamos de ter algo que seja estável, algo que não varie muito de dia para dia. O PONTO DE PARTIDA: Temos um único corpo (não dois ou três...). Existe apenas um ponto de referência que é o corpo, mas o corpo tem muitas partes e as coisas crescem a ritmos diferentes e têm tamanhos diferentes e pessoas diferentes. Mas o mesmo não se aplica ao seu interior. As coisas relacionadas com o nosso ”internal milieu” – meio interno – por exemplo, toda a gestão dos processo químicos no nosso corpo – são, de facto, extremamente mantidas dia após dia (POR UMA BOA RAZÃO). Se nos desviarmos demasiado dos parâmetros que estão próximos da linha média desse intervalo de sobrevivência – que nos permite viver, adoecemos ou morremos. Então temos um sistema interno nas nossas próprias vidas que garante algum tipo de continuidade. Uma quase infinita constância de dia para dia. Porque se não tivermos essa constância, fisiologicamente, iremos adoecer ou morrer, então este é mais um elemento para esta continuidade e a última coisa é que existe uma união muito forte entre a regulação do nosso corpo dentro do cérebro e o corpo em si mesmo, diferente de qualquer outra união. o Exemplo: estou a criar imagens de vocês, mas não existe um vínculo fisiológico entre as imagens que tenho de vocês enquanto audiência e o meu cérebro. No entanto, existe um vínculo próximo e mantido de forma permanente entre as partes do meu cérebro que regulam o corpo e o meu próprio corpo. Tronco cerebral: Entre o córtex cerebral e a espinal medula É nesta região que temos este alojamento de todos os dispositivos de regulação vital do corpo. Isto é tão específico que, por exemplo, se olharmos para a parte coberta a vermelho na parte superior do tronco cerebral – se a danificarmos, por exemplo, na sequência de um AVC – entramos em coma ou em estado vegetativo que é claro um estado em que a nossa mente desaparece, a nossa consciência desaparece. O que sucede é que perdemos a base do “EU”, deixamos de ter acesso a qualquer sentimento da nossa própria existência e de facto pode haver imagens a formarem-se no córtex cerebral, mas nós não sabemos que elas lá estão. Perdemos, efetivamente, a consciência quando sofremos danos naquela secção vermelha do tronco cerebral. Mas se considerarmos a parte verde do tronco cerebral, nada disso acontece. É assim tão específico. Na parte verde do tronco cerebral – se a lesionarmos, o que acontece com frequência, o que temos é uma paralisia total, mas a nossa mente consciente é mantida. Sentimos, sabemos, temos uma mente completamente consciente que podemos expor de forma muito indireta. Esta é uma condição terrível. Locked-in Syndrome As pessoas estão, de facto,” presas” dentro dos seus próprios corpos mas têm realmente uma mente: Locked-In Syndrome Pessoas com Locked-in Syndrome ao contrario do estado vegetativo, apresentamconsciência, mas não apresentam movimentação corporal. Nessa secção vermelha do tronco cerebral existem, para simplificar, todos esses pequenos quadrados - periaqueductal gray (PAG) + superior colliculus (SC) + medial parabrachial nucleus (PBN) - que correspondem a módulos que formam na verdade mapas cerebrais de diferentes partes do nosso interior, diferentes aspetos do nosso corpo. Eles são extraordinariamente topográficos, e estão extraordinariamente interligados num padrão recorrente. É a partir daqui e desta forte união entre o tronco cerebral e o corpo que António Damásio acredita que geramos este mapeamento do corpo que fornece a base do “EU” e isso vem na forma de sentimentos – sentimentos primordiais. Olhem para o córtex cerebral, para o tronco cerebral e para o corpo e ficam com uma ideia da interligação na qual temos o tronco cerebral a fornecer a base para o EU numa interligação muito forte com o corpo - E temos o córtex cerebral a fornecer o grande espetáculo das nossas mentes com a profusão de imagens que são de facto os conteúdos das nossas mentes e aos quais normalmente prestamos mais atenção, como deveríamos, porque esse é realmente o filme que está a passar nas nossas mentes. Relativamente às setas: → Representam uma interação muito próxima. → Não podemos ter uma mente consciente se não tivemos a interação entre o córtex cerebral e o tronco cerebral → Não podemos ter uma mente consciente se não tivemos a interação entre o tronco cerebral e o corpo. O tronco cerebral que nós temos é partilhado com uma variedade de outras espécies. Nos vertebrados, o design do tronco cerebral é muito semelhante ao nosso, o que é uma das razões pelas quais António Damásio pensa que essas outras espécies têm mentes conscientes tal como nós. Exceto que não são tão ricas como as nossas porque eles não têm um córtex cerebral como o nosso. É aí que reside a diferença. Neste sentido, António Damásio discorda fortemente da ideia de que a consciência deveria ser considerada como o grande produto do córtex cerebral. Apenas a riqueza das nossas mentes o é, não o facto em si de termos um EU/self, de nos podermos referir à nossa própria existência, e de termos a perceção de sermos pessoas. Há 3 níveis do EU a considerar: → Proto self (eu proto): sistema de regulação vital- não consciente: hipotálamo, tronco cerebral e insula- emoção (Réptil) → Core self (eu núcleo): consciência nuclear- sentimento (mamíferos) → Autobiographical self (eu autobiográfico): consciência alargada (só o ser humano) Os primeiros dois são partilhados com muitas muitas outras espécies e estão a sair, em grande medida, to tronco cerebral e no que quer que exista de córtex nessas espécies. É o EU autobiográfico, que algumas espécies possuem (os cetáceos, os primatas e os cães têm, em certa medida, um EU autobiográfico), MAS o EU autobiográfico é construído com base em recordações passadas e em recordações dos planos que fizemos; é o passado vivido e o futuro antecipado. O EU autobiográfico conduziu à memória ampliada, ao raciocínio, à imaginação, à criatividade e à linguagem. E daí resultaram os instrumentos da cultura: religiões, justiça, comércio, artes, ciência e tecnologia. É no âmbito dessa cultura que podemos realmente obter – e é esta a novidade – algo que não é inteiramente determinado pela nossa biologia. É desenvolvido nas culturas. Desenvolveu-se nos coletivos de seres humanos. E esta é claro a cultura na qual desenvolvemos a regulação sociocultural. Emoções- inconsientes Sentimentos- Já passou para a consciencia (core-self) CONSCIÊNCIA: PRESSUPOSTOS FUNDAMENTAIS 1. Alguns aspetos dos processos da consciência podem ser relacionados com a operação de regiões e sistemas específicos do cérebro, abrindo deste modo a porta para a descoberta da arquitetura neural que suporta a consciência. 2. A consciência e a vigília (estar vígil significa estar acordado) assim como a consciência e a atenção elementar podem ser separadas. Este facto baseia-se na evidencia clara de que certos doentes neurológicos podem estar acordados e atentos sem que tenham uma consciência normal. 3. Consciência e emoção não se podem separar. Quando a consciência se encontra alterada, o mesmo se passa com a emoção. 4. A consciência não é monolítica, pelo menos nos seres humanos: pode ser dividida em espécies simples e complexas e a evidencia neurológica torna esta divisão transparente A espécie mais simples – consciência nuclear –fornece ao organismo um sentido do si num momento – agora – e num lugar – aqui. O âmbito da consciência nuclear é o aqui e o agora. A consciência nuclear não ilumina o futuro, e o único passado que nos permite vagamente vislumbrar é o que ocorreu no instante exatamente anterior. Não corresponde a nenhum algures, não corresponde a nenhum ante, nem corresponde a nenhum depois. A espécie mais complexa de consciência – consciência alargada – e da qual existem vários níveis e graus – fornece ao organismo um elaborado sentido de si – uma identidade e uma pessoa – e coloca essa pessoa num determinado ponto da sua história individual, amplamente informada acerca do passado que já viveu e do futuro que antecipa e, agudamente alerta para o mundo que a rodeia. Os dois tipos de consciência correspondem a dois tipos de si/self: O sentido do si na consciência nuclear: si nuclear (core self) – uma entidade transitória, recriada incessantemente para todos os objetos com os quais o cérebro interage. O sentido do si na consciência alargada: si autobiográfico (autobiographical self) – corresponde a um conjunto não transitório de factos e modos de ser singulares que caraterizam uma pessoa (ligado à identidade). O si autobiográfico depende de memórias sistematizadas de situações em que a consciência nuclear permitiu o conhecimento das caraterísticas mais invariantes da vida de um organismo: quem foram os pais, onde nasceu, quando, de que coisas se gosta e que coisas se detestam, a reação habitual face a um problema ou conflito, o nome, etc. O termo memória autobiográfica designa o arquivo organizado dos principais aspetos da biografia de um organismo. PORQUE É QUE IMPORTA SE É O TRONCO CEREBRAL OU O CÓRTEX CEREBRAL E COMO É QUE ISTO ACONTECE? 3 RAZÕES: → Curiosidade: os primatas são extremamente curiosos e os humanos acima de todos; se nos interessamos, por exemplo, pelo facto de que a antigravidade está a puxar as galáxias para longe da Terra, porque é que não deveríamos interessar-nos pelo que se passa dentro dos seres humanos? → Compreender a sociedade e a cultura: Deveríamos olhar para a forma como a sociedade e a cultura nesta regulação sociocultural são um trabalho em curso. → Medicina: não esqueçamos que algumas das piores doenças da humanidade são doenças como a depressão, alzheimer, a dependência de drogas, pensem em AVCs que podem devastar a vossa mente ou deixar-vos inconscientes. Não têm hipótese de tratar essas doenças de forma eficaz e não aleatória se não souberem como isto funciona. Por isso existe uma razão muito boa para além da curiosidade que justifica o que estamos a fazer, e que justifica termos algum interesse no que se passa nos nossos cérebros. Teste: É apresentado um protocolo clinico: quais as perturbações, porque acha isso 2 ou 3 Perguntas de desenvolvimento.