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Sheri White Feather Os Barone de Boston III DORMINDO COM SEU RIVAL

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Disponibilização: Yuna, Gisa, Mare e Rosie
Tradução e Revisão: Julia
Rev. Final e Formatação: Iara
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Estava acostumada a enfrentar com os homens na sala de reuniões. Parecia que com o Flint Kingman, Gina Barone tinha encontrado a fôrma de seu sapato no trabalho e na cama. E, além de ter que trabalhar com o homem que sua família tinha contratado contra sua vontade, se viu obrigada a fingir estar tendo uma aventura com ele para que a imprensa não falasse do escândalo do negócio familiar.
Gina não demorou muito em mergulhar no mundo de fantasia de Flint e ali a rainha de gelo se deixou derreter pelo calor de seu adversário.
Quem é quem
Flint Kingman: Sua natureza forte e apaixonada se choca contra a parte estóica de sua herança cherokee. E, entretanto, com seu aspecto moreno e atraente e seu sorriso sedutor é o menino mimado dos meios de comunicação.
Gina Barone: Combina um temperamento ardente com a frieza que mostra ante quem considera rival no trabalho, incluído Flint Kingman. Com sua maleta e seu terninho, é a autêntica princesa de gelo.
Maria Barone: É a mais nova da família, e a que mantém todas as tradições da Sorveteria Baronessa, que tem várias décadas de antigüidade. Também guarda os segredos de família.
Capítulo Um
 
Gina Barone não tinha vontade de ir a uma festa, mas deu um gole a seu copo do Chardonnay, rezando para que o vinho não lhe caísse mal no estômago. Logo passou através da multidão que tinha assistido à festa beneficente luzindo um sorriso que queria dizer: «Tudo está sob controle».
Sabia que era importante se deixar ver e manter a cabeça erguida, sobre tudo naquele momento. Gina era a vice-presidente de marketing e relações públicas da Sorvetes Baronessa, um império familiar de sorvetes italianos. Uma empresa que estava sendo acossada pelos meios de comunicação. E Gina se sentia em parte responsável por isso.
Avançou entre a multidão, saudando os rostos conhecidos com uma inclinação de cabeça. Tinha ido ali para marcar sua presença, mas pensava que seria melhor evitar as conversações longas. Só se via capaz de saudar educadamente. E com aquela idéia em mente, limitaria a provar a comida, beber um gole de vinho e esperar que transcorresse o tempo suficiente para poder despedir-se e fazer uma saída digna.
-Gina?
Ela se deteve quando reconheceu a Morgan Chancellor, uma sócia da empresa que revoava pela cena social como uma mariposa, posando de convidado em convidado. Morgan bateu as pestanas antes de inclinar-se sobre ela
-Não sabe quem perguntou por você? 
Gina suspeitava que houvesse muita gente falando dela, comentando o fracasso que tinha colhido no mês anterior durante o ato publicitário que tinha preparado para o dia de São Valentim, e que tinha terminado em desastre. Um amigo de Gina, convidado por ela, que passara mal pelo ato tinha sofrido um grave ataque anafilático por causa da pimenta que alguém tinha jogado no novo sabor de sorvete que aquele dia a Baronesa apresentava. Gina havia sentido então ganas de matar a alguém, ao menos inconscientemente. E ainda não tinha superado a culpa e a vergonha que sentia por aquilo.
-Bom, e quem perguntou por mim? - perguntou girando-se para Morgan e obrigando a si mesma a sorrir.
-Flint Kingman.
-Está aqui? —perguntou enquanto, seu sorriso se desvanecia de repente.
-Sim. Pediu-me que a procurasse. 
-Sério?
Gina olhou a seu redor. A nata da sociedade de Boston comparecia em peso, mas, em algum lugar, escondido entre os esmoking negros e os vestidos de desenho, estava seu novo rival.
Com gesto nervoso, Gina levou a mão ao colar de diamantes e pérolas que levava no pescoço, e desejou não ter-lo colocado. A reputação de Flint a golpeou como um soco. O menino de ouro. O príncipe, o mago do mundo das relações públicas. A família da Gina esperava que trabalhasse com ele, que seguisse seus conselhos. Por que não deixariam a ela reparar por si mesma o dano com os meios de comunicação? Por que a obrigavam a trabalhar com Flint Kingman?
Tinha-lhe deixado muitas mensagens no escritório, insistindo em que respondesse suas chamadas. Assim por fim Gina tinha reunido a coragem suficiente para fazê-lo. Mas sua conversação profissional foi se esquentando, e ela tinha acabado por mandá-lo ao diabo.
E agora ele estava ali.
-Importaria de me dizer onde se encontra? —pediu a Morgan.
-Claro -disse a ruiva olhando por cima de seu ombro antes de franzir o cenho - Faz um momento estava ali detrás, com esse grupo de senhores, mas já não o vejo.
Gina se encolheu de ombros com a esperança de parecer tranqüila, uma sensação muito diferente ao tumulto que sentia em seu interior.
-Seguro que me procurará mais tarde. - assegurou ela.
Gina não pôde evitar perguntar-se se Flint não teria ido à festa só para intimidá-la. Já que não tinha aparecido em nenhum momento para apresentar-se, certamente continuaria espiando-a de longe, lhe provocando um agravamento em sua úlcera, uma doença produto dos nervos que Gina mantinha oculta de sua família.
-Se me perdoa Morgan, vou dar uma olhada no bufê.
-Adiante. Se vir Flint, lhe farei saber isso. 
-Obrigada.
Gina se dirigiu à imensa mesa em que estava servido o bufê, tratando de convencer a si mesma de que se sentia o suficientemente segura para comer em público. Não ia permitir de maneira nenhuma que Flint a intimidasse, embora sentisse desejos de sair correndo pela porta.
Fazendo malabarismo com seu prato de comida e um copo de vinho cheio até em cima, Gina se dirigiu por volta de uma das janelas que iam do chão até o teto, colocou a bebida em uma das mesinhas auxiliares próximas e se virou para contemplar a vista. A chuva caía e as luzes da cidade brilhavam como estrelas cintilantes que lançassem faíscas sobre a brisa do mês de março.
Gina se levantou com o prato na mão, admirando a paisagem molhada, e então escutou uma voz masculina chamando-a por seu nome. Aquela voz grave, como de vodca com gelo, atravessou-lhe a espinha dorsal e conseguiu lhe acelerar os batimentos do coração. Gina reconheceu imediatamente o tom de Flint Kingman.
Disposta a enfrentar-se a ele, deu a volta. Olhou-o diretamente nos olhos, e fez todo o possível para manter a compostura. Esperava a um homem alto e bonito, mas era mais que isso. Muito mais.
Ia vestido com um terno Armani e sapatos Gucci, e mostrava uma imagem tão impecável como sua reputação. E estudava sexualidade. Um calor primitivo, puro e essencial.
Gina segurou o prato com as duas mãos para evitar que a comida esparramasse pelo chão. Os homens não costumavam pô-la nervosa. Mas aquele sim o fazia.
Flint não disse nada: Simplesmente, limitou-se a olhá-la com aqueles olhos cor âmbar.
- Você não vai apresentar-se? —disse ela, com a postura rígida e os dedos sem circulação de tanto apertá-los.
Um sorriso cínico apareceu nos lábios daquele homem enquanto uma mecha de cor chocolate lhe caía com rebeldia sobre a frente.
-Finge muito bem. Mas sabe perfeitamente quem sou.
Como se fosse um predador seguro de si mesmo, Flint se aproximou um pouco mais, o suficiente para permitir que seu cheiro entrasse em seu campo de ação. Dentro do estômago da Gina se acendeu uma chama de fogo.
«Malditos nervos», pensou. «E maldito Flint Kingman».
-Passarei por seu escritório na terça-feira - disse ele-. Às duas.
-Consultarei minha agenda e então lhe direi algo. - respondeu Gina.
-Na terça-feira às duas. Isto não é negociável.
Gina sentiu como se arrepiava. Odiava a aquele homem e tudo o que representava.
-É sempre tão prepotente?
-Sou enérgico, não prepotente.
-Isso é o que diz.
Gina levantou o queixo uns centímetros, e Flint estudou aquele gesto orgulhoso. Gina Barone era toda uma força feminina da natureza. Tinha um corpo esbelto e elegante, uma juba ondulada e castanha recolhida na nuca, e uns olhos da cor das violetas.
Uma dama de ferro de temperamento ardente. Flint tinha ouvido dizer que era uma princesa de gelo. Que era umamulher que estava sempre à defensiva, uma mulher que competia com os homens. E agora ia competir com ele.
Gina lhe dedicou um olhar irritado e ele dirigiu a vista para seu prato de canapés, que estava intacto.
-Não gostou da comida?
-Não tive a oportunidade de prová-la.
-Porque eu a interrompi?
Flint estirou a mão, agarrou um cogumelo do prato da Gina e o meteu na boca, sabendo de sobra que aquele comportamento desafiante a enfureceria ainda mais. Seus olhos violetas se voltaram um tanto agressivos, e Flint suspeitou que estivesse contemplando a possibilidade de fazer algo extremamente infantil, como lhe arrojar o resto dos cogumelos sobre o peito. 
-Não tenho nada contagioso, senhorita Barone. 
-Tampouco tem nenhuma educação. 
-Claro que sim.
Nesta ocasião, Flint se fez com um camarão-rosa e o degustou com deleite. Logo procurou no bolso de sua jaqueta até encontrar um lenço com suas iniciais bordadas no que se limpou as mãos com gesto elegante. Pensou que aquela festa era muito estirada. Igualmente Gina Barone.
Flint estava mais que farto da superficialidade da sociedade em que vivia. Estava acostumado a mover-se naquele mundo como peixe na água, mas agora tudo lhe parecia uma grande mentira. Por que teria que ser de outra maneira? Depois de tudo, acabava de descobrir um segredo familiar, um cadáver no armário que fazia com que toda sua vida parecesse uma farsa.
Sem deixar de olhá-lo com desdém, Gina deixou seu prato sobre a mesa.
-Graças a você perdi o apetite.
Mas Flint pensou que antes tampouco o tinha. Certamente, o problema dos sorvetes Baronessa era uma carga muito pesada para seus ombros inexperientes. Gina nunca tinha tido que enfrentar um escândalo público, e muito menos daquela magnitude. Flint sim o tinha feito, é obvio. Os escândalos eram sua especialidade. Mas não os segredos de família. Não podia superar a mentira em que se criou.
Passou a mão pelo cabelo e então caiu na conta de que tinha perdido de vista sua prioridade. Nada, nem sequer o problema que tinha, devia interferir nos negócios. Obrigou a si mesmo a retornar ao presente e olhou fixamente a Gina.
Lhe Incomodaria que ele tentasse fazer-se cargo da situação, ou o que lhe incomodava era a verdade, o fato de que ele estivesse mais qualificado para o trabalho? Para ser sincero, a Flint não importava. Ele era muito bom no que fazia, e tinha trabalhado muito duro para demonstrá-lo.
-Deixe de me olhar assim — disse Gina. 
-Assim como?
-Como se fosse superior.
-Os homens são superiores. —respondeu ele deliberadamente para picá-la.
-E por isso Adão mordeu a maçã? —perguntou Gina—. Porque era muito instruído?
-Que tipo de pergunta é essa?
-Uma pergunta retórica. - respondeu ela -. Todo mundo sabe que Adão mordeu a maçã por culpa de Eva.
E aquilo o que significava? Que Gina pensava que o cérebro dos homens estava localizado na entre perna? Ou, no caso de Adão, atrás da folha de parra?
Flint estudou sua interlocutora. Atrás dela brilhavam as luzes da cidade, tão brancas e brilhantes como o broche de diamantes que Gina levava no pescoço. Era uma peça excepcional, mas ele teria preferido a visão de seu pescoço nu. Tinha uma pele suave e apetecível, banhada pelo sol e torrada por suas raízes sicilianas.
Flint deslizou lentamente a vista para o nascimento de seus seios.
-Não me ofende que pense que tenho o cérebro nas calças. - disse levantando o olhar. 
-Pois deveria.
-E você deveria me oferecer uma maçã vermelha e brilhante. - assegurou Flint detendo um instante para lhe dar mais força a suas palavras -. Daria uma dentada grande e suculenta. 
Gina o olhou fixamente.
Flint lhe dedicou um sorriso sedutor. Estava se divertindo com aquele jogo. Entretinha-lhe discutir com ela, e certamente era melhor que ficar a chorar frente a sua jarra de cerveja.
-O pior que me poderia acontecer seria ter que trabalhar com você. -assegurou Gina.
Flint inclinou brandamente a cabeça, perguntando-se que aspecto teria ela com o cabelo solto, lhe emoldurando o rosto.
-Tenho entendido que não tem opção. 
-Se eu fosse você não estaria tão seguro - respondeu ela.
- a Verei na terça-feira. As duas em ponto. - recordou-lhe Flint antes de partir.
Não estava absolutamente preocupado. Cedo ou tarde, ela se renderia e lhe permitiria arrumar o desastre.
Embora Flint não fosse capaz de arrumar o seu próprio.
 
 
Gina se levantou sobressaltada à manhã seguinte. Sentou-se na cama e levou o travesseiro ao peito. Tinha sonhado com Flint Kingman.
Tinha sido um sonho erótico, a visão da névoa a meia-noite, de seu peito forte e musculoso brilhando sob a chuva.
Enquanto ela estava dormindo durante uma noite de tormenta, Flint tinha invadido seu dormitório, seu santuário privado.
Gina foi em busca da bata e se envolveu nela. Tudo lhe parecia diferente agora. O armário de cerejeira e a imensa cama de metal. O chão de madeira e os tapetes persas. Exalando um profundo suspiro, Gina deu a volta e abriu à persiana. Graças a Deus, tinha parado de chover. Não queria que voltasse a chover nunca mais. Não se isso significava a imagem semi desnuda de Flint com a cabeça inclinada para trás e a água deslizando-se por seu estômago plano até cair pela cintura de suas calças pretas justas.
Gina apertou a bata. Tinha sonhado com ele vestido com a roupa que vestia na noite anterior, só que estava no terraço do hotel, permitindo que ela o despisse.
Maldito fosse aquele sorriso seu tão sensual. E sua atitude prepotente.
Gina tinha dois dias antes de seu próximo encontro, dois dias para se armar de informação. Não sabia virtualmente nada de Flint, mas suspeitava que ele conhecesse muitas coisas dela.
Certamente Flint havia feito seus deveres semanas atrás, analisando a seu oponente, investigando os pontos fortes e os fracos, seus êxitos e seus fracassos.
Bom, ao menos seus sonhos eram só dela. E também sua ulcera. Duvidava muito que Flint tivesse tido acesso a seu histórico médico.
Gina cruzou o salão e se dirigiu à cozinha. Serviu-se um copo de leite, estirou a mão para alcançar o telefone e marcou o número do Morgan Chancellor com a esperança de encontrá-la em casa. Morgan não era realmente uma fofoqueira. Nunca lançava rumores ao acaso, mas parecia conhecer tudo sobre outros. E Gina tinha a intenção de falar de Flint com alguém que estivesse disposto a responder a suas perguntas.
Morgan respondeu ao quinto toque. Gina começou uma conversação amigável, perguntando à outra mulher se tinha se divertido na festa.
-Por certo. - disse depois de um momento -. Ao final, Flint Kingman me encontrou.
-De verdade? E o que te pareceu?
-Não estou muito segura. - disse Gina tratando de se separar da mente a imagem de seu corpo nu sob a chuva - Não o tenho muito controlado. O que você sabe dele, Morgan?
-Vejamos… Seu pai é um magnata da publicidade, e sua madrasta é absolutamente fascinante… É obvio, sua verdadeira mãe era igualmente impressionante. Era uma atriz de Hollywood. Morreu quando Flint era um bebê.
- Era famosa? - perguntou Gina, intrigada.
-Não, mas deveria havê-lo sido. Ao que parecia, tinha talento.
-Como se chamava? - perguntou Gina, tratando de imaginar-se à mulher que tinha dado a vida ao Flint.
-Danielle Wolf. Mas os jornais da época não falavam muito dela. Se de verdade sentir curiosidade por Flint, deveria ler coisas sobre Tara Shaw.
-A estrela de cinema? A bomba humana? A muito famosa loira conhecida em todo mundo? Por que, acaso era amiga de sua mãe?
-Não, para nada - respondeu Morgan enquanto mordiscava um biscoito-. Flint trabalhava para ela.
-E o que? Ele é assessor de relações públicas. É perfeitamente normal.
- Teve uma aventura com ele, Gina - disse Morgan deixando de mordiscar. 
- OH, Meu deus...
Flint e Tara Shaw, a deusa da tela dos anos setenta? Devia ter ao menos o dobro da idade dele.
-Alguns dizem que lhe rompeu o coração - continuou Morgan voltando a mastigar seu biscoito-.Outros, que ele rompeu com ela. E outros asseguram que ambos estavam só jogando, movendo os lençóis por pura e simples diversão.
Gina se removeu sobre seu assento, e esteve a ponto de derramar o leite. Agarrou com força o copo para evitar que lhe caísse.
-Quando ocorreu?
-Quando ele acabava de sair da universidade. Surpreende-me que não saiba.
-Não estou acostumado a prestar atenção a esse tipo de coisas. Não sigo as fofocas de Hollywood.
-Eu sim — respondeu Morgan— Sua aventura não durou muito, mas foi todo um escândalo.
-Maior que o que me salpicou agora?
-Muito mais.
Aquilo era mais que suficiente. Gina passou o resto da manhã navegando pela Internet em busca de velhos artigos que falassem da Tara Shaw e de seu jovem e selvagem amante.
 
 
Enquanto conduzia diante das fastuosas mansões do Beacon Hill, Flint sentiu a repentina necessidade de chamar a Tara, de lhe contar o que ocorria. Mas deu uma olhada em seu celular que descansava no painel, e deu-se conta de que não tinha seu número. Não tinha falado com Tara Shaw a mais de oito anos. Flint tinha deixado Hollywood sem olhar atrás. E, além disso, que diabos lhe diria? E o que pensaria seu atual marido se seu antigo amante de repente a chamasse?
Flint virou para a esquerda e tomou a rua familiar que o levou até a garagem de seus pais. Sabia que seu pai estaria em casa em um domingo pela tarde. Flint e ele se viam com bastante freqüência. Trabalhavam no mesmo edifício, mas naqueles dias apenas se falavam, ao menos não de assuntos importantes.
Abriu a porta com sua chave, a mesma chave que tinha desde que era um adolescente. Aquela mansão tão elegante tinha sido seu lar durante dezoito anos.
Flint se deteve um instante no vestíbulo de mármore, contemplando sua imagem no espelho da entrada. Aquela não era uma casa fria, carente por completo de emoção, mas tampouco desprendia uma sensação de calidez. Mas, como ia ser de outra maneira, especialmente naquelas circunstâncias?
Flint atravessou o salão, passando ao lado dos móveis de estilo Chippendale, as mesas ornamentais e as estátuas douradas. Os Kingman eram uma família de êxito, mas o dinheiro não faz às pessoas necessariamente felizes.
Encontrou a seu pai na salinha do jardim, uma estrutura de aço e cristal adornada com plantas e casulos em flor. James Kingman, um homem alto e sério de mandíbula forte e largos ombros, gostava de jardinagem, e cuidava de suas flores com delicadeza.
Aquele dia estava dedicando-se a uns formosos jasmins cultivados por ele mesmo. Flint tirou a jaqueta e o homem levantou o olhar.
-Homem, olá - disse ao advertir a presença de seu filho -. O que te traz por aqui?
«Você, minha mãe e eu. O passado. O presente. A dor» pensou Flint.
-Queria falar contigo - disse finalmente.
-Sobre o que?
-Sobre minha mãe.
-Não quero revolver tudo outra vez - respondeu James negando com a cabeça.
-Mas eu quero falar disso.
-Não há nada do que falar. Já lhe contei isso tudo. Esquece de uma vez.
Esquecê-lo? Duas semanas atrás, Flint tinha descoberto um segredo terrível, e agora a verdade o perseguia como um fantasma.
-Esteve mentindo todos estes anos, papai.
James se incorporou lentamente. Estava vestido com calças jeans e camisa também jeans, mas seu aspecto era impecável. Tratava-se de um homem rico e de bom gosto.
-O fiz para te proteger. Por que não quer aceitá-lo?
-Não é justo - assegurou seu filho.
-A vida não é justa - respondeu James lançando mão de um tópico que só serviu para fazer Flint se sentir pior.
Ambos guardaram então silêncio. Emanava água de uma das fontes ornamentais, imitando o som da chuva ao cair. Flint levantou o olhar para o teto de cristal e observou umas nuvens negras que cruzavam pelo céu azul.
-Será melhor que vá - assegurou pegando a jaqueta - Tenho coisas que fazer.
-Não te zangue, filho. - pediu-lhe James olhando-o nos olhos.
Flint observou a seu pai. Seu cabelo loiro começava já a converter-se em cinza prateado. Ele tinha herdado os olhos cor avelã de seu pai, mas seu cabelo escuro e sua pele de bronze eram de sua mãe. A mulher da qual não lhe era permitido falar.
Não era raiva o que estava corroendo a alma de Flint. Era dor.
-Não estou zangado. – assegurou - te Verei amanhã no escritório. Dê em Faith um beijo de minha parte. - acrescentou referindo-se a sua madrasta.
Gostava muito de Faith Kingman. Ela o tinha criado desde que tinha dez anos, mas tampouco estava disposta a falar daquilo, porque o considerava uma traição a seu marido.
Flint saiu da casa de seus pais e James voltou a concentrar-se em suas flores, escondendo-se detrás de suas brilhantes cores e suas pétalas de veludo.
 
 
Na terça-feira, Gina vestiu para ir ao escritório o que ela considerava uma roupa poderosa. A blusa fazia par com seus olhos, à jaqueta preta se ajustava à perfeição a sua cintura e a saia, muito estreita, ficava justa por cima do joelho. Mas seus sapatos eram sua arma secreta. Quando atravessou os amplos corredores dos escritórios da Baronessa, produziram um som de decisão e autoconfiança que lhe outorgavam um ar de feminina autoridade.
O quarto andar do edifício de aço e cristal era o domínio de Gina, e estava acostumada a olhar pela janela para tirar forças da visão da rua. E aquele dia necessitava toda energia que pudesse lhe dar.
Deu uma olhada ao relógio de parede. Flint estaria ali a qualquer momento. Gina se levantou de sua escrivaninha e permaneceu de pé, esperando com impaciência sua chegada. Levava ensaiando aquele momento há dois dias, praticando as palavras e os gestos.
Agora sabia muitas coisas sobre Flint Kingman. Inclusive tinha descoberto um par de coisas sobre sua mãe. Danielle Wolf, uma beleza meio indígena procedente da reserva cheyenne, tinha deixado seu lar para lavrar uma carreira como atriz. Cinco anos mais tarde, abandonou Hollywood para converter-se em esposa e mãe, e tinha morrido em um acidente de carro um mês depois do nascimento de seu filho.
Gina tinha tentado alugar os filmes de série B nas que Danielle tinha participado. Suspeitava que Flint tivesse herdado o espírito aventureiro de sua mãe. Não lhe faria nenhum dano analisar todos os aspectos da personalidade de seu oponente.
 Sua secretária chamou então pelo intercomunicador. .
-Sim? -disse Gina apertando o botão.
-O senhor Kingman está aqui.
- Diga-lhe para entrar. - disse soltando o ar que tinha retido.
Um minuto mais tarde, ele entrou pela porta vestido com um terno cinza e gravata prateada. Tinha o cabelo penteado para trás, afastado do rosto. De repente, Gina pôde ver o nativo americano que havia nele: a riqueza da cor de sua pele, as maçãs do rosto proeminentes, os olhos profundos. Àquele dia lhe pareciam mais escuros que dourados, e se deu conta então de que eram de uma impressionante cor avelã.
Flint compôs uma careta de prepotência, e ela abriu a gaveta da escrivaninha, tirou uma maçã, e a lançou.
Pegou-o despreparado, e ele deixou cair à maleta para pegar a fruta.
-A fruta proibida, senhorita Barone? - perguntou ele voltando a compor a mesma careta.
-Considere um presente de despedida.
-É que vou a algum lugar? - interessou-se Flint arqueando uma sobrancelha.
-A qualquer lugar menos aqui. — disse ela inclinando-se para frente - Já lhe disse que não penso em trabalhar com você.
Flint recolheu sua maleta e avançou uns passos. Tão seguro de si mesmo como sempre, sentou-se em uma das cadeiras e se dispôs a estudar a maçã.
-O que está fazendo? - perguntou ela.
-Procurando o verme.
-Não sou tão má - respondeu Gina, sorrindo muito a seu pesar.
Flint levantou a vista e ela deixou imediatamente de sorrir. Por que tinha que olhá-la daquela maneira tão provocadora, tão sensual? Gina quase podia sentir a pele molhada pela chuva que ele tinha em seu sonho.
-Todas as mulheres são más. E também formosas e inteligentes a sua maneira - disse Flint -, Eu gosto das fêmeas.
-Isso tenho escutado.— respondeu Gina dando a volta ao redor de sua escrivaninha antes de sentar-se em sua cadeira de couro.
Desejava parecer mais capitalista do que em realidade se sentia.
-Vai utilizar meu histórico amoroso contra mim? - perguntou-lhe ele.
-Não nos enganemos senhor Kingman: Você é um jogador. Conduz um Corvette vermelho a toda velocidade, sai com modelos e faz uma marca em sua cama depois de cada conquista.
-Não está mau, mas isso não é de todo certo - respondeu Flint olhando-a fixamente - Porque tenho uma cama de ferro, e não é fácil fazer marcas no metal.
Gina conteve os nervos. Ela também tinha uma cama de ferro. A que ele tinha invadido.
-Você teve uma aventura amorosa com uma estrela que lhe dobrava em idade.
Algo apareceu aos olhos do Flint. Dor? Raiva? Orgulho masculino? Gina não estava segura.
-Não vai defender-se? - perguntou ela, confundida por seu silêncio.
De repente, Flint Kingman, o assessor seguro de si mesmo, era impossível de decifrar.
 
 
Capítulo Dois
Gina esperou que Flint respondesse, mas ele se limitou a ficar ali sentado olhando-a fixamente.
-E bem? - perguntou ela finalmente, incapaz de seguir lhe mantendo o olhar.
Flint piscou por fim, e as íris de seus olhos se encheram de faíscas de cor âmbar.
-O que quer que lhe diga? Na época eu só tinha vinte e dois anos.
E isso o que significava? Que tinha se apaixonado de verdade, ou que era muito jovem e muito selvagem para controlar seus desejos sexuais?
-Como você vai limpar a reputação da Baronessa quando a sua própria não está o que se diz impoluta? - insistiu Gina, negando-se a deixar escapar o tema.
-Estou mais que qualificado para tirar a Baronessa desta confusão - assegurou Flint estirando os ombros.
-E eu também — respondeu ela, embora fosse consciente de que em parte tinha sido culpa dela.
- Seriamente?
Flint colocou a maleta sobre o regaço e a abriu. Com um rápido movimento de mão colocou um maço de periódicos sensacionalistas sobre a mesa de Gina.
As manchetes lhe atravessaram o peito como um soco.
 Uma maldição misteriosa destrói o império do sorvete.
A máfia atua em Boston. Conseguirão sobreviver os Barone, de origem siciliana?
Fruta da paixão contra paixão mortal. Quem tentou assassinar a um homem inocente?
-Já os li. - defendeu-se Gina-. E não são mais que mentiras. Essa maldição é uma tolice, minha família não tem nenhuma relação com a máfia, e o homem que sofreu uma reação alérgica à pimenta se recuperou sem nenhuma seqüela.
-Talvez, mas não basta negar os fatos. Que plano você tem para defender-se da má imprensa, senhorita Barone? Esse é um trabalho muito árduo.
Gina afastou os jornais e sua úlcera pareceu cobrar vida, produzindo uma dor intensa que lhe era familiar.
-Pensei em organizar um concurso. – respondeu - Algo que atraia o interesse do público.
-Um concurso de que tipo? Para escolher o nome da maldição?
- Trataria de criar um novo sabor de sorvete - disse Gina olhando-o com os olhos entreabertos - Baronessa convidará ao público a criar um sabor que substitua à Fruta da Paixão. O ganhador do concurso e o novo sabor atrairão a atenção da imprensa.
Flint permaneceu sentado em silêncio, valorando sua idéia.
-É uma estupenda ferramenta de marketing - disse finalmente-, mas é muito cedo para organizar um concurso. Primeiro necessitamos algo mais suculento. Um grande escândalo, algo que faça à imprensa esquecer o desastre da pimenta.
-E suponho que você já pensou no escândalo perfeito.
-Para ser sincero, ainda não - confessou Flint passando a mão por uma mecha rebelde-. Mas quando o encontrar, você será primeira em saber.
-Eu não gosto da idéia - disse-lhe Gina – O Que faremos será substituir uma fileira de mentiras por outra mentira. Não me parece bem.
-Pois sinto muito. É a única maneira. Acredite em mim, já me vi nesta situação outras vezes. - Assegurou ele agarrando um dos jornais -. E me diga o que é esse assunto da maldição?
-Não se supõe que já deveria estar sabendo? - inquiriu Gina, levando a mão ao estômago para tratar de acalmar a dor.
-Quero escutá-lo de sua boca, conhecer seu ponto de vista.
-Já lhe disse que é uma tolice - respondeu ela levantando do assento e dirigindo-se para o móvel bar-. Quer beber algo?
Flint negou com a cabeça, e Gina se serviu de um copo de leite.
-É bom para o corpo — comentou ela ao observar que Flint olhava o leite com curiosidade.
-Isso parece. —respondeu ele deslizando o olhar por suas curvas com masculina aprovação.
«Não me olhe assim», pensou Gina para si mesma. «Não paquere comigo. Não me olhe com esses olhos de cama».
Mas Flint o fez. Olhou-a. Muito de perto. Do mesmo modo em que havia feito em seu sonho, uns segundos antes de despi-la. Nenhum dos dois falou. Ficaram olhando-se fixamente um ao outro, apanhados em um desses estranhos e sensuais momentos.
Flint desviou por fim o olhar e ela levou o copo de leite aos lábios, permitindo que o líquido branco deslizasse brandamente por sua garganta.
-A maldição — recordou-lhe Flint com voz um tanto rouca.
Gina tomou assento e tratou de recuperar sua habitual compostura. Não pôde evitar pensar que aquela atração impossível sim que era uma maldição.
-Tudo começou com meu avô - começou a dizer - Deixou uma garota que queria se casar com ele, e em seu lugar fugiu para se casar em segredo com minha avó no dia de São Valentim. Então, a outra garota lançou uma maldição contra eles e seus descendentes. Jurou que a desgraça cairia sobre eles o dia de seu aniversário, convertendo São Valentim em uma data terrível.
-Então, por que você escolheu *quatorze de fevereiro para apresentar a fruta da paixão? — perguntou Flint — Me parece um pouco arriscado.
-Porque estava decidida a demonstrar que a maldição não existia. Além disso, um sabor chamado «fruta da paixão» era uma boa promoção para o dia de São Valentim - assegurou Gina antes de dar outro sorvo em seu leite - Ou assim deveria ter sido.
-Mentiu senhorita Barone — disse Flint guardando os periódicos em sua maleta - Você não pensa que a maldição seja uma tolice. Agora acredita nela.
-Não sou uma mulher supersticiosa, mas devia ter sido mais precavida. -defendeu-se Gina tratando de dissimular seu sentimento de culpabilidade — Ao longo dos anos ocorreram feitos desafortunados em minha família o dia de São Valentim, mas sempre me pareceram coincidências.
-Não se preocupe por isso - assegurou Flint -. Eu repararei o dano.
-Não, eu o farei - respondeu Gina.
Ele se encolheu de ombros e lhe dedicou um desses sorrisos lento e sensuais, que a fez recordar que tinha sonhado com ele.
Quando Flint se levantou para partir, Gina escutou um imprevisto golpe de chuva açoitando as janelas que tinha a suas costas.
Uma chuva fresca, dura e masculina.
*Dia de São Valentim, ou dia em que é comemorado o dia dos namorados.
Assim que Flint se partiu, Gina foi direto ao escritório de seu irmão. Nicholas ostentava o prestigioso cargo de diretor geral da Sorvetes Baronessa.
-Quero que despeça Flint Kingman. – Lhe falou de supetão.
Nicholas, que estava sentado atrás de seu escritório, estirou seus largos ombros e a olhou como o poderoso homem de negócios que era.
-Por quê?
«Porque sonhei com ele», desejava lhe dizer. «Porque invadiu minha cama e minha cabeça».
-Porque vai causar a esta empresa mais dano do que benefício.
-Como seria isso?
-Está pensando em inventar um grande escândalo para despistar a imprensa.
-É a isso a que se dedica Gina. É assessor, e, além disso, dos melhores. Ele confia em seus instintos.
-E o que passa com meus instintos?
-Você é uma mulher inteligente e muito capaz, mas ele é um perito nesta matéria.
Gina se sentou frente a seu irmão e agarrou uma borracha de seu escritório, desejando poder lançar-lhe. Ele era oito anos mais velho, e sempre a tinha tratado como a uma menina. Estava acostumado a chamá-la «cabelo de espaguete» porque lhe escapavamos cachos do coque como espirais de massa.
Gina olhou a Nicholas e passou a mão pelo cabelo. Agora, ela alisava o cabelo em um salão de renome.
-Ou seja, você está do lado de Flint.
-De seu lado? - perguntou Nicholas inclinando-se para diante para olhá-la melhor — Não estará convertendo isto em uma guerra de sexos, verdade?
Gina pensou na maçã, a fruta proibida que tinha jogado em Flint aquela tarde.
-Está todo o tempo mandando em mim.
-Certamente porque lhe questiona cada passo que dá. Tem que domar seu caráter, Gina.
Ela apertou a borracha entre os dedos, e desejou ter a coragem suficiente para lançá-la.
-Contratamos Flint como consultor - continuou Nicholas - A idéia é que ambos trabalhem juntos. 
-Estupendo.
Gina tinha claro que aquilo não ia a nenhuma parte. Ficou em pé e exalou um suspiro de frustração. A chuva seguia golpeando os vidros, lembrando-lhe que Flint também era capaz de controlar o clima.
Conseguiria alguma vez arrancar da cabeça a imagem daquele corpo forte e úmido?
-E não vá com este conto a papai. - advertiu-lhe Nicholas.
-Não pensava fazê-lo. - respondeu ela, tratando de parecer mais adulta do que se sentia-. Se tiver que trabalhar com o Flint, farei-o, mas não deixarei que leve todo o mérito. Que saiba.
- Falou como uma mulher inteligente. - assegurou seu irmão com uma careta -. Te Adoro, cabelo de espaguete.
Gina se deteve na porta e sorriu. Ela também amava Nicholas Barone, embora seu irmão mais velho fosse um sabichão.
Horas mais tarde, Gina conduzia a caminho de sua casa com os pára-brisa do carro dançando ao ritmo da chuva. Vivia em uma casa de pedra reformada em North End. Era uma construção que pertencia a sua família, e a compartilhava com duas de suas irmãs. Cada uma tinha seu próprio apartamento, mas se reuniam com freqüência no salão comum do primeiro piso para sentar-se com uma terrina de pipocas e conversar.
Gina estacionou o carro e se dirigiu à porta principal da casa. No alpendre a esperava Flint, com o casaco flutuando ao vento. Ela se deteve nada mais vê-lo e o observou fixamente. Flint levantou a vista com o rosto umedecido pela chuva e o cabelo empapado e brilhante.
-Não funcionou, verdade?
-Como diz?
-Seu irmão não vai me despedir, não é certo?
Gina caminhou para frente para proteger-se da tormenta. Como saberia que foi se queixar com Nicholas? Acaso era tão previsível?
-Quero que jante comigo esta noite - disse Flint incorporando-se, atacando-a com aquele sorriso.
-Como? - perguntou Gina com o coração pulsando a toda velocidade na garganta - Por quê?
-Para que nos acostumemos um ao outro. Temos muito trabalho pela frente. E não tem sentido perder o tempo.
-Mas está chovendo... - objetou ela envolvendo-se no casaco.
-E quando chove você não janta? - perguntou Flint lhe dedicando um olhar curioso.
É obvio que sim. Simplesmente, não lhe entusiasmava a idéia de passar mais tempo em sua companhia, especialmente com toda aquela água caindo do céu. Entretanto, talvez um jantar de trabalho lhe serviria de revulsivo. Possivelmente a ajudasse a esquecer-se da outra imagem.
-De acordo. Jantarei com você.
-Reúna-se comigo no «Beef and Bull» por volta das sete - disse Flint - É um restaurante que fica em...
-Já sei onde fica. - interrompeu-o Gina — Estarei ali às oito.
-Sete e meia - desafiou-a Flint.
-Oito - repetiu Gina com firmeza.
Necessitava tempo para banhar-se, se trocar e arrumar o cabelo, empapado pela chuva.
-De acordo - cedeu ele com gesto de chateio -. Mas não chegue tarde.
Gina procurou suas chaves e lhe dedicou um sorriso triunfante. Por fim vencia uma batalha. Talvez numa escala pequena, mas ao menos era um começo.
 
As oito em ponto, Flint chegou ao restaurante, um lugar tranqüilo e tenuemente iluminado que estava decorado com adornos feitos em madeira e antiguidades do oeste.
-Estou esperando a uma pessoa - disse depois de dar seu nome à garota encarregada de receber aos clientes - Já chegou?
-Não, senhor Kingman - respondeu a jovem negando com a cabeça.
- me Sentarei aí para esperá-la - disse Flint assinalando com a mão uma esquina escura da salinha de espera.
Tomou assento em uma das poltronas de couro e estirou as pernas antes de olhar com impaciência seu relógio de pulso, uma peça lavrada em ouro e diamantes que lhe recordava quem era e de onde vinha. Flint se perguntou por que não era capaz de aceitar as coisas como eram, e a maneira em que o tinham criado.
Mas é que sua vida de sonho tinha mudado. Flint Kingman já não era o mesmo homem. A verdade sobre sua mãe lhe tinha alterado a alma, o coração, o núcleo mesmo de sua existência.
Gina entrou no restaurante e ele tratou de apaziguar suas emoções. Por muito preocupado que estivesse não podia permitir que aquilo afetasse a sua carreira. Os Barone o tinham contratado para que solucionasse a crise de sua empresa, e isso era o que tinha que fazer acontecesse o que acontecesse.
Flint permaneceu sentado e observou a Gina durante um instante. Quando saiu do escritório dela aquela tarde, lhe tinha ocorrido um plano. Um plano magnífico, mas que implicava se aproximar mais a Gina. Não o suficiente para introduzi-la na confusa desordem de sua vida, mas sim o bastante para enganar as pessoas.
E com aquela idéia em mente, tinha-a convidado para jantar. Precisava vê-la em um cenário romântico, explorar a energia que havia entre eles.
Uma energia sexual pensou Flint. Um calor inesperado.
Gina Barone não podia suportar sua personalidade dominante, e ele detestava sua atitude prepotente, mas aquilo não importava. Aquilo era uma simples questão de negócios, uma atração animal que poderiam utilizar a seu favor.
Além disso, Flint já tinha fantasiado com ela. Aquela mesma tarde, quando estava tomando uma ducha relaxante, Gina se tinha coado através do vapor de água.
Ele não pretendia pensar nela, e muito menos sem roupa, mas tinha perdido a batalha. A imagem de Gina coberta de espuma penetrou em sua cabeça, e ele tinha sido incapaz de afastá-la dali, por muito consciente que fora de que já era grandinho para aquelas fantasia. Agasalhado por um halo de água quente, Flint fechou os olhos e imaginou...
Gina deu a volta e o viu. Ele tragou saliva. Quanto mediria ela? Um metro setenta, um metro setenta e cinco? Aos olhos de sua mente, Gina se ajustava perfeitamente a ele na ducha, com aquele corpo úmido, tão doce e tão esbelto.
Ela se aproximou mais, e Flint ficou em pé, com seu metro oitenta e três de altura coberto com uma gabardina. Debaixo levava um traje de desenho, mas se não conseguia controlar seus hormônios, luziria uma enorme excitação onde não devia.
-Chegou tarde - espetou-lhe quando estiveram perto um do outro…
-E você continua tão mal educado como de costume — respondeu ela.
Flint não pôde evitar sorrir. Tinham uma química da mais estranha, mas, de algum jeito, funcionava.
Estava claro que aquela atitude de princesa de gelo não deslumbraria a imprensa, nem tampouco seduziria ao público. O que significava que ele teria que remodelar um pouco sua imagem.
Gina tirou o casaco e Flint escorregou a vista por toda a magnitude luxuriosa de seu corpo. Claro que o faria. Podia convertê-la em uma garota rebelde que, entretanto resultasse simpática.
-O que está fazendo? - perguntou-lhe Gina.
-Só olhava - respondeu ele olhando-a nos olhos com um sorriso.
Gina vestia um vestido não muito curto de cor bege que fazia jogo com a pele. Flint elevou a mão para lhe soltar um de seus cachos, mas ela deu um passo atrás, negando-se a que ele a tocasse.
-Mantenha as mãos quietas, Kingman.
-É que a chuva lhe bagunçou o cabelo - mentiu ele - Só tratava de arrumar-lhe.
Gina deixou escapar uma espécie de suspiro e Flint soube que a tinha posto nervosa. Nervosa no melhor sentido. No sentido sexual.
-Meu cabelo está perfeito. - disse ela.
Mas Flint não estava de acordo. Aquele estilo de senhora arrumada era muito estirado, muito formal.-Você vai me convidar para jantar ou não? - perguntou ela.
-É obvio. Vamos a nossa mesa.
Um garçom os guiou para uma mesinha para dois afastada, em que luzia uma vela branca com cera derretida na base e um único casulo de rosa colocado em um copo. Ambos os detalhes lhe conferiam à mesa rústica um toque romântico.
Estudaram suas cartas em silêncio. Cinco minutos mais tarde, quando o garçom retornou com as bebidas que tinham pedido, Gina e Flint pediram o mesmo, com a diferença de que ele pediu a carne mal passada e ela muito passada.
Quando levaram um cestinho com pão quente, ele fez a ameaça de levantá-la para lhe oferecer um pãozinho ao mesmo tempo em que Gina colocava a mão para servir-se ela mesma. Mas antes que suas mãos se roçassem, ela retirou a sua.
-Adiante, senhorita Barone. - disse Flint oscilando a cesta frente a ela -. Ou Posso te chamar Gina?
Ela escolheu um bolinho e logo procedeu a lubrificá-lo de manteiga.
-Está bem, me chame Gina.
-Você pode me chamar Flint. - apontou ele enquanto a observava dar uma dentada em seu pão.
Ela o mastigou e logo emitiu um leve som de prazer, parecido a um tênue gemido sensual.
-Diga - ordenou Flint, divertido, enquanto estirava o braço para alcançar sua cerveja.
-O que diz? -perguntou ela elevando a vista.
-Meu nome. Diga meu nome.
-Flint - respondeu Gina olhando-o com curiosidade.
-Não esteve mau, mas é melhorável. - disse ele contendo uma careta-. Tem que gemer depois de dizer meu nome, como fez depois comer a parte de pão.
Gina ao fim deu-se conta da brincadeira, e lhe tendeu o cestinho de pão.
-Vai pro inferno, Flint.
-Não pude evitá-lo - confessou ele dando rédea solta ao sorriso que estava contendo — Quero dizer... Aqui há uma mulher que tem um orgasmo com um pão com manteiga.
-Não tive nenhum orgasmo.
-Claro que sim.
-Claro que não.
Ela o olhou por cima da mesa, mas sua expressão de aborrecimento ficou de repente curta. Flint a estava olhando fixamente, e Gina se ruborizou e começou a brincar com o guardanapo que tinha no regaço.
-Não o faça - disse ela.
-Fazer o que?
-Não me olhe assim.
Flint observou suas feições, fascinado por aqueles olhos violetas e aquela boca suculenta.
-É que é muito bonita Gina.
Ele não era capaz de deter a atração, o calor, a espontânea sexualidade que lhe ardia no sangue.
Gina soltou o ar que tinha retido e se fez o silêncio.
A chuva golpeava contra o edifício, e a luz da vela dançava entre eles, remarcando a intensidade do momento.
Flint lhe dedicou um leve sorriso sensual. Gina era perfeita para o escândalo que tinha em mente.
 
 
Capítulo Três
 
 
Dois dias mais tarde, Gina entrou pela porta do impressionante edifício que albergava a empresa Kingman Marketing, uma agência global de publicidade, relações públicas e marketing.
Flint a tinha chamado pela manhã, solicitando uma reunião. Gina tinha tentado convencê-lo para que acudisse ele a seu escritório, mas tinha se negado. Por alguma inexplicável razão, queria que ela se aproximasse de seus domínios.
Gina suspeitava que ele tivesse idealizado o escândalo e pretendia lhe fazer algum tipo de apresentação do mesmo.
Apertou o botão do elevador principal e, uma vez dentro, pulsou a tecla correspondente e deixou escapar um suspiro nervoso. Não se sentia cômoda voltando a ver Flint, especialmente depois daquele jantar «de trabalho» tão estranho.
Aconteceram meia noite olhando-se fixamente o um ao outro como dois adolescentes ávidos de sexo em seu primeiro encontro. Gina tinha odiado cada minuto daquele sentimento de entusiasmo, e tinha tratado de lutar contra ele durante todo o jantar. Mas a comida se fundia em sua boca como um não desejado afrodisíaco, e Flint não tinha deixado de lhe sorrir nem de brincar com ela com aquela maneira sua tão particular, o que tinha servido unicamente para pô-la mais nervosa.
O elevador se deteve no sexto piso, e Gina desceu, tratando de contê-la ansiedade. Esticou a jaqueta e disse a si mesma que tinha que relaxar. Não pensava permitir que Flint a olhasse do mesmo modo que o tinha feito no restaurante. Aquele dia vestiu-se com um traje de jaqueta marrom, pulôver de gola para fora e botas clássicas. Sem contar com a cara e as mãos, levava todo o corpo coberto. Era impossível que aquele traje o excitasse.
Disposta a liderar batalha, Gina entrou no escritório, e ficou parada observando a imensa área de recepção. Havia antiguidades de todos os cantos do mundo, mescladas com obras de arte modernas. Ela soube imediatamente que Flint tinha trabalhado braço a braço com o decorador.
-Você é Gina Barone? - perguntou-lhe uma jovem elegante aproximando-se com a mão estendida - Sou Kerry Landau, a assistente de Flint.
-Encantada de conhecê-la.
Quando Gina deu a volta para saudar a jovem viu Flint. Tinha aparecido do nada, e estava apoiado no marco da porta de seu escritório com a cabeça levemente inclinada.
-Está aqui a senhorita Barone. - anunciou Kerry.
-Já a vejo.
Flint deslizou o olhar sobre o corpo cuidadosamente coberto da Gina, e ela se sentiu de repente tão nua como uma estátua. E igualmente vulnerável.
-Está preparada? - perguntou ele.
Para entrar na cova privada do lobo? Não, não estava absolutamente preparada.
-É obvio.
-Bem.
Flint a acompanhou por um pequeno corredor bem iluminado até seu escritório. Ofereceu-lhe assento em uma zona elegante e confortável. Não tinha controlado recursos para decorar seus domínios, e Gina suspeitou que sua família fosse tão rica como a sua própria. Mas ali acabavam suas similitudes.
Flint era filho único. O príncipe, o herdeiro do trono Kingman. Por sua parte, Gina lutava contra sua posição de filha média, aquela a que os pais quase não viam aquela que tinha de trabalhar o dobro para que se fixassem nela.
-Bom - disse Gina removendo o chá que Flint acabava de lhe servir em uma xícara de prata - Qual é o motivo desta reunião? Idealizou algum escândalo?
-Sim.
-E? - perguntou ela depois de dar um sorvo delicado.
-Acredito que você e eu deveríamos ter uma aventura.
Gina esteve a ponto de derramar o chá, e Flint soltou uma gargalhada.
-Não uma aventura de verdade. - esclareceu.
-ver se o entendi - disse ela colocando a xícara sobre a mesa enquanto tentava aparentar tranqüilidade - Está sugerindo que finjamos um romance?
-Isso. Um romance apaixonado e uma ruptura soada.
-Não pode estar falando a sério. - disse ela soltando o ar com força.
- Claro que sim. Sua família já foi palco da imprensa sensacionalista, assim você atrairá muita atenção. E eu também, tendo em conta que já estive no olho do furacão.
Assim era, tinha sido o foco de todos os olhares por sua relação com uma estrela de cinema.
- Acredite em mim. Funcionará. Imagine as manchetes: «O príncipe das relações públicas derrete a princesa do sorvete». Será um êxito.
-Mas se nem sequer nos damos bem... - objetou ela sacudindo a cabeça.
-E o que? Isto é uma montagem. Três semanas de encontros românticos, logo uma ruptura pública e sairei de sua vida - disse Flint enquanto tirava o terno e afrouxava a gravata - Quando saltarmos à imprensa, já ninguém se lembrará da pimenta no sorvete nem das maldições de família. Vamos, não tem nada que perder - assegurou ele olhando-a diretamente aos olhos.
«Só a cabeça», pensou ela.
-Entre nós há muita química, Gina.
Flint se aproximou da poltrona em que ela estava sentada e a puxou pela mão. Quando seus dedos se roçaram, Gina sentiu uma descarga elétrica que lhe percorreu o braço.
-Não pode negá-lo. Sei que a sente.
Flint levou sua mão à boca e lhe roçou os nódulos com os lábios. Logo, brincando, deu-lhe uma breve dentada.
Gina notou como lhe esquentava o sangue da cabeça até os pés. Sentiu um golpe de calor entre as pernas, e os mamilos se puseram duros. Mas quando lhe dedicou um de seus sorrisos lentos e sensuais, ela retirou a mão.
É obvio, Flint tinha razão. Aquela montagempodia funcionar. A imprensa sensacionalista se alimentaria daquela tensão sexual que ele pretendia criar. As revistas se dedicariam a escavar em sua aventura em lugar de jogar lixo sobre a Baronessa.
-Então, o que me diz? - perguntou Flint.
«Sim. Não. Talvez», pensou Gina. A cabeça lhe dava voltas e tinha o coração acelerado.
-Não sei. Eu...
-Ouça, se o que se preocupa é sua imagem, relaxe. Já pensei nisso.
-Do que está falando? - perguntou ela piscando.
-Desse seu modo de ser tão sério. - respondeu Flint aproximando-se até o móvel bar - Sabe tão bem como eu que não serve Gina. Te Faz parecer antipática.
-Seriamente? - perguntou ela olhando-o irritada. 
-Sim — assegurou ele abrindo uma lata de soda e dando um grande gole - Mas já enfrentei a casos parecidos com antecedência. Sou o tipo adequado para te proporcionar uma imagem que cativará os meios de comunicação, seduzirá ao público e fará que os homens caiam rendidos a seus pés.
-Não necessito que organize minha vida pessoal. - replicou Gina ofendida, levantando o queixo.
-Não é isso. - assegurou Flint colocando a lata sobre a mesa — Tem muita sensualidade, mas não sabe como utilizá-la.
-E acredita que uma relação falsa contigo me converterá em uma mulher fatal?
-Pode estar segura disso. - respondeu ele com seu característico sorriso.
-Vai-te ao diabo, Flint.
-Vamos, não ponha assim. Isto é só trabalho.
Naquele momento, a Gina não importava. Negando-se a escutar uma palavra mais de seu discurso de assessor, ficou em pé e se dirigiu para a porta, deixando Flint amaldiçoando a suas costas.
 
 
O salão comunitário da casa de pedra era cômodo e ao mesmo tempo elegante. Estava decorado com plantas de grandes folhas, móveis de cor marrom e um bom número de almofadas azuis claras. Mas a atmosfera familiar não serviu para melhorar o humor da Gina.
Oito horas depois de sua reunião com o Flint, estava sentada no grande sofá do salão, desafogando sua frustração com suas irmãs menores.
Rita, que trabalhava de enfermeira no Hospital Geral de Boston e estava a ponto de fazer vinte e cinco anos, escutava-a com simpatia.
Por outro lado, Maria, de vinte e três anos, parecia preocupada. Estava sentada ao lado da janela, contemplando o pôr-do-sol. Gina admirava a mão que tinha sua irmã para os negócios, e aquela noite necessitava toda sua atenção.
-É que não te importa o que está ocorrendo? - perguntou Gina, incapaz de conter sua irritação.
Maria deu a volta imediatamente e a olhou fixamente com a feições de seu rosto infantil um tanto decomposta. Apesar de seu tamanho pequeno, exsudava força.
-Isso não é justo. Você sabe quão importante era para mim a promoção do dia de São Valentim. Estou tão preocupada como você pela empresa que fundaram nossos avôs.
É obvio que era assim. Gina se sentiu culpada imediatamente. Maria levava a sorveteria Baronessa, um local retrô situado em Hanover Street no que se respirava o encanto e a emoção de tempos passados.
Mas Gina não podia evitar perguntar se não estaria ocorrendo algo mais na vida da Maria. Ultimamente, sua irmã tinha estado partindo quase às escondidas, como se fosse encontrar-se com alguém em segredo.
Gina sacudiu a cabeça com incredulidade. Todo aquele assunto da montagem que lhe tinha proposto Flint a estava froxando louca, chegando inclusive a imaginar um amante secreto para a Maria.
-Sinto-me como se estivesse apanhada entre uma rocha e uma parede de pedra - disse Gina, represando a conversação para seu rival -. A reputação da Baronessa vai por água abaixo e eu acabo de brigar abertamente com o assessor que se supõe que tem que nos tirar desta confusão.
-Sinto muito, Gina. - interveio Maria afastando-se da janela - Sei que isto não é fácil para ti.
Rita, que estava sentada em uma das poltronas, dobrou as pernas. Seguia com o uniforme posto, embora tinha tirado os tamancos brancos de enfermeira.
-Tem que haver uma solução.
-Sim, mas, qual? -perguntou Gina passando-a mão por sua cabeleira frisada com impaciência — Estou disposta a fazer o que for para restaurar a reputação da Baronessa, mas não posso suportar a idéia de me render ante esse macho arrogante. Não acredita que seja capaz de seduzir à imprensa por mim mesma. Pensa que necessito que ele me treine.
-Então, lhe demonstre que está equivocado - sugeriu Maria - Demonstre que pode dirigir à imprensa. 
-É uma idéia estupenda. - assegurou Rita imediatamente - depois de tudo, Gina, você tem seu próprio encanto. Sua imagem não tem nada de mau.
-Assim é - continuou Maria lhe dirigindo um cálido sorriso - É uma mulher bonita, triunfante e poderosa. O que pode te ensinar nenhum assessor que você já não saiba?
-Nada. - respondeu Gina, sentindo como crescia sua confiança em si mesma.
Mas ela sim podia ensinar muitas coisas a Flint Kingman.
 
 
 Depois de dez exaustivas horas de escritório, Flint abriu a porta de sua casa e ao entrar jogou as chaves enquanto soltava um palavrão. O dia tinha ido de mal a pior, e toda a culpa era da Gina.
Como era possível que o tivesse rechaçado? Seu plano era perfeito, mas ela era muito orgulhosa para admiti-lo, para agradecer-lhe como se merecia. Não só estava se oferecendo a reparar o dano da Baronessa, mas também a criar a ela uma imagem mais glamurosa.
Que mulher em seu são julgamento recusaria algo assim? Acaso não sabia com quem estava tratando? Flint era um perito. Inclusive sua própria casa era uma obra de arte. Deu uma olhada a seu redor, orgulhoso das reformas que tinha feito em seu lar: O frio mármore do vestíbulo tinha sido substituído por um chão de madeira, e através de um arco se acessava a uma zona em que era exibida uma coleção de antiguidades cuidadosamente escolhidas,
Flint sentiu a imperiosa necessidade de tomar uma ducha quente e tomar uma cerveja fria, assim que se dirigiu à cozinha de design, agarrou uma garrafinha e começou a tirar a roupa.
Quando subiu as escadas para o dormitório principal já tinha deixado uma trilha de roupa atirada pelo caminho.
Situado ao lado da cama, vestido unicamente com um par de cuecas boxer, abriu a cerveja e lhe deu um sorvo. Então soou o maldito telefone.
-Diga - respondeu com brutalidade, ainda irritado pela reação de Gina.
-Sou eu. - respondeu ao outro lado uma voz feminina.
-Quem é «eu»? - perguntou Flint, embora sabia de quem se tratava da mesma princesa de gelo.
-Sou Gina. Mudei de opinião.
-Significa isso que fará a montagem comigo?
-Sim. - respondeu ela com firmeza - Mas não permitirei que mude minha imagem.
Flint guardou silêncio durante uns segundos. Ela seguiria seus conselhos tanto se gostasse como se não. Mas não ia discutir esse ponto naquele instante. No momento, a deixaria acreditar que tinha ganho.
-Muito bem, mas não poderá dar para trás se as coisas ficarem feias. Assim mais vale que esteja completamente segura de que quer te comprometer com este projeto.
-Eu tento lutar contra o problema da Baronessa. - respondeu Gina - Embora isso signifique ter que fingir uma relação contigo.
-Muito bem. Vou para lá, então.
-Para que? - perguntou ela.
-Para ultimar os detalhes. Estarei ali dentro de aproximadamente uma hora.
Flint pendurou o telefone antes que Gina pudesse protestar. Logo tirou as cuecas e se meteu na ducha com a esperança de que ela não invadisse sua mente. O único que lhe faltava seria voltar a fantasiar com Gina Barone.
Por que se sentia tão atraído por ela? Era todo sério e excessivamente profissional que podia ser uma mulher. Em seu interior não havia nem uma grama de calor.
E naquela época, Flint necessitava alguém carinhosa. Queria uma mulher que fosse capaz de fazer algo por ele, inclusive deixar uma brilhante carreira profissional.
Sabia que aquele era um pensamento muito egoísta, mas nada lhe importava. As notícias sobre sua mãe tinham mudado seu modo de ver as coisas, e não podia evitar suspirar pelo que lhe tinha sido negado.
Depois detomar uma boa ducha, Flint vestiu umas calças pretas e um pulôver cinza e se dispôs a ir ver a Gina.
Tal como havia dito, apresentou-se a sua porta no prazo previsto e pulsou a tecla do apartamento do quarto andar. Quando lhe foi aberto, Flint entrou e a esperou no vestíbulo. A casa de pedra tinha uma escada de madeira polida, um elevador moderno decorado com uma porta antiga e uma área de recepção decorada como um salão.
De repente, Flint sentiu como uma espécie de energia feminina girando a seu redor como um fantasma perfumado. Colocou as mãos nos bolsos e se dispôs a contemplar a escada.
Gina descendia por ela como uma sereia surta do mar Adriático. Levava o cabelo solto flutuando sobre os ombros.
De repente, um súbito desejo sexual percorreu as veias do Flint.
Ela descendeu até o saguão e ambos ficaram olhando-se fixamente o um ao outro.
-Eu gosto de como leva o cabelo — disse ele como se tal coisa, afundando mais as mãos nos bolsos, ali onde seu corpo se havia posto duro.
-Obrigada. — respondeu Gina com sua frieza habitual - Mas eu gosto mais preso.
«Que bruxa», pensou Flint. «Nem sequer é capaz de aceitar graciosamente um elogio.».
-Quero que o leve solto quando estiver comigo - ordenou ele sem poder evitar imaginar o que se sentiria ao afundar as mãos naquela espessa juba.
-Não comece Flint. - disse Gina elevando o queixo.
-Que não comece com o que? - perguntou ele lhe dedicando um de seus sorrisos, sabendo que aquilo a incomodaria ainda mais.
-A me dizer o que tenho que fazer.
Ele se encolheu de ombros, e Gina lhe assinalou a área de recepção.
-Sente-se. te Trarei algo de beber.
-Obrigado, mas prefiro tomá-lo em seu apartamento.
-Não te convidei a subir. - respondeu ela olhando-o friamente.
-Mas vai fazê-lo. - assegurou Flint aproximando-se mais-. Dentro de uns dias você e eu vamos começar a sair, e isso me dá o direito de conhecer sua casa.
-Bem, mas lembre-se de que dentro de umas semanas o mandarei ao inferno. - respondeu Gina dando um passo atrás.
-Efetivamente, assim será. E estou seguro de que desfrutará de cada minuto ao fazê-lo. - disse Flint enquanto começava a subir as escadas sem ela - Mas por agora está unida a mim.
Gina exalou um profundo suspiro e o seguiu até alcançá-lo. Ambos chegaram a seu apartamento ao mesmo tempo, e ela abriu a porta.
-Muito bonito. - comentou Flint.
E o era. Os chãos de madeira serviam de suporte a móveis de diversas procedência, mas igualmente elegantes. Flint se deu conta de que os sofás estavam forrados em seda italiana. A dama tinha bom gosto.
- O que quer beber?
-Café. - respondeu ele indo para a cozinha.
Flint farejou um pouco por ali enquanto ela o preparava.
-Pode-se saber muito de uma pessoa vendo sua geladeira — disse abrindo a da Gina e dando uma olhada.
Estava claro que gostava de cozinhar. Havia vasilhas com sobras de comida e verduras frescas.
-Quero ver seu dormitório. — disse Flint enquanto agarrava a xícara de café que lhe ofereceu.
-Nem pensar, Kingman. Meu quarto está fora do limite.
-Para mim não. Estou a ponto de me converter em seu amante.
-Meu falso amante. - corrigiu Gina.
Flint ignorou o que ela havia dito e começou a caminhar para o corredor, por onde supunha que estaria sua habitação. Ela foi detrás dele, resmungando algo sobre suas maneiras, ou, mas bem sobre sua falta delas.
Flint abriu a porta e ficou mudo.
-O que ocorre? - perguntou Gina a suas costas.
-Este é meu quarto. - respondeu ele.
Sentia como se Gina tivesse invadido seu santuário. Sua alma.
-Do que está falando?
Flint deu a volta para observar a aquela mulher a que logo que conhecia.
-Tenho um armário de cerejeira que certamente foi construído pelo mesmo carpinteiro. E minha cama é quase idêntica. Inclusive a colcha é da mesma cor.
-Tem que haver alguma diferença. - murmurou Gina olhando sua cama e logo a ele - Contratou os serviços de um decorador?
-Não — respondeu ele negando com a cabeça — E você?
-Não.
Ambos ficaram olhando-se fixamente, como se estivessem apanhados. Parecia como se tivessem estado vivendo em um universo paralelo, como se seus espíritos se conhecessem de outro tempo e de outro lugar.
Tratando de distrair-se da intensidade do momento, Flint desviou a vista para a cômoda. E então viu as figurinhas. Algumas tinham formas caprichosas, e outras brilhavam como jóias, com as asas debruadas em ouro.
A princesa de gelo colecionava anjos.
Flint levantou a vista e captou uma imagem de Gina que o deixou confundido. Enquanto ela avançava para ele, o brilho de uma tênue lâmpada âmbar iluminou sua pele, enviando brilhos que dançaram sobre seu cabelo revisto, lhe proporcionando uma aura celestial.
-São preciosos, verdade? - perguntou Gina tomando uma das figurinhas e elevando-a para a luz, para o halo que a rodeava.
Durante um comprido e intenso instante, Flint foi incapaz de afastar os olhos dela. Ficou ali parado, cativado por sua beleza, pela magia que irradiava. Aquela figurinha pequena parecia brilhar entre suas mãos. Mas antes de cometer alguma estupidez, como lhe dizer quão maravilhosa era, Flint decidiu romper o feitiço.
-Eu não acredito nos anjos. -afirmou.
Já era suficiente com que Gina lhe tivesse roubado a habitação. Não estava disposto além a que ela soubesse que naqueles momentos a considerava uma espécie de ser celestial.
O rosto da Gina refletiu um gesto de desilusão, mas Flint deu a volta, dirigiu-se ao armário e o abriu decidido a voltar para o trabalho.
-O que está fazendo? - perguntou Gina apertando a figurinha contra seu peito.
-Ver a roupa que tem.
- Por quê? Tem medo de que compartilhemos, além disso, o mesmo vestuário?
-Não, espertinha. Estou procurando algo para que ponha em nosso primeiro encontro. Um pouco ajustado.
-Eu não gosto da roupa ajustada.
-Você gostará enquanto esteja comigo - assegurou-lhe Flint.
De uma maneira ou outra, estava decidido a converter a Gina Barone em uma mulher fatal. Não em um anjo, recordou a si mesmo. A não ser em uma mulher sensual e provocadora.
Uma mulher que pudesse lhe esquentar o sangue sem lhe esquentar o coração.
 
Capítulo Quatro
 
 
Gina se perguntou o que estaria tramando Flint. A noite anterior ele tinha estado em seu apartamento, e aquela tarde tinha insistido em que fosse a seu escritório. Ao parecer, tinha uma surpresa reservada. Gina não se confiava nele, mas lhe pôde a curiosidade e se apresentou ali.
Quando atravessou a área de recepção, Kerry, a leal assistente do Flint, levantou a vista da tela de seu computador.
-Está esperando-a. - disse a jovem com um sorriso - Pode passar.
-Obrigada. - respondeu Gina exalando um suspiro.
Encontrou ao Flint esperando-a com três araras portáteis cheios de roupa, várias caixas de sapatos e um espelho de corpo inteiro gasto especialmente para a ocasião.
-O que é tudo isto? - perguntou ela.
-Uma seleção de seu guarda-roupa para as próximas duas semanas -respondeu ele com seu típico sorriso de assessor -. Disse a uma estilista o que necessitaria e ela me enviou isso. Encarrega-se de vestir a algumas das mulheres mais famosas do mundo.
Gina deu uma olhada à roupa que havia nos cabides: Trajes de noite, vestidos justos, saias que apenas lhe cobririam o traseiro...
- Prove este. - disse Flint tirando um vestido comprido e prateado - Pode se trocar em meu banheiro. E se ficar bem, pode pôr isso amanhã de noite.
Gina observou aquele traje cintilante. Fechava na frente, deixando um espaço mínimo para lhe cobrir os seios.
-Suponho que esteja de brincadeira...
-Estará muito sexy com ele posto neném. 
-Se você gosta tanto, pode pôr isso você.
Disposto a não render-se, Flint procurou outro traje, esta vez um vestido cor cereja muito curto.
-O que te parece este? Tem um cinturão a jogo.
Um cinturão que Gina ia utilizar como correia se ele seguia lhe tirando trajes.
-Não vai me converter em uma tia boa, Flint.Assim esquece.
-É uma dissimulada, Gina. — disse Flint pendurando o vestido no cabide.
-Não o sou. — respondeu ela cruzando braços.
-Ah, não? - respondeu Flint sentando-se na esquina de seu escritório com uma mecha de cabelo caindo sobre a frente -. Aposto que nunca fez amor em um avião. Nem no elevador. Nem sequer debaixo de uma árvore, no parque.
Gina tratou de atuar como se sua acusação não a tivesse feito envergonhar-se.
-É ilegal andar por aí se enrolando em lugares públicos.
-Certo, mas isso é o que o faz tão excitante.
Ela fez tudo o que humanamente pôde por evitar seu olhar, mas podia sentir aqueles olhos ardentes lançando faíscas sexuais em sua direção.
-Eu sou uma dama disse então -. Comporto-me em público corretamente.
-Já, mas você não gostaria de fazer realidade alguma vez suas fantasias?
-Não fantasio com os aviões.
-E o que me diz do elevador? — insistiu ele inclinando brandamente a cabeça.
Muito bem, talvez ali a tinha pegado, mas certamente não ia ser tão estúpida de admiti-lo. Gina não era o suficientemente atirada para levar a cabo suas fantasias nem viver ao limite. Conduzia um Sedam de luxo em lugar de um esportivo, ia de férias a lugares práticos em vez de lugares exóticos e imprevisíveis, e batalhava contra uma úlcera que lhe abria cada vez que o estresse alcançava o nível suficiente em sua particular escala Richter.
- E em privado? — disse então Flint.
-Perdoa como diz? - perguntou ela elevando os olhos.
-Em privado também te comporta corretamente? - explicou-se ele enquanto examinava um vestido de couro negro digno de uma profissional do sadomasoquismo.
Gina ficou com a boca seca. Só tinha se deitado com dois homens em sua vida, e a nenhum tinha arrancado nunca a roupa nem lhe tinha arranhado as costas. Mas tampouco era nenhuma puritana.
-Comporto-me como devo.
-Ponha isto - ordenou Flint lhe passando aquele mini vestido - Quero ver suas pernas. Inteiras, até as coxas.
-Não. - respondeu ela agarrando o traje que lhe tendia.
- Supõe-se que temos que convencer ao mundo de que somos amantes. - assegurou ele olhando-a fixamente - É consciente disso, verdade?
-É obvio que sim. Mas, não poderíamos fingir que nosso primeiro encontro é isso, um primeiro encontro, e não nos converter em amantes imediatamente?
-Sim, podemos fazê-lo. Mas só temos umas poucas semanas para fazer esta montagem, assim terá que te render a meus encantos o mais breve possível.
-E por que não pode você te render a meus?
-Porque irá vestida como uma dissimulada, por isso.
-Muito bem. Levarei algo provocador, mas o comprarei eu mesma. -assegurou Gina pendurando aquele vestido de dominadora no cabide-. Aonde vamos, por certo?
-À estréia de uma peça de teatro. Uma obra erótica. - acrescentou Flint -. Assim te prepare para noite tórrida.
Gina sentiu como lhe acelerava ao coração dentro do peito. Uma obra pornográfica? Uma noite tórrida?
-Posso suportar algo que te ocorra. — o desafiou ela.
 
 
Gina observou sua imagem no espelho. se Atreveria de verdade a levar aquilo posto em público?
A malha branca de seu vestido se ajustava a seu corpo com linhas singelas. Mas esse não era o problema. O vestido deixava as costas completamente nuas, o que significava que não tinha posto sutiã, algo que Gina não tinha feito nunca até o momento.
O que lhe ocorria? Acaso estava tratando de competir com a antiga Tara Shaw, tentando provar a Flint que podia ser tão desejável como sua ex-amante?
Gina olhou seu relógio e o coração lhe deu um tombo. Ele chegaria em qualquer momento. Deu uma olhada ao redor em busca de seus sapatos, o xale, e a bolsa de noite no que levava o remédio para o estômago. Esteve a ponto de cair ao colocar os saltos, e no momento em que dava uma última olhada no espelho, soou o interfone.
- Espere-me no andar de baixo. Em seguida abro. - disse Gina através do inter comunicador enquanto abria a porta.
Logo colocou o xale que fazia jogo com o vestido, e pensou na possibilidade de tomar um copo de vinho para acalmar os nervos. Mas talvez lhe irritasse a úlcera, assim desprezou a idéia e decidiu tomar uns minutos para tranqüilizar-se.
Quando abriu a porta de seu apartamento, esteve a ponto de se chocar contra Flint. Ele ia muito elegante, vestido com um traje negro de corte clássico, uma camisa branca engomada e uma fina gravata negra.
-Lhe disse que me esperasse abaixo. - disse Gina fechando a porta atrás dela.
-Desde quando faço caso do que você me diz? - respondeu Flint com uma careta rebelde - Tire o xale e me deixe ver o vestido.
-É um traje muito provocador. - advertiu-lhe ela tratando de aparentar naturalidade -. Fará que se fixem em mim.
-Deixa que eu seja quem o julgue. - disse Flint aproximando-se para lhe tirar o xale.
-Eu o farei.
Gina se despojou do objeto e a tirou, dando um giro rápido para mostrar suas costas nuas. Logo tratou de voltar a tampar-se.
-Um momento. Espera. - ordenou Flint agarrando o xale e deixando-a vulnerável ante seus olhos.
Aqueles olhos de reflexos âmbar.
Gina se abraçou a si mesma, desejando não ter optado por um vestido sem sutiã. Quando Flint posou o olhar sobre seus mamilos, ela se agarrou à bolsa.
«Diga algo, por favor,», pensou. «Não fique aí olhando sem dizer nada».
Ele deu um passo adiante, e Gina tratou de respirar com normalidade.
-Pode me devolver meu xale, por favor?
-Não. - respondeu ele deixando o objeto sobre o corrimão - Quero te olhar mais.
-Está-me pondo nervosa, Flint.
-Sei.
Ele se aproximou outro tanto, e Gina se estremeceu.
- Relaxe. Supõe-se que estamos a ponto de nos converter em amantes. Não pode dar um coice cada vez que te toque.
Flint deslizou as mãos por seu cabelo.
-O que está fazendo? - perguntou Gina, tratando de combater um súbito enjôo.
- Tirando alguns grampos. - respondeu ele enquanto enroscava uma mecha de cachos entre os dedos -. Melhor. Agora está perfeita.
Gina não podia imaginar que aspecto teria com a metade do coque desfeito. Provavelmente, desalinhada. Como se acabasse de levantar-se da cama.
Flint deu um passo atrás e lhe entregou seu xale. Tomaram o elevador, e o trajeto para o primeiro piso pareceu durar uma eternidade.
- Acha que alguém tenha feito amor aqui alguma vez? - perguntou Flint.
-Não acredito. Quero dizer, seguro que não.
A suas irmãs não lhes ocorreria fazer algo semelhante. É obvio que não. Rita e Maria eram umas senhoritas, igual a ela.
- Deveríamos fingi-lo alguma vez. — disse Flint com cara de menino travesso -. Fazer como se o estivéssemos fazendo aqui.
-Isso não tem graça.
Quando se abriu a porta do elevador, Gina desceu com os mamilos tão duros como balas.
 
 
-Por certo, temos que posar para o marido de Kerry. Vai nos fazer umas fotografias eróticas. - comentou Flint como se tal coisa quando se subiram a seu Corvette esportivo.
-Como diz? — perguntou Gina com voz afogada.
-O marido do Kerry é um artista, e está de acordo. Virá bem a publicidade. Acordamos que nos fará algumas fotos sensuais, mas antes que tenha a oportunidade de escolher qual vai utilizar para pintar nosso retrato, alguém lhe roubará as fotos de seu estúdio para vender a uma revista - assegurou Flint sem tirar olho da estrada —. Seremos a fofoca da cidade.
-Fotos sensuais? - repetiu Gina quase sem respiração - Por que não me falou disto antes?
-Não queria te contar todo o plano de supetão. - desculpou-se ele.
-Não penso fazê-lo. - assegurou Gina cruzando-se de braços -. Não penso permitir que circulem por aí esse tipo de minhas fotografias. E não penso me tirar à roupa diante do marido do Kerry. Assim esquece-o.
-Não estará nua. Levará um pouco de lingerie - assegurou Flint colocando o carro no estacionamento do teatro -. Não tem eleição, Gina. Tem que fazê-lo. Forma parte do escândalo. Toda a imprensa se ecoará.
-Não me importa. me Enganou.
-Fiz o que tinha que fazer. — respondeu ele colocando-sena fila de carros que queriam entrar no estacionamento - Supõe-se que vamos ter um romance apaixonado, e que eu estou obcecado contigo, e por isso encomendei um retrato erótico teu.
-Não sei se sou capaz. - assegurou Gina mordendo o lábio inferior —. Quando se supõe que é a sessão?
- Dentro de dois dias. — respondeu Flint sem poder afastar os olhos de sua boca — Para então, já temos que estar dormindo juntos. Ou fingindo esclareceu - Eu deveria te acompanhar a seu apartamento depois da obra e ficar ali algumas horas, para que pareça que não pudemos resistir. Parece-te bem?
-Sim. - respondeu ela.
Seus olhos se encontraram então. Escutou-se o som de uma buzina, e Flint caiu na conta de que a fila tinha avançado sem que ele se desse conta. O condutor de atrás lhe fez um gesto para que se movesse, urgindo-o a prestar atenção a algo que não fosse à formosa mulher com a que estava planejando um falso romance.
 
 
Quando Flint e ela atravessaram o luxuoso vestíbulo do teatro, o estômago da Gina começou a protestar, e isso que a noite acabava de começar.
-Deixa que te ajude com o xale - sugeriu Flint inclinando-se para ela.
-De acordo. - respondeu Gina, consciente de que ele esperava que se tirasse o único amparo que tinha.
Ele permaneceu atrás enquanto ela o tirava. Gina sentia sua respiração sobre a nuca, esquentando-lhe. Assim que terminou de tirar o xale, seus mamilos se chocaram contra o suave tecido do vestido.
-Está preciosa.
Flint seguia atrás dela, e naquele instante lhe tocou a pele, deslizando brandamente um dedo por sua espinha dorsal. Gina pensou que aquilo formava parte do jogo, parte do escândalo público. Mas sua carícia tinha sido real, igual a sua reação. Todas e cada uma das terminações nervosas de seu corpo pareceram cobrar vida, invadindo-a com umas sensações que nem sequer suspeitava que tinha.
Flint a abraçou por detrás e a estreitou contra si. O traseiro da Gina se estrelou contra sua braguilha, e lhe mordiscou o lóbulo da orelha.
No vestíbulo do teatro havia centenas de pessoas tomando uma taça e desfrutando do coquetel que se estava servindo antes da estréia. E durante um bom momento, a boca e as mãos do Flint pareciam mover-se por todo seu corpo. Gina se deu conta de que tinha os dedos perigosamente perto de seus mamilos.
-Talvez deveríamos procurar nossos assentos - murmurou ela com os joelhos trementes.
-Muito bem, neném.
Flint lhe acariciou docemente a bochecha com o dorso da mão, e, por um momento, Gina desejou que aquele afeto fora real.
Flint Kingman era todo um ator. Levava a interpretação no sangue, já que sua mãe tinha sido atriz de Hollywood. Enquanto procuravam suas poltronas, Gina pensou que talvez devesse lhe contar que tinha alugado um filme em que intervinha sua mãe. Tinha-a visto três vezes, comovida pela beleza daquela mulher. Flint tinha herdado suas maçãs do rosto, sua natural sensualidade, seu sorriso sedutor. Era, sem nenhum gênero de dúvidas, filho do Danielle Wolf.
E logo estava, é obvio seu escandaloso romance com a Tara Shaw. Gina se imaginava que ela também teria contribuído a moldar ao Flint para convertê-lo no que era.
Gina se girou para olhá-lo e de repente a assaltou um pensamento. Teria sido de verdade amante da Tara, ou sua relação tinha sido um truque publicitário, uma montagem para impulsionar a carreira da já amadurecida atriz? Conhecendo Flint, tudo podia tratar-se de uma mentira.
Quinze minutos mais tarde, o teatro se encheu. Quando baixaram as luzes e se abriu o pano de fundo, Gina se concentrou no cenário.
A primeira cena deixou ao público impressionado. Uma moça começou a despir-se frente a um espelho. Quando ficou completamente nua, fechou os olhos e procedeu a beliscar-se brandamente os mamilos enquanto sussurrava um nome.
O cenário se encheu de fumaça e apareceu um homem. Gina se deu conta de que se tratava de uma seqüência onírica, mas aquilo não impediu que o homem do sonho tomasse entre seus braços à mulher de carne e osso que tinha diante.
E começasse a beijá-la e a acariciá-la.
Gina sabia que estavam atuando, mas mesmo assim sua interpretação a impressionou. Experimentou um calor entre as pernas enquanto um calafrio erótico lhe percorria a espinha dorsal. Sentia o que a atriz estava sentindo: fogo, desejo... O prelúdio do ato sexual.
E quando Flint lhe aproximou mais, soube que a ele também estava excitando a cena. De repente, o cenário se obscureceu. Já não havia luz: só os suspiros do ato amoroso, os sussurros da paixão.
Na escuridão, Flint começou a acariciar o braço nu da Gina, a plenitude de seu seio...
Ela girou a cabeça e ele a beijou. Apaixonadamente.
Tão apaixonadamente que Gina esteve a ponto de ficar sem respiração.
A atriz estava alcançando o orgasmo, e emitia pequenos gemidos. As luzes se acendiam e se apagavam intermitentemente, mostrando rápidas imagens dos atores nus, mas Flint seguia beijando a Gina, afundando as mãos em seu cabelo para atraí-la mais para si.
A língua do Flint se introduziu com força em sua boca, exigindo, insistindo, provocando em Gina um desejo enlouquecido, convertendo-a em parte mesma de seu ser.
Afligida pelo prazer, Gina o beijou a sua vez, descobrindo um deleite tão saboroso e proibido que queria mais e mais. Imediatamente o cenário voltou a iluminar-se e a mulher estava de novo sozinha.
Gina se afastou e olhou fixamente a Flint. Observou seu rosto entre as sombras, e soube que era o homem de seus sonhos. Sua fantasia. O ator que desapareceria quando seu escândalo terminasse.
Que o céu a ajudasse. Estava apanhada em um romance tórrido que nem sequer era real.
 
 
Capítulo Cinco
 
 
Flint contemplou através da janela do salão da Gina o North End de Boston. Acabavam de retornar do teatro, e lhe estava resultando difícil recuperar o controle de suas emoções.
-O que deveríamos fazer agora? - perguntou Gina.
«Nos beijar», pensou ele. «Nos acariciar. Fazer amor». De repente, Flint desejava que aquele romance fora real. Queria deitar-se com Gina, ter uma aventura apaixonada e selvagem com a princesa de gelo e deixá-la louca.
-Nada. -disse Flint - Não temos que fazer nada.
-Quer que prepare uma infusão? É tarde, assim poderíamos tomar uma camomila, por exemplo.
Flint deu a volta para olhá-la. Seguia levando aquele vestido branco que mostrava suas costas nuas. beijaram-se uma e outra vez durante a representação e durante o intermédio, fazendo todo um escândalo público. E a Gina só lhe ocorria lhe oferecer uma infusão?
- Supõe-se que deveríamos estar revolvendo nos como loucos, Gina, nos matando de paixão.
-Não pague comigo sua frustração sexual. - respondeu ela ruborizando-se.
Flint lhe sustentou o olhar. Sabia que sua boca era tão doce como parecia, e, de algum modo, aquilo só serviu para zangá-lo ainda mais.
- Por que não? Você provocou.
-E você é um homem rude e sem sentimentos.
Sem sentimentos? Flint a desejava. Desejava-a tanto que mal podia respirar. 
-Tenho muitos sentimentos.
«Muitos» pensou para si. 
-Isto tampouco é fácil para mim — assegurou Gina passando-a mão pelos cachos - Sinto-me atraída por ti, Flint. Mas não vou me deitar contigo. Não penso converter isto em um romance de verdade.
-E quem te disse que isso é o que eu procuro? - respondeu ele à defensiva, metendo as mãos nos bolsos.
-Ninguém, mas pensei que tomar uma infusão nos tranqüilizaria, manteria nossa mente ocupada - disse Gina cravando a vista no chão - Mas talvez devesse ir para casa.
Maldita fora. Por que tinha que parecer de repente tão vulnerável?
-Sinto muito. Não queria te ofender. É que foi uma noite muito estranha. Mas se me parto agora, não parecerá que temos feito amor. Só levo aqui dez minutos.
Gina não respondeu. Parecia um pouco envergonhada, e seguia olhando ao chão. Ao cabo de um instante levantou a vista e ambos ficaram olhando-se. A energia que havia entre eles era densa, igual ao ar que

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