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Segunda Guerra Mundial(JAN MAR 1940)

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Janeiro a Março de 1940
 
 
O desenvolvimento das hostilidades
 
O início do ano encontrou os exércitos dos principais beligerantes a vigiarem-se uns aos outros das respectivas posições fortificadas na frente ocidental, com uma cautela que não oferecia nenhuma perspectiva imediata de um ataque em larga escala. Os aliados, no momento, pareciam ter aceito o ponto de vista de Mr. Churchill, expresso a 12 de novembro, no sentido de que "se atravessarmos o inverno sem que ocorra algo grande ou importante, teremos, na verdade, vencido a primeira campanha da guerra". Ao lado alemão havia indícios de vaga ferocidade a ameaçar os aliados com quase imediata destruição. Hitler, na sua proclamação de Ano Novo, e novamente no seu discurso de 30 de janeiro, insinuou que estava para começar a coisa a sério. Goering anunciou que ao sinal de Hitler a força aérea "desencadearia sobre a Grã-Bretanha um assalto de violência jamais conhecida na história." Mas, com todas essas palavras, a atividade na frente ocidental era confinada a incursões esparsas, nas quais os aliados pareciam apenas procurar informações, e os alemães tentando conseguir o domínio de posições que mais tarde lhes pudessem vir a ser úteis.
 
A ameaça séria de possível ação veio a 14 de janeiro, com um novo surto de guerra nos Países Baixos. Certos informes da imprensa alegaram que este era baseado no fato de que o piloto de um avião alemão que fez uma aterrissagem forçada em solo belga tinha por casualidade no bolso os planos de um ataque alemão. A circunstância foi realçada de um modo curioso pelo fato de que o governo holandês, a 6 de janeiro, anunciara a determinação de resistir a qualquer ataque "com toda a potência de nossas armas", e o governo belga se tinha mostrado disposto a apoiar a Holanda contra a agressão. Mas, fosse qual fosse a razão, o alarme foi suficientemente forte para que a Bélgica mobilizasse 600.000 homens e para que a Holanda e a Grã-Bretanha cassassem todas as licenças no Exército. A 24 de janeiro, Mr. Chamberlain renovou o compromisso britânico de assistência imediata à Bélgica no caso de um ataque alemão. Embora nessa ocasião a crise tivesse amainado, os Países Baixos e a Suíça também permaneceram em estado de alerta à vista das informações periódicas que recebiam acerca de concentrações alemães nas proximidades de suas fronteiras. Os pequenos vizinhos da Alemanha, estava claro, não confiavam absolutamente em sua boa fé.
 
Entretanto, dificilmente se poderiam considerar ideais para uma ofensiva militar as condições desse período. As condições meteorológicas - as informações a respeito das quais incorriam nas muitas coisas suprimidas pela censura, em razão de que elas pudessem servir aos aviadores inimigos - mostraram de que eram capazes, desencadeando uma Blitzkrieg por conta própria. O inverno mais frio do último meio século se abatera sobre a Europa. Os temporais desencarrilavam trens, interrompiam o tráfego e criaram uma escassez temporária de carvão, tanto para as indústrias como para es cidadãos particulares. Em fevereiro, foi informado que uma quarta parte da população de Berlim vivia em casas sem calefação. Essas dificuldades na frente interna refletiam-se sem dúvida na contínua inação militar.
Isto não era verdade, entretanto, nem no mar, nem no ar. Navios mercantes continuavam a cruzar os mares com abastecimentos essenciais. As marinhas mantinham uma vigilância incessante sobre as rotas vitais de comércio. E tanto à superfície das águas como em baixo dela, a guerra prosseguia - uma guerra que procurava apertar o bloqueio contra o inimigo e romper o cerco que o inimigo se esforçava por impor.
 
 
 
 
A guerra no mar
 
Nestas lutas os aliados estavam mais do que bem. Pelo fim de março, cálculos não oficiais indicavam o total das perdas britânicas e francesas em 211 navios, perfazendo 810.000 toneladas. As perdas em navios de todas as nações beligerantes e neutros atingiam 7.300 toneladas diárias, em comparação com as 20.000 toneladas registradas durante o período da guerra irrestrita de 1917. O que era mais encorajador era a prova de que os afundamentos estavam em declínio, o que era, em grande parte, devido ao bom êxito do sistema de comboio. As perdas de navios aliados e neutros somavam 90.000 toneladas em março contra 200.000 toneladas em fevereiro. Mesmo na semana que terminava a 20 de fevereiro, e a qual mostrava a perda de 20 navios, apenas cinco britânicos havia entre estes. Entre 26 de fevereiro e 3 de março, a Grã-Bretanha perdeu somente dois navios pequenos, somando 1886 toneladas. E a 30 de março, Mr. Churchill anunciou que durante a quinzena anterior apenas um navio britânico havia sido afundado em conseqüência de ação inimiga.
 
Nesta situação, a Alemanha lançou toda a sua fúria contra a navegação neutra. O completo desprezo pela lei do direito internacional demonstrado pelos nazistas com o afundamento de navios beligerantes sem aviso prévio, e o espalhar indiscriminado de minas, ficou mais luminosamente em evidência com os seus ataques deliberados às tripulações dos navios mercantes. Durante o mês de fevereiro, em que foi informada a perda de 25 navios britânicos, as nações neutras perderam 39. Até 14 de fevereiro a Suécia tinha perdido, desde o rebentar da guerra, 32 navios de carga, com 228 marinheiros mortos e 15 perdidos. De conformidade com o ministro sueco das relações exteriores, sete desses navios foram indiscutivelmente afundados pelos submarinos da Alemanha, três dos quais quando estavam a caminho de portos neutros; e do total de 32 apenas sete tinham a Grã-Bretanha como destino. Até 21 de fevereiro, a Noruega perdera 49 navios e 327 marinheiros. Um total de cerca de 200 navios neutros fôra destruído até o fim de março. Somente num comboio aliado, onde suas probabilidades de afundamento eram de um contra 800, estava um navio neutro razoavelmente protegido nos mares. Mas, se a navegação aliada era martelada e a neutra ameaçada, a navegação alemã era varrida dos mares. Pelo fim de março, 38 navios somando cerca de 200.000 toneladas tinham sido postos à pique, a maioria pela própria tripulação a fim de evitar a captura. Quando foram acrescentadas as cem mil toneladas da navegação alemã tomadas pelos aliados, elas somaram cerca de 8% da marinha mercante da Alemanha. As restantes estavam presas em portos alemães ou neutros ou confinados, no que dissesse respeito à navegação, às águas do Báltico e dos estados neutros do norte.
 
A rota principal deixada aberta para a navegação alemã ficava ao longo da costa norueguesa. A Alemanha tinha preparado um caminho marítimo que permitia aos seus barcos navegar de Murmansk para os portos alemães, mantendo-se dentro de águas territoriais neutras durante todo o trajeto. Na última parte de fevereiro, foi informado que vasos de guerra aliados estavam cruzando o Ártico na região de Murmansk e Petsamo. Protestos da Noruega à Grã-Bretanha pelos fins de março revelaram que destróieres britânicos mantinham estreita vigilância sobre navios alemães carregados de minério, os quais às vezes viajavam dentro do limite de três milhas. Uma nova dosagem de audácia nas operações efetuadas pelos submarinos britânicos conduzia no dia 22 de março ao torpedeamento de um cargueiro alemão carregado de minério na zona fortemente minada do Kategat, e no dia seguinte outro cargueiro foi afundado na mesma área. Foi tornado claro que em ambos os casos, em contraste com os métodos nazistas, os comandantes dos submarinos britânicos tomaram providências para o salvamento das tripulações alemães e efetuaram a destruição dos navios sem perda de vidas.
 
A esse tempo o bloqueio abrangia um campo ainda mais vasto. Informações de que mercadorias eram transportadas pelo mar à Alemanha através de Vladivostok e de que a Alemanha tinha feito propostas tanto à Rússia tomo ao Japão para a criação de bases submarinas no Pacífico, eram seguidas de notícias de atividade naval aliada no Extremo Oriente. Pelos fins de março, pelo menosdois navios russos - um dos quais tinha sido capturado já a 13 de janeiro - tinham sido apreendidos com a sua carga de metais em Hong Kong pelos navios de guerra britânicos. Um protesto soviético conduziu a nada mais que a entrega desses navios aos franceses por "motivos administrativos". Estava ficando claro que, onde os aliados suspeitavam que uma carga se destinava à Alemanha, ficavam cada vez menos inclinados conceder aos neutros o benefício da dúvida.
 
Seria esperar demais que uma atividade tão constante e de tão longo alcance pudesse ser executada inteiramente sem perdas. Assim mesmo, o preço que os navios aliados eram forçados a pagar durante esse período foi comparativamente pequeno, e muito inferior ao registrado durante os primeiros meses da guerra. Nenhum navio de importância fôra afundado, conquanto o Nelson tenha sido danificado por uma mina e outro cruzador levemente atingido durante um reide aéreo sobre Scapa Flow. A 16 de janeiro, foi revelado que três submarinos britânicos tinham sido perdidos enquanto "empenhados num serviço particularmente perigoso" - presumivelmente uma tentativa para alcançar a base naval alemã da enseada de Heligoland. Dois destróieres, o Grenville e o Exmouth, foram perdidos pelos britânicos durante o mês de janeiro; outro, o Daring, foi torpedeado em fevereiro; e em março o destróier francês La Railleuse foi a vítima de uma explosão no porto de Casablanca. Contra essas perdas menores, a Grã-Bretanha tinha cinco navios grandes quase prontos, esperando-se que dois desses entrassem em serviço na primavera. A França tinha um vaso de guerra para ficar pronto provavelmente no decurso do ano, e outro, o Jean Bart - o segundo de quatro em construção - chegou à fase de lançamento nos primeiros dias de março.
 
As perdas alemães eram menos fáceis de se avaliar, pois que a frota nazista era demasiadamente importante para ficar inativa. Mais notável era a carência de qualquer ação de parte dos couraçados de bolso. Em teoria, a Alemanha deveria ainda possuir dois desses depois da perda do Graf Spee, Mas, um deles, o Admiral Scheer, não dera notícia de si desde que a guerra tivera início. Quanto ao Deutschland, a última notícia obtida foi a declaração curiosa de 25 de janeiro de que ele retornara à sua base e fôra rebatizado com o nome de Lutzow a fim de reservar seu antigo nome para um navio mais poderoso. Já que um dos cruzadores alemães em construção havia sido batizado com o nome de Lutzow, esse procedimento pareceu extraordinariamente singular. Mas, qualquer que fosse o seu nome, nada mais dele foi ouvido; e parecia haver certa razão para a suspeita de que ambos os navios de batalha de bolso tinham sido postos fora de ação no decurso dos vários ataques britânicos pelo ar e por meio de submarinos.
 
Na questão da guerra submarina, a posição alemã era da mesma forma difícil de ser calculada. A despeito dos clamores alemães sobre produção em massa, era altamente duvidoso que mais do que quatro botes submarinos por semana tivessem sido completados, e um número mais baixo estaria provavelmente mais próximo da verdade.
 
Isto faria pouco mais que manter o equilíbrio com a base aliada de destruição, conservadoramente calculada entre dois a três por semana. Informes sobre a natureza dos novos submarinos alemães eram igualmente variados; mas a sugestão de que a Alemanha se empenhava pela obtenção de unidades maiores capazes de mais largo campo de ação, viria ficar comprovada por evidências definitivas.
 
A libertação do Altmark
 
Mas, o episódio mais emocionante da guerra no mar foi um que produziu menos efeito sobre a força naval alemã do que sobre o restante do prestígio alemão. O caso do Altmark foi uma seqüência triunfante da destruição do Graf Spee. Esse navio, que tinha à bordo a tripulação de sete navios ingleses destruídos pelo cruzador de bolso, fôra objeto de uma busca meticulosa da armada britânica mesmo desde a batalha do rio da Prata. Por dois meses, o navio-prisão iludia os caçadores. E então, a 16 de fevereiro, foi localizado por aviões britânicos de reconhecimento quando deslizava pela costa norueguesa ao sul de Bergen, rumo a Hamburgo e à segurança.
 
Três destróieres britânicos saíram no encalço de sua presa. Mas a tentativa do Intrepid de capturar o Altmark foi frustrada por um navio armado norueguês cujo comandante exigiu que os britânicos respeitassem as águas territoriais da Noruega. Durante as discussões, o Altmark penetrou no abrigo de um fiorde próximo; e então os navios britânicos retiraram-se para além do limite de três milhas e radiografaram por ordens ao Almirantado.
 
O almirante respondeu com uma ordem de penetrar na zona neutra e libertar os prisioneiros. Foi depois do escurecer que o destróier mais antigo, Cossack, aproximou-se do norueguês e pediu que o Altmark fosse levado a Bergen sob guarda unida e ali revistado à cata de prisioneiros britânicos. Quando isto foi recusado, da mesma forma como foi recusado o pedido de que o comandante norueguês permitisse uma busca no local, o Cossack foi adiante. O Altmark, libertando-se dos gelos em que tinha sido colhido, tentou enfrentar o Cossack, mas o destróier abordou-o e um grupo de marinheiros galgou a coberta do navio alemão. Houve tiros de ambos os lados; um número de marinheiros alemães que tinha escapado pelos lados abriu fogo da terra, e o fogo com que os ingleses responderam causou entre eles numerosas baixas. Encerrados nos paióis de munição, depósitos e num tanque vazio de óleo havia 299 marujos britânicos, muitos deles em sérias condições físicas causadas pelas fadigas penosas do aprisionamento. Com estes a bordo, o Cossack deixou o Altmark paralisado entregue à respectiva tripulação e rumou com os homens libertados para a Inglaterra.
 
Seguiu-se a isto um feixe de protestos diplomáticos. A Alemanha protestou junto à Noruega por ter esta permitido a violação de sua neutralidade. A Grã-Bretanha, alegando que o Altmark era um navio armado e que as autoridades norueguesas tinham-no abordado e revistado em Bergen, protestaram junto à Noruega por ter esta deixado de descobrir e de libertar os prisioneiros. A Noruega, negando que o navio tivesse parado em Bergen e afirmando que ignorava que houvesse prisioneiros a bordo ou que o Altmark estivesse armado, protestou contra a ação do Cossack e exigiu a volta dos marinheiros libertados - exigência provavelmente feita mais para satisfazer a Alemanha do que com a esperança de ser atendida. A cólera apoplética dos porta-vozes nazistas ofereceu o espetáculo algo cômico da Alemanha expressando horror por uma violação do direito internacional. O contraste entre a atitude normal alemã e essa repentina exigência de legalidade foi sutilmente estabelecido por Mr. Chamberlain, a 24 de fevereiro.
 
"De tal maneira os nazistas respeitam os interesses alheios que os navios neutros não mais estão livres de seus ataques, mesmo quando navegam apenas entre um ponto neutro e outro. Podem afundar navios mercantes, podem destruir cargueiras cujas tripulações são deixadas a navegar ao léu e morrer de inanição, mas os países neutros não devem reclamar. Porém, se nós, os britânicos, a fim de salvar 300 homens, ilegalmente feitos prisioneiros, da brutalidade de um campo de concentração, cometemos assim uma quebra meramente técnica de neutralidade, que não envolve vidas e não toca na propriedade neutra, então é quanto basta para que os nazistas fiquem exaustos de tantas exclamações de histérica indignação."
 
Cumprido o seu dever, por meio de formais e vigorosos protestos, acompanhados por uma oferta de arbitramento, a Noruega por sua vez mostrou-se contente em aceitar um compromisso que deixou o caso no ponto em que estava.
 
A guerra no ar
 
Enquanto, pois, a guerra se desenvolvia à superfície das águas como em baixo dela, a guerra no ar continuava a dar sua contribuição principal a esse aspecto particular do conflito. Extensivos vôos de reconhecimento em terra, durante os quais os aviões aliadoschegavam a pontos longínquos do leste tão distantes como a Polônia, eram efetuados por ambos os lados; mas, à exceção de ocasionais encontros de patrulhas, não houve lutas, e nenhum bombardeio de objetivos civis ou militares. Mas os navios de guerra e os mercantes estavam expostos aos perigos da guerra aérea tanto quanto aos dos submarinos e das minas.
 
Aqui, como no caso da guerra submarina, os neutros desprotegidos é que corriam os principais riscos. Os ataques aéreos alemães a comboios britânicos, conquanto aparentemente em aumento durante o mês de março, foram na quase totalidade infrutíferos. Os bombardeios e metralhamentos de traineiras e navios leves davam resultados dificilmente compensadores da indignação suscitada por tão implacável brutalidade. Ocasionalmente, um navio britânico isolado podia sofrer - como por exemplo o transatlântico de passageiros Domala, vítima, a 2 de março, de um ataque aéreo a metralhadora e o qual ceifou pelo menos 108 vidas, na maioria de indianos britânicos que estavam sendo repatriados depois de um internamento na Alemanha. Mas eram os neutros que ofereciam a presa mais fácil. particularmente porque estavam geralmente desarmados e completamente iluminados. Nove navios holandeses foram bombardeados e metralhados somente a 4 de março; outros três foram atacados no dia seguinte. A navegação escandinava não era mais respeitada pelos aviões do que pelos submarinos. Nem mesmo os italianos escapavam. A 7 de março, durante uma fase particularmente crítica nas relações entre a Grã-Bretanha e a Itália, o cargueiro italiano Emilia Lauro foi vítima de um selvagem ataque aéreo que matou um e feriu três - ação que, conforme observara, lastimosamente, o comandante italiano, "veio como surpresa de nossos amigos".
 
Scapa e Sylt
 
A atividade era dirigida principalmente contra navios mercantes, e de quando em vez contra os vasos de guerra ocupados no serviço de comboiamento. O esforço máximo dos aviadores alemães contra a frota britânica durante esse período verificou-se com o reide contra Scapa Flow, a 16 de março. Embora Mr. Churchill tivesse anunciado cerca de três semanas antes que Scapa Flow não havia sido usada como base principal desde o afundamento do Royal Oak, ela estava sendo utilizada claramente como importante ancoradouro, e parecia nessa ocasião estar abrigando certo número de grandes navios e outras embarcações menores. Ao escurecer do dia 16 de março, catorze Heinkels se lançaram sobre a base, num reide que durou hora e meia. Algo como cem bombas foram deixadas cair, causando sete baixas entre o pessoal naval e infringindo danos menores num vaso de guerra descrito como não sendo um "navio de primeira classe". O aspecto mais importante da incursão, todavia, consistiu no fato de os alemães terem pela primeira vez atacado objetivos de terra da mesma forma que os navios no porto. Aparentemente com o fim de danificar hangares e campos de pouso, a decolagem dos caças britânicos, os alemães lançaram bombas explosivas e incendiárias nas cercanias desses objetivos, matando um civil e ferindo sete.
 
A ação provocou imediatas represálias britânicas. A atividade aérea britânica nesse sentido orientou-se para o interceptar dos incursores alemães, tanto por meio de patrulhamentos de costa como por ataques aéreos a bases aeronavais e para o ataque a navios alemães de patrulhamento na costa do Reich. No dia do reide contra Scapa Flow, aviadores britânicos localizaram e bombardearam vários navios de patrulha ao largo de Heligoland. Mas, a 19 de março, nova intensificação de ação se verificou, quando os britânicos efetuaram o maior reide aéreo da história contra as bases aéreas alemãs na ilha de Sylt. Tendo começado logo depois do escurecer e prosseguido com ondas sucessivas de bombardeiros, o reide durou quase sete horas, enquanto o seu desenvolvimento, radiografado pelos aviadores ao Almirantado e comunicado ao primeiro ministro, era relatado, fase por fase, por Mr. Chamberlain na Câmara dos Comuns.
 
Como no caso do reide contra Scapa Flow, os comunicados britânicos e alemães sobre o reide contra Sylt mostraram ampla divergência. Os aviadores britânicos acreditaram terem destroçado numerosos hangares alemães, obtido impactos em tanques de óleo e depósitos de munição, e danificado seriamente o molhe conhecido como Dique Hindenburgo, a única ligação ferroviária da ilha com o continente. O comunicado alemão admitiu apenas danos de menor importância, e os nazis procuraram provar sua afirmativa com uma excursão cuidadosamente organizada de jornalistas especialmente escolhidos. De qualquer modo, pareceu provável que ambos os reides tinham, até certo ponto, um caráter experimental, e havia dúvidas sobre se os experimentos foram concludentes para qualquer um dos lados beligerantes.
 
Nenhum dos dois lados, era claro, estava ainda pronto para arriscar-se a um ataque aéreo de plenitude de força. Se ficou certo que os bombardeiros podiam passar, ficou também certo que o faziam arriscando-se consideravelmente a jamais regressar. Se a defesa, não desfrutava, no ar, da preponderância que "afirmava" ter conseguido em terra, era mesmo assim bastante forte para obrigar ao atacante a interromper sua ação. Os próprios reides contra a navegação consistiam em ações rapidíssimas, em que pequenas esquadrilhas ou mesmo aparelhos isolados lançavam suas bombas e se punham imediatamente a salvo; dificilmente 3% dos navios afundados o foram por ataques aéreos. Nem também as esquadrilhas atacantes, via de regra, se empenhavam em batalhas quando alçavam vôo os aviões defensores. As perdas em combate propriamente dito, tanto nesses reides como na frente ocidental, foram desprezíveis. Os aliados pretendiam ter abatido 133 aparelhos (os alemães reconheciam a perda de 85) e danificado outros 26 tão seriamente que era improvável tivessem podido alcançar suas bases. Os alemães afirmaram ter abatido 357 aviões aliados - número que os aliados disseram ser mais que o dobro de suas perdas reais. Mas mesmo aceitando completamente as afirmações de ambos, o comentário do Spectador a 23 de fevereiro continuaria verdadeiro: "A escala da guerra aérea até esta data, e as possibilidades da guerra aérea futura, serão postas nas suas verdadeiras proporções se se notar que em todas essas luta - Mar do Norte, Baía de Heligoland, Frente Ocidental - nenhum dos lados perdeu em aparelhos o equivalente a uma semana, ou meia semana, de produção."
 
Assim, tanto no mar como no ar, não menos que em terra, as forças armadas hesitavam em empenhar-se fortemente em luta. Ao invés elas tentavam, por meio do bloqueio e dos ataques à navegação, estrangular a vida econômica do adversário. E enquanto cada qual conduzia esta espécie de ofensiva, cada qual também se esforçava por fortalecer e consolidar sua frente interna para os esforços crescentes que se esperavam fossem exigidos pela guerra.
 
As frentes internas
 
A declaração do gabinete de guerra britânico, a 9 de setembro, de que os planos estavam sendo feitos de acordo com a presunção de que a guerra durasse três anos ou mais podia ser tranqüilizadora, mas dificilmente será tida como inesperada. Em contraste com o ocorrido em 1914, quando se esperava uma vitória rápida e fácil, havia agora poucas ilusões sobre o caráter sério da luta em que as nações tinham entrado. Diante de tal perspectiva, ambas as facções pareciam determinados a evitar o mais possível as dispendiosas confusões da última guerra, no terreno civil não menos que no militar. Em 1914 se verificara arraigada relutância em perturbar o curso normal da vida civil, mesmo com sacrifício de uma maior eficiência militar. Em 1939 era evidente desde o começo que todas as atividades nacionais tinham que ser orientadas com o único propósito de se obter o máximo da eficiência bélica.
 
Para as democracias isto significou a regularização e coordenação dos esforços econômicos até um ponto muito mais extensivo que o que jamais tinham conhecido até então, dirigidas por uma concentraçãode autoridade muito mais poderosa que qualquer outra que existira em tempos de paz. A Grã-Bretanha e a França preferiram evitar a palavra "ditadura", como também o que ela representava. Mas para a direção eficiente das energias nacionais a uma finalidade suprema, alguma forma de autoridade central, munida de poderes adequados, era absolutamente essencial. O reconhecimento deste fato serviu de base à organização dos gabinetes de guerra em ambos os países.
 
Por trás dessa resolução, entretanto, ostentava-se um fato ainda mais fundamental. Este era a manutenção, em ambos os países, do sistema do governo parlamentar. A autoridade obtida pelos ministros franceses e ingleses descansava solidamente na sóbria decisão de uma maioria de representantes selecionados da nação. O parlamento britânico, a 24 de agosto, votou a Lei dos Poderes de Emergência (Lei da Defesa), que conferiu ao governo o direito de impor extensivas regulamentações decididas em sessão de conselho. O governo francês, a que já tinha sido dado o direito de agir por meio de decretos temporários, teve esse direito confirmado para a duração da guerra, por voto da Câmara, a 30 de novembro, e do Senado, a 1o de dezembro. Mas nenhuma dessas medidas era de alguma forma uma abdicação da autoridade fundamental do parlamento. O gabinete existia, e os ministros exerciam os seus poderes, sujeitos em última instância à aprovação das legislaturas eleitas; e ou o Parlamento podia anular esses poderes ou impor-se ao ministério toda a vez que tal ação se mostrasse desejável no interesse nacional.
 
Isto foi demonstrado pela crítica constante, se bem que razoável, que os governos dos dois países tiveram que sofrer e satisfazer. Nos primeiros dias da guerra, foi a Câmara dos Comuns que promoveu uma drástica modificação dos regulamentos do Decreto das Medidas de Guerra nos interesses de uma pior liberdade pessoal. Na França, semelhante criticismo pôs fim a alguns dos piores absurdos da censura, inclusive a supressão de toda a crítica à política governamental; na Inglaterra, isto teve resultado igual com a reorganização do impropriamente denominado Ministério da Informação. Mas tais realizações reforçaram a eficácia do governo democrático, ao invés de enfraquecê-la. Conforme Mr. Churchill disse numa irradiação de 27 de janeiro:
 
"No nosso país, os homens públicos sentem orgulho em serem servidores do povo. Envergonhar-se-iam de ser seus patrões. Ministros da Coroa sentem-se fortalecidos por terem ao seu lado a Câmara dos Comuns e a Câmara dos Lordes, a se reunirem com grande regularidade e buscarem contínuas oportunidades de estimular suas atividades. Naturalmente, é bem verdade que surgem muitas vezes severas críticas ao governo em ambas as Casas. Mas nós não nos ressentimos com a crítica bem-intencionada de qualquer homem que queira vencer a guerra. Nem mesmo a crítica honesta nós evitamos, e esta é a mais perigosa de todas."
 
O gabinete de guerra britânico
 
Percebeu-se na Grã-Bretanha, durante a guerra passada, que um gabinete de uns vinte membros era organismo grande demais para uma eficiente direção dos negócios. Quando Mr. Lloyd George se tornou Primeiro Ministro, em 1916, ele criou um pequeno grupo interno de cinco, cuja função única era a direção da guerra. Esse foi o precedente que orientou a formação de um Gabinete de Guerra interno ao romper da presente conflagração. Presidiu-o o Primeiro Ministro e contava com Sir John Simon (Chanceler do Erário), Lord Halifax (Secretário do Exterior), Lord Chatfield (Coordenação da Defesa), Mr. Hore-Belisha (Guerra), Sir Kingsley Wood (Ar), e Sir Samuel Hoare (Lord do Selo Privado). Dois outros membros levaram a essa corporação a experiência obtida durante a Grande Guerra. Mr. Winston Churchill, voltando ao seu antigo posto no Almirantado, foi incluído no Gabinete de Guerra; e Lord Hankey, que tinha longa folha de serviço como Secretário do Comitê de Defesa Imperial e o qual servira como Secretário do Gabinete Imperial de Guerra, entrou como ministro sem pasta. Em edição, Mr. Anthony Eden, que foi nomeado Secretário dos Domínios, iria ter acesso ao Gabinete de Guerra no tocante a assuntos relativos ao seu departamento.
 
Em 1916 observaram-se certas divergências entre esse corpo e o Gabinete de Guerra. Em primeiro lugar, este não era uma coalizão de todos os partidos. Os partidos Liberal e Trabalhista tinham sido aproximados, mas, depois de confabulações, haviam decidido manter-se de lado, prontos a apoiar os esforços de guerra do governo, mas permanecendo livres para criticar onde a crítica se mostrasse justificada. Em segundo lugar, ele consistia em grande parte na chefia de pastas. Os membros do anterior gabinete de guerra tinham sido libertados de todos os deveres administrativos, com a finalidade de poderem devotar todas as suas energias aos problemas mais amplos da guerra. No caso presente, os membros retinham suas pastas executivas, e sentiu-se que isto seria um erro. Foi também sugerido em alguns círculos que devido a razões não alheias à inclusão de Mr. Churchill - o Gabinete de Guerra pendia pesadamente para o lado dos serviços militares, e que o fiel da balança poderia, com vantagens, ser desviado para o lado civil.
 
Mal se tinham passado quatro meses antes que uma mudança mais importante no Gabinete de Guerra tivesse lugar. A 5 de janeiro foi anunciado que Mr. Hore-Belisha renunciara a pasta de Secretário de Estado da Guerra. A notícia apanhou o público em geral inteiramente de surpresa. Mr. Hore-Belisha tinha ganho uma reputação de enérgico reformador, particularmente durante a sua gestão na pasta da Guerra. Sua drástica modificação do Supremo Comando, suas medidas para democratizar o exército e acelerar as promoções, seus esforços para melhorar o soldo dos soldados, tinham provocado comentários favoráveis. O mistério foi mal desfeito pelas explicações oficiais no Parlamento. A coisa mais aproximada a uma insinuação, na declaração algo velada de Mr. Hore-Belisha, foi a observação: "Não me ocorreu considerar que estávamos tornando o exército democrático demais para lutar pela democracia." O primeiro ministro limitou-se grandemente a negar algumas interpretações que corriam em forma de boatos. Não tem havido, disse ele, divergência alguma em política entre Mr. Hore-Belisha e o Gabinete ou o Conselho do Exército. Não tem havido pressão alguma para o seu afastamento de parte dos homens de "galões dourados", e nenhum membro do Alto Comando ameaçou renunciar. "Quero dizer apenas que cheguei à percepção de dificuldades - talvez possa descrevê-las como resultado das muito grandes qualidades de meu honrado amigo - que, a meu modo de ver, faziam desejável que alguma mudança ocorresse de quando em vez". Tudo que era possível deduzir-se de tal declaração era que, no caso de Mr. Oliver Stanley, que substituiu Mr. Hore-Belisha na pasta da Guerra, essas dificuldades peculiares dificilmente se apresentariam.
 
A substituição, se bem que aceita sem críticas sérias, pouco contribuiu para refrear a crescente impaciência que se tornou manifesta num certo número de círculos durante os meses que se sucederam. Um sentimento foi expresso abertamente: não apenas o de que certos funcionários se conduziam de um modo algo menos que ideal em seus postos, mas também o de que havia necessidade de mais eficaz coordenação dos esforços do que a empregada pelo Gabinete de Guerra nas bases existentes. No começo de abril foram tomadas medidas experimentais para conciliar esses sentimentos. Além de certas modificações ministeriais, inclusive a substituição de Sir Kingsley Wood no Ministério do Ar por Sir Samuel Hoare, e a resignação de Lord Chatfield ao seu cargo no Gabinete, a estrutura mesma do corpo central governante foi reorganizada. Mr. Churchill tornou-se chefe de um comitê composto dos chefes dos serviços de guerra; Sir John Simon, daí em diante, passou a presidir um comitê de política econômica; e Sir Kingsley Wood, agora Lord do Selo Privado, foi posto na chefia de um comitêde política interna. Assim, a direção das ativas hostilidades, dos assuntos econômicos e dos problemas sociais e domésticos foi entregue a uma autoridade coerente, com o Gabinete de Guerra a exercer a suprema função de órgão coordenador. Não era de modo algum tudo que a crítica esperava, mas representou progresso destacado em favor da unidade de direção.
 
Governo de guerra na França
 
Também na França, o início da guerra conduziu a uma reorganização do governo. Daladier procurou ampliar as bases de seu ministério com a inclusão de dois líderes socialistas, mas estes não obtiveram a permissão de seu partido em termos aceitáveis por Daladier. O ministério que ele anunciou a 13 de setembro era, portanto, muito semelhante na composição ao que o precedera. A modificação mais notável foi a transferência para o ministério da Justiça de M. Bonnet, que durante a sua gestão no ministério do Exterior estivera por demais ligado à política de apaziguamento. Nem também era este um órgão reduzido, nos moldes do Gabinete de Guerra britânico, se bem que de certa maneira uma significativa concentração de poderes tivesse sido efetuada quando Daladier tomou em mãos as pastas da Guerra e dos Negócios Exteriores, além da chefia do Gabinete.
 
O parlamento francês governa tradicionalmente o executivo com mãos ciumentas; e um ministério dotado do poder de emitir decretos-leis de tanta autoridade concentrada nas mãos do primeiro ministro iria fazer com que seus atos fossem fiscalizados com cuidados ainda maiores que os habituais.
 
Os socialistas particularmente poderiam mostrar certa preocupação a respeito da atitude do governo no tocante aos elementos mais radicais da Esquerda. Ao começo da guerra, o governo utilizou todos os recursos de sua autoridade para lançar um golpe contra os comunistas. O partido estava proscrito e seus líderes presos; sua tentativa de se reorganizar num Partido de Operários e Camponeses foi declarada ilegal; os conselhos municipais comunistas foram suprimidos, e 60 dos 73 deputados comunistas à Câmara foram privados de seus assentos. Mas, na verdade, os próprios socialistas se adiantaram em condenar Moscou desde o pacto germânico-soviético. O próprio Parlamento votou a expulsão dos deputados comunistas; e quando, em fevereiro, M. Daladier defendeu sua política ante a Câmara, em sessão secreta, obteve o triunfo quase sem precedentes de um voto unânime de confiança.
 
Este sucesso, entretanto, mostrou-se temporário. Certa obstinação sobre a condução da guerra tornou-se evidente em março, e foi acentuada à conclusão da paz entre a Finlândia e a Rússia. A 15 de março, depois de dois dias de debates secretos, uma moção de confiança foi obtida no Senado, sem nenhum voto em contrário, mas, de um modo significativo, com certo número de abstenções. A 19 de março houve uma prolongada sessão secreta na Câmara dos Deputados. Ao terminar, uma moção expressando admiração pela Finlândia e confiança em que o governo conduzisse a guerra à vitória foi aprovada por 239 contra 1 voto. Mas as cifras demonstraram que 300 deputados, na maioria socialistas, tinham-se abstido de votar, e indicava crescente precariedade na posição do governo. O resultado foi a renúncia do governo Daladier a 20 de março.
 
O sucessor de Daladier foi Paul Reynaud, ministro das Finanças. M. Reynaud era conhecido como um homem de energia e decisão um moderado que apoiava os métodos democráticos e as finanças equilibradas. Sua reputação crescera com o trabalho desenvolvido no gabinete Daladier, onde sua política conseguira estabilizar a posição financeira da França e trouxera uma volta de confiança capaz de paralisar a evasão do capital para o exterior. Seu gabinete, em que Daladier permaneceu na qualidade de Ministro da Guerra e o próprio M. Reynaud assumiu a direção da política estrangeira, ficou marcado por dois feitos especiais. Criou um grupo central de nove ministros para agir como Gabinete de Guerra, e ampliou as bases do governo com a inclusão de três socialistas no ministério. Além disso, um Comitê de Guerra, consistente dos ministros da defesa e dos chefes dos serviços combatentes, e um Comitê Econômico Inter-Ministerial, cuja função era coordenar a atividade econômica, foram criados no interesse de uma direção central mais eficaz.
 
O novo ministério foi recebido de maneira algo duvidosa. Seu primeiro voto de confiança foi obtido pela contagem de 268 contra 156, mas a abstenção de 111 membros deixou-o com uma maioria real de apenas um voto. Havia várias razões para isto. O gabinete dos nove, que M. Reynaud descreveu como "bastante para a deliberação, mas não para a ação", era considerado por muita gente como sendo ainda grande demais. A inclusão dos ministros socialistas foi vista com maus olhos pelos conservadores; e os radical-socialistas, o partido de Daladier, exibia certos sinais de descontentamento. Embora o novo gabinete tivesse mostrado sinais de força crescente nos dias que se seguiram, no começo de abril seu futuro era ainda duvidoso.
 
A ascendência de Goering
 
Na Alemanha de Adolf Hitler não havia, naturalmente, problema algum de concentração de autoridade para fins de guerra. Isto fôra conseguido com a ascenção de Hitler ao poder. Mas mesmo assim o governo alemão sentiu a necessidade de um órgão capaz de supervisar a coordenação das medidas necessárias para o eficaz prosseguimento da guerra. O equivalente alemão do Gabinete de Guerra britânico era, pois, o Conselho Ministerial para a Defesa do Reich, que Hitler criara com o decreto de 30 de agosto.
 
O chefe desse órgão era o marechal-de-campo Goering, agora definitivamente estabelecido como segundo na importância depois do próprio Hitler. Desde que os nazistas tomaram o poder, ele tinha sido encarregado de uma sucessão de tarefas críticas, de modo que a sua autoridade já se estendia aos terrenos político, militar e econômico. Foi presidente do Reichstag, criador e chefe da força aérea alemã, e diretor do Plano de Quatro Anos que governava a atividade econômica da Alemanha. E em seu discurso no Reichstag, a 1o de setembro, Hitler nomeou Goering seu sucessor imediato para o caso de lhe acontecer algo durante a guerra.
 
Para o segundo na lista, e também para membro do Conselho de Defesa, Hitler nomeou Rudolf Hess. O mérito relevante deste era a sua completa devoção pessoal a Hitler. Em troca, Hitler provavelmente confiava em Hess mais que em qualquer outro de seus associados. Tornou Hess seu vice-líder no Partido Nazista, e dependia dele em muitos dos trabalhos de detalhe envolvendo coisas como a redação de decretos. Da parte de Hess, Hitler podia contar com solícita obediência.
 
Os outros quatro membros do Conselho eram Wilhelm Frick (Ministro do Interior), dr. Walther Fuck (Ministro da Economia e diretor do Reichsbank), general Wilhelm Keitel (Chefe do Estado-Maior pessoal de Hitler) e dr. Heinrich Lamers, chefe da Chancelaria do Reich e secretário do Conselho. Esses homens eram naturalmente membros em função dos próprios cargos que ocupavam, e sua inclusão foi menos digna de nota que a omissão de certos outros líderes. A ausência de Herr von Ribbentrop poderia ser atribuída ao fato de que ele era Ministro do Exterior, visto que o Conselho iria lidar principalmente com questões domésticas. Mas a exclusão do dr. Goebbels, ministro da Propaganda, e de Heinrich Himmler, chefe da Polícia Secreta, eram levadas por muitos observadores na conta da hostilidade pessoal de Goering. Sua inimizade em relação a Goebbels havia muito era notória; e sua antipatia a Himmler, embora possivelmente mais recente, não era por isso menos amarga. Parecia ser compartilhada pelos altos círculos do exército, revoltados com a brutalidade dos métodos policiais de Himmler. Diz muito do poder de Himmler o fato de pouco tempo depois Goering ter sido obrigado a conceder-lhe o direito a um assento como substituto do dr. Frick sempre que este tivesse que ausentar-se.
 
Ao término do ano era sentida a necessidade de coordenaçãoainda maia estreita. O Conselho de Defesa poderia harmonizar a política, mas algo semelhante a um Estado-Maior para a economia nacional atrairia maior harmonia neste terreno O resultado foi a criação, a 4 de janeiro, de um Conselho Geral da Economia de Guerra. Novamente Goering foi escolhido chefe, e ligados a ele estavam funcionários dos principais ministérios que lidavam com questões sociais e econômicas, da mesma forma que do exército e da organização do Plano de Quatro Anos. A nova nomeação tornou Goering chefe supremo de toda a economia nacional, e colocou diretamente em suas mãos o controle de funções específicas que mesmo Hitler nunca procurou exercer.
 
Economia de guerra
 
"As Finanças", disse Sir John Simon ao apresentar o orçamento de guerra da Grã-Bretanha, "são a quarta arma de defesa, não menos importante que as outras três, e se as finanças falharem, o pilar que sustenta todos os nossos esforços de guerra, ruirá". Mas as finanças nesta guerra significam algo muito mais que o simples equilíbrio entre as despesas e as receitas do governo. Com todos os beligerantes, mesmo durante o período mais calmo da guerra, gastando somas equivalentes a menos de metade de suas rendas nacionais, as fontes de empréstimos e impostos tinham que ser consideradas; e isto significava, em última análise, um cuidado extraordinário com as próprias fontes de renda nacional.
 
Um resultado foi a completa mudança de atitude quanto à questão dos gastos individuais. Em tempo de paz era natural que os cidadãos fossem encorajados a comprar quanta coisa lhes fosse possível. Quanto mais eles comprassem, maior seria o encorajamento dos esforços de produção; e esse caminho, sentia-se, conduzia à prosperidade nacional. Mas em tempo de guerra, todas as energias produtivas da nação eram necessárias à condução da guerra. Quanto mais o cidadão médio exigia para si próprio, menos ficaria para os propósitos de guerra. Por outro lado, quanto mais suas exigências fossem reduzidas ao estritamente essencial, tanto maiores seriam os recursos à disposição do Estado.
 
Um dos modos de restringir s consumo individual era o racionamento. Isto foi introduzido na Alemanha para certo número de artigos de primeira necessidade a 27 de agosto, e depois regulamentado em setembro. Os aliados foram mais vagarosos para adotar restrições obrigatórias. Mas a 8 de janeiro a Inglaterra introduziu cartões de racionamento para a manteiga, açúcar, toucinho e presunto, e a carne foi acrescida à lista em março. Sir John Simon explicou essas medidas como destinadas deliberadamente a reduzir o consumo dos gêneros; e as medidas tomadas em fevereiro para o controle do algodão e da lã foram dirigidas para idêntico fim. As restrições francesas, introduzidas a 1o de março, tomaram a forma não de cartões de racionamento, mas da proibição de certos alimentos em determinados dias - nenhuma carne na segunda-feira, por exemplo, e nada de farináceos na terça-feira. O álcool ficou proibido por três dias da semana, mas o vinho foi deixado à vontade dos consumidores gauleses.
 
Um segundo método consistia na elevação dos preços - ou, alternativamente, na redução dos salários. Todos os governos beligerantes reconheceram as dificuldades com que esbarrava esta última medida; mas todos se empenharam em evitar qualquer séria elevação de salários, enquanto deixavam que os preços tomassem um rumo ascendente. No caso de certos gêneros de primeira necessidade ainda não racionados, percebeu-se que estes tinham que ser limitados; e em fevereiro o governo britânico apresentou um plano de subsídio alimentar ao custo de 58.000.000 de libras por ano para ser aplicado ao trigo e ao leite, da mesma forma que aos gêneros racionados como carne e toucinho, cujos preços se elevavam acima do desejável. Mas a elevação de preços de muitos artigos foi deixada à vontade; e nos países beligerantes - como também, na verdade, nas nações neutras da Europa - o custo da vida subiu durante esse período entre vinte e trinta por cento.
 
A par desses acontecimentos manifestava-se um esforço, não somente para aumentar a produção da agricultura e indústria nacionais, como também - e particularmente no caso da Grã-Bretanha - para dar um estímulo especial às indústrias de exportação. As compras britânicas no exterior - sempre grandes, aumentaram substancialmente como resultado das exigências bélicas. As importações de 105.000.000 libras em janeiro ultrapassavam mais que duas vezes e meia as exportações, e excederam as importações de janeiro de 1939 em perto de 30.000.000 de libras. As importações de fevereiro baixaram a menos de 96.000.000 libras, mas as exportações também baixaram até 40.000.000 de libras. Isto envolvia não somente um problema de balança comercial, mas também um de câmbio estrangeiro. Algum alívio poderia ser esperado de planos como o da expansão da agricultura doméstica para dois milhões de acres; e o problema do câmbio poderia tornar-se menos agudo por meio de compras dentro do Império, onde as aquisições extensivas de produtos como lã, cobre e madeira já tinham sido resolvidas. Mas era aparente que sério esforço ainda tinha que ser feito para equilibrar a balança.
 
Nos círculos comerciais da Grã-Bretanha ergueu-se em conseqüência a exigência pela criação de um Ministério da Economia, cuja tarefa seria a coordenação e direção de todas as atividades econômicas da nação - a tarefa mesma que estava sendo cumprida pelo Conselho Econômico de Goering na Alemanha. Essa proposta foi rejeitada por Mr. Chamberlain, que receava que "esse ministro de altos poderes poderia fazer mais mal do que bem" e o qual pensava no "que é que o primeiro ministro iria fazer depois que esse cavalheiro desse ordens a todos os departamentos." Mas a 1o de fevereiro ele anunciou a criação de um Conselho de Exportação, chefiada por Sir Andrew Rae Duncan, cuja tarefa seria encorajar o comércio exportador da Grã-Bretanha e diminuir a diferença entre exportações e importações pelo incremento das exportações em cerca de cinqüenta por cento.
 
O problema das finanças
 
Esses, pois, eram alguns dos acontecimentos que se ocultavam por trás dos esforços dos governos beligerantes para assentar as bases necessárias à neutralização do crescente custo da guerra - custo que, na Grã-Bretanha, chegava a seis e meio milhões de libras por dia. A França gastava algo menos, a Alemanha consideravelmente mais. Nem toda essa despesa podia ser coberta pelos impostos comuns, embora sérios esforços tenham sido feitos para a obtenção da maior renda possível. Os impostos sobre a renda dos britânicos subiram de 37 para 80 por cento. O imposto francês sobre a renda - de 4 para 15 por cento - parecia baixo em comparação, mas foi completado por impostos indiretos e por taxações drásticas sobre os lucros comerciais. A Alemanha aumentou um imposto já pesado em 50 por cento, e impostos indiretos sobre vários artigos em 20 por cento. Mesmo a Grã-Bretanha dificilmente poderia esperar, entretanto, obter pela taxação mais que 40 por cento de um gasto de guerra que acabaria por subir a tanto como três bilhões de libras por ano. A Alemanha teria conseguido muito se se aproximasse daquela proporção; enquanto a França, que gastaria sete e meio bilhões de dólares em 1940, teria provavelmente que obter tanto como três quartas partes daquela soma por meio de empréstimos e créditos.
 
Essa situação exigia uma cuidadosa administração dos recursos de crédito do país. Certo uso poderia ser feito dos empregos de capital existentes, particularmente para conseguir créditos no exterior. Todos os beligerantes tinham imposto rígidas restrições cambiais. A Alemanha, naturalmente, havia muito tinha reivindicado para o Estado todos os bens de estrangeiros. Em fevereiro, a Grã-Bretanha atribuiu uma lista de sessenta garantias americanas selecionadas. Mas a principal fonte de recursos devia ser as apropriações dos fundos disponíveis dentro do país. A flutuação favorável de um empréstimo britânico de 300.000.000 librasà taxa de três por cento mostrou a intenção de se manter o custo das apropriações o mais baixo possível; e isto foi acompanhado de medidas tendentes a evitar a alta conseqüente das inversões particulares e pela fixação a um preço mínimo das garantias governamentais. A França também se empenhou em preservar ao governo uma posição crediária favorável; e a Alemanha mostrou sinais de ampliar o já extenso controle que exercia sobre a política de inversões de indivíduos e corporações.
 
O fato era, naturalmente, que fora desses países - os baluartes financeiros da Europa - relativamente poucas fontes de crédito havia disponíveis. A Grã-Bretanha esperava poder fazer uso da capacidade de crédito do Canadá e dos outros Domínios, e poderiam ser obtidos créditos comerciais de vários neutros. Mas estes, à exceção dos Estados Unidos, tinham fundos limitados para poder pôr à disposição dos beligerantes; e os créditos americanos estavam barrados pela Lei da Neutralidade. Conforme Mr. Robert Hudson, Secretário do Comércio Ultramarino, resumiu o duplo problema dos suprimentos e finanças:
 
"Não estamos livres para concentrar todas as nossas forças na fabricação de munições, porque devemos devotar parte dos nossos recursos industriais, uma parte crescente, ao preparo de artigos que pagarão pela matéria-prima de que essas munições por sua vez possam ser fabricadas. Não podemos tomar empréstimos externos para fazer isto, como fizemos entre 1914 e 1918. Devemos pagar à vista. Esta é uma guerra de cash-and-carry".
 
Dificuldades orçamentárias, entretanto, não iriam, por si só, trazer o colapso a qualquer um dos beligerantes. Enquanto os seus povos continuassem a produzir, e enquanto consentissem em fazer entrega de uma parte bastante de sua produção ao Estado para fins bélicos, suas dificuldades econômicas não seriam insuperáveis. As restrições e o racionamento que tinham sido impostos o foram, na maioria dos casos, devido à necessidade da precaução, mais que em resultado de necessidades imediatas, e as necessidades absolutas da vida eram ainda satisfeitas em todos os países beligerantes. A Alemanha tinha, sem dúvida, impelido seus cidadãos para mais perto de um padrão mínimo de vida do que a Grã-Bretanha ou a França. Ao começo do ano, uma política mais suave foi adotada com respeito aos salários e horas-extras indicação de que a pressão sobre os trabalhadores era considerada como tendo ido longe demais. E quando a 15 de fevereiro Goering anunciou um aumento no preço da manteiga e do leite, ele sentiu a necessidade de acrescentar a isso um argumento de que a Alemanha tinha grande quantidade de gêneros alimentícios disponíveis, como também um apelo às donas de casa para que se mantivessem animosas.
 
No terreno comercial, as importações alemães dos neutros acessíveis pareciam alcançar ou mesmo ultrapassar o nível de antes da guerra, e certa quantidade de suprimentos de outros países gotejou através dos vizinhos da Alemanha. Um sinal menos prometedor foi o decréscimo das exportações, mesmo para a Europa continental. Para sanar as deficiências em ambos esses terrenos, as melhores esperanças da Alemanha repousavam no desenvolvimento de suas relações com a Rússia. Era verdade que pequeno lucro fôra obtido até então de tais relações. Mas um novo tratado comercial, a 12 de fevereiro, (esses tratados estavam se tornando ocorrenciais quase que mensais) acenava com o elevar do tráfico entre os dois países dos existentes 200 milhões de marcos para "um nível que excederia o de todos os anos decorrentes desde a Guerra Mundial" - isto é, ultrapassaria o bilhão de marcos a que chegara em 1931. E se tais esperanças fossem seriamente alimentadas, elas sem dúvida haveriam de receber considerável impulso com a conclusão da guerra russo-finlandesa.
 
A Rússia e a Finlândia
 
A severidade do inverno que se abatera sobre a Europa, fossem quais fossem os seus efeitos sobre as operações no ocidente, em nada contribuíra para diminuir a intensidade da guerra que se travava entre a Rússia e a Finlândia. Nas frentes de batalha que se estendiam ao Círculo Ártico, sob uma temperatura que às vezes decaía a 45°C. abaixo de zero, a luta prosseguia; e à medida que ela continuava, a fantasia exuberante dos primeiros informes sobre os êxitos finlandeses começou a dar lugar a apreciações mais sóbrias em torno das graves perspectivas que se descortinavam.
 
Ao iniciar-se o ano, os finlandeses ainda mostravam uma resistência de notável sucesso à contínua pressão soviética, que se manifestava em todas as frentes. O avanço norte, de Salla ao entroncamento ferroviário de Kemijaervi, encontrou uma barreira inicial a 19 de dezembro, e uma tentativa subseqüente foi paralisada em meados de janeiro. O esforço de atravessar a estreita cintura da Finlândia, com a finalidade de alcançar o golfo de Bothnia e assim cortar as ligações ferroviárias com a Suécia, levou, pelo fim do ano, à batalha de Suomussalmi, em que os finlandeses primeiro derrotaram a 163a divisão russa e depois, passada uma semana, voltaram-se contra a 44a divisão, que vinha em socorro da primeira, e castigaram-na severamente. Os ataques contra a linha Mannerheim foram repelidos com êxito; outro movimento ofensivo ao sul de Suomussalmi, em Kuhmo, foi frustrado; e a séria ofensiva ao norte do lago Ladoga, que continuou por todo o mês de janeiro, chegou até o fim desse mês sem ser coroada de sucesso decisivo.
 
Ao começo de fevereiro, entretanto, mudou a tática russa. Já então tivera lugar uma modificação no comando russo, e as tropas de segunda categoria empenhadas nas operações anteriores foram substituídas por divisões mais bem treinadas, possivelmente trazidas das forças siberianas. Essa reorganização foi então seguida de um nove plano de campanha. Até aí os esforços principais tinham sido dirigidos por forças mecanizadas contra a fronteira não-fortificada da Finlândia oriental. As dificuldades de terreno, a deficiência das comunicações russas, e a habilidade dos finlandeses em tirar plena vantagem desses fatores, tinham contribuído para a falta de êxito dos russos. Foram então abandonados os métodos iniciais. Os esforços ao norte ficaram reduzidos a meras operações auxiliares; e a 1o de fevereiro todo o peso da ofensiva russa foi lançado num ataque frontal contra a Linha Mannerheim.
 
A Linha Mannerheim
 
A Linha Mannerheim era um exemplo de primeira classe de modernas fortificações. Seguiu ela os princípios adotados pelos alemães no ocidente e pelos franceses na sua mais recente construção atrás da Linha Maginot os princípios da defesa em profundidade. Tirou plena vantagem das características naturais do terreno em que fôra construída. A largura de 96 km. do istmo de Carélia é pontilhada de lagos que constituem obstáculos para um assalto em massa ao longo de todo o comprimento daquela linha. A tática de infiltração impõe-se praticamente ao atacante pela própria natureza do terreno. E as obras de fortificações haviam sido construídas justamente para fazer frente a essa tática. Elas não eram construídas numa linha contínua, mas numa série de posições isoladas. Os pontos fortes eram a cidadela de Muolaa ao centro, as defesas de Taipale no lago Ladoga, e os fortes de Koivisto no golfo da Finlândia. Entre eles, e mais atrás, em três zonas principais, havia uma série de posições fortificadas a cobrirem as principais linhas de aproximação e construídas de modo a produzir um fulminante fogo cruzado contra as tropas atacantes. Uma crescente resistência na defesa foi calculada para infligir aos atacantes perdas tais que um contra-ataque apropriado lhes completaria a destruição.
 
Parecia que uma brecha preliminar fôra aberta, na última parte de janeiro, onde o principal peso do ataque russo estava então concentrado: ao longo da estrada de Viipuri a Leningrado antes de Summa, no centro direito da linha entre Muolaa e Koivisto. Atrás do ataque havia uma concentração de artilharia remanescente das batalhas do Somme e de Verdun, durante a GrandeGuerra. Assestados quase lado a lado, os canhões russos martelavam incessantemente as fortificações, atirando, segundo cálculos, umas 300.000 granadas diariamente. Os efeitos desse canhoneio foram a erradicação das peças defensoras e o desvio de sua linha de fogo, ficando assim a infantaria atacante, coberta por tanques, capacitada de avançar sobre cada posição sucessiva. Depois de uma batalha de quinze dias, Summa foi capturada e a primeira linha defensiva estava penetrada.
 
Os finlandeses tinham obtido suas vitórias iniciais ao permitirem que as forças russas, avançassem para depois isolá-las, por meio de ataques às suas comunicações. Isto exigia uma flexibilidade de manobra que não era possível na defesa de posições fortificadas. O equivalente dessa tática na Linha Mannerheim teria sido um contra-ataque antes que o saliente criado pelos russos no ataque contra Summa se tivesse transformado numa ruptura das linhas finlandesas. Mas fortes ataques russos na extremidade oriental da linha e ao norte do lago Ladoga mantiveram engajadas substanciais forças finlandesas e impediram os finlandeses de reforçar os defensores de Summa. Eles não tinham reservas frescas disponíveis para contra-ataques, apesar da convocação de homens de 45 e 46 anos. Com a ruptura da frente finlandesa, os russos estavam capacitados a alargar a sua frente e a voltar a atenção aos fortes de Koivisto que ameaçavam seu flanco.
 
A 26 de fevereiro. os finlandeses finalmente admitiram a perda de Koivisto. A cidade-chave de Viipuri encontrava-se então sob um bombardeio a curta distância. Tropas russas penetraram em seus subúrbios nos primeiros dias de março; outras forças russas foram empregadas num movimento de flanco em torno da baía de Viipuri. Apesar da barragem de artilharia e do fogo de metralhadoras que as acolheu no avanço aberto por sobre o gelo, elas dominaram as ilhas e a baía e puderam fixar-se no continente. A 11 de março, Viipuri estava envolvida e seus dias visivelmente contados.
 
Mas quatro dias antes, a 7 de março, o mundo ficara atônito ao ter conhecimento da notícia de que negociações de paz já estavam em andamento entre a Rússia e a Finlândia.
 
A oferta russa de paz
 
Os passos que conduziram a esse acontecimento foram um segredo cuidadosamente guardado; e os vários documentos disponíveis ao tempo de ter sido este trabalho escrito haviam levantado apenas uma parte muito pequena do véu. Mas parecia claro que, mesmo depois de declarada a guerra, ambas as facções continuavam a acalentar na mente a possibilidade de um acordo. A 15 de dezembro, o Ministro dos Estrangeiros da Finlândia irradiou uma mensagem pessoal ao premier Molotov oferecendo negociações para uma paz honrosa. Oferta semelhante foi feita pelo presidente Kallio, numa reunião da Dieta de Guerra, a 1o de fevereiro. Nesse ínterim, os russos haviam, segundo parece, informado à Suécia, a 29 de janeiro, que estavam desejosos de receber sugestões dos finlandeses, uma vez que as primitivas reivindicações russas fossem satisfeitas e garantias subseqüentes lhes fossem dadas. Mas a resposta finlandesa, e a base sugerida no discurso do presidente Kallio, não iam de encontro a essas condições. Moscou decaiu na atitude de que o regime de títeres de Terijoki, e não "os bandidos finlandeses" de Helsingfors, constituía o governo legal da Finlândia; e novas iniciativas finlandesas, por intermédio da Suécia, a 12 de fevereiro, não receberam resposta.
 
Na parte final de fevereiro, entretanto, essa atitude mudou. Novos perigos de um choque com o Japão, sobre a fronteira da Mongólia, negociações que haviam sido interrompidas, e um certo nervosismo devido à situação interna, podem ter tido algo a ver com isso. De qualquer forma, o embaixador soviético em Londres achegou-se ao governo britânico a 22 de fevereiro com uma série de propostas que pedia à Grã-Bretanha encaminhasse à Finlândia.
 
As propostas russas eram mais duras que as exigências originais que tinham conduzido à guerra com a Finlândia. Elas incluíam todo o território que cobre o lago Ladoga e o total do istmo de Carélia, bem como concessões na região de Petsamo e um longo arrendamento da base naval de Hangoe. O governo britânico estudou-as durante cinco dias e depois achou que eram ultrajantes demais para serem encaminhadas. Assim, tendo falhado na obtenção dos bons ofícios britânicos, o governo soviético voltou-se de novo para a Suécia.
 
A posição da Suécia
 
Os suecos tinham boas razões para procurar a oportunidade de paz com mais empenho que os ingleses. Sua posição era a de uma crescente inquietude. A guerra entre a Alemanha e os aliados tornara a sua neutralidade bastante precária. Os interesses da Alemanha em manter acesso aos suprimentos suecos, particularmente o minério de ferro, acentuaram a sua pressão política, dirigida especialmente em favor da supressão na imprensa sueca de quaisquer comentários menos favoráveis à Alemanha. Em vista do que o comércio e a navegação suecos sofriam com os indiscriminados métodos alemães de guerra naval, tais comentários eram naturalmente de certa freqüência. E, do mesmo modo naturalmente, os aliados, conquanto simpatizassem com os suecos por sua tão difícil situação, eram obrigados a efetuar todos os esforços para impedir a sua manutenção técnica de neutralidade, utilizada, de fato, numa forma favorável à Alemanha.
 
O início da guerra russo-finlandesa complicou enormemente a situação. Pôs a Escandinávia, particularmente a Suécia, entre três fogos. Havia a sensação geral de que a Finlândia era um baluarte essencial cuja queda tornaria a Suécia a próxima vítima da agressão russa; e um sentimento "ativista" muito considerável manifestou-se no país, exigindo não somente assistência voluntária aos finlandeses, mas também intervenção militar direta a seu favor. E mesmo que os aliados não tenham até então exercido pressão para o mesmo fim, manifestações como o discurso de Mr. Churchill a 20 de janeiro, solicitando aos neutros que apoiassem os aliados contra a Alemanha, eram sinais bastante claros de que isso poderia por fim acontecer.
 
Contra essa possibilidade erguia-se o perigo muito mais iminente de uma ação direta alemã, se a Suécia desse um passo em falso. Não que a Alemanha fosse necessariamente hostil aos finlandeses, apesar de sua ligação com a Rússia. Ela cedeu à pressão russa, retendo aviões italianos que eram mandados à Finlândia, via Alemanha, no começo da guerra. Mas não mostrou entusiasmo algum pela aventura russa. Negou peremptoriamente o boato de que dera assistência militar ou técnica contra os finlandeses. E era significante o não ter, aparentemente, oposto objeções ao auxílio sueco à Finlândia ou ao trânsito de abastecimentos e de voluntários dos países aliados através de solo escandinavo.
 
Uma intervenção militar aliada direta, entretanto, teria sido um caso decididamente diferente. A Alemanha nutria a viva suspeita de que o objetivo de tal intervenção não seria apenas o de libertar a Finlândia, mas também o de desfechar um golpe no Reich. Na Grã-Bretanha e França havia apoio considerável à política de ser utilizada a intervenção na Finlândia para a criação de uma frente norte contra a Alemanha e assim privar esta do acesso às minas de ferro da Suécia. Esta política foi vivamente defendida por Mr. Hore-Belisha num discurso aos seus eleitores, a 23 de fevereiro. A Alemanha, por sua vez, tornou claro à Suécia e à Noruega que a presença de tropas aliadas em seu território constituiria o sinal para uma invasão alemã.
 
Os aliados e a Finlândia
 
Em fevereiro, os aliados estavam definitivamente estudando uma expedição à Finlândia. As primeiras solicitações finlandesas, que se tornaram freqüentes de 30 de novembro em diante, eram de suprimentos militares. A essas, os aliados responderam com a melhor de sua capacidade, e uma relação impressionante de suprimentos, incluindo artilharia e aviões como também grande variedade de armamento leve, foi mais tarde revelada pelos governosfrancês e britânico. Mas não foi senão em meados de janeiro que o barão Mannerheim disse que se sentiria satisfeito em ter 30.000 soldados bem treinados pelos meados de maio.
 
A 5 de fevereiro, o Supremo Conselho de Guerra reuniu-se e se decidiu a mandar uma expedição. Percebeu-se, entretanto, que isso provocaria um ataque alemão à Suécia e que parte da força seria requerida para auxiliar os suecos. Assim, embora o efetivo da expedição fosse estabelecido em 100.000, apenas 30.000 iriam realmente para a Finlândia. Foi sugerido aos finlandeses na segunda metade de fevereiro que fizessem um apelo público por uma expedição que não chegasse depois de 5 de março, o que permitiria aos aliados ajustar com a Noruega e a Suécia a questão da passagem.
 
A esse tempo, com a Rússia a martelar a Linha Mannerheim, a situação finlandesa se tornara muito mais desesperadora. A 13 de fevereiro, mais ou menos, a Finlândia procurou os países escandinavos com um pedido oficial de auxílio militar, estabelecendo que a alternativa era para ela solicitar intervenção aliada, e deixando compreendido que os aliados tinham feito uma promessa concreta de assistência militar. A 16 de fevereiro foi anunciado que a Suécia recusou a solicitação finlandesa. A notícia conduziu a um estourar de protestos "ativistas" tão sério que dois dias depois o rei Gustavo teve que convocar o Conselho da Coroa a fim de fazer uma declaração pública apoiando a ação de seus ministros. A 25 de fevereiro, uma reunião dos ministros do Exterior da Noruega, Suécia e Dinamarca resultou na declaração de que estes países estavam unanimemente decididos a manter sua neutralidade, e que "receberiam com satisfação quaisquer propostas para o início de negociações entre os beligerantes."
 
Entrementes, parece que os finlandeses tinham começado a fazer pressão por um auxílio aliado mais imediato. Uma declaração de M. Daladier, a 12 de março, revelou que no começo da segunda metade de fevereiro, fôra feito um apelo e que a 16 de fevereiro os finlandeses haviam sido informados de que os transportes necessários tinham sido reunidos e que os franceses dispunham de 50.000 soldados prontos para embarcar. Reconheceu-se, não oficialmente, haver a Inglaterra tomado medidas semelhantes.
 
Enquanto esperavam um pedido formal da Finlândia, os aliados trataram de limpar o caminho na Escandinávia. A 2 de março, de conformidade com uma declaração do ministro dos Estrangeiros da Noruega, os aliados pediram a este país e à Suécia permissão para o transporte de tropas através de seu território. A Suécia recusou a 3 de março; a Noruega a 4 de março. A esse tempo, conversações preliminares de paz estavam em andamento em Estocolmo, e os próprios finlandeses se mostravam hesitantes. Pediram aos aliados permissão para suspender a sua decisão de uma solicitação formal de ajuda, e ao mesmo tempo inquiriam se podiam contar com 50.000 homens no prazo de um mês. Os aliados, de conformidade com Mr. Chamberlain, responderam que a sua proposta anterior representava a maior força materialmente capaz de ser transportada. Este era o significado, aparentemente, de "todos os recursos disponíveis" que, conforme disse Mr. Chamberlain na Câmara dos Comuns a 11 de março, os aliados tinham prometido oferecer à Finlândia, se esta lhes pedisse. Mas o pedido jamais veio, pois que os finlandeses já estavam negociando os termos finais da paz em Moscou. Um pedido formal dos aliados, a 12 de março, de passagem pela Escandinávia não deu em nada, pois que algumas horas mais tarde os representantes finlandeses firmaram o tratado de paz com a Rússia.
 
O tratado de paz russo-finlandês
 
Os termos impostos pelo tratado à Finlândia eram muito mais severos que os que ela havia rejeitado em novembro. Ao norte, ela obteve a volta de Petsamo, que os russos tinham ocupado ao começo da guerra; mas as restrições do tratado de paz de 1920 a respeito de forças navais naquela região foram renovadas, e um território na península de Rybachi devia ser cedido. Na fronteira oriental, ao invés de obterem uma faixa da Carélia Russa, de conformidade com as propostas anteriores, os finlandeses cederam uma faixa na região de Salla, incluindo a cidade de Kuolajaervi. Além disso, houve importantes concessões de trânsito em ambas estas regiões. Haveria livre trânsito entre a Rússia e a Noruega através da região de Petsamo, e entre a Rússia e a Suécia pela rota ferroviária mais curta. Para este propósito, os finlandeses prometeram que a linha que corria do interior do golfo de Bothnia até Kemiajervi iria nesse mesmo ano estender-se até atingir a fronteira e estabelecer ligação com uma linha russa de Kandalaksha. Isto completaria uma rápida rota de trânsito da extremidade do golfo de Bothnia ao mar Branco, o que poderia ser de primeira importância para o desenvolvimento da região de Murmansk.
 
Mas foi no sul que a Finlândia sofreu as perdas realmente importantes As negociações anteriores tinham fracassado em conseqüência da relutância finlandesa em ceder as ilhas estratégicas do golfo da Finlândìa e vender ou arrendar a base naval de Hangoe. Agora, os finlandeses tiveram que atender a ambas as exigências. Todas as ilhas na baía de Viipuri e um certo número no golfo da Finlândia foram entregues. Hangoe foi arrendada à Rússia por trinta anos, a uma renda anual de 8 milhões de marcos finlandeses, e a península e ilhas adjacentes passaram para administração russa até a duração do prazo de arrendamento.
 
Os termos relativos ao istmo de Carélia foram os mais drásticos de todos. As exigências originais da Rússia baseavam-se apenas num reajustamento fronteiriço sem importância, que faria recuar a fronteira de modo a deixar Leningrado fora do alcance de artilharia. Ao invés, o istmo todo, inclusive Viipuri, foi cedido juntamente, com uma faixa para o norte do lago Ladoga, colocando-o completamente em território russo. Economicamente, esta foi a perda mais grave sofrida pela Finlândia. Viipuri, ou Viborg, a terceira cidade da Finlândia em tamanho, era o porto de mar de uma área que continha grande parte da indústria finlandesa. Agora metade dessa área, com importantes serrarias e fábricas de pasta para papel e uma população de cerca de 400.000 pessoas, era entregue à Rússia, enquanto a área remanescente ficava privada de um acesso direto ao seu escoadouro natural.
 
Mas, embora essa perda econômica significasse um golpe severo à Finlândia, o aspecto estratégico era mais importante, particularmente sob o ponto de vista da Rússia. Suas finalidades nas primitivas negociações tinham sido o assegurar do domínio sobre o golfo da Finlândia, a garantia da segurança de Leningrado e a remoção da possibilidade de uma ameaça a Murmansk pela península de Rybachi. Elas estavam agora alcançadas plenamente; e, além disso, a possibilidade da Finlândia poder novamente oferecer séria resistência militar foi reduzida a uma fração quase desprezível. A Rússia podia, agora, dominar Petsamo. A cessão de Kuolajaervi reduziu a distância do golfo de Bothnia, e a projetada estrada de ferro proveria uma linha de comunicação capaz de permitir um avanço russo para isolar a Finlândia da Suécia. Hangoe e as ilhas adjacentes tornaram a Rússia suprema no golfo da Finlândia. E, mais importante que tudo, as cessões em torno do lago Ladoga significavam a perda pela Finlândia das principais posições defensivas. Uma nova linha fortificada poderia ser construída mais atrás; mas um ataque russo não mais seria dividido pelo lago Ladoga, e a cessão de Viipuri e da faixa ao norte do lago Ladoga envolvia o rompimento das ligações ferroviárias em que a Finlândia baseara a defesa de sua fronteira oriental.
 
A perspectiva de que a Rússia tivesse assim a Finlândia à sua mercê constituía motivo de grave preocupação para a Suécia. A garantia russa de que não tinha mais aspirações territoriais na Escandinávia foi aceita com alguma reserva, que não foi mitigada pela informação de que, na comissão designada para assentar os detalhes da novafronteira, os delegados russos tinham traçado um mapa que estendia suas reivindicações a vários pontos. E quando a proposta de um pacto de defesa mútua entre a Suécia, Noruega e Finlândia foi vetada pela Rússia, como sendo contrária à cláusula do tratado que proibia alianças hostis, parecia claro que a Rússia estava determinada a manter a Finlândia dentro da sua própria órbita política.
 
Desta forma, a paz, embora tivesse apaziguado as apreensões imediatas da Suécia, de forma nenhuma as removeu inteiramente. Em certos círculos manifestava-se a tendência de criticar a Suécia pelas suas argumentações, e particularmente pelo seu bloqueio da intervenção aliada. Mas o seu problema era de caráter desesperadamente difícil, e a sua simpatia pelos finlandeses tinha sido demonstrada de uma forma a mais tangível. Calcula-se que nove mil voluntários suecos tinham sido enviados à Finlândia - indubitavelmente muito mais que os que tinham vindo de todos os outros países juntos. Cinco mil mais tinham oferecido seus serviços. Dinheiro e suprimentos no valor de 125.000.000 de marcos filandeses lhes tinham sido mandados. Para uma nação de 6.000.000 de habitantes esse esforço não era de modo algum pequeno. O balanço de toda a questão foi muito bem resumido pelo barão Mannerheim nas suas despedidas às exaustas forças finlandesas:
 
"Sem o auxílio pronto, em armas e equipamentos, que nos foi dado pela Suécia e as potências ocidentais, a nossa luta até esta data teria sido concebível... Somos orgulhosamente cônscios do dever histórico, que continuaremos a cumprir - a defesa daquela civilização ocidental que tem sido nossa herança por séculos; mas também sabemos que pagamos até o último níquel qualquer dívida que porventura tenhamos contraído com o Ocidente."
 
O Oriente Próximo e os Bálcãs
 
O fim da guerra finlandesa removeu, temporariamente, qualquer imediata perspectiva de criação de uma frente norte contra a Alemanha. Era esta uma perspectiva que tinha sido abertamente discutida por certo número de comentadores, tanto na Inglaterra como na França, os quais achavam que a existência da linha Siegfried tornava necessário o encontro de outro ponto mais promissor por onde a Alemanha pudesse ser atacada. Mas uma frente norte não era a única possibilidade; e enquanto alguns olhos estavam voltados para a Escandinávia e a Finlândia, outros perscrutavam, especulantes, os Bálcãs e o Oriente Próximo.
 
Essa especulação foi alimentada pela revelação de que mui consideráveis preparativos militares aliados estavam a caminho na extremidade oriental do Mediterrâneo. O desembarque em Suez, a 12 de fevereiro, de um contingente de tropas australianas e neozelandesas, estimado em 30.000 homens, chamou a atenção sobre as forças muito consideráveis que estavam sendo concentradas naquela região. Tropas britânicas no Egito e na Palestina e tropas francesas na Síria, calculava-se com justeza, tinham atingido um total de bem acima de meio milhão de homens. A Turquia tinha cerca de 350.000 homens em armas; e na segunda parte de março a realização de uma conferência em Aleppo entre os Estados-Maiores aliados e turco sugeriram que essas forças estavam se preparando para agir de acordo quando a ocasião se apresentasse.
 
Isto descortinou várias possibilidades. Um dos pontos em torno dos quais as discussões freqüentemente se concentravam era o de um ataque aos campos petrolíferos russos de Baku. Se a Rússia tencionava prover a Alemanha de considerável quantidade do óleo de que ela tão desesperadamente necessitava, era de Baku que esse óleo tinha que vir. Lá se encontravam os mais antigos e produtivos campos da Rússia, fornecendo vinte e três milhões de toneladas, ou três quartas partes da produção total da Rússia. Sua tomada seria um golpe severo na economia soviética, bem como em quaisquer esperanças alemães de obter substanciais fontes de petróleo.
 
Um ataque aos próprios poços de Baku teria que ser conduzido através do difícil terreno montanhoso do Cáucaso meridional. Séria falta de comunicações agravaria essa dificuldade; é que, embora fosse informado que a Turquia tinha completado uma nova linha ferroviária para Erzerum, parte dessa linha não passava ainda de bitola estreita, e o próprio sistema ferroviário turco tinha sofrido considerável dano em resultado do tremor de terra da Anatólia setentrional, em princípios do ano. Se, contudo, o principal objetivo era cortar os suprimentos para a Alemanha, algo poderia ser feito pela tomada de Baku. Esse porto, terminal, no mar Negro, do oleoduto de Baku, ficava a apenas 32 km. da fronteira turca, e seria vulnerável a um ataque ou bloqueio pelo mar. Um incentivo para tal ação foi fornecido pela notícia, em fevereiro, de que navios-tanque russos estavam começando a transportar petróleo de Batum para o porto romeno de Constança, onde este ficaria armazenado para depois ser reembarcado para a Alemanha. Afirmou-se mesmo que os aliados, na conferência de Aleppo, tinham aplanado o caminho para a obtenção do consentimento da Turquia de passagem de vasos de guerra aliados através dos Dardanelos para o mar Negro - informe este que, entretanto, os aliados logo desmentiram.
 
Por outro lado, foi sugerida a possibilidade da Rússia mesma desferir um ataque, não tanto à Turquia, como à Pérsia ou ao Iraque. A finalidade seria os campos de petróleo de Mosul ou as comunicações aliadas com a Índia, através do golfo Pérsico. Certo esforço foi feito para o encontro de um significado agressivo nas misteriosas manobras navais russas no mar Negro, manobras que tiveram lugar na última fase de fevereiro. Mas, conquanto um certo nervosismo fosse informado como existente entre as nações do Oriente Médio, nenhuma prova tangível surgiu de que a Rússia estivesse alimentando quaisquer desígnios agressivos naquela direção.
 
Uma terceira possibilidade de ação existia sobre os Bálcãs. Se um ou mais Estados balcânicos se resolvessem afinal a entrar para o campo dos aliados, ficaria aberta a possibilidade da criação de uma frente oriental contra a Alemanha. Se um desses Estados fosse atacado pela Alemanha ou pela Rússia, semelhante perspectiva se apresentaria. E em vista da intensa luta diplomática que vinha sendo travada nessa região era bastante possível que algo semelhante pudesse verificar-se.
 
Ao mesmo tempo, era improvável que a Alemanha atacasse nos Bálcãs até que todas as outras formas de pressão estivessem esgotadas. O que a Alemanha queria no momento era não tanto a posse das terras daquela região como a garantia de que os produtos dessas terras lhe ficariam à plena disposição. Uma invasão militar também mui provavelmente interviria na produção, frustrando, pelo menos temporariamente, o propósito que se destinaria a servir. Enquanto os países balcânicos continuassem a comerciar com ela, a Alemanha teria todo o interesse em apoiar-lhes a neutralidade, tentando, simultaneamente, por todos os meios de pacífica pressão colocar suas economias a serviço do Reich.
 
A Romênia e a Alemanha
 
O foco principal de tal pressão - e não somente do lado alemão mas também do aliado - era a Romênia. Os produtos romenos eram de primeira necessidade para a Alemanha, e o mais importante deles era o petróleo. Pelo acordo de dezembro, supunha-se que a Alemanha tinha assegurado um mínimo de 130.000 toneladas por mês. Na verdade, entretanto, os fornecimentos de janeiro não chegaram a mais de 26.000 toneladas. Ampla variedade de obstáculos erguia-se a caminho. O transporte por si mesmo apresentava um problema formidável. O Danúbio gelado impedia o transporte por água, e os aliados se preparavam para a primavera fretando todos os barcos disponíveis, a fim de deixá-los fora do alcance dos alemães. O funcionamento dos transportes por estradas de ferro, através da Galícia, agora em poder da Rússia, era tão pouco satisfatório que, pelo fim de janeiro, a Alemanha arranjou permissão para colocar em serviço as seus próprios técnicos e guardas de ferrovia, a fim de tentar remediar

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