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ESTADO DE MATO GROSSO DEFENSORIA PÚBLICA Missão: Promover assistência jurídica aos necessitados com excelência e efetivar a inclusão social, respaldada na ética e na moralidade. Princípio da Proporcionalidade e da Razoabilidade: expressões sinônimas? Leandro Paternost de Freitas, Defensor Público Substituto de Sapezal – MT. 1. Introdução A mudança constitucional, vivenciada pelo Brasil em meados da década de oitenta, foi conseqüência de uma evolução de fatos políticos, no sentido de superar autoritarismo e arbítrio então vigentes, rumo à democratização e ao pleno Estado de Direito. Embora o seu texto esteja marcado de contradições, já que foi elaborado dentro da estrutura política que justamente pretende superar, é com tal objetivo e nesse contexto que aparece a nova Carta Política brasileira (FILHO GUERRA, 2000, p. 186). Daí dizer Willis Santiago Guerra Filho que “a reunião de uma Assembléia Nacional Constituinte, eleita por voto direto, para elaborar um texto normativo, já indicava o caminho tomado para resgatar a legitimidade perdida: a democracia e legalidade, ou seja, Estado Democrático de Direito”. O modelo de nosso sistema constitucional é formado por dois tipos básicos de normas, quais sejam, as regras e os princípios, a serem aplicados mediante uma ordenação em que as primeiras são entendidas e validadas pela sua referência aos últimos, os quais, por sua vez, possuem grau diverso de relevância para ESTADO DE MATO GROSSO DEFENSORIA PÚBLICA Missão: Promover assistência jurídica aos necessitados com excelência e efetivar a inclusão social, respaldada na ética e na moralidade. o atingimento da finalidade do sistema (legalidade, com respeito à dignidade humana) (FILHO GUERRA, 2000, p. 199). Em síntese apertada, uma vez que é o que basta para o presente trabalho, pode-se dizer que as regras jurídicas caracterizam-se por ter em sua estrutura lógico-deôntica uma descrição de uma hipótese fática e a previsão da conseqüência jurídica de sua ocorrência. Por seu turno, os princípios jurídicos não trazem semelhante descrição de situação jurídica, mas sim a prescrição de um valor, que se consubstancia em uma palavra (FILHO GUERRA, 2000, p. 169). Outra distinção merecedora de registro entre as regras e os princípios é, mas agora no letrear de Willis Santiago Guerra Filho (2000, p. 171): uma das características dos princípios jurídicos que melhor os distinguem das normas que são regras é sua maior abstração, na medida em que não se reportam, ainda que hipoteticamente, a nenhuma espécie de situação fática, que dê suporte à incidência de norma jurídica. Outra constatação que se faz absolutamente necessária, no que toca a natureza diversa entre regras e princípios, dá-se quando ocorre um choque entre suas disposições, posto que esse conflito deve ser solucionado por métodos de hermenêutica diferentes em se tratando de um ou outro tipo normativo. Assim, caso sejam duas regras que dispõem diferentemente sobre uma mesma situação têm-se uma antinomia jurídica, que deve ser afastada com base em critérios que são fornecidos pelo próprio ordenamento jurídico, como por exemplo, o critério cronológico, o critério hierárquico e o critério da especialidade, para que se mantenha sua unidade e coerência (BOBBIO, 1982, p. 92). Por outro lado, se for uma antinomia jurídica entre os princípios, tudo se passa de modo diferente, pois eles, como explica Willis Santiago Guerra Filho (2000, p. 173): ESTADO DE MATO GROSSO DEFENSORIA PÚBLICA Missão: Promover assistência jurídica aos necessitados com excelência e efetivar a inclusão social, respaldada na ética e na moralidade. na medida em que não disciplinam nenhuma situação jurídica específica, considerados na forma abstrata como se apresenta para nós, no texto constitucional, não entram em choque diretamente, são compatíveis uns com os outros. Contudo ao procurarmos solucionar um caso concreto, que não é resolvido de modo satisfatório aplicando-se as regras pertinentes ao mesmo, inquirindo dos princípios envolvidos no caso, logo se percebe que esses princípios se acham em um estado de tensão conflitiva, ou mesmo, em rota de colisão. É essa natureza diferenciada de princípios e regras que suscita a necessidade de se desenvolver uma hermenêutica constitucional igualmente diferenciada, diante da hermenêutica tradicional aplicadas as regras. No plano dos princípios, há de ser utilizado, para solucionar a antinomia, o princípio da proporcionalidade, que é uma regra de interpretação e aplicação do direito – no que diz respeito ao objeto do presente trabalho, de interpretação e aplicação dos direitos fundamentais (SILVA, 2002, p. 23). Outro não é o entendimento de Willis Santiago Guerra Filho (2000, p. 182) sobre a colisão entre princípios, posto que sua lição é no sentido de que: para resolver o grande dilema da interpretação constitucional, representado pelo conflito entre princípios constitucionais, aos quais se devem igual obediência, por ser a mesma posição que ocupa na hierarquia normativa, se preconiza o recurso a um “princípio dos princípios”, o princípio da proporcionalidade, que determina a busca de uma “solução de compromisso”. 2.1. Princípio da proporcionalidade ESTADO DE MATO GROSSO DEFENSORIA PÚBLICA Missão: Promover assistência jurídica aos necessitados com excelência e efetivar a inclusão social, respaldada na ética e na moralidade. A solução da antinomia axiológica, representada pela colisão entre os princípios, requer a aplicação do princípio da proporcionalidade, que está implícito na Constituição Federal acerca da estrutura dos direito fundamentais (SILVA, 2002, p. 45). O objetivo da proporcionalidade é respeitar mais, em determinada situação, um dos princípios em colisão, procurando desrespeitar o mínimo ao(s) outro(s), e jamais lhe(s) faltando minimamente com o respeito, isto é, ferindo-se seu “núcleo essencial” (FILHO GUERRA, 2000, p. 182). Com a habitual clareza, Eduardo Talamini bem explica o mecanismo para solucionar a colisão entre os princípios, ao dizer que: ...quando dois ou mais princípios colidem, deverão ser ponderados e balanceados, considerando-se o peso que cada um deles tem, em vistas das circunstâncias concretas. Um cederá perante o outro, na medida do necessário, naquele caso. Mas isso não significará declarar inválido o princípio que não prevaleceu, [...] Apenas, naquelas específicas circunstâncias, um dos princípios precede o outro – podendo ser diversa a ordem de precedência, em outras circunstâncias. O princípio da proporcionalidade no controle das leis restritivas de direitos fundamentais surgiu por desenvolvimento jurisprudencial do Tribunal Constitucional Alemão, origem esta o que diferencia do princípio da razoabilidade, como ver-se-á no desenvolver deste trabalho. O método de aplicação do princípio da proporcionalidade, para a solução dos conflitos axiológicos, tem uma estrutura racionalmente definida, com subelementos independentes, que são aplicados em uma ordem pré-definida (SILVA, 2002, p. 30). Os subelementos ou sub-princípios da proporcionalidade são e devem ser aplicados na seguinte ordem: análise da adequação, da necessidade e da proporcionalidade em sentido estrito. ESTADO DE MATO GROSSO DEFENSORIA PÚBLICA Missão: Promover assistência jurídica aos necessitados com excelência e efetivar a inclusão social, respaldada na ética e na moralidade. Luís Virgílio Afonso da Silva nos mostra a importância de aplicar os sub-princípios na ordem pré-definida porque alertaao fato de que: a real importância dessa ordem fica patente quando se tem em mente que a aplicação dessa regra da proporcionalidade nem sempre implica a análise de todas as suas três sub-regras. Pode-se dizer que tais sub-regras relacionam-se de forma subsidiária entre si. [...] A impressão que muitas vezes se tem, quando se mencionam as três sub-regras da proporcionalidade, é que o juiz deve sempre proceder à analise de todas elas, quando do controle do ato considerado abusivo. Não é correto, contudo, esse pensamento. É justamente na relação de subsidiariedade acima mencionada que reside a razão de ser da divisão em sub-regras (SILVA, 2002, p. 34). Portanto, a colisão entre os princípios poderá estar solucionada simplesmente com a análise da primeira sub-regra (adequação), o que faz dispensar a análise das demais, já que as sub-regras da proporcionalidade se relacionam em grau de subsidiariedade. Em outros casos, por serem mais complexos, pode ser indispensável a análise das sub-regras necessidade e proporcionalidade em sentido estrito. 2.1.1. Adequação Gilmar Ferreira Mendes, citado por Luís Virgílio Afonso da Silva, (2002, p. 36) nos fornece um conceito aproximado do que seria um meio considerado adequado, asseverando que: “os meios utilizados pelo legislador devem ser adequados e necessários à consecução dos fins visados. O meio é adequado se, com a sua utilização, o evento pretendido pôde ser alcançado”. ESTADO DE MATO GROSSO DEFENSORIA PÚBLICA Missão: Promover assistência jurídica aos necessitados com excelência e efetivar a inclusão social, respaldada na ética e na moralidade. Com raciocínio mais abrangente que o anterior, Luís Virgílio Afonso da Silva diz que adequado “não é somente o meio com cuja utilização um objetivo é alcançado, mas também o meio com cuja utilização a realização de um objetivo é fomentada, promovida, ainda que o objetivo não seja completamente realizado” (2002, p. 36). Dessa forma, um meio será considerado inadequado se a medida utilizada não contribuir em nada para fomentar a realização do objetivo pretendido. Para melhor visualização sobre a utilização prática deste princípio, passa-se a analisar se a medida coercitiva inominada da prisão civil, possivelmente prevista no §5º do art. 461, do Código de Processo Civil, (que cuida da tutela específica das obrigações de fazer e não fazer) é, ou não, adequada para atingir o objetivo por ela visado. Sob a ótica da adequação, infere-se que esse meio é adequado para fomentar o objetivo buscado, uma vez que o devedor, ante a possibilidade de ver a prisão civil decretada em seu desfavor, tenderá a se comportar exatamente como previsto no ato decisório, garantindo a realização da obrigação de fazer, não fazer ou de entregado de coisa em benefício do credor. Deste modo, tendo em vista que o teste da adequação limita- se ao exame de sua aptidão para fomentar os objetivos visados, a prisão civil é um meio adequado para coagir o devedor recalcitrante a cumprir o “quantum” determinado na liminar ou sentença. Ocorre que para saber se o meio (prisão civil como medida coercitiva) utilizado é ou não proporcional deve-se partir para o exame do próximo subelemento da proporcionalidade, ou seja, da necessidade. 2.1.2. Necessidade ou restrição menor possível ESTADO DE MATO GROSSO DEFENSORIA PÚBLICA Missão: Promover assistência jurídica aos necessitados com excelência e efetivar a inclusão social, respaldada na ética e na moralidade. Recorrendo-se aos ensinamentos de Eduardo Talamini (2001, p. 390), para que um meio possa ser considerado necessário “deve-se escolher o meio mais brando possível para a consecução do fim eleito e que não exceda os limites indispensáveis para tanto”. Dispensa tratamento igual o doutrinador Luís Virgílio Afonso da Silva (2002, p. 38), haja vista que comenta sobre o assunto dizendo que: um ato estatal que limita um direito fundamental é somente necessário caso a realização do objetivo perseguido não possa ser promovido, com a mesma intensidade, por meio de outro ato que limite, em menor medida, o direito fundamental atingido. Dessa maneira, uma medida estatal será considerada necessária se, dentre todos os meios existentes para promover o fim perseguido, ela for o meio mais brando possível para fomentar o objetivo visado. Na análise da necessidade da prisão civil para coagir o devedor a cumprir a obrigação de fazer, não fazer ou entrega de coisa, trata-se de cotejá-la com outras medidas que sejam capazes de promover o mesmo objetivo com a mesma intensidade, mas que restrinja menos os direitos fundamentais envolvidos na questão. Para tanto, é necessário ir a busca de outros meios adequados que tenha a capacidade de promover o mesmo objetivo com a mesma intensidade. Se existentes outros meios que promovam, com igual intensidade, o mesmo objetivo promovido pela medida em análise, tem-se que a medida (prisão civil, art 461, §5º, do CPC) não é necessária. A análise da necessidade de uma medida ganha maiores proporções frente ao tipo da obrigação que está envolvido no caso, seja ela fungível ou infungível. Tratando-se do grupo das obrigações fungíveis, o magistrado está ESTADO DE MATO GROSSO DEFENSORIA PÚBLICA Missão: Promover assistência jurídica aos necessitados com excelência e efetivar a inclusão social, respaldada na ética e na moralidade. autorizado a adotar tanto medidas coercitivas, que incidem sobre a própria pessoa do devedor fazendo com que ele próprio dê cumprimento a obrigação, quanto medidas executivas lato sensu, que substituem a vontade do devedor para alcançar resultado prático equivalente ao cumprimento espontâneo da obrigação. Ora, se ao credor interessa o “resultado final”, ou seja, o cumprimento da obrigação, pouco importando o caminho a ser traçado para alcançá-lo (tutela específica ou resultado prático equivalente), a utilização da medida da prisão civil mostra-se desnecessária, uma vez que, cotejando-se os meios coercitivos existentes para promover o mesmo resultado visado, existem outros meios que promovem o mesmo objetivo, mas com menor restrição aos direitos fundamentais. Portanto, o juiz, ao revés de aplicar a prisão civil, poderá lançar mão de outras medidas que promovem com igual intensidade o mesmo objetivo buscado, como por exemplo a fixação da multa diária, busca e apreensão, remoção de pessoas e coisas, desfazimento de obras, impedimento de atividades nocivas, até mesmo usando força policial. É que o juiz deve, na escolha da medida para promoção do objetivo buscado, efetivar sua opção por determinada medida que, à luz dos limites impostos pela natureza e função de tais medidas, respeite mais amplamente o Estado Democrático de Direito em que se deve preservar a dignidade da pessoa humana (CF, art. 1º, III). Por outro lado, no que tange ao grupo das obrigações infungíveis, a análise da necessidade ganha contornos diferentes, uma vez que, por ser um negócio jurídico que se estabelece intuitu personae, é de interesse do credor que o cumprimento da obrigação seja levado a cabo pela pessoa do próprio devedor. Ademais, para satisfazer o interesse do credor, um único caminho pode ser traçado para alcançar o cumprimento da obrigação (tutela específica realizada pela adoção de medidas coercitivas), devendo o magistrado adotar tão- ESTADO DE MATO GROSSO DEFENSORIA PÚBLICA Missão: Promover assistência jurídica aos necessitados com excelência e efetivar a inclusão social, respaldada na ética e na moralidade. somente medidas tendentes a obtero cumprimento da obrigação através da própria pessoa do devedor, o que faz diminuir o leque das medidas que promovem o mesmo objetivo visado. Desta maneira, a utilização da medida prisão civil, como forma de coagir o próprio devedor a cumprir a obrigação infungível, se mostra igualmente desnecessária, uma vez que existem outras medidas coercitivas que promovem o mesmo objetivo com igual intensidade, mas com menor restrição aos direitos fundamentais envolvidos na questão, como é o exemplo da multa diária. A utilização da multa diária como medida coercitiva mostra- se com alto grau de eficácia quando se atenta ao fato de que esse instrumento processual tem a capacidade de influenciar a vontade do devedor para que ele cumpra o comando decisório da maneira a que está sujeito, uma vez que se o devedor poderia obter vantagens com o descumprimento da ordem judicial (liminar ou sentença), ela tem o escopo retirar essas vantagens. Por outro lado, para pôr fim a este sub-tópico, no caso de o devedor não se mostrar intimidado com a fixação da multa diária, continuando a se comportar de maneira diversa da liminar ou decisão, outro caminho não há, a não ser converter a obrigação em perdas e danos, o que aliás determina o §1º do art. 461, do Código de Processo Civil, ao prescrever que: “a obrigação somente se converterá em perdas e danos se o autor o requerer ou se impossível a tutela específica ou a obtenção do resultado prático correspondente”. 2.1.3. Proporcionalidade em sentido estrito Embora uma medida seja considerada adequada e necessária, isso não significa, por si só, que ela deva ser considerada como ESTADO DE MATO GROSSO DEFENSORIA PÚBLICA Missão: Promover assistência jurídica aos necessitados com excelência e efetivar a inclusão social, respaldada na ética e na moralidade. proporcional. Faz-se necessário ainda um terceiro exame, o exame da proporcionalidade em sentido estrito, que consiste, agora nas palavras de Luís Virgílio Afonso da Silva (2002, p. 40): “em um sopesamento entre a intensidade da restrição ao direito fundamental atingido e a importância da realização do direito fundamental que com ele colide e que fundamenta a adoção da medida restritiva”. Sob outro prisma, ainda galgando nas lições de Luís Virgílio Afonso da Silva, uma medida será considerada desproporcional em sentido estrito quando: [...] os motivos que fundamentam a adoção da medida não tenham peso suficiente para justificar a restrição ao direito fundamental atingido. É possível, por exemplo, que essa restrição seja pequena, bem distante de implicar a não-realização de algum direito ou de atingir o seu núcleo essencial. Se a importância da realização do direito fundamental, no qual a limitação se baseia, não for suficiente para justificá-la, será ela desproporcional (SILVA, 2002, p. 41). Outrossim, no contrabalaciamento entre a intensidade da violação do direito fundamental atingido e a importância da realização do direito fundamental que com ele colide, para que uma medida ganhe o status de proporcional, é necessário que ela se aproxime ao máximo da dignidade da pessoa humana, valor que deve ser sempre buscado no Estado Democrático de Direito (CF, art. 1º, III e art. 5º). Como já foi explicado anteriormente, só haverá a necessidade de examinar a proporcionalidade em sentido estrito caso a medida estatal tiver sido considerada adequada e necessária, já que elas guardam uma relação de subsidiariedade entre si. Levando-se em consideração que a análise acima realizada chegou-se à conclusão que a utilização da prisão civil para coagir o devedor a cumprir as obrigações de fazer, não fazer ou entrega de coisa, não é necessária, não há que se falar na análise acerca da sua proporcionalidade em sentido estrito. ESTADO DE MATO GROSSO DEFENSORIA PÚBLICA Missão: Promover assistência jurídica aos necessitados com excelência e efetivar a inclusão social, respaldada na ética e na moralidade. 3. Princípio da razoabilidade Muito embora o princípio da razoabilidade seja considerado sinônimo do princípio da proporcionalidade, seja pela doutrina, seja pela jurisprudência, tais princípios se diferem tanto na origem quanto a sua estrutura e forma de aplicação. Sobre a distinção entre esses princípios, alerta Luís Virgílio Afonso da Silva (2002, p. 28): É evidente que [...] não são mais sinônimos, pois expressão construções jurídicas diversas. Pode-se admitir que tenham objetivos semelhantes, mas isso não autoriza o tratamento de ambos como sinônimos. Ainda que se queira, por intermédio de ambos, controlar as atividades legislativas ou executivas, limitando-as para que não restrinjam mais do que o necessário os direitos dos cidadãos (direito fundamental), esse controle é levado a cabo de forma diversa, caso seja aplicado um ou outro critério. Enquanto o princípio da razoabilidade é produto da jurisprudência norte americana acerca do aspecto substancial do due processo, o princípio da proporcionalidade é fruto das decisões das cortes constitucionais alemãs, conforme dito anteriormente (TALAMINI, 2001, p. 391). Quanto a forma de aplicação do princípio da razoabilidade, Luís Virgílio Afonso da Silva (2002, p. 28) é salutar ao esclarecer que: “[...] o teste sobre a irrazoabilidade é muito menos intenso do que os testes que a regra da proporcionalidade exige, destinando-se meramente a afastar atos absurdamente irrazoáveis”. Portanto, percebe-se que o princípio da proporcionalidade é muito mais abrangente e amplo do que o princípio da razoabilidade, sendo forçoso ESTADO DE MATO GROSSO DEFENSORIA PÚBLICA Missão: Promover assistência jurídica aos necessitados com excelência e efetivar a inclusão social, respaldada na ética e na moralidade. afirmar que um ato considerado desproporcional não será, necessariamente, considerado irrazoável, pois para ser declarado desproporcional, não é necessário que o ato seja extremamente irrazoável ou absurdo. 4. Princípio da Dignidade da Pessoa Humana Conforme mencionado acima, a sub-regra proporcionalidade em sentido estrito exige que, na ponderação entre a restrição do direito fundamental e a importância da realização do direito fundamental que com ele colide, se chegue a um resultado final que mais se aproxime do que seja considerado como digno da pessoa humana, de sorte que se faz necessário tecer algumas considerações, ainda breves, acerca desse princípio. Primeiramente, há de se reputar que, segundo Ingo Wolfgang Sarlet, [...] não há como negar que uma conceituação clara do que efetivamente seja esta dignidade, inclusive para efeitos de definição do seu âmbito de proteção como norma jurídica fundamental, se revela no mínimo difícil de ser obtida, [...]. Tal dificuldade, exaustiva e corretamente destacado na doutrina, decorre certamente (ao pelo menos também) da circunstancia de que se cuida de conceito de contornos vagos e imprecisos, caracterizado por sua ambigüidade e porosidade, [...] (SARLET, 2006, p. 39). Embora se revele difícil estabelecer os contornos precisos acerca da definição do que seja dignidade da pessoa humana, faz-se necessário os operadores do direito conhecerem as lições de Podlech Häberle a respeito do assunto, ESTADO DE MATO GROSSO DEFENSORIA PÚBLICA Missão: Promover assistência jurídica aos necessitados com excelência e efetivar a inclusão social, respaldada na ética e na moralidade. haja vista que ele sustenta uma dimensão dúplice da dignidade, dizendo que, conforme menciona Ingo Wolfgang Sarlet: sustenta-se que uma dimensão dúpliceda dignidade manifesta-se enquanto simultaneamente expressão da autonomia da pessoa humana (vinculada à idéia de autodeterminação no que diz com as decisões essenciais a respeito da própria existência), bem como da necessidade de sua proteção (assistência) por parte da comunidade e do Estado, especialmente quando fragilizada ou até mesmo – e principalmente – ausente a capacidade de autodeterminação. Assim, a dignidade, na sua perspectiva assistência (protetiva) da pessoa humana, poderá, dadas as circunstâncias, prevalecer em face da dimensão autonômica, de tal sorte que, todo aquele a quem faltarem as condições para uma decisão própria e responsável (de modo especial no âmbito da biomedicina e bioética) poderá até mesmo perder – pela nomeação eventual de um curador ou submissão involuntária a tratamento médico e/ou internação – o exercício pessoal de sua capacidade de autodeterminação, restando-lhe, contudo, o direito a ser tratado com dignidade (protegido e assistido) (SARLET, 2006, p. 49). Deste modo, é fácil perceber que a dignidade em sua dimensão protetiva consubstancia-se em um escudo que apresenta capacidade de proteger a dignidade da pessoa humana contra atitudes inconscientes da própria pessoa, evitando que a pessoa adote condutas que desrespeitem sua dignidade, até mesmo contra condutas oriundas do próprio Estado, notadamente naqueles em que se constitui em Estado Democrático de Direito. O Estado deve guiar as suas ações tanto no sentido de preservar a dignidade existente quanto objetivando a promoção da dignidade. A dignidade da pessoa humana é uma qualidade intrínseca e, portanto, é irrenunciável e inalienável, constituindo elemento que qualifica o ser humana como tal e dele não pode ser destacado. Esta portanto, nas lições de Ingo Wolfgang Sarlet, deve ser ESTADO DE MATO GROSSO DEFENSORIA PÚBLICA Missão: Promover assistência jurídica aos necessitados com excelência e efetivar a inclusão social, respaldada na ética e na moralidade. [...] compreendida como qualidade integrante e irrenunciável da própria condição humana, pode (e deve) ser reconhecida, respeitada, promovida e protegida, não podendo, contudo (no sentido ora empregado) ser criada, concedida ou retirada (embora possa ser violada), já que existe em cada ser humana como algo que lhe é inerente (SARLET, 2006, p. 42). De outro lado, resta relatar, finalmente, que a dignidade é algo real, uma vez que não se verifica maior dificuldade em identificar claramente muitas das situações em que é agredida, ainda que não seja possível estabelecer um rol taxativo de violações da dignidade. Com efeito, embora se encontra dificuldade em expressar o que é a dignidade, não se pode balbuciar em dizer o que não seja dignidade. Referencias Bibliográficas BOBBIO, Norberto. Ordenamento jurídico. 10ª edição. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1999. FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Direitos Humanos Fundamentais. 2ª edição. São Paulo: editora Saraiva, 1998. GUERRA FILHO, Willis Santiago. Teoria processual da constituição. São Paulo: Celso Bastos Editor, 2000. SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais na constituição federal de 1988. 4º edição. Porto Alegre: Editora Livraria do Advogado, 2006. SILVA, Luís Virgílio Afonso da. Revista dos Tribunais nº. 798. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. ESTADO DE MATO GROSSO DEFENSORIA PÚBLICA Missão: Promover assistência jurídica aos necessitados com excelência e efetivar a inclusão social, respaldada na ética e na moralidade. TALAMINI, Eduardo. Tutela relativa aos deveres de fazer e de não fazer. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001.
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