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A RTIGO A RT I C L E3 8 6 Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, 20(2):386-402, mar- a b r, 2004 Territórios do Sistema Único de Saúde – mapeamento das redes de atenção hospitalar The territorial basis of the Brazilian National Health System: mapping hospital networks 1 C o o rdenação de Ge o g ra f i a , Fundação Instituto Bra s i l e i ro de Ge o g rafia e Es t a t í s t i c a , Rio de Ja n e i ro, Bra s i l . 2 De p a rtamento de Epidemiologia e Métodos Qu a n t i t a t i vos em Saúde, Escola Nacional de Saúde P ú b l i c a , Fundação Os w a l d o C r u z , Rio de Ja n e i ro, Bra s i l . 3 De p a rtamento de Informações em Saúde, Ce n t ro de In f o r m a ç ã o Científica e Te c n o l ó g i c a , Fundação Oswaldo Cruz, Rio de Ja n e i ro, Bra s i l . C o r re s p o n d ê n c i a Evangelina X. G . de Ol i ve i ra C o o rdenação de Ge o g ra f i a , Fundação Instituto Bra s i l e i ro de Ge o g rafia e Es t a t í s t i c a . Av. República do Chile 500, Rio de Ja n e i ro, R J 2 0 0 3 1 - 0 7 0 , Bra s i l . e va n @ i i s . c o m . b r Evangelina X. G . de Ol i ve i ra 1 Marilia Sá Ca rvalho 2 Cláudia Tra vassos 3 A b s t r a c t This article presents two types of networks orga- n i zed according to patient caseload in health s e rv i c e s , concerning both primary hospital care (most frequent hospital pro c e d u res) and tert i a ry c a re (high-cost pro c e d u re s ) . Data on inpatient c a re in Brazil in 2000 obtained from the Ho s p i- tal Information System of the Unified Na t i o n a l Health System were aggregated by place of re s i- dence and hospital location at the municipal l e ve l . Both the network structure and the node (municipality) hiera rchy were established using the dominant flow appro a c h . In addition, a ty- p o l o gy of flows was applied to indicate the de- g ree of connection across the network s . Pr i m a ry hospital care networks reach most of the coun- t ry, and few municipalities are not connected to the network . Re l a t i vely few cities provide high- e r- l e vel serv i c e s , and almost half of the munici- palities are unconnected. The Mi n i s t ry of He a l t h aims to provide access to frequently used health s e rvices near the users’ place of re s i d e n c e , a n d this goal appears to be feasible in the short run. On the other hand, much remains to be done to e n s u re widespread access to tert i a ry care . Health Se rvices Ac c e s s i b i l i t y ; At t e n t i o n ; He a l t h Se rv i c e s I n t ro d u ç ã o O mapeamento das redes estabelecidas pelo deslocamento das pessoas que buscam atendi- mento pelo Sistema Único de Saúde (SUS), em todo o Brasil, permite identificar lacunas na d i s t ribuição dos serv i ç o s. Um quadro de re f e- rência nacional, que permita situar os estudos mais detalhados, é útil para investigar em que medida o SUS avançou na promoção da uni- versalização do acesso. De fato, para que os s e r- viços possam ser acessíveis a todos, o planeja- mento do setor saúde precisa conhecer a sua d i s t ribuição e a de seus usuários nas várias es- c a l a s, da escala local à nacional. A regionalização e a hiera rquização da re d e de serviços de saúde são dire t ri zes do SUS. At é re c e n t e m e n t e, a estratégia de descentra l i z a ç ã o, c a ra c t e rizada pela municipalização, re c e b e u maior destaque do que a hiera rquização dos s e rv i ç o s. Com a No rma Op e racional de At e n- ção à Saúde (NOAS-SUS), publicada em janeiro de 2001, foi retomada a proposta original de h i e ra rquização através da organização de re- des articuladas e efetivas de serviços que inte- g rem as capacidades de diversos municípios, de modo a alcançar economias de escala, e evi- tar ineficiências no sistema 1. Na geografia, redes são estru t u ras de interc o- n e x ã o, constituídas por dois tipos de elementos: pontos (ou nós) e as ligações entre eles. A confi- g u ração das ligações re vela a estru t u ra da rede 2. REDES DE ATENÇÃO HOSPITA L A R 3 8 7 Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, 20(2):386-402, mar- a b r, 2004 Nas redes terri t o ri a i s, os lugares corre s p o n d e m aos pontos, e as ligações podem ser materi a i s, como as estra d a s, ou imateri a i s, como os sinais e l e t romagnéticos 3. O estudo das redes perpassa v á rios campos do conhecimento, e adquiriu par- ticular relevância nos últimos anos. As redes configuram-se em árvo re, ou em malha 3. Redes em árvo re, também conhecidas como redes hierárquicas (ou piramidais), ca- ra c t e rizam-se pela limitação das conexões en- t re seus diversos ra m o s. Predominam os fluxo s h i e r á rq u i c o s, de um centro menor para o seu s u p e rior e, não havendo caminhos altern a t i- vo s, podem ocorrer pontos de estra n g u l a m e n- t o, impedindo o acesso da população aos ní- veis superi o res da hiera rquia. Já as redes org a- nizadas em malha – em que cada nó se liga a v á rios outros – permitem perc o r rer caminhos va riados entre os pontos, de modo que os di- versos ramos da rede estão interc o n e c t a d o s. Na Saúde Pública, o conceito de acesso é c o m p l e xo, e expressa o grau de ajuste entre as necessidades dos usuários e a oferta de serv i- ços de saúde, segundo a idéia inicialmente p ro- posta por Donabedian 4. Neste tra b a l h o, aces- so assume uma definição mais re s t rita, a de acessibilidade geográfica, já re f e rida por Do- n abedian. Segundo essa conceituação inicial, acessibilidade é um dos componentes do aces- s o, aquele que relaciona a localização da ofert a e a localização dos usuári o s, considerados os meios de tra n s p o rte destes e o tempo, a distân- cia e os custos envolvidos no deslocamento 5 , 6. O nível de renda das pessoas condiciona a in- tensidade com que o uso de um serviço de saú- de é afetado pela distância a que está localiza- do o serviço 7, e isso ocorre mesmo nos casos em que o serviço é gra t u i t o, na medida em que o sistema de saúde afirma a unive r s a l i d a d e, mas não garante tra n s p o rt e. As barre i ras re p resentadas pela distância têm impacto diferenciado de acordo com o ní- vel de complexidade dos serviços demanda- dos; assim, os deslocamentos em busca de ser- viços especializados serão, norm a l m e n t e, mais longos do que aqueles que demandam níve i s de atenção mais simples 8 , 9. A investigação das desigualdades no acesso aos serviços de saúde d e ve, port a n t o, levar em conta o padrão de lo- calização destes serv i ç o s, e a va riação nas dis- tâncias que os indivíduos com problemas de saúde semelhantes devem perc o r rer para obter a t e n d i m e n t o. O presente trabalho investiga as redes esta- b e l e c i d a s, no Brasil, para diferentes tipos de d e- manda de serviços de saúde – mais simples e mais complexo s. Dois tipos de rede foram in- vestigados: a configurada pela atenção hospi- talar básica, definida pelas condições de maior f reqüência de internação e as redes estabeleci- das por tratamentos de alta complexidade, pa- ra examinar va riações de escala e dire c i o n a- mento dos fluxos que demandam serviços m a i s e s p e c i a l i z a d o s. Material e métodos Este estudo examinou as internações pagas pe- lo SUS – no ano de 2000 em todo o Brasil – agre- gadas segundo o município de internação e o de residência dos pacientes. Os dados fora m obtidos no Sistema de In f o rmações Ho s p i t a l a- res do SUS (SIH-SUS), considerando-se apenas as Au t o rizações de In t e rnação Hospitalar (AIH) de tipo 1 (re g i s t ros que, em geral, corre s p o n- dem às internações). O total de AIH do tipo 1 foi de 11.937.323; e destas, 2.953.531 (24,7%) fora m realizadas em município diferente do municí- pio de residência dos pacientes. Pa ra investigar a organização da rede de atenção hospitalar básica, o total das intern a- ções no Brasil foi desagre ga d o, por idade, em dois grupos: o das pessoas com cinco anos e mais de idade (10.234.858 AIH) e o das cri a n ç a s com idade menor do que cinco anos (1.702.465 AIH). Com esta divisão, buscou-se avaliar as mudanças na extensão e na configuração das re- des provocadas pela menor capacidade de des- locamento das cri a n ç a s. Selecionou-se as in- t e rnações de maior freqüência, tomando como referência a va ri á vel “p rocedimento re a l i z a d o” (Tabela de Procedimentos) 1 0, que é a unidade de pagamento do SUS. Pa ra o pri m e i ro gru p o incluiu-se apenas os quarenta pro c e d i m e n t o s mais fre q ü e n t e s, re s p o n s á ve i s, no mínimo, por 0,5% das internações no país, relacionados na Tabela 1, e correspondendo a 6.417.217 inter- n a ç õ e s. Uma vez identificado o subconjunto de p ro c e d i m e n t o s, selecionou-se as intern a ç õ e s em que o município de residência do paciente e ra diferente do município de sua intern a ç ã o, e n c o n t rando-se 1.377.224 nesta situação. Ap l i- cou-se a mesma seqüência e cri t é rios de sele- ção para gerar o grupo composto pelas intern a- ções das cri a n ç a s, um total de 1.442.583 inter- nações, das quais 291.962 ocorreram fora de s e u município de residência. Pa ra essa faixa etári a , são trinta os procedimentos mais fre q ü e n t e s, re s p o n s á ve i s, no mínimo, por 0,5% das inter- Oliveira EXG et al.3 8 8 Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, 20(2):386-402, mar- a b r, 2004 Tabela 1 Identificação dos procedimentos mais freqüentes – população com cinco e mais anos de idade. Brasil, 2000. C ó d i g o D e s c r i ç ã o % no Brasil % fora do d o m i c í l i o 3 5 0 0 1 0 1 1 Parto norm a l 1 1 , 7 7 , 6 3 5 0 2 1 0 1 2 Parto normal com atendimento do recém-nascido na sala de parto 4 , 3 2 , 5 7 7 5 0 0 1 1 3 Insuficiência card í a c a 3 , 8 2 , 9 6 3 0 0 1 4 0 3 Tratamento em psiquiatria em hospital psiquiátrico – b 3 , 3 5 , 7 3 5 0 0 9 0 1 2 C e s a r i a n a 3 , 2 2 , 4 3 5 0 1 4 0 1 6 C u retagem pós-aborto 2 , 3 1 , 5 3 5 0 2 5 0 1 8 Parto normal – exclusivamente para hospitais amigos da criança 2 , 2 1 , 7 7 6 5 0 0 2 2 5 Doença pulmonar obstrutiva crônica 2 , 2 1 , 3 7 4 5 0 0 2 5 2 E n t e ro infecções (clínica médica) 2 , 1 1 , 0 8 1 5 0 0 1 0 6 AVC agudo 1 , 8 1 , 4 7 6 5 0 0 1 2 8 Crise asmática 1 , 8 0 , 8 7 6 5 0 0 0 7 1 B ro n c o p n e u m o n i a 1 , 6 0 , 9 3 5 0 2 2 0 1 9 Cesariana com atendimento do recém-nascido na sala de parto 1 , 6 1 , 1 7 6 5 0 0 0 6 3 Pneumonia não especificada 1 , 6 0 , 9 7 7 5 0 0 1 2 1 Crise hipertensiva 1 , 4 0 , 8 8 0 5 0 0 0 7 2 P i e l o n e f r i t e 1 , 2 0 , 7 7 2 5 0 0 0 0 0 Diagnóstico e/ou primeiro atendimento em clínica médica 1 , 2 0 , 9 3 3 0 1 1 1 1 7 H e rniorrafia inguinal (unilateral) 1 , 2 1 , 1 8 2 5 0 0 0 5 3 Diabetes sacarino 1 , 1 0 , 7 3 4 0 0 8 0 2 0 Colpoperineoplastia anterior e posterior 1 , 0 1 , 0 3 3 0 0 4 0 8 0 C o l e c i s t e c t o m i a 0 , 8 0 , 9 7 5 5 0 0 1 2 4 Hemorragias digestivas 0 , 8 0 , 7 7 5 5 0 0 0 3 5 Gastrite e duodenite 0 , 8 0 , 4 3 5 0 2 6 0 1 4 Cesariana – exclusivamente para hospitais amigos da criança 0 , 8 0 , 7 7 7 5 0 0 0 3 2 Insuficiência coronariana aguda 0 , 7 0 , 7 8 0 5 0 0 2 1 8 Outras afecções do aparelho gênito urinário 0 , 7 0 , 5 7 6 5 0 0 2 3 3 Insuficiência respiratória aguda 0 , 7 0 , 5 3 3 0 0 5 0 6 0 A p e n d i c e c t o m i a 0 , 7 0 , 6 7 4 3 0 0 2 7 0 E n t e ro infecções (pediatria) 0 , 6 0 , 3 7 6 3 0 0 1 0 2 Crise asmática 0 , 6 0 , 3 7 6 5 0 0 0 4 7 Pneumonia bacteriana 0 , 6 0 , 4 8 5 5 0 0 8 7 9 I n t e rcorrências clínicas de paciente oncológico 0 , 6 0 , 9 7 6 3 0 0 0 8 0 B ro n c o p n e u m o n i a 0 , 5 0 , 3 3 3 0 1 6 1 1 9 L a p a rotomia exploradora 0 , 5 0 , 6 7 3 5 0 0 0 1 1 Desnutrição (clínica médica) 0 , 5 0 , 3 3 4 0 1 0 0 3 3 H i s t e rectomia total 0 , 5 0 , 5 7 5 5 0 0 2 7 2 Colecistite aguda 0 , 5 0 , 3 7 4 5 0 0 2 0 1 E s t reptococcias (clínica médica) 0 , 5 0 , 3 8 0 5 0 0 1 1 0 Cólica nefrética 0 , 5 0 , 3 7 6 3 0 0 0 7 2 Outras pneumonias 0 , 5 0 , 3 To t a l 6 2 , 7 4 6 , 6 REDES DE ATENÇÃO HOSPITA L A R 3 8 9 Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, 20(2):386-402, mar- a b r, 2004 nações ( Tabela 2). Note-se que apenas quatro p rocedimentos integram as duas re l a ç õ e s. No caso das redes de alta complexidade, se- l e c i o n a ram-se as internações re l a t i vas aos pro- cedimentos hospitalares de alta complexidade, definidos na Po rt a ria SAS n. 96, de 27 de março de 2000, sendo essas internações agregadas se- gundo especialidades, com base na Tabela de Compatibilidade entre o Procedimento Re a l i- zado e o Diagnóstico Principal In f o rmado da Po rt a ria SAS n. 579, de 28 de deze m b ro de 2 0 0 1 . De n t re as 56 especialidades constantes desta tabela foram analisadas as duas re s p o n s á ve i s pelo maior número de intern a ç õ e s, a saber, Ci- ru rgia Ca rdíaca, com 51.695 intern a ç õ e s, das quais 29.590 ocorre ram fora do município de residência, e Ne u ro c i ru rgia – Alta Co m p l e x i d a- d e, com 94.039 intern a ç õ e s, 41. 638 das quais em outro município. Não foram considerados os fluxos interm u- nicipais re p resentados por uma única intern a- ç ã o, visando reduzir problemas de flutuação a l e a t ó ria, o que, no final, resultou em tra b a- l h a r-se com 1.358.635 internações de pessoas com cinco anos e mais de idade e 284.655 de c ri a n ç a s, para a atenção hospitalar básica, e com 26.725 internações para Ciru rgia Ca rd í a c a e 38.991 para Ne u ro c i ru rg i a . A unidade geográfica de análise foi o muni- c í p i o. Em 3.640 municípios, dos 5.507 existen- tes no Brasil em 2000, ocorre ram intern a ç õ e s pagas pelo SUS. Na entrada dos dados dos for- m u l á rios da AIH não é incomum, nos casos de ocorrência de municípios homônimos, o erro Tabela 2 Identificação dos procedimentos mais freqüentes – crianças com menos de cinco anos de idade. Brasil, 2000. C ó d i g o D e s c r i ç ã o % no Brasil % fora do d o m i c í l i o 7 6 4 0 0 2 7 1 E n t e ro infecções em lactente 1 0 , 5 8 , 9 7 6 4 0 0 0 8 5 B roncopneumonia em lactente 1 0 , 2 8 , 2 7 6 3 0 0 1 0 2 Crise asmática 9 , 3 6 , 9 7 4 3 0 0 2 7 0 E n t e ro infecções (pediatria) 7 , 5 5 , 0 7 6 4 0 0 0 7 7 Pneumonia do lactente 7 , 2 6 , 8 7 6 3 0 0 0 8 0 B ro n c o p n e u m o n i a 7 , 1 4 , 7 7 6 3 0 0 0 7 2 Outras pneumonias 5 , 0 3 , 9 7 1 3 0 0 0 1 5 P re m a t u r i d a d e 2 , 9 4 , 0 7 6 3 0 0 1 8 8 Insuficiência respiratória aguda 2 , 5 2 , 5 7 1 3 0 0 0 0 7 Diagnóstico e/ou primeiro atendimento em clínica pediátrica 2 , 3 2 , 2 7 6 3 0 0 0 2 1 L a r i n g o t r a q u e o b ro n q u i t e 2 , 0 1 , 3 7 2 3 0 0 0 1 9 Desidratação aguda (pediatria) 1 , 8 1 , 5 7 4 3 0 0 2 6 1 Septicemia (pediatria) 1 , 7 3 , 0 7 1 3 0 0 0 8 2 Icterícias neonatais 1 , 5 1 , 4 7 1 3 0 0 1 1 2 Outras afecções do re c é m - n a s c i d o 1 , 5 1 , 5 7 6 3 0 0 0 5 6 B ronquiolite aguda 1 , 4 1 , 2 3 3 0 1 1 1 1 7 H e rniorrafia inguinal (unilateral) 1 , 3 1 , 8 7 4 3 0 0 2 3 7 Estafilococcias (pediatria) 1 , 1 1 , 2 7 4 3 0 0 2 2 9 E s t reptococcias (pediatria) 1 , 0 0 , 9 7 1 3 0 0 0 6 6 Pneumopatias agudas 1 , 0 1 , 0 7 6 3 0 0 0 6 4 Pneumonia estafilocóccica 0 , 8 0 , 9 8 1 3 0 0 0 4 2 E p i l e p s i a s 0 , 8 0 , 9 3 1 0 0 4 1 0 5 Postectomia (circ u n c i s ã o ) 0 , 7 0 , 8 7 1 3 0 0 0 9 0 Infecções perinatais 0 , 7 0 , 7 8 0 3 0 0 0 7 3 P i e l o n e f r i t e 0 , 6 0 , 6 3 3 0 1 5 1 1 2 H e rniorrafia umbilical 0 , 5 0 , 6 7 1 3 0 0 0 3 1 Anoxia perinatal grave 0 , 5 0 , 6 3 1 0 0 0 0 0 2 C i r u rgia múltipla 0 , 5 0 , 6 7 1 3 0 0 0 5 8 S í n d rome da A.P.I. do recém-nascido (membrana hialina) 0 , 5 0 , 7 7 3 3 0 0 0 1 2 Desnutrição protéico calórica (1o e 2o graus)pediatria 0 , 5 0 , 5 To t a l 8 4 , 9 7 4 , 8 Oliveira EXG et al.3 9 0 Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, 20(2):386-402, mar- a b r, 2004 de identificação da Unidade da Fe d e ração do município de residência do paciente intern a- d o. En c o n t ro u - s e, por exemplo, pacientes in- t e rnados em São Pa u l o, e residentes em Sa n t o André, na Pa raíba, bem como intern a ç õ e s, em Cuiabá, de residentes em V á rzea Gra n d e, no Piauí, ou ainda, residentes em Ca x i a s, no Ma- ra n h ã o, internados em Nova Iguaçu, no Rio de Ja n e i ro. Tais erros prejudicam a análise dos flu- xo s. Pa ra corri g i - l o s, selecionou-se para re v i- são – e quando necessári o, realocou-se – os re- g i s t ros re f e rentes a municípios de re s i d ê n c i a com problemas de homônimos, num total de 263 casos, re p resentando no mínimo duas e no máximo 197 AIH. No caso dos pro c e d i m e n t o s de alta complexidade, entre t a n t o, não fora m realizadas corre ç õ e s, pois, além de re g i s t ra r- s e apenas nove casos de dúvidas provocadas por h o m ô n i m o s, va riando de 2 a 67 AIH, é perf e i t a- mente plausível que pacientes residentes em São Be rn a rd o, Ma ra n h ã o, por exemplo, ten h a m s o f rido ciru rgia cardíaca em São Pa u l o. A estru t u ra espacial pode ser inve s t i g a d a e m p regando conceitos da teoria dos gra f o s, ra- mo da topologia desenvolvido a partir do estu- do de Eu l e r, de 1736, sobre as pontes de Kö- n i g s b e rg. Nos grafos lineares os objetos (luga- res) são re p resentados por vért i c e s, e as liga- ções por arestas 1 3. Pa ra identificar redes ba- seadas no consumo de serviços de saúde em- p re g o u - s e, neste tra b a l h o, o método do fluxo d o m i n a n t e, proposto por Nystuen & Dacey 1 4, que estabelece a hiera rquia dos nós da re d e com base em três pro p riedades dos fluxos: “ (1) uma cidade é independente se o seu maior fluxo se dirige para uma cidade menor do que ela, e s u b o rdinada se o fluxo vai para uma cidade m a i o r ; (2) tra n s i t i v i d a d e : se A é subordinada a B e B é subordinada a C, então A é subord i n a d a a C; e (3) uma cidade não pode ser subord i n a d a a qualquer de suas subord i n a d a s” 1 5 ( p. 149). Pa ra cada uma das redes inve s t i g a d a s, a m a t riz de fluxos entre os municípios é compos- ta pelas células que re p resentam o município de residência e o de intern a ç ã o, e pelo número de intern a ç õ e s. Pa ra aplicar a pri m e i ra pro- p riedade dos fluxo s, empregou-se como indi- cador de tamanho do município o Valor To t a l (em Reais) das AIH (de todos os tipos) pagas pelo SUS no ano de 2000, em cada município. O método do fluxo dominante define, si- m u l t a n e a m e n t e, o arcabouço da rede e os ní- veis hierárquicos dos municípios que consti- tuem os nós. Os municípios independentes constituem o pri m e i ro nível; os que lhes são di- retamente subordinados são de nível 2; aque- les que se ligam a um município de nível 2 são de nível 3, e assim sucessiva m e n t e. Os municí- pios subord i n a d o s, diretamente ou por tra n s i- t i v i d a d e, constituem a rede do município de n í vel superi o r, podendo-se examinar redes li- gadas a centros (municípios) de qualquer ní- vel. Note-se que lugares de um mesmo níve l h i e r á rquico não precisam apresentar cara c t e- rísticas semelhantes. Co n s i d e re - s e, por exem- p l o, uma rede formada por alguns poucos mu- nicípios, em área de povoamento rarefeito, e o u- t ra composta por um grande centro que polari- za um elevado número de municípios: o centro de mais alto nível em cada uma das redes ocu- pa idêntica posição (o nível 1) em ambas as re- d e s, mantendo-se essa correspondência entre os demais níve i s, apesar das diferenças de ta- m a n h o, equipamento ou funções desempe- nhadas pelos centros em cada uma das áre a s. O arcabouço traçado pelas principais liga- ções entre os nós (o fluxo dominante) eviden- cia a estru t u ra hierárquica da re d e, mas vári o s o u t ros fluxo s, além do principal, estru t u ram os relacionamentos internos e externos de cada rede e limitar o exame apenas aos fluxos domi- nantes re p resenta perda de inform a ç ã o. Um a f o rma de avaliar a diversidade de fluxos é clas- sificá-los segundo tipologia que os distingue da s eguinte forma: os hierárq u i c o s, que acompa- nham a principal ligação, e os tra n s ve r s a i s, que o c o r rem entre diferentes ra m o s, ou sub-re d e s ( Fi g u ra 1). Além disso, é possível ve rificar se tais f l u xos obedecem à hiera rquia da rede (ascen- dentes) ou se são “c o n t ra – h i e r á rq u i c o s” (des- cendentes). Note-se que os fluxos hierárq u i c o s e contra – h i e r á rquicos podem diri g i r-se para seu superior ou inferior imediato, ou podem ser c a p t u rados por um centro de outro nível, sendo então chamados de fluxos em “curto circuito” 1 6. Ao considerar também as ligações existentes e n- t re os diversos ramos da re d e, além das re l a ç õ e s de subordinação hierárquica, esta classificação p e rmite avaliar o grau de “f e c h a m e n t o” ou, ao c o n t r á ri o, de interconexão das várias re d e s. Como pri m e i ra aproximação ao exame das b a r re i ras re p resentadas pela distância, calcu- lou-se a proporção de internações segundo fai- xas de distância. Pa ra a identificação da rede e classificação dos fluxo s, utilizou-se um pro g ra- ma desenvolvido por Mabini & Rabino 1 7. A distância em linha reta, da sede de cada muni- cípio para a de seu superi o r, foi calculada pelo p ro g rama Arc Vi e w, o mesmo usado para ma- pear as re d e s. R e s u l t a d o s No Brasil, em 2000, os municípios com hospi- tal conveniado ao SUS concentra vam 91,0% da REDES DE ATENÇÃO HOSPITA L A R 3 9 1 Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, 20(2):386-402, mar- a b r, 2004 q u a t ro destes municípios, não há hospitais c o n veniados ao SUS. As cinco redes com subordinados têm di- mensões bem dive r s a s. As duas menores são a de Rio Crespo (Rondônia) comandando apenas um município, e a de Ponte Branca (Mato Gro s- so) com dois municípios. Recife e Po rto Alegre comandam redes com 486 e 466 municípios, re s p e c t i va m e n t e, e a maior de todas as redes é a de São Pa u l o, com 4.543 municípios. O mapa da Fi g u ra 2 apresenta os três pri m e i ros níve i s das maiores re d e s, desconsiderando os centro s que não têm municípios subordinados As áre a s de atuação dessas redes são marcadas por g randes diferenças de tamanho, seja em ter- mos de área, seja em número de municípios, seja em volume de população (Tabela 3). A rede comandada por Recife está org a n i- zada em sete níve i s, e é composta por municí- pios de Pe rn a m b u c o, Pa raíba e Alagoas. No se- gundo nível contam-se 42 centro s, 18 dos quais têm municípios subord i n a d o s. En t re as re d e s comandadas pelos centros de nível 2 desta- cam-se as de João Pessoa e Maceió. A classifi- cação dos fluxos originados nos municípios da rede de Recife indica uma predominância dos f l u xos tra n s ve r s a i s, que alcançam 65,2% do to- tal, sendo 52,5% ascendentes. Quanto aos flu- xos hierárq u i c o - a s c e n d e n t e s, 16,5% são dire- t o s, e 15,1% em “c u rto circ u i t o”, saltando está- g i o s, e indo diretamente para um nível superi o r. população total do país e cerca de 75,0% das i n t e rnações ocorre ram no município de re s i- dência do paciente. Na investigação da rede de atenção hospitalar básica, para o grupo da po- pulação de cinco anos e mais de idade ve ri f i- cou-se que os quarenta procedimentos mais f reqüentes ( Tabela 1) foram re s p o n s á veis por 62,7% das internações custeadas pelo SUS no ano 2000, em todo o país. Co n s i d e rando ape- nas as internações realizadas em hospitais fora do município de residência do paciente, esta p roporção cai para46,6%. No total, 2.808 mu- nicípios intern a ram pessoas residentes fora de seus limites. Co n s i d e rando a distribuição de pacientes em todos os pares município de re s i- dência–município de intern a ç ã o, 35,0% dos f l u xos correspondem a menos de cinco pes- s o a s, e 26,0% a trinta ou mais pessoas; em re l a- ção ao total acumulado de pacientes que saem de cada município, esses va l o res são de 0,5% e 94,0%, re s p e c t i va m e n t e. As internações de pessoas de cinco anos e mais de idade conform a ram 12 re d e s, cinco das quais compostas por um município de ní- vel 1 e pelo menos um subord i n a d o. Sete mu- nicípios não enviaram pacientes para intern a- ção fora de seu terri t ó rio e são, por definição, c e n t ros independentes. Destes sete, três locali- zam-se no Amazo n a s, e os outros quatro, um no Ma ra n h ã o, um no Piauí, um no Rio Gra n d e do Sul e um no Mato Gro s s o. Note-se que, em Tipos de fluxos • H i e r á rquico ascendente 1a dire t o 1b “curto circ u i t o ” 1c “eso-hierárq u i c o ” • Contra hierárquico descendente 2a dire t o 2b “curto circ u i t o ” • Transversal (mesma árvore ) 3a ascendente 3b horizontal 3c descendente • Transversal (árvores difere n t e s ) 4a ascendente 4b horizontal 4c descendente Figura 1 Tipos de fluxos (adaptado de Rabino & Ocelli 1 6) . v v v v v v v v v v 1a 1b 1c 4a 2b 4b 4c 2a 3a 3c 3b nível de corte Oliveira EXG et al.3 9 2 Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, 20(2):386-402, mar- a b r, 2004 Figura 2 Redes de atenção hospitalar básica. População de 5 anos e mais de idade. 0 200 400 600 800 1000 km nível dos centros de rede � 1 � 2 � 3 � 4 redes nível 1 nível 2 nível 3 REDES DE ATENÇÃO HOSPITA L A R 3 9 3 Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, 20(2):386-402, mar- a b r, 2004 A rede de Po rto Alegre é basicamente re s- t rita à área do Rio Grande do Sul, e seus muni- cípios distribuem-se por cinco níve i s. Ap e n a s um município gaúcho, na fro n t e i ra com Sa n t a Ca t a rina, está fora dela, e um município cata- rinense integra a re d e. No nível 2 estão 73 mu- n i c í p i o s, 41 dos quais têm subord i n a d o s. De s- t a c a m - s e, no segundo nível, as redes coman- dadas por Caxias do Sul, Passo Fundo e Pe l o- t a s. A classificação dos fluxos originados nos municípios da rede de Po rto Alegre indica uma p redominância dos fluxos tra n s ve r s a i s, que al- cançam 58,0% do total, sendo 49,8% ascen- d e n t e s. Quanto aos fluxos hierárq u i c o - a s c e n- d e n t e s, 22,7% são dire t o s, e 17,1% em “c u rt o c i rc u i t o”. E s t ru t u rada em nove níve i s, a rede de São Paulo é composta pelas redes dos centros de n í vel 2: capitais estaduais, centros re g i o n a i s p a u l i s t a s, e municípios da região metro p o l i t a- na de São Pa u l o. Das redes de nível 2, a mais extensa é a de Goiânia, com 123 centros de ní- vel 3, dos quais 85 (69,1%) não apresentam ra- mificação própria. A dimensão da área é re l a t i- vizada pela ra refação das ligações mais exten- s a s. Note-se que, no quarto nível desta re d e, s u b o rdinada a Brasília, está a sub-rede de Te re- sina, que engloba a de São Lu í s, no quinto ní- vel. A segunda maior rede em número de mu- nicípios é aquela ligada ao Rio de Ja n e i ro, com 18 centros de nível 3, dos quais apenas cinco (27,8%) não têm subord i n a d o s. De s t a c a m - s e, Tabela 3 Atenção hospitalar básica (população de cinco anos e mais de idade) – principais redes de nível 1 e respectivas sub-redes de nível 2. R e d e s N ú m e ro de Á rea (km2) População 2000 N ú m e ro m u n i c í p i o s ( n ú m e ro de habitantes) de níveis São Paulo 4 . 5 4 3 7 . 9 7 9 . 0 7 0 1 4 5 . 8 8 5 . 8 9 7 9 G o i â n i a 1 1 3 6 3 . 4 8 8 . 9 7 0 2 4 . 7 3 4 . 2 8 9 9 Rio de Janeiro 8 6 1 5 3 3 . 2 8 2 3 2 . 2 4 6 . 5 5 2 8 C u r i t i b a 6 1 6 2 8 3 . 4 8 7 1 3 . 3 0 6 . 4 4 8 8 S a l v a d o r 4 4 7 4 5 8 . 1 9 0 1 4 . 0 1 5 . 8 8 4 7 Ribeirão Pre t o 4 0 6 2 4 2 . 2 4 8 7 . 7 7 1 . 1 6 7 8 F o r t a l e z a 3 5 9 2 0 8 . 0 3 8 1 0 . 4 4 8 . 1 0 9 8 S o ro c a b a 2 5 5 1 1 7 . 4 8 3 6 . 0 8 1 . 2 5 5 8 C a m p i n a s 1 8 7 6 0 . 4 3 6 7 . 7 3 5 . 2 5 3 8 B e l é m 8 7 5 3 8 . 7 1 4 4 . 3 0 4 . 7 9 1 6 Campo Grande 6 8 3 2 2 . 0 0 1 1 . 9 2 2 . 9 5 2 5 M a n a u s 6 7 1 . 7 1 1 . 0 3 2 3 . 3 7 3 . 3 8 8 6 São José dos Campos 1 2 5 . 7 6 7 1 . 0 7 5 . 8 9 0 4 S a n t o s 9 2 . 4 0 2 1 . 4 7 4 . 6 6 5 4 R e c i f e 4 8 6 1 5 6 . 9 0 0 1 3 . 3 9 8 . 6 8 0 7 João Pessoa 2 1 8 5 3 . 8 5 7 3 . 4 4 2 . 1 0 5 7 M a c e i ó 9 0 2 3 . 5 6 9 2 . 6 2 4 . 5 3 7 5 Serra Ta l h a d a 3 9 3 6 . 5 7 2 7 5 9 . 6 8 4 5 C a r u a r u 2 2 9 . 5 7 7 8 2 0 . 7 7 2 4 G a r a n h u n s 2 2 6 . 6 2 6 4 9 0 . 9 2 9 3 P a l m a re s 1 4 3 . 6 0 0 3 9 3 . 8 5 9 3 A rc o v e rd e 1 0 1 0 . 6 4 7 2 6 9 . 1 0 8 3 Porto Alegre 4 6 6 2 6 7 . 6 6 9 1 0 . 1 7 8 . 4 1 8 5 Caxias do Sul 1 1 6 3 6 . 1 9 5 1 . 5 2 6 . 7 4 6 5 Passo Fundo 8 7 2 6 . 3 7 3 8 3 9 . 0 7 4 5 P e l o t a s 5 7 7 4 . 6 3 7 1 . 4 6 1 . 3 0 6 5 Santa Maria 3 4 2 8 . 2 9 8 5 6 4 . 6 4 7 4 I j u í 3 0 9 . 7 7 6 2 9 4 . 3 4 0 5 To r re s 8 1 . 2 5 1 6 2 . 5 2 8 3 Oliveira EXG et al.3 9 4 Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, 20(2):386-402, mar- a b r, 2004 e n t re as sub-redes do Rio de Ja n e i ro, aquelas comandadas por Belo Ho ri zonte (Minas Ge- rais) e Vi t ó ria (Espírito Santo). As redes de Fo r- t a l eza (Ceará), Campo Grande (Mato Grosso d o Sul), Ribeirão Preto (São Paulo), Manaus (Ama- zonas) e Santos (São Paulo) têm, como Go i â n i a ( Goiás), a maior parte dos centros de nível 3 sem ra m i f i c a ç ã o, configurando hiera rq u i z a ç ã o t runcada, enquanto Sa l vador (Bahia) tem pa- drão mais semelhante ao do Rio de Ja n e i ro, com melhor distribuição dos municípios pelos v á rios níve i s. As regiões dos demais centros es- tão a meio caminho entre os dois tipos. Como mencionado inicialmente, as re d e s podem superpor-se num mesmo território. Ne s- te contexto observe - s e, na Fi g u ra 2, o entre c ru- zamento das redes paulistas, e conseqüente p a- drão de descontinuidade terri t o rial. Vale notar que a área de influência de Ribeirão Preto apre- senta-se descontínua, capturando a rede de L o n d rina, no Pa raná. A classificação dos fluxos originados nos municípios da rede de São Paulo indica uma p redominância dos fluxos tra n s ve r s a i s, que al- cançam 60,5% do total, sendo 51,1% ascenden- t e s. Quanto aos fluxos hierárquico ascendent e s, 17,9% são dire t o s, e 17,0% em “c u rto circ u i t o”. Nos 5.495 municípios abaixo do pri m e i ro n í vel, 58% das pessoas internadas residem a menos de 30km do município do hospital, e 22,4% num raio de 30 a 60km. A segunda rede investigada foi a de atenção hospitalar básica estabelecida a partir do sub- conjunto de internações limitado às cri a n ç a s. Os trinta procedimentos mais freqüentes ( Ta- bela 2) foram re s p o n s á veis por 84,9% das inter- n a ç õ e s, e por 74,8% das internações re a l i z a d a s em hospital localizado fora do município de re- sidência dos pacientes. No total, 2.140 municí- pios intern a ram pessoas residentes fora de seus limites. Co n s i d e rando a distribuição de pacientes em todos os pares município de re s i- dência-município de intern a ç ã o, 40,0% dos f l u- xos correspondem a menos de cinco pessoas, e 15,0% a trinta ou mais pessoas; em relação ao total acumulado de pacientes que saem de ca- da município, esses valores são de 7,0% e 4 1 , 0 % , re s p e c t i va m e n t e. Das 216 redes de nível 1 encontra d a s, 131 são compostas de um único município. En t re os municípios de nível 1, 177 não enviaram pa- cientes para internação fora de seu terri t ó rioe d e s t e s, 38 municípios não têm hospital conve- niado ao SUS. A distribuição destes 38 segundo as regiões mostra que 12 estão na região No rt e, 13 no No rd e s t e, sete no Su d e s t e, dois no Sul e q u a t ro no Ce n t ro Oe s t e. A Fi g u ra 3 apre s e n t a as redes dos níveis 1, 2 e 3. Apesar do grande número de pequenas re- d e s, ve rifica-se que as vinte maiores redes (Ta- bela 4) comandam quase 85,0% do total de mu- nicípios bra s i l e i ro s, correspondendo a cerca de 90,0% da população do país. A maior das redes é a de Goiânia, em cuja á rea de influência encontram-se municípios dos Estados de Go i á s, Mato Gro s s o, Ro n d ô n i a , Pará, To c a n t i n s, Ma ra n h ã o, Bahia, e Minas Ge- ra i s, e que está estru t u rada em sete níve i s. No segundo nível contam-se 106 centro s, dos q u a i s 68 (64,2%) não apresentam ramificação pró- p ria. En t re as redes comandadas pelos centro s de nível 2 destacam-se as de Brasília (Di s t ri t o Fe d e ral), Araguaína e Palmas no To c a n t i n s. A segunda maior rede é aquela ligada a Be- lo Ho ri zo n t e, com municípios de Minas Ge- ra i s, Bahia e Espírito Santo (além de um muni- cípio amazonense). Conta com 58 centros de n í vel 2, dos quais apenas 19 (32,8%) não têm s u b o rd i n a d o s. De s t a c a m - s e, entre as sub-re- des de Belo Ho ri zo n t e, aquelas comandadas por Montes Claro s, Teófilo Otoni e Gove rn a d o r Va l a d a re s. A rede de Recife (Pe rnambuco) comanda municípios de Pe rn a m b u c o, da Pa raíba e de A l a g o a s, alcançando ainda alguns municípios do Rio Grande do No rte e da Bahia. Nesta re d e existem 54 centros de nível 2, 35 (64,8%) dos quais não apresentam ramificação própria. As m a i o res redes de nível 2 são as de João Pe s s o a ( Pa raíba) e Maceió (Alagoas). A rede de Po rto Alegre está basicamente li- mitada ao Rio Grande do Sul, alcançando ape- nas quatro municípios catari n e n s e s, e metade dos 74 centros de nível 2 tem subord i n a d o s. As redes de Fo rt a l eza, Ribeirão Pre t o, Na t a l (Rio Grande do No rte), Aracaju (Se rgipe), Lon- d rina (Pa raná), Ba u ru (São Paulo), São José do Rio Preto (São Paulo), Vi t ó ria, Cu ritiba (Pa ra n á ) e Campinas (São Paulo) têm, como Goiânia ( Go i- ás), a maior parte dos centros de nível 2 sem ra- m i f i c a ç ã o, configurando hiera rquização tru n- cada, enquanto Rio de Ja n e i ro, Sa l va d o r, Te re s i- na (Piauí), Fl o rianópolis (Santa Ca t a rina), São Paulo e Belém (Pará) têm padrão mais seme- lhante ao de Belo Ho ri zo n t e, com melhor distri- buição dos municípios pelos vários níve i s. Na classificação dos fluxos que ocorrem nas redes de nível 1, predominam as relações hie- r á rq u i c a s, sendo 41,5% do tipo hierárquico as- cendente direto e 14,9% em “c u rto circ u i t o” Os f l u xos tra n s ve r s a i s, entre ramificações da re d e, somam 40,6%; sendo 27,4% deles ascendentes. Nos 5.290 municípios abaixo do pri m e i ro n í vel, 61,1% das pessoas internadas residem a menos de 30km do município do hospital, e 22,4% num raio de 30 a 60km. REDES DE ATENÇÃO HOSPITA L A R 3 9 5 Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, 20(2):386-402, mar- a b r, 2004 Figura 3 Redes de atenção hospitalar básica. Crianças de até 5 anos de idade. 0 200 400 600 800 1000 km nível dos centros de rede � 1 � 2 � 3 � 4 sem rede � 1 redes nível 1 nível 2 nível 3 Oliveira EXG et al.3 9 6 Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, 20(2):386-402, mar- a b r, 2004 Tabela 4 Atenção hospitalar básica (crianças) – maiores redes de nível 1. R e d e N ú m e ro de Á rea (km2) População 2000 N í v e i s m u n i c í p i o s ( n ú m e ro de habitantes) G o i â n i a 5 4 6 1 . 8 8 7 . 6 1 5 1 2 . 0 2 6 . 1 6 0 7 Belo Horizonte 5 2 9 3 8 6 . 6 4 4 1 2 . 2 4 5 . 3 9 7 6 R e c i f e 4 8 6 1 5 8 . 2 1 0 1 3 . 3 6 3 . 2 8 2 7 Porto Alegre 3 7 3 2 1 4 . 0 1 1 9 . 1 6 4 . 1 9 0 6 Te re s i n a 3 6 4 4 4 0 . 6 8 3 7 . 5 3 7 . 7 6 6 5 C u r i t i b a 3 0 5 2 0 5 . 1 8 0 8 . 5 9 5 . 3 2 8 6 S a l v a d o r 2 4 0 2 6 8 . 6 2 5 8 . 6 4 9 . 5 8 0 5 F l o r i a n ó p o l i s 2 2 7 7 2 . 4 1 1 4 . 0 5 0 . 2 9 0 5 São Paulo 2 2 1 3 4 3 . 5 2 3 2 4 . 9 6 5 . 3 5 2 6 Ribeirão Pre t o 2 0 6 2 0 3 . 2 5 0 5 . 4 3 0 . 5 7 8 6 F o r t a l e z a 1 8 4 1 4 7 . 8 7 2 7 . 4 5 7 . 4 1 2 6 N a t a l 1 6 4 5 2 . 0 4 6 2 . 7 8 6 . 6 9 4 4 C a m p i n a s 1 1 5 3 5 . 6 8 3 5 . 5 8 6 . 9 7 4 6 B e l é m 1 1 0 8 6 6 . 9 7 4 5 . 4 5 8 . 5 8 2 5 A r a c a j u 1 0 9 4 9 . 7 9 4 2 . 5 0 5 . 4 3 9 5 L o n d r i n a 1 0 5 3 8 . 3 9 9 1 . 8 0 7 . 3 2 2 5 São José do Rio Pre t o 9 5 7 5 . 8 7 8 1 . 3 0 8 . 2 3 9 4 Rio de Janeiro 9 4 5 3 . 0 0 6 1 4 . 2 2 9 . 8 5 7 6 B a u r u 8 6 3 2 . 5 9 1 1 . 6 8 0 . 6 8 8 6 Vi t ó r i a 8 0 5 8 . 9 4 2 3 . 2 9 8 . 9 1 2 4 Na atenção hospitalar de alta complexida- d e, a pri m e i ra rede a ser investigada baseou-se nos fluxos que demandam atendimento em Ci- ru rgia Ca rdíaca, e está apresentada na Fi g u ra 4. No total, 85 municípios intern a ram pessoas nesta especialidade e destes, 80 intern a ra m pessoas residentes fora de seus limites. Re g i s- t re - s e, além disso, que 3.004 municípios não e n v i a ram pacientes para tra t a m e n t o. Co n s i d e- rando a distribuição de pacientes em todos os p a res município de residência–município de i n t e rn a ç ã o, 60,0% dos fluxos correspondem a menos de cinco pessoas, e 4,0% a trinta ou mais pessoas; em relação ao total acumulado de pacientes que saem de cada município, es- ses va l o res são de 51,0% e 8,0%, re s p e c t i va- m e n t e. As internações para Ciru rgia Ca rdíaca con- f o rm a ram três re d e s, as de Aracaju, It a p e ru n a (Rio de Ja n e i ro) e São Pa u l o. Aracaju, com 39 m u n i c í p i o s, tem rede basicamente limitada ao p r ó p rio estado de Se rg i p e, e não conta com s u b - re d e s. Todos os fluxos desta rede são do ti- po hierárquico-ascendente dire t o. It a p e ru n a , com 27 municípios, atrai fluxos dos municípios v i z i n h o s, do Rio de Ja n e i ro, Minas Ge rais e Es- p í rito Sa n t o, e também não tem sub-re d e s. Pre- dominam os fluxos hierárq u i c o - a s c e n d e n t e s d i re t o s, com 74,3%, seguidos pelos transversais, com 25,7% do total. São Paulo polariza a rede nacional, com 2.437 municípios. Conta com 272 centros de n í vel 2, dos quais 87,5 % não têm subord i n a- d o s. O mapa da Fi g u ra 4 indica que a maior p a rte das redes de nível 2 é dominada pelas ca- pitais estaduais e centros regionais paulistas e, de modo geral, não ultrapassam as fro n t e i ra s e s t a d u a i s. Como exceção aparece Goiânia, que e m b o ra comande região menor do que no caso das redes de atendimento básico, influencia ainda uma grande área. A região comandada por Campo Grande também ultrapassa larg a- mente os limites estaduais, estendendo-se por Mato Grosso e Rondônia. O nível 3 corre s p o n- de às redes de centros regionais e demais capi- t a i s. A maior parte dos fluxos é do tipo hierár- quico direto 72,3%, mais 9,2% em “c u rto circ u i- t o” no mesmo ramo da re d e. As relações tra n s- versais não ultrapassam 18,1%, sendo 16,9% a s c e n d e n t e s. Nos 2.500 municípios abaixo do pri m e i ro n í vel, 86,8% das pessoas internadas residem a menos de 30km do município do hospital, e 10,2% num raio de 30 a 60km. A segunda rede de alta complexidade inve s- tigada baseou-se nos fluxos que demandam REDES DE ATENÇÃO HOSPITA L A R 3 9 7 Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, 20(2):386-402, mar- a b r, 2004 Figura 4 Redes de cirurgia card í a c a . 0 200 400 600 800 1000 km nível dos centros de rede � 1 � 2 � 3 redes 1 2 3 � municípios de origem de pacientes Oliveira EXG et al.3 9 8 Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, 20(2):386-402,mar- a b r, 2004 atendimento em Ne u ro c i ru rgia – Alta Co m p l e- x i d a d e, e está apresentada na Fi g u ra 5. No to- tal, 145 municípios intern a ram pessoas nesta especialidade e destes, 139 municípios inter- n a ram pessoas residentes fora de seus limites. Re g i s t re - s e, além disso, que 2.386 municípios não enviaram pacientes para tra t a m e n t o. Co n- s i d e rando a distribuição de pacientes em todos os pares município de re s i d ê n c i a – m u n i c í p i o de intern a ç ã o, 53,0% dos fluxos corre s p o n d e m a menos de cinco pessoas, e 5,0% a trinta ou mais pessoas; em relação ao total acumulado de pacientes que saem de cada município, es- ses va l o res são de 41,0% e 7,0%, re s p e c t i va- m e n t e. As redes re l a t i vas às internações para Ne u- ro c i ru rgia – Alta Complexidade são 18, apre- sentando maior distribuição no terri t ó rio na- cional que no caso anteri o r. A diferença de ta- manhos entre as 18 redes de pri m e i ro níve l , a p resentadas na Fi g u ra 5, é flagra n t e, va ri a n d o de São Pa u l o, com 1.435 municípios, Cu ri t i b a , Belo Ho ri zonte e Po rto Alegre, de 357 a 309, Re- cife e Fl o rianópolis com 139 e 116, até Rio Bo- nito (Rio de Ja n e i ro) e Mogi Guaçu (São Pa u l o ) , cada qual com três municípios subord i n a d o s. A rede de São Paulo conta com 55 centros no segundo nível, dos quais 58,2% não têm re d e p r ó p ria. En t re os 23 centros que comandam s u b - redes estão, além das capitais e centros re- gionais paulistas, Londrina, Uberlândia (Mi n a s Ge rais) e It abuna (Bahia). Os centros de nível 2 contam com redes mais densas, valendo obser- va r-se a concorrência entre Goiânia, Ca m p o Gra n d e, e até mesmo Brasília, no atendimento dos municípios do noroeste do país. A maior parte dos fluxos é do tipo hierár- q u i c o, direto (76,3%), ou em “c u rto circ u i t o” (7,5%). As relações tra n s versais re p re s e n t a m 15% do total, sendo 10,7% ascendentes. Nos 3.115 municípios abaixo do pri m e i ro n í vel, 36,7% das pessoas internadas residem a menos de 30km do município do hospital, e 20,9% num raio de 30 a 60km. O exame da classificação dos fluxos nas q u a t ro redes investigadas (Tabela 5) patenteia os diferentes padrões de organização em cada uma delas. A oposição entre as redes de aten- ção hospitalar básica e as de alta complexidade e x p re s s a - s e, nas pri m e i ra s, pela pre d o m i n â n- cia dos fluxos tra n s ve r s a i s, que ocorrem entre d i f e rentes ramos; nas demais, predominam os f l u xos hierárq u i c o s. No t e - s e, além disso, que os f l u xos hierárquicos são ascendentes, o que quer dizer que municípios de nível mais baixo se dirigem para municípios de nível superi o r, p raticamente não ocorrendo as inversões clas- sificadas como “c o n t ra - h i e r á rq u i c a s”, ou fluxo s d e s c e n d e n t e s. A cadeia hierárquica também tende a ser obedecida, e só nas redes da popu- lação de cinco anos e mais de idade é que a p roporção de fluxos em “c u rto circ u i t o” – aque- les que saltam um ou mais níveis e vão dire t a- mente para um município de posição mais ele- vada – têm participação mais semelhante à dos f l u xos ascendentes dire t o s. D i s c u s s ã o Os resultados deste estudo evidenciam que c e rca de 75,0% de todas as internações re a l i z a- das no país no ano de 2000 ocorre ram no mu- nicípio de residência dos pacientes, o que não s u r p reende ao considera r-se que 91,0% da po- pulação bra s i l e i ra mora em municípios com hospitais conveniados ao SUS. As difere n ç a s e n t re as redes de atenção hospitalar básica e as de alta complexidade e, em cada tipo, dos e x e m- plos selecionados, permitem compreender m e- lhor o significado destes va l o re s. Assim, os diferentes tipos de redes observa- dos demonstram a desigualdade regional no a c e s s o, que é ainda mais marcada em re l a ç ã o aos serviços mais complexo s. Ainda que, ao longo dos anos, a efetiva implantação da uni- versalização do acesso aos serviços de saúde, meta do SUS, tenha sido tolhida pelas condi- ções político-econômicas mais gera i s, é indis- c u t í vel o avanço do setor saúde, no Brasil, em t e rmos de ampliação da cobert u ra e níveis de a t e n d i m e n t o. En t re t a n t o, embora alguns estu- dos apontem tendência à redução das desi- gualdades regionais no sistema de saúde 1 8 , 1 9, esse processo é muito lento, pois “a distribui- ção territorial de infra - e s t r u t u ra de recursos re- força as desigualdades no acesso aos serviços e na quantidade e qualidade da atenção re c e b i d a pela população” 2 0 ( p. 291) e, como observa Santos 2 1, a geografia dos fluxos depende da g e o g rafia dos fixo s. Assim, a atenção hospitalar básica está dis- p o n í vel em praticamente todo o terri t ó rio na- cional e poucos são os municípios desconecta- d o s. Na pri m e i ra rede a predominância dos flu- xos tra n s versais destaca a possibilidade de al- t e rn a t i vas em relação ao local de atendimento, apontando as interconexões entre os vários ra- mos das re d e s, o que indica maior difusão do acesso a estas re d e s. Em relação às redes defi- nidas com base no atendimento das cri a n ç a s, a divisão dos fluxos em tra n s versais e hierárq u i- cos indica um padrão misto, em que o atendi- mento é complementado por opções fora da rede hierárquica. Destacam-se aqui, além da ampla cobert u ra, as pequenas distâncias, exc e- REDES DE ATENÇÃO HOSPITA L A R 3 9 9 Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, 20(2):386-402, mar- a b r, 2004 Figura 5 Redes de neuro c i r u rgia – alta complexidade. 0 200 400 600 800 1000 km nível dos centros de rede � 1 � 2 � 3 redes 1 2 3 � municípios de origem de pacientes Oliveira EXG et al.4 0 0 Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, 20(2):386-402, mar- a b r, 2004 Tabela 5 Classificação dos fluxos nas redes investigadas. Brasil, 2000. Tipos de fluxos População de Crianças (%) C i r u rgia N e u ro c i r u rgia – alta cinco e mais anos c a rdíaca (%) complexidade (%) de idade (%) Tr a n s v e r s a i s 6 0 , 8 4 0 , 6 1 8 , 0 1 5 , 4 H i e r á rq u i c o - a s c e n d e n t e s 3 4 , 9 5 6 , 4 8 1 , 6 8 3 , 8 D i re t o s 1 8 , 1 4 1 , 5 7 2 , 6 7 6 , 3 Em “curto circ u i t o ” 1 6 , 8 1 4 , 9 9 , 0 7 , 5 to nas áreas de povoamento mais ra re f e i t o, on- de aumenta a extensão a perc o r rer entre os municípios de residência e o do hospital. Pa ra as pessoas de cinco anos e mais de idade, re g i s- t ram-se atendimentos em locais mais – às ve- zes muito – distantes, fato que pode estar liga- do à estru t u ra das relações ao longo da rede ur- bana, e não necessariamente à carência de re- cursos locais. Vale dizer que as pessoas viajam – a trabalho ou para lazer – e podem ser sur- p reendidas por problemas de saúde que exijam atendimento de emergência fora do município de re s i d ê n c i a . Situação bem diversa é a das redes de alta c o m p l e x i d a d e, nas quais apenas um pequeno n ú m e ro de centros presta atendimento, e cerc a de metade dos municípios bra s i l e i ros está des- conectada: 54,5% no caso da Ciru rgia Ca rd í a- ca, e 43,3% no caso da Ne u ro c i ru rgia – Alta Co m p l e x i d a d e. As duas redes investigadas têm padrão de fluxos marcadamente hierárq u i c o, e são poucas as ligações estabelecidas fora do ar- cabouço das re d e s. Esse é, de re s t o, um dos m e- canismos clássicos de racionamento e re s t ri- ção da demanda por serviços escassos. Ap e s a r destas semelhanças, o desenho das duas re d e s é bem difere n t e, sendo a pri m e i ra polari z a d a quase que exc l u s i vamente por São Pa u l o, en- quanto a segunda tem padrão de distri b u i ç ã o mais descentra l i z a d o. Tal fato reflete a difere n- ça dos dois tipos de tratamento, o primeiro m a i sp ro g ra m a d o, o segundo muito ligado a situa- ções de emergência, decorrentes de causas ex- t e rnas e doença cére b ro - va s c u l a r. O método utilizado não é capaz de supera r uma limitação decorrente da instabilidade das ligações determinadas por fluxos de pequeno n ú m e ro de pessoas. De fato, a flutuação decor- rente da menor freqüência pode explicar al- guns casos de municípios sem atendimento, que não dispõem de hospital conveniado e não i n t e rn a ram pacientes em outros municípios. Numa tentativa de garantir maiores vo l u m e s, optou-se por agregar as internações de todo o ano de 2000. No caso dos procedimentos de al- ta complexidade, entre t a n t o, o volume re a l i z a- do no período de um ano é ainda re l a t i va m e n- te pequeno, sendo muito prov á vel que o em- p rego de informações de outros anos apre s e n- te resultados diversos dos aqui expostos, ainda que a estru t u ra básica se mantenha e as altera- ções afetem mais as extremidades das re d e s. Estudos futuros deverão explorar maneiras de e l i m i n a r, ou re d u z i r, este problema. A interpretação da hiera rquia das re d e s identificadas exige cautela. Re c o rde-se que o método empregado garante somente que – ao longo de um mesmo ramo da rede – o menor c e n t ro estará subordinado a um de maior ta- m a n h o, e que essas relações de subord i n a ç ã o são tra n s i t i va s. Assim, um pequeno centro pe- ri f é rico ligado apenas a um único vizinho po- derá estar incluído na área de um polo de ex- p ressão nacional, ainda que não tenha qual- quer relação direta com o mesmo. Um exemplo i l u s t ra t i vo é o do Município de Tabatinga ( A m a- zonas), na fro n t e i ra com a Colômbia, que na rede das pessoas de cinco anos e mais é um c e n- t ro de nível 3 da rede de São Pa u l o, dire t a m e n- te ligado a Ma n a u s, centro de nível 2. De p e n- dendo da extensão da cadeia envolvida, muni- cípios de porte ou complexidade semelhantes poderão ocupar níveis bem dive r s o s. Nu m a á rea onde os objetivos de regionalização e hie- ra rquização do atendimento já estejam mais a va n ç a d o s, vários níveis hierárquicos estarão p resentes; em outras áre a s, a maior parte dos municípios contará com apenas uma opção de n í vel superi o r. Desta forma, o estudo da hiera r- quia da rede não pode ser limitado à conside- ração dos níveis dos centros em cada ra m i f i c a- ç ã o. Ce n t ros de mesmo nível em redes difere n- tes poderão ter características ra d i c a l m e n t e d í s p a res entre si, dependendo do perfil de seu s u p e ri o r. Pa ra ciru rgia cardíaca, por exemplo, It a p e runa, Aracaju e São Paulo comandam re- REDES DE ATENÇÃO HOSPITA L A R 4 0 1 Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, 20(2):386-402, mar- a b r, 2004 R e s u m o Este trabalho investiga dois tipos de redes estabeleci- das pelos fluxos de pacientes para os serviços de saúde: a de atenção hospitalar básica, definida pelos pro c e d i- mentos com maior freqüência de internação e as de atenção de alta complex i d a d e .A g re g a ram-se os dados do Sistema de Informações Ho s p i t a l a res do Si s t e m a Único de Saúde sobre as internações realizadas no ano de 2000 em todo o Brasil – segundo o município de in- ternação e o de residência dos pacientes. Em p re g o u - s e o método do fluxo dominante, que define o arc a b o u ç o da rede e os níveis hierárquicos dos municípios que constituem os nós. A classificação dos fluxos avalia o g rau de interc o n exão das re d e s . As redes de atenção des independentes, de modo que os municí- pios de Co rd e iro (Rio de Ja n e i ro) e Sa l g a d o ( Se rgipe), com menos de 20 mil habitantes, e o do Rio de Ja n e i ro, entre outro s, são centros de n í vel 2. Nesse sentido, a independência das re- des de It a p e runa e Aracaju traduz a falta de flu- xos de sua população para centros de outra s re d e s. Mesmo considerando uma única re d e, os centros de segundo nível poderão re p re s e n- tar pólos de sub-redes própri a s, ou simples- mente estar diretamente ligados ao nível 1. As- sim sendo, muitos dos fluxos tra n s versais clas- sificados como hori zontais (ou até mesmo co- mo descendentes) diri g e m - s e, na ve rd a d e, pa- ra centros maiores e melhor equipados do que o centro que constitui o nível superi o r. O método de mapeamento das redes aqui e m p regado limita-se a investigar as ligações d e- finidas pela ausência ou presença de determ i- nado serv i ç o, e não é capaz de dimensionar a o f e rta ou a demanda, não avaliando taxas de atendimento ou questões de necessidade. É c e rtamente possível que a pre valência das con- dições investigadas seja desigualmente distri- buída. Não se pode, entre t a n t o, descartar a in- dicação de problemas de acesso, ao compa- ra r-s e, no caso da atenção básica, as distâncias dos municípios que, estando conectados à re- de quando se considera a população de cinco anos e mais de idade, não intern a ram qualquer c riança, e acham-se situados a grandes distân- cias dos centros de atendimento, configura n d o vastas áreas desassistidas. Em relação ao efeito da distância no acesso aos serv i ç o s, é fato largamente estabelecido na l i t e ra t u ra, e mesmo no dia a dia, que o raio de alcance dos serviços de mais alto nível é maior que o dos serviços básicos: as pessoas irão m a i s longe para obter bens e serviços mais comple- xo s. No caso das redes de alta complexidade aqui inve s t i g a d a s, a concentração do atendi- mento em poucos centros determina a existên- cia de maiores distâncias a perc o r rer para ob- ter atendimento. O que ocorre é que, de fato, as pessoas que vivem mais longe não têm a possi- bilidade de deslocar-se: apenas 3,0% dos pa- cientes internados para ciru rgia cardíaca re s i- diam em municípios situados a mais de 60km do centro em que se intern a ram, e nestes mu- nicípios concentram-se cerca de 40,0% da po- pulação bra s i l e i ra. Co m p a re-se esta situação a o que ocorre nas internações nos pro c e d i m e n t o s mais freqüentes: pouco menos de 20,0% dos pacientes de cinco anos e mais de idade inter- n a ram-se em centros a mais de 60km, mas as pessoas residentes além deste limite re p re s e n- tam apenas 1,3% da população total. Im p o rt a ressaltar que este trabalho investigou apenas a e s t ru t u ra da re d e, sem dimensionar a oferta e a demanda, aspectos importantes da questão do a c e s s o. Co n s i d e rados esses resultados à luz das p retensões expressas na NOAS, ve rifica-se que o seu objetivo de garantir o acesso aos serv i ç o s de saúde de uso mais fre q ü e n t e, o mais próxi- mo possível da residência dos cidadãos, pare- c e, se não alcançado, alcançável no curto pra- zo. Se, porém, a oportunidade de receber tra t a- mento deve refletir a necessidade de saúde da população e não a distância do serviço 2 2, a or- ganização das referências intermunicipais pa- ra os outros níveis de atenção ainda tem muito que ava n ç a r. hospitalar básica alcançam quase todo o país; p o u c o s municípios estão fora delas. Nas redes de alta comple- xidade poucas cidades prestam atendimento e cerc a da metade dos municípios bra s i l e i ros está desconecta- d a . O objetivo da Normas Op e racionais de Atenção à S a ú d e , de garantir o acesso aos serviços de saúde de uso mais freqüente perto da residência dos cidadãos, p a rece alcançável em curto pra zo. A organização das referências para os outros níveis de atenção, e n t re t a n- t o, ainda tem muito que ava n ç a r. Acesso aos Se rviços de Saúde; At e n ç ã o ; Se rviços de S a ú d e Oliveira EXG et al.4 0 2 Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, 20(2):386-402, mar- a b r, 2004 R e f e r ê n c i a s 1 . 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Ap rovar os procedimentos con- stantes dos anexos I e II desta Po rt a ria, como in- t e g rantes dos Sistemas de Alta Co m p l e x i d a d e A m b u l a t o rial e Hospital do Sistema Único de Saúde: Anexo I e II. http://dtr2001.saude. g ov. b r / s a s / P O RTA R I A S / P O RT 2 0 0 0 / a n e xo i i - P T 096.html (acessado em 20/Ja n / 2 0 0 3 ) . 1 2 . Mi n i s t é rio da Sa ú d e. Po rt a ria SAS n. 579 de 28 de d eze m b ro de 2001. Art. 1o – Ap rovar a tabela de compatibilidade entre o procedimento re a l i z a d o e o diagnóstico principal inform a d o, de acord o com a classificação estatística internacional de doenças e problemas relacionados à saúde – dé- cima revisão no processamento das AIH – Au t o ri- zação de In f o rmação Hospitalar do SIH – Si s t e m a de In f o rmações Ho s p i t a l a re s. http://dtr2001.saude. g ov. b r / s a s / P O RTA R I A S / Po rt 2 0 0 1 / P T- 5 7 9 . h t m (acessado em 20/Ja n / 2 0 0 3 ) . 1 3 . Diestel R. 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